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anãliss e, sele. produ. nrentes .a vem ri. auto. na, se , como elvil- A Bib60grafia como Ciência: da Critica Textual à Bibliometria 1\& ** Edson Ner~ do Forteco CDU 01 :31 mor A busca de informações bibliográficas, embora importante como etapa inicial de qualquer estudo ou investigação que pretenda ser realmente original, não pode confundir-se com a pesquisa bibliográfica. A bibliografia consagrou-se como ciênc~ _ pelas pesquisas literárias do inglês Alfred . WillianPollard em torno dos "Shakespeare Folias and Quaftos" (1909). Em 1917, os também ingleses F.J. Cole e N.B. Eales aplicaram a estatística na análise de uma bibliografia de anatomia comparada, fundando ti bibliometria. As pesquisas bibliométricas reafirmqram a natureza científica da bibliografia, considerada pelo sociólogo Victor Zoltowski"como ciência concreta, cujo objetivo é recensear o universo dos livros em sua totalidade, tal como procede a demografia ao recensear a população. Analisando a "Bibliographie de Ia France ", Zoltowski lançou, em 1955, as bases de uma bibliometria I macrobibliográfica. Com o advento dos .í~dices de citações (Science Citation lndex em 1963 e Social Sciences Citation liulex dez anos depois), surgiu a bibliometria microbibliográfica. O possível e desejável aparecimento de um índice de citações em Humanidades permitirá a reconstituição das cadeias de citações imaginadas por Henri Lefebvre. E com essa reconstituição, ~ui~~ retificações poderão ocorrer na utona das idéias. asil. mia res, O que se entende freqüentemente por pesquisa bibliográfica não passa de uma- procura de livros e artigos sobre determinado assunto ou de determinado autor: trabalho que, na maior parte dos casos, consiste em copiar informações das bibliografias, catálogos e outras fontes de referência disponíveis; trabalho que se resume, portanto, em fazer fichas. Procurarei mostrar neste artigo que a bibliografia é muito mais do que isso, desfazendo a confusão entre cópia de informações e pesquisa, atividade que supõe uma hipótese claramente formulada e objetivamente testada. Infelizmente, não dispomos, em língua portuguesa, de uma palavra como ~echerche - da qual :derivou o inglês research - cujo prefixo reforça o sentido .'dos verbos chercher e to search; mas a sígníficação original de pesquisa não * Conferência proferida em São Paulo, em 1975, para o Curso de atualização promovido pela APB e Cybertheke. Publicada com o título O que é e o que ·não é pesquisa biblio- gráfica, na Revista do Arquivo Público de Recife, v. 29, n. 31, p. 4-10, dez. 1979. Nesta revisão para RBBD, o autor acres- centa três notas e dedica o artigo à memória' de Jorge Peixoto. * * Professor titular do Departamento de Biblio- teconomia da UnB.

anãliss A Bib60grafia como Ciência: nrentes da ... · Walter Wilson Greg (1875-1959). O último chegou a receber o título de Cavaleiro do Império Britânico, ficando seu nome

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anãlisse, sele.produ.

nrentes

.a vemri. auto.na, se, como

elvil-

A Bib60grafia como Ciência:da Critica Textualà Bibliometria 1\&

**Edson Ner~do FortecoCDU 01 :31

mor

A busca de informações bibliográficas,embora importante como etapa inicial dequalquer estudo ou investigação quepretenda ser realmente original, não podeconfundir-se com a pesquisa bibliográfica.A bibliografia consagrou-se como ciênc~

_ pelas pesquisas literárias do inglês Alfred .WillianPollard em torno dos "ShakespeareFolias and Quaftos" (1909). Em 1917, ostambém ingleses F.J. Cole e N.B. Ealesaplicaram a estatística na análise de umabibliografia de anatomia comparada,fundando ti bibliometria. As pesquisasbibliométricas reafirmqram a naturezacientífica da bibliografia, consideradapelo sociólogo Victor Zoltowski"comociência concreta, cujo objetivo é recensearo universo dos livros em sua totalidade, talcomo procede a demografia ao recensear apopulação. Analisando a "Bibliographiede IaFrance ", Zoltowski lançou, em 1955,as bases de uma bibliometria

I macrobibliográfica. Com o advento dos. í~dices de citações (Science Citation lndexem 1963 e Social Sciences Citation liulexdez anos depois), surgiu a bibliometriamicrobibliográfica. O possível e desejávelaparecimento de um índice de citaçõesem Humanidades permitirá a reconstituiçãodas cadeias de citações imaginadas porHenri Lefebvre. E com essa reconstituição,~ui~~ retificações poderão ocorrer nautona das idéias.

asil.mia

res,

O que se entende freqüentemente porpesquisa bibliográfica não passa de

uma- procura de livros e artigos sobredeterminado assunto ou de determinadoautor: trabalho que, na maior parte doscasos, consiste em copiar informações dasbibliografias, catálogos e outras fontesde referência disponíveis; trabalho que seresume, portanto, em fazer fichas.

Procurarei mostrar neste artigo que abibliografia é muito mais do que isso,desfazendo a confusão entre cópia deinformações e pesquisa, atividade quesupõe uma hipótese claramente formuladae objetivamente testada.

Infelizmente, não dispomos, emlíngua portuguesa, de uma palavra como~echerche - da qual :derivou o inglêsresearch - cujo prefixo reforça o sentido

.'dos verbos chercher e to search; mas asígníficação original de pesquisa não

* Conferência proferida em São Paulo, em1975, para o Curso de atualização promovidopela APB e Cybertheke. Publicada com otítulo O que é e o que ·não é pesquisa biblio-gráfica, na Revista do Arquivo Público deRecife, v. 29, n. 31, p. 4-10, dez. 1979.Nesta revisão para RBBD, o autor acres-centa três notas e dedica o artigo à memória'de Jorge Peixoto.

* * Professor titular do Departamento de Biblio-teconomia da UnB.

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justifica o amplo sentido com que a palavravem sendo usada, pois sua etimologiaé .o latim perquirere - perquirir, investigarcom escrúpulo, indagar, inquirir minucio-samente - através do espanhol pesquisa,definida pela Real Academia corno "infor-mación o indagación que se hace de unacosa para averiguar Ia realidad de ellao sUScircunstancias" .

Não estou negando - note-se bem-a utilidade desse tipo de trabalho, queé ou deve ser a fase preliminar de qualquerpesquisa científica, para evitar redes-Cobertas ou reinvenções. Em Sociodinâmica da Cultura, Abraham Mo-les inclui essa busca de informações nopróprio "tempo de gestação" das obrasculturais. Para ele, a busca de informaçõesconsome de um terço a metade do "tempode gestação", pois é preciso testar doeu-mentariamente as idéias que surgem emnosso espírito, para verificar se elas sãorealmente originais (11, p. 734). Masnão é admissível que se continue chamandopesquisa bibliografica a uma simplesprocura de informações, por mais cuida-dosamente planejada e exaustivamenteestudada que tenha sido.

O mais grave, porém, é que essaacanhada concepção de pesquisa biblio-gráfica vem sendo veiculada pelos própriosprofessores de bibliografia. Parafraseandoo desabafo de Manuel Bandeira em suaPoética, direi que estou farto dessa biblio-grafia raquítica, sifilítica e subdesenvol-vida, com seus repertórios, suas fichase bizantinas discussões sobre JohannTritheim ou Conrad Gemer, cujas obrasninguém viu entre nós. Sinto-me atétentado a propor, de acordo com o espíritocontestatário de nossa época, uma anti-bibliografia a juntar-se à antipsiquiatriados Foucault e dos Laing ou à antíecono-mia dos Attali e dos Guillaume.

Por que esta contestação'? Pelopuro prazer de contestar'? De modo ne-nhum! Com a antibibliografia proposta,

procuro tirar da bibliografia o seu aspectode pura técnica ou mesmo de simplesciência auxiliar, para ressaltar sua condiçãode ciência com objetivos próprios,talvez mais válida, corno tal, do que aprópria biblioteconomia, que seria antesuma arte, corno até a medicina vem sendoconsiderada por alguns autores (8, p. 63,129 et passim).

Neste sentido, aplicam-se à antibi-bliografia as palavras com as quais, emobra recente, Attali e Guillaume justifi-cam. a antieconomia: "Os manuais clás-sicos, em especial, continuam descrevendoimpertubavelrnente as mesmas teorias aca-dêmicas, adornadas, por vezes, para secolocarem ao sabor do dia, com algunsnovos desenvolvimentos que lidam margi-nal e superficialmente com as questõesque estilo na moda. Ao· formarem asfuturas gerações de economistas, de exe-cutivos, de professores, contribuem parareproduzir representações econômicas ul-trapassadas; é por isso que este livro é,em primeiro lugar, urna crítica da forma eda essência do ensino tradicional da ciên-cia econômica" (2, p. 7).•Foi no início do século XX que abibliografia deixou de designar apenasuma "lista de livros" para ser encaradacomo ciência cujos precursores são trêsnotáveis bibliotecários do British Museum:Alfredo William Pollard (1859-1944), Ro-nald BninleesMcKerrow (1872-1940) eWalter Wilson Greg (1875-1959). O últimochegou a receber o título de Cavaleiro doImpério Britânico, ficando seu nomeornado com um elegante Sir.

Estes ingleses, aliás, não fizerammais do que restaurar urna tradição queremonta à célebre Biblioteca de Alexan:dria, cujos diretores foram notáveis erudi-tos, corno Zenódoto de Éfeso, Aristófa-nes de Bízãncío, Aristarco de Samotrá-cea, Calímaco de Cirene, Apolõnio deRodes, etc. De Zenódoto, por exemplo,sabemos que foi quem primeiro estabe-

EdsonNery da Fonseca - A Bibliografia como Ciência. à Bibliometria

leceu O texto das obras de Homero, divi-dindo-as em 24 livros cada urna.

A semelhança de outras ciências, abibliografia começou com urna descober-ta: a da relação entre a primeira e asedições subseqüentes das obras dramáticasde Shakespeare. E assim corno o austna-CO Johann Gregor Mendel tornou-se opai da genética pela publicação, em 1866,do seu famoso trabalho sobre hibridaçãode plantas, Pollard pode ser consideradoo pai da bibliografia textual - por algunstambém chamada histórica, crítica oudescritiva - com seu estudo Shakespearefolias and quartos, publicado em 1909 26

O exemplo da genética não apareceaqui por acaso. Existe uma analogia entreesta ciência e a bibliografia, na medidaem que ambas procuram estabelecer se-melhanças e diferenças: a primeira entreorganismos aparentados biologicamente e asegunda entre as sucessivas edições deuma obra. Abra-se um simples manualde bibliografia textual e ver-se-ã corno osesquemas de sucessão de textos manus-critos e impressos se assemelham aos detransmissão hereditária (1 3, p. 31-37,40, 42 e 43). Para citar as palavras de SirWalter Greg: "Books are the materialmeans by which literature ís transrnited;thereforer bibliography, the study ofbooks, is essentially the science of thetransmission of literary documents" (26,p. 15, grífos nossos).

Existem várias outras analogias entrea ciência biológica e a ciência bibliográ-fica. Albert C. Clark tem um livro inti-tulado Descent of manuscripts (Oxford,1918). Fala-se também na árvore genea-l~gica dos manuscritos e impressos, tec-nIcamente denominada estema. Fala-seigualmente de manuscritos que têm ndescendentes da primeira geração ancestral,chamado tecnicamente de arquetipo; emexemplares contaminados por erros doscopistas.

Costuma-se dizer que os copistas

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erravam porque seus olhos "caminhavam"mais depressa do que suas mãos. Entre-tanto, a má leitura e a má transcriçãode textos não existiu apenas na épocados manuscritos. Com todos os progres-sos alcançados pelas técnicas de impres-são, ainda hoje encontramos erros nostextos modernos mais caprichados, cornosão os das enciclopédias. Em sua obraA new introduction to bibliography,publicada em 1972, Philip Gaskell -- professor e bibliotecário do TrinityCollege - observa com razão: "Não hámotivo para confinar a bibliografia aosdocumentos escritos. Todos os documen-tos, manuscritos ou impressos, estãocompreendidos na província do biblió-grafo; e deve ser acrescentado que ospropósitos e procedimentos da bibliogra-fia se aplicam não apenas aos livros ma-nuscritos e impressos, mas também a qual-quer outro documento, disco, fita oufilme: documentos que, por serem re-produzidos, são susceptíveis de propor-cionar diferentes versões e variantes"(11,p.I).

Não se pense que a bibliografiatextual só tenha aplicação nos autoreschamados clãssícos. O Brasil precisa demuitos especialistas para o fascinantee até agora pouco explorado trabalho deestabelecimento dos textos de seus es-critores antigos e modernos. Um tra-balho .corno esse pode e deve ser carac-terizado corno pesquisa bibliográfica e oque ele apresenta de mais avançado é apossíbílidade de sua automatização. Emartigo publicado em 1965, o beneditinoDom J acques Froger apresentou suges-tivo estudo recapitulativo - state-of--the-art report, corno dizem os norte--americanos - sobre "a mãquina eletrô-nica a serviço das ciências humanas" ,publicando três anos depois um estudomais específico (9a).

Somente a documentação manuscri-ta e impressa existente na Biblioteca

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Nacional do Rio de Janeiro e .no Instí-tuto de Estudos Brasileiros da Univer-sidade de São Paulo, por exemplo, dariapara ocupar muitas equipes de pesquisa-dores especializados em bibliografia tex-tual, durante várias gerações. Trata-se,portanto, de especialização promissora,que um dia pode até constituir-se emcurso independente do de biblioteconomía,Ou interdependente deste, como seriamais apropriado dizer-se de especializa-ções afins e mesmo não-afins.

Nosso país possuí, neste campo,uma tradição infelizmente interrompida:a da admirável equipe de técnicos e erudí-.tos que ajudou Benjamin Franklin RamizGalvão a reformar a Biblioteca Nacional,entre 1870 a 1882, período durante oqual publicaram-se edições importantescomo a da Prosopopeia de Bento Teí-xeira, a Arte da grammática da Iinguabraztlica. da nação JJ.riri, do Padre Ma-míami, a Flora Fluminensis de frei JoséMariano de Conceição VelIoso e outras,avulsas ou incluídas nos Anais da Biblio-teca Nacional, iniciados em 1876.

Rubens Borba de Moraes e Rose-marie Erikà Horch são, no Brasil, osúnicos bibliotecários que mantêm aindaviva essa tradição. Do primeiro é essaprestimosa Bibliografia brasileira do perío-do colonial, que tem, entre outros méri-tos, o de identificar as edições da obrade Tomás Antônio Gopzaga Martlia deDirceu. Muitas outras obras de grandeinteresse para a hist6riada literatura,da ciência e da arte brasileira estão re-ferenciadas na mesma bibliografia deBorba de Moraes. Elas são a matéria--prima potencial de edições críticas eestão à espera de bibli6grafos que conhe-çam, não apenas. as normas da ABNT,mas a ciência da bibliografia textual,como Rosemarie Horch, exímia catalo-gadora dos incunábulos da BibliotecaNacional e exploradora dos cimélios daColeção Barbosa Machado.

Existem ainda outro tipo de pesqui.sa que dá à bibliografia categoria cien.tífica. Refiro-me às análises bíblíoms.tricas resultantes dá aplicação da esta.tística à bibliografia. Segundo Alan Prír,chard, os precursores foram os inglesesF,J. Cole e N.B. Eales quando, em 1917,analisaram a bibliografia de anatomiacomparada. Essa análise foi comentadapor outro inglês - E.W. Hulme - numlivro publicado em 1923 e em cujo títuloaparece pela primeira vez a expressão"bibliografia estatística": Statistical bi-bliography in relation to the growth ofmodern civilization 23. I

Engana-se Pritchard, entretanto, aoafirmar que a expressão passou vinte edois anos ignorada, até ser novamenteempregada por Charles F. GosnelI e L.M.Raisig. No seu Traite de documentation,publicado em 1934, Paul Otlet: aborda oassunto num capítulo intitulado "LeLivre et Ia mesure. Bibliométrie" e no'qual já se fala em bibliografia estatí~tiéa~q'p. 13-22). E BradÍord não pode ser igual-mente esquecido entre os precursores dabibliometria, pois sua famosa lei, pelaprimeira vez formulada, em 1934, baseia-se na análise estatística de um a biblio-grafia especializada 4.

Muitos estudos bibliométricos foramrealizados com base na. lei de Bradforde até já começam a aparecer, no Brasil,dissertações de mestrado na mesma linhade pesquisas. Tanto já se escreveu sobre oassunto que é perfeitamente previsível oaparecimento de uma análise bibliométri·ca da lei de Bradford baseada na próprialei de Bradford. Ultimamente, entretanto,ela começou a sofrer restrições, quanto àsua ambiguidade 31 e até com relação àsua validade científica. Em artigo recente,André Chonez chega a falar em "impoS-tura pseudo-cíentffíca' 5 .

Podemos classificar as análises bi·bliométricas em mícro-biblíogrãfícas emacro-bibliográficas. Denominamos micrv

Edson Nery da Fonseca- A Bibliografia como Ciência... à Bibliometria

_bibliográficaa análise de artigos de perió-dícos. tal como foi pela primeira vezrealizada por Coles e Eales (1917), Hulme(1923) e Bradford (1934), Mais recente-mente, surgiu outro tipo de análise que euchamaria de ultra-mícro-bíblíográfíca, poisse exerce sobre citações contidas emartigosde periódicos.

AS análises de citações identificamredes que se constituem na infraestru-tura da Ciência da Informação. Elas comoque escancaram a nossos olhos todo o,processo de organização do conhecimento,revelando,como salienta Manfred Kochen,relações entre novas e antigas informa-ções (13 p. 139). Os precursores daanálise que estou denominando de ultra--mícro-bíblíogrãfícasão todos norte-ameri-canos: Eugene Garfield, M.M. Kessler,Charles Osgood, Derek de SolIa Price eoutros, citados no estudo recapitula-tivo deste último, intitulado "Networkof scientificpapers" 22.

As mais importantes conquistas nestecampo são o Science Citation Indec ,iniciado em 1963 e o Social SciencesCitation Indec ,.cuja publicação começouem 1973. O índice de citações pode serbrevemente defmido como uma lista. dedocumentos citados por um documento.No caso do Science Citation Indec e doSocial Sciences Citation Indec , as listasindicam citações contidas em coleçõesde documentos, somente possíveis pormeio da tecnologia eletrônica. Ambossão publicados trimestralmente e acumu-lados anualmente em volumes encader-nados pelo Institute for Scientific Infor-mation, de Filadélfia.. Os índices das citações estão divi-

!lidos em três partes: Citation Indec(O~omástico),Source Indec (documentoseditados por instituições, documentosanônimos, patentes e documentos de;utoria individual) e Permuterm Subjectndex (Indíce temático em cadeia). A

Parte 1 - Citation Indec _. tem apresen-

33

tação tabular, indicando: autor citado,autor citante, ano da publicação citada,ano da citação, volume e página. Comtodas as suas listagens, um índice de ci-tações permite responder se determinadanota prévia já foi expandida em artigo,se determinado livro já foi objeto de umarecensão crítica (book-review}, se deter-minada teoria já foi confirmada, se deter-minado método já foi aperfeiçoado, sedeterminada sugestão já foi testada, sedeterminada patente foi citada, se existenova smtese para determinado compostoquímico ou se sua atividade biológicafoi devidamente confirmada, se determi-nado produto foi clinicamente avaliado,se determinada idéia é original, se existemoutros pesquisadores trabalhando em deter-minado campo, quais os mercados poten-ciais para determinado instrumento, queobras foram publicadas por determinadainstituição, quais as obras mais recentesde determinado autor e em que obrascoletivas ele colaborou, etc.

Se dentro de mais alguns anossurgir o Humanities Citation Inde: , ociclo se completará, concretizando umsonho do grande pensador Henri Lefebvre,que em 1967 escreveu estas palavrasproféticas: "Uma triagem maliciosa daspublicações numa determinada especiali-dade (digamos a sociologia) nos apresenta-ria muitas surpresas. Seria possível re-constituir as cadeias de citações. Perce-beríamos quão raramente se introduz nostextos uma idéia nova; encontraríamosonde determinada idéia foi introduzida,por quem, aquilo que ela se tornou, comoela se metamorfose ou, onde morreu,onde está seu túmulo (...). O estudo dascitações pressupõe grandes meios, dinheiro,máquinas. e um mundo bem grande, oda coisa escrita. Que amontoado gigan-tesco de papel impresso! A grande pesquisaque lembramos aqui reduziria esse monteao revelar todos os textos que parafraseiamoutros textos, ao remontar às palavras

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originais. Que restaria daquele amonto-ado? O livro absoluto, tão procurado,tão sonhado. Deixaremos a cada um dosleitores o prazer de compor esse livro.Quanto a nós, continuamos a imaginaressa triagem, que exigiria o empregodas técnicas quantitativas mais modernas:enumeração, freqüências" (15, p. 182-3).

Esta longa citação mostra quedificilmente se exagera a importância dosíndices de citações, somente possíveis- repetimos - pelo processamento ele-trônico de dados. Se me disserem que nãodispomos, no Brasil, de' recursos parafazer o mesmo eu responderia com aindicação do tempo ocioso da maiorparte dos computadores existentes nopaís.

Lamento não poder deter-me commais vagar sobre o assunto porque issorequereria, no minímo, outro artigo.Recomendo, porém, a leitura da contri-buição de M.V. Malin em Library Trendsde janeiro de 1968 e li) e o verbete queMelvin Weinstock escreveu para a Encyclo-pedia of library and information science 30.

Na análise que denominei de macro-bibliográfica, a matéria prima é a biblio-grafia nacional de determinado país. Elafoi pela primeira vez intentada pelo soció-logo Victor Zoltowski. Tomei conheci-mento da existência deste autor atravésde uma citação de pé-de-página do livrinhode Louise-Ntlellel Malclês sobre a históriada bíblíografla (17), p. 13). Parece-meinjustificável que um trabalho tão impor-tante para a bibliografia seja desconhecidopela maior parte dos bibliotecários. Taldesconhecimento se explica - embora demodo algum se justifique - pelo fatodo estudo a que me refiro haver sidopublicado numa revista de sociologia,constituindo-se, por isso, numa liçãopara todos nós: a de que não basta con-sultar as revistas de nossa especialização,pois como demonstrou Bradford, os ar-

~ tigos especializados estão disperses por

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revistas gerais e de ou tras especializações.Vejamos o que disse e, sobretudo,

o que fez Victor Zoltowski. Para ele abibliografia é uma "ciência concreta"que tem por objetivo "recensear o mundodos livros na sua totalidade, do mesmomodo pelo qual a demografia procedecom o recenseamento da população"(32, p. 175). O estudo consiste numaanálise da Bibliographie de Ia France- criada em 1811 por um decreto deNapoleão I - desde seu início em 1812<té 1900.

Tal análise permitiu a Zoltowskiidentificar movimentos culturais, comple-tando, esclarecendo e mesmo retificandoinformações dos historiadores das idéias,das letras e das artes. Assim - esclareceZoltowski - "introduzindo a bibliografiacomo ciência concreta e a estatísticabibliográfica que a torna quantificável,pode-se estudar, através dos séculos,certos problemas sociológicos sobre omesmo terreno e com o mesmo método"(32,p.183).

Ignoro se análises bibliométricassemelhantes à de Victor Zoltowski foramfeitas em outros países, tendo comobase as respectivas bibliografias nacionaís.!Sou orientador de uma dissertação demestrado em Ciência da Informaçãocuja autora - a bibliotecária pernam-bucana Ivanilda Fernandes da Cunha, daUniversidade Federal de Pernambuco -- está analisando, com idêntico objetivo,o Boletim Bibliográfico da BibliotecaNacional do Rio de Janeiro. Trata-se,evidentemente, de uma amostragem muitoprecária, considerando-se que o depósitolegal somente é cumprido, no Brasil,por um número muito reduzido de edi-tores. Para comprovar esse escandalosOfato, basta comparar com a Library ofCongress Accession List :Brazil, publicaçãObimestral iniciada em janeiro de 1975,de acordo com o programa nacional deaquisição e catalogação dos Estados Unidos

Edson Nery da Fonseca - A BIbliografia como Ciéncra ... à Bibliometria 35

e graças ao Library of Congress Offlcedo Rio de Janeiro. 2

Sempre me pareceu que a biblio-grafia nacional de um país com as dimen-sões continentais e os contrastes cultu-rais do Brasil devia ser descentralizadapor grandes Estados - como São Paulo,paraná e Minas Gerais, por exemplo - epor grandes regiões como as do Norte,Nordeste e Centro-Oeste, coordenadas,as destas, pelas respectivas superinten-dências regionais de desenvolvimento(SUDAM, SUDENE e SUDECO).

Se o Controle Bibliográfico Universaladmite, como assinala Dorothy Anderson,bibliografias regionais de âmbito inter-nacional (I, p. 30, item 11.3 e p. 39,item 14.4), parece lícito supor que biblio-grafias estaduais e regionais como asaqui propostas serão bem acolhidas tantopelo referido programa· como peloUNISIST. A exigência natural de ambosé que as contribuições nacionais a uma

1 -

bibliografia internacional sejam apresenta-das de acordo com as novas normas paradescrição bibliográfica de monografias(ISBD-M) e· de publicações periódicas(ISBD-S); e, no caso do UNISIST, segundoos modelos do seu manual de referência(vide bibliografia).

Para concluir, de acordo com otítulo deste artigo: a procura de informa-ções e a cópia de referências, emboraimportante como etapa inicial de qualquertrabalho científico, não pode ser conside-rada pesquisa bibliográfica, expressão quedesigna (1) a correta identificação detextos e seu estudo comparativo, paradeterminação do arquétipo e suas variantes;(2) as análises bibliométricas cujo objetivoé a comprovação ou retificação da his-tória das idéias, tanto (2.1) pelo relacio-namento entre documentos citados· edocumentos citantes como (2.~), pelorecenseamento ideográfico de bibliogra-fias nacíonaís,l

NOTAS

Depois de escrito este artigo, tomei conhecimento de uma interessantíssima teseapresentada à Universidade de Paris por Robert Estivals: La bibliometrie biblio-graphique (Lille, Service de Reproductíon des Theses de l'Université de Lille,1971. 2 t.): estudo exaustivo e fundamental. Recentemente, publicou-se outraobra importantíssima: Literature and bibliometrics, by David Nicholas and Mau-reen Ritchie (London, Bingley; Hamden, Linnet Books, 1978. 183 p.).

2 _A dissertação de Ivanilda Fernandes da Cunha Rolím foi defendida e aprovadano curso de Mestrado em Biblíoteconomia do Instituto Brasileiro de Informaçãoem Ciência e Tecnologia/Uníversidade Federal do Rio de Janeiro, em 1977. Iva-nilda Rolim acaba de traduzir o trabalho de Zoltowski, a sair em 1979, possi-velmente pela Editora Cultrix.--

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EdsonNery da Fonseca - A Bibliografia como Ciência... à Bibliometria 37

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