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Na BEIRA com Aquilino - Roteiro cultural por “Terras do Demo” – 20 de maio de 2017 1/16 Ação de formação – Visita de estudo a Salzedas (mosteiro), Ucanha, Moimenta da Beira, Carregal-Tabosa, Serra da Lapa (santuário), Soutosa (Fundação Aquilino Ribeiro), Vila Nova de Paiva… (20 de maio de 2017) Objetivos específicos: • Conhecer monumentos e espaços naturais relacionados com a Ordem de Cister e a obra literária de Aquilino Ribeiro; • Motivar para a leitura dos livros de Aquilino Ribeiro; • Promover a articulação entre diversas manifestações do património cultural; • Fomentar o convívio, o espírito de grupo e a qualidade das relações interpessoais. Destinatários: Docentes e Não Docentes do AE António Sérgio e seus convidados. Data: sábado, 20 de maio de 2017. Transporte: autocarro (preço: ±15 €). Tempo de formação e convívio: 11 horas (8:00 h a 19:00 h). Local e hora de saída: Frente à Escola Secundária António Sérgio (Gaia), às 8 horas Orientação da visita: Visitas guiadas no mosteiro de Salzedas e na Fundação Aquilino Ribeiro. Contactos / inscrições (a confirmar mediante pagamento, até 6 de maio): • Cristina Sobral ([email protected]) • Fernanda Portela Martins ([email protected]; tlm. 919562954) • José Gerós ([email protected]); tl. 223750135 • Manuel António Silva ([email protected]; tlm. 933207627) Mosteiro de Salzedas Torre de Ucanha

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Ação de formação – Visita de estudo a

Salzedas (mosteiro), Ucanha, Moimenta da Beira, Carregal-Tabosa, Serra da Lapa (santuário), Soutosa (Fundação Aquilino Ribeiro), Vila Nova de Paiva…

(20 de maio de 2017)

Objetivos específicos: • Conhecer monumentos e espaços naturais relacionados com a Ordem de Cister e a obra literária

de Aquilino Ribeiro; • Motivar para a leitura dos livros de Aquilino Ribeiro; • Promover a articulação entre diversas manifestações do património cultural; • Fomentar o convívio, o espírito de grupo e a qualidade das relações interpessoais. Destinatários: Docentes e Não Docentes do AE António Sérgio e seus convidados.

Data: sábado, 20 de maio de 2017. Transporte: autocarro (preço: ±15 €).

Tempo de formação e convívio: 11 horas (8:00 h a 19:00 h).

Local e hora de saída: Frente à Escola Secundária António Sérgio (Gaia), às 8 horas

Orientação da visita: Visitas guiadas no mosteiro de Salzedas e na Fundação Aquilino Ribeiro. Contactos / inscrições (a confirmar mediante pagamento, até 6 de maio): • Cristina Sobral ([email protected]) • Fernanda Portela Martins ([email protected]; tlm. 919562954) • José Gerós ([email protected]); tl. 223750135 • Manuel António Silva ([email protected]; tlm. 933207627)

Mosteiro de Salzedas

Torre de Ucanha

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Mosteiro de Santa Maria de Salzedas

Mosteiro masculino da Ordem de Cister: a sua construção iniciou-se em 1168. Com a sua fundação

intimamente ligada à figura de Teresa Afonso, esposa de Egas Moniz, o complexo monástico foi

largamente ampliado no século XVII e XVIII, destacando-se um novo e monumental claustro no século

XVIII, com traço do arquiteto maltês Carlos Gimach.

Contando no seu espólio com trabalhos de alguns dos maiores nomes da pintura em Portugal, como

Vasco Fernandes (Grão Vasco), Bento Coelho da Silveira ou Pascoal Parente, com a extinção das

Ordens Religiosas em Portugal em 1834, a igreja foi convertida em igreja paroquial e parte das

dependências monásticas vendidas a privados.

Classificado Monumento Nacional em 1997, em 2002, ao abrigo de protocolo com a Diocese de

Lamego, o Estado Português iniciou o progressivo restauro dos edifícios e espólio, possibilitando a sua

abertura ao público em outubro de 2011.

Imóvel de Interesse Público pelo Decreto n.º 95/78, DR, I Série, n.º 210, de 12-09-1978

Reclassificado como Monumento Nacional pelo Decreto n.º 67/97, DR, I Série-B, n.º 301, de 31-12-1997

Ampliação da classificação e atribuição de Zona Especial de Proteção pelo Decreto n.º 31-I/2012, DR, I Série, n.º 252 (suplemento), de 31-12-2012

Zona Especial de Proteção pela Portaria n.º 291/2014, DR, II Série, n.º 83, de 30-04-2014

Fotografia de Pedro Martins. Direção Regional de Cultura do Norte

Ponte Fortificada de Ucanha

A mais conhecida passagem do rio Varosa é a ponte de Ucanha, provavelmente edificada durante os

séculos XIV-XV, substituindo uma outra de filiação romana. A torre que lhe está adossada foi

construída em 1465 por iniciativa do abade do Mosteiro de Santa Maria de Salzedas, D. Fernando,

marcando a entrada no couto monástico e servindo como depósito do pagamento da portagem que os

viandantes aqui entregavam para a transporem.

Por ordem deste abade foi erigido em 1472 um hospital nas proximidades da ponte, para auxílio dos

pobres e viajantes, possivelmente no local onde hoje se mantém uma porta de cariz medieval.

Aqui passava a estrada, já desde a época romana, que de Lamego se dirigia para o interior, passando

por Moimenta da Beira e Trancoso, podendo-se ainda hoje observar alguns troços de calçada bem

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conservados. Inevitavelmente, também aqui parte um caminho em direção ao Mosteiro de Santa Maria

de Salzedas. A Ponte Fortificada de Ucanha integra o projeto Vale do Varosa desde abril de 2014.

Monumento Nacional pelo Decreto de 16-06-1910, DG, n.º 136, de 23-06-1910

Fotografia de Pedro Martins. Direção Regional de Cultura do Norte

Biblioteca Municipal Aquilino Ribeiro – Moimenta da Beira

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Pátio Aquilino Ribeiro - Carregal

Santuário de Nossa Senhora da Lapa

Ex-libris de Aquilino Ribeiro

Fundação Aquilino Ribeiro

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A nobre casa de Aquilino Ribeiro, em Soutosa, datada do séc. XIX dá lugar à Fundação Aquilino

Ribeiro (FAR), instituição de utilidade pública sem fins lucrativos. A casa senhorial, como muitos lhe

chamam, tem como objetivo promover a vida e obras literárias de Aquilino Gomes Ribeiro e preservar

as memórias do escritor, valorizando os bens culturais e promoção da sua obra com objetivos científicos,

educativos e lúdicos.

Aquilino, nasceu em 1885 na freguesia de Carregal, Sernancelhe, mas foi em Soutosa, concelho de

Moimenta da Beira, que o escritor passou parte da sua infância, mudou-se para a aldeia juntamente com

os seus pais, aos dez anos de idade.

Após a morte de seu pai, Aquilino herda, em 1918, a exímia casa de Soutosa que aparece sempre

como refúgio na vida crucial do escritor.

A sua cronologia é extensa, o mestre passou e viveu em diferentes lugares, colocando-se em fuga

diversas vezes, combatendo sempre as ditaduras. No entanto, nunca deixou para trás a escrita onde a

palavra liberdade era fulcral em todos os seus romances.

Em vida publicou 69 livros onde abordavam diversas áreas, como a ficção, memórias, literatura,

biografias, estudos de história e etnologia, teatro, crítica literária, entre outras. Em 1907, em parceria

com José Ferreira da Silva escreve A Filha do Jardineiro, obra de ficção e de crítica às figuras do regime.

De linguagem provinciana e de cariz prosador do séc. XX, e através de uma escrita original, Aquilino

afirmava com persistência que “alcança quem não cansa”, uma das frases mais conhecidas do autor.

A Casa-Museu presenteia-nos com centenas de objetos pessoais do escritor, como livros, postais e

fotografias. Sem esquecer, o extenso jardim, o pátio interior da Casa, os anexos de lavoura, a Biblioteca

de Aquilino, situada na casa de São João que possui também um auditório e, a Casa do Aldeão que é

conhecida por ser uma casa doméstica dos finais do século XIX, princípios do século XX, onde possui

utensílios usados nos nossos antepassados.

A FAR é o local ideal para conhecer e compreender o mundo retratado pelo mestre Aquilino, talvez

divagar e entender os porquês da sua luta e persistência pela igualdade e liberdade.

*** ***

Aquilino Ribeiro (Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.)

Aquilino Gomes Ribeiro

(Carregal, Sernancelhe, 13 de setembro de 1885 — Lisboa, 27 de maio de 1963)

É considerado por alguns como um dos romancistas mais fecundos da primeira metade do século

XX. Inicia a sua obra em 1907 com o folhetim "A Filha do Jardineiro" e depois 1913 com os contos de

Jardim das Tormentas e com o romance A Via Sinuosa, 1918, e mantém a qualidade literária na maioria

dos seus textos, publicados com regularidade e êxito junto do público e da crítica.

Cronologia

1885 - Nasce no Carregal (concelho de Sernancelhe) em 13 de Setembro, filho natural mais novo

do padre Joaquim Francisco Ribeiro e de Mariana do Rosário Gomes, como sua irmã Maria do

Rosário e seus irmãos Melchior e Joaquim. É batizado na Igreja Matriz dos Alhais (Concelho de

Vila Nova de Paiva).

1895 - Muda-se para Soutosa, concelho de Moimenta da Beira. Faz exame de instrução primária.

Entra no Colégio de Nossa Senhora da Lapa.

1900 - Entra no Colégio de Lamego, em Lamego. Estuda Filosofia em Viseu. Entra depois no

Seminário de Beja, obedecendo a um desejo da sua mãe que queria fazê-lo sacerdote.

1904 - Expulso do Seminário, depois de ter dado uma réplica cortante a uma acusação do padre

Manuel Ançã, um dos diretores da instituição. Regressa a Soutosa.

1906 - Vai para Lisboa. Colabora no jornal republicano A Vanguarda.

1907 - Em parceria com José Ferreira da Silva escreve A Filha do Jardineiro, obra de ficção de

propaganda republicana e de crítica às figuras do regime.

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1907 - Entra para a Loja Montanha do Grande Oriente Lusitano, em Lisboa, a convite de Luz de

Almeida.

1907 - É preso por ser anarquista na sequência de uma explosão no seu quarto na Rua do Carrião, a

28 de Novembro, em Lisboa, na qual morre um carbonário.

1908 - Evade-se da prisão em 12 de Janeiro e durante a clandestinidade em Lisboa mantém os

contactos com os regicidas, refugiado numa casa de Meira e Sousa, na Rua Nova do Almada, em

frente da Boa Hora.

1910 - Estuda na Faculdade de Letras da Sorbonne. Vem a Portugal após o 5 de Outubro e regressa

a Paris, onde conhecera Grete Tiedemann.

1912 - Reside alguns meses na Alemanha.

1913 - Casa com Grete Tiedemann e regressa a Paris. Publica o livro Jardim das Tormentas.

1914 - Nasce o primeiro filho, Aníbal Aquilino Fritz Tiedemann Ribeiro. Declarada a Primeira

Guerra Mundial, Aquilino regressa a Portugal, sem ter terminado a licenciatura.

1915 - É colocado como professor no Liceu Camões, onde ficará durante três anos.

1918 - Publica A Via Sinuosa.

1919 - Entra para a Biblioteca Nacional de Portugal, a convite de Raul Proença. Convive com o

chamado grupo da Biblioteca onde pontificam Jaime Cortesão e Raul Proença. Publica Terras do

Demo, e a primeira versão do seu conto "Valeroso Milagre" na Revista Atlântida (nº 32), cuja

trama se passa no Mosteiro de Nossa Senhora da Assunção de Tabosa, situado na sua freguesia

natal, aquando das invasões francesas. É na Biblioteca Nacional que Aquilino Ribeiro é procurado

por pessoas de suas relações para lhe mostrarem uma Ata do Regicídio.

1921 - Integra a direção da revista Seara Nova.

1922 - Publica O Malhadinhas integrado no livro Estrada de Santiago, o qual inclui também uma

nova versão do "Valeroso Milagre".

1927 - Entra na revolta de 7 de Fevereiro, em Lisboa. Exila-se em Paris. No fim do ano regressa a

Portugal, clandestinamente. Morre a primeira mulher.

1928 - Entra na revolta de Pinhel. Encarcerado no presídio de Fontelo (Viseu), evade-se e volta a

Paris.

1929 - Casa em Paris com Jerónima Dantas Machado, filha de Bernardino Machado.

Em Lisboa é julgado à revelia em Tribunal Militar, e condenado.

1930 - Nasce-lhe o segundo filho, Aquilino Ribeiro Machado que viria a ser o 60.º Presidente da

Câmara Municipal de Lisboa - (1977-1979).

1931 - Vai viver para a Galiza.

1932 - Volta a Portugal clandestinamente.

1933 - Recebe o Prémio Ricardo Malheiros da Academia das Ciências de Lisboa, pelo seu livro As

Três Mulheres de Sansão.

1935 - É eleito sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa.

1946 - Publica Aldeia, Terra, Gente e Bichos.

1951 - Publica Geografia Sentimental.

1952 - Faz uma viagem ao Brasil onde é homenageado por escritores e artistas, na Academia

Brasileira de Letras.

1956 - É fundador e presidente da Sociedade Portuguesa de Escritores.

1957 - Publica A Casa Grande de Romarigães.

1958 - Publica Quando os Lobos Uivam. É nomeado sócio efetivo da Academia das Ciências de

Lisboa. É militante da candidatura de Humberto Delgado à presidência da República.

1960 - É proposto para o Prémio Nobel da Literatura por Francisco Vieira de Almeida, proposta

subscrita por José Cardoso Pires, David Mourão-Ferreira, Urbano Tavares Rodrigues, José Gomes

Ferreira, Maria Judite de Carvalho, Mário Soares, Vitorino Nemésio, Abel Manta, Alves Redol,

Luísa Dacosta, Vergílio Ferreira, entre muitos outros.

1961 - Vai a Londres e Paris.

1962 - Nasce-lhe a primeira neta, Mariana, a quem dedica O Livro da Marianinha.

1963 - É homenageado em várias cidades do país por ocasião dos cinquenta anos de vida literária.

Morre no dia 27 de Maio. Nessa mesma hora, a Censura comunicava aos jornais não ser mais

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permitido falar das homenagens que lhe estavam a ser prestadas. É sepultado no Cemitério dos

Prazeres.

1974 - É publicado o livro de memórias Um Escritor Confessa-se. Como escreve José Gomes

Ferreira no prefácio Aquilino sabe mentir a verdade.

1980 - Vila de Oeiras. um livro sobre a vila de Oeiras

1982 - A 14 de Abril é agraciado a título póstumo com o grau de Comendador da Ordem da

Liberdade

2007 - Por decisão unânime, a Assembleia da República decide homenagear a sua memória e

conceder aos seus restos mortais as honras de Panteão Nacional. A cerimónia de trasladação para o

Panteão Nacional ocorreu a 19 de setembro desse mesmo ano.

A obra

A linguagem de Aquilino Ribeiro caracteriza-se fundamentalmente por uma excecional riqueza

lexicológica e pelo uso de construções frásicas de raiz popular, cheias de provincianismos.

Aquilino foi sobretudo um estilista e, por isso, a sua linguagem vernácula é arejada, frequentemente

condimentada nos diálogos com expressões entre grotescas e satíricas.

Apesar de ter optado por uma literatura de tradição, Aquilino procurou ao longo da sua vida uma

renovação contínua de temas e processos, tornando-se assim muito difícil sistematizar a temática da sua

vastíssima obra.

Num número considerável de obras, Aquilino reflete, ainda que distorcidas pela imaginação, cenas

da sua vida: o convívio com as gentes do campo, a educação ministrada pelos sacerdotes, as

conspirações políticas, as fugas rocambolescas, os exílios.

Até 1932, ano em que fixa residência na Cruz Quebrada, todos os ambientes, contextos e personagens

que Aquilino cria remetem para a sua querida Beira natal. O Malhadinhas, Andam Faunos pelos

Bosques e Terras do Demo constituem o melhor exemplo desta situação. De facto, ver-nos-emos, com

uma extrema facilidade, envolvidos com as suas personagens beirãs, os seus costumes, tradições e

modos de falar típico. Aquilino Ribeiro como escritor não pode ser enquadrado em nenhuma das escolas

e tendências da sua época.

*** ***

TERRAS DO DEMO: esquecidas por Deus, eternizadas por Aquilino

Incontornáveis na geografia sentimental e literária de Aquilino Ribeiro, as Terras do Demo

que o escritor batizou são agora o melhor chamariz turístico dos concelhos de Vila Nova de

Paiva, Moimenta da Beira, Sernancelhe e Aguiar da Beira. Entre penedos e serranias, ermidas e

solares há uma “terra de que ninguém faz ideia”, mas que vale “uma volta pelo Chiado”.

Chegar às Terras do Demo já não é tão difícil como nos tempos de Aquilino Ribeiro, quando a viagem

por “lanços perigosos e ziguezagues mortais” mais parecia “o caminho marítimo para a Índia”. Na

altura, “largava-se de Viseu pela tardinha” e ia-se “para o cabo do mundo”, mas agora meia hora basta

para chegarmos da capital de distrito a Vila Nova de Paiva, uma das portas deste território “por onde

“nem Cristo” nem “el-Rei” passaram.

É nesta vila, outrora chamada de Barrelas, que decorre a ação d`O Malhadinhas, almocreve fala-

barato que, meio a sério, meio a brincar, gabava-se das sete maravilhas da povoação, como uma cruz

mudéjar que ainda hoje pode ser vista na Igreja Matriz de Vila Nova de Paiva. (…)

A meio caminho entre Vila Nova de Paiva e Moimenta da Beira, em Soutosa, fica outro ponto

incontornável da geografia sentimental do escritor, a Fundação Aquilino Ribeiro – casa-museu e

biblioteca. Foi nesta aldeia que o autor passou parte da infância e encontrou inspiração para muitas das

suas obras, passando a trazê-la “nos poros, no sangue e no cérebro”. A verdadeira natureza das gentes

e dos animais nunca esteve tão perto: “A visita matinal que faço a estas queridas e prosaicas coisas, com

as rolas a ensaiar, após a traviata sobre o pinhal, suas sarabandas de amor, trocando o bom dia com os

jornaleiros, vale uma volta pelo Chiado ao cair da tarde”.

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O berço, a fé e a história A serra da Lapa deixou muitas marcas nos livros de Aquilino Ribeiro. Desde logo porque foi numa

das suas aldeias – Carregal, no concelho de Sernancelhe – que o escritor nasceu. Da casa natal recordou

o “grande e desmazelado pátio fidalgo” (agora mais limpo e ordenado) e os ciprestes vizinhos “batidos

pelo vento que não gemiam como as demais gentes”. “Eu olhava para eles, assim mudos, fixos e

sobranceiros, e recebia deles uma lição de altitude e firmeza”, escreveu em Cinco Réis de Gente. Se

passar por lá não deixe de visitar a igreja matriz quinhentista da povoação e, já agora, o mosteiro

cisterciense do povo vizinho de Tabosa.

Os estudos primários foram feitos no colégio da Lapa com “pulmões lavados pelos mil metros de

altitude, carne de cabra de manhã, ao meio-dia e à noite e palmatoadas pela medida grande, louvado

seja Deus, a qualquer hora”. Já nessa altura o santuário da Lapa era palco de peregrinações de meio

Portugal, atraído pela história da santa que apareceu a uma menina pastora e cuja imagem passou a ter

abrigo entre os enormes rochedos de uma gruta. Dos muitos ex-votos mais antigos sobressai um

crocodilo embalsamado, supostamente trazido da Índia por um devoto que escapou à morte depois de

uma luta com o animal. (…)

A terra toda na Beira Alta

Para Aquilino, “A Beira Alta não tem símile no Mundo. Em poucas dezenas de quilómetros reproduz-

se a terra toda: amenidade e bravura, a colina e o vale, a civilização e a selvajaria”.

*** ***

Carregal

Quem sobe de Adebarros para o sul, por íngreme ladeira, fortemente acidentada de socalcos

e barrancos, semeada de restos de pinheirais que os incêndios de verão dizimaram, deixa-

se extasiar por uma paisagem carregada de marcas de vendavais frequentes e das nevadas

das invernias rigorosas. E vê a urze namorando os sargaços a espreguiçar-se lânguida ao

lado de negros blocos graníticos. Chegado ao plaino alto e sadio, depara com a povoação

de Carregal, a uns onze km a oeste do concelho. Hoje já não tem de atravessar as “veredas

tortuosas” ou “os caminhos torcicolares” de antanho.

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A chã em que repoisa, própria para cultura de cereais, vinha e fruteiras, contrasta, pela sua

quase imensidão e amenidade, com o quadro Montesinho que a rodeia. O rio Aviasca, aqui

muito pobre de águas por se encontrar ainda muito perto da nascente, perfila-se numa

travessia serena e mansa para se precipitar abruptamente rumo a Adebarros, de onde

prossegue sua marcha, por campos verdes e aprazíveis, para o Távora, onde entronca junto

à Faia.

Os arredores de Carregal, de grandeza rústica e de matriz selvático, eram de pinheirais

extensos, lombas de vegetação arbustiva, ravinas cavadas que forma sulcadas pelas

correntes de água, por vezes torrentosas, que descem das montanhas vizinhas. O horizonte

próximo é composto pelas dobras da Serra da Lapa e da Serra da Nave, enquanto para norte,

em pleno inferior se estende o ledo vale que, explorando as terras de serrania pobrinhas, as

apelida ironicamente de “Terras do Demo”, no dizer apropriado de Mestre Aquilino, que

aqui, nesta aldeia, viu o sol da vida. É neste vale de terrenos fecundos que assentam as

povoações ribeirinhas do Távora.

O casario era pequeno, mas tinha sabor português, tipicamente regional, agora acrescentado

das marcas da modernidade que advém sobretudo da labuta de muitos por outras terras do

todo nacional e estrangeiro.

Nada nos permite inferir da sua inquestionável antiguidade. Pelo contrário, tanto o nome

da freguesia com as habitações domésticas com ainda a data da edificação da Igreja

Paroquial (1545) dedicada ao Divino Espírito Santo, fazem pensar que se trata de uma das

povoações de nascimento mais recente do concelho, talvez logo a seguir a Lamosa e a Lapa.

Terá resultado a paróquia do desmembramento da de Santa Maria de Caria.

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Alguns dos lugares do termo da atual freguesia aparecem, já no século X, como fazendo

parte da honra de Egas Moniz e de Mem Moniz, cujos descendentes fizeram doações à

Ordem do Hospital (no século XIII).

Pertenceu sempre ao concelho de Caria, até que, depois da sua extinção em 1855, foi

incorporado no de Sernancelhe, com a mesma vila de Caria.

Por volta do ano de 1500, quando a sua população era ainda diminuta e o povoado muito

estreito, foi seu donatário Álvaro da Costa, que deu algum impulso ao seu crescimento.

No século XVIII, aparece como vigararia da apresentação do Ordinário Diocesano, no

termo de Vila da Rua ou Caria de Jusã.

Em meados do século XIX, o pároco de então anotou num dos livros do Registo Paroquial,

conforme a referência do Abade Moreira, o seguinte:

”No dia 18 de Julho de 1858 achei um título pertencente à família dos S.res Paulinos, que

mostra ter ido edificada a igreja paroquial, no ano de 1545, pelo donatário Álvaro da Costa

e mulher Maria Rebelo, fidalgos moradores que foram neste lugar. Era nesse tempo Bispo

de Lamego o Sr. D. Agostinho. E para constar fis esta lembrança. Carregal 18 de Julho de

1858. O Vigário collado José Teixeira Dias”

Não contente com e edificação da igreja, o donatário fundou na povoação uma

Misericórdia, que dotou de rendas bastantes para subsídios a muitos pobres. Tal

Misericórdia venceu mesmo as malhas que os liberais urdiram em torno das obras de

benemerência eclesiástica.

Esta freguesia tem uma população global de 510 habitantes, repartidos por 205 fogos, e

630 eleitores. Abrange duas povoações anexas: Forca, a nascente; e Tabosa (Tabosa, do

Carregal, só para distinguir de Tabosa, da Cunha), a poente.

Texto:

Abílio Louro de Carvalho

Da Varanda do Távora

Sernancelhe na Marcha da Corrente

Edição Câmara Municipal de Sernancelhe 2002

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LAPA

A Lapa é uma terra de fé, um sítio de mistério natural e de alcance transcendental. De qualquer ponto que o circunstante

lance o olhar, de perto ou de longe, encontra como ponto de contacto ou a torre da igreja ou um cruzeiro ou mesmo um dos

quatro consagrados miradouros. Está a povoação situada quase no cimo da serra com o mesmo nome, a 915 metros de

altitude. Localiza-se junto às nascentes do rio Vouga, na freguesia de Quintela, concelho de Sernancelhe, diocese de Lamego,

distrito de Viseu.

Joana, a muda pastorinha de Quintela, nunca sonhara que a imagem da Srª da Lapa, a nena que guardava ciosamente na

cestinha da merenda, fosse motivo para que à serra ou ao Santuário acolhessem milhares de romeiros, tantos que houvessem

de a assustar. A história da Lapa inicia-se nos finais do século XV, mais propriamente no ano de 1498. Percebido o sinal miraculoso, os

romeiros empreenderam a espontânea construção de uma capela. E a seguir uma proteção para os devotos que faziam a

romaria à volta da gruta inserida no enorme fraguedo. Isto da sua história passou-se assim: o célebre e hábil general mouro,

Al-Mançor, pelo ano de 982, atravessou o Douro para a margem esquerda. Havendo destruído Lamego, progrediu para Trancoso. No trânsito arrasou o Convento de Arcas, onde martirizou muitas das religiosas. Atravessada a serra de Pêra,

chegaram ao convento de Sisimiro, sito na atual Quinta das Lameiras, freguesia de Pinheiro, concelho de Aguiar da Beira.

Parte das religiosas sofreram o martírio, outras escaparam levando consigo uma imagem de Nossa Senhora, procurando abrigo nos matos por onde se embrenharam. Acharam a gruta ou lapa, onde guardaram a dita imagem que ali resistiu à agrura

dos séculos, durante uns 515 anos.

Em 1498, uma pastorinha chamada Joana, muda de nascença, da freguesia e lugar de Quintela, andando a guardar o gado de

seus pais, lembrou-se um dia de entrar ali na gruta e encontrou a santa imagem que meteu na cesta onde guardava as

maçarocas e a merenda. A imagem era de pequena dimensão, mas muito formosa. E a pastorinha guardou-a e enfeitava-a

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como podia e sabia, com as mais lindas flores que topava nos campos ou no monte. Ao voltar a casa, no fim do dia, cuidava

da roupa da imagem. As ovelhas, apesar de fartas e nédias, eram apresentadas quase sempre nos mesmos lugares, o que motivou acusações por parte de outrem à mãe de Joana. Tudo isto e as teimosias da filha a fizeram enervar e, sem mais,

tirou-lhe a imagem, que teve por uma vulgar nena ou boneca, e atirou-a ao lume.

A menina, transida de pavor, gritou; “Tá! Minha Mãe! É Nossa Senhora! Ai! Que fez?”. A fala começou a prender

irreversivelmente a mocinha pastora e a mãe ficou com o braço paralisado, transe de que se curou com a oração de ambas.

A imagem foi levada para a Lapa, sob a orientação do percurso por Joana e todos a acompanharam. Porém, tal não terá

sucedido sem que antes o cura de Quintela houvesse tentado a entronização da veneranda imagem no interior da Igreja

Paroquial, donde a mesma imagem desaparecia de modo insólito.

Para abrigo da imagem de Nossa Senhora e para resguardo temporário dos fieis, sobretudo na época de maior afluência destes, foi construído um Oratório e levantadas algumas barracas. O Oratório e barracas adjacentes estavam sob a jurisdição

do reitor da Vila da Rua.

Foi este o princípio da localidade de Lapa, onde por força destas circunstâncias começaram a edificar-se as principais

habitações e bem assim as subsequentes, o que transformou um lugar inóspito num aglomerado que logrou alcançar numa certa projeção e que hoje mantém a atmosfera de mística espiritualidade e de estranha grandeza.

Entretanto, como a Companhia de Jesus se instalasse em Portugal e gozasse de gerais simpatias, foi permitido aos Jesuítas,

a título transitório, que dirigissem o culto da Lapa, auxiliando os fieis e atendendo-os de confissão. Porém, no ano de 1575, o padroado da Abadia de Vila da Rua passa a jurisdição e posse da Coroa Portuguesa, com o curato de Quintela que lhe

estava adstrito e em cujo limite se encontrava a Ermida da Senhora da Lapa. Em 1576, sob autorização do Papa Gregório

XIII, D. Sebastião, deu a Igreja da Rua, com metade dos seus réditos, ao Colégio de Jesus, que os Jesuítas fundaram em 1542 e possuíam em Coimbra, ficando-lhes a pertencer também o Oratório da Lapa. Efetivamente, D. João III tinha-lhes entregue

o Colégio das Artes, com a promessa de um dote, para côngrua sustentação, promessa que não satisfez na totalidade, cabendo

o ónus do cumprimento ao seu sucessor.

Vindo estabelecer-se na Lapa, os Jesuítas dão corpo, com o auxílio de particulares, à edificação do Santuário e do Colégio, obras iniciadas no século XVI. Dentro da Igreja, ou melhor junto dela mandou levantar, em 1586, Pedro do Sovral, Senhor

do Morgado de Sernancelhe, a atual capela do Santíssimo Sacramento, para abrigo do túmulo de família. Antes de ter a

função hodierna e de albergar aquele altar de boa talha joaninha, serviu de sacristia.

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O Colégio, junto ao Santuário, começou nos finais do século XVII, mais exatamente em 1685 e ficou sempre obra não

acabada.

O complexo religioso e escolar afirma-se progressivamente como um prestigiado e prestigiante santuário de peregrinação nacional e um notável polo de aquisição e consolidação de cultura. O colégio locupleta-se de escolares. E a Senhora da Lapa

impõe-se como um centro de irradiação do culto à Virgem e como fermento de mais povoações, cidades, dioceses e santuários

um pouco por todo o mundo, sobretudo pelas inúmeras estâncias por que andarilharam os padres jesuítas.

Lapa, o Santuário

O Santuário, que abrigou na capela-mor, onde pontificava o altar do Menino Jesus da Lapa, o rochedo milagroso

com a imagem da Senhora que seduzia ativamente os homens e as mulheres de crença inabalável, começou a atrair

os peregrinos em vários momentos do ano, que se deslocavam em romaria para impetrar graças, obter a propiciação

pelas faltas humanas, agradecer os favores do Altíssimo, umas vezes em jeito pessoal e muitas vezes em convénio

coletivo. De facto, as pessoas e as famílias eram torturadas pelos malefícios da doença, do azar ou da má sorte; e

os povos, pelos efeitos das pestes e pragas que lhes devastavam as culturas, os animais ou os parentes, os

benfeitores, os vizinhos e os amigos.

Assim debaixo da rocha, que forma a gruta onde apareceu a imagem de Nossa Senhora, está o altar da Senhora da

Lapa, ladeando irregular e estreita passagem que vai dar ao presépio, de centenas de figurinhas, obra da escola de

Machado de Castro. É crença supersticiosa que quem tiver a alma atafulhada de pecados não consegue passar

naquele angusto canal granítico. O altar deixa ver um painel de prata e os mármores de Carrara. A servir de altar-

mor fica o altar do Menino Jesus, revestido de trajes napoleónicos, aferrolhado por forte gradeamento de ferro e

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ladeado por quadros de D. Josefa de Óbidos. Também, sob pequena estátua da Mater Dolorosa se divisa o mais

pequeno, mas significativo altar da Senhora da Boa Morte, rodeada por compungido apostolado.

A aludida capela do Santíssimo, jazigo da família do primeiro Conde da Lapa, tem um rico altar de talha joaninha

e forma um espaço convidativo para a reflexão.

É notável a cenografia de que se revestem os altares laterais do corpo da igreja, como se pode examinar:

Junto do arco-cruzeiro, do lado da Epístola, vê-se o altar de Stº António, em que a Virgem, sob uma nuvem

circundada de anjos, lhe entrega o Menino, com a indicação de um anjo a relembrar a frase joânica do Evangelho:

“Eis a Tua Mãe”! Do lado do Evangelho, temos o altar da Crucifixão ou do Calvário, em que o Senhor, expirado

há momentos, é trespassado no lado esquerdo pela lança do soldado romano Longuinhos, na presença de outros

que se entretêm repartindo entre si as vestes do Crucificado e jogando os dados da sorte sobre a sua túnica

inconsútil, a ver a quem viria a pertencer. O altar de S. José representa a passagem deste homem, que após o

cumprimento da sua discreta, mas insubstituível missão, recebe a coroa da justiça, cuja descida é determinada pelo

anjo do tempo. Entretanto, o Pai Celeste prepara-se para acolher no Reino Eterno este homem justo que passou

pelo mundo como brisa inefável. Resta o Altar da Senhora da Soledade, em que a Virgem, aos pés da cruz,

contempla os instrumentos da Paixão; e o corpo do Senhor está sepultado perante a Senhora lacrimosa ao pé de

João Evangelista, José de Arimateia, Nicodemos e as santas mulheres.

Por detrás da capela-mor e no compartimento que rodeia a lapa, era a Casa do Peso, assim chamada por nela

estarem as balanças aonde as pessoas se dirigiam para as próprias pesagens, com vista à futura entrega do mesmo

peso em trigo em cumprimento da promessa deste teor à Senhora. Pode ver-se lá suspenso o grande caimão, um

gigantesco ex-voto que testemunha o lendário milagre da mulher, das redondezas ou das bandas do Oriente, que,

aflita, se chamou à Senhora, que lhe terá inspirado o arremesso dos novelos para que, havendo-os engolido, ficasse

engasgado e a mulher fosse liberta do perigo.

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Tesouros sem conto, peso e medida aqui espelham a generosidade ou o brio de crentes anónimos ou grados, gente

simples ou homens cultos, populares ou nobres, clérigos ou altas personalidades das casas reais. De notar são essas

generosidades que foram criando e avolumando o rico espólio de paramentos de pratas que exorna de modo

excelente o tesouro da Fábrica do Santuário.

Na sacristia pode apreciar-se belo paramenteiro e seis ex-votos em pedrelas de notável interesse e acentuado valor.

Muitos outros quadrinhos há aqui como no concelho, a atestar a devoção e as graças que impenderam sobre as

necessidades e orações dos crentes, nos finais do século XVIII, um pouco por todo o século XIX e ainda pelo

século passado.

A igreja, vista do exterior ostenta uma frontaria com o triângulo pretensamente apoiado em duas colunas embutidas

no muro frontal; e, à cabeceira, por detrás do passadiço que dá para o colégio, o campanário com os dois sinos que

encarrega de dar as horas e de chamar os devotos para os ofícios culturais.

No fraguedo que medeia entre a cabeceira da Igreja e o caminho que dá para a zona das lavadeiras, junto a lenteiras

e hortas, onde borbulha uma das fontes nascentes do Vouga, estão três cruzeiros graníticos, qual remate de via

sacra de rua a constituir um calvário rural, aí do século XVIII. A onda destruidora que às vezes passa por estes

lugares fizera desaparecer os braços das cruzes. A Câmara Municipal, quando procedeu às obras de saneamento

básico e de beneficiação dos arruamentos da Lapa e envolvente do Santuário repôs a integridade das cruzes.

Lapa, o Colégio

Durante o ano de 1654, o Senado da Câmara de Caria, a pedido dos Jesuítas, doou, a estes, um lote de terreno

baldio situado junto à Igreja e cujo destino era a implantação da casa dos padres.

Os escassos recursos de então não permitiram a conclusão imediata da obra, sendo esta concluída cerca de trinta

anos depois.

Logo após a aprovação da obra do colégio ter chegado de Roma, a primeira pedra é benzida e lançada a 28 de

junho de 1685. As obras, sob a orientação do Padre António Cordeiro, prolongam-se por algumas dezenas de anos.

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As razões que fundamentaram a construção do Colégio foram:

- a necessidade de um edifício onde pudessem habitar mais padres que correspondessem ao cada vez maior número

de romeiros,

- a necessidade de melhores instalações bem como a faculdade de encontrar espaços para dar aulas solicitadas

(note-se que nesse tempo eram os alunos que procuravam os professores).

Em 1714, quando o edifício se encontrava acabado, têm início as aulas de Latim e, posteriormente, as aulas de

Teologia.

É de salientar que o Colégio é um edifício de forma quadrangular que se desenvolve em dois pisos a norte e três a

sul. Com pátio interior, a sua forma arquitetónica é, no entanto, singela e com boas cantarias.

Em 1759 o Marquês de Pombal expulsa os jesuítas do país. O colégio e o santuário passaram a constituir

propriedade do governo, até que, em 1793, D. Maria I doou tudo ao bispo de Lamego. Em 1892 assistiu-se à sua

reabertura, tendo tido como aluno, entre 1897 e 1899, o famoso escritor Aquilino Ribeiro. Com a mudança de

regime, assistiu-se ao encerramento definitivo do colégio em 1910.

A degradação e inutilidade do colégio foram uma realidade até 1994, data em que foi decidido proceder-se à sua

restauração, visando a recolha e assistência aos peregrinos, pois não se previa a utilização para a qual teria sido

destinado.

Texto: Abílio Louro de Carvalho

Da Varanda do Távora

Sernancelhe na marcha da Torrente

Edição Câmara Municipal de Sernancelhe 2002