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“AMOR À VISTA ALEGRE”
DIEGO DIAS
Personagens
Edy – Vendedor e dono da barraquinha de churrasquinhos.
Di – Um professor de filosofia com mais questões amorosas que ontológicas.
Marreco – O ajudante meio atrapalhado de Edy.
Uma cliente mulher.
Um cliente homem.
“Quem me vê sorrindo pensa que estou alegre
O meu sorriso é por consolação
Porque sei conter para ninguém ver
O pranto do meu coração.”
(“Quem em vê sorrindo” - Cartola)
- Ato único -
É uma noite tranquila em Vista Alegre, subúrbio carioca. Edy e Marreco trabalham vendendo
churrasquinhos na calçada, próximos ao meio fio. Há mesas de madeira escura do lado oposto da
barraquinha, onde estão sentados os poucos clientes que apareceram esta noite. Di caminha
tranquilamente pela calçada em direção à barraquinha de Edy, olhando-o fixamente. Edy e Marreco
arrumam distraidamente a barraquinha por dentro.
DI: (Ao estabelecer um primeiro contato visual com Edy) E aí, fala tu! Tudo de boa?!
EDY: (Estendendo mão para apertar a de Di) Fala meu parceiro! Tudo na paz. Que
milagre é esse o senhor por aqui em plena terça-feira?
DI: Pô, tá calor à beça dentro de casa e o ar não tá dando vazão, como... Achei
melhor sair pra rua pra tomar umazinha de leve.
EDY: Cê num tá errado não. Senta aqui nessa mesa mais perto que dá pra gente ir
trocando uma ideia. (Se dirigindo a Marreco) Marreco! Pega um latão de Brahma lá
na mala. (Breve pausa e emenda) Ah, e vê se dessa vez cê não esquece a porra do
isopor aberto que o gelo tá caro pra caralho hem.
Edy caminha e se senta na cadeira à esquerda de Di.
DI: (Puxando assunto) Pô, meu cumpadi, e cadê o som?
EDY: Nem te conto filho, queimou. Ano Novo e Natal, como, tocando direto, último
volume, eu chapando ... 24 horas seguidas... Mas tá na garantia, eu vou ligar pra lá...
O pessoal já tá acostumado né, sem o som o movimento caiu bastante, tô até
pensando em comprar um outro antes do carnaval, só pra cá...
DI: Então, o papo tem que ser esse daí. Porque cê tá em casa, bate aquela fome...
Mas aí cê fica na preguiça né. Pô, vai que eu vou lá e o cara num tá lá. Com o som a
gente já fica sabendo de longe que cê ta aí.
EDY: Pô, pode crer. É bem por aí mesmo.
DI: Mas além do som, o que falta pro negócio ficar bom?
EDY: Pro negócio ficar bom?!
DI: É, porra.
EDY: (Em tom galhofeiro) Pro negócio ficar bom, bom mesmo, falta eu ganhar na
Mega-Sena. Porra, esse ano eu acertei os seis números da Mega da Virada, só que
em seis jogos diferentes. Em cada um, um número. Fiquei puto pra caralho, era
melhor não ter acertado nada. (Breve pausa) Mano... Se eu ganho na Mega-Sena eu
abandono a barraca na hora e vou pro Norte, tá ligado? Compro uma casa na beira
da praia, lá por Sergipe mermo... aquela água verdinha... mansinha... tá ligado?
Cadeira de sol no rasinho, de sunga o dia inteiro só (faz o gesto de beber com as
mãos) mandando pra dentro, faça chuva faça sol. Assino um contrato com a Ambev
de um caminhão por mês, filho. Vitalício. Compro um daqueles freezer vermelho e
instalo perto da piscina, porque a casa tem que ter piscina né? Só sombra e água
fresca, como... E água de coco de preferência né, que eu também sou filho de Deus.
(Se dirigindo a Marreco) Marreco! Traz mais um latão aqui, filho. Mas dessa vez
pega um mais lá do fundo que esse que cê trouxe agora tava meio quente. (Se
levanta pra atender uma freguesa no balcão da barraquinha e fala alto lá de dentro)
Mas e tu? O que que houve que cê tá com essa cara de bunda rachada?
DI: Não filho, eu tô bem, tô bem. Só tô meio cansado lá do trabalho...
EDY: Você ainda tá lá naquela escola?
Di: Tô sim.
Edy: É aula de que mesmo que cê dá? (Se dirigindo a cliente) A senhora quer que
passe molho e farofa?
CLIENTE MULHER: Farofa não, só o molho tá bom. Dá quanto?
EDY: Com o Guaravita fica seis reais pra senhora.
A cliente paga e se dirige pra uma mesa mais afastada. Edy põe o dinheiro no bolso e caminha de volta
para se sentar onde estava antes.
EDY: Assume ae Marreco, que eu vou dar uma moral pro meu parceiro aqui.
(Olhando pra Di) Pode falar agora.
DI: Então, são aulas de Filosofia pro Ensino Médio.
EDY: E tu tá gostando de dar aula?
DI: Pô, te falar que agora tô. A gente vai acompanhando o crescimento da gurizada.
Vai vendo eles se tornarem adultos, muitos já estão entrando até pra faculdade. O
reconhecimento e o respeito de boa parte deles é o que faz tudo valer a pena. Esses
dias mesmo, eu fui no Norte Shopping comprar uma fonte nova pra minha TV e
esbarrei com um lá. Sabe aqueles da turma do fundão? Então, o maluco tava com a
esposa e a filhinha de meses no colo. Me contou que foi aprovado agora fim de ano
no concurso da Petrobras, que é formado em Serviço Social pela UFF. Ficamos até
de marcar com calma um chope um dia desses.
EDY: Porra, pode crer. Os meus ainda são pequenos, cê sabe. Quatro logo, pesado.
Mas eu insisto muito com eles pra estudarem. A mais velha gosta bastante de
Biologia, fica vendo aqueles programas na Sky o dia inteiro se deixar.
DI: O foda é que se diz que o ensino é para o povo, mas a própria forma de
transmissão dele não é. Em sala de aula, por exemplo, eu tenho que falar dentro de
toda uma concepção acadêmica. A própria linguagem oficial se torna uma barreira
quase intransponível. Uma vez um aluno levantou a mão e perguntou: “Professor,
dá pra apertar a tecla SAP?”. Estou cada vez mais convencido que o “academiquês”
é mais uma estratégia de demarcação de classes, como uma forma de garantir
espaços para os poucos iniciados, os diplomados. (Uma breve pausa e acende um
cigarro) Mas foda-se, quero falar disso não.
EDY: Então me fala porque tá com essa cara de jacaré resgatado pela Defesa Civil.
Tu pensa que me engana, né. Cansaço, sei... Cansaço uma porra! Eu te conheço tem
quanto tempo?
DI: Pô meu primo, põe aí uns oito anos. Por baixo.
EDY: Então, vai ficar escondendo o jogo jogador? Confia em mim não?
DI: Jamais... Pô leke, te falar, é mulher... Tava até ouvindo Cartola em casa antes de
vir pra cá.
EDY: Pô, Cartola tu tá bem ainda. O foda vai ser quando chegar no Djavan, aí que tu
vai tá fudido mermo. Vai achar que é samurai e os caraio.
DI: Pô mano, é que ela é muito linda, inteligente e...
EDY: (Perde a atenção na conversa e passa a encarar com ar de sedução uma moça
da plateia) Falando em coisa linda, tu tá vendo aquela ali? Que isso fera...
DI: Qual?!
EDY: (Apontando) Ali, porra. Mas olha discretamente.
DI: Ah sim, muito bonita, mas a questão é que...
EDY: Mermão, eu caso com ela amanhã. Levo pra Porto de Galinhas de lua de mel e
tudo. Você viu que belo par de (faz com a mão o volume de seios).
DI: De olhos! Belo par de olhos!
EDY: (Dá uma piscada) É... E que olhos meu camarada! Mas voltando, qual a fita
com essa mulher que tá te deixando tão preocupado assim?
DI: (Em tom evasivo) O pior é que eu não sei bem...
EDY: Como que ela é?
DI: Morena...
EDY: De cabelo ou tom de pele?
DI: De espírito!
EDY: (Com ar incrédulo) Ahn? Que porra é essa de maconha estragada foi essa que
tu fumou?
DI: (Com um leve sorriso) Pô mano, tu sabe que minha parada é só cigarro e cerveja.
Nada mais.
EDY: (Se dirigindo a Marreco) Ae Marreco! Escuta essa aqui. Tu sabia que agora
alma tem cor? (Dá uma risada) Tem cabelo e tudo! Tô achando que tu tem alma
ruiva hem, todo enrolado! (Dá outra risada) Porra mano, só tu mesmo, tu me
aparece com cada uma (balança a cabeça em tom de piada). Ai, ai. Mas fala aí. Ela é
de onde?
DI: Vixii fio, de longe. E põe longe nisso.
EDY: Longe assim onde? Jacarepaguá?
DI: (Com um leve sorriso) É pra outro lado, mas é mais longe que isso.
EDY: Porra, então é um relacionamento à distância?
DI: Não mano, não chega a tanto não.
EDY: Então qual o problema? Tu tem Bilhete Único?
DI: Tenho, porra.
EDY: Então fio, qual o problema? Vai de van, vai de trem , vai de camelo, mas vai.
Quando se quer, pra tudo se dá um jeito. (Se levantando pra atender um cliente)
Num tô te entendendo, meu parceiro.
DI: Essa parte aí da distância é tranquila.
EDY: (Para o cliente) Boa noite, o senhor vai querer o que?
CLIENTE HOMEM: O que que você tem hoje aí?
EDY: Nós temos coração de galinha, espetinho de carne, espetinho de frango, carne
com linguiça, linguiça com frango e misto completo. Vai de que?
CLIENTE HOMEM: Esse último aí que você falou.
EDY: Misto completo?
CLIENTE HOMEM: É.
EDY: Passa molho e farofa?
CLIENTE HOMEM: Pode passar.
EDY: E pra beber?
CLIENTE HOMEM: Tem refrigerante?
EDY: Nós temos Coca, Fanta Uva, Fanta Laranja, Kuat, Sprite, Guaravita e Guara
Crac.
CLIENTE HOMEM: Tem Guaraviton?
EDY: (Com cara de quem já tá ficando puto) Tem não. Só esses que eu falei mesmo.
CLIENTE HOMEM: Então tá bom. Me dá um Guara Crac mesmo.
EDY: (Girando os espetinhos na grelha) Marreco! Pega um Guara Crac, um latão pro
meu primo e um pacote de guardanapo fechado no carro. (Estendendo o espetinho
para o cliente) Tudo dá oito milhões.
Edy recebe o dinheiro, guarda no caixa e volta para se sentar.
EDY: Voltando, qual o seu problema então fio. Ela é feia, é chata, tem mal hálito,
peida dormindo?...
DI: Mano ela é linda. É difícil até expressar o efeito que ela produz aqui. É a coisa
mais bela que já conheci. Até Afrodite morreria de inveja do sorriso dela. Sabe uma
mulher que ao acordar já marca toda uma presença? Então... Fora o cheiro, o tom
de voz suave... O gosto do beijo... Às vezes eu acordo no meio da noite só pra ficar
olhando, observando o sono dela mesmo, ali na minha cama deitada de bruços.
Podemos ficar horas conversando que, mesmo sem forçar, o assunto não esgota.
Coisa rara isso. Ao menos pra mim, ela é tudo e muito mais do que todas as
palavras que eu jamais conheci um dia serão capazes de retratar.
EDY: (Em tom galhofeiro) Tu tá piegas pra caralho, hem neguinho. Vai passar
batido do Djavan e já vai estacionar direto no Raça Negra logo de cara.
DI: Pô mano, zoa não que é sério. Tá vendo porque que eu não queria falar nada?
EDY: (Em um tom infantilizado) Ô dó, ele tá sensível. (Breve pausa) Mas agora
falando sério: se ela é tudo isso pra você por que essa preocupação toda? Se tu não
for nela meu irmão, me apresenta então que eu não vou dar esse mole que você tá
dando não.
DI: Vai à merda! Se foder rapá!
EDY: (Rindo) Tá parei, manda o papo reto então.
DI: A minha questão é que ela é atriz.
EDY: De televisão?
DI: Não, pior. De teatro.
EDY: DE TEATRO?! (Em tom desolado) É... Te entendo. Agora fodeu tudo... (Olhando
pensativo num ponto fixo no chão). Marreco! Traz aquela cachacinha mineira que
agora o bagulho ficou louco aqui.
Marreco se aproxima, serve duas doses e se retira. Os outros dois permanecem em silêncio. De repente,
viram as doses em um gole só.
DI: (Com a voz ainda embargada da cachaça) Sabe, às vezes eu fico pensando, será
que eu vou ter culhões para aguentar ela fazendo uma cena sei lá, com um beijo, ou
uma que ela tivesse que se mostrar apaixonada por outra pessoa, nu artístico ou
sei lá mais o que que esses diretores pós-modernos ainda podem inventar. Diretor
não tem família, só pode.
EDY: (Largadão na cadeira) Fato!
DI: Ou então, pensa comigo, atriz de teatro trabalha de sexta a domingo. Fora que
os outros dias da semana tá ensaiando. Ainda tem as turnê. E eu fico como nessa
história? Monologando?
EDY: (Em tom professoral) Vamo pensar com calma. Ao que me parece você tem
duas opções. Você pode ir contra, por ela na parede sei lá, exigir que ela escolha
entre você e o teatro...
DI: Eu nunca faria isso, o teatro é a vida dela, o sonho dela, além do mais que...
EDY: (Verdadeiramente irritado) Porra! Você vai deixar eu terminar de falar?
DI: Foi mal.
EDY: Retomando... A outra opção que você tem é ser o melhor amigo dela nisso, ser
o maior incentivador, ser o fã número um dela, meu primo. Tenho certeza que se
você escolher essa opção, isso só vai aproximar cada vez mais vocês. Porque pensa
comigo, não existe nada mais pé no saco que uma pessoa que não está na mesma
vibe que você. Que em vez de te por pra cima, tá ligado? te critica e te diminui.
Porra parceiro, essas paradas de dom nasce com a pessoa. Nem fodendo tem como
arrancar. Falando de mim, eu fico aqui nessa barraca sem hora pra ir embora. Tem
vez que eu saio duas, três da manhã... Chego em casa só janto e durmo pra no dia
seguinte acordar às sete e ir ao Ceasa comprar o que tá faltando. Volto pra casa e
passo a tarde toda temperando, cortando as carnes e o caralho a quatro. Agora
imagina se a minha mulher não entendesse essa minha correria? Que batesse pé?
Seria um inferno, num concorda?
DI: Sem dúvidas.
EDY: Mas sabe o que ela faz? Ao contrário filho, ela se tornou a melhor parceira que
eu poderia ter. Quando eu penso em desistir desse meu sonho de ter o meu próprio
negócio, reclamando que minha coluna tá toda lenhada do peso que eu carrego, ou
que tô muito cansado pra passar a madrugada na rua... Porra, ela me dá mó ânimo,
me faz recordar porque eu pedi demissão daquela porra de escritório de
engenharia, tá ligado? Me faz lembrar o brilho nos olhos que esta barraca me traz.
Do quanto está seguindo meu sonho me faz ser uma pessoa melhor e como isso
irradia pra todo mundo lá em casa.
DI: Mas meu medo é justamente de que ela sempre escolha o teatro em detrimento
a estar comigo, saca isso?
EDY: Saco sim meu parceiro, mas vamos lá. Seu medo é de que, que ela ame mais o
teatro que a você. Acertei?
DI: Na veia.
EDY: Como mainha me ensinou, essa galera intelectual quanto mais estuda, mais
burra fica. Pensa comigo filhão. Ela está com você, num tá?
DI: Está.
EDY: Então pronto! Tu quer mais o que? Tem que entender que se ela está contigo
foi porque ela quis assim. Se sentiu confortável contigo. Por causa de que essas
paranoia agora? Enquanto for recíproco cês sempre vão encontrar momentos pra
ficar juntos. Vai assistir ela! Vai ajudar a ensaiar, sei lá... Se mexe filho, se envolve
que do céu só cai chuva, e mesmo assim se o seu telhado não tiver em dia vai ter
goteira na sua cama. Morou? Não existe essa de um amor maior por um ou por
outro. São sentimentos diferentes. Tu mesmo, cê largaria o ensino por conta de
alguém?
DI: Jamais.
EDY: Então porra, é a mesma coisa! Não é questão de importância, tanto pra ela
quanto pra você. Um amor não deve anular o outro. Pelo contrário, se você ama ela
e ela te ama também, então você tem que amar o teatro, porque o teatro faz parte
dela. E você ficando aí com essa cara de jabuti defumado, só vai passar a
impressão de que não gosta dela. É óbvio que você não precisa fazer do mundo
dela o seu mundo, né. Você tem suas próprias paixões também. E te falar, dois
andam mais decididos e chegam mais longe. Você só precisa apoiar, estar dentro
mesmo que tando de fora? Capiche?
DI: Porra primo, você sempre tem as palavras certas nos momentos mais
oportunos.
EDY: (Levemente emocionado) Tomar no cu rapá, precisa babar meu ovo não. Falei
pra caramba, tô com a garganta seca, tipo como... Marreco! Traz dois latão de uma
vez, que hoje nós vai beber. Só vamo sair daqui quando o fígado disser chega!
DI: (Em tom zombeteiro) Ou não ter mais freguês né?
EDY: (Dá uma risada e se vira pra Marreco que está fechando bem o isopor) Depois
Marreco, pega as peça no carro que eu falei tanto que me animei. Vamo mandar um
improviso hem! (Voltando-se para Di) Tu segura no pandeiro?
DI: Pô primo, tô enferrujadão!
EDY: A cerveja é combustível e óleo pras juntas, vamo nessa fio, para de graça.
Edy começa a batucar o surdo, enquanto Marreco vai afinando o cavaquinho. Meio acanhado Di
segura o pandeiro. Os fregueses das mesas começam a se aproximar ao ouvir os primeiros acordes.
Alguns transeuntes que estão indo pros bares da região começam a parar para observar o furdunço
que se inicia. Forma-se uma pequena e animada aglomeração. Ao sinal de Marreco, inicia-se a
cantoria. Edy começa e é seguido em coro pelos que rodeiam a mesa. Todos cantam “Não sou mais
disso”, de Zeca Pagodinho:
Eu não sei se ela fez feitiço
Macumba ou coisa assim
Eu só sei
Que eu tô bem com ela
E a vida melhor pra mim...
Eu deixei de ser pé-de-cana
Eu deixei de ser vagabundo
Aumentei minha fé em Cristo
Sou bem-quisto
Por todo mundo... (2x)
Na hora de trabalhar
Levanto sem reclamar
Antes do galo cantar
Já vou!
À noite volto pro lar
Pra tomar banho e jantar
Só tomo uma no bar
Bastou!...
Provei pra você
Que eu não sou mais disso
Não perco mais
O meu compromisso
Não perco mais
Uma noite à toa
Não traio e nem troco
A minha patroa (2x)
No início da segunda passagem da canção, Di coloca levemente o pandeiro sobre a mesa, bate com a
mão direita fechada duas vezes sobre o seu coração olhando nos olhos de Edy, em sinal de
agradecimento e de despedida. A pequena aglomeração vai se dispersando acompanhando o final da
música. Marreco começa a guardar as mesas e as cadeiras e a recolher todos os itens da barraquinha.
A luz foca em Edy, que sentado com o surdo à sua frente, balança a cabeça com um sorriso maroto nos
lábios e encara a plateia.
EDY: É incrível como a gente tem que ensinar tudo a esses jovens. Sabem de nada!
Puta que os pariu. Leem muitos livros, veem muitos filmes, tem informações
condensadas a um clique das mãos... E mesmo assim se deparam com os mesmos
dilemas de desde que o mundo é mundo, ou “desde que o samba é samba”.
Coração é terra de Marlboro, fio. Não adianta teoria não. É tipo um boxeador que
toma uma porrada certeira pra curar a ferida e não abandonar o ringue. Mas ó
rapaziada, vamo amar! Bora se entregar! Bora viver que essa vida é boa demais!
Certeza mesmo só da velha da foice, de que pra morrer basta tá vivo. Mano, meu
tempo é hoje! E é no agora que lanço minhas sementes. Pescador que não lança
linha ao mar, não colhe tainha não! Não arriscar por medo de perder já é ser
vencido por antecedência, né. E vamos combinar que não existe derrota mais
vexatória do que perder de W.O., meu primo. É pior que tomar goleada em casa. É
passar atestado de covarde. Eu sei que eu falo um monte de merda, mas pensa
nisso e depois me conta o resultado. E quando for à Vista Alegre, esquece não,
come churrasquinho na banca do Edy que eu também tenho família!
Fim