61
1 MATERIAL DE APOIO DIREITO CIVIL TEORIA GERAL DOS CONTRATOS Apostila 01 Prof. Pablo Stolze Gagliano 1. Visão Geral dos Contratos no novo CC O Código Civil de 2002 disciplinou os contratos da seguinte forma: a) Título V – Dos contratos em Geral, subdividido em dois Capítulos (Capítulo I - “Das Disposições Gerais” - e Capítulo 2 - “Da Extinção do Contrato”). Tais capítulos são ainda estruturados em Seções, que versam sobre aspectos gerais da matéria contratual; b) Título VI – Das Várias Espécies de Contratos, subdividido em 20 capítulos, compartimentados em várias outras Seções, cuidando dos Contratos em Espécie 1 . Nota-se, no estudo dessa disciplina, que o codificador inovou, ao tratar de temas não regulados pelo Código anterior, a exemplo do contrato preliminar, do contrato com pessoa a declarar, da resolução por onerosidade excessiva (aplicação da teoria da imprevisão), da venda com reserva de domínio, da venda sobre documentos e do contrato estimatório. Além disso, disciplinou contratos novos, como a comissão, a agência/distribuição, a corretagem e o contrato de transporte, deixando de fazer referência a alguns outros institutos, como, por exemplo, a cláusula comissória na compra e venda (art. 1163 do CC-16). 1 “Contratos em Espécie” integram outra grade do Curso LFG.

Apostila de contratos 2

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Apostila de contratos 2

1

MATERIAL DE APOIO

DIREITO CIVIL

TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

Apostila 01

Prof. Pablo Stolze Gagliano

1. Visão Geral dos Contratos no novo CC

O Código Civil de 2002 disciplinou os contratos da seguinte forma:

a) Título V – Dos contratos em Geral, subdividido em dois

Capítulos (Capítulo I - “Das Disposições Gerais” - e Capítulo 2 -

“Da Extinção do Contrato”). Tais capítulos são ainda

estruturados em Seções, que versam sobre aspectos gerais da

matéria contratual;

b) Título VI – Das Várias Espécies de Contratos, subdividido em

20 capítulos, compartimentados em várias outras Seções,

cuidando dos Contratos em Espécie1.

Nota-se, no estudo dessa disciplina, que o codificador inovou, ao tratar

de temas não regulados pelo Código anterior, a exemplo do contrato

preliminar, do contrato com pessoa a declarar, da resolução por onerosidade

excessiva (aplicação da teoria da imprevisão), da venda com reserva de

domínio, da venda sobre documentos e do contrato estimatório.

Além disso, disciplinou contratos novos, como a comissão, a

agência/distribuição, a corretagem e o contrato de transporte, deixando de

fazer referência a alguns outros institutos, como, por exemplo, a cláusula

comissória na compra e venda (art. 1163 do CC-16).

1 “Contratos em Espécie” integram outra grade do Curso LFG.

Page 2: Apostila de contratos 2

2

Perdeu-se, todavia, a oportunidade de se regular, pondo fim a

infindáveis dúvidas, algumas importantes modalidades contratuais já de uso

corrente, como o leasing, o franchising, o factoring, o consórcio, os contratos

bancários e os contratos eletrônicos.

Apesar dessas omissões, entretanto, devemos reconhecer que, em

geral, o trabalho do codificador, na seara contratual, foi bem desempenhado,

sobretudo por haver realçado a necessidade de imprimir socialidade à noção de

contrato.

2. Princípios do Direito Contratual

Segue o painel dos princípios que analisaremos em sala de aula:

a) o princípio da autonomia privada ou do consensualismo;

b) o princípio da força obrigatória do contrato (pacta sunt servanda);

c) o princípio da relatividade subjetiva dos efeitos do contrato;

d) o princípio da função social do contrato;

e) o princípio da boa-fé objetiva;

f) o princípio da equivalência material.

2.1. Observações acerca do princípio da função social do contrato

Devemos, de logo, ressaltar que a função social do contrato traduz

conceito sobremaneira aberto e indeterminado, impossível de se delimitar

aprioristicamente.2

HUMBERTO THEODORO JR., citando o competente professor PAULO

NALIN, na busca por delimitar as suas bases de intelecção, lembra-nos, com

acerto, que a função social manifestar-se-ia em dois níveis3:

2 Sobre o tema, confira-se a excelente obra: Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002. Coleção: Rubens Limongi França, 2ª Ed. São Paulo: Método, 2002, FLÁVIO TARTUCE.

Page 3: Apostila de contratos 2

3

a) intrínseco – o contrato visto como relação jurídica entre as

partes negociais, impondo-se o respeito à lealdade negocial e à

boa fé objetiva, buscando-se uma equivalência material entre

os contratantes;

b) extrínseco – o contrato em face da coletividade, ou seja, visto

sob o aspecto de seu impacto eficacial na sociedade em que

fora celebrado.

2.2. Observações acerca do princípio da boa-fé objetiva

Além das finalidades interpretativa, integradora e delimitadora de

direitos subjetivos, o princípio da boa-fé objetiva ainda tem a função

constitutiva (normativa) de deveres anexos ou de proteção, implícitos em

qualquer contrato4.

CONTRATO VÁLIDO ------------------------ RELAÇÃO OBRIGACIONAL:

(FONTE PRIMORDIAL

DE OBRIGAÇÕES)

a) dever jurídico principal:

prestação de DAR,

FAZER ou NÃO FAZER;

b) deveres jurídicos anexos

ou colaterais

(decorrentes da BOA-FÉ

OBJETIVA): lealdade e

confiança, assistência,

informação,

3 THEODORO JR., Humberto. O Contrato e sua Função Social. Rio de Janeiro: Forense, 2003, pág. 43. 4 Sobre a o tema: CORDEIRO, Antônio Menezes. Da Boa-Fé Objetiva no Direito Civil. Portugal: Almedina, 2001. Em nosso sentir, obra máxima, em língua portuguesa, no estudo do princípio.

Page 4: Apostila de contratos 2

4

confidencialidade ou

sigilo etc.

A boa fé objetiva, pois, é o principio ou norma reguladora desses deveres,

cuja enumeração não pode ser considerada taxativa5.

3. Formação dos Contratos

O contrato se forma quando as manifestações de vontade, em geral

contrapostas, contemporizam-se, conciliando os interesses divergentes, e

formando o denominado consentimento.

O consentimento das partes é a pedra de toque de todo contrato:

PARTE 1 ------------- CONSENTIMENTO ------------- PARTE 2

5 “Entre os deveres com tais características encontram-se, exemplificativamente: a) os deveres de cuidado, previdência e segurança, como o dever do depositário de não apenas guardar a coisa, mas também de bem acondicionar o objeto deixado em depósito; b) os deveres de aviso e esclarecimento, como o do advogado, de aconselhar o seu cliente acerca das melhores possibilidades de cada via judicial passível de escolha para a satisfação de seu desideratum, o do consultor financeiro, de avisar a contraparte sobre os riscos que corre, ou o do médico, de esclarecer ao paciente sobre a relação custo/benefício do tratamento escolhido, ou dos efeitos colaterais do medicamento indicado, ou ainda, na fase pré-contratual, o do sujeito que entra em negociações, de avisar o futuro contratante sobre os fatos que podem ter relevo na formação da declaração negocial; c) os deveres de informação, de exponencial relevância no âmbito das relações jurídicas de consumo, seja por expressa disposição legal (CDC, arts.12, in fine, 14, 18, 20, 30 e 31, entre outros), seja em atenção ao mandamento da boa-fé objetiva; d) o dever de prestar contas, que incumbe aos gestores e mandatários, em sentido amplo; e) os deveres de colaboração e cooperação, como o de colaborar para o correto adimplemento da prestação principal, ao qual se liga, pela negativa, o de não dificultar o pagamento, por parte do devedor; f) os deveres de proteção e cuidado com a pessoa e o patrimônio da contraparte, v.g., o dever do proprietário de uma sala de espetáculos ou de um estabelecimento comercial de planejar arquitetonicamente o prédio, a fim de diminuir os riscos de acidentes; g) os deveres de omissão e de segredo, como o dever de guardar sigilo sobre atos ou fatos dos quais se teve conhecimento em razão do contrato ou de negociação preliminares, pagamento, por parte do devedor etc” (COSTA, Judith Martins-. A Boa-Fé no Direito Privado. São Paulo: RT, 1999, p.439).

Page 5: Apostila de contratos 2

5

Na denominada “fase de puntuação”, as partes discutem, ponderam,

refletem, fazem cálculos, estudos, redigem a minuta do contrato, enfim,

contemporizam interesses antagônicos, para que possam chegar a uma

proposta final e definitiva.

No dizer de GUILLERMO BORDA,

“Muchas veces las tratativas contractuales se desenvuelven através de um

tiempo más o menos prolongado, sea porque el negocio es complejo y las

partes quieren estudiarlo em todas sus consecuencias o porque quien lo firma

no tiene poderes suficientes o por cualquier otro motivo”.6

A característica básica desta fase é justamente a não vinculação

(formal) das partes à uma relação jurídica obrigacional, muito embora possa,

em tese, haver responsabilidade civil pré-contratual por quebra de boa-fé

objetiva, caso haja lesão à legítima e firme expectativa de contratar

alimentada por uma das partes, à luz do princípio da confiança. Dependerá da

análise do caso concreto à luz da principiologia constitucional aplicada às

relações de direito privado, consoante veremos em sala.

Esses atos preparatórios, característicos da fase de puntuação, não se

identificam com o denominado contrato preliminar, figura jurídica que é

especialmente – posto não apenas - estudada no âmbito da “promessa de

compra e venda”.

A proposta de contratar, também denominada de policitação, consiste na

oferta de contratar que uma parte faz à outra, com vistas à celebração de

determinado negócio (aquele que apresenta a oferta é chamado de

proponente, ofertante ou policitante).

Trata-se de uma declaração receptícia de vontade.

6 BORDA, Guillermo A. Manual de Contratos. 19 ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2000, pág. 33.

Page 6: Apostila de contratos 2

6

O Código Civil, ao disciplinar o tema, na Seção II, do Capítulo I, Título V

(Da Formação dos Contratos), embora não haja elencado os seus elementos

constitutivos, regulou-a, nos seguintes termos:

Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o

contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou

das circunstâncias do caso.

Observe-se, portanto, que a proposta de contratar obriga o proponente

ou policitante, que não poderá voltar atrás, ressalvadas apenas as exceções

capituladas na própria lei (arts. 427 e 428).

Cuida-se, no caso, do denominado princípio da vinculação ou da

obrigatoriedade da proposta, diretriz normativa umbilicalmente ligada ao

dogma da segurança jurídica.

Da análise desse dispositivo, concluímos que o legislador reconhece a

perda da eficácia cogente da oferta, nas seguintes situações especiais:

a) se o contrário (a não-obrigatoriedade) resultar dos termos

dela mesma – é o caso de o proponente salientar, quando da sua

declaração de vontade (oferta), que reserva o direito de retratar-se

ou arrepender-se de concluir o negócio. Tal possibilidade,

entretanto, não deverá existir nas ofertas feitas ao consumidor, na

forma da Lei n. 8078/90 (CDC);

b) se o contrário (a não-obrigatoriedade) resultar da natureza

do negócio – cite-se como exemplo, seguindo o pensamento de

Page 7: Apostila de contratos 2

7

CARLOS ROBERTO GONÇALVES, “das chamadas propostas abertas

ao público, que se consideram limitadas ao estoque existente”7;

c) se o contrário (a não-obrigatoriedade) resultar das

circunstâncias do caso – nesse caso, optou o legislador por

adotar uma dicção genérica, senão abstrata, que dará ao juiz a

liberdade necessária para aferir, no caso concreto, e respeitado o

princípio da razoabilidade, situação em que a proposta não poderia

ser considerada obrigatória.

Nessa mesma linha, vale registrar ainda que a proposta pode ter prazo

de validade.

É o que dispõe o art. 428 do CC-02 (correspondente ao art. 1.081, CC-

16):

Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta:

I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi

imediatamente aceita. Considera-se também presente a

pessoa que contrata por telefone ou por meio de

comunicação semelhante;

II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido

tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento

do proponente;

III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a

resposta dentro do prazo dado;

IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao

conhecimento da outra parte a retratação do proponente.

7 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Obrigações – Parte Especial – Tomo I – Contratos (Sinopses Jurídicas). 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, pág. 16.

Page 8: Apostila de contratos 2

8

Para que entendamos tais situações, é preciso definir o que se

entende por “pessoa presente” e “pessoa ausente”.

Presentes são as pessoas que mantêm contato direto e simultâneo

uma com a outra, a exemplo daquelas que tratam do negócio pessoalmente,

ou que utilizam meio de transmissão imediata da vontade (como o telefone,

por exemplo). Observe-se que, em tais casos, o aceitante toma ciência da

oferta quase no mesmo instante em que a mesma é emitida.

Ausentes, por sua vez, são aquelas pessoas que não mantém contato

direto e imediato entre si, caso daquelas que contratam por meio de carta ou

telegrama (correspondência epistolar).

Não tendo regulado os contratos eletrônicos, entendemos que tais

regras, constantes no Código Civil, devem, mutatis mutandis, lhes ser

aplicadas.

Nessa linha de raciocínio, poderemos considerar, entre presentes, o

contrato celebrado eletronicamente em um chat (salas virtuais de

comunicação), haja vista que as partes envolvidas mantêm contato direto

entre si quando de sua formação, e, por outro lado, entre ausentes, aquele

formado por meio do envio de mensagem eletrônica (e-mail), pois, nesse caso,

medeia um lapso de tempo entre a emissão da oferta e a resposta.

Fora dessas hipóteses (arts. 427, segunda parte e art. 428),

portanto, a proposta obriga o proponente e deverá ser devidamente

cumprida, caso haja a conseqüente aceitação.

E o que se sentende por aceitação?

Trata-se da manifestação de vontade concordante do aceitante ou

oblato que adere à proposta que lhe fora apresentada.

Cumpre-nos observar que se a aceitação for feita fora do prazo,

com adições, restrições, ou modificações, importará em nova proposta.

Ou seja, caso a aquiescência não seja integral, mas feita intempestivamente

Page 9: Apostila de contratos 2

9

ou com alterações (restritivas ou ampliativas), converter-se-á em

contraproposta, nos termos do art. 431 do Código Civil.8

Nessa mesma linha, se a aceitação, por circunstância imprevista,

chegar tarde ao conhecimento do proponente, este deverá comunicar o fato

imediatamente ao aceitante, sob pena de responder por perdas e danos (art.

430). Aqui está mais uma aplicação do “dever de informar” decorrente da boa

fé objetiva!...

Finalmente, vale salientar que a aceitação poderá ser expressa ou

tácita, consoante se pode concluir da análise do art. 432 do Código Civil:

Art. 432. Se o negócio for daqueles em que não seja

costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver

dispensado, reputar-se-á concluído o contrato, não chegando

a tempo a recusa.

Por fim, importante questão a ser enfrentada diz respeito à

formação do contrato entre ausentes, especialmente o pactuado mediante

correspondência epistolar.

Aliás, como carecemos de uma disciplina específica dos contratos

eletrônicos, consoante já dissemos, a matéria aqui exposta poderá, mutatis

mutandis, ser adaptada àqueles negócios pactuados via e-mail.

Fundamentalmente, a doutrina criou duas teorias explicativas a

respeito da formação do contrato entre ausentes9:

a) teoria da cognição para os adeptos dessa linha de

pensamento, o contrato entre ausentes somente se consideraria

formado, quando a resposta do aceitante chegasse ao

conhecimento do proponente.

8 Norma muito semelhante vem prevista no Código Civil Argentino: “Art. 1152. Cualquiera modificación que se hiciere em la oferta al aceptarla, importará la propuesta de um nuevo contrato”. 9 Cf. PEREIRA, Caio Mário da Silva, ob. cit., pág. 25 e RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Dos Contratos e Declarações Unilaterais de Vontade. vol 3. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 1997.

Page 10: Apostila de contratos 2

10

b) teoria da agnição (dispensa-se que a resposta chegue ao

conhecimento do proponente):

b.1. sub-teoria da declaração

propriamente dita – o contrato se formaria

no momento em que o aceitante ou oblato

redige, datilografa ou digita a sua resposta.

Peca por ser extremamente insegura, dada a

dificuldade em se precisar o instante da

resposta.

b.2. sub-teoria da expedição - considera

formado o contrato, no momento em que a

resposta é expedida.

b.3. sub-teoria da recepção – reputa

celebrado o negócio no instante em que o

proponente recebe a resposta. Dispensa, como

vimos, que leia a mesma. Trata-se de uma

sub-teoria mais segura do que as demais, pois

a sua comprovação é menos dificultosa,

podendo ser provada, por exemplo, por meio

do A.R. (aviso de recebimento), nas

correspondências.

Mas, afinal, qual seria a teoria adotada pelo nosso direito positivo?

CLÓVIS BEVILÁQUA, autor do projeto do Código Civil de 1916 era,

nitidamente, adepto da sub-teoria da expedição, por reputá-la “a mais

razoável e a mais jurídica”.10

Por isso, boa parte da doutrina brasileira, debruçando-se sobre o art.

1086 do Código revogado, concluía tratar-se de dispositivo afinado com o

pensamento de BEVILÁQUA:

10 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das Obrigações.São Paulo: RED, 2000, pág. 238.

Page 11: Apostila de contratos 2

11

Art. 1086 (caput). Os contratos por correspondência

epistolar, ou telegráfica, tornam-se perfeitos desde que a

aceitação é expedida, ... (grifamos)

Na mesma linha, se cotejarmos esse dispositivo com o

correspondente do Código em vigor, teremos a nítida impressão de que foi

adotada a vertente teórica da expedição:

Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se

perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto:

I - no caso do artigo antecedente;

II - se o proponente se houver comprometido a

esperar resposta;

III - se ela não chegar no prazo convencionado.

(grifamos)

Note-se, entretanto, que o referido dispositivo enumera situações em

que o contrato não se reputará celebrado: no caso do art. 433; se o

proponente se houver comprometido a esperar a resposta (nesta hipótese, o

próprio policitante comprometeu-se a aguardar a manifestação do oblato); ou,

finalmente, se a resposta não chegar no prazo assinado pelo policitante.

Ocorre que se nós observarmos a ressalva constante no inciso I

desse artigo, que faz remissão ao art. 433, chegaremos à inarredável

conclusão de que a aceitação não se reputará existente, se antes dela ou

com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante.

Atente para essa expressão: “se antes dela ou com ela CHEGAR ao

proponente a retratação do aceitante”.

Page 12: Apostila de contratos 2

12

Ora, ao fazer tal referência, o próprio legislador acabou por negar a

força conclusiva da expedição, para reconhecer que, enquanto não tiver havido

a RECEPÇÃO, o contrato não se reputará perfeito, pois, antes do recebimento

da resposta ou simultaneamente a esta, poderá vir o arrependimento do

aceitante.

Dada a amplitude da ressalva constante no art. 433, que admite,

como vimos, a retratação do aceitante até que a resposta seja recebida pelo

proponente, entendemos que o nosso Código Civil adotou a sub-teoria da

recepção, e não a da expedição11.

Nessa linha, inclusive, enunciado da Terceira Jornada sufraga a tese

da recepção, aplicando-a para a contratação pela via eletrônica:

E. 173 – Art. 434: A formação dos contratos realizados entre pessoas

ausentes, por meio eletrônico, completa-se com a recepção da aceitação pelo

proponente.

4. Classificação dos Contratos

a) Quanto à Natureza da Obrigação.

a.1) Contratos Unilaterais, Bilaterais ou Plurilaterais - na medida

em que o contrato implique em direitos e obrigações para ambos os

contratantes ou apenas para um deles, será bilateral (ex.: compra e venda)

ou unilateral (ex.: depósito), podendo se falar em contrato plurilateral (ou

multi-lateral), na medida em que haja mais de dois contratantes com

obrigações (contrato de constituição de uma sociedade ou de um condomínio);

a.2) Contratos Onerosos ou Gratuitos – Quando a um benefício

recebido corresponder um sacrifício patrimonial (ex: compra e venda), fala-se

11 Nesse sentido, tb., GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Obrigações – Parte Especial – Tomo I – Contratos (Sinopses Jurídicas). 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p.20/21.

Page 13: Apostila de contratos 2

13

em contrato oneroso. Quando, porém, fica estabelecido que somente uma

das partes auferirá benefício, enquanto a outra arcará com toda obrigação,

fala-se em contrato gratuito ou benéfico (ex: doação pura (sem encargo) e

comodato).

a.3) Contratos Comutativos ou Aleatórios. Quando as obrigações se

equivalem, conhecendo os contratantes, ab initio, as suas respectivas

prestações, como, por exemplo, na compra e venda ou no contrato individual

de emprego, fala-se em um contrato comutativo. Já quando a obrigação de

uma das partes somente puder ser exigida em função de coisas ou fatos

futuros, cujo risco da não ocorrência for assumido pelo outro contratante, fala-

se em contrato aleatório, previsto nos arts. 458/461, como é o caso, por

exemplo, do contratos de seguro, jogo e aposta, bem como como o contrato

de constituição de renda.

Sub-divisão dos Contratos Aleatórios:

a) Contrato de Compra de Coisa Futura, com

Assunção de Risco pela Existência (emptio spei): nessa

primeira espécie, prevista expressamente no art. 458, o

contratante assume o risco de não vir a ganhar coisa

alguma, deixando à sorte propriamente dita o resultado da

sua contratação;

b) Contrato de Compra de Coisa Futura, sem

Assunção de Risco pela Existência (emptio rei

speratae): nessa segunda hipótese, prevista no art. 459,

CC-02 (art.1.119, CC-16)12, não há a assunção total de

riscos pelo contratante, tendo em vista que o alienante se

comprometeu a que alguma coisa fosse entregue;

c) Contrato de Compra de Coisa Presente, mas

Exposta a Risco assumido pelo Contratante: a última

12 CC-02: “Art.459. Se for aleatório, por serem objeto dele coisas futuras, tomando o adquirente a si o risco de virem a existir em qualquer quantidade, terá também direito o alienante a todo o preço, desde que de sua parte não tiver concorrido culpa, ainda que a coisa venha a existir em quantidade inferior à esperada. Parágrafo único. Mas, se da coisa nada vier a existir, alienação não haverá, e o alienante restituirá o preço recebido”.

Page 14: Apostila de contratos 2

14

modalidade codificada é a que versa sobre a venda de coisa

atual sujeita a riscos, prevista nos art.46013.

a.4) Contratos Paritários ou por Adesão - Na hipótese das partes

estarem em iguais condições de negociação, estabelecendo livremente as

cláusulas contratuais, na fase de puntuação, fala-se na existência de um

contrato paritário, diferentemente do contrato de adesão, que pode ser

conceituado simplesmente como o contrato onde um dos pactuantes pré-

determina (ou seja, impõe) as cláusulas do negócio jurídico

a.5) Contratos Evolutivos - Classificação proposta pelo Prof. ARNOLDO

WALD, para se referir a figuras contratuais, próprias do Direito Administrativo,

em que é estabelecida a equação financeira do contrato, impondo-se a

compensação de eventuais alterações sofridas no curso do contrato, pelo que o

mesmo viria com cláusulas estáticas, propriamente contratuais, e outras

dinâmicas, impostas por lei.

b) Classificação dos Contratos quanto à Disciplina Jurídica (civis,

comerciais, trabalhistas, consumeristas e administrativos).

c) Classificação dos Contratos quanto à Forma.

c.1) Solenes ou Não-Solenes - Quanto à imprescindibilidade de

uma forma específica para a validade da estipulação contratual;

c.2) Consensuais ou Reais - Em relação à maneira (forma) pela

qual o negócio jurídico é considerado ultimado, ainda nesta classificação

quanto à forma, os contratos podem ser consensuais, se concretizados com a

simples declaração de vontade, ou reais, na medida que exijam a entrega da

coisa, para que se reputem existentes.

d) Classificação dos Contratos quanto à Designação (nominados e

inominados) - pode-se falar na existência de contratos nominados e

contratos inominados, na medida em que tenham terminologia ou 13 CC-02: “Art.460. Se for aleatório, por se referir a coisas existentes, mas expostas a risco, assumido pelo adquirente, terá igualmente direito o alienante a todo o preço, posto que a coisa já não existisse, em parte, ou de todo, no dia do contrato”

Page 15: Apostila de contratos 2

15

nomenclatura definida e prevista expressamente em lei ou, em caso contrário,

sejam apenas fruto da criatividade humana.

e) Classificação dos Contratos quanto à Pessoa do Contratante.

e.1) Pessoais ou Impessoais – Quanto à importância da pessoa do

contratante para a celebração e produção de efeitos do contrato, podem

tais negócios jurídicos ser classificados em contratos pessoais ou contratos

impessoais. Os primeiros, também chamados de personalíssimos, são os

realizados intuitu personae, ou seja, celebrados em função da pessoa do

contratante, que tem influência decisiva para o consentimento do outro, para

quem interessa que a prestação seja cumprida por ele próprio, pelas suas

características particulares (habilidade, experiência, técnica, idoneidade etc).

Nessas circunstâncias, é razoável se afirmar, inclusive, que a pessoa do

contratante torna-se um elemento causal do contrato (ex: contrato de

emprego). Já os contratos impessoais são aqueles em que somente interessa

o resultado da atividade contratada, independentemente de quem seja a

pessoa que irá realizá-la.

e.2) Individuais ou Coletivos - Tem-se como parâmetro também o

número de sujeitos envolvidos/atingidos. No contrato individual, sua

concepção tradicional se refere a uma estipulação entre pessoas determinadas,

ainda que em número elevado, mas consideradas individualmente. Já no

contrato coletivo, também chamado de contrato normativo, tem-se uma

transubjetivização da avença, alcançando grupos não individualizados,

reunidos por uma relação jurídica ou de fato.

f) Classificação dos Contratos quanto ao Tempo.

f.1) Instantâneos (execução imediata ou execução diferida) -

Por contratos instantâneos, compreendam-se as relações jurídicas

contratuais cujos efeitos são produzidos de uma só vez (ex: compra e venda a

vista de bens móveis, em que o contrato se consuma com a tradição da coisa).

Page 16: Apostila de contratos 2

16

Tal produção concentrada de efeitos, porém, pode se dar ipso facto à avença

ou em data posterior à celebração (em função da inserção de um termo

limitador da sua eficácia), subdividindo-se, assim, tal classificação em

contratos instantâneos de execução imediata ou de execução diferida. Tal

subclassificação também tem interesse prático, tendo em vista que, nos

contratos de execução diferida, é aplicável a teoria da imprevisão, por

dependerem de circunstâncias futuras, o que, por óbvio, inexiste nos contratos

de execução imediata.

f.2) De duração (determinada ou indeterminada) - Já os contratos

de duração, também chamados de contratos de trato sucessivo, execução

continuada ou débito permanente14, são aqueles que se cumprem por meio

de atos reiterados, como, por exemplo, o contrato de prestação de serviços,

compra e venda a prazo e o contrato de emprego. Tal duração pode ser

determinada ou indeterminada, na medida em que haja ou não previsão

expressa de termo final ou condição resolutiva a limitar a eficácia do contrato.

g) Classificação dos Contratos quanto à Disciplina Legal Específica

(típicos e atípicos) - Quando há uma previsão legal da disciplina de

determinada figura contratual, estaremos diante de um contrato típico; na

situação inversa, ou seja, em que o contrato não esteja disciplinado/regulado

pelo Direito Positivo, vislumbraremos um contrato atípico.

h) Classificação pelo Motivo Determinante do Negócio (causais e

abstratos) - Classificação (lembrada por SILVIO RODRIGUES), que toma, por

base, o motivo determinante do negócio, para dividi-los em contratos

causais e contratos abstratos. Os primeiros estão vinculados à causa que os

determinou, podendo ser declarados inválidos, se a mesma for considerada 14 “Débito permanente é o que consiste em uma prestação tal que não é possível conceber sua satisfação em um só momento; mas, do contrário, tem de ser cumprida durante certo período de tempo, continuadamente. A determinação de sua duração resulta da vontade das partes, mediante cláusula contratual em que subordinam os efeitos do negócio a um acontecimento futuro e certo, ou da declaração de vontade de um dos contratantes pondo termo à relação (denúncia). São, por conseqüência, por tempo determinado ou indeterminado” (GOMES, Orlando. Contratos, 24 ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001, p.79).

Page 17: Apostila de contratos 2

17

inexistente, ilícita ou imoral. Já os contratos abstratos seriam aqueles cuja

força decorre da sua própria forma, independentemente da causa que o

estipulou. Seriam os exemplos dos títulos de crédito em geral, como um

cheque.

i) Classificação pela Função Econômica (de troca, associativos, de

prevenção de riscos, de crédito e de atividade)

a) de troca: caracterizado pela permuta de utilidades

econômicas, como, por exemplo, a compra e venda

b) associativos: caracterizado pela coincidência de fins, como é

o caso da sociedade e da parceria;

c) de prevenção de riscos: caracterizado pela assunção de

riscos por parte de um dos contratantes, resguardando a

possibilidade de dano futuro e eventual, como nos contratos de

seguro, capitalização e constituição de renda;

d) de crédito: caracterizado pela obtenção de um bem para ser

restituído posteriormente, calcada na confiança dos

contratantes e no interesse de obtenção de uma utilidade

econômica em tal transferência. É a hipótese típica do mútuo

feneratício (a juros);

e) de atividade: caracterizado pela prestação de uma conduta

de fato, mediante a qual se conseguirá uma utilidade

econômica. Como exemplos, podem ser lembrados os

contratos de emprego, prestação de serviços, empreitada,

mandato, agência e corretagem.

j) Contratos Reciprocamente Considerados

j.1. Classificação quanto à Relação de Dependência (principais e

acessórios) - Os contratos principais são os que têm existência autônoma,

independentemente de outro. Por exceção, existem determinadas relações

contratuais cuja existência jurídica pressupõe a de outros contratos, a qual

servem. É o caso típico da fiança, caução, penhor, hipoteca e anticrese.

Page 18: Apostila de contratos 2

18

j.2. Classificação quanto à Definitividade (preliminares e

definitivos) - Por fim, quanto à definitivamente, podem ser os contratos ser

classificados em preliminares e definitivos. Os contratos preliminares (ou

pactum de contrahendo), exceção no nosso ordenamento jurídico, nada mais

são do que negócios jurídicos que têm por finalidade justamente a celebração

de um contrato definitivo.

OBS.: Este tópico (classificação dos contratos) foi elaborado por RODOLFO

PAMPLONA FILHO (co-autor da obra Novo Curso de Direito Civil – Saraiva), a

quem registramos o nosso agradecimento.

Contato: [email protected]

5. Textos Complementares

Seguem textos, meus amigos, de dois grandes civilistas do Brasil, o Profs.

Antônio Junqueira de Azevedo (sobre o Projeto do CC) e Flávio Tartuce.

O princípio da boa-fé nos contratos

Antônio Junqueira de Azevedo15

RESUMO

Tece críticas referentes ao art. 421 do Projeto do Código Civil, onde está

presente a cláusula geral da boa-fé nos contratos. Como insuficiências,

destaca: a) não se pode saber se o artigo representa norma cogente ou

dispositiva; b) o artigo se limita ao período que vai da conclusão até a

execução do contrato, não prevendo a aplicação da boa-fé nas fases pré e pós-

contratuais. Como deficiências do art. 421, cita a ausência de disposições

15 Fonte: www.cjf.gov.br

Page 19: Apostila de contratos 2

19

sobre: deveres anexos, cláusulas faltantes e cláusulas abusivas. A última

crítica é que o Projeto assenta-se em um paradigma ultrapassado, centrado na

figura do julgador, devendo o paradigma atual centrar-se na Constituição, em

normas cogentes.

ABSTRACT

The text criticises the Art. 421 of the Civil Code Project where the general

clause on good faith in contracts is established. As inadequacies, it states that:

a) it is not possible to know if the article is a reasonably necessary or specific

norm, b) the article is only about the period between the conclusion and the

execution of the contract, not predicting the good faith application in the

phases before and after the contract. It also considers as inadequacies of the

Art. 421 and mentions that there are not dispositions about attached rights,

missing and abusive clauses. The last criticism is that the Project is based in an

outmoded paradigm, centred in the judge figure. The actual paradigm should

centred itself in the Constitution, in reasonably necessary norms.

O tema "Boa-fé nos contratos" é uma homenagem que faço ao Prof. Clóvis do

Couto e Silva.

Meu intuito é fazer a crítica de um projeto de lei. Sinto-me nisso como quem

cumpre um dever.

A presença da boa-fé no Projeto está em três artigos: em um sobre o exercício

de direito, em outro sobre interpretação — como se deve interpretar os

negócios jurídicos — e no que me diz respeito boa-fé nos contratos, no art.

421, cujo texto é o seguinte: Os contratantes são obrigados a guardar, assim

na conclusão do contrato como em sua execução, os princípios da probidade e

da boa-fé.

Page 20: Apostila de contratos 2

20

O artigo é insuficiente, deficiente e, além de tudo, revela que está num

paradigma anterior aos tempos em que estamos vivendo. Ele está no

paradigma do sistema que alguns dizem aberto, de cláusulas gerais e conceitos

indeterminados. No meu modo de entender, já estamos, no mundo, hoje, em

outro paradigma.

O primeiro paradigma se baseava inteiramente na segurança da lei — naquela

idéia de que a lei deve ser universal, geral, prever tudo com precisão e, tanto

quanto possível, ser completa. O papel do juiz, nesse paradigma, era o de um

autômato. É o famoso juiz "boca da lei", la bouche de la loi, na linguagem de

Montesquieu.

Esse paradigma, no começo do século XX, foi alterado, foi substituído pelo

segundo paradigma, que hoje alguns estão chamando de "sistema aberto".

Nesse sistema, o ponto central deixou de ser a lei e passou a ser o juiz. Para

isso, passou-se a utilizar conceitos indeterminados e cláusulas gerais.

A boa-fé é um conceito indeterminado. Quando se refere ao tipo de

comportamento exigido — por exemplo, dos contratantes — configura-se em

cláusula geral.

O artigo referido, com a evolução do Direito, é hoje insuficiente por várias

razões. Uma delas é que não sabemos se representa uma norma cogente ou se

é uma norma dispositiva. O Projeto de Código Civil não levou em consideração

códigos modernos, como o Uniform Comercial Code (Código Comercial

americano) — na verdade, ainda que tenha horror aos americanos, os Estados

Unidos são a Nação que está impondo as suas regras e nada mais lógico que,

pelos menos, se verificasse aquilo que é o código prescritivo, normativo, no

mundo americano. O Uniform Comercial Code diz sobre a boa-fé: The

obligation of good faith may not be disclaimed by agreement, ou seja, no

Direito americano está muito claro que a obrigação de boa-fé não pode ser

afastada por contrato. Portanto, ele está imposto como cogente, mas, o

mesmo artigo do Código americano é ainda mais completo porque acrescenta

Page 21: Apostila de contratos 2

21

que as partes podem, por contrato, determinar quais os standards by with the

performance of such obligation is to be measured, ou seja, o standard pelo

qual a "performance", a execução da obrigação, será executada. Naturalmente

há determinações possíveis pelas partes, segundo o tipo de área de atividade e

de negócio que estão fazendo. Já nas Ordenações do Reino se dizia que quem

compra cavalo no mercado de Évora não tem direito aos vícios redibitórios. Se

um sujeito vai negociar no mercado de objetos usados, em feira de troca, a

boa-fé exigida de um vendedor não pode ser igual à de uma outra loja ou

outro negócio, em que há um pressuposto de cuidado. Portanto, no caso do

Projeto, não se sabe se a norma é cogente e não se fala se as partes podem

adotar outros standards ou quais standards e assim por diante.

Segunda insuficiência: o art. 421 se limita ao período que vai da conclusão do

contrato até a sua execução. Sempre digo que o contrato é um certo processo

em que há um começo, prosseguimento, meio e fim. Temos fases contratuais

— fase pré-contratual, contratual propriamente dita e pós-contratual. Uma das

possíveis aplicações da boa-fé é aquela que se faz na fase pré-contratual, fase

essa em que temos as negociações preliminares, as tratativas. É um campo

propício para o comportamento de boa-fé, no qual ainda não há contrato e

podem-se exigir aqueles deveres que uma pessoa deve ter como correção de

comportamento em relação ao outro.

Cito um caso entre a Cica e plantadores de tomate, no Rio Grande do Sul, no

qual, em pelo menos 4 acórdãos, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

reconheceu que a Companhia Cica havia criado expectativas nos possíveis

contratantes — pequenos agricultores —, ao distribuir sementes para que

plantassem tomates e, depois, errou ao se recusar a comprar a safra dos

tomates. Houve, então, prejuízo dos pequenos agricultores, baseado na

confiança despertada antes do contrato, fase pré-contratual. Logo, o caso do

art. 421 deveria também falar em responsabilidade pré-contratual ou extensão

do comportamento de boa-fé na fase pré-contratual.

Page 22: Apostila de contratos 2

22

Faço um parêntese para exemplificar, transformando em hipótese o que li nos

jornais de hoje sobre o caso da Ford com o Governador do Rio Grande do Sul.

A Ford, durante os dois anos em que teria procurado montar a sua indústria,

certamente teve muitos gastos e, de repente, o negócio não teria sido

efetivado. O problema da responsabilidade pré-contratual é justamente esse,

qual seja, o dos gastos que se fazem antes do contrato e quando há a ruptura.

Se essa hipótese da Ford for pré-contratual — no caso, suponho ter havido

algum contrato anterior — mas se não houvesse, e se fosse apenas um

problema de negociações, antes de qualquer efetivação do negócio, haveria

dois pressupostos da responsabilidade pré-contratual: a confiança na

realização do futuro negócio e o investimento na confiança. Faltariam, talvez,

outros dois pressupostos: o de poder atribuir uma justificação à confiança que

alguém teve e, em segundo lugar, o de que essa confiança tenha sido causada

pela outra parte. Assim, poderíamos duvidar se o Governador chegou a criar

essa confiança e, portanto, provocou a despesa da indústria; e, ainda, se a

indústria não confiou demais e assim por diante. São problemas em aberto,

mas de qualquer maneira, o meu primeiro ponto sobre a responsabilidade pré-

contratual é que há uma omissão do Projeto de Código Civil, no artigo em

causa.

A terceira insuficiência é na fase pós-contratual, porque se está dito "boa-fé na

conclusão" e "na execução", nada está dito sobre aquilo que se passa depois

do contrato. Isso também é assunto que a doutrina tem tratado — a chamada

"responsabilidade pós-contratual" ou post pactum finitum. Darei três exemplos

para comprovação de que, após o contrato encerrado, ainda há possibilidade

de exigir boa-fé dos contratantes:

1 O proprietário de um imóvel vendeu-o e o comprador o adquiriu por este ter

uma bela vista sobre um vale muito grande, construindo ali uma bela

residência, que valia seis vezes o valor do terreno. A verdade é que o vendedor

gabou a vista e aí fez a transferência do imóvel para o comprador — negócio

acabado. Depois, o ex-proprietário, o vendedor foi à prefeitura municipal,

verificou que não havia a possibilidade de construir um prédio em frente, mas

Page 23: Apostila de contratos 2

23

adquiriu o prédio em frente ao que tinha vendido e conseguiu na prefeitura a

alteração do plano diretor da cidade, permitindo ali uma construção. Quer

dizer, ele construiu um prédio que tapava a vista do próprio terreno que havia

vendido ao outro — esse não era ato literalmente ilícito. Ele primeiramente

vendeu, cumpriu a sua parte. Depois, comprou outro terreno, foi à prefeitura,

mudou o plano, e aí construiu. A única solução para o caso é aplicar a regra da

boa-fé. Ele faltou com a lealdade no contrato que já estava acabado. É,

portanto, post pactum finitum.

2 Uma dona de boutique encomendou a uma confecção de roupas 120 casacos

de pele. A confecção fez os casacos, vendeu-os e os entregou para essa dona

da boutique. Aí, liquidado esse contrato, a mesma confecção fez mais 120

casacos de pele idênticos e vendeu-os para a dona da boutique vizinha. Há,

também, evidentemente, deslealdade e post pactum finitum.

1. Um indivíduo queria montar um hotel e procurou o melhor e mais

barato carpete para colocar no seu empreendimento. Conseguiu

uma fornecedora que disse ter o preço melhor, mas que não fazia

a colocação. Ele pediu, então, à vendedora a informação de quem

poderia colocar o carpete. A firma vendedora indicou o nome de

uma pessoa que já tinha alguma prática na colocação do carpete,

mas não disse que o carpete que estava fornecendo para esse

empresário era de um tipo diferente. O colocador do carpete pôs

uma cola inadequada e, semanas depois, todo o carpete estava

estragado. A vendedora dizia: cumpri a minha parte no contrato,

entreguei, recebi o preço, o carpete era esse, fiz favor indicando

um colocador. Segundo a regra da boa-fé, ela não agiu com

diligência, porque, no mínimo, deveria tê-lo alertado — uma

espécie de dever de informar e de cuidar depois de o contrato ter

terminado — a propósito do novo tipo de carpete. Há

responsabilidade pós-contratual.

Page 24: Apostila de contratos 2

24

Portanto, o art. 421 está insuficiente, pois só fala em conclusão — o momento

em que se faz o contrato — e execução. Não fala nada do que está para

depois, nem falava do que estava antes. Finalmente, ainda a propósito das

insuficiências, o artigo fala apenas em execução, no momento final, e muitas

vezes o caso na verdade não chega a ser de execução, mesmo que dilatemos a

expressão em português "execução".

A respeito da "substancial performance", ou seja, o contratante que executa

em grande parte as suas obrigações e somente não executa uma pequena

parte, por não executar essa pequena parte não seria razoável que se

rescindisse o contrato. O caso dessas cláusulas que permitem uma resolução

por um contratante tendo em vista o inadimplemento de outro, é de

inexecução e não propriamente de execução. Mas uma cláusula resolutiva pode

ser empregada com má-fé. O Código deveria ter dito "execução" ou "extinção

da obrigação". Não só o Código Comercial americano, a que vinha me

referindo, fala em "performance" ou enforcement; outros códigos mais novos,

a exemplo do de Quebec, também se referem à execução ou à extinção da

obrigação. Até o Código da Louisiana tratou do assunto.

Refiro-me a esses códigos porque são desta década. O que estou citando do

Código Comercial americano é da última edição, de 1990; o Código da

Louisiana, edição de 1999, que foi revista; e o Código de Quebec entrou em

vigor em 1994.

Os autores do Projeto de Código Civil não tiveram conhecimento dessas leis,

porque elas são posteriores. Mas esse é o ponto: ficamos com um Projeto de

Código Civil feito antes de os atuais estudantes de Direito terem nascido! O

mundo mudou muito; as coisas ficaram não-factíveis na situação em que

estamos.

Até aqui falamos das insuficiências; temos ainda as deficiências e o problema

dos paradigmas — o assunto é vasto.

Page 25: Apostila de contratos 2

25

Com relação às deficiências, a regra da boa-fé tem uma espécie de função que

chamo de "pretoriana" em relação ao contrato. O chamado "Direito

Pretoriano", no Direito romano, foi aquele que os pretores introduziram para

ajudar, suprir e corrigir o Direito Civil. Havia o Direito Civil estrito (o Direito

Civil mais rigoroso) e o Direito Pretoriano veio adjuvandi, supplendi, vel

corrigendi e juris civilis gratia.

Essa tríplice função existe na cláusula geral de boa-fé, porque justamente a

idéia dessa cláusula no contrato é ajudar na interpretação do contrato,

adjuvandi, suprir algumas das suas falhas, acrescentar o que nele não está

incluído supplendi e eventualmente corrigir alguma coisa que não é de direito

no sentido de justo corrigendi. Esse é o papel da cláusula de boa-fé nos

contratos feitos.

São essas três funções os pontos que, nos países europeus, na doutrina da

boa-fé, mais são salientados. Houve um certo movimento, desde o começo do

século, a propósito da boa-fé, ela já teve até mais importância do que tem

hoje e nos últimos anos tem havido até um certo refluxo da mesma, mas

continua fundamental para os contratos.

A interpretação de acordo com a boa-fé está bem tanto no art. 421 como no

primeiro artigo da Parte Geral sobre interpretação dos negócios jurídicos. Mas

as outras duas funções, aquela que é supplendi e a outra que é corrigendi, não

estão no Projeto. No caso da função supplendi, há dois aspectos: um é o

problema dos deveres anexos. A cláusula de boa-fé — sempre comentada por

todos os tratadistas, por todos os manuais — cria deveres anexos ao vínculo

principal. Existe aquilo a que as partes expressamente se referiram e, depois,

há deveres colocados ao lado, ora ditos secundários, ora anexos,

especialmente o dever de informar, mais um dever negativo, o de manter

sigilo sobre alguma coisa que soube da outra parte, ou até deveres ditos

positivos, como o de procurar colaborar com a outra parte (daí até uma visão

talvez excessivamente romântica, de que os contratantes devem colaborar

entre si).

Page 26: Apostila de contratos 2

26

Esses deveres anexos, nos Códigos a que estava me referindo, hoje estão

expressos. O Código Civil holandês, por exemplo, trata do assunto no art. 242

do Livro das Obrigações e diz que as partes devem respeitar aquilo que

convencionaram. Ou seja, o contrato não produz somente os efeitos que foram

convencionados entre as partes, mas igualmente aqueles que, segundo a

natureza do contrato, decorrem das exigências da razão e da eqüidade. Razão

e eqüidade é a maneira como o Código Civil holandês se refere à boa-fé. Os

autores holandeses evitaram a palavra "boa-fé", para que não houvesse

confusão com a chamada "boa-fé subjetiva" — a boa-fé no sentido de

conhecimento ou desconhecimento de uma situação. Como o caso da cláusula

geral da boa-fé não é um problema de boa-fé subjetiva, mas sim objetiva, no

sentido de comportamento, os holandeses preferiram mudar a expressão para

"exigências da razão e da eqüidade". De qualquer maneira, falam da boa-fé

criando deveres. Idem o art. 1.434 do Código do Quebec que, no caso, já fala

em boa-fé. O Projeto, para estar pelo menos de acordo com os dias de hoje,

deveria ter expressa a regra da criação dos deveres anexos.

O outro ponto, a propósito do supplendi das funções da cláusula de boa-fé,

refere-se às cláusulas faltantes. Às vezes as partes fazem o contrato e, por

omissão, falta de previsão ou incapacidade redacional, não incluem alguma

cláusula; teremos, então, uma omissão. Também o Código da Louisiana prevê

a falta de cláusula e atribui à boa-fé a idéia de pôr a cláusula que falta no lugar

da omissão.

A terceira função corrigendi a que me referi e é talvez a pior omissão do

Projeto do Código Civil no tema: "cláusulas abusivas". O nosso Código do

Consumidor, que veio muito depois do Projeto do Código Civil, está mais

atualizado do que este. O assunto das cláusulas abusivas não só tem um

elenco no art. 51 do Código como até o Ministério da Justiça publicou mais 29

— no mês de março de 1999 — cláusulas abusivas em matéria de planos de

saúde, de cartão de crédito, de transporte aéreo etc.

Page 27: Apostila de contratos 2

27

O que se passa no resto do mundo, a propósito disso, são referências à boa-fé,

como maneira de evitar as cláusulas abusivas. Por exemplo, no Código de

Quebec, em que se define o que é cláusula abusiva, é feita a distinção entre

contrato de consumo (le consommateur) e contrato de adesão, porque pode

haver contrato de adesão de quem não é consumidor. Considera, portanto,

abusiva a cláusula que leva à desvantagem o consumidor, ou aderente a

cláusula que, de uma maneira excessiva e irrazoável (déraisonnable), vá

contra as exigências da boa-fé. Mais adiante torna a acrescentar que é abusiva

especialmente a cláusula tão afastada das obrigações essenciais que desnatura

o contrato. O Código Civil holandês também define, em seu art. 248, o que é

cláusula abusiva e assim por diante.

Apontei insuficiências e deficiências a propósito da boa-fé nos contratos.

Agora, passarei a uma visão mais global, que demonstra que o paradigma do

Projeto de Código Civil está ultrapassado. Em primeiro lugar, qualquer cientista

hoje na Biologia, na Física ou na Química conhece um historiador das ciências

chamado Thomas Kuhn, que escreveu um livro chamado A estrutura das

revoluções científicas — Tradução por Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira.

São Paulo: Perspectiva, 1975. 262 p. (Debates; 115). Não trata de Direito,

mas define o que é paradigma, dizendo que o mundo intelectual caminha por

mudanças de paradigma. Um paradigma foi, por exemplo, na Astronomia, o de

Ptolomeu; outro, o de Copérnico. Um paradigma é o da geometria de Euclides;

outro, o da geometria não-euclidiana. Um da Biologia antes da genética, dos

gens; outro, o da genética, e assim por diante.

No caso do Direito — e isso é senso comum —, aquele paradigma do século

passado, da lei, do juiz autômato, da lei geral, universal, em que o juiz não

tinha papel algum, ficou ultrapassado.

Veio, então, um segundo paradigma, no qual o juiz ganhou um papel

importante, inclusive com os trabalhos sobre hermenêutica, o que trouxe

mudanças ao tipo de solução. E é isso o que Kuhn diz a propósito de

paradigma, que é uma espécie de modelo de solução que uma determinada

Page 28: Apostila de contratos 2

28

área do conhecimento apresenta para os problemas. O paradigma na visão de

Kuhn é um modelo que serve a um grupo que se dedica a algum tipo de

conhecimento, para solucionar os problemas que se apresentam.

O mundo inteiro, em todas as áreas, está acostumado a trabalhar com

problemas. Todo biólogo tem problema; todo físico tem problema. A maneira

como se soluciona o problema é o paradigma, e isso aprendemos na escola. O

professor transmite para o aluno; o aluno aprende e será operador do Direito

com o paradigma que recebeu. Daí uma certa dificuldade quando o paradigma

está em mudança ou quando o anterior entrou em crise. Muitos juristas,

muitos professores, no caso do Direito, recusam as inovações.

Após o da lei, o paradigma dito do juiz, daquele tempo em que o Estado era

intervencionista, era aquele que usava os famosos conceitos jurídicos

indeterminados, as cláusulas gerais; os conceitos indeterminados eram

principalmente o que chamo de "bando dos quatro" — à moda daquela

revolução cultural comunista —, quais sejam: função social, boa-fé, ordem

pública e interesse público.

O problema todo desses quatro conceitos é que eles não têm conteúdo, são

vazios do ponto de vista axiológico. Eles servem para retórica, e o mundo de

hoje não se conforma mais com esses conceitos vazios. O paradigma, que

antes era da lei, passou a ser o do juiz e hoje é o do caso concreto e da

Constituição. Hoje estamos fugindo do juiz. Essa fuga não é um problema do

Judiciário, ele vai decidir o que é da missão dele, que é conflito real, o caso

difícil, que exige ponderação. Mas o juiz é um julgador e, quando não há

necessidade desse julgador, não é preciso o juiz. Nesse sentido, há uma fuga

do juiz.

Aponto não só a Lei da Arbitragem, que é evidente, mas as instituições como a

Bolsa de Mercadorias e Futuros, como a CVM — Comissão de Valores

Mobiliários — a OAB, Conselho de Medicina e várias outras instituições cujos

problemas não deságuam no Judiciário. Fiquei perplexo quando tive de tratar

Page 29: Apostila de contratos 2

29

de um assunto acadêmico — uma tese sobre a Bolsa de Mercadorias e Futuros

— e verifiquei que todos os dias há milhões e milhões de reais que se

transferem entre pessoas que negociam na Bolsa de Mercadorias e Futuros.

Nenhum caso da Bolsa de Mercadorias e Futuros está no Poder Judiciário! As

pessoas estão fugindo da estrutura do Judiciário, própria do paradigma

anterior. As escolhas, hoje em dia, recaem em apelar para a Constituição e

outros tipos de soluções. O Projeto de Código Civil infelizmente volta a insistir

na presença do juiz para muita coisa. O Projeto está no paradigma do Estado

inchado.

Os conceitos indeterminados — o "bando dos quatro" a que me referi —

continuam a ser usados hoje, mas agora com diretrizes materiais. A

Constituição, sobre a função social, não se limitou a dizer que a propriedade

tem função social, como está no art. 5º. Na verdade, disse o que era função

social no art. 182, § 2º, para os imóveis urbanos e para a propriedade rural no

art. 186. Ou seja, dá diretrizes, não é um jogo de palavras retórico.

Com relação à boa-fé, todos os códigos modernos dão diretrizes. O Código Civil

holandês diz que a boa-fé deve ser vista de acordo com o Direito holandês, de

acordo com o interesse das partes, combinado com o interesse coletivo.

Procura-se dar ao juiz alguma diretiva; uma diretriz para o conceito.

Evidentemente, há normas de ordem pública — um tipo de situação da qual se

fala tanto — que são as cogentes: estas continuam, sem problema. O

problema real do conceito indeterminado de ordem pública é quando se fala

em "princípio" de ordem pública e não em "regra" de ordem pública. A regra

de ordem pública é a cogente, mas, quando se fala em princípio e que aí não

tem definição, a tendência hoje é recusar esse emprego vago. Na verdade,

deve-se fazer a distinção entre ordem pública de direção — que era aquela

econômica, própria da primeira metade do século — e a ordem pública de

proteção às pessoas mais fracas — que se reflete em normas cogentes. A

ordem pública de direção, hoje encarada como princípio, está limitada à

dignidade humana. Quando alguma norma, alguma decisão, algum contrato

Page 30: Apostila de contratos 2

30

quebra a dignidade humana, podemos dizer que ela quebra o princípio de

ordem pública; mas daí extravasar para uma ordem pública de ordem

econômica já não está no mundo de hoje.

Todo código implica um certo desgaste social e um trabalho muito grande para

os operadores do Direito. O meu ponto de vista é que o Projeto de Código Civil

é um pouco, só um pouco mais adiantado do que o Código Civil vigente. Claro,

porque um é de 1916 e o outro é de 1970. Porém, não concordo — tendo em

vista as mudanças do mundo de hoje — em adotarmos, para o ano 2000, um

Projeto, que é de 1970, por uma pequena melhora em relação ao Código Civil.

Não vale, tudo posto na balança, o desgaste que isso representa e aquilo que

vai resultar para nós. A questão não é só o Código Civil, e sim, todo o Direito

Civil, e o Direito Civil como está é superior ao Direito Civil como ficaria, se

fosse aprovado o Projeto.

O Dr. Antonio Junqueira de Azevedo é Professor da Universidade de São

Paulo.

A FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS, A BOA-FÉ OBJETIVA E AS

RECENTES SÚMULAS DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.16

Flávio Tartuce.17

Sumário: 1. INTRODUÇÃO. 2. A SÚMULA 308 DO SUPERIOR TRIBUNAL

DE JUSTIÇA: A RESTRIÇÃO DOS EFEITOS DA HIPOTECA.. 3. A

SÚMULA 302 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: A ABUSIVIDADE

DA CLÁUSULA RESTRITRIVA DE INTERNAÇÃO EM CONTRATOS DE

PLANO DE SAÚDE. 3. AS SÚMULAS 297 E 285 DO SUPERIOR

16 Artigo publicado na Revista científica da Escola Paulista de Direito (EPD – São Paulo). Ano I. N. I. Maio/Agosto de 2005. Coordenação científica Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka. 17 Graduado pela Faculdade de Direito da USP em 1998. Especialista em Direito Contratual pela COGEAE-PUC/SP. Mestre em Direito Civil Comparado pela PUC/SP. Professor dos cursos de pós-graduação em Direito Civil, Direito Civil e Processo Civil e Direito Empresarial da Escola Paulista de Direito (EPD). Autor e colaborador de obras jurídicas. Advogado em São Paulo. Site: www.flaviotartuce.adv.br.

Page 31: Apostila de contratos 2

31

TRIBUNAL DE JUSTIÇA. A APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO

CONSUMIDOR ÀS INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS E FINANCEIRAS. 4. A

SÚMULA 286 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: A POSSIBILIDADE

DE REVISÃO DE CONTRATOS OBJETO DE NOVAÇÃO. 5. REFERÊNCIA

BIBLIOGRÁFICAS.

1. INTRODUÇÃO.

Em nosso livro A Função Social dos Contratos, tivemos a oportunidade de

demonstrar toda a evolução pela qual vem passando o contrato,

particularmente todas as alterações substanciais pelas quais vem passando

esse instituto, que é basilar e fundamental não só para o Direito Civil, como

para todo o Direito Privado.18

Não vamos, aqui, repetir todos os conceitos que constaram naquela obra.

Na realidade, o presente trabalho serve como atualização antecipada do nosso

trabalho, trazendo novos tratamentos jurisprudenciais dados tanto em relação

à função social dos contratos quanto à boa-fé objetiva. Isso, inclusive, para

demonstrar que a jurisprudência de nossos Tribunais superiores vêm

acompanhando essa tendência.

De qualquer forma, pertinente lembrar que, pela função social dos

contratos, os negócios jurídicos patrimoniais devem ser analisados de acordo

com o meio social. Não pode o contrato trazer onerosidades excessivas,

desproporções, injustiça social.19 Também, não podem os contratos violar

18 Flávio Tartuce. A Função Social dos Contratos. Do Código de Defesa do Consumidor ao Novo Código Civil. São Paulo: Método, 2005. 19 Não se pode esquecer que o contrato é importante fonte obrigacional. Nesse sentido, Nelson Rosenvald, um dos mais brilhantes juristas da nova geração sintetiza muito bem como deve ser encarada a obrigação atualmente: “A obrigação deve ser vista como uma relação complexa, formada por um conjunto de direitos, obrigações e situações jurídicas, compreendendo uma série de deveres de prestação, direitos formativos e outras situações jurídicas. A obrigação é tida como um processo – uma série de atos relacionados entre si -, que desde o início se encaminha a uma finalidade: a satisfação do interessa na prestação. Hodiernamente, não mais prevalece o status formal das partes, mas a finalidade à qual se dirige a relação dinâmica. Para além da perspectiva tradicional de subordinação do devedor ao credor existe o bem comum da relação obrigacional, voltado para o adimplemento, da forma mais satisfativa ao credor e menos onerosa ao devedor. O bem comum na relação obrigacional traduz a solidariedade mediante a cooperação dos indivíduos para a satisfação dos interesses patrimoniais recíprocos, sem comprometimento dos direitos da

Page 32: Apostila de contratos 2

32

interesses metaindividuais ou interesses individuais relacionados com a

proteção da dignidade humana, conforme reconhece Enunciado n. 23 do

Conselho da Justiça Federal, aprovado na I Jornada de Direito Civil.20

Assim sendo, entendemos que a função social dos contratos traz

conseqüências dentro do contrato (intra partes) e também para fora do

contrato (extra partes).

Como efeito intra partes, citamos a previsão do art. 413 do novo Código

Civil, exemplo típico de relativação da força obrigatória do contrato (pacta sunt

servanda), justamente uma das conseqüências da função social dos negócios

jurídicos. Por esse dispositivo, o juiz deve reduzir o valor da cláusula penal se

a obrigação tiver sido cumprida em parte ou se entender que a multa é

excessivamente onerosa. Como o comando legal utiliza-se a expressão “deve”

a redução é de ofício, sem a necessidade de argüição pela parte interessada.

Isso é confirmado pela natureza jurídica do princípio da função social dos

contratos, de ordem pública, conforme previsão do art. 2.035, parágrafo único,

do próprio Código Civil.21

Como exemplo de efeitos extra partes, citamos um caso em que o

contrato, pelo menos aparentemente, é bom para as partes, mas ruim para a

sociedade. Podemos citar um contrato celebrado entre uma empresa e uma

agência de publicidade. O contrato é civil e paritário, não trazendo qualquer

desequilíbrio ou quebra do sinalagma. Entretanto, a publicidade veiculada é

discriminatória (publicidade abusiva – art. 37, § 2º do CDC), estando nesse

ponto presente o vício. Pela presença do abuso de direito, o contrato pode ser

personalidade e da dignidade do credor e devedor” (Dignidade Humana e Boa-Fé. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 204). 20 “Art. 421: a função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana”. 21 Entendemos que a função social do contrato tem respaldo na Constituição Federal. Primeiro, na tríade dignidade-solidariedade-igualdade, que consubstancia o Direito Civil Constitucional, constantes dos arts. 1º, 3º e 5º da Norma Fundamental. Segundo, na função social da propriedade (art. 5º, XXII e XXIII e art. 170, III da CF/88) (Flávio Tartuce. Função Social dos Contratos, ob, cit.). Sobre o Direito Civil Constitucional recomendamos a leitura da obra de Gustavo Tepedino (Temas de Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2004).

Page 33: Apostila de contratos 2

33

tido como nulo, combinando-se os arts. 187 e 166, VI, do novo Código Civil –

nulidade por fraude à lei imperativa diante do ato emulativo.22

Ao lado da função social dos contratos, a boa-fé objetiva procura valorizar

a conduta de lealdade dos contratantes em todas as fases contratuais (art. 422

do novo Código Civil - função de integração da boa-fé).

Na dúvida, os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a

boa-fé (art. 113 do novo Código Civil – função de interpretação da boa-fé).

Em reforço, lembramos a interpretação a favor do consumidor (art. 47 do

CDC) e do aderente (art. 423 do novo Código Civil).

Por fim, a boa-fé objetiva está relacionada com deveres anexos, inerentes

a qualquer negócio. A quebra desses deveres caracteriza o abuso de direito

(art. 187 do novo Código Civil – função de controle da boa-fé).

Sem dúvidas, esses dois princípios trazem uma nova dimensão contratual.

Felizmente, antes mesmo do novo Código Civil a nossa melhor jurisprudência

já vinha aplicando ao contrato esses novos paradigmas.

Superou-se a tese pela qual o contrato visa principalmente a segurança

jurídica. Na realidade, o contrato tem a principal função de atender à pessoa e

aos interesses da coletividade, diante da tendência de personalização do

Direito Privado.23 Essa a real função dos contratos!

As súmulas a seguir, felizmente, servem para demonstrar essa tendência.

Passamos a analisar o seu conteúdo.

2. A SÚMULA 308 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: A

RESTRIÇÃO DOS EFEITOS DA HIPOTECA.

Prevê a Súmula 308 do Superior Tribunal de Justiça que: “A hipoteca

firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à

22 Vale citar uma passagem de Luigi Ferri, citando Acarelli no sentido de que o juiz deverá anular qualquer acordo de vontades pela simples ocorrência de um dano potencial à sociedade, mesmo que haja algum outro interesse comum (Luigi Ferri. La Autonomia Privada. Tradução e notas em espanhol por Luis Sancho Mendizibal. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1969, p. 438) 23 Sobre a personalização do Direito Privado, recomendamos as contribuições de Luiz Edson Fachin, particularmente a brilhante obra Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo (Rio de Janeiro: Renovar, 2001).

Page 34: Apostila de contratos 2

34

celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os

adquirentes do imóvel”. Trata-se de súmula com relevante enfoque sociológico.

Ora, sabe-se que a hipoteca é um direito real de garantia sobre coisa

alheia, que recai principalmente sobre bens imóveis, tratada entre os arts.

1.473 a 1.505 do atual Código Civil. Sem prejuízo dessas regras especiais, a

codificação traz ainda regras gerais quanto aos direitos reais de garantia, entre

os seus artigos 1.419 a 1.430.

Um dos principais efeitos da hipoteca é a constituição de um vínculo real,

que acompanha a coisa (art. 1.419). Esse vínculo real tem efeitos erga omnes,

dando direito de excussão ao credor hipotecário, contra quem esteja o bem

(art. 1.422).

Exemplificando, se um imóvel é garantido pela hipoteca, é possível que o

credor reivindique o bem contra terceiro adquirente do bem, o que traz o que

se denomina direito de seqüela. Assim, não importa se o bem foi transferido a

terceiro; esse também perderá o bem, mesmo que o tenha adquirido de boa-

fé.24

A constituição da hipoteca é muito comum em contratos de construção

e incorporação imobiliária, visando um futuro condomínio edilício. Como

muitas vezes o construtor não tem condições econômicas para levar a frente

a sua obra, celebra um contrato de empréstimo de dinheiro com um terceiro

(agente financeiro ou agente financiador), oferecendo o próprio imóvel como

garantia, o que inclui todas as suas unidades do futuro condomínio.

24 Marco Aurélio S. Viana comenta muito bem esse efeito da hipoteca: “O que caracteriza o direito real de garantia é a vinculação de um bem ao cumprimento da obrigação. Sua função é assegurar ao credor a satisfação do crédito, colocando-o a cavaleiro da insolvência do devedor (Cf. Orlando Gomes, Direitos Reais, cit., v. 2, p. 468; Clóvis Bevilacqua, Direito das Coisas, cit., v. 2, p. 10). O titular do direito goza de seqüela e preferência. Vinculado o bem à garantia de uma prestação, sua transmissão implica na do gravame. Isso equivale a dizer que o titular do direito real de garantia acompanhará o bem, exigindo a satisfação do crédito, pouco importando em mãos de quem ele esteja. O valor do bem está afeto à satisfação do crédito. Assim, quem adquire imóvel hipotecado, por exemplo, poderá vê-lo levado à venda para pagamento da dívida que garantia. É o direito de seqüela” (Comentários ao Novo Código Civil. Volume XVI. Coordenador: Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 700).

Page 35: Apostila de contratos 2

35

Iniciada a obra, o incorporador começa a vender as unidades para

terceiros, que no caso são consumidores, pois é evidente a caracterização

da relação de consumo, nos moldes dos arts. 2º e 3º da Lei n. 8.078/90.

Diante da boa-fé objetiva e da força obrigatória que ainda rege os

contratos, espera-se que o incorporador cumpra com todas as suas

obrigações perante o agente financiador, pagando pontualmente as parcelas

do financiamento. Assim sendo, não haverá maiores problemas.

Mas, infelizmente, como nem tudo são flores, nem sempre isso ocorre.

Em casos tais, quem acabará perdendo o imóvel, adquirido a tão duras

penas? O consumidor, diante do direito de seqüela advindo da hipoteca.

A referida súmula visa justamente proteger o último, restringindo os

efeitos da hipoteca às partes contratantes. Isso, diante da boa-fé objetiva, já

que aquele que adquiriu o bem pagou pontualmente as suas parcelas frentes à

incorporadora, ignorando toda a sistemática jurídica que rege a incorporação

imobiliária.

Presente a boa-fé do adquirente, não poderá ser responsabilizado o

consumidor pela conduta da incorporadora, que acaba não repassando o

dinheiro ao agente financiador. Fica claro, pelo teor da súmula, que a boa-fé

objetiva também envolve ordem pública, pois caso contrário não seria possível

a restrição do direito real.25

Aliás, concluímos que a boa-fé objetiva é princípio de ordem pública

interpretando o art. 167, § 2º, do novo Código Civil, que traz a inoponibilidade

25 A referência à boa-fé é expressa no recente julgado a seguir transcrito, do próprio STJ, já aplicando a recente súmula 380: “CIVIL E CONSUMIDOR. IMÓVEL. INCORPORAÇÃO. FINANCIAMENTO. SFH. HIPOTECA. TERCEIRO ADQUIRENTE. BOA-FÉ. NÃO PREVALÊNCIA DO GRAVAME. 1 - O entendimento pacificado no âmbito da Segunda Seção deste STJ é no sentido de que, em contratos de financiamento para construção de imóveis pelo SFH, a hipoteca concedida pela incorporadora em favor do Banco credor, ainda que anterior, não prevalece sobre a boa-fé do terceiro que adquire, em momento posterior, a unidade imobiliária. Súmula 308 do Superior Tribunal de Justiça. 2 - Recurso especial conhecido, mas não provido” (STJ, REsp 625045 / GO ; RECURSO ESPECIAL 2003/0229385-3, RELATOR: Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, Julgamento: 17/05/2005, Publicação: DJ 06.06.2005).

Page 36: Apostila de contratos 2

36

do ato simulado frente a terceiros e boa-fé. Esclarecemos. Como se sabe, a

simulação gera, em regra, a nulidade absoluta do negócio celebrado. Mas essa

nulidade absoluta, que envolve ordem pública, não poderá ser oposta frente a

terceiros de boa-fé. Pois bem, se o princípio da boa-fé não envolvesse ordem

pública, a boa conduta não faria frente ao ato simulado.

Superado esse ponto, entendemos que a súmula 308 do STJ também

mantém relação com o princípio da função social dos contratos, já que visa

preservar os efeitos do contrato de compra e venda do imóvel a favor do

consumidor, parte economicamente mais fraca. Por essa simples razão, já

mereceria os nossos aplausos.

Mas a súmula visa também proteger o direito à moradia, assegurado

constitucionalmente, no art. 6º da Carta Política de 1988. Reforçando, tende-

se a preservar o negócio jurídico, diante do principio da conservação negocial,

inerente à concepção social do contrato.26

Concluindo, percebe-se que a eticidade e a socialidade acabam fazendo

milagres no campo prático, relativizando o rigor formal da concepção dos

direitos reais, em prol da proteção do vulnerável, do hipossuficiente, daquele

que sempre agiu conforme a boa-fé.

3. A SÚMULA 302 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: A

ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA RESTRITRIVA DE INTERNAÇÃO EM

CONTRATOS DE PLANO DE SAÚDE.

Não se pode esquecer da grande importância do Código de Defesa do

Consumidor para os contratos, uma vez que a grande maioria dos negócios

jurídicos patrimoniais são de consumo, enquadrados nos arts. 2º e 3º da Lei

n. 8.078/90.

Por muito tempo, afirmou-se que, havendo relação jurídica de consumo

não seria possível a aplicação concomitante do Código Civil e do Código de

26 Interessante aqui transcrever o Enunciado n. 22 do Conselho da Justiça Federal, também da I Jornada de Direito Civil, que traz a relação entre função social e conservação contratual: “Art. 421: a função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral, que reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas”.

Page 37: Apostila de contratos 2

37

Defesa do Consumidor. Isso, na vigência do Código anterior, eminentemente

individualista e muito distante da proteção do vulnerável constante da Lei

Consumerista.

Entretanto, atualmente e ao contrário, tem-se defendido um “diálogo das

fontes” entre o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor. Por meio

desse diálogo, deve-se entender que os dois sistemas não se excluem, mas se

complementam. A tese foi trazida para o Brasil por Cláudia Lima Marques,

utilizando os ensinamentos de Erik Jayme.27 Isso se dá diante de uma

aproximação principiológica entre os dois sistemas legislativos, principalmente

no que tange aos contratos.28

27 Cláudia Lima Marques demonstra as razões filosóficas e sociais da tese do “diálogo da fontes”: “Segundo Erik Jayme, as características da cultura pós-moderna no direito seriam o pluralismo, a comunicação, a narração, o que Jayme denomina de ‘le retour des sentiments’, sendo o Leitmotiv da pós-modernidade a valorização dos direitos humanos. Para Jayme, o direito como parte da cultura dos povos muda com a crise da pós-modernidade. O pluralismo manifesta-se na multiplicidade de fontes legislativas a regular o mesmo fato, com a descodificação ou a implosão dos sistemas genéricos normativos (Zersplieterung), manifesta-se no pluralismo de sujeitos a proteger, por vezes difusos, como o grupo de consumidores ou os que se beneficiam da proteção do meio ambiente, na pluralidade de agentes ativos de uma mesma relação, como os fornecedores que se organizam em cadeia e em relações extremamente despersonalizadas. Pluralismo também na filosofia aceita atualmente, onde o diálogo é que legitima o consenso, onde os valores e princípios têm sempre uma dupla função, o ‘double coding’, e onde os valores são muitas vezes antinômicos. Pluralismo nos direitos assegurados, nos direitos à diferença e ao tratamento diferenciado aos privilégios dos ‘espaços de excelência’ (JAYME, Erik. Identité culturelle et intégration: le droit internacionale privé postmoderne. Recueil des Cours de l’Académie de Droit International de la Haye, 1995, II, Kluwer, Haia, p. 36 e ss)” (MARQUES, Cláudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. Introdução. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 24). 28 Sobre essa aproximação, aliás, foi aprovado o Enunciado nº 167 na III Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal em dezembro último, com o seguinte teor: “Com o advento do Código Civil de 2002, houve forte aproximação principiológica entre esse Código e o Código de Defesa do Consumidor, no que respeita à regulação contratual, uma vez que ambos são incorporadores de uma nova teoria geral dos contratos”. As razões apontadas pelo magistrado paraibano e jovem civilista Wladimir Alcibíades Marinho Falcão Cunha, autor da proposta, são pertinentes, merecendo transcrição o seguinte trecho: “Entretanto pode-se dizer que, até o advento do Código Civil de 2002, somente o Código de Defesa do Consumidor encampava essa nova concepção contratual, ou seja, somente o CDC intervinha diretamente no conteúdo material dos contratos. Entretanto, o Código Civil de 2002 passou também a incorporar esse caráter cogente no trato das relações contratuais, intervindo diretamente no conteúdo material dos contratos, em especial através dos próprios novos princípios contratuais da função social, da boa-fé objetiva e da equivalência material.Assim, a corporificação legislativa de uma atualizada teoria geral dos contratos protagonizada pelo CDC teve sua continuidade com o advento do Código Civil de 2002, o qual, a exemplo daquele, encontra-se carregado de novos princípios jurídicos contratuais e cláusulas gerais, todos hábeis a proteção do

Page 38: Apostila de contratos 2

38

Pretendemos analisar a Súmula 302 do STJ à luz desse diálogo de

complementariedade entre os dois sistemas, “a permitir a aplicação

simultânea, coerente e coordenada das plúrimas fontes legislativas”.29 Prevê a

referida súmula que “é abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que

limita no tempo o internação hospitalar do segurado”.

A súmula somente consubstancia o que já vinha entendendo tanto a

doutrina quanto a jurisprudência.30 A abusividade da cláusula é flagrante,

enquadrando-se inicialmente no art. 51, I, da Lei n. 8.078/90, pela qual é nula

a cláusula que exonerem ou atenuem a responsabilidade do prestador do

serviço. Além dessa previsão, a referida cláusula já era vedada expressamente

pela Portaria n. 3, de 19 de março de 1999, da Secretaria de Direito

Econômico do Ministério da Justiça.31

Fazendo um necessário “diálogo das fontes”, a cláusula de limitação de

internação poderia também ser considerada abusiva pelo que consta do art.

424 do atual Código Civil, já que o contrato em questão assume a forma de

adesão, sendo o seu conteúdo imposto unilateralmente pela empresa de plano

de saúde.

Isso porque o comando legal em questão prevê a nulidade absoluta, nos

contratos de adesão, das cláusulas que implicam em renúncia prévia a direito

consumidor mais fraco nas relações contratuais comuns, sempre em conexão axiológica, valorativa, entre dita norma e a Constituição Federal e seus princípios constitucionais. Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002 são, pois, normas representantes de uma nova concepção de contrato e, como tal, possuem pontos de confluência em termos de teoria contratual, em especial no que respeita aos princípios informadores de uma e de outra norma” (Proposta enviada por e-mail pelo próprio Conselho da Justiça Federal aos participantes da III Jornada). 29 Marques, Cláudia Lima, Comentários, ob. cit., p. 26. 30 Por todos os julgados, transcrevemos o seguinte: “CONTRATO - Plano de saúde - Contrato de adesão - Relatividade das volições contratuais - Cláusula limitativa - Internação em unidade de terapia intensiva (UTI) - Prazo exíguo de 15 dias anuais com prorrogação dependente unicamente do critério da prestadora de serviço - Nulidade - Predominância do direito à vida sobre qualquer outro - Criação de vantagem exagerada para o convênio e restrição do direito para o conveniado - Lei Federal n. 8.078, de 1990 (art. 5º, IV) - Recurso provido”. (Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível n. 144.424-4/0 - São Paulo - 4ª Câmara de Direito Privado de Férias “Janeiro/2004" - Relator: Munhoz Soares - 29.01.04 - V. U.) 31 A portaria, regulamentando o art. 51 do CDC, considera abusivas, dentre outras, as cláusulas que: “2. Imponham, em contratos de planos de saúde firmados anteriormente à Lei 9665/98, limites ou restrições a procedimentos médicos (consultas, exames médicos, laboratoriais e internações hospitalares, UTI e similares) contrariando prescrição médica”.

Page 39: Apostila de contratos 2

39

resultante da natureza do negócio. Ora, pela referida cláusula está sendo

limitado o uso do serviço pelo aderente, que é o principal objetivo do contrato

celebrado entre as partes.

Partindo-se para a análise principiológica da referida súmula, observa-se,

de imediato, que a mesma traz aplicação direta do princípio da função social

dos contratos, relativizando a força obrigatória (efeito inter partes).

Podemos também citar o já mencionado Enunciado n. 23 do Conselho da

Justiça Federal, uma vez que a autonomia contratual não pode prevalecer

diante de um interesse maior, relacionado com a vida e com a integridade

física do segurado, direitos da personalidade relacionados com a dignidade

humana. Vale lembrar que os direitos da personalidade são irrenunciáveis

(art. 11 do novo Código Civil). Pela cláusula de limitação de internação, o

contratante renuncia ao direito de ser tratado como se espera, principalmente

num caso de gravidade, em unidade de tratamento intensivo (UTI). Sem

prejuízo de tudo isso, entendemos que a cláusula de limitação traz no seu

conteúdo um abuso de direito (art. 187 do novo Código Civil), a gerar a sua

nulidade por fraude à lei imperativa (art. 166, VI, do nCC).

Em reforço, a parte que impõe a referida cláusula desrespeita o dever

anexo de lealdade e, com isso, a boa-fé objetiva que se espera nas relações

negociais.32 Percorre-se o mesmo caminho: pela quebra da boa-fé, caracteriza-

se o abuso de direito a gerar a nulidade absoluta do referida cláusula.

De qualquer forma, não se pode esquecer que a cláusula é nula, mas deve

preservado todo o resto do contrato, aplicação direta do art. 51, § 2º do

Código de Defesa do Consumidor, que consagra o princípio da conservação

contratual na ótica consumerista.33

32 Sobre a quebra dos deveres anexos, relacionados com a boa-fé objetiva, vale conferir o teor do Enunciado n. 24, também da I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal: “Art. 422: em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422 do novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa”. 33 “Art. 51. (...) §2º A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes”. Já tivemos a oportunidade de demonstrar a relação entre o princípio da conservação do contrato e a função social, lembrando a proteção do ato jurídico perfeito, que consta do art. 5º, XXXVI da CF/88 e a importante função que o contrato exerce para a sociedade. Assim sendo, a nulidade deve ser o último recurso (Tartuce,

Page 40: Apostila de contratos 2

40

Feitas essas observações e ressalvas, manifestamos o nosso entusiasmo e

a nossa concordância integral em relação à Súmula 302 do STJ, que atende

àquela visualização personalizada do Direito Contratual, pela qual o principal

objetivo dos negócios jurídicos patrimoniais é atender aos interesses da

pessoa. Isso, sintonizada, com o Direito Civil Constitucional e os seus três

princípios máximos: a proteção da dignidade humana (art. 1º, III, da CF/88),

a solidariedade social (art. 3º, I, da CF/88) e a igualdade em sentido amplo

(art. 5º, caput, da CF/88).

4. AS SÚMULAS 297 E 285 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE

JUSTIÇA. A APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

ÀS INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS E FINANCEIRAS.

Ainda em relação ao Código de Defesa do Consumidor, duas

importantes súmulas do Superior Tribunal de Justiça prevêem a sua

aplicação em dois casos muito comuns da prática contratual: aos contratos

bancários e financeiros. Transcreveremos o teor das ementas de forma

destacada para uma análise conjunta:

“Súmula 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às

instituições

financeiras”

“Súmula 285: Nos contratos bancários posteriores ao Código de

Defesa do

Consumidor incide a multa moratória nele prevista”.

As duas ementa sepultam de vez a suposta discussão quanto à existência

ou não de relação de consumo nos contratos celebrados com as instituições

bancárias e financeiras.

Dizemos suposta, e de forma destacada, pois sempre nos pareceu clara a

possibilidade de aplicação da Lei n. 8.078/90 ao contratos celebrados entre

correntistas/destinatários finais e instituições bancárias e financeiras. Aliás,

entender ao contrário sepultaria a efetividade prática do Código de Defesa do

Flávio. A Função Social dos Contratos. Do Código de Defesa do Consumidor ao Novo Código Civil. São Paulo: Método, 2005, p. 104). .

Page 41: Apostila de contratos 2

41

Consumidor em nosso País. Por certo que o grande interesse social relacionado

com a norma consumerista é vê-la aplicada às relações jurídicas que as

pessoas mantém com as instituições bancárias e financeiras.

A possibilidade ou, mais do que isso, a necessidade de aplicação do

Código de Defesa do Consumidor fica clara pelo que consta do art. 3º, § 2º, da

Lei n. 8.078/90, pelo qual “serviço é qualquer atividade fornecida no mercado

de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária,

financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de

caráter trabalhista” (destacamos). Norma mais clara não há!

De qualquer forma, os bancos, por meio da Confederação Nacional do

Sistema Financeiro (Consif) propuseram uma ação declaratória de

inconstitucionalidade desse comando consumerista, que recebe o número

2.591/2003. Nessa ação pretendem que o CDC não seja aplicado às relações

bancárias. Com todo o respeito em relação às razões que constam da referida

ação, com ela não concordamos em hipótese alguma.

A referida ADIN, para nós, é totalmente destoada da principiologia

adotada pela Constituição Federal de 1988 que protege os consumidores de

forma expressa (art. 5º, XXXII e art. 170, V). A não aplicação do CDC aos

bancos viola a própria dignidade humana e a solidariedade social,

particularmente a tendência de personalização do Direito Privado. Essa não

incidência entra em conflito também com a função social dos contratos e a

boa-fé objetiva, regramentos sociais indeclináveis que corporificam uma nova

realidade contratual.

Esperamos, portanto, que a ADIN n. 2.591/2001 não obtenha êxito. Na

verdade, entendemos que a mesma está prejudicada pela entrada em vigor no

novo Código Civil, que confirma a tendência de proteção dos mais fracos, dos

mais frágeis.34

34 Concordamos integralmente com a notas do advogado e professor Paulo R. Roque A Khouri em relação à referida ADIN: “Ora, da forma como a questão é colocada na ADIn nº 2.591, o consumidor jamais poderia valer-se das normas protetivas do CDC, principalmente, do art. 6º, V, para questionar, v. g., juros bancários ‘pactuados’ em 500% ao ano. Tal entendimento contraria, ao meu sentir, a própria Constituição Federal que elegeu a ‘defesa do consumidor’, no seu art. 5º, XXXII, como um direito e garantia fundamental. De mesma forma, ao lado da própria função social da propriedade, da livre concorrência, a defesa do consumidor é princípio da ordem econômica de acordo com o art. 170 da Constituição. Impedir ao consumidor o direito de questionar a justiça da pactuação da cláusula de juros implica negar vigência a um direito e garantia

Page 42: Apostila de contratos 2

42

Com o insucesso da ADIN, continuarão a ter aplicação as referidas

súmulas, com a aplicação do CDC aos contratos bancários e financeiros, entre

os últimos, o caso dos contratos de cartão de crédito. De qualquer forma, o

que falta ainda à jurisprudência brasileira é limitar as taxas de juros cobrada

por tais instituições, o que não vem ocorrendo, diante da vigência de duas

outras súmulas de nossos Tribunais Superiores.

A Súmula 596 do STF prevê que as instituições bancárias não estão

sujeitas à Lei de Usura (Decreto-lei 22.626/1933), sendo perfeitamente

possível a livre convenção de juros, o que vem sendo aplicado pelo STJ.35 A

recente Súmula 283 do STJ prevê o mesmo para as empresas administradoras

de cartão de crédito. Já manifestamos nossa discordância em relação às

referidas súmulas.36

Na situação descrita vemos um paradoxo: duas súmulas prevêem a

aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários e

financeiros; mas duas outras trazem a livre convenção dos juros. Em outras

palavras: as Súmulas 297 e 285 do STJ tendem a proteger os consumidores; fundamental, como se fosse dada à instituição financeira uma carta branca para livremente explorar a sua propriedade, sem atentar-se para sua função social”. (Direito do Consumidor. São Paulo: Atlas, 2ª Edição, 2005, p. 64) 35 Por todos os julgados, transcrevemos o seguinte: “CONTRATO BANCÁRIO. APLICABILIDADE DO CDC EM TESE. CASO CONCRETO EM QUE NÃO INCIDE. ABUSIVIDADE INDEMONSTRADA. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO N. 596 DA SÚMULA STF. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA À TAXA MÉDIA DE MERCADO. LEGALIDADE. RECURSO PARCIALMENTE ACOLHIDO. I - A norma protetiva do consumidor, mais nova e específica, regula situações apenas genericamente subordinadas à regra ampla do Sistema Financeiro Nacional. Não sendo caso de aplicação do Código de Defesa do Consumidor, ou não sendo demonstrada abusividade, aplica-se a jurisprudência tradicional sobre o tema, refletida no enunciado n. 596 da súmula do Supremo Tribunal Federal. II - Consoante se tem proclamado, a comissão de permanência "é aferida pelo Banco Central do Brasil com base na taxa média de juros praticada no mercado pelas instituições financeiras e bancárias que atuam no Brasil, ou seja, ela reflete a realidade desse mercado de acordo com o seu conjunto, e não isoladamente, pelo que não é o banco mutuante que a impõe" (Superior Tribunal de Justiça, ACÓRDÃO: RESP 374356/RS (200101533375), 485166 RECURSO ESPECIAL, DATA DA DECISÃO: 12/03/2003, ORGÃO JULGADOR: - SEGUNDA SEÇÃO, RELATOR: MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, RELATOR ACÓRDÃO: MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, FONTE: DJ DATA: 19/05/2003 PG: 00120, VEJA: JUROS ALÉM DO LIMITE DA LEI DE USURA) STJ - RESP 214003-SC, RESP 221942-RS, RESP 235380-MG, RESP 196253-RS). 36 Tartuce, Flávio. A Função Social dos Contratos, ob. cit., p. 291.

Page 43: Apostila de contratos 2

43

as Súmulas 596 do STF e 283 do STJ tentem a beneficiar as entidades

bancárias e financeiras.37

Se isso ocorre quanto aos juros convencionais, infelizmente; o mesmo

não se pode dizer quanto à multa moratória, felizmente. Isso porque a

cláusula penal é limitada em dois por cento (2%) sobre o valor da dívida tanto

nos casos de contratos bancários quantos nos contratos financeiros - repita-

se, o caso do contrato de cartão de crédito.

A Súmula 285 do STJ prevê essa limitação de forma expressa para os

contratos celebrados na vigência do CDC. Não faz o mesmo, de forma

expressa, a Súmula 297, mas isso é decorrência lógica do seu teor, já que a

referida multa consta da própria lei consumerista. Para ilustrar, reportamo-nos

à ementa transcrita na última nota de rodapé.

Mais uma vez, manifestamos nosso contentamento em relação às duas

últimas súmulas, adaptadas à nova Teoria Geral dos Contratos e aos novos

paradigmas contratuais. Lembramos que as súmulas apenas consubstanciam o

que a doutrina consumerista especializada sempre defendeu em relação aos

contratos bancários e financeiros. As ementas vieram em boa hora, para que

não pairem mais dúvidas em relação ao seu conteúdo.

5. A SÚMULA 286 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: A

POSSIBILIDADE DE REVISÃO DE CONTRATOS OBJETO DE NOVAÇÃO.

Como se sabe, a novação (arts. 360 a 367 do novo Código Civil) pode ser

conceituada como uma forma de pagamento indireto em que ocorre a

substituição de uma obrigação anterior por uma obrigação nova, diversa da

primeira criada pela partes. Seu principal efeito é a extinção da dívida

primitiva, com todos os acessórios e garantias, sempre que não houver

37 Não podemos concordar com julgados como o seguinte, em que fica clara a mencionada contradição: “CONTRATO - Cartão de crédito - Reconhecida a ocorrência de abusividade na conduta da administradora ao auferir lucro no repasse do financiamento - Declarada a nulidade da cláusula, por ser potestativa, nos termos da lei civil e do Código de Defesa do Consumidor (artigo 51, IV, X e XII) - Determinado o recálculo do saldo, com aplicação da taxa mensal de juros, mais os encargos pertinentes a serem comprovados, além da multa moratória (2%), afastando-se a verba relativa a honorários advocatícios decorrentes da cobrança administrativa - Inaplicabilidade, porém, do limite de juros de 12% ao ano, por depender o artigo 192, § 3º, da Constituição Federal de regulamentação por lei complementar - Ação parcialmente procedente - Recurso provido em parte - Voto vencido” (Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, PROCESSO: 1142957-7, RECURSO: Apelação, ORIGEM: São Paulo, JULGADOR: 3ª Câmara de Férias de Julho de 2003, JULGAMENTO: 03/08/2004, RELATOR: Maia da Rocha)

Page 44: Apostila de contratos 2

44

estipulação em contrário (art. 364 do novo Código Civil). Aliás, havendo a

referida previsão em contrário, autorizada pela própria lei, haverá novação

parcial. Podem as partes convencionar o que será extinto, desde que isso não

contrarie a ordem pública, a função social dos contratos e a boa-fé objetiva.

A novação não produz, como ocorre no pagamento direto, a satisfação

imediata do crédito. Por envolver mais de um ato volitivo, constituiu para nós

negócio jurídico e forma de pagamento indireto.

São elementos essenciais da novação a existência de uma obrigação

anterior (obrigação antiga) e de uma nova obrigação, ambas válidas e lícitas,

bem como a intenção de novar (animus novandi). Prevê o art. 361 do novo

Código Civil que o ânimo de novar pode ser expresso ou mesmo tácito, mas

sempre inequívoco. Não havendo tal elemento imaterial ou subjetivo, a

segunda obrigação simplesmente confirma a primeira.

Tanto a doutrina quanto a jurisprudência sempre apontaram que a

novação liqüidava totalmente a obrigação anterior, que não poderia ser

restabelecida.38 Esse seria, na verdade, o principal efeito da novatio, que a

diferenciava de institutos jurídicos como sub-rogação e a dação em

pagamento.

Pois bem, o Superior Tribunal de Justiça tem analisado ultimamente a

novação com vistas ao princípio da função social dos contratos e das

obrigações, revolucionando a própria concepção do instituto. Isso pode ser

evidenciado pelo teor da recente Súmula 286 daquele Tribunal, que tem a

seguinte redação: “A renegociação de contrato bancário ou a confissão da

dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades

dos contratos anteriores”.

38 Sobre esse efeito da novação, vale conferir: “A novação corresponde a meio liberatório singular, a modo especial de extinguir-se a obrigação. Chega-se a compará-la a um pagamento fictício. Define-se como ‘a conversão de uma dívida em outra para extinguir a primeira’. É a substituição de uma dívida por outra, eliminando-se a precedente. Desaparece a primeira e, em seu lugar, surge nova. Êsse o seu conteúdo essencial, aliás, duplo: um extintivo, referente à obrigação antiga; outro gerador, relativo à obrigação nova. Não existe, pois, tão-sòmente, uma transformação; o fenômeno é mais complexo, abrangendo a criação de nova obrigação, que subsistiu à antiga” (Barros Monteiro, Washington de. Curso de Direito Civil. Direito das Obrigações. 1ª Parte. São Paulo: Saraiva, 8ª Edição, 1972, p. 324)

Page 45: Apostila de contratos 2

45

Ora, a socialidade salta aos olhos, uma vez que se quebra com aquela

tradicional regra pela qual ocorrida a novação não é mais possível discutir a

obrigação anterior. Sendo flagrante o abuso de direito cometido pela parte

negocial e estando presente a onerosidade excessiva por cobrança de juros

abusivos nas obrigações anteriores, será possível a discussão judicial dos

contratos novados. Visando esclarecer, transcrevemos uma das ementas de

julgado que gerou a edição do entendimento sumular no ano de 2004, em que

se faz menção expressa ao instituto da novação:

“NEGÓCIOS BANCÁRIOS. REVISÃO. Na ação revisional de

negócios bancários, pode-se discutir a respeito de contratos

anteriores, que tenham sido objeto de novação. Recurso especial não

conhecido” (STJ, RESP 332832 / RS ; RECURSO ESPECIAL,

2001/0086405-2. Relator: Ministro Asfor Rocha, Segunda seção de

Direito Privado, Data do Julgamento: 28/05/2003. Data da Publicação

e Fonte: DJ 23/02/20003).

Não só concordamos com a súmula e o julgado acima transcrito como

entendemos que nasce um novo entendimento jurisprudencial quanto à

matéria, quebrando velhos paradigmas, em prol dos princípios do Direito Civil

Constitucional, particularmente o da construção de uma sociedade livre, justa

e solidária (art. 3º, I, da CF/88).

O objetivo da súmula é única: evitar o enriquecimento sem causa, o

locupletamento sem razão, a lesão subjetiva e a desproporção negocial.

Recordamos que muitas vezes as negociações contratuais são impostas por um

das partes, em posição privilegiada. A Súmula n. 286 do STJ representa uma

total quebra de paradigma, assim como as demais ementas nesse breve

estudo comentadas.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

FACHIN, Luiz Edson. Estatuto jurídico do patrimônio mínimo. Rio de

Janeiro: Renovar, 2001.

FERRI, Luigi. La autonomia privada. Tradução e notas em espanhol por

Page 46: Apostila de contratos 2

46

Luis Sancho Mendizibal. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1969.

KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do consumidor. 2. ed. São Paulo:

Atlas, 2005.

MARQUES, Cláudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do

Consumidor. Introdução. São Paulo: RT, 2004.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. Direito das

obrigações. 1ª Parte. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1972.

ROSENVALD, Nelson. Dignidade humana e boa-fé. São Paulo: Saraiva,

2005.

TARTUCE, Flávio. A função social dos contratos. Do Código de Defesa do

Consumidor ao novo Código Civil. São Paulo: Método, 2005.

TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar,

2004.

VIANA, Marco Aurélio S. Comentários ao novo Código Civil. In: TEIXEIRA,

Sálvio de Figueiredo (Coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. XVI.

OBS.: Sobre os princípios da função social e da boa-fé objetiva em face

da nova Súmula 381 do STJ, confiram, meus amigos, o artigo que

escrevemos juntamente com o Prof. Salomão Viana, disponível no:

http://www.pablostolze.com.br/pabloStolze_meusArtigos.asp

6. Fique por Dentro

STJ apresenta novas súmulas 29/10/2009

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) define temas importantes nas súmulas que edita. Confira a seguir os enunciados das recentes súmulas lançadas pela Corte e acesse a notícia com detalhes sobre a aprovação de cada texto:

Page 47: Apostila de contratos 2

47

- Súmula 409: “Em execução fiscal, a prescrição ocorrida antes da propositura da ação pode ser decretada de ofício”. Leia a notícia sobre a Súmula 409.

- Súmula 408: "Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória n. 1.577, de 11/6/1997, devem ser fixados em 6% ao ano até 13/09/2001, e, a partir de então, em 12% ao ano, na forma da súmula n. 618 do Supremo Tribunal Federal”. Leia a notícia sobre a Súmula 408.

- Súmula 407: “É legítima a cobrança da tarifa de água, fixada de acordo com as categorias de usuários e as faixas de consumo”. Leia a notícia sobre a Súmula 407.

- Súmula 406: "A Fazenda Pública pode recusar a substituição do bem penhorado por precatórios". Leia a notícia sobre a Súmula 406.

- Súmula 405: “A ação de cobrança do seguro obrigatório (DPVAT) prescreve em três anos”. Leia a notícia sobre a Súmula 405.

- Súmula 404: "É dispensável o Aviso de Recebimento (AR) na carta de comunicação ao consumidor sobre a negativação de seu nome em bancos de dados e cadastros”. Leia a notícia sobre a Súmula 404.

- Súmula 403: “Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais”. Leia a notícia sobre a Súmula 403. - Súmula 402: “O contrato de seguro por danos pessoais compreende danos morais, salvo cláusula expressa de exclusão”. Leia a notícia sobre a Súmula 402.

Para acessar a lista completa de súmulas do STJ no site da Corte (www.stj.jus.br), basta clicar em “Consultas”, no menu à esquerda da tela inicial do site, e acessar o link “Súmulas”.

Fonte: http://www.stj.gov.br/portal_stj/objeto/texto/impressao.wsp?tmp.estilo=&tmp.area=682&tmp.texto=94439

STJ aprova Súmula que permite juros superiores a 12% ao ano

29/05/2009

Page 48: Apostila de contratos 2

48

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou a Súmula de n.º 382, que define

que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só,

não caracteriza abuso. A Súmula foi editada nesta quarta-feira (27) pela

Segunda Seção. Os ministros entendem que é necessário analisar caso a caso

o abuso alegado por parte da instituição financeira.

A Seção tomou por base inúmeros precedentes. Um dos casos foi julgado em

2004 pela Quarta Turma e teve como relator o ministro Raphael de Barros

Monteiro Filho (Resp 507.882/RS). O julgamento foi em favor da empresa Itaú

Leasing de Arrendamento Mercantil. Em outro precedente, também do Rio

Grande do Sul (Resp 1.042.903), foi julgado no último ano pela Terceira Turma

e teve como relator o ministro Massami Uyeda.

Nesse processo, contra a BV Financeira S.A Crédito Financiamento e

Investimento, o juiz de primeiro grau julgou procedente a ação de revisão de

contrato de alienação fiduciária em garantia para limitar os juros em 12 % ao

ano e excluir a inscrição do devedor no cadastro de inadimplentes. Segundo a

decisão do STJ, não incide essa limitação, exceto em hipóteses legais e

específicas.

O ministro esclareceu nesse julgamento que não há sequer o reconhecimento

de ofício da nulidade de cláusulas contratuais consideradas abusivas, sendo

necessário o pedido expresso do interesse da parte. A Segunda Seção do STJ

entende que, no caso, não existia a limitação prevista no Decreto 22626/33,

salvo nas hipóteses legais específicas, visto que as instituições financeiras,

integrantes do Sistema Financeiro Nacional são regidas pela Lei 4595/64.

Cabe ao Conselho Monetário Nacional, segundo Súmula 596, do STF, limitar os

encargos de juro e esse entendimento não foi alterado após a vigência do

Código de Defesa do Consumidor (CDC), cujas normas também se aplicam aos

contratos firmados por instituições bancárias. A autorização do Conselho

Monetário Nacional para livre contratação dos juros só se faz em hipóteses

Page 49: Apostila de contratos 2

49

específicas, como cédula de cartão de crédito rural, industrial ou comercial.

A Segunda Seção consagrou com a Súmula o entendimento de é possível a

manutenção dos juros ajustado pelas partes, desde que não fique

demasiadamente demonstrado o abuso. O teor do texto é: “A estipulação de

juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica

abusividade”.

Referência:

CPC, art. 543-C

Lei n.4.595, de 31/12/1964

Res. N. 8, de 07/08/2008-STJ, art. 2º, § 1º

Resp 1.061.530-RS

AgRg nos Edcl no Resp 788045

Resp1042903

AgRg no Resp 879902

Resp 507882

AgRg no Resp 688627

AgRg no Resp 913609

Fonte:

http://www.stj.gov.br/portal_stj/objeto/texto/impressao.wsp?tmp.estilo=&tmp

.area=398&tmp.texto=92201 acessado em 31 de maio de 2009.

DECISÃO

Cabe indenização por danos morais quando banco envia cartão de

crédito sem solicitação

Cabe indenização por danos morais quando uma instituição financeira, na

ausência de contratação dos serviços, envia cartão de crédito e faturas de

cobrança da respectiva anuidade ao consumidor. A Terceira Turma do Superior

Tribunal de Justiça (STJ) não atendeu ao recurso de um banco e manteve a

decisão de segunda instância que condenou a instituição ao pagamento de

uma indenização por danos morais a uma consumidora gaúcha.

Page 50: Apostila de contratos 2

50

Segundo dados do processo, a consumidora recebeu um cartão de crédito não

solicitado e mais três faturas no valor de R$ 110 cada uma, referentes à

anuidade. Ela tentou cancelar o cartão e as cobranças indevidas, mas o banco

se negou a efetuar os cancelamentos.

A consumidora, então, ajuizou ação de indenização por danos morais cumulada

com declaratória de inexistência de débito contra a instituição financeira,

alegando abalo moral, já que o banco não cancelou o cartão e as cobranças,

conforme ela havia requerido.

O banco, por sua vez, argumentou que o cartão foi solicitado pela

consumidora, que os valores relativos à anuidade foram estornados e que dos

fatos narrados não adveio qualquer prejuízo moral a ensejar a reparação

pretendida.

Em primeira instância, o pedido foi julgado procedente, declarando a

inexistência do débito. Além disso, o banco foi condenado a pagar uma

indenização no valor de R$ 10 mil a título de danos morais, a ser corrigida pelo

Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M) desde a decisão, somando os juros

legais moratórios de 1% ao mês, a partir da citação, ambos até a data do

efetivo pagamento.

A instituição financeira apelou da sentença. O Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul (TJRS) deu parcial provimento à apelação, somente para reduzir

o valor da indenização. Para o TJ, o ato de enviar o cartão de crédito sem a

devida solicitação da consumidora, bem como as faturas para a cobrança da

anuidade viola o Código de Defesa do Consumidor (CDC), caracterizando

prática abusiva, passível de indenização a título de danos morais.

Inconformado, o banco recorreu ao STJ, argumentando que não foi

comprovado o dano moral, não havendo, conseqüentemente, o dever de

Page 51: Apostila de contratos 2

51

indenizar. Sustentou, ainda, que a situação vivenciada pela consumidora, o

recebimento de um cartão de crédito e de algumas faturas que posteriormente

foram canceladas, configura um mero aborrecimento, não podendo ser

considerada como uma das hipóteses em que a simples prova do ato ilícito

gera o dever de indenizar, sendo necessária a prova do dano efetivamente

sofrido.

Ao analisar a questão, o relator, ministro Sidnei Beneti destacou que o envio

de cartão de crédito não solicitado é conduta considerada pelo CDC como

prática abusiva. Para ele, esse fato e os incômodos decorrentes das

providências notoriamente dificultosas para o cancelamento significam

sofrimento moral, já que se trata de uma pessoa de idade avançada, próxima

dos cem anos de idade à época dos fatos, circunstância que agrava o

sofrimento moral.

O ministro ressaltou também que, para presumir o dano moral pela simples

comprovação do fato, este tem de ter a capacidade de causar dano, o que se

apura por um juízo de experiência. Por essa razão, é presumido o dano moral

em casos de inscrição indevida em cadastros de proteção ao crédito ou de

recusa indevida de cobertura por plano de saúde.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa

Fonte:

http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=3

98&tmp.texto=89974 acessado em 16 de Novembro de 2008.

7. Jurisprudência do STJ e o Princípio da Boa-Fé Objetiva

Page 52: Apostila de contratos 2

52

DIREITO CIVIL. CONTRATO DE INCORPORAÇÃO. CÓDIGO DE DEFESA DO

CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. RESTITUIÇÃO DE PARCELAS PAGAS.

SÚMULA N.

7/STJ.

1. Em que pese o contrato de incorporação ser regido pela Lei n.

4.591/64, admite-se, outrossim, a incidência do Código de Defesa do

Consumidor, devendo ser observados os princípios gerais do direito que

buscam a justiça contratual, a equivalência das prestações e a boa-fé objetiva

e vedam o locupletamento ilícito.

2. Aplica-se a Súmula n. 7 do STJ na hipótese em que a tese versada no

recurso especial reclama a análise dos elementos fáticos produzidos ao longo

da demanda.

3. Recurso especial não-conhecido.

(REsp 747.768/PR, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA

TURMA, julgado em 06/10/2009, DJe 19/10/2009)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CIVIL. LOCAÇÃO.

IMÓVEL LOCADO PELO NU-PROPRIETÁRIO. BOA-FÉ OBJETIVA. LEGITIMIDADE

DO LOCADOR PARA EXECUTAR OS ALUGUÉIS EM ATRASO. AGRAVO

REGIMENTAL IMPROVIDO.

1. Na espécie, não se aplicam os Enunciados 5 e 7 da Súmula do Superior

Tribunal de Justiça, porquanto a decisão agravada, ao decidir a matéria, não

interpretou cláusula contratual nem reexaminou o quadro fático dos autos, pois

cingiu-se a analisar a legitimidade do nu-proprietário para executar débitos

relativos a contrato de locação de imóvel objeto de usufruto.

2. Uma das funções da boa-fé objetiva é impedir que o contratante adote

comportamento que contrarie o conteúdo de manifestação anterior, cuja

seriedade o outro pactuante confiou.

3. Celebrado contrato de locação de imóvel objeto de usufruto, fere a boa-fé

objetiva a atitude da locatária que, após exercer a posse direta do imóvel por

mais de dois anos, alega que o locador, por ser o nú-proprietário do bem, não

detém legitimidade para promover a execução dos aluguéis não adimplidos.

Page 53: Apostila de contratos 2

53

4. Agravo regimental improvido.

(AgRg no AgRg no Ag 610.607/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS

MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 25/06/2009, DJe 17/08/2009)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535

DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE AJUIZADA

EM VIRTUDE DE INADIMPLEMENTO DE CONTRATO DE COMPROMISSO DE

COMPRA E VENDA. IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DE ANTECIPAÇÃO DE

TUTELA SEM QUE TENHA HAVIDO MANIFESTAÇÃO JUDICIAL ACERCA DA

RESOLUÇÃO DO CONTRATO, AINDA QUE ESTE CONTE COM CLÁUSULA

RESOLUTÓRIA EXPRESSA.

PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA.

1. Não há violação ao artigo 535 do CPC quando a Corte de origem aprecia a

questão de maneira fundamentada, apenas não adotando a tese do recorrente.

2. É imprescindível a prévia manifestação judicial na hipótese de rescisão de

compromisso de compra e venda de imóvel para que seja consumada a

resolução do contrato, ainda que existente cláusula resolutória expressa,

diante da necessidade de observância do princípio da boa-fé objetiva a nortear

os contratos.

3. Por conseguinte, não há falar-se em antecipação de tutela reintegratória de

posse antes de resolvido o contrato de compromisso de compra e venda, pois

somente após a resolução é que poderá haver posse injusta e será avaliado o

alegado esbulho possessório.

4. Recurso provido em parte, para afastar a antecipação de tutela.

(REsp 620.787/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA,

julgado em 14/04/2009, DJe 27/04/2009, REPDJe 11/05/2009)

DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. SEGURO SAÚDE. CONTRATAÇÃO ANTERIOR À

VIGÊNCIA DA LEI 9.656/98. DOENÇA PRÉ-EXISTENTE. OMISSÃO

IRRELEVANTE.

LONGO PERÍODO DE SAÚDE E ADIMPLEMENTO CONTRATUAL ANTES DA

MANIFESTAÇÃO DA DOENÇA.

Page 54: Apostila de contratos 2

54

- As disposições da Lei 9.656/98 só se aplicam aos contratos celebrados a

partir de sua vigência, bem como para os contratos que, celebrados

anteriormente, foram adaptados para seu regime. A Lei 9.656/98 não retroage

para atingir o contrato celebrado por segurados que, no exercício de sua

liberdade de escolha, mantiveram seus planos antigos sem qualquer

adaptação.

- O segurado perde direito à indenização, nos termos do art. 766, CC/2002,

(art. 1.444/CC1916) se tiver feito declarações inverídicas quando poderia fazê-

las verdadeiras e completas. E isso não se verifica se não tiver ciência de seu

real estado de saúde.

Precedentes.

- Excepcionalmente, a omissão do segurado não é relevante quando contrata

seguro e mantém vida regular por vários anos, demonstrando que possuía,

ainda, razoável estado de saúde quando da contratação da apólice.

- Aufere vantagem manifestamente exagerada, de forma abusiva e em

contrariedade à boa-fé objetiva, o segurador que, após longo período

recebendo os prêmios devidos pelo segurado, nega cobertura, sob a alegação

de que se trata de doença pré-existente.

Recurso Especial provido.

(REsp 1080973/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,

julgado em 09/12/2008, DJe 03/02/2009)

DIREITO CIVIL. VIZINHANÇA. CONDOMÍNIO COMERCIAL QUE ADMITE

UTILIZAÇÃO MISTA DE SUAS UNIDADES AUTÔNOMAS. INSTALAÇÃO DE

EQUIPAMENTO POR CONDÔMINO QUE CAUSA RUÍDO. INDENIZAÇÃO DEVIDA.

DANO MORAL FIXADO EM QUANTUM RAZOÁVEL.

- O exercício de posições jurídicas encontra-se limitado pela boa-fé objetiva.

Assim, o condômino não pode exercer suas pretensões de forma anormal ou

exagerada com a finalidade de prejudicar seu vizinho. Mais especificamente

não se pode impor ao vizinho uma convenção condominial que jamais foi

Page 55: Apostila de contratos 2

55

observada na prática e que se encontra completamente desconexa da

realidade vivenciada no condomínio.

- A 'suppressio', regra que se desdobra do princípio da boa-fé objetiva,

reconhece a perda da eficácia de um direito quando este longamente não é

exercido ou observado.

- Não age no exercício regular de direito a sociedade empresária que se

estabelece em edifício cuja destinação mista é aceita, de fato, pela coletividade

dos condôminos e pelo próprio Condomínio, pretendendo justificar o excesso

de ruído por si causado com a imposição de regra constante da convenção

condominial, que impõe o uso exclusivamente comercial, mas que é letra

morta desde sua origem.

- A modificação do quantum fixado a título de compensação por danos morais

só deve ser feita em recurso especial quando aquele seja irrisório ou

exagerado.

Recurso especial não conhecido.

(REsp 1096639/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,

julgado em 09/12/2008, DJe 12/02/2009)

CIVIL. CONDOMÍNIO. É POSSÍVEL A UTILIZAÇÃO, PELOS CONDÔMINOS, EM

CARÁTER EXCLUSIVO, DE PARTE DE ÁREA COMUM, QUANDO AUTORIZADOS

POR ASSEMBLÉIA GERAL, NOS TERMOS DO ART. 9º,§ 2º, DA LEI Nº 4.591/64.

A DECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM, BASEADA NO CONJUNTO

PROBATÓRIO, NÃO PODE SER REEXAMINADA, EM FACE DA SÚMULA 7/STJ.

1. O Tribunal "a quo" decidiu a questão com base nas provas dos autos, por

isso a análise do recurso foge à mera interpretação da Lei de Condomínios, eis

que a circunstância fática influi na solução do litígio. Incidência da Súmula

07/STJ.

2. O alcance da regra do art. 3º, da Lei nº 4.591/64, que em sua parte final

dispõe que as áreas de uso comum são insuscetíveis de utilização exclusiva por

qualquer condômino", esbarra na determinação da própria lei de que a

convenção de condomínio deve estabelecer o "modo de usar as coisas e

serviços comuns", art. 3º, § 3º, "c", da mencionada Lei. Obedecido o quorum

Page 56: Apostila de contratos 2

56

prescrito no art. 9º, § 2º da Lei de Condomínio, não há falar em nulidade da

convenção.

3. Consoante precedentes desta Casa: " o princípio da boa-fé objetiva tempera

a regra do art. 3º da Lei nº 4.591/64" e recomenda a manutenção das

situações consolidadas há vários anos.(Resp' nº.s 214680/SP e 356.821/RJ,

dentre outros).

Recurso especial não conhecido

(REsp 281.290/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA,

julgado em 02/10/2008, DJe 13/10/2008)

SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL.

FINANCIAMENTO. RELAÇÃO DE CONSUMO. COMISSÃO DE CONCESSÃO DE

CRÉDITO.

INCIDÊNCIA MENSAL QUE VIOLA A BOA-FÉ OBJETIVA.

- A comissão de concessão de crédito, cobrada pela instituição financeira para

fornecer crédito ao mutuário, incide apenas uma vez, no início do contrato.

Qualquer outra cobrança do referido encargo é ilícita. A cobrança mensal do

referido encargo viola preceitos de boa-fé objetiva, razão pela qual não deve

ser admitida.

Recurso Especial provido.

(REsp 908.835/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado

em 27/05/2008, DJe 20/06/2008)

DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. SEGURO SAÚDE. CONTRATAÇÃO ANTERIOR À

VIGÊNCIA DO CDC E À LEI 9.656/98. EXISTÊNCIA DE TRATO SUCESSIVO.

INCIDÊNCIA DO CDC, MAS NÃO DA LEI 9.656/98. BOA-FÉ OBJETIVA. PRÓTESE

NECESSÁRIA À CIRURGIA DE ANGIOPLASTIA. ILEGALIDADE DA EXCLUSÃO DE

“STENTS” DA COBERTURA SECURITÁRIA. DANO MORAL CONFIGURADO.

DEVER DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS.

- As disposições da Lei 9.656/98 só se aplicam aos contratos celebrados a

partir de sua vigência, bem como para os contratos que, celebrados

anteriormente, foram adaptados para seu regime. A Lei 9.656/98 não

Page 57: Apostila de contratos 2

57

retroage, entretanto, para atingir o contrato celebrado por segurados que, no

exercício de sua liberdade de escolha, mantiveram seus planos antigos sem

qualquer adaptação.

- Embora o CDC não retroaja para alcançar efeitos presentes e futuros de

contratos celebrados anteriormente a sua vigência, a legislação consumerista

regula os efeitos presentes de contratos de trato sucessivo e que, por isso,

foram renovados já no período de sua vigência.

- Dada a natureza de trato sucessivo do contrato de seguro saúde, o CDC rege

as renovações que se deram sob sua vigência, não havendo que se falar aí em

retroação da lei nova.

- A cláusula geral de boa-fé objetiva, implícita em nosso ordenamento antes da

vigência do CDC e do CC/2002, mas explicitada a partir desses marcos

legislativos, impõe deveres de conduta leal aos contratantes e funciona como

um limite ao exercício abusivo de direitos.

- O direito subjetivo assegurado em contrato não pode ser exercido de forma a

subtrair do negócio sua finalidade precípua. Assim, se determinado

procedimento cirúrgico está incluído na cobertura securitária, não é legítimo

exigir que o segurado se submeta a ele, mas não instale as próteses

necessárias para a plena recuperação de sua saúde.

- É abusiva a cláusula contratual que exclui de cobertura a colocação de

“stent”, quando este é necessário ao bom êxito do procedimento cirúrgico

coberto pelo plano de saúde. Precedentes.

- Conquanto geralmente nos contratos o mero inadimplemento não seja causa

para ocorrência de danos morais, a jurisprudência desta Corte vem

reconhecendo o direito ao ressarcimento dos danos morais advindos da injusta

recusa de cobertura de seguro saúde, pois tal fato agrava a situação de aflição

psicológica e de angústia no espírito do segurado, uma vez que, ao pedir a

autorização da seguradora, já se encontra em condição de dor, de abalo

psicológico e com a saúde debilitada.

Recurso especial a que se dá parcial provimento.

(REsp 735.168/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado

em 11.03.2008, DJ 26.03.2008 p. 1)

Page 58: Apostila de contratos 2

58

AGRAVO REGIMENTAL. COMPRA E VENDA. SOJA. PREÇO FIXO. ENTREGA

FUTURA.

ONEROSIDADE EXCESSIVA. BOA-FÉ OBJETIVA.

- "Nos contratos agrícolas de venda para entrega futura, o risco é inerente ao

negócio. Nele não se cogita em imprevisão" (REsp 783.520/HUMBERTO).

(AgRg no REsp 884.066/GO, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS,

TERCEIRA TURMA, julgado em 06.12.2007, DJ 18.12.2007 p. 270)

DIREITO CIVIL E AGRÁRIO. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A PREÇO

CERTO. ALTERAÇÃO DO VALOR DO PRODUTO NO MERCADO. CIRCUNSTÂNCIA

PREVISÍVEL. ONEROSIDADE EXCESSIVA. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS

PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO, BOA-FÉ OBJETIVA E

PROBIDADE. INEXISTÊNCIA.

- A compra e venda de safra futura, a preço certo, obriga as partes se o fato

que alterou o valor do produto agrícola não era imprevisível.

- Na hipótese afigura-se impossível admitir onerosidade excessiva, inclusive

porque a alta do dólar em virtude das eleições presidenciais e da iminência de

guerra no Oriente Médio – motivos alegados pelo recorrido para sustentar a

ocorrência de acontecimento extraordinário – porque são circunstâncias

previsíveis, que podem ser levadas em consideração quando se contrata a

venda para entrega futura com preço certo.

- O fato do comprador obter maior margem de lucro na revenda, decorrente da

majoração do preço do produto no mercado após a celebração do negócio, não

indica a existência de má-fé, improbidade ou tentativa de desvio da função

social do contrato.

- A função social infligida ao contrato não pode desconsiderar seu papel

primário e natural, que é o econômico. Ao assegurar a venda de sua colheita

futura, é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os custos

em que poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do contrato,

como aqueles derivados das condições da lavoura.

Page 59: Apostila de contratos 2

59

- A boa-fé objetiva se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo

objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que

cada pessoa ajuste a própria conduta a esse modelo, agindo como agiria uma

pessoa honesta, escorreita e leal.

Não tendo o comprador agido de forma contrária a tais princípios, não há como

inquinar seu comportamento de violador da boa-fé objetiva.

Recurso especial conhecido e provido.

(REsp 803.481/GO, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,

julgado em 28.06.2007, DJ 01.08.2007 p. 462)

DIREITO CIVIL E AGRÁRIO. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A PREÇO

CERTO. ALTERAÇÃO DO VALOR DO PRODUTO NO MERCADO. CIRCUNSTÂNCIA

PREVISÍVEL. ONEROSIDADE EXCESSIVA. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS

PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO, BOA-FÉ OBJETIVA E

PROBIDADE. INEXISTÊNCIA. CLÁUSULAS ACESSÓRIAS ABUSIVAS.

IRRELEVÂNCIA.

- A compra e venda de safra futura, a preço certo, obriga as partes se o fato

que alterou o valor do produto agrícola não era imprevisível.

- Na hipótese afigura-se impossível admitir onerosidade excessiva, inclusive

porque chuvas e pragas – motivos alegados pelo recorrido para sustentar a

ocorrência de acontecimento extraordinário – são circunstâncias previsíveis na

agricultura, que o produtor deve levar em consideração quando contrata a

venda para entrega futura com preço certo.

- O fato do comprador obter maior margem de lucro na revenda, decorrente da

majoração do preço do produto no mercado após a celebração do negócio, não

indica a existência de má-fé, improbidade ou tentativa de desvio da função

social do contrato.

- A função social infligida ao contrato não pode desconsiderar seu papel

primário e natural, que é o econômico. Ao assegurar a venda de sua colheita

futura, é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os custos

em que poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do contrato,

como aqueles derivados das condições da lavoura.

Page 60: Apostila de contratos 2

60

- A boa-fé objetiva se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo

objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que

cada pessoa ajuste a própria conduta a esse modelo, agindo como agiria uma

pessoa honesta, escorreita e leal.

Não tendo o comprador agido de forma contrária a tais princípios, não há como

inquinar seu comportamento de violador da boa-fé objetiva.

- Nos termos do art. 184, segunda parte, do CC/02, “a invalidade da obrigação

principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da

obrigação principal”. Portanto, eventual abusividade de determinadas cláusulas

acessórias do contrato não tem relevância para o deslinde desta ação. Ainda

que, em tese, transgridam os princípios da boa-fé objetiva, da probidade e da

função social do contrato ou imponham ônus excessivo ao recorrido, tais

abusos não teriam o condão de contaminar de maneira irremediável o

contrato, de sorte a resolvê-lo.

Recurso especial conhecido e provido.

(REsp 783.404/GO, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,

julgado em 28.06.2007, DJ 13.08.2007 p. 364)

CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. LEI Nº 8.009, DE 1990. A impenhorabilidade

resultante do art. 1º da Lei nº 8.009, de 1990, pode ser objeto de renúncia

válida em situações excepcionais; prevalência do princípio da boa-fé objetiva.

Recurso especial não conhecido.

(REsp 554.622/RS, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado

em 17.11.2005, DJ 01.02.2006 p. 527)

PROMESSA DE COMPRA E VENDA. CONSENTIMENTO DA MULHER. ATOS

POSTERIORES. " VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM ". BOA-FE. PREPARO.

FERIAS.

1. TENDO A PARTE PROTOCOLADO SEU RECURSO E, DEPOIS DISSO,

RECOLHIDO A IMPORTANCIA RELATIVA AO PREPARO, TUDO NO PERIODO DE

FERIAS FORENSES, NÃO SE PODE DIZER QUE DESCUMPRIU O DISPOSTO NO

ARTIGO 511 DO CPC. VOTOS VENCIDOS.

Page 61: Apostila de contratos 2

61

2. A MULHER QUE DEIXA DE ASSINAR O CONTRATO DE PROMESSA DE

COMPRA E VENDA JUNTAMENTE COM O MARIDO, MAS DEPOIS DISSO, EM

JUIZO, EXPRESSAMENTE ADMITE A EXISTENCIA E VALIDADE DO CONTRATO,

FUNDAMENTO PARA A DENUNCIAÇÃO DE OUTRA LIDE, E NADA IMPUGNA

CONTRA A EXECUÇÃO DO CONTRATO DURANTE MAIS DE 17 ANOS, TEMPO EM

QUE OS PROMISSARIOS COMPRADORES EXERCERAM PACIFICAMENTE A

POSSE SOBRE O IMOVEL, NÃO PODE DEPOIS SE OPOR AO PEDIDO DE

FORNECIMENTO DE ESCRITURA DEFINITIVA. DOUTRINA DOS ATOS

PROPRIOS. ART. 132 DO CC.

3. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

(REsp 95.539/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA,

julgado em 03.09.1996, DJ 14.10.1996 p. 3901)

8. Bibliografia Básica do Curso e Mensagem

Bibliografia: Novo Curso de Direito Civil – Teoria Geral dos Contratos –

vol. IV, tomo 01. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho

(Saraiva) (www.saraivajur.com.br ou www.editorajuspodivm.com.br)

Mensagem

“Quando idealizamos um projeto do Bem, que contribua com o nosso

crescimento e o da humanidade, o universo conspira a nosso favor!”.

Um grande abraço, amigos!

Tenham Fé sempre!

Fiquem com Deus!

O amigo,

Pablo.

Revisado.2009.2.ok

C.D.S.