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“Difícil não é passar em concurso público... Difícil é estudar com persistência até conseguir passar nele, pois a maioria desiste antes disto”. Prof. Thales Perrone LEMBRETE DO PROFESSOR: NÃO SE ESQUEÇA DE FAZER TODOS OS EXERCÍCIOS NO FINAL DA APOSTILA. ATRAVÉS DELES, VOCÊ SEDIMENTARÁ TUDO O QUE FOI ESTUDADO NA SALA DE AULA. BOA SORTE ! CAPÍTULO I NOÇÕES DE DIREITO ADMINISTRATIVO E PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 1. BREVES CONCEITOS (segundo Hely Lopes Meirelles) 1.1. Direito: conjunto de regras de conduta coativamente impostas pelo Estado. 1.2. Direito Administrativo: conjunto harmônico de normas e princípios jurídicos que regem os órgãos (estrutura), os agentes (pessoal) e as atividades públicas tendentes a realizar concreta (veja que a atividade legislativa é considerada como atividade estatal abstrata), direta (a atividade judicial é indireta) e imediatamente os fins desejados pelo Estado (o Direito Administrativo não diz quais são os fins desejados pelo Estado, pois isto caberá às outras ciências. Ele apenas disciplina as atividades e os órgãos estatais - ou a eles assemelhados-, visando o eficiente funcionamento da Administração Pública. Cada Estado, ao se organizar, é que declarará os fins visados e instituirá os Poderes e órgãos necessários. Assim, a CF cuida da parte estrutural, estática, da anatomia; o Direito Administrativo, da parte funcional, dinâmica, fisiológica). 1.3. Estado moderno: para atender os seus fins, o Estado moderno realiza atos nos diversos sentidos: administrativo, legislativo e judiciário. Todos eles se socorrem do Direito Administrativo, vez que referido direito orienta os aspectos

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“Difícil não é passar em concurso público...Difícil é estudar com persistência até conseguir passar nele, poisa maioria desiste antes disto”.

Prof. Thales Perrone

LEMBRETE DO PROFESSOR: NÃO SE ESQUEÇA DE FAZER TODOS OS EXERCÍCIOS NO FINAL DA APOSTILA. ATRAVÉS DELES, VOCÊ SEDIMENTARÁ TUDO O QUE FOI ESTUDADO NA SALA DE AULA.BOA SORTE !

CAPÍTULO I NOÇÕES DE DIREITO ADMINISTRATIVO E PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1. BREVES CONCEITOS (segundo Hely Lopes Meirelles)

1.1. Direito: conjunto de regras de conduta coativamente impostas pelo Estado.

1.2. Direito Administrativo: conjunto harmônico de normas e princípios jurídicos que regem os órgãos (estrutura), os agentes (pessoal) e as atividades públicas tendentes a realizar concreta (veja que a atividade legislativa é considerada como atividade estatal abstrata), direta (a atividade judicial é indireta) e imediatamente os fins desejados pelo Estado (o Direito Administrativo não diz quais são os fins desejados pelo Estado, pois isto caberá às outras ciências. Ele apenas disciplina as atividades e os órgãos estatais - ou a eles assemelhados-, visando o eficiente funcionamento da Administração Pública. Cada Estado, ao se organizar, é que declarará os fins visados e instituirá os Poderes e órgãos necessários. Assim, a CF cuida da parte estrutural, estática, da anatomia; o Direito Administrativo, da parte funcional, dinâmica, fisiológica).

1.3. Estado moderno: para atender os seus fins, o Estado moderno realiza atos nos diversos sentidos: administrativo, legislativo e judiciário. Todos eles se socorrem do Direito Administrativo, vez que referido direito orienta os aspectos organizacionais, a administração de bens e de seu pessoal, a formalização de atos etc., somente se afastando do funcionamento estatal/administrativo quando diante das atividades precípuas (principais) do Poder Legislativo (feitura de leis) e Judiciário (decisões judiciais).Assim, verifica-se que o Direito Administrativo rege toda e qualquer atividade de administração de qualquer dos Poderes (Legislativo, Executivo ou Judiciário).

2. FONTES DO DIREITO ADMINISTRATIVO

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2.1. A lei (em sentido amplo, abrangente, é tido como a fonte primária do Direito Administrativo. Abrange as normas constitucionais, as normas jurídicas administrativas (que se caracterizam como atos normativos da Administração) etc, vez que referidos atos têm poder normativo coercitivo à sociedade e ao próprio Estado. Assim, a lei é a fonte formal e primordial do Direito Administrativo.

2.2. A doutrina (exerce de maneira indireta grande influência na elaboração das leis e nas decisões judiciais, ordenando, assim, o próprio Direito Administrativo. É tida como fonte mediata do Direito, sendo fonte supletiva de omissões e interpretações da lei).

2.3. A jurisprudência (significa a reiteração de julgamentos em um mesmo sentido. Conforme leciona Edmir Netto de Araújo, a chamada jurisprudência administrativa não é propriamente fonte da mesma natureza da judiciária, pois não obriga o aplicador judiciário da lei e nem o particular, embora seja procedimento corrente na Administração sua observância obrigatória pelos agentes administrativos. A reiteração das decisões administrativas, em interpretação uniforme feita pelos órgãos consultivos da Administração age indiretamente como fonte).2.4. Os costumes (exercem grande influência, tendo em vista a deficiência da legislação pátria. Segundo HLM, a prática administrativa vem suprindo o texto escrito, e, sedimentada na consciência dos administradores e administrados, a praxe burocrática passa a suprir a lei ou atua como elemento informativo da doutrina. Observe-se que o costume admissível será aquele secundum legem, ou seja, em conformidade com a lei).

2.5. Alguns autores apresentam outras fontes do Direito Administrativo, tais como: princípios gerais do direito, praxe administrativa (hábito uniforme e contínuo dos agentes públicos na realização de seus serviços e na interpretação das normas jurídicas frente a decisão de casos concretos), a analogia, a eqüidade etc.

3. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

Para que se possa interpretar o sentido e o alcance das normas/regras contidas no Direito Administrativo, utilizam-se, analogicamente, as mesmas regras de interpretação do Direito Privado que lhe forem aplicáveis. Contudo, não se pode esquecer alguns pressupostos inafastáveis, quais sejam:

3.1. Supremacia do interesse público sobre o privado (sendo o bem comum o objetivo da Administração Pública, sempre que houver conflito entre o interesse do particular e o público, deverá prevalecer o último);

3.2. Presença do atributo da presunção relativa de legitimidade dos atos administrativos (esta presunção de que os atos administrativos são realizados em conformidade com a lei é relativa, pois ao particular resta a possibilidade de provar que o ato administrativo foi realizado de maneira ilícita, ou seja, contrária ao ordenamento jurídico). Nós iremos estudar este assunto mais adiante, no capítulo dos Atos Administrativos.

3.3. Reconhecimento da existência legal da discricionariedade administrativa (o Poder Discricionário terá como limite o interesse coletivo, dele nunca podendo se afastar, sob pena de a Administração Pública cometer o denominado abuso de poder). Este assunto será melhor abordado no capítulo dos Poderes Administrativos. 4. PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EXPRESSOS NO CAPUT DO ART. 37 DA CF/88 (referido artigo trata especificamente da Administração Pública)

Princípios são os alicerces de uma ciência. São os mandamentos principais. Segundo José dos Santos Carvalho Filho, princípios administrativos são os postulados fundamentais que inspiram todo o modo de agir da Administração Pública. Assim, podemos dizer que os princípios administrativos (ou princípios da Administração Pública) são as diretrizes, as idéias centrais que regem (informam) a atuação da Administração. Todo ato praticado sem a observância de tais princípios é inválido, ilegal e poderá ser anulado pela Administração ou pelo Poder Judiciário.

Devemos observar que todos os princípios administrativos aplicam-se não apenas ao Poder Executivo, mas, também, ao Legislativo e ao Judiciário, bem como a todas as esferas de Governo, quais sejam: União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

4.1. Princípio da Legalidade● Ao particular é lícito fazer tudo, desde que a lei não proíba (é a chamada “autonomia da vontade”). Na Administração Pública, só é permitido fazer o que a lei determina ou autoriza, vez que a vontade da Administração será aquela decorrente da lei.● Toda e qualquer atividade administrativa deve ser determinada ou autorizada por lei. Não o sendo, a atividade é ilícita. Tal princípio tem por origem mais próxima a criação do Estado de Direito (onde o Estado cria as regras e todos devem obedecê-las, incluindo o próprio Estado). É uma proteção contra o abuso de poder da própria Administração.

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● Conforme leciona Maria Sylvia Zanella di Pietro, “...a Administração Pública não pode, por simples ato administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados; para tanto, ela depende de lei”. Assim, quando vemos a Administração Pública criando obrigações ao particular através de um ato administrativo, é porque ela está embasada em alguma lei preexistente ao ato administrativo obrigacional.● Algumas restrições ao princípio da legalidade: a) Medidas Provisórias (são atos expedidos pelo chefe do executivo e que têm a denominada “força de lei”, que só serão obedecidas pela Administração se editadas nos parâmetros constitucionais da relevância e urgência. Tais medidas produzem, ao serem editadas, pelo menos dois efeitos: o inovador da ordem jurídica e o provocador do Congresso Nacional para que este delibere acerca da medida); b) Estado de Sítio e de Defesa (representam restrições ao princípio da legalidade vez que são instituídos por Decreto Presidencial).● Através das funções estatais básicas, cria-se a lei (legislação) e, após, a executa (através da Administração). Assim, a execução da lei pressupõe, necessariamente, a existência prévia dela. Portanto, só se concebe atividade administrativa diante dos parâmetros instituídos previamente pela lei. Conclui-se, desta forma, que só é legítima a atividade administrativa que estiver condizente com a lei.● Cumprir friamente a lei, não significa simplesmente atendê-la. Deve-se observar, também, o “espírito”, a “função social” da mesma, de forma que ao legal deverá ajuntar-se o honesto, o justo e o conveniente aos interesses sociais. Desse pensamento, surgiu a teoria da moralidade administrativa. ●A legalidade não se subsume apenas à observância da lei, mas a todo o sistema jurídico.● Referido princípio não poderá ser afastado em hipótese alguma (nem mesmo em se tratando de atos discricionários).● Não se pode dizer que há um escalonamento hierárquico entre os princípios. Desta forma, não se pode afirmar que o princípio da legalidade é mais ou menos importante que os demais princípios abaixo estudados. Assim, não há um princípio superior e outro inferior, sendo todos igualmente relevantes para a Administração Pública. O que pode vir a acontecer é o fato de um princípio incidir em grau maior do que os demais, numa determinada situação específica, mas sem que um deles venha a anular os demais, uma vez que todos devem ser obrigatoriamente observados.● Em toda atividade desenvolvida pelos agentes públicos, o princípio da legalidade é o que precede todos os demais princípios.

4.2. Princípio da Impessoalidade (alguns autores o denominam de “princípio da finalidade”).● Impessoal é “o que não pertence a uma pessoa em especial”.● É uma novidade trazida pela CF/88, vez que surgiu com esta denominação, pela primeira vez, na CF/88, em seu art. 37, caput. ● Como se aplica o princípio em relação aos administrados? a Administração não pode discriminar pessoas, salvo se presente o interesse público, como nos casos de desapropriação. Deverá haver uma igualdade de tratamento pela Administração em relação aos administrados que se encontrem em idêntica situação jurídica. ● Como se aplica o princípio em relação à própria Administração Pública? a responsabilidade dos atos não deve ser imputada ao agente público, e sim à pessoa jurídica a qual ele exerce suas atividades. Por esta razão, o §1º do art. 37 da CF proíbe que conste o nome, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridade ou servidores públicos em publicidade de atos, programas, obras, serviços e campanhas. Assim, os atos administrativos são imputáveis não aos agentes que os praticam, mas ao órgão ou entidade administrativa em nome dos quais agem os mesmos. ● Para que haja impessoalidade, deve a Administração voltar-se exclusivamente para o interesse público, ficando refletida a aplicação do princípio da finalidade, segundo o qual o alvo da Administração é somente o bem comum. Se assim não for, cometer-se-á uma ilicitude denominada de desvio de finalidade.● As regras descritas no Código de Processo Civil e na Lei 9.784/99 relativas a situações de impedimentos e suspeições são aplicadas aos agentes públicos como corolário do princípio da impessoalidade.

4.3. Princípio da Moralidade (ou Princípio da Probidade Administrativa)● Não se trata da moral comum, mas jurídica, onde o agente deve distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto, o conveniente do inconveniente, o justo do injusto, não desprezando o elemento ético de sua conduta.● A moralidade administrativa constitui pressuposto de validade de todo ato administrativo.● O ato administrativo obedecerá à lei jurídica e à lei ética da instituição, pois nem tudo que é legal é honesto.● Acórdão do TJSP, RDA 89/134: “O controle jurisdicional se restringe ao exame da legalidade do ato administrativo; mas por legalidade ou legitimidade se entende não só a conformação do ato com a lei, como também com a moral administrativa e com o interesse coletivo”.● Em relação à conduta do agente para com a própria instituição, a moral administrativa é imposta ao agente para sua conduta interna, segundo as exigências da instituição a que serve e segundo a finalidade de sua ação.● São meios constitucionais de controle da moralidade: a) Ação Popular (utilizada para desconstituir atos lesivos à moralidade, sendo subscrita por cidadão, independentemente

de ter havido ou não lesão patrimonial) eb) Ação Civil Pública ● Referido princípio também deverá ser observado pelo particular que se relaciona com a Administração. Assim, por exemplo, o conluio entre os licitantes diante de uma concorrência, por exemplo, caracteriza ofensa a esse princípio. ● Exemplos de infringência ao princípio: segundo HLM, “tanto infringe a moralidade administrativa o administrador que, para atuar, foi determinado por fins imorais ou desonestos como aquele que desprezou a ordem institucional e,

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embora movido por zelo profissional, invade a esfera reservada a outras funções, ou procura obter mera vantagem para o patrimônio confiado à sua guarda. Em ambos os casos, os seus atos são infiéis, pois violam o equilíbrio que deve existir entre todas as funções, ou, embora mantendo ou aumentando o patrimônio gerido, desviam-no do fim institucional, que é o de concorrer para a criação do bem comum.” 4.4. Princípio da Publicidade ● Regra: os atos são públicos. Exceções: quando se tratar da segurança da sociedade ou do Estado (segurança nacional), da intimidade, de investigações policiais ou em casos de interesse superior da Administração (em procedimento previamente declarado sigiloso). Conforme assevera Maria Sylvia Z. di Pietro, “...pode ocorrer que, em certas circunstâncias o interesse público esteja em conflito com o direito à intimidade, hipótese em que aquele deve prevalecer em detrimento deste, pela aplicação do princípio da supremacia do interesse público sobre o individual.” ● Publicidade é a divulgação oficial de ato administrativo para informação, conhecimento e controle da sociedade. Com a publicidade iniciam-se os efeitos externos do ato. O princípio abrange não só as divulgações oficiais dos atos administrativos, mas também a possibilidade de conhecimento por qualquer pessoa dos atos internos da Administração, como pareceres, despachos, providências, processos, procedimentos administrativos, atas de julgamentos das licitações etc.● É permitida a publicidade de atos, programas e obras somente com objetivo educativo, informativo ou de orientação.● São importantes remédios (ações) Constitucionais que visam assegurar o respeito ao princípio da publicidade: Habeas Data (art. 5º, LXXII, CF/88) e Mandado de Segurança, art. 5º, LXIX,CF/88 (Individual ou Coletivo).● A publicidade não é elemento formativo do ato, mas requisito de eficácia e moralidade do mesmo. ● O princípio abrange os atos concluídos e os em formação. Ex: algumas fases de certos procedimentos exigem publicidade, tais como os editais de licitações.● O princípio da publicidade pode ser reclamado administrativamente através:1) do Direito de Petição – art.5º, XXXIV, “a”, CF ( para formular qualquer postulação aos Órgãos Públicos) e2) Certidões – art. 5º, XXXIV, “b”, CF (podem ser requeridas por qualquer pessoa; visam registrar a verdade dos fatos

administrativos e se prestam para a defesa de direitos ou esclarecimento de situações).● Conforme assevera Hely Lopes Meirelles, “a publicação que produz efeitos jurídicos é a do órgão oficial da Administração, e não a divulgação pela imprensa particular, pela televisão ou pelo rádio, ainda que em horário oficial. Por órgão oficial entendem-se não só o Diário Oficial das entidades públicas como, também, os jornais contratados para essas publicações oficiais. Vale ainda como publicação oficial a afixação dos atos e leis municipais na sede da Prefeitura ou da Câmara, onde não houver órgão oficial, em conformidade com o disposto na Lei Orgânica do Município”.

4.5. Princípio da Eficiência (também denominado de “qualidade do serviço prestado”):● Inserido pela Emenda Constitucional nº. 19/98.● Significa que não basta agir apenas dentro do aspecto da legalidade, mas também com presteza, perfeição e rendimento funcional.● Mesmo sendo estável, o agente administrativo é constantemente avaliado, podendo vir a perder o cargo se não for aprovado.● Os contratos de gestão, por exemplo, se prestam a tornar a Administração mais eficiente.● Referido princípio consta, também, da legislação infraconstitucional, como no Código de Defesa do Consumidor.● Visa aperfeiçoar os serviços e as atividades prestados, buscando otimizar os resultados e atender o interesse público com maiores índices de adequação, eficácia e satisfação. ● Parte da doutrina adota como sinônimo do princípio da eficiência a expressão “especialidade”. ● O princípio alcança os serviços prestados à coletividade (externos) e os serviços prestados no âmbito da própria Administração (internos), visando obter a qualidade total da execução das atividades.● O controle judicial sofre limitações e só pode incidir quando se tratar de comprovada ilegalidade. Diz a doutrina que: “ o Poder Judiciário não pode compelir a tomada de decisão que entende ser de maior grau de eficiência. ” nem invalidar atos invocando, exclusivamente, o princípio da eficiência.● Eficiência ≠ Eficácia ≠ Efetividadea) Eficiência → relaciona-se ao modo pelo qual se processa o desempenho da atividade. A idéia diz respeito à conduta do agente.b) Eficácia → tem relação com os meios e instrumentos empregados pelos agentes.c) Efetividade → é voltada para os resultados obtidos com as ações.O desejável é que as três qualificações caminhem simultaneamente, mas nem sempre isto acontece.● A EC 45/2004, ao dispor que no âmbito administrativo é resguardado a todos o direito à razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, já demonstra a preocupação do legislador em garantir a observância do princípio da eficiência. O mesmo se diga com relação à promoção, por merecimento, de juízes e membros do Ministério Público, que só farão jus se agir com presteza no exercício da função (desta forma, a eficiência passa a ser considerada como elemento objetivo de aferição de promoção por merecimento). ● Conforme dispõe o art. 103-A da CF/88, o STF, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, poderá aprovar súmula que, após publicada, terá efeito vinculante em relação à administração pública direta e indireta, em todas as esferas. Essa súmula visa evitar interpretações divergentes entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração

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pública que acarretem grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica, que acabam por acarretar ineficiência no serviço público. O mesmo raciocínio podemos dar com relação às súmulas vinculantes da AGU (Advocacia Geral da União), de observância obrigatória para a Administração Federal (LC 73/93, art.2º e 17º).

5. OUTROS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NÃO EXPRESSOS NO CAPUT DO ART. 37 DA CF/88

Atenção! Embora os princípios abaixo estudados não estejam expressos no caput do artigo 37 da Constituição Federal, poderão estar expressos em outras leis, como a 9.784/99 e a 8.666/93. Outros deles não estão explícitos no artigo 37, mas em outros artigos da própria Constituição, tais como: contraditório e ampla defesa, devido processo legal, economicidade, probidade etc.

5.1. Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos● A prestação dos serviços, mesmo descentralizada ou delegada, deve ser obrigatória, contínua e sem interrupção.● A CF/88 dispôs que Lei Ordinária regulará o direito de greve no âmbito da Administração. Essa restrição à greve está intimamente relacionada ao princípio em estudo.● Com base nesse princípio, há uma vedação ao particular contratado, dentro de certos limites, de opor a exceptio non adimpleti contractus, evitando paralisar obras e serviços, exceto disposição legal expressa ou nos casos de aplicação das teorias da imprevisão e do fato do príncipe. ● O princípio é a regra, embora não tenha caráter absoluto, pois é permitido paralisar temporariamente o serviço para reparos técnicos, após aviso prévio, ou diante de situações de emergência, independentemente de aviso prévio.● Serviços remunerados com tarifa (pagamento que se caracteriza como preço público), prestados freqüentemente por concessionários e permissionários, admitem suspensão no caso de inadimplência. Ex: CELG e TELEGOIÁS.● Até mesmo o Código de Defesa do Consumidor dispõe que os serviços públicos essenciais devem ser contínuos.● A EC 19/98 dispôs que o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica (art. 37). Assim, caberá à lei específica (que até o momento não foi promulgada) tratar especificamente do tema, visando resguardar a continuidade dos serviços públicos. Observe-se que a Lei Federal 7.783/89 regulamentou o direito de greve para os trabalhadores em geral (da iniciativa privada), definindo como serviços essenciais praticamente os serviços públicos comuns, declarando em seu art. 16 que referida lei não se aplica a servidores da Administração direta, indireta e fundacional.

5.2. Princípio da Motivação:● Os atos administrativos devem ser motivados para que o Judiciário possa controlar o mérito do ato quanto ao aspecto da legalidade.● A doutrina uníssona entende pela obrigatoriedade de motivação dos atos vinculados.● A doutrina majoritária defende a obrigatoriedade de motivação dos atos discricionários. Obs. I: HLM entende não ser obrigatória a motivação no ato discricionário. Mas, se o motivar, o ato deverá condicionar-se a ele, em razão da observância da Teoria dos Motivos Determinantes. Obs. II: Diógenes Gasparini e José dos Santos Carvalho Filho dizem que o art. 50 da Lei 9.784/98 (que regula o processo administrativo na esfera federal) exige a motivação, com indicação dos fatos e dos fundamentos, de diversos atos administrativos, quais sejam: atos que negam, limitam ou afetam direitos ou interesses; impõem ou agravam deveres, encargos ou sanções; decidem processos administrativos de concurso ou seleção pública; decidem recursos administrativos etc.Obs. III: A CF/88 prevê a necessidade de motivação das decisões do judiciário (administrativas/judiciais/disciplinares), como garantia de ampla defesa.● Há atos administrativos que não têm motivação. Ex: atos que denegam pedidos de autorização ou de permissão (que geram atuação discricionária), ou atos funcionais, como nomeação para cargo comissionado e exoneração do mesmo.● Segundo Hely, “pela motivação, o administrador público justifica sua ação administrativa, indicando fatos (pressupostos de fato) que ensejam o ato e os preceitos jurídicos (pressupostos de direito) que autorizam sua prática. Claro está que em certos atos administrativos oriundos do poder discricionário a justificação será dispensável, bastando apenas evidenciar a competência para o exercício desse poder e a conformação do ato com o interesse público, que é pressuposto de toda atividade administrativa. Em outros atos administrativos, porém, que afetam o interesse individual do administrado, a motivação é obrigatória...”. ● A lei 9.784/99 (art. 1º e 50º) expressa a obrigatoriedade da Administração Pública Federal de obedecer ao princípio da motivação.● Motivação aliunde é aquela que consiste na declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato (§1º do art. 50 da Lei 9.784/99).● É princípio implícito na CF/88 (bem como o da razoabilidade) e explícito na Lei 9.784/99.

5.3. Princípio da Supremacia do Interesse Público Sobre o Particular

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● Referido princípio é irrenunciável. Não há faculdade de atuação ou não do Poder Público, mas sim “dever” de atuação (é o chamado poder-dever-de agir). Os exemplos citados a seguir demonstram algumas situações onde há a predominância do Princípio: a existência legal de cláusulas exorbitantes; restrições ao direito de greve dos agentes públicos e Poder de Polícia, dentre outros institutos.● Mesmo quando age em vista de algum interesse estatal imediato, o fim último deverá ser o interesse público, sob pena do administrador agir com desvio de poder (ou de finalidade).● Este princípio inspira o legislador quando da elaboração da norma e vincula a Administração em toda a sua atuação.● Alguns autores o denominam, também, de princípio da finalidade pública.● Para o doutrinador Celso Antônio Bandeira de Mello, os princípios da Supremacia do Interesse Público sobre o Privado e o da Indisponibilidade do Interesse Público são basilares para a Administração Pública.

5.4. Princípios da Autotutela da Administração Pública e do Controle ou Tutela da Administração Pública:● o sistema de controle dos atos da Administração adotado no Brasil é o jurisdicional. É o judiciário quem revisa, em caráter de definitividade, as decisões administrativas no tocante à legalidade (controle finalístico ou de legalidade).● A Administração pode autotutelar-se: (controle endógeno/interno da Administração)1) anulando atos ilegais praticados por ela;2) revogando atos válidos e eficazes quando inconvenientes ou inoportunos (aspectos de mérito administrativo). Essa

competência é exclusiva ou privativa do Poder Público, porque é a ele que pertence o direito de valoração interna que configura o mérito do ato administrativo. E essa exclusividade encontra amparo no art. 2º da CF/88 (separação dos poderes).

● O Poder Judiciário só poderá:1) anular atos ilegais (e não revogá-los).● Assim, temos: o controle interno, realizado pela própria Administração (princípio da autotutela), e o controle externo (princípio do controle ou da tutela), realizado pelos Poderes Legislativo (diretamente ou com auxílio dos Tribunais de Contas); Judiciário (art. 5, XXXV, CF/88) e pela própria Administração direta quando fiscaliza os atos realizados pela Administração indireta, com o fim de assegurar a observância das finalidades institucionais para as quais esta última foi criada (conforme estudaremos no capítulo seguinte, veremos que entre a Administração direta e a indireta inexiste subordinação, mas tão somente vinculação. Mesmo assim, deverá a Administração direta fiscalizar os atos da indireta, exercendo o poder de tutela sobre a mesma). ● Ver súmulas do STF nº. 346 (“A Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos”) e 473 (“A Administração pode anular os seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”).

5.5. Princípio da Razoabilidade ●É difícil distinguir o princípio da razoabilidade com o da proporcionalidade. Por esta razão, grande parte da doutrina (estudiosos do direito) e da jurisprudência (decisões dos tribunais) emprega os dois termos indistintamente, como sinônimos.● É princípio implícito na CF/88 e expresso na Lei 9.784/99.● O princípio tem como objetivo aferir a compatibilidade entre os meios adotados pela Administração e os fins alcançados por ela, visando evitar restrições desnecessárias ou abusivas do Poder Público.● Segundo Lúcia Valle, a razoabilidade deverá ser aferida segundo os valores do homem médio.● O princípio assume grande importância quando a Administração Pública atua no exercício do seu Poder de Polícia (poder este que será estudado mais adiante) e diante dos atos discricionários.● Na doutrina, prevalece a noção de que o princípio se entrelaça e completa ao da proporcionalidade.● Este princípio surge de idéias como:a) Limitação de direitos (uma vez que “todo direito pressupõe a noção de limite”) eb) Proibição do excesso de poder.● Não pode o juiz controlar a conduta do administrador sob mera alegação de que um outro ato é mais razoável. Não lhe é lícito substituir o juízo de valor do administrador pelo seu, haja vista a separação e independência das funções executivas e judiciais. Poderá, sim, controlar o ato administrativo sob o aspecto da legalidade e da moralidade.● A conduta da Administração deverá se dar dentro dos padrões normais de aceitabilidade.Ato ofensivo ao princípio da Razoabilidade será, indiscutivelmente, ilegal. Se a ação vulnera o princípio, é ilegal. Se não o ofende, será legal.

5.6. Princípio da Proporcionalidade● É princípio implícito na CF/88 e expresso na Lei 9.784/99.● O princípio tem como objetivo aferir a compatibilidade entre os meios e os fins, visando evitar restrições desnecessárias ou abusivas do Poder Público.● Assume grande importância quando a Administração Pública atua no exercício do seu Poder de Polícia e diante dos atos discricionários.● Na doutrina, prevalece a noção de que o princípio se entrelaça e completa ao da razoabilidade.

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● Este princípio surge de idéias como:c) Limitação de direitos (“todo direito pressupõe a noção de limite”) ed) Proibição do excesso de poder.● O poder público deve intervir com equilíbrio, sem excessos e proporcionalmente ao fim a ser atingido.

5.7. Princípio da Indisponibilidade do Interesse Pùblico● Aos agentes administrativos, no desempenho de suas funções, não é lícito dispor desse interesse ou fazer prevalecer seu próprio interesse ou sua vontade psicológica, porque do interesse público os agentes da Administração só detém a guarda, e não a titularidade. A conseqüência imediata da indisponibilidade é que os direitos concernentes a interesses públicos são em princípio inalienáveis, impenhoráveis, intransigíveis, intransferíveis a particulares, ou, em uma palavra: indisponíveis.● A Administração Pública agirá, sempre, buscando um fim desejado pela lei, qual seja, “o bem da coletividade”, para que o ato seja legítimo.● A busca de finalidade não almejada pelo legislador enseja desvio de finalidade.

5.8. Princípio da Presunção de Legitimidade (ou da presunção de veracidade ou de legalidade do ato administrativo)● Presunção de que os atos da Administração são concretizados em conformidade com a lei. Qualquer irregularidade deverá ser provada pelo particular. ● Referida presunção é relativa (presunção juris tantum), pois cabe prova em contrário. O ônus da prova de que o ato da Administração não foi realizado em conformidade com os ditames da lei caberá a quem o alega.

5.9. Princípio da Auto-Executoriedade● Prerrogativa da Administração Pública de poder converter em atos materiais suas pretensões jurídicas, sem precisar se socorrer do Poder Judiciário ou Legislativo.

5.10. Princípio da Hierarquia● Os órgãos são estruturados numa relação de infra-ordenação e subordinação.

5.11. Princípio da Segurança Jurídica● É princípio implícito na CF/88.● Está expresso na Lei 9.784/99 (art. 2º).● Por esse princípio, fica vedada a aplicação retroativa de nova interpretação da norma administrativa.● O princípio não impede a Administração de anular atos inválidos (contrários à lei), vez que, nestas situações, não há mudança de interpretação do ato, mas tão somente a necessária declaração de ilegalidade dele.● A Administração poderá mudar a interpretação da lei. Porém, seus efeitos não serão retroativos. Sendo uma decisão que não retroage ao tempo, diz-se que seu efeito é ex nunc. Se retroagisse, seu efeito seria denominado de ex tunc.● Por este princípio, a nova lei não poderá afetar o ato jurídico perfeito, a coisa julgada e o direito adquirido (estes institutos são comumente estudados em direito constitucional).● A lei proíbe a aplicação retroativa em qualquer hipótese, mesmo que a nova interpretação seja mais benéfica ao administrado, pois o princípio da segurança jurídica visa assegurar um mínimo de estabilidde às relações jurídicas advindas do ato● Conclusão: Uma vez praticado um ato pela Administração Pública, quando vigente certo posicionamento administrativo sobre a aplicação de uma norma, não poderá uma nova interpretação, construída posteriormente à produção do ato, vir a alcançá-lo visando desfazê-lo, independente de a nova interpretação beneficiar ou prejudicar o administrado.

5.12. Observações da Lei nº. 9.784/99● Referida Lei trata do Processo Administrativo na esfera Federal.● Traz, em seu artigo 2º, os princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

5.13. Observações da Lei 8.666/93 (Lei que trata dos Contratos e das Licitações Públicas)● Traz em seu bojo princípios específicos relacionados às licitações e contratos, que serão estudados juntamente com referida Lei.

CAPÍTULO IIPODERES E DEVERES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1. CONSIDERAÇÕES GERAIS► Os Poderes são conferidos aos agentes para realizar os objetivos da Administração, vez que em seu nome agem.

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► Não se deve confundir “poderes administrativos” com “Poderes Políticos”. Os Poderes Políticos são representados pelo Executivo, Legislativo e Judiciário, conforme a clássica tripartição de Montesquieu. Estes últimos são orgânicos e estruturais do Estado, ao passo que os poderes da administração (poderes administrativos) são incidentais e instrumentais.► Os poderes da Administração constituem instrumentos (prerrogativas de direito público) conferidos à Administração pelo ordenamento jurídico (lei) para que ela atinja sua finalidade, qual seja, o interesse público.► Ao mesmo tempo que o ordenamento jurídico confere poderes à Administração, impõe, por outro lado, deveres. Daí surgem os denominados deveres administrativos.► Os poderes da Administração são prerrogativas decorrentes, principalmente, do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o particular.► Os poderes da Administração são irrenunciáveis (Princípio da Indisponibilidade) e devem ser obrigatoriamente exercidos pelos titulares (é o chamado “poder-dever de agir” ou “dever-poder de agir”). Assim, o vocábulo “poder” não quer dizer “faculdade de agir”, pois a ação será obrigatória, quando necessária, ou por disposição legal.► Os poderes e deveres do administrador público são os expressos em lei, os impostos pela moral administrativa e os exigidos pelo interesse da coletividade.► O agente público, quando despido da função, ou fora do exercício do cargo, não poderá usar da autoridade pública.► A omissão do servidor na realização de determinado ato poderá configurar-se como conduta ilegal. Mas, nem toda omissão o será. As omissões tidas como genéricas não são ilegais, como as que ocorrem, por exemplo, quando o administrador avalia a oportunidade e conveniência em construir um hospital ou uma escola. Já as omissões específicas serão ilegais, pois decorrem do não cumprimento de determinação legal imposta no prazo fixado. Assim, a omissão específica de não realizar licitação, quando a lei obrigava a fazê-la, configura uma omissão específica e referida atitude, por parte da administração, é ilegal.► O administrador, em diversos atos, age de acordo com as prerrogativas conferidas pelo regime jurídico administrativo. Este regime garante ao agente o poder de utilizar determinados instrumentos legais, sempre em prol do interesse público, consubstanciados nos denominados poderes administrativos (ou poderes do administrador público). ► São poderes administrativos: a) vinculado; b) discricionário; c) hierárquico; d) disciplinar e e) regulamentar.

2. USO DE PODER E ABUSO DE PODER► O Uso do Poder é a utilização normal, pelos agentes públicos, das prerrogativas que a lei lhes confere.► O Abuso de Poder é a conduta ilegítima do administrador, quando atua fora dos objetivos expressa ou implicitamente traçados na lei.►Abuso de Poder (ou Abuso de Autoridade) é gênero, que possui duas espécies:a) Excesso de Poder (quando o agente atua fora dos limites de sua competência, ou seja, quando ele excede os limites de suas atribuições. Ou o agente invade atribuições de outrem ou se arroga ao exercício de atividades que a lei não lhe conferiu). Alguns doutrinadores (estudiosos do direito) alegam que ocorre o excesso de poder quando o administrador, embora competente para a prática do ato, extrapola, excede, ultrapassa os limites de sua competência. b) Desvio de Finalidade ou Desvio de Poder (quando o agente, embora dentro de sua competência, afasta-se do interesse público, desviando-se de suas finalidades administrativas). É conduta mais visível nos atos discricionários.► O abuso de poder pode revestir-se da forma comissiva (quando age) ou omissiva (quando deixa de agir), quer seja o ato doloso (com a intenção de ferir a lei) ou culposo (sem a intenção de agir ilicitamente).► Nem toda ilegalidade decorre de conduta abusiva, mas todo abuso se reveste de ilegalidade. Assim, ilegalidade é gênero e o abuso de poder, espécie. ► Ato praticado com desvio de finalidade será sempre nulo, pois o vício é grave (insanável). Porém, se o ato ilegal decorrer de excesso de poder, o mesmo poderá ou não ser anulado, a depender da possibilidade (ou não) de se afastar o vício e sanar o defeito. Este assunto será detalhado no capítulo dos Atos Administrativos, mais precisamente no tópico elementos dos atos administrativos.

3. PODERES ADMINISTRATIVOS

São Poderes da Administração (ou poderes administrativos): a) Regulamentar, b) Hierárquico, c) Disciplinar, d) Vinculado, e) Discricionário e f) de Polícia.

3.1. Poder Regulamentar► É a prerrogativa de direito público conferida EXCLUSIVAMENTE aos Chefes do Executivo (Presidente da República, Governadores e Prefeitos) para editar atos administrativos normativos gerais e abstratos, através do instrumento (ou veículo) denominado “decreto”, visando a fiel execução da lei. Segundo alguns autores, é a faculdade conferida aos Chefes do Executivo de explicar, detalhar, explicitar, pormenorizar a lei (o modo e a forma de execução da mesma). Desta forma, suprem-se as omissões do Poder Legislativo, através dos regulamentos de execução. É através do decreto que o regulamento se exterioriza.► Referido poder decorre de disposição constitucional e é indelegável a qualquer subordinado. Assim, não há que se falar em regulamento delegado. Veja que a Constituição permite expressamente a delegação quanto à Lei, como ocorre com a delegação para elaborar lei, prevista no artigo 68 da CF, que trata das leis delegadas. Porém, quanto aos regulamentos das leis, ela, a Constituição, nada dispôs.

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► A prerrogativa é apenas para complementar a lei (e não alterá-la). Se o Executivo extrapolar do seu poder de regulamentar a lei, estará agindo com abuso de poder regulamentar, invadindo a competência do Poder Legislativo, desrespeitando o tradicional princípio da separação dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.► Dependendo dos destinatários (ou do conteúdo, segundo alguns administrativistas), os decretos classificam-se em: a) gerais (tem caráter normativo, traçam regras gerais e visam regulamentar as leis). Exemplo 1: a Agência Goiana de

Administração e Negócios Públicos – AGANP - foi criada pela Lei 13.550, de 11/11/1999. Em 19/08/2002, foi regulamentada pelo Decreto nº. 5.639/02). Exemplo 2: O Regulamento do Imposto de Renda foi exteriorizado através do Decreto nº. 85.450/80, de lavra do Chefe do Executivo federal (Presidente da República);

b) ou individuais/especiais (com destinatários específicos, individualizados, como nos casos de decreto de nomeação de agente público). Observação: Aqui não se está falando em lei sendo regulamentada ou em uso do poder regulamentar.

► Dependendo da abrangência de seus efeitos, podem ser classificados em nacionais e regionais.► Dependendo das entidades que editam, os decretos podem ser municipais, estaduais, distritais ou federais. ► Compete ao Congresso sustar os atos normativos do Executivo que exorbitem do poder regulamentar (ver o art. 49, V, da CF/88).► Apesar de alguns autores admitirem os denominados “decretos autônomos” sobre matéria ainda não disciplinada por lei, a doutrina majoritária os repudia. São os denominados regulamentos autônomos ou independentes. Os que não concordam com a sua existência alegam que o art. 84, IV, da CF dispõe que os regulamentos visam a fiel execução da lei e, também, que o art. 25 do ADCT/CF revogou todos os dispositivos legais que delegassem ao Poder Executivo competência que era própria do Congresso Nacional. Assim, estes doutrinadores alegam que o regulamento autônomo é aquele que inova na ordem jurídica, que cria um direito novo (contendo obrigações e restrições sem amparo legal), estabelecendo normas acerca de matérias ainda não disciplinadas previamente pela lei, não complementando ou desenvolvendo nenhuma lei prévia, o que é ilegal. O poder legiferante (poder de fazer a lei), oriundo do Legislativo, é denominado “direto e primário”, onde os atos são classificados como legislativos (e não regulamentares). Já os decretos e regulamentos autônomos (atos do Executivo) estampariam uma espécie de poder legiferante indireto (poder esse que não encontra amparo na CF/88). Além disso, não pode o Executivo invadir as denominadas “reservas da lei”, ou seja, regular matérias que só podem ser disciplinadas por lei através do Poder Legislativo.

Os que defendem a existência e validade dos decretos autônomos afirmam que a Emenda Constitucional nº. 32/2001 autoriza os Chefes do Executivo a tratar de matérias típicas da Administração, devidamente descritas no artigo 84, VI, da CF/88, tais como a organização e funcionamento dela (desde que não implique em aumento de despesa nem na criação ou extinção de órgãos públicos) e na extinção de cargos ou funções públicas (quando vagos). Para estes estudiosos, os decretos retirariam seus fundamentos de validade diretamente da Constituição, sendo editados em função dela e não em função de uma Lei qualquer. Para estes doutrinadores, apenas nas hipóteses acima mencionadas poderá o Chefe do Executivo expedir decretos autônomos sem a edição prévia de lei que justifique e limite a sua expedição.

Concluindo, verificamos que o fundamento legal do decreto de execução (ou regulamentar) baseia-se no artigo 84, IV da CF/88, sendo o mesmo (o decreto) indelegável. Já o fundamento legal do decreto autônomo encontra sua base normativa no mesmo artigo 84, porém, no seu inciso VI, sendo que este (o decreto autônomo) poderá ser delegado aos Ministros de estado e estampariam o uso do poder normativo conferido à Administração (e não do poder regulamentar, que é indelegável). Como o parágrafo único do artigo 84 da CF autoriza o Presidente da República a delegar o exercício de algumas competências descritas no mesmo artigo (84), porém, não menciona expressamente o inciso IV (que prevê a edição de decretos de execução), conclui-se que, neste último caso, a competência é exclusiva e insuscetível de ser delegada a outrem.

Temos:Originários ou primários (são os atos emanados pelo Legislativo, ou seja, as leis). (*1)

►Atosnorma

Sua competência tem origem na CF para edição do denominado “direito novo”.

tivos Derivados ou secundários (são os atos oriundos, por excelência, do poder regulamentar, emanados do Executivo). (*2)Têm por objetivo a explicação, especificação ou execução da lei, através da edição de normas complementares à lei.

(*1) Entenda-se lei, em sentido material e formal (ou em sentido restrito e próprio), aquela oriunda do Legislativo. É denominada de geral e abstrata.(*2) Lei, em sentido material apenas (ou em sentido amplo e impróprio) é toda norma editada pelo Poder Executivo (inclui-se, aqui, o decreto regulamentar).

►São titulares do poder regulamentar: o Presidente da República e, por simetria constitucional, governadores, prefeitos e interventores.

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► O poder regulamentar não pode ser editado contra legem (contrário à lei) ou praeter legem (mais que a lei regulamentada), mas secundum legem (segundo a lei).► É possível fixar-se obrigações subsidiárias (ou derivadas), diversas das obrigações primárias (ou originárias) descritas na lei, desde que as obrigações subsidiárias sejam adequadas a ela e não se configurem na criação do denominado “direito novo”. O que é ilegal é a exigência de obrigações derivadas impertinentes ou desnecessárias em relação à obrigação legal, infringindo o princípio da proporcionalidade e o da reserva legal. ► Controle dos atos de regulamentação:a) Via Congresso Nacional eb) Via Poder Judiciário (é cabível ao particular ingressar com uma ação denominada “argüição de descumprimento de

preceito fundamental”, porque a mesma abrange a inconstitucionalidade de atos normativos). Além disso, através do remédio (ação) constitucional do “Mandado de Injunção”, o Judiciário poderá declarar a inércia do órgão ou agente incumbidos da regulamentação da norma.

► Tratando-se de um poder-dever de agir, não pode a Administração eximir-se de desempenhá-lo quando necessário. Assim, não se pode falar em mera faculdade de regulamentar a lei. Contudo, podemos verificar a presença intensa do Poder Discricionário, uma vez que a lei garante certa margem de liberdade ao Chefe do Executivo na edição do conteúdo normativo. Além disso, nem todas as leis necessitam de regulamentação, mas apenas as leis administrativas que devem ser executadas pela Administração, excluindo-se, por conseqüência, as leis trabalhistas, processuais, civis, etc., que são aplicáveis independentemente de qualquer regulamentação.

► Segundo Hely Lopes, “as leis que trazem a recomendação de serem regulamentadas não são exeqüíveis antes da expedição do decreto regulamentar”. Assim, tais leis, por não serem auto-executáveis, e enquanto não forem regulamentadas, não produzirão efeitos. Nestes casos, diz-se que o decreto de execução, enquanto não editado pelo Presidente da República, é condição suspensiva para a execução da lei. ► Os decretos regulamentares (oriundos do poder regulamentar do Chefe do Executivo) são diferentes dos decretos legislativos (declaração de vontade do Legislativo em matéria de sua competência administrativa, como a escolha de dirigentes do Banco Central, dos ministros do TCU, da Procuradoria Geral da República, a atos que digam respeito à organização administrativa do parlamento, dentre outros). ► Segundo Clèmerson Merlin Clève, “a edição de regulamentos (poder regulamentar), as instruções, as circulares, os regimentos, as ordens de serviço, os estatutos etc constituem-se em atividade normativa secundária exercida pela Administração, ao passo que as emendas constitucionais, as leis complementares e ordinárias, as leis delegadas, as medidas provisórias, os decretos legislativos e as resoluções constituem-se em atos normativos primários.

Não há um conceito universalmente válido e preciso para o regulamento. Podemos identificá-lo, contudo, através do seu caráter geral, impessoal e, em regra, abstrato, além do fato de ser expedido privativamente pelo chefe do executivo e referente à organização e ação do Estado.

O regulamento visa, somente, esclarecer a lei (que estabelece regras gerais), através de normas complementares, garantindo, destarte, a sua fiel execução. A lei não consegue prever todos os pormenores e, tão pouco especifica sua forma de aplicação, tarefa esta deixada a encargo do regulamento. Surgem, assim, as regras de execução (e não de legislação). Assim, o regulamento é ato subordinado (inferior) e dependente da lei, sendo denominados de regulamentos executivos.

Outros doutrinadores também entendem a natureza da atividade regulamentar como sendo uma atribuição originária, de caráter constitucional e que a discricionariedade está na dinâmica da competência, na maneira de se executar a lei e de dar aplicabilidade à mesma.

O poder regulamentar consubstancia-se na conveniência e oportunidade (poder discricionário) conferida ao Executivo para disciplinar os comandos legais, buscando dispor internamente acerca da estrutura da Administração ou pormenorizando o conteúdo de certas matérias.

Pelo regulamento, que se dá através do poder hierárquico conferido ao chefe do executivo, discrimina-se a conduta, a forma de atuação da Administração, os procedimentos a serem adotados, a determinação dos critérios a serem utilizados como base ao cumprimento da lei, as regras de conduta a serem adotadas pelos órgãos e agentes etc. O regulamento conterá, assim, regras orgânicas e processuais destinadas a pôr em execução a lei, visando garantir a uniformidade e o respeito ao princípio da igualdade, uma vez que evitará que cada Administração aja de acordo com seus entendimentos e interpretações diante da mesma lei e dos casos concretos.

Não devemos nos esquecer que as leis, sendo genéricas, abstratas, impessoais, deixam uma certa margem de liberdade para que a Administração as regulamente (poder discricionário), limitando a atuação de seus órgãos e agentes.

O regulamento (espécie) é um ato administrativo normativo (gênero). Não é lei em sentido formal, mas, sim, material (o conteúdo/matéria identificam-se com a lei).

São características do ato administrativo normativo: a) a existência de um comando geral e abstrato emanado da Administração Pública (normas de conduta) e b) a busca pela observância e explicação da lei. Já a lei (ato normativo originário) tem a sua gênese no Poder Legislativo, dá-se mediante processo legislativo constitucionalmente previsto e tem a característica de trazer ao mundo jurídico um jus novum (direito novo), sendo considerada como uma fonte primária do direito. Apesar de regulamento e lei serem normas, o primeiro não altera o segundo, mas apenas a desenvolve e a explica, sendo tido (o regulamento) como fonte secundária do direito.

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Porém, alguns doutrinadores não concordam com esse entendimento e afirmam que tanto a lei como o regulamento têm o condão de inovar a ordem jurídica, afinal, se não fosse assim, o regulamento apenas repetiria a lei e se tornaria inútil.

Outros estudiosos, contudo, afirmam que somente a lei, por iniciativa própria, tem o poder de inovar originariamente na ordem jurídica, de criar direitos e obrigações e de restringir a liberdade e a propriedade, ao passo que o regulamento inova, apenas, de forma subordinada à lei, não podendo prescrever penas, estabelecer restrições à igualdade, à liberdade ou à propriedade, prever tributos (para tanto a CF já dispõe qual o ente político que possui referida competência), dar organização administrativa às repartições governamentais criando cargos e prescrevendo novas competências, enfim, impor obrigações de fazer ou deixar de fazer ou restringir direitos sem lei anterior que a autorize. E veja-se que, pelo princípio constitucional da legalidade, somente seremos obrigados a fazer ou deixar de fazer alguma coisa em virtude de lei (e não de ato normativo administrativo).

Os direitos e as obrigações então criadas pelos regulamentos dizem respeito, tão-somente, aos subordinados hierárquicos do editor do ato normativo, qual seja, do chefe do Executivo, que deverão obedecer as suas ordens e determinações. Portanto, sobre este aspecto, o regulamento revela-se inovador, criando obrigações e deveres aos subordinados dos chefes do Executivo (órgãos e agentes).

É claro que, indiretamente, os particulares são afetados pelas determinações regulamentares quando devam tratar com os agentes sujeitos às normas administrativas em tela.

Observe-se que, se o artigo 84, IV, determina que o chefe do Executivo expedirá decretos e regulamentos para a fiel execução das leis, resta claro que o atual sistema jurídico pátrio admite, tão somente, o denominado regulamento de execução, que tem a finalidade de promover a fiel execução da lei.

A competência para editar regulamento é outorgada, de forma indelegável, ao chefe do Executivo (§ único do artigo 84 da CF/88). Se o ato provém de outra autoridade, não mais será tido como regulamento, e sim como ato normativo diverso daquele.

O regulamento é exteriorizado através do decreto (que o aprova), sendo o instrumento de suprema manifestação jurídico-normativa do chefe do Executivo. Desta forma, através do decreto (forma), exterioriza-se o conteúdo (matéria) do regulamento editado. Lembramos que a Portaria não é o instrumento adequado para o cumprimento deste desiderato.

Será necessária tão somente a ciência dos destinatários através de qualquer meio lícito quando o regulamento deva produzir efeitos apenas no interior da Administração. Contudo, se os efeitos atingirem terceiros estranhos à Administração, será necessária a publicação integral do regulamento.

Observe que, em países como a França, a Constituição prevê as matérias que podem ser abordadas exclusivamente através da atividade regulamentar. O mesmo não ocorre no Brasil.

Pelo princípio da universalidade da lei, todos os campos normativos podem ser disciplinados através da lei. E ela poderá, se assim desejar o legislador, esgotar toda a matéria, pormenorizando, detalhando, apresentando a sua forma de aplicação e execução. Portanto, é de se verificar que não é toda lei que necessita de regulamentação para ser executada. Mas, se o Executivo assim entender, poderá regulamentar toda e qualquer lei.

Quais leis podem ser regulamentadas, tendo em vista que o artigo 84, IV da CF/88 não as previu? Resposta: pela doutrina majoritária, apenas aquelas cuja aplicação e execução incumbam ao Executivo, ou seja, somente as leis administrativas (excluindo-se, aqui, as leis privadas que tratam das relações entre os particulares).

O Presidente da República, por óbvio, só poderá regulamentar as leis editadas pelo Congresso Nacional, de competência da União, sendo-lhe defeso regulamentar leis estaduais (que o serão pelos governadores) e municipais (prefeitos). Assim, a atribuição regulamentar somente será exercida pelo órgão administrativo a quem compete aplicar a lei”.

► Sendo lei em sentido material apenas (ato administrativo editado pelo Executivo), o regulamento deverá seguir a mesma técnica legislativa (ou quase a mesma) adotada para a Lei elaborada pelo Legislativo, ou seja, deverá conter: preâmbulo, texto, fecho, vigência e publicação. O regulamento estará, também, sujeito a referendo ministerial (conterá, além da assinatura do Chefe do Executivo, as assinaturas do Ministro da Justiça e, pelo menos, do Ministro que deva executá-lo). Além disso, o regulamento estará sujeito à nulidade, caso afronte a lei ou a constituição e à revogação, por critérios de oportunidade e conveniência administrativas.► Uma Lei, por ter caráter genérico e impessoal, não pode ser atacada via Mandado de Segurança. O regulamento, pelo mesmo motivo, também não o poderá.► Com o desaparecimento da lei, desaparece, também, o regulamento.► O regulamento somente pode explicitar/especificar a lei cuja execução caiba ao Executivo. Desta forma, o Chefe do Executivo não poderá regulamentar leis privadas, como as civis ou comerciais que dizem respeito às relações entre os particulares, ou regulamentar leis de outras esferas governamentais.► Pela teoria do paralelismo principiológico, Governadores e Prefeitos também têm competência para expedir decretos, tendo em vista o que determina a Constituição Estadual e a Lei Orgânica do Município, respectivamente. ► Observemos que o poder regulamentar, a se exteriorizar através de regulamentos, é apenas uma das diversas formas que a Administração possui dentro de sua competência normativa. Assim, dentro de um poder mais abrangente (o normativo), encontramos o poder regulamentar, que é uma de suas espécies. Por esta razão, há doutrinadores que preferem utilizar a expressão “poder normativo”, abaixo estudado.

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► Segue, abaixo, um exemplo concreto de Lei (elaborada pelo Congresso Nacional – Legislativo) e, logo abaixo, a sua regulamentação (pelo poder Executivo, através de Decreto):

Presidência da RepúblicaCasa CivilSubchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 7.474, DE 8 DE MAIO DE 1986 .

Dispõe sobre medidas de segurança aos ex-Presidentes da República, e dá outras providências.

        Faço saber que o Congresso Nacional decretou, o Presidente da Câmara dos Deputados no exercício do cargo de Presidente da República, nos termos do § 2º do artigo 59, da Constituição Federal, sancionou, e eu, José Fragelli, Presidente do Senado Federal, nos termos do § 5º do artigo 59, da Constituição Federal, promulgo a seguinte

       Art. 1º O Presidente da República, terminado o seu mandato, tem direito a utilizar os serviços de quatro servidores, para segurança e apoio pessoal, bem como a dois veículos oficiais com motoristas, custeadas as despesas com dotações próprias da Presidência da República. (Redação dada pela Lei nº 8.889, de 21.6.1994)

     § 1o  Os quatro servidores e os motoristas de que trata o caput deste artigo, de livre indicação do ex-Presidente da República, ocuparão cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS, até o nível 4, ou gratificações de representação, da estrutura da Presidência da República. (Redação dada pela Lei nº 10.609, de 20.12.2002)

     § 2o  Além dos servidores de que trata o caput, os ex-Presidentes da República poderão contar, ainda, com o assessoramento de dois servidores ocupantes de cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS, de nível 5.(Redação dada pela Lei nº 10.609, de 20.12.2002)

     Art 2º O Ministério da Justiça responsabilizar-se-á pela segurança dos candidatos à Presidência da República, a partir da homologação em convenção partidária.

     Art 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

     Art 4º Revogam-se as disposições em contrário.

     Senado Federal, em 8 de maio de 1986.

Senador JOSÉ FRAGELLI Presidente

► Vejamos, agora, o Decreto oriundo do Executivo:

Presidência da RepúblicaCasa CivilSubchefia para Assuntos Jurídicos

DECRETO Nº 6.381, DE 27 DE FEVEREIRO DE 2008.

 Regulamenta a Lei no 7.474, de 8 de maio de 1986, que dispõe sobre medidas de segurança aos ex-Presidentes da República, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei no 7.474, de 8 de maio de 1986,

DECRETA:

Art. 1o  Findo o mandato do Presidente da República, quem o houver exercido, em caráter permanente, terá direito:

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I - aos serviços de quatro servidores para atividades de segurança e apoio pessoal;

II - a dois veículos oficiais, com os respectivos motoristas; e

III - ao assessoramento de dois servidores ocupantes de cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS, nível 5.

Art. 2o  Os servidores e motoristas a que se refere o art. 1o serão de livre escolha do ex-Presidente da República e nomeados para cargo em comissão destinado ao apoio a ex-Presidentes da República, integrante do quadro dos cargos em comissão e das funções gratificadas da Casa Civil da Presidência da República.

Art. 3o  Para atendimento do disposto no art. 1o, a Secretaria de Administração da Casa Civil da Presidência da República poderá dispor, para cada ex-Presidente, de até oito cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS, sendo dois DAS 102.5, dois DAS 102.4, dois DAS 102.2 e dois DAS 102.1.

Art. 4o  Os servidores em atividade de segurança e os motoristas de que trata o art. 1o receberão treinamento para se capacitar, respectivamente, para o exercício da função de segurança pessoal e de condutor de veículo de segurança, pelo Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.

Art. 5o  Os servidores em atividade de segurança e os motoristas aprovados no treinamento de capacitação na forma do art. 4o, enquanto estiverem em exercício nos respectivos cargos em comissão da Casa Civil, ficarão vinculados tecnicamente ao Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional, sendo considerados, para os fins do art. 6 o , inciso V, segunda parte, da Lei n o 10.826, de 22 de dezembro de 2003 , agentes daquele Departamento.

Art. 6o  Aos servidores de que trata o art. 5o poderá ser disponibilizado, por solicitação do ex-Presidente ou seu representante, porte de arma institucional do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional, desde que cumpridos os seguintes requisitos, além daqueles previstos na Lei n o 10.826, de 2003 , em seu regulamento e em portaria do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional:

I - avaliação que ateste a capacidade técnica e aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, a ser realizada pelo Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional;

II - observância dos procedimentos relativos às condições para a utilização da arma institucional, estabelecidos em ato normativo interno do Gabinete de Segurança Institucional; e

III - que se tratem de pessoas originárias das situações previstas no art. 6 o , incisos I , II e V, da Lei n o 10.826, de 2003.

Parágrafo único.  O porte de arma institucional de que trata o caput terá prazo de validade determinado e, para sua renovação, deverá ser realizada novamente a avaliação de que trata o inciso I do caput, nos termos de portaria do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional.

Art. 7o  Durante os períodos de treinamento e avaliação de que tratam os arts. 4o e 6o, o servidor em atividade de segurança e motorista de ex-Presidente poderá ser substituído temporariamente, mediante solicitação do ex-Presidente ou seu representante, por agente de segurança do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional.

Art. 8o  O planejamento, a coordenação, o controle e o zelo pela segurança patrimonial e pessoal de ex-Presidente caberá aos servidores de que trata o art. 1o, conforme estrutura e organização própria estabelecida.

Art. 9o  A execução dos atos administrativos internos relacionados com a gestão dos servidores de que trata o art. 1o e a disponibilidade de dois veículos para o ex-Presidente serão praticadas pela Casa Civil, que arcará com as despesas decorrentes.

Art. 10.  Os candidatos à Presidência da República terão direito a segurança pessoal, exercida por agentes da Polícia Federal, a partir da homologação da respectiva candidatura em convenção partidária.

Art. 11.  O Ministro de Estado da Justiça, no que diz respeito ao art. 10, o Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional, no que concerne aos arts. 4o, 5o, 6o e 7o, e o Secretário de Administração da Casa Civil, quanto ao disposto nos arts. 2o e 9o, baixarão as instruções e os atos necessários à execução do disposto neste Decreto.

Art. 12.  Este Decreto entra em vigor na data da sua publicação.

Art. 13.  Revoga-se o Decreto n o 1.347, de 28 de dezembro de 1994.

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Brasília, 27 de fevereiro de 2008; 187o da Independência e 120o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVATarso GenroJorge Armando Felix

3.2. Poder Normativo► O poder normativo autoriza a edição de normas administrativas que, na verdade, são atos administrativos (e não leis em sentido material e formal), devendo-se, sempre, respeitar os limites da lei, sob pena de referidos atos da Administração serem ilegais e inconstitucionais. Assim, não se poderá expedir um regulamento (via poder regulamentar), instrução, portaria ou qualquer outro ato que venha a ilidir a liberdade do indivíduo se a lei não tiver previamente delineado esta restrição. Desta forma, a função precípua do ato administrativo será a de agregar, à lei, nível de concreção. Nunca lhe será permitido inaugurar, originariamente, qualquer cerceio ou direitos de terceiros.► Segundo Edmir Netto, “o poder normativo derivado (e não apenas regulamentar, que é uma de suas espécies) permite ao administrador editar normas gerais e abstratas, observados o princípio da legalidade e as regras de competência”. Referido autor ainda nos coloca que “o poder normativo é exercido, no caso de sua espécie poder regulamentar, por decreto (ato privativo dos chefes do Poder Executivo) e, nos demais casos, por resoluções (Ministros, Secretários de Estado, Presidentes de Tribunais, “Mesas” dos órgãos legislativos), portarias (demais autoridades do Executivo, superintendentes de autarquias e presidentes de fundações), Instruções e Ordens Internas ou de Serviço (idem às portarias), deliberações (decisões de órgãos colegiados), que se restringem ao âmbito de atuação dos respectivos órgãos, e ainda os regimentos de órgãos ou entidades, para disciplinar suas atividades internas”. Com exceção do decreto, todos os demais são editados por autoridades que não o chefe do Executivo. Esses atos dispõem acerca de normas que têm alcance limitado ao âmbito de atuação do órgão expedidor e não possuem o mesmo alcance que os decretos regulamentares. ► Lembre-se que o artigo 87, II, da CF/88 dispõe que os Ministros de Estado têm competência para expedir instruções (que são atos normativos) para a execução das leis, decretos e regulamentos.► Os atos do poder normativo, bem como os poder regulamentar, não poderão dispor contra legem ou ultra legem (ou sem lei que os fundamente). Assim, através deles não se podem criar direitos nem estabelecer obrigações, vedações ou penalidades que não estejam previamente previstas na lei.► Os atos normativos da Administração, assim como as leis editadas pelo Poder Legislativo, têm em comum o fato de que ambos possuem efeitos gerais e abstratos.

3.3. Poder Hirerárquico► Para que a Administração Pública possa atuar em prol da comunidade, faz-se necessário, basicamente, a utilização de dois institutos jurídicos: a distribuição de competências entre os seus órgãos e entidades (na forma da lei) e o estabelecimento de graus de hierarquia.► Hierarquia é o escalonamento em plano vertical dos órgãos e agentes. Tem como objetivo a organização da função administrativa. Em razão desse escalonamento, firma-se uma relação jurídica entre os agentes, denominada relação hierárquica.► É o poder conferido à Administração para organizar sua estrutura, distribuir e escalonar as funções de seus órgãos, ordenar e rever a atuação dos seus agentes, estabelecendo uma relação de hierarquia e subordinação entre eles.► Segundo Mário Masagão, o poder hierárquico é o vínculo que coordena e subordina uns aos outros os órgãos do Poder Executivo, graduando a autoridade de cada um.► Para HLM, o poder hierárquico visa ordenar, coordenar, controlar e corrigir as atividades administrativas. Vejamos: ORDENAR as atividades da Administração, ao repartir e escalonar as funções entre os agentes de modo que cada qual exerça eficientemente o seu cargo.COORDENAR, na busca de harmonia entre todos os serviços.CONTROLAR, ao fazer cumprir as leis e as ordens e acompanhar o desempenho de cada servidor.CORRIGIR os erros administrativos dos seus inferiores. ► Pela hierarquia se define a responsabilidade de cada um.► Não há hierarquia entre os órgãos do Poder Judiciário e Legislativo em relação às suas funções próprias (típicas/precípuas/principais), constitucionais/institucionais, pois hierarquia é caráter privativo da função executiva, como elemento típico da organização e da ordenação dos serviços administrativos. Mas, atenção! Judiciário e Legislativo, se estiverem a desempenhar função administrativa (função não precípua), deverão respeitar a hierarquia. Inexiste hierarquia entre os agentes que exercem FUNÇÃO JURISDICIONAL, por respeito ao princípio da livre convicção do juiz, ou entre os que exercem função LEGISLATIVA, por respeito ao princípio da partilha das competências constitucionais (onde o poder legiferante já se encontra delineado na CF). Assim, por exemplo, se uma lei federal dispõe sobre matéria reservada ao município, não haverá preponderância dela sobre a lei municipal, e a primeira será tida como inconstitucional.

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Poderes de Estado Função Há hierarquia?Executivo Administrativa Sim.

Legislativa/Normativa (*1) Não.Jurisdicional atípica (*2) Não.

Legislativo Administrativa (*3) Sim.Legislativa Não.Jurisdicional constitucional (*4) Não.

Judiciário Administrativa (*5) Sim.Legislativa/Normativa (*6) Não.Jurisdicional Não.

(*1) – Exemplos: Edição de Medidas Provisórias (CF/88, art. 62); edição de normas gerais e abstratas oriundas de seu poder regulamentar (art. 84, IV da CF/88) e edição de leis delegadas (art. 68 da CF/88).(*2) – OBSERVAÇÃO IMPORTANTE: A constituição federal vigente atribui ao Poder Judiciário a função jurisdicional, na qual suas decisões têm o caráter da definitividade, ou seja, não podem ser questionadas por outro Poder após o trânsito em julgado delas (não há mais o que se questionar, haja vista não haver mais recursos cabíveis dentro do Judiciário e, menos ainda, fora dele). Desta forma, tendo em vista que as decisões do Executivo não possuem este atributo da definitividade, podendo ser questionadas pelo Poder Judiciário, dizemos que a função jurisdicional típica somente é exercida pelo Judiciário (regra geral) e, excepcionalmente, pelo Legislativo (quando a CF assim o autoriza). Contudo, certas questões de concursos aludem à possibilidade de todos os poderes exercerem todas as funções. Neste caso, devemos entender que o Executivo estaria sim exercendo jurisdição, porém, sem definitividade. (*3) – Exemplo: Quando organiza seus serviços internos (CF/88, art.51, IV e art. 52, XIII).(*4) – Exemplos: Senado processando e julgando o Presidente da República nos crimes de responsabilidade (CF/88, art. 52, I) ou Senado processando e julgando os Ministros do Supremo Tribunal Federal nos crimes de responsabilidade (CF/88, art. 52, II).(*5) – Exemplo: Quando organiza seus serviços (art.96, I, “a”, “b”, “c” e art. 96, II, “a”, “b” etc, todos da CF/88).(*6) – Exemplo: Elaboração dos Regimentos Internos dos Tribunais (CF/88, art.96, I, “a”)

► São efeitos da relação hierárquica:a) Comando do superior sobre o inferior;b) Dever de obediência dos inferiores quanto às ordens superiores relacionadas ao serviço, salvo se as mesmas forem

manifestamente ilegais (conforme dispõe o Estatuto dos Funcionários Públicos);c) Fiscalização (poder de controle interno no âmbito de uma mesma pessoa jurídica);d) Revisão (poder de autotutela) dos atos praticados por agentes/órgãos de hierarquia inferior, quanto aos aspectos de

mérito (com a análise da oportunidade e conveniência do ato) ou de legalidade (com a análise da adequação formal do ato à lei e sua conformidade com o conteúdo da norma e com os princípios que regem a Administração Pública), podendo revogar ou anular atos administrativos;

e) Delegação de atribuições que não sejam exclusivas da autoridade (transferência de atribuições de um órgão ou agente a outro). O poder de delegação não é irrestrito, não atingindo funções específicas atribuídas a determinados agentes. Abrange funções genéricas e comuns da Administração, não sendo admitida a recusa (pelo delegado), das funções delegadas, haja vista seu dever de obediência.

f) Avocação de atribuições não exclusivas do subordinado. Por ela, o superior pode substituir-se ao subalterno, chamando a si as questões afetas ao último, salvo quando a lei só lhe permita intervir nelas após a decisão do subalterno. Tem caráter de excepcionalidade. Diz respeito à tradicional regra de que “quem pode o mais, pode o menos”;

g) Poder conferido ao superior hierárquico de editar atos normativos com efeitos unicamente internos (portarias, resoluções, instruções), ordenando, assim, a atuação dos órgãos subordinados. Excluem-se, aqui, os regulamentos, tendo em vista que os mesmos produzem efeitos externos;

h) Aplicar punições para os casos de infrações disciplinares (jus puniendi);Unidade de direção (resulta automaticamente do escalonamento vertical entre os órgãos, de maneira que independe de previsão legal específica para ser exercido). Observação: segundo Cretella Júnior, “diz-se que existe unidade de direção quando as ordens, emanadas dos escalões superiores, são obedecidas por todos os agentes dos escalões inferiores, até a base da pirâmide, de tal modo que a máquina administrativa funciona de modo harmônico e uniforme, dando a impressão de uma peça única”.i) Resolução dos conflitos de competência (positivos, ou seja, quando dois ou mais agentes públicos se consideram

competentes para a realização de determinado serviço público, ou negativos, ou seja, quando dois ou mais agentes públicos se consideram incompetentes para a prática de determinado serviço público).

► Edmir Netto nos lembra que “o ordenamento jurídico pode determinar que a competência de certo órgão ou agente inferior a outros na escala hierárquica seja exclusiva e, portanto, não possa ser avocada, como, por exemplo, o julgamento da habilitação e das propostas pela Comissão Julgadora nas licitações (arts. 43 e 44 da lei n. 8.666/93).

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► Não devemos confundir “subordinação” com “vinculação”: Subordinação VinculaçãoTem caráter interno. Tem caráter/natureza externo (a).Se estabelece entre órgãos de uma mesma pessoa administrativa/jurídica como fator decorrente da hierarquia.

Resulta do controle das pessoas federativas (políticas) sobre as entidades da Administração Indireta.

Ex.: Relação entre uma Divisão e um Departamento dentro da Secretaria do Município.Ex II: Relação entre a Secretaria Estadual de Educação de Goiás e as Escolas Estaduais de Educação.Ex III: Relação entre os diversos órgãos que compõem a Secretaria Estadual de Educação.

Ex.: Relação de um Estado-membro à sua autarquia ou empresa pública.Ex II: Relação entre a Secretaria Estadual de Educação e uma Fundação Estadual que atue na área da educação.

3.4. Poder Disciplinar► O poder disciplinar decorre do poder hierárquico. Contudo, não devem ser confundidos tais poderes.► É o poder conferido à Administração para apurar infrações e aplicar penalidades aos seus agentes por infrações funcionais, desde que expressamente previstas em lei (advertências, suspensões, demissões, etc.).►Todos os agentes públicos estão sujeitos ao poder disciplinar. Só serão submetidos a sanções quando a infração for funcional.► Porém, o poder disciplinar não fica adstrito unicamente às relações funcionais. Abrange, também, as relações contratuais entre os particulares e o Poder Público. Assim, cabe à Administração apurar eventuais infrações do contratado na execução do contrato administrativo e aplicar a penalidade legal, se cabível. Mas, ressalte-se que o poder disciplinar não se presta a aplicar punição a particulares que não tenham relação funcional ou contratual com a Administração (nesse último caso, o Poder Público utilizar-se-á do Poder de Polícia para aplicar eventuais penalidades administrativas, como nos casos de aplicação de multa de trânsito por excesso de velocidade). ► O exercício do poder disciplinar é ato preponderantemente vinculado, sob pena do responsável omisso cometer o crime de condescendência criminosa (artigo 320 do Código Penal). Assim, a autoridade competente, tendo conhecimento da falta funcional do agente, deverá aplicar a pena, não tendo a liberdade de escolha entre punir ou não punir. Mas, ao aplicar a sanção, poderá o superior hierárquico, conforme o caso, realizar um juízo de valores entre as penalidades possíveis sugeridas pela lei, aplicando aquela que for razoável e proporcional à falta cometida. Neste caso, estaremos diante do poder discricionário, pois não existe, em regra, no poder disciplinar, o princípio da pena específica. Os Estatutos dos Servidores não estabelecem, via de regra, normas rígidas sobre a definição dos “tipos” e respectivas sanções. Assim, ao se aplicar a sanção, analisar-se-á, com certa discricionariedade: a) Atenuantes e agravantes do caso concreto;b) Natureza e gravidade da infração;c) Prejuízos causados para o interesse público ed) Antecedentes do agente público.► Maria Sylvia di Pietro ressalta a existência de infrações não expressamente definidas em lei, tais como “procedimento irregular e ineficiência no serviço” (puníveis com demissão) e “falta grave” (punível com a suspensão). Sendo vocábulos imprecisos, a lei deixou à Administração o poder discricionário de enquadrar os casos em qualquer dessas infrações.► A sanção e a não aplicação da mesma deverão ser motivadas. ► São Instrumentos utilizados pela Administração Pública visando apurar possíveis infrações administrativas, sendo assegurados o contraditório e a ampla defesa: a Sindicância e o Processo Administrativo Disciplinar.► São institutos revogados:a) “Termo de Declaração” (confissão, por escrito, de infração onde o superior hierárquico aplicava a sanção – mea

culpa).b) “Verdade sabida” (aplicação de penalidade pela autoridade que conheceu e presenciou a infração, sem direito ao

contraditório e à ampla defesa ao acusado). As revogações retro deram-se em virtude do que determina o art. 5º, LV, da CF/88.

► Punição criminal X Punição disciplinar:Traz preceitos impositivos de conduta e prevê sanções. Traz preceitos impositivos de conduta e prevê sanções.A punição é criminal. A punição é disciplinarDeriva do poder punitivo geral do Estado na sua relação com os indivíduos, ainda que no exercício de função pública (jus puniendi do Estado).

Enquadra-se dentro do Direito Administrativo e emana da relação entre a Administração e os seus servidores.

Utiliza-se do sistema da rígida tipicidade. Os tipos abertos são aceitos normalmente na esfera da Administração: falta grave, procedimento irregular etc.

O juiz aplica a pena atribuída à conduta tipificada na lei, permitindo-se ao mesmo somente quantificá-la (dosimetria da pena).

De acordo com a gravidade da conduta a autoridade escolherá, entre as penas legais, a que consulte ao interesse do serviço e a que mais reprima a falta, em obediência ao

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princípio da adequação punitiva.► Não cabe ao judiciário alterar ou majorar sanções aplicadas pelo administrador, mas tão-somente invalidá-las se constatar ilegalidade.► O Poder disciplinar abrange, assim, o dever de: a) determinar providências apuratórias em casos de irregularidades (se o agente for competente para tanto) ou comunicar o fato à autoridade responsável e b) aplicar penalidades aos contratados ou agentes públicos.

3.4. Poder VinculadoPoder Vinculado (ou regrado) Poder DiscricionárioÚnico comportamento possível frente o caso concreto, previamente estabelecido em lei (direito positivo). Não há juízo de oportunidade/conveniência. A liberdade de ação do administrador é mínima (ou inexistente), pois terá que se ater à lei. Segundo HLM, “deixando de atender a qualquer dado expresso na lei, o ato é NULO”.

Há juízo de oportunidade e conveniência dos atos que vai praticar, que devem ser exercidos dentro dos limites da lei, atendendo ao interesse público, uma vez que o princípio da legalidade deve imperar sobre toda a atividade administrativa.

O ato administrativo só poderá ser apreciado pelo Judiciário no tocante à sua legalidade (e não quanto ao mérito).

Só poderá ser apreciado pelo Judiciário no tocante à sua legalidade (e não quanto ao mérito). O Poder discricionário não é imune ao Judiciário. O que não pode ocorrer é a substituição da discricionariedade do administrador pela do juiz.A discricionariedade comporta 3 elementos:a) Norma de previsão aberta que exija complemento de

aplicação;b) Margem de livre decisão quanto à conveniência e

oportunidade ec) Ponderação valorativa de interesses concorrentes, com

prevalência do que melhor atender ao fim da norma.► É um poder conferido à Administração de forma expressa e explícita.► A professora Maria Sylvia Z. di Pietro defende a tese que discricionário e vinculado não são poderes administrativos. Para ela, “quanto aos chamados poderes discricionário e vinculado, não existem como autônomos; a discricionariedade e a vinculação são, quando muito, atributos de outros poderes ou competências da Administração”. Assim, para a renomada autora, a Administração, diante da prática de um ato vinculado, em que é mínima a sua liberdade de ação e onde a vontade do administrador fica adstrita à do legislador, não há que se falar em poder conferido ao Estado, mas, sim, em restrição imposta a ele.► No ato vinculado, todos os elementos (competência, finalidade, forma, motivo e objeto) encontram-se previamente determinados em lei. Em ocorrendo a situação fática correspondente, não há para o administrador outra opção senão a sua prática. ► A doutrina nos ensina que a discricionariedade ocorre não apenas diante dos juízos de oportunidade e conveniência, mas também nos denominados conceitos jurídicos indeterminados, como interesse público, falta grave, boa-fé, decoro, moralidade pública e etc. Nestes casos, compete ao administrador, por exemplo, decidir se a ação ou omissão praticada pelo agente configura-se como falta grave ou não.

3.5. Poder Discricionário

► Poder discricionário é a prerrogativa concedida aos agentes de elegerem, entre várias condutas possíveis, a que traduz maior conveniência e oportunidade para o interesse público.► São fatores exigidos para a legalidade do exercício do poder discricionário:a) A conduta escolhida deverá ser adequada à finalidade expressa na lei, sob pena de ser ilegítima;b) Se a autoridade não permite o exame dos fundamentos de fato ou de direito que mobilizaram sua decisão em certas

situações em que seja necessária a sua averiguação, haverá, pelo menos, uma fundada suspeita de utilização abusiva do poder discricionário e ocorrência de desvio de finalidade;

c) Atualmente, os estudiosos do direito administrativo têm considerado os princípios da RAZOABILIDADE e da PROPORCIONALIDADE como controladores da discricionariedade. Porém, a exacerbação ilegítima desse tipo de controle ofende o princípio constitucional da Separação dos Poderes.

► Há diferenças entre discricionariedade e arbitrariedade:Discricionariedade ArbitrariedadeLiberdade de ação, dentro dos limites da lei. Ação contrária ou excedente à Lei.Ato legal e válido, quando autorizado pela lei. Ilegítimo e inválido.Judiciário manifesta-se quanto à Legalidade, sendo vedada Todo o ato em si é sujeito ao controle do Judiciário.

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a aferição da oportunidade e conveniência firmados em conformidade com a lei. Assim, podemos afirmar que cabe controle do poder judiciário sobre os atos discricionários. O que é proibida é a substituição da discricionariedade do administrador pela do magistrado.► Nenhuma atividade administrativa é completamente discricionária. A discricionariedade é relativa e parcial (e não absoluta), pois há elementos dos atos que sempre serão vinculados, quais sejam: a competência (princípio da legalidade), a finalidade (princípio da supremacia do interesse público) e a forma (ver art. 166, I e V do CC).

4. PODER DE POLÍCIA (ou Polícia Administrativa)

► O Poder de polícia surge como fato gerador do tributo “taxa”, na modalidade taxa de polícia.

► Conceito I: Atividade da Administração Pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos (art. 78 do Código Tributário Nacional).

► Conceito II: Para Caio Tácito, o “poder de polícia é o conjunto de atribuições concedidas à Administração para disciplinar e restringir, em favor do interesse público, direitos e liberdades individuais”. .

► Conceito III: Para HLM, “poder de polícia é a faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”.

► Conceito IV: Para José Cretella Jr., “poder de polícia é a faculdade discricionária da Administração de, dentro da lei, limitar a liberdade individual em prol do interesse coletivo”.

► Conceito V: Para Celso Antonio Bandeira de Mello, poder de polícia é “a atividade da Administração Pública, expressa em atos normativos ou concretos, de condicionar, com fundamento em sua supremacia geral e na forma da lei, a liberdade e a propriedade dos indivíduos, mediante ação ora fiscalizadora, ora preventiva, ora repressiva, impondo coercitivamente aos particulares um dever de abstenção (non facere) a fim de conformar-lhes os comportamentos aos interesses sociais consagrados no sistema normativo”.

► A princípio, a competência para o exercício do poder de polícia é da entidade competente para legislar sobre a matéria.

► Quando o Poder Público interfere na órbita do interesse privado para salvaguardar o interesse público, restringindo direitos individuais, atua no exercício do poder de polícia. Assim, o fundamento do PP é a supremacia do interesse público sobre o privado.

► Objeto do poder de polícia: sobre todos os bens, direitos, interesses e atividades individuais. Ex.: construção, meio ambiente, saúde pública, trânsito, poluição etc.

► Critérios de limitação do poder de polícia:a) Que seja utilizado em prol do interesse coletivo;b) Respeito ao princípio da proporcionalidade (deverá haver uma relação proporcional entre a limitação ao direito

individual e o prejuízo a ser evitado). c) Que os atos estejam de acordo com os limites constitucionais e legais (sob pena de incorrer em abuso de poder);d) Competência: O órgão executor do Poder de polícia deverá ser competente, sob pena do ato não ser válido.e) Eficácia: a medida deverá ser adequada.f) Necessidade: o exercício do poder só será adotado visando evitar ameaças prováveis ou reais de perturbações ao

interesse público.

► O poder de polícia pode incidir em duas áreas de atuação do Estado: na administrativa (polícia administrativa) e na judiciária (polícia judiciária).

► Quando falamos em Segurança Pública, temos:

a) Polícia Ostensiva: Polícia Militar (estadual – art. 144, parágrafo 5º, CF/88) e Polícia Rodoviária Federal (União – art. 144, parágrafo 3º, CF/88).

b) Polícia Judiciária: Polícia Civil (Estadual – art. 144, parágrafo 4º, CF/88) e Polícia Federal (União – art. 144, parágrafo 1º, CF/88).

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► Diferenças entre a Polícia Administrativa e a Polícia Judiciária:

Polícia Administrativa Polícia JudiciáriaAqui estamos analisando a atividade oriunda do poder de polícia.

Aqui estamos nos referindo à atividade pela qual se promove a investigação dos crimes e contravenções penais.

Configura-se pelo exercício de função de natureza administrativa (e não jurisdicional).

Exercício de função de natureza administrativa (e não jurisdicional).

É atividade administrativa que se inicia e se exaure em si mesma. Inicia e se completa no âmbito da função administrativa.

Embora seja atividade administrativa, prepara a atuação da função jurisdicional penal, fornecendo-lhe subsídios após a ocorrência do delito.

Executada por diversos órgãos administrativos de caráter mais fiscalizador. É inerente e difunde-se por toda a Administração Pública. Ex: polícia de trânsito, de costumes, sanitária, de comunicações, de edificações, de caça, florestal, de pesca, de tráfego e trânsito, de medicamentos, das águas etc.

Vide artigo 144 da CF/88.Ex: órgãos de segurança: Polícia Civil e Polícia Militar.

Incide basicamente sobre os bens, direitos e atividades dos indivíduos (conforme dispõem os doutrinadores)

Preordena-se ao indivíduo (pessoa) em si (individualmente ou indiscriminadamente), ou seja, aquele a quem se atribui o cometimento de ilícito penal.

Tem caráter eminentemente preventivo. Pode, eventualmente, agir repressivamente, a exemplo da interdição de um estabelecimento comercial.

Tem natureza predominantemente repressiva.

Rege-se pelo Direito Administrativo. Rege-se pelo Direito Penal e Processual Penal.Visa exclusivamente ao combate de ilícitos administrativos. Visa, principalmente, ao combate de ilícitos penais.

Polícia de Manutenção da Ordem PúblicaAtividade pela qual se efetua o patrulhamento ostensivo das vias públicas e dos demais locais de acesso público (praças, ruas, estádios, prédios públicos etc.)Exercício de função de natureza administrativa (e não jurisdicional).A atividade recai diretamente sobre os indivíduos (pessoas) em si.Visa, principalmente, ao combate de ilícitos penais.Age de modo preventivo, no intuito de evitar a ocorrência de ilícitos penais ou de outras infrações atentatórias ao interesse público. Poderá ter a sua atividade exaurida na própria esfera administrativa ou poderá, ainda, alcançar a esfera jurisdicional.

► Álvaro Lazzarini diz que a linha de diferenciação entre as polícias administrativa e a judiciária está na ocorrência ou não de ilícito penal. Quando a atuação é na área do ilícito puramente administrativo (preventiva ou repressivamente), a polícia é administrativa. Quando o ilícito penal é praticado, é a polícia judiciária que age.

4.1. Atributos (ou características) do poder de polícia

Gerais Atributos

Específico

4.1.1. Atributos Gerais

a) Presunção de legitimidade: presunção relativa de que o ato administrativo é valido (legal), até que se prove o contrário.

b) Auto-executoriedade► É a capacidade de a Administração auto executar as suas próprias decisões sem precisar de autorização de outro Poder (Judiciário ou Legislativo) para executá-las.► Exemplo: se uma Van é apreendida, é possível cobrar taxa de liberação do veículo em virtude do exercício do poder de polícia e do tempo de permanência na garagem competente, mas não é permitido cobrar indiretamente a multa pela infração de trânsito para liberar o veículo. Caso contrário, a Administração estaria atribuindo a si mesma atividade auto-executória de cobrança sem o devido respaldo legal. Nada obsta que a lei determine o pagamento da multa como condição para a prática de outro ato, v.g., como condição para a renovação de licenciamento de veículos ou a exigência de quitação de tributos para participar de licitação. O que é imprescindível é que referidas hipóteses tenham previsão legal.

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c) Imperatividade, coercitividade ou coercibilidade: determina comportamentos à coletividade e exige o efetivo cumprimento das medidas administrativas adotadas no exercício do poder de polícia.► Se a atividade corresponder a um poder, decorrente do ius imperii estatal, há de ser desempenhada de forma a obrigar todos a observarem os seus comandos.► Pode a Administração usar a força, caso necessário, para vencer eventual recalcitrância. Ex: grevistas que se apoderam da fábrica e se recusam a desocupá-la na forma da lei.

4.1.2. Atributo Específicoa) Discricionariedade: via de regra, no exercício do poder de polícia, a Administração Pública age com discricionariedade, avaliando a conveniência e a oportunidade do ato, podendo escolher os meios adequados para exercer o poder de polícia. Porém, em algumas hipóteses, o ato administrativo poderá ser vinculado quando a norma que o rege estabelecer o modo e a forma de sua realização. É o que ocorre, por exemplo, com as licenças para dirigir, construir e exercer determinadas atividades (a lei determina os requisitos diante dos quais a Administração é obrigada a adotar a solução previamente definida, qual seja, a de conceder a licença requerida pelo particular).► Havendo valoração do órgão administrativo sobre a conveniência e a oportunidade, estar-se-á diante do exercício do poder discricionário. O inverso ocorre quando já está fixada a dimensão da limitação. Nessa hipótese, a Administração terá de cingir-se a essa dimensão, não podendo, sem alteração da norma restritiva, ampliá-la em detrimento dos indivíduos. Neste caso, a atuação será vinculada. Exemplo: a Administração enumera alguns rios onde a pesca está proibida (Poder Discricionário). Assim, será vedado à Administração impedir a pesca (não havendo outra restrição) nos rios não arrolados como alvo das medidas restritivas de polícia (Poder Vinculado).► Celso Antonio Bandeira de Mello entende que o poder de polícia é atividade negativa, vez que impõe ao particular a obrigação de não-fazer, evitando-se, assim, um dano proveniente da ação por ele indevidamente exercida.

4.2. Poder de Polícia Originário e Derivado4.2.1. Originário: as pessoas políticas da federação podem exercer o poder de polícia, afinal, se lhes incumbe editar as próprias leis limitativas, de todo corrente que se lhes confira, em decorrência, o poder de minudenciar as restrições. Trata-se, aqui, do poder de polícia originário, que alcança, em sentido amplo, as leis e os atos administrativos provenientes de tais pessoas.4.2.2. Derivado: o Estado não age somente por seus agentes e órgãos internos (administração direta). Várias atividades e serviços são executados por pessoas administrativas vinculadas ao Estado, pois tais entidades são o prolongamento do Estado e desempenham funções públicas por delegação. Porém, ressalte-se que referida delegação deverá dar-se por lei formal (oriunda de procedimento regular do Poder Legislativo).

4.3. Atuação da Administração Pública no Exercício do Poder de PolíciaPode a Administração atuar de duas maneiras no exercício do poder de polícia:4.3.1. Editando atos normativos em geral (genéricos/abstratos/impessoais). Nesse caso, as restrições são perpetradas via regulamentos, decretos, resoluções, portarias, instruções etc.Exemplo: ato que vise regular o desempenho de determinada profissão.4.3.2. Editando atos concretos: atos preordenados a determinados indivíduos plenamente identificados ( por exemplo, os veiculados por atos sancionatórios como a multa), e atos de consentimentos, como as licenças e autorizações.

4.4. Qualificação dos Atos de Polícia Quanto ao Objeto que ColimamOs atos de polícia possuem, quanto ao objeto que colimam, dupla qualificação:4.4.1. determinações de ordem pública (a vontade administrativa é impositiva, gerando deveres e obrigações aos indivíduos, não podendo estes se eximir de cumpri-los).4.4.2. consentimentos (representam a resposta da Administração aos pedidos dos interessados em exercer determinada atividade que dependa do consentimento para ser considerada legítima. Exemplos: licenças, autorizações e permissões).

4.5. Atos de FiscalizaçãoOs atos de fiscalização realizados pela Administração Pública, através do exercício do poder de polícia, poderão ser:4.5.1. Preventivos (procura-se impedir um dano social. Para tanto, a Administração utiliza-se das fiscalizações, proibições, autorizações, licenças etc).4.5.2. Repressivos (a transgressão da norma de polícia enseja uma sanção, tipo interdição de atividade, apreensão e destruição de mercadorias, multa, embargo de obra etc.).

4.6. Limites do Poder de Polícia► A faculdade repressiva não é ilimitada, estando sujeita a limites jurídicos, tais como, direitos do cidadão, prerrogativas individuais e liberdade públicas asseguradas na constituição e nas leis. Atuar aquém desses limites é renunciar ilegitimamente a poderes públicos. Agir além dela, representa arbítrio e abuso de Poder.

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4.7. Legitimidade da Polícia Administrativa► Os atos de polícia deverão ser praticados por agentes no exercício regular de sua competência.► Os atos deverão ser produzidos com a forma imposta pela lei.► A doutrina moderna erigiu à categoria de princípio necessário à legitimidade do ato de polícia a existência de uma linha proporcional entre os meios e os fins da atividade administrativa (Princípio da Proporcionalidade), sob pena da administração agir com abuso de poder, podendo o ato ser invalidado, inclusive, via mandado de segurança. À Administração são conferidas prerrogativas que têm o único escopo de atender os interesses coletivos. Se a conduta administrativa é desproporcional, a conclusão é a de que um ou alguns indivíduos estão sendo prejudicados por excesso de poder. Assim, a violência excessiva nas favelas, muitas vezes, é desproporcional à regular diligência de preservação da ordem pública no exercício do poder de polícia. Também é desproporcional a aplicação de pena mais gravosa que o ato ilícito cometido.

4.8. Sanções de Polícia► Sanção administrativa (gênero) é:a) ato punitivo;b) previsto em lei (somente ela disporá sobre as condutas que constituam infrações);c) aplicado pela Administração como resultado de uma infração administrativa (transgressão de normas de polícia).► Sanções = penalidades.► Se a sanção resulta do exercício do poder de polícia, qualificar-se-á como sanção de polícia.► Atos administrativos apenas possibilitam a execução da lei sancionatória, mas não podem, por si mesmos, dar origem a apenações. Por essa razão. O TRF da 1ª Região anulou Portaria do Ibama dispondo que: “portaria não é instrumento adequado a, originariamente, prescrever infrações e sanções administrativas, de modo que, somente a lei, em sentido formal e material, pode descrever infração e impor penalidades”.► Exemplos de sanções: multa, inutilização de bens privados, interdição de atividade, embargo de obra, cassação de patentes, proibição de fabricar produtos etc.► As sanções devem observar o devido processo legal. Se o ato sancionatório não propiciar ao infrator a oportunidade de rechaçar a acusação (contraditório e ampla defesa), estará contaminado de vício de legalidade.► Na esfera da Administração federal, direta ou indireta, a ação punitiva, quando se tratar do exercício do poder de polícia, prescreve em cinco anos contados da data da prática do ato ou, em se tratando de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado. Entretanto, se o fato constituir crime, o prazo prescricional será o mesmo atribuído pela lei penal.► A prescrição da ação punitiva da Administração, no caso das sanções de polícia se interrompe: a) pela citação do indiciado ou acusado, ainda que por edital; b) por qualquer ato inequívoco pelo qual se demonstre o interesse administrativo na apuração do fato; e c) pela decisão condenatória recorrível.

5. PRINCIPAIS DEVERES DO ADMINISTRADOR PÚBLICO

São deveres genéricos da Administração Pública:5.1. Dever de Probidade: o agente público deverá atuar com honestidade e moralidade, sem favorecimentos, e optar pelo que melhor atenda à Administração. A improbidade acarreta suspensão de direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao Erário, sem prejuízo da ação penal cabível. A improbidade pode se dar por atos que dão ensejo ao enriquecimento ilícito, por atos que geram prejuízo ao erário ou por atos que ofendam os princípios da Administração (Lei 8.429/92). A lei abrange todo e qualquer agente público, seja qual for a situação que o vincule ao Poder Público Destacam-se, também, dentre outras sanções infraconstitucionais: proibição de contratar com o Poder Público, pagamento de multa civil e vedação ao recebimento de incentivos fiscais. O dever de probidade encontra-se constitucionalmente integrado na conduta do administrador, como elemento necessário à legitimidade de seus atos. A Lei 8.429/92 classifica os casos de improbidade administrativa em três espécies: a) enriquecimento ilícito; b) prejuízo ao Erário; e c) não observância dos princípios administrativos. A Ação Popular é um dos institutos intimamente relacionados a esse dever.

5.2. Dever de prestar contas: a prestação pode ser realizada internamente, através dos órgãos escalonados em graus hierárquicos, ou externamente, através dos Tribunais de Contas competentes. O dever de prestar contas alcança a administração centralizada ou descentralizada, bem como as pessoas que recebam subvenção governamental, sendo, portanto, uma obrigação a todos que gerem ou administram dinheiro público. A prestação não se refere, apenas, aos erários públicos ou à gestão financeira, mas a todos os atos de governo e de administração. Vide o § único do art. 70 da CF/88.

5.3. Dever de eficiência: É o dever de desempenhar uma boa administração. O agente público deverá agir com presteza, perfeição e rendimento funcional. A eficiência deverá se dar de forma que o trabalho seja perfeito e que as técnicas adotadas tenham sido adequadas para atingir os fins propostos. Desta forma, a verificação da eficiência atinge os aspectos quantitativos e qualitativos do serviço. Verificamos o princípio da eficiência diante de situações como: a) supervisão ministerial da Administração Direta em relação à Indireta; b) dispensa de servidor estável, com a devida perda do cargo,

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por ser ineficiente, após avaliação periódica de desempenho; c) avaliação especial de desempenho, como condição para a aquisição da estabilidade e etc.

5.4. Poder-dever de agir: O agente público tem o dever de agir sempre que necessário. Seus poderes administrativos, portanto, são irrenunciáveis. A omissão do agente, diante de situações que exijam alguma conduta, caracteriza abuso de poder.

CAPÍTULO IIIORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA

1. NOÇÕES GERAIS A Forma de Estado é a FEDERAÇÃO. Há um poder político central e soberano e entidades políticas internas componentes do sistema, às quais são conferidas competências específicas pela CF.

Há diferenças entre a Federação e a Confederação:Federação ConfederaçãoTodos os integrantes da federação materializam o Estado e agem dentro dos limites constitucionais de competência. Apenas o Estado em si detém soberania. Todos os membros são soberanos.Os entes integrantes do regime se associam numa união indissolúvel, como forma de dar à unidade resultante preponderância sobre a pluralidade formadora.

A aliança se forma entre vários Estados soberanos.

A Federação distingue o poder político central dos poderes atribuídos aos entes integrantes.

Há um vínculo frágil e instável.

A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são: a) Pessoas jurídicas de direito público; b) Pessoas federativas e c) Representantes de cada compartimento interno do Estado federativo brasileiro. Os Territórios, embora sendo pessoas jurídicas de direito público, não têm autonomia política e não integram a federação (art. 18, CF/88), sendo, apenas, pessoas administrativas descentralizadas que integram a União e são reguladas por lei complementar federal.

2. CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DA FEDERAÇÃO2.1. A descentralização política;2.2. O poder de autoconstituição das entidades integrantes;2.3. A participação das vontades dos entes integrantes na formação da vontade nacional (senadores);2.4. Os entes integrantes do sistema federativo têm AUTONOMIA na organização político-administrativa do Estado. Essa autonomia demonstra que os entes são dotados de independência dentro dos parâmetros constitucionais. Essa autonomia atribui aos entes os poderes de autoconstituição, autogoverno, autolegislação e auto-administração;2.5.Inexistência de hierarquia entre os entes da federação, pois gozam de “poder de autodeterminação”.

3. PODERES E FUNÇÃO ADMINISTRATIVANa organização político-administrativa da república brasileira, são três os Poderes Políticos: Executivo, Legislativo e Judiciário.A tripartição dos Poderes abrange, também, os Estados-membros. Mas os municípios têm em sua estrutura orgânica apenas o Legislativo e o Executivo (bipartição de Poderes).Os Poderes têm funções típicas e atípicas.A função administrativa é, dentre todas, a mais ampla. Através dela, o Estado cuida da gestão de seus interesses e os da coletividade. É vista como residual, ou seja, excluídas a função legislativa e a jurisdicional, todo o restante espelha o exercício da função administrativa.A função administrativa é desempenhada em todos os Poderes da U/E/DF e M, abrangendo todos os órgãos que não estejam voltados ao exercício da legislação ou da jurisdição.

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1. CONCEITOSEm sentido objetivo (material ou funcional), administração pública exprime a idéia de atividade, tarefa, ação,

enfim, a própria função administrativa.Em sentido subjetivo (formal ou orgânico) a Administração Pública representa o universo de órgãos, agentes e

pessoas jurídicas (entidades) incumbidos de realizar as atividades administrativas, visando à satisfação das necessidades

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coletivas e segundo os fins desejados pelo Estado. Neste sentido, dá-se realce ao agente ou sujeito da função. Por pessoas jurídicas (ou administrativas) entendem-se aquelas que exercem suas atividades de maneira descentralizada, tais como as autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas (compondo a Administração indireta).

2. PRINCÍPIOS REGEDORESOs princípios regedores da Administração Pública estão na CF ou fora dela (inseridos nas diversas leis que

tratam da organização dos entes federativos). Os princípios constitucionais (LIMPE) se impõem a todas as esferas federativas (U/E/DF/M), abrangendo a administração direta e indireta. Quanto à União, seu estatuto organizacional próprio apresenta cinco princípios norteadores da Administração Federal: planejamento, coordenação, delegação de competência, controle e descentralização. São esses princípios, especialmente o da descentralização, que fundamentam a divisão da administração em direta e indireta.

3. ORGANIZAÇÃO

3.1. Administração Pública Direta – Noções GeraisA Administração Pública Direta é formada pelos entes integrantes da federação e seus respectivos órgãos.Os órgãos são centros de competências instituídos para o desempenho de funções estatais, por intermédio de

seus agentes. Para bem desempenhar suas funções, todo órgão recebe uma determinada competência. Essa competência é redistribuída entre os seus cargos, com a correspondente parcela de poder necessária para que os seus agentes possam agir. A Lei 9784/99 dispõe que órgão é a unidade de atuação integrante da estrutura da Administração direta ou indireta.

A Administração Direta é o conjunto de órgãos que integram as pessoas federativas, aos quais foi atribuída a competência para o exercício de forma centralizada das atividades administrativas do Estado. A Administração Pública é titular e executora do serviço público. A cada órgão é cometida uma competência própria, que corresponde a alguma parcela do objetivo total do Estado. Portanto, a centralização é inerente à Administração Direta do Estado.Atenção! no conceito de “Estado”, considera-se as pessoas políticas que compõem o sistema federativo: U/E/DF e M.

Certas funções centralizadas são tão importantes que mereceram referência constitucional, tais como os órgãos das “administrações tributárias” (vide o art. 37, XXII).

Veja-se que os órgãos são integrados por agentes ou servidores. Os agentes são a representação humana dos órgãos.

A título de ilustração, a Administração Direta possui a seguinte composição:Executivo Presidência da República e Ministérios

Casa Civil (*1) SecretariasSecretaria Geral (*2) Conselhos Assessoria Especial (*3) InspetoriasAdvogado Geral da União (*4) Departamentos Conselho da República (*5) Coordenadorias Conselho de Defesa Nacional (*6)

Esfera Federal(União)

Legislativo tem o poder constitucional de dispor sobre sua organização e funcionamento, bem como de elaborar seu regimento interno.

Judiciário tem capacidade auto-organizatória em relação a cada um de seus Tribunais.

Executivo Governadoria do Estado e Secretarias Estaduais Órgãos de Assessoria

Esfera Estadual(Estado-membro)

Legislativo

Judiciário

Esfera Municipal(Município)

Executivo Prefeitura e Secretarias Municipais Órgãos de Assessoria ao Prefeito

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Legislativo a Câmara Legislativa poderá dispor sobre sua organização. (*1 e 2) – Órgãos Essenciais. (*3 e 4) – Órgãos de Assessoramento Imediato.(*5 e 6) – Órgãos de Consulta. Estes órgãos, apesar de incluídos na hierarquia administrativa para fins disciplinares (apuração de infrações e aplicação de penalidades), não se submetem à relação hierárquica quanto ao desempenho de suas funções precípuas, quais sejam, as de caráter consultivo (ver artigos 90 e 91-§1º, ambos da CF/88).

3.1.1. Classificação dos Órgãos Públicos: Os órgãos públicos podem ser classificados quanto à posição estatal, estrutura e atuação funcional. Vejamos:

3.1.1.a. Classificação dos Órgãos Públicos quanto à Posição Estatal: Independentes (ou Primários):

São: A) originários da CF; B) representativos dos três Poderes de Estado; C) sem qualquer subordinação hierárquica ou funcional quando no exercício das suas funções típicas; D) sujeitos somente aos controles constitucionais recíprocos de um Poder pelo outro; E) seus membros são agentes políticos, distintos de seus servidores.

Exemplos: As Chefias do Poder Executivo, tais como a Presidência da República, Governadorias de Estado e as Prefeituras Municipais. As Casas Legislativas, tais como o Senado Federal, Congresso Nacional, Câmara de Vereadores, Câmara dos Deputados e Assembléias Legislativas. Todos os Tribunais do Poder Judiciário (STF, STJ, TJ, TRFs etc), incluindo os Juízes singulares (Varas da Justiça). Incluem-se, ainda, dentro da classificação de órgãos independentes, embora não sejam representativos de qualquer Poder, o Ministério Público Federal, o Ministério Público Estadual, os Tribunais de Contas (da U/E/M) e o Tribunal do Júri. Por último, lembramos que os Municípios não possuem Poder Judiciário e nem Ministério Público.

Autônomos (ou Diretivos): Características: A) localizam-se logo abaixo dos Órgãos Independentes, no ápice da estrutura administrativa; B)

são subordinados aos chefes dos órgãos independentes; C) têm ampla autonomia administrativa, financeira e técnica; D) caracterizam-se como órgãos diretivos e visam precipuamente o planejamento, a coordenação, a supervisão e o controle das atividades sob sua competência. Exemplos: Ministérios, Secretarias Estaduais e Secretarias Municipais, a Advocacia Geral da União e os demais órgãos diretamente subordinados aos Órgãos independentes, prestando assistência e auxílio imediatos. Seus dirigentes, em regra, não são servidores, mas agentes políticos nomeados em comissão.

Superiores: Características: A) têm poder de direção, controle, decisão, planejamento e comando dos assuntos de sua

competência específica; B) estão sujeitos às regras de hierarquia e subordinação de uma chefia superior; C) não tem autonomia administrativa ou financeira, pois referida autonomia é atributo dos órgãos independentes e autônomos aos quais pertencem, mas possuem autonomia técnica na sua área-fim em relação às suas funções específicas. Exemplos: Gerências, Gabinetes, Secretarias-Gerais, Inspetorias-Gerais, Procuradorias Administrativas e Judiciais, Departamentos, Coordenadorias e Divisões.

Subalternos: Características: A) devem obediência ao Poder Hierárquico dos Órgãos mais elevados; B) têm reduzido poder

decisório; C) sua atribuição precípua é a de execução (serviços de rotina, tarefas de formalização de atos administrativos, cumprimento de decisões superiores e primeiras decisões em casos individuais). Exemplos: Seção de Transporte, Seção de Pagamento, Setor de Almoxarifado (atividades-meio).

3.1.1.b. Quanto à estrutura: Simples (ou unitários): são constituídos por um só centro de competência (inexistência de outro órgão incrustado na sua estrutura, para realizar deconcentradamente sua função principal). Não é o número de cargos ou agentes que define a estrutura em simples ou composta.

Compostos: são os que possuem em sua organização outros órgãos menores, com função principal igual (atividade-fim realizada desconcentradamente) ou com outras funções auxiliares (atividades-meio). No órgão composto, ocorre o fenômeno da “desconcentração”, onde o órgão de maior hierarquia envolve os menores e inferiores formando, assim, um sistema orgânico. As funções são distribuídas a vários centros de competência. O órgão mais alto supervisiona os demais e os chefes imediatos realizam a fiscalização. Pode-se avocar e rever os atos das unidades inferiores. Ex.: Secretaria de Educação + órgãos de pessoal + unidades escolares.

3.1.1.c. Quanto à atuação funcional: Singulares (ou unipessoais): apesar da existência de outros agentes auxiliares, a sua decisão se dá por meio de um único agente, que é seu chefe e representante. Exemplo: Órgão da presidência da república.

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Colegiados (ou pluripessoais): a decisão se manifesta conjunta e majoritariamente pela vontade de seus membros.

3.2. Administração Pública Indireta – Noções GeraisConceito: Grupo de pessoas jurídicas de direito público ou privado, criadas ou instituídas a partir de lei

específica, que atuam paralelamente à Administração direta na prestação de serviços públicos ou na exploração de atividades econômicas.

Conceito II: É o conjunto de pessoas administrativas que, vinculadas à respectiva Administração Direta, desempenham as atividades administrativas de forma descentralizada.

A Administração Indireta é formada por pessoas jurídicas, também denominadas de entidades administrativas. A Lei 9784/99 define entidade como “a unidade de atuação dotada de personalidade jurídica”.

Tais pessoas ligam-se às pessoas políticas da federação, nas quais está a respectiva administração direta.O objetivo de sua instituição é a atuação estatal descentralizada.O objetivo da Administração Indireta do Estado é a execução de algumas tarefas de seu interesse por outras

pessoas jurídicas. Quando não pretende executar determinada atividade através de seus próprios órgãos, o Poder Público transfere a sua titularidade ou mera execução a outras entidades.

O critério para a instituição de pessoas da Administração Indireta é de ordem administrativa, através da análise da oportunidade e conveniência. Criada essa entidade, a atividade será descentralizada.

Tendo em vista a autonomia conferida pela CF, todas as entidades federativas podem ter a sua Administração Indireta. Assim, além da federal, temos a Administração Indireta de cada Estado, do DF e dos municípios.

Conforme o Decreto 200/67, a Administração Indireta compreende as seguintes entidades administrativas, dotadas de personalidade jurídica própria: Autarquias, Fundações Públicas (inseridas na administração indireta em 1987), Sociedades de Economia Mista e Empresas Públicas. Essas entidades são integrantes da Administração Indireta, sejam elas da União/E/DF ou M. Com essa qualificação, estará ela vinculada à respectiva Administração Direta. A circunstância de que a entidade se enquadra numa das categorias jurídicas mencionadas, confere certeza suficiente para ser considerada como integrante da Administração Indireta da respectiva pessoa federativa, e isso independentemente de prestar serviço público ou exercer atividade econômica de natureza empresarial.

O termo paraestatal significa “ao lado do Estado”, “paralelo ao Estado”. São as pessoas jurídicas que atuam ao lado e em colaboração com o Estado. Vários são os sentidos que lei, doutrinadores e tribunais têm emprestado à expressão.

Quanto aos princípios da Administração Indireta, podemos dizer que todos os princípios de caráter genérico incidem sobre a mesma. Porém, há três que merecem destaque, porque dizem respeito particularmente à administração indireta. São eles:

a) Princípio da Reserva Legal: todas as pessoas da Administração Indireta de qualquer dos Poderes só podem ser instituídas por lei específica. Daí o art. 37, XIX, dizer que “Somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação...” O art. 173, § 1º dispõe que as empresas públicas e sociedades de economia mista terão como objeto explorar atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços. O Mandamento significa que tais entidades só podem ingressar no mundo jurídico se houver manifestação dos Poderes Legislativo e Executivo no processo de formação da lei instituidora, cabendo a este último (o Executivo) o poder de iniciativa da lei, por se tratar de matéria de caráter estritamente organizacional da Administração Pública. O princípio se aplica, também, à hipótese de instituição de pessoas subsidiárias das empresas públicas e sociedades de economia mista, evitando-se que as entidades primárias instituam, a seu exclusivo critério, essas pessoas de natureza derivada (subsidiárias), com o risco de ficarem sem qualquer controle e de provocarem dispêndio ao erário público. Não é necessário, porém, que haja uma lei autorizadora específica para que seja criada cada subsidiária. Nada impede que a lei instituidora da entidade primária, ou lei subseqüente, já preveja a instituição de futuras subsidiárias (esse é o entendimento do STF).

b) Princípio da Especialidade: aponta para a absoluta necessidade de ser expressamente consignada na lei a atividade a ser exercida descentralizadamente pela Administração Indireta. Nenhuma dessas entidades pode ser instituída com finalidades genéricas, sem que se defina na lei o objeto preciso de sua atuação. Somente as pessoas políticas (U/E/DF/M) têm funções genéricas das mais diversas naturezas.

c) Princípio do Controle: toda pessoa integrante da Administração Indireta é submetida a controle pela Administração Direta da pessoa política a que é vinculada (e não subordinada). O princípio do controle (ou tutela administrativa) tem quatro aspectos: 1º) controle político (os dirigentes das entidades da Administração Indireta são escolhidos pela autoridade da Direta, razão por que os mesmos exercem função de confiança – relação intuitu personae); 2º) controle institucional (obriga a entidade a cumprir os fins para os quais foi criada); 3º) controle administrativo (que permite a fiscalização dos agentes e das rotinas administrativas da entidade) e 4º) controle financeiro (fiscalização dos setores financeiro e contábil da entidade).

A forma através da qual os órgãos governamentais exercem o controle pode variar conforme a lei de organização administrativa federal, estadual, distrital ou municipal. Como regra, tem-se adotado o sistema de controle

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através de Ministérios ou de Secretarias. A União adotou essa sistemática, denominando-a de supervisão ministerial: “todo e qualquer órgão da administração federal, direta ou indireta, está sujeito à supervisão do Ministro de Estado competente”. O controle funda-se na relação de vinculação (toda pessoa da administração indireta é vinculada a determinado órgão da respectiva administração direta). Observe-se a distinção entre a relação de vinculação, fixada entre pessoas e relação de subordinação, apropriada para o controle entre órgãos internos das pessoas administrativas. Assim, citamos como exemplo de controle o fato de as escolas e universidades ficarem sob o controle do Ministério da Educação e do Desporto. Pessoas ligadas à área econômica, como o Banco Central, Casa da Moeda e Banco do Brasil são vinculadas ao Ministério da Fazenda. Hospitais e Fundações de saúde ao Ministério da Saúde etc.

4. AUTARQUIAS4.1. Conceito I: autarquia é uma entidade criada por lei específica, com personalidade jurídica de direito público, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública de natureza administrativa, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizadas.

4.2. Conceito II: Para o professor Bandeira de Mello, as autarquias são “pessoas jurídicas de direito público de capacidade exclusivamente administrativa”.

4.3. Conceito III: pessoa jurídica de direito público, integrante da Administração Indireta, criada por lei para desempenhar funções que, despidas de caráter econômico, sejam próprias e típicas do Estado. Exemplos de autarquias vinculadas à União: INSS, INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), Banco Central do Brasil (BACEN), Comissão de Valores Mobiliários (CVM, vinculada ao Ministério da Fazenda), IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), DNOCS (Departamento Nacional de Obras contra Secas), EMBRATUR, SUSEP (Superintendência de Seguros Privados, vinculada ao Ministério da Fazenda), ANATEL etc. Na esfera estadual, temos a AGANP (Agência Goiana de Administração e Negócios Públicos – autarquia estadual vinculada à Secretaria de Estado da Fazenda), a AGR (Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos), o IPASGO (Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores do Estado de Goiás, vinculada à Secretaria da Fazenda), a Agência Goiana de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Agência Ambiental de Goiás, vinculada à Secretaria do Meio Ambiente) etc. Na esfera municipal, encontramos o MUTIRAMA, a SMT (Superintendência Municipal de Trânsito) e o DERMU (Departamento de Estradas de Rodagem do Município).Autarquia e autonomia POLÍTICA têm significados diversos.A autonomia política indica que alguns entes podem criar sua própria administração e estabelecer sua organização jurídica. É o que ocorre quanto à U/E/DF e M. O art. 18 da CF emprega o termo “autônomos” quando se refere a tais entidades políticas. A conotação de autarquia não é de caráter político, mas administrativo. O Estado, quando cria autarquias, visa a atribuir-lhes funções que merecem ser executadas de forma descentralizada. Daí não poderem as autarquias criar regras jurídicas de auto-organização, nem terem capacidade política (autonomia política), mas, sim, autonomia administrativa. Sua função é meramente administrativa. Assim, enquanto a autonomia é o próprio Estado, a autarquia é apenas, uma pessoa administrativa criada pelo Estado.

4.4. Autarquias institucionais X territoriais: a doutrina distingue as autarquias institucionais das territoriais. As territoriais correspondem a desmembramentos geográficos em certos países, normalmente com regime unitário, aos quais o poder central outorga algumas prerrogativas de ordem política e administrativa, permitindo-lhes uma relativa liberdade de ação. Não chegam a ser verdadeiras autonomias, mas têm a seu cargo algumas funções privativas conferidas pelo Estado. Esse, aliás, foi o sentido inicial do termo autarquia. Citamos como exemplos os territórios (entes despidos de autonomia, que executam, por delegação, algumas funções próprias de Estado). Porém, as autarquias ditas institucionais nascem como pessoas jurídicas criadas pelo Estado para tarefas às quais a lei as destinou. Tratam-se de meras pessoas administrativas.

4.5. Personalidade Jurídica: a CF não dispôs de forma peremptória que as autarquias integram a Administração Indireta. Foi o Decreto-Lei nº.200/67 (Estatuto da Reforma Administrativa Federal) que ofereceu a conceituação de autarquia, dispondo claramente que esta entidade era integrante da Administração Indireta: “ serviço autônomo criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da administração pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada”. As autarquias são pessoas jurídicas de direito público (qualificação conformada pelo atual Código Civil, que relacionou as autarquias dentre as pessoas jurídicas de direito público). Dotadas de função exclusivamente administrativa (o que as coloca em plano diverso das pessoas integrantes da federação, estas sim, possuidoras de capacidade política), sua personalidade jurídica de direito público lhes atribui todas as prerrogativas contidas no ordenamento jurídico. Sendo pessoas jurídicas de direito público, não incidem sobre elas a legislação prevista no Código Civil. A regra de que a existência legal das pessoas jurídicas começa com a inscrição, no registro próprio, de seus contratos, atos constitutivos ou estatutos, se irradia apenas sobre as pessoas de direito privado. Para as pessoas jurídicas de direito público, como as autarquias, a regra tem estreita conexão com o princípio da legalidade, visto que, sendo criadas por lei, têm o início de sua existência no mesmo momento

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em que se inicia a vigência da lei criadora. É, portanto, com o início da vigência da lei criadora que tem início a personalidade jurídica das autarquias.

4.6. Criação e Extinção das Autarquias: a lei que dá origem à autarquia deve ser da iniciativa privativa do Chefe do Executivo. Para a extinção, é também a lei o instrumento jurídico adequado. Ademais, não poderia ato administrativo dar por finda a existência de pessoa jurídica instituída por lei, já que se trata de ato de inferior hierarquia (a lei é hierarquicamente superior ao ato administrativo). Já a organização das autarquias é delineada através de ato administrativo, normalmente decreto do Chefe do Executivo. No ato de organização, são fixadas as regras atinentes ao funcionamento da autarquia, aos órgãos componentes e à sua competência administrativa, ao procedimento interno e a outros aspectos ligados efetivamente à atuação da entidade autárquica. Assim, as autarquias detêm poder de auto-administração, podendo gerir a si próprias dentro dos limites estabelecidos na lei instituidora.

4.7. Objeto: O Decreto-Lei 200/67 consignou que as autarquias executam atividades típicas da administração pública (expressão que suscita dúvidas de seu sentido). O legislador teve o escopo de atribuir às autarquias a execução de serviços públicos de natureza social e de atividades administrativas, com a exclusão dos serviços e atividades de cunho econômico e mercantil (estes serviços são adequados a outras pessoas administrativas, como as sociedades de economia mista e as empresas públicas). Citamos, a título de exemplo, autarquias que desenvolvam determinado serviço de assistência a regiões inóspitas do país ou que prestem serviços médicos.

4.8. Classificação das Autarquias Quanto ao Nível Federativo: as autarquias podem ser federais, estaduais, distritais ou municipais. Não são admissíveis autarquias interestaduais ou intermunicipais. Se há interesse conjunto de Estados-membros e de municípios em executar serviços comuns, devem, por si mesmos ou por pessoas descentralizadas, como é o caso de autarquias, celebrar convênios ou consórcios administrativos, constituindo essa forma de cooperação a gestão associada (art. 241 da CF), tendo em vista que cada pessoa descentralizada é vinculada apenas ao ente federativo responsável por sua instituição, e não simultaneamente a várias pessoas administrativas.

4.9. Objetivos Quanto aos objetivos, as autarquias classificam-se em:a) Autarquias assistenciais: visam auxiliar a regiões menos desenvolvidas ou a categorias sociais específicas,

minorando as desigualdades regionais e sociais. Ex.: ADENE (Agência de Desenvolvimento do Nordeste), ADA (Agência de Desenvolvimento da Amazônia) e INCRA (Instituto nacional de Colonização e Reforma Agrária);

b) Autarquias previdenciárias: voltadas para a atividade de previdência social oficial. Ex.: INSS.c) Autarquias culturais: dirigidas à educação e ao ensino. Ex.: UFRJ.d) Autarquias profissionais: incumbidas da inscrição de certos profissionais e de fiscalizar sua atividade. Ex.: OAB e

CRM.e) Autarquias administrativas: que formam a categoria residual, ou seja, daquelas entidades que se destinam às várias

atividades administrativas, inclusive de fiscalização, quando essa atribuição for da pessoa federativa a que estejam vinculadas. Ex.: INMETRO (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial), BACEN e IBAMA.

f) Autarquias de controle: enquadram-se nesta categoria as agências reguladoras.

4.10. Regime Jurídico Quanto ao REGIME JURÍDICO, as autarquias classificam-se em:

a) Autarquias comuns (ou de regime comum): sujeitas a uma disciplina jurídica sem qualquer especificidade;b) Autarquias especiais (ou de regime especial): são regidas por disciplina específica, cuja característica seria a de

atribuir prerrogativas especiais e diferenciadas a certas autarquias. Seus elementos definidores corresponderiam às seguintes prerrogativas: 1a ) poder normativo técnico, onde essas autarquias recebem das leis delegação para editar normas técnicas - não as normas básicas de política legislativa -, mas complementares da lei; 2º) autonomia decisória, onde os conflitos administrativos, inclusive os que envolvem as entidades sob seu controle, se dirimem na própria autarquia; 3º) independência administrativa, onde alguns de seus dirigentes têm investidura a termo (são nomeados para prazo determinado fixado na lei, não ficando os mesmos à mercê de algum critério político do Ministério supervisor). Assim, têm os dirigentes alguma estabilidade em seus cargos, sobretudo porque são nomeados pelo Presidente da República, mas sua investidura depende de aprovação do Senado Federal e 4º) autonomia-econômico-financeira.

4.11. Patrimônio: quanto ao PATRIMÔNIO, observa-se que as autarquias não integram a organização política do Estado, mas estão a ele vinculadas, ostentando personalidade jurídica de direito público. O art. 98 do Código Civil diz que “São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno...”. Por via de conseqüência, a natureza dos bens das autarquias é a de bens públicos. Assim, os bens das autarquias são impenhoráveis e imprescritíveis. Não é livre para o administrador autárquico a sua alienação. É necessário que o mesmo obedeça às regras legais reguladoras dessa especial atividade administrativa, qual seja, a alienabilidade dos bens públicos.

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4.12. Pessoal: quanto ao PESSOAL, de acordo com o antigo art. 39 da CF, as pessoas federativas ficaram com a obrigação de instituir, no âmbito de sua organização, regime jurídico único para os servidores da Administração Direta, das autarquias e das fundações públicas. O objetivo foi o de manter planos de carreira idênticos para esses setores. O regime jurídico único, todavia, foi extinto pela EC 19/98. Desvinculado da Administração Direta, o regime de pessoas das autarquias poderá este ser o estatutário ou o trabalhista. Tudo dependerá do que a lei do ente federativo dispuser a respeito.

4.13. Controle Judicial: as autarquias, conquanto dotadas de personalidade jurídica de direito público, praticam atos administrativos típicos e atos de direito privado. Os atos de direito privado são controlados no Judiciário pelas vias comuns adotadas na legislação processual. Ex.: se a autarquia adquire área de um particular, o contrato aí celebrado (compra e venda) será o previsto no Código Civil.

4.14. Foro dos Litígios Judiciais: as autarquias federais (artigo 109, I, CF/88), nos litígios comuns, sendo autoras, rés, assistentes ou oponentes, têm suas causas na Justiça Federal. A JF é competente, também, para processar e julgar mandados de segurança contra agentes autárquicos (109, VIII, CF). Há a previsão de foro específico (Justiça Estadual) para as causas de falência e Justiça do Trabalho nos casos de acidentes de trabalho (art. 114 da CF/88, por força da EC 45/2004). Dependendo da matéria, serão competentes para o julgamento da lide a Justiça Eleitoral e a Justiça do Trabalho. Quanto às autarquias estaduais e municipais, os processos terão seu curso na Justiça Estadual. Vejamos a questão dos litígios decorrentes da relação de trabalho: o regime dos servidores autárquicos pode ser o estatutário ou o trabalhista. Sendo estatutário, o litígio classifica-se como de natureza comum, de modo que eventuais demandas devem ser dirimidas nos juízos fazendários, os mesmos, aliás, onde tramitam os litígios de natureza estatutária dos servidores da Administração Direta. Se, ao contrário, o litígio decorrer de contrato de trabalho firmado entre a autarquia e o servidor, terá ele a natureza de litígio trabalhista, devendo ser solvido na Justiça do Trabalho, seja federal, estadual ou municipal a autarquia.

4.15. Atos e Contratos: os atos das autarquias são, como regra, típicos atos administrativos. Devem conter todos os requisitos de validade (competência, finalidade etc.) e são privilegiados pela imperatividade, presunção de legitimidade, auto-executoriedade e exigibilidade. Sua extinção pode dar-se pela invalidação ou pela revogação. Fora daqueles contratos típicos do direito privado (compra e venda, permuta, doação etc.), os ajustes firmados por autarquias se caracterizam como contratos administrativos. Tais contratos regem-se pela Lei 8.666/93.

4.16. Responsabilidade Civil: Dispõe o art. 37, § 6º, da CF, que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos respondem pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. É a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, ou seja, aquela que independe da investigação sobre a culpa na conduta do agente.

4.17. Prerrogativas Autárquicas: são elas, dentre outras:a) Imunidade tributária : o art. 150, § 2º da CF veda a instituição de impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços

das autarquias, desde que vinculados a suas finalidades essenciais. Assim, a imunidade para as autarquias tem natureza condicionada.

b) Impenhorabilidade de seus bens e de suas rendas : não há penhora como garantia do credor. A garantia se estabelece, como regra, pelo sistema de precatórios judiciais.

c) Imprescritibilidade de seus bens : não podem ser adquiridos por terceiros via usucapião. Não só os imóveis, mas quaisquer bens públicos são imprescritíveis.

d) Prescrição qüinqüenal : dívidas e direitos em favor de terceiros contra autarquias prescrevem em cinco anos.e) Créditos sujeitos à execução fiscal : os créditos autárquicos são inscritos como dívida ativa.f) Situações processuais específicas : as autarquias se consideram como fazenda pública. Tem prazo em quádruplo para

contestar e em dobro para recorrer. Estão sujeitas ao duplo grau de jurisdição, só produzindo efeito após confirmação pelo Tribunal das sentenças proferidas contra autarquias e as que julgarem procedentes embargos à execução de Dívida Ativa. Inexistirá a prerrogativa quando o valor discutido não exceder a 60 salários mínimos, ou a decisão tiver fundamento em jurisprudência do plenário do STF ou em súmula de qualquer tribunal superior competente, hipóteses em que a pessoa pública interessada terá que interpor o respectivo recurso voluntário.

4.18. AGÊNCIAS AUTÁRQUICAS REGULADORAS E EXECUTIVAS: uma das medidas preconizadas pelo Governo foi a da criação de um grupo especial de autarquias (denominadas de agências). Tais agências visam controlar as pessoas privadas incumbidas da prestação de serviços públicos, em regra sob a forma de concessão ou permissão, e também na de intervenção estatal no domínio econômico, quando necessário para evitar abusos neste campo, perpetrados por pessoas da iniciativa privada. Em função dessa diversidade de objetivos, tais agências autárquicas classificam-se em duas categorias:

4.18.1. Agências Reguladoras (Lei 9.635/98): Instituído o Plano Nacional de Desestatização, transferiu-se à iniciativa privada atividades que o Estado exercia de forma dispendiosa e indevida. Uma das formas de transferir referidas

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atividades consistiu no processo de privatização, pelo qual se antevia a alienação, às pessoas da iniciativa privada, de direitos pertencentes ao Governo federal que lhe asseguravam a preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da sociedade. O afastamento do Estado, dessas atividades, exigiu a instituição de órgãos reguladores. Foram então criadas, sob a forma de autarquias (agências autárquicas ou governamentais), as agências reguladoras (entidades com típica função de controle). Ex.: ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica, vinculada (e não subordinada) ao Ministério de Minas e Energia, regulamentando e fiscalizando a geração, transmissão e distribuição de energia elétrica), ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações); ANP (Agência Nacional de Petróleo, regulamentando e fiscalizando serviços relacionados às atividades petrolíferas desenvolvidas pelo Poder Público ou seus concessionários), ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, com o objetivo de proteger a saúde da população em geral), ANS (controladora das entidades que oferecem planos de saúde), ANA (Agência Nacional das Águas, tendo como alvo a implementação da política nacional de recursos hídricos e o controle dos usos desses recursos em águas do domínio da União e vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, como entidade federal de implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos), ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), a ANTAq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários, regulando a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre) e a ANCINE (Agência Nacional de Cinema, para dispor sobre políticas relativas à atividade cinematográfica). A essas autarquias reguladoras foi atribuída a função principal de controlar a prestação dos serviços públicos e o exercício de atividades econômicas. Atualmente os servidores das agências reguladoras devem sujeitar-se ao regime estatutário respectivo (na esfera federal é a Lei 8.112/90). Assim, as agências reguladoras são pessoas jurídicas de direito público interno, criadas por lei específica, sob a forma de autarquias especiais, integrantes da administração indireta, com o objetivo de desempenhar atividades típicas de Estado.

Podemos elencar, abaixo, as características das Agências Reguladoras, quais sejam: São pessoas jurídicas de direito público com capacidade administrativa. É a outorga da Administração Pública Direta de regimes especiais de atuação a entidades autárquicas. São instituições muito recentes em nosso ordenamento jurídico. Possuem natureza jurídica de autarquias de regime especial. São titulares de poder normativo e disciplinar, como ocorre com a aplicação de multas aos entes particulares. Não executam o serviço propriamente; apenas fiscalizam. Têm independência administrativa (estabilidade dos dirigentes: mandato fixo, só podendo ser destituídos por condenação judicial transitada em julgado, improbidade administrativa ou descumprimento injustificado das políticas estabelecidas para o setor ou pelo contrato de gestão. A nomeação é realizada pelo Presidente da República, após sabatina do Senado). Têm autonomia financeira (renda própria e liberdade de sua aplicação). Necessidade de concurso público para contratação de pessoal. Todas as agências reguladoras poderão: celebrar contratos (notadamente os que determinem a prestação dos serviços do setor competente); determinar a abertura de licitações para formalização dos respectivos contratos; fiscalizar a execução dos contratos; fixar multas e outras sanções aos concessionários pelo descumprimento de cláusulas contratuais e resolver conflitos de interesses das concessionárias.

4.18.2 Agências Executivas (Lei 9.649/98, aplicável apenas na esfera federal): As agências executivas se distinguem das reguladoras, pois não tem como função precípua a de exercer controle sobre particulares prestadores de serviços públicos. Tais entidades destinam-se a exercer atividade estatal descentralizada. Não se quer dizer que não possam ter, entre suas funções, a de fiscalização de pessoas e atividades, mas sim que tal função não constituirá o ponto fundamental de seus objetivos. Ex: INMETRO (Instituto Nacional de Metrologia, Normatização e Qualidade Industrial), Agência de Inteligência (ABIN), ADENE (Agência de Desenvolvimento do Nordeste, que tem a função de implementar políticas e viabilizar instrumentos de desenvolvimento do Nordeste), ADA (Agência de Desenvolvimento da Amazônia) etc. As entidades devem candidatar-se à qualificação se elas (juntamente com o seu Ministério superior) assim o desejarem.

Podemos encontrar mais algumas características das Agências Executivas, quais sejam: Se Estados e Municípios quiserem adotar medida semelhante, deverão legislar sobre o assunto. O Poder Executivo poderá qualificar como agência executiva uma autarquia ou fundação pública (com personalidade jurídica de direito público ou de direito privado). As autarquias ou fundações públicas deverão, obrigatoriamente, para se candidatarem à qualificação especial de agências executivas: 1) Ter um plano estratégico de reestruturação, desenvolvimento e aprimoramento institucional já concluído ou em andamento, visando aprimorar a qualidade da gestão da instituição, voltada ao aumento da eficiência e à redução de custos. Esta situação deverá ser provada quando da assinatura do contrato de gestão; 2) Ter celebrado contrato de gestão com o respectivo Ministério supervisor (ou Secretaria de Estado/Município no nível estadual/municipal), com a necessária anuência do ex-MARE (Ministério da Reforma do Estado), hoje MPOG (Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão), estabelecendo objetivos estratégicos e metas a serem atingidas pela pessoa jurídica, bem como os indicadores que permitirão averiguar o real cumprimento dos compromissos assumidos. A qualificação como Agência Executiva será feita em ato do Presidente da República (ou do Chefe de Estado), mediante decreto. O Poder Executivo editará medidas de organização administrativa específicas para as Agências Executivas, visando a sua autonomia de gestão, bem como as disponibilidades de recursos orçamentários e financeiros para o

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cumprimento dos objetivos e metas definidos nos contratos de gestão, eis que a ampliação da autonomia dessas entidades lhes garante um melhor gerenciamento dos recursos públicos. Para compras por dispensa de licitação, o valor é 10% superior ao da Lei 8.666/93. Para contratação de obras e serviços, o valor é 20% superior ao da Lei 8.666/93. Não há a criação de nova pessoa jurídica no âmbito da Administração Pública. São apenas prerrogativas atribuídas às autarquias e fundações. Também não há qualquer alteração nas relações de trabalho dos servidores das entidades que venham a ser qualificadas como executivas. Têm prerrogativas apenas temporariamente. A diferença entre agência reguladora e executiva é que a primeira tem personalidade jurídica de direito público, sendo autarquia em regime especial encarregada do exercício do poder normativo nas concessões e permissões de serviços públicos, exercitando o poder inicialmente conferido ao Poder Público, enquanto a Agência Executiva configura um “rótulo”, ou seja, um atributo dado à autarquia ou fundação, que celebrem contrato de gestão com Órgão da Administração Direta a que se encontrem vinculadas, para a melhoria da eficiência na prestação de serviços e redução de custo. O contrato de gestão é uma espécie de contrato administrativo, pelo qual a Administração direta (contratante) concede à autarquia ou fundação (Administração Indireta – contratada) maior autonomia gerencial, orçamentária e financeira, visando o cumprimento de metas fixadas.- São cláusulas obrigatórias nos contrato de gestão: 1) o prazo de duração do contrato (mínimo de um ano); 2) os controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidades dos dirigentes; 3) a remuneração do pessoal; 4) as metas de desempenho que devem ser atingidas; 5) penalidades a serem aplicadas aos dirigentes das entidades e 6) termos de ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira.

5. EMPRESAS PÚBLICAS E SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA (por serem muito semelhantes, estudaremos essas entidades dentro de um mesmo item). Delas se vale o Estado para executar atividade de seu interesse com mais flexibilidade, sem as travas burocráticas das pessoas de direito público.

5.1. Conceito de Empresas Públicas: são pessoas jurídicas de direito privado, integrantes da Administração Indireta do Estado, criadas por autorização legal, sob qualquer forma jurídica (societária) adequada a sua natureza (admitida em direito), para que o Governo exerça atividades gerais de caráter econômico ou, em certas situações, execute a prestação de serviços públicos. Observemos que toda empresa pública financeira é exploradora de atividades econômicas (exemplo:Caixa) e não será prestadora de serviços públicos.

5.2. Exemplos de Empresas Públicas: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT); FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos); Casa da Moeda do Brasil (vinculada ao Ministério da Fazenda); CAIXA (Caixa Econômica Federal, vinculada ao Ministério da Fazenda); BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social); SERPRO (Serviço Federal de Processamento de Dados), EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), RADIOBRÁS, CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento, empresa pública federal prestadora de serviços públicos pertinentes ao gerenciamento dos estoques oficiais de alimentos e à política de garantia de preços mínimos, entre outros) etc.

5.3. Conceito de Sociedades de Economia Mista: São pessoas jurídicas de direito privado, integrantes da Administração Indireta do Estado, criadas por autorização legal (instituídas mediante lei autorizadora e registro em órgão próprio), sob a forma de sociedades anônimas, cujo controle acionário pertença ao Poder Público, tendo por objetivo, como regra, a exploração de atividades gerais de caráter econômico e, em algumas ocasiões, a prestação de serviços públicos. Assim, as ações com direito a voto pertencerão, em sua maioria absoluta, à União (se federal) ou à entidade da Administração indireta.

5.4. Exemplos de S.E.M.: Banco do Brasil S.A.; Banco da Amazônia S.A.; IRB (Instituto de Resseguros do Brasil); PETROBRAS (Petróleo Brasileiro S.A.), Bancos Estaduais etc.

5.5. Personalidade Jurídica: As Empresas Públicas e as Sociedades de Economia Mista têm personalidade jurídica de direito privado. Essas pessoas administrativas, tendo personalidade de direito privado, embora sob a direção institucional do Estado, possibilitam maior versatilidade em sua atuação, quando voltadas para atividades econômicas. O Estado assemelha-se a um empresário que precisa de celeridade e eficiência para atingir seus objetivos. O fato de terem personalidade jurídica de direito privado não as coloca no nível de exata igualdade com as pessoas da iniciativa privada, vez que naquelas é o Estado o grande comandante.

5.6. Criação e Extinção: No aspecto da criação da pessoa, o regime a adotar-se é o de direito privado, ou seja, deve o Estado providenciar a prática do ato que contenha o estatuto, ou os próprios atos constitutivos da entidade, para que sejam inscritos no registro próprio, fato que dá início à existência legal da pessoa jurídica, como, aliás, está claro no art. 45 do Código Civil. Assim, para a criação da entidade, uma vez publicada a lei específica autorizativa da criação dela e,

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entrando a mesma em vigor, estará o chefe do Poder Executivo autorizado a editar o ato constitutivo da entidade, via decreto. Mas, referido decreto constitutivo deverá ser registrado no registro competente, para, a partir daí, tornar-se constituída a entidade e adquirir sua personalidade jurídica.

A extinção das empresas públicas e das sociedades de economia mista reclama lei autorizadora; o Poder Executivo, a que são normalmente vinculadas, não tem competência exclusiva para dar fim às entidades. Desta forma, para a extinção das entidades com personalidade jurídica de direito privado, faz-se necessária a edição de uma lei específica autorizativa que, entrando em vigor, autoriza o Chefe do Executivo a expedir o decreto de extinção, promovendo-se a baixa dos seus atos constitutivos no registro competente.

5.7. Subsidiárias: o Estado cria e controla diretamente determinada sociedade de economia mista, denominada de primária ou sociedade/empresa de primeiro grau. Esta, por sua vez, passa a gerir uma nova sociedade subsidiária (sociedade ou empresa de segundo grau). Poderia até surgir uma empresa de terceiro grau e assim sucessivamente. Não fica a sua criação ao livre arbítrio da Administração. Sua criação depende de autorização legislativa, com a participação efetiva da respectiva Casa Legislativa. A autorização não precisa ser dada para a criação específica de cada entidade. É legítimo que a lei disciplinadora da entidade primária autorize desde logo a posterior instituição de subsidiárias, antecipando o objeto a que se destinarão. Ex.: A Lei 9478/97 autorizou a PETROBRAS a instituir subsidiária (TRANSPETRO) para operar e construir seus dutos, terminais e embarcações para transporte de petróleo e seus derivados. As subsidiárias também são controladas, embora de forma indireta, pela pessoa federativa que instituiu a entidade primária. A subsidiária tem apenas o objetivo de se dedicar a um dos segmentos específicos da entidade primária, mas como esta é quem controla a subsidiária, ao mesmo tempo em que é diretamente controlada pelo Estado, é este, afinal, quem exerce o controle, direto ou indireto, sobre todas. Nada impede que a entidade primária institua a denominada subsidiária integral, ou seja, aquela que tem um único acionista. Nesse caso, a única acionista será a sociedade de primeiro grau instituidora. É viável que a subsidiária integral venha, posteriormente, a ter caráter societário mediante a admissão de novos acionistas. O que é indispensável é que tais instrumentos tenham previsão legal. Por isto. a Lei 10738/2003 autorizou o Banco do Brasil S.A., sociedade de economia mista primária, a constituir duas subsidiárias integrais: uma como banco múltiplo para financiamentos destinados a populações de baixa renda e outra como administradora de consórcios para facilitar o acesso a bens duráveis aos mesmos destinatários. A lei permite a admissão futura de acionistas.

5.8. Objeto: O objetivo das sociedades de economia mista e das empresas públicas é, basicamente, o desempenho de atividades de caráter econômico. São elas verdadeiros instrumentos de atuação do Estado no papel de empresário. O Estado, só excepcionalmente, pode dedicar-se à exploração direta de atividade econômica. Só admite-se essa atividade sob o impacto de motivos de segurança nacional ou de relevante interesse coletivo. Mesmo a exploração indireta, por sociedades de economia mista e empresas públicas, há de ter limites, para impedir que essas entidades se introduzam no mercado com vistas ao regime de competição com as empresas da iniciativa privada. Aliás, é ao particular que cabe, genericamente, a iniciativa para a exploração de atividades econômicas. Registre-se que não são todos os serviços públicos que poderão ser exercidos por sociedades de economia mista e empresas públicas, mas somente aqueles que, mesmo sendo prestados por empresa estatal, poderiam sê-lo pela iniciativa privada. Desse modo, excluem-se aqueles serviços ditos próprios do Estado, ou seja, aqueles que só o Estado pode executar, como a segurança pública, a prestação de justiça, a defesa da soberania nacional. O fato é que, no grande universo das sociedades de economia mista e empresas públicas, dificilmente se encontrará alguma delas que execute serviço público que não seja superavitário, demonstrando, por conseguinte, que seu alvo básico é realmente a atividade econômica.

5.9. Regime Jurídico: As sociedades de economia mista e as empresas públicas são, de um lado, pessoas jurídicas de direito privado e, de outro, pessoas sob o controle do Estado. Nem estão elas sujeitas inteiramente ao regime de direito privado nem inteiramente ao de direito público. Assim, seu regime tem certa natureza híbrida, já que sofrem o influxo de normas de direito privado em alguns setores de sua atuação e de normas de direito público em outros. Quando se trata do exercício em si da atividade econômica, predominam as normas de direito privado. É comum, portanto, a incidência de normas de Direito Civil ou de Direito Empresarial, reguladoras que são das relações econômicas de direito privado. Aliás, essa é que deve ser a regra geral, o que se confirma pelo art. 173, §1º, II da CF, que estabelece sua sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas quanto a direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributárias. Não devem ter privilégios que as beneficiem, sem serem estendidos às empresas privadas, pois isso provocaria desequilíbrio no setor econômico em que ambas as categorias atuam. Inexistem, pois, privilégios materiais e processuais, como os atribuídos às autarquias. Por essa razão, o STJ sumulou que prescreve em 20 anos a ação de indenização contra sociedades de economia mista em caso de responsabilidade civil (a orientação se estende às empresas públicas e às pessoas governamentais de direito privado). Ao contrário, incidem as normas de direito público naqueles aspectos ligados ao controle administrativo resultante de sua vinculação à pessoa federativa (citamos como exemplos a autorização legal para sua instituição; o controle pelo Tribunal de Contas; o controle e a fiscalização do Congresso Nacional; a exigência de concurso público para ingresso de seus empregados; a previsão de rubrica orçamentária etc).

5.10. Regime Tributário: As empresas públicas e as sociedades de economia mista devem sujeitar-se ao regime jurídico das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações tributárias e não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos

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às do setor privado. Na medida em que o Estado as institui, cobrindo-lhes com as vestes do direito privado, deve arcar com os efeitos tributários normais incidentes sobre as demais empresas privadas. A imunidade e os privilégios fiscais só se justificam para as pessoas de direito público, estas sim representando o próprio Estado. Tem-se como exceção a hipótese em que a empresa pública ou sociedade de economia mista executam serviço público monopolizado. A concessão de privilégio seria aceitável em virtude da inexistência de ameaça ao mercado. Mas, nessa hipótese excepcional, deve o Poder Público agir com prudência nos privilégios que outorgar, sob pena de desfigurá-la como pessoa de direito privado.

5.11. Constituição do capital5.11.1. Nas sociedades de economia mista o capital é formado da conjugação de recursos oriundos das pessoas de direito público ou de outras pessoas administrativas, de um lado, e de recursos da iniciativa privada, de outro. As parcelas do capital, representadas por ações, são distribuídas entre a entidade governamental e particulares. É à entidade política criadora ou a uma de suas entidades administrativas que pertence o domínio da maior parte do capital votante. Assim, as sociedades de economia mista só são assim qualificadas quando, além de ter havido prévia autorização legal, haja o domínio do capital por parte do Estado ou de outra pessoa a ele vinculado. As sociedades onde o capital pertencente ao Estado é minoritário e não possibilita o controle societário são denominadas de sociedades de mera participação do Estado (além de não integrarem a Administração Pública, não são consideradas sociedades de economia mista). Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo afirmam em sua obra de Direito Administrativo que “As ações, representativas do capital, são divididas entre a entidade governamental e a iniciativa privada. Exige a lei, porém, que nas sociedades de economia mista federais a maioria das ações com direito a voto pertençam à União ou a entidade da Administração Indireta federal (Decreto-Lei n.200\67, art. 5, III), ou seja, o controle acionário dessas companhias é do Estado. Mutatis mutantis, se a sociedade de economia mista for integrante da Administração Indireta de um município, a maioria das ações com direito a voto deve pertencer ao município ou a entidade de sua Administração Indireta; se for uma sociedade de economia mista estadual, a maioria das ações com direito a voto deve pertencer ao Estado-membro ou a entidade da Administração Indireta estadual, valendo o mesmo raciocínio para o Distrito Federal”. Portanto, é legalmente possível a existência de uma Sociedade de economia mista federal com 51% das ações com direito a voto em poder de uma Autarquia federal, 20% em poder do Estado de Goiás, 5% em poder de uma fundação pública municipal, 10% em poder de pessoas jurídicas da iniciativa privada e 14% em poder de pessoas físicas. Mas observe que a maioria do capital votante deverá estar nas “mãos” da esfera federal (por esta razão a autarquia deverá ser federal).

5.11.2. Nas empresas públicas só é admissível que participem do capital pessoas administrativas, independente de seu nível federativo ou sua natureza jurídica (pública ou privada). Assim, as empresas públicas terão que ser compostas por pessoas integrantes da Administração Pública. Em conseqüência, estão impedidas de participar do capital as pessoas da iniciativa privada, sejam elas físicas ou jurídicas. Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo asseveram com maestria que “não há possibilidade de participação de recursos de particulares na formação do capital das empresas públicas. A lei permite, porém, desde que a maioria do capital votante de uma empresa pública federal permaneça de propriedade da União, a participação no capital de outras pessoas jurídicas de direito público interno, bem como de entidades da Administração Indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (Decreto-Lei n.200/67, art.5°, II). O mesmo raciocínio é aplicável às empresas públicas das outras esferas da Federação”. Observe que o controle (a maioria do capital votante) deverá pertencer à entidade política instituidora da empresa pública (não confundir “maioria do capital” com “maioria do capital votante”) e que outras entidades políticas e administrativas de qualquer esfera de governo poderão participar do restante do capital. Portanto, é plenamente possível haver uma empresa pública federal com 51% do capital votante em poder da União, 10% em poder de uma Autarquia estadual, 20% em poder do Estado de Goiás, 10% em poder de uma empresa pública municipal e 9% a uma Sociedade de Economia Mista distrital.

5.12. A forma jurídica:5.12.1. As sociedades de economia mista devem ter a forma de sociedades anônimas. Por terem essa forma societária, própria do direito privado, são reguladas, basicamente, pela lei das sociedades por ações. Lembremos que, se o concurso perguntar se a sociedade de economia mista somente pode ser uma “sociedade por ações”, a resposta estará falsa, uma vez que “sociedade por ação é um gênero, que comporta duas espécies: a) sociedade anônima e b) comandita por ações.

5.12.2. As empresas públicas podem revestir-se de qualquer das formas admitidas em direito (em lei), como a LTDA, SA, Comandita por ações, etc. Podem ser: a) Unipessoais, quando o capital pertence exclusivamente à pessoa instituidora. Ex.: a lei que autorizou a criação da Empresa de Pesquisa Energética – EPE (empresa pública) dispôs que a União é o único titular do capital, possuindo, portanto, a integralidade do mesmo (100%) eb) Pluripessoais, quando, além do capital dominante da pessoa criadora se associam recursos de outras pessoas administrativas.Atenção! É possível, apenas na esfera federal, a denominada “forma jurídica inédita”, uma vez que compete somente à União legislar sobre direito comercial (vide artigo 22, I, da CF/88).

5.13. Foro Processual para Entidades Federais:

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5.13.1. Empresas Públicas: A CF privilegiou as empresas públicas federais, que terão seus litígios processados pela Justiça Federal (vide artigo 109, I, da CF/88, que diz: “Aos juízes federais compete processar e julgar I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho”). Observe, porém, que a súmula 270 do STJ assentou que “o protesto pela preferência de crédito, apresentado por ente federal em execução que tramita na Justiça Estadual não desloca a competência para a Justiça Federal”. Ente federal abrange as empresas públicas, as autarquias e fundações autárquicas (Administração Indireta da União). Quanto às empresas públicas estaduais e municipais, o litígio será na Justiça Estadual, no juízo fixado na lei de organização judiciária do respectivo Estado. Eventual ação relativa a “acidente de trabalho”, terá como competente o foro da Justiça do Trabalho (conforme Emenda Constitucional de 2004 e posicionamento recente do STF acerca do assunto).

5.13.2. As sociedades de economia mista têm suas ações processadas na Justiça Estadual, já que a CF silenciou sobre elas (vide artigo 109, I). O STF (Súmula 517) só admite o deslocamento para a JF quando a União intervém como assistente ou oponente. A Súmula 556 do STF assentou que “é competente a Justiça comum para julgar as causas em que é parte sociedade de economia mista”. No mesmo sentido seguiu a súmula 42 do STJ.

5.14. Patrimônio: Os bens que integram inicialmente o patrimônio das empresas públicas e das sociedades de economia mista provêm geralmente da pessoa federativa instituidora. Esses bens, enquanto pertenciam a esta última, eram bens públicos. Quando transferidos às entidades, passam a ser bens privados, sujeitos à sua própria administração (Hely Lopes Meirelles denomina-os de bens públicos com destinação especial). Sendo privados, não são impenhoráveis, não tem a sua alienabilidade condicionada etc.

ATENÇÃO! O STF entendia não-recepcionado pela atual CF o art. 12 do DL 509/59, que considerava impenhoráveis os bens da ECT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos), porque empresas públicas que exploram atividades econômicas devem sujeitar-se ao regime das empresas privadas. Porém, em sessão plenária, a Corte julgou aplicável o dispositivo tratado em referido decreto.

A administração dos bens, incluindo conservação, proteção e os casos de alienação e oneração é disciplinada pelos estatutos da entidade. Nada impede, porém, que em determinados casos a lei (até mesmo a lei autorizadora) trace regras específicas para os bens, limitando o poder de ação dos administradores da empresa. No silêncio da lei, vale o que estipularem o estatuto da empresa e as resoluções de sua diretoria.

No caso de extinção da entidade, liquidadas as obrigações por ela assumidas em face de terceiros, o patrimônio será incorporado à pessoa criadora, qualificando-se então como públicos esses bens após a incorporação.

Uma empresa pública exploradora de atividade econômica sujeita-se em grande parte ao regime jurídico próprio das empresas privadas. Contudo, tem seu patrimônio protegido pelas regras da Lei de Improbidade Administrativa.

5.15. Pessoal: O pessoal das empresas públicas e das sociedades de economia mista se submete ao regime trabalhista comum. O vínculo jurídico entre os empregados e as pessoas administrativas tem natureza contratual. Esse regime já vem previsto na CF, quando definiu que se aplicaria àquelas entidades o mesmo regime jurídico aplicável às empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas (173, § 1º). Sendo contratual o regime, os litígios decorrentes das relações de trabalho serão processados na Justiça do Trabalho (114 da CF). O ingresso desses empregados deve ser precedido de concurso público (37,II da CF). Para esses empregados não incidem as regras protetivas especiais dos servidores públicos, v.g. a estabilidade estatutária. Mesmo tendo sido aprovados por concurso, incidem as regras da CLT que disciplinam a formação e a rescisão do contrato de trabalho. Outras regras se aplicam aos empregados das empresas públicas e das sociedades de economia mista:a) não podem acumular seus empregos com cargos ou funções públicas (37, XVII, CF);b) são equiparados a funcionários públicos para fins penais (327, §1º, CP); ec) são considerados agentes públicos nas hipóteses de improbidade administrativa (Lei 8.429/92).

5.16. Atos e Contratos: Como regra, os atos praticados por essas entidades são atos jurídicos de direito privado, sendo submetidos às regras do Direito Civil e Empresarial. Algumas dessas pessoas, porém, exercem atividades delegadas da respectiva Administração Direta. Assim, os atos jurídicos praticados no exercício da função delegada hão de considerar-se atos administrativos, suscetíveis de controle através de mandado de segurança e ação popular. Os contratos celebrados por essas entidades deveriam ser de direito privado, mas a Lei 8.666/93 determinou que as empresas públicas e sociedades de economia mista, dentre outras pessoas administrativas, ficariam sujeitas ao regime nela instituído, tendo como contratos administrativos os ajustes firmados pelas entidades. A licitação é obrigatória para as empresas públicas e sociedades de economia mista. 5.17. Falência e execução (pensamento doutrinário anterior à nova Lei de Falências – Lei 11.101/2005):5.17.1. A sujeição ao regime falimentar só pode atingir as sociedades de economia mista que exercem atividade econômica stricto sensu, ou seja, de natureza empresarial, porque estas é que são equiparadas às empresas privadas no que concerne aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários. Tratando-se de sociedade de economia mista que se dedique à prestação de serviços públicos (segundo a doutrina prevalente), a insolvência deve regular-se pelo direito público. Quanto à execução e penhora dos bens, continuam sendo aplicáveis a todas as sociedades de economia

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mista, independentemente da atividade que desempenhem (pois são tidos como bens privados). Sendo pessoas de direito privado, não são alcançadas pelas prerrogativas de direito público.

5.17.2. Em relação às empresas públicas, o tratamento deve ser o mesmo adotado para as sociedades de economia mista. Exercendo atividade econômica empresarial, a empresa pública pode ter a falência decretada; se prestar serviço público, sujeitar-se-á apenas ao processo de execução e penhora de seus bens, tal como disciplinado na Lei Processual Civil. E a pessoa controladora dessas entidades é subsidiariamente responsável pelas obrigações por elas assumidas.

Observe-se, contudo, que a atual Lei de Falências (Lei 11.101/2005), expressamente determinou em seu art. 2º que as empresas públicas e sociedades de economia mista não estão sujeitas às suas regras. Desta forma, podemos concluir que referidas entidades administrativas não podem ter decretada sua falência (sejam elas prestadoras de serviço público ou exploradoras de atividade econômica). Mas, atenção! A Lei de Falências deixou de mencionar as suas subsidiárias. Assim, podemos chegar à conclusão de que as mesmas estarão, sim, sujeitas à falência, mas, se prestadoras de serviço público, não terão seus bens penhorados.

5.18. Responsabilidade Civil: No ordenamento vigente, existem dois planos de responsabilidade civil: a responsabilidade civil de direito privado, cujas regras se encontram no Código Civil, fundada na teoria da responsabilidade subjetiva, e a responsabilidade de direito público, prevista no 37, §6º da CF e 43 do CC, que consagra a teoria da responsabilidade objetiva. Em relação a esta última, dispõe o referido artigo que a ela se submetem as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos. Se o objeto da atividade for a exploração de atividade econômica em sentido estrito (tipicamente mercantil e empresarial), a norma constitucional não incidirá (em conseqüência, a responsabilidade será a subjetiva, regulada pela lei civil). Se, ao contrário, executarem serviços públicos típicos, tais entidades passam a ficar sob a égide da responsabilidade objetiva prevista na CF. Essa é que nos parece a melhor interpretação para o art. 37, §6º da CF. Seja qual for a natureza da sociedade de economia mista ou da empresa pública, o Estado, vale dizer, a pessoa federativa a que estão vinculadas as entidades é sempre responsável subsidiário. Somente se o patrimônio dessas entidades for insuficiente para solver os débitos, os credores terão o direito de postular os créditos remanescente através de ação movida contra a pessoa política controladora (há divergências entre os juristas). Diógenes Gasparini não admite, sequer, a responsabilidade subsidiária.

6. FUNDAÇÕES PÚBLICAS6.1. Conceito: Entidades dotadas de personalidade jurídica de direito público ou de direito privado, sem fins lucrativos, criadas em virtude de lei ordinária autorizativa e registro em órgão competente ou por lei ordinária específica, para desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgãos ou entidades de direito público, com autonomia administrativa, patrimônio próprio gerido pelos respectivos órgãos de direção e funcionamento custeado por recursos da União e de outras fontes. Caberá à lei complementar dizer a sua área de atuação (37, XIX, CF).

6.2. Divisão: Podemos considerar, já de início, uma primeira divisão para as fundações:a) Fundações privadas, instituídas por pessoas da iniciativa privada (particulares); eb) Fundações públicas, instituídas pelo Estado (essas é que são estudas no Direito Administrativo e no presente capítulo).

6.3. Outras denominações dadas às fundações públicas: Fundações instituídas pelo Poder Público (vide artigo 71, II, CF/88), fundações instituídas e mantidas pelo Poder público, fundações controladas pelo Poder Público (vide artigo 163, II, CF/88), fundações sob controle estatal (vide artigo 8º, parágrafo 5º, da ADCT - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), fundações governamentais (conforme a doutrina) etc.

6.4. Natureza Jurídica das Fundações: Há duas correntes:6.4.1. Corrente dominante: defende a existência de duas fundações públicas: as fundações de direito público (com personalidade jurídica de direito público), caracterizadas como verdadeiras autarquias, razão por que são denominadas algumas vezes de fundações autárquicas ou autarquias fundacionais (seriam elas uma espécie do gênero autarquias) e as fundações de direito privado (com personalidade jurídica de direito privado). O STF assim assentou: “ nem toda fundação instituída pelo Poder Público é fundação de direito privado. As fundações, instituídas pelo Poder Público, que assumem a gestão de serviço estatal e se submetem a regime administrativo previsto, nos Estados-membros, por leis estaduais, são fundações de direito público, e, portanto, pessoas jurídicas de direito público. Tais fundações são espécie do gênero autarquia...”.

6.4.2. Corrente Minoritária: defende que, mesmo instituídas pelo Poder Público, as fundações têm sempre personalidade jurídica de direito privado (Manoel Oliveira Franco Sobrinho, Caio Tácito, Seabra Fagundes, Eros Roberto Grau, Jose dos Santos Carvalho Filho etc.) e que a Lei 7.596/87 (que acrescentou o art. 5º do Decreto-Lei 200/67 incluindo as fundações públicas no rol das já pertencentes à Administração Indireta) corrobora neste sentido ao dispor que referidas entidades “adquirem personalidade jurídica com a inscrição da escritura pública de sua constituição no Registro Civil de Pessoas Jurídicas...”.

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6.5. Característica Fundamental: As fundações públicas não comportam o intuito de obtenção de lucros (rendimentos que decorrem das atividades de caráter econômico). O lucro somente é compatível com as sociedades civis e comerciais que visem distribuir rendimentos aos sócios. As fundações terão fins não-lucrativos e, se em sua atividade, houver valores que ultrapassem os custo de execução, serão tidos como superávit, necessário ao pagamento de novos custos operacionais, visando melhorar o atendimento aos fins sociais.

6.6. Objeto: Os fins são sempre de caráter social e suas atividades se caracterizam como serviços públicos. Não poderá o Estado instituir fundações para intervir no domínio econômico e atuar no mesmo plano que os particulares. Para isso, criará as empresas públicas e as sociedades de economia mista. Suas atividades comuns são: assistência social, médica e hospitalar, educação e ensino, pesquisa e atividades culturais.

6.7. São Fundações: Fundação Escola de Administração Pública; Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; Fundação Casa de Rui Barbosa; Fundação Nacional do Índio (FUNAI); Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); Fundação Nacional de Saúde (FNS); IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada); FIOCRUZ, Fundação Biblioteca Nacional (em 1990 foi transformada em fundação de direito público, vinculada ao Ministério da Cultura) etc.Obs: JSCF entende que as fundações sob regime de direito privado deverão sujeitar-se, quanto ao objeto, ao que dispõe o CC e as de direito público ao que dispuser a lei (mesmo que o objeto seja diverso do tratado no diploma civilístico). 6.8. Criação e Extinção:6.8.1. Em se tratando de fundações públicas de direito privado, a lei apenas autoriza a criação da entidade. Sua personalidade dá-se com a inscrição da escritura pública de sua constituição no Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Assim, a lei apenas autoriza e o registro é quem dá personalidade. É a lei, também, que autorizará a sua extinção.

6.8.2. Se a fundação for de natureza autárquica (direito público) a regra é a mesma para as autarquias. A própria lei dá nascimento à entidade (o art. 37, XIX da CF refere-se, então, às fundações de direito privado). A própria lei extinguirá a fundação (como ocorre com as autarquias).

6.9. Prerrogativas:6.9.1. As fundações públicas de direito público têm as mesmas prerrogativas que as autarquias.

6.9.2. As fundações públicas com personalidade de direito privado deveriam reger-se, basicamente, pelo Código Civil. Mas o art. 5º do Decreto-Lei 200/67, embora preveja o registro da escritura pública de constituição da entidade, consignou que não lhes são aplicáveis as demais disposições do CC concernentes às fundações. Assim, o regime jurídico aplicável sobre as fundações de direito privado têm caráter híbrido (constituição e registro são regidos pelo Código Civil, e as demais condições, pela lei respectiva). Não têm privilégios quanto a prazos para contestar e recorrer. Estão sujeitas ao duplo grau de recurso, só produzindo efeito após confirmada, pelo tribunal competente, a sentença proferida contra as pessoas federativas e as respectivas autarquias e fundações de direito público.

6.10. Privilégios Tributários: Ambas as fundações fazem jus á imunidade relativa aos impostos sobre a renda, o patrimônio e os serviços federais, estaduais e municipais, pois o art. 150, VI, ”a” é extensivo às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público.

6.11. Patrimônio6.11.1. As fundações públicas de direito público têm seu patrimônio como bens públicos. 6.11.2. As fundações públicas de direito privado terão seu patrimônio constituído de bens privados, incumbindo sua gestão aos órgãos dirigentes da entidade na forma definida no respectivo estatuto. Somente se houver na lei autorizadora restrições e impedimentos quanto à gestão dos bens fundacionais é que os órgãos dirigentes deverão obedecer. Fora isto, o poder de gestão é da própria fundação.

6.12. Pessoal6.12.1. Quanto às fundações públicas de direito público, o regime de pessoal há de ser o que a pessoa federativa tiver estabelecido através da respectiva legislação, visto acabar a obrigatoriedade do regime jurídico único.

6.12.2. No caso das fundações públicas de direito privado, JSCF entende que o pessoal deverá sujeitar-se ao regime trabalhista comum (CLT). Sendo de natureza privada, não teria sentido que seus servidores fossem estatutários (com sistema de cargos e carreiras). Porém, aplicam-se aos empregados dessas fundações as restrições de nível constitucional, v.g., a vedação à acumulação de cargos e empregos (37, XVII), prévia aprovação em concurso (37, II) etc.

6.13. Controle Institucional: Todas as fundações públicas sujeitam-se a controle pela respectiva Administração Direta, que se dará sob três prismas:

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a) Político, decorrente da relação de confiança entre os órgãos de controle e os dirigentes da fundação controlada (estes são indicados e nomeados por aqueles);

b) Administrativo, pelo qual a Administração Direta fiscaliza se a fundação está desenvolvendo atividade consoante com os fins para os quais foi constituída;

c) Financeiro, exercido pelo Tribunal de Contas, tendo a entidade o encargo de oferecer sua prestação de contas para apreciação por aquele Colegiado.

6.14. Controle do Ministério Públicoa) Se a fundação tiver instituidor privado, velará pela mesma o Ministério Público do estado onde esteja situada. Se a

atividade se estender por diversos estados, o controle caberá, em cada um deles, ao respectivo MP Estadual, através, normalmente, de sua Curadoria de Fundações.

b) Se a fundação tiver instituidor privado e sede no DF ou território, velará pela mesma o MP federal. c) No caso de fundações governamentais (objeto do presente estudo), independentemente da natureza da entidade, quem

realiza o controle finalístico é a respectiva Administração Direta, sob pena de haver duplicidade de controle para os mesmos fins.

6.15. Controle Judicial: Sendo fundações governamentais de direito privado, a regra será que pratique atos de natureza privada, controláveis pelas vias processuais comuns. Mas, se praticar ato no exercício de função delegada, esse ato será administrativo e sujeito a controle por vias específicas, v.g., mandado de segurança e ação popular.

6.16. Foro dos Litígios: 6.16.1. Quanto às fundações públicas com personalidade de direito público, a competência de foro para os litígios judiciais segue as mesmas normas relativas às autarquias. Se for fundação de direito público federal, a competência será da JF, inclusive para litígios que decorram da relação estatutária entre a fundação e seus servidores. As fundações estaduais e municipais terão seus feitos processados no foro fixado no código de organização judiciária do Estado.6.16.2. Sendo fundação pública de direito privado Fed/Est/Mun, o foro será o das pessoas privadas (Justiça Estadual). Litígios trabalhistas serão resolvidos na Justiça do Trabalho.

6.17. Atos e Contratos: 6.17.1. As fundações públicas de direito público executam, em regra, atos administrativos, sendo os mesmos regulados por normas especiais de direito público. Poderão, é claro, praticar atos de natureza privada, que se sujeitarão ao CC. Seus contratos se caracterizam como administrativos, regidos pela Lei 8.666/93. Há obrigatoriedade de licitação prévia.6.17.2. As fundações públicas de direito privado praticam, em regra, atos de direito privado. Serão públicos os praticados no exercício de função delegada pelo Poder Público. Seus contratos deveriam ser regulados pelo direito privado, mas a Lei 8.666/93 determina que sua aplicação regula as fundações públicas de um modo geral, sem fazer qualquer distinção entre elas. Assim, é obrigatória a licitação e seus contratos seguem a lei retro.

6.18. Responsabilidade Civil: A responsabilidade civil objetiva se aplica às duas modalidades de fundação pública. O art. 37, §6º da CF diz que são civilmente responsáveis por atos de seus agentes tanto as pessoas jurídicas de direito público como as de direito privado prestadoras de serviços públicos. E as fundações são criadas pelo Estado para a execução de atividades de caráter social e que, obviamente, retratam verdadeiros serviços públicos. A responsabilidade das fundações é primária e a da pessoa estatal instituidora, subsidiária.

6.19. Diferença Marcante entre Fundações e Autarquias: está na finalidade das mesmas. Enquanto as primeiras realizam atividades atípicas de Estado, v.g., assistência social, educativa e recreativa (todas de caráter social), além de pesquisa e estudos técnicos (como as realizadas pelo IPEA e IBGE), os últimos desenvolvem atividades típicas do Estado, quais sejam, atividades administrativas.

6.20. Capital: embora alguns autores aceitem a participação de capital privado sobre a composição do patrimônio das fundações públicas, a doutrina majoritária entende que ele é formado com capital exclusivamente público. Contudo, devemos observar o comentário do professor Gustavo Barchet de que o Cespe aceita a teoria minoritária. Agora, uma vez instituída a fundação com capital exclusivamente público, segundo a doutrina majoritária, nada obsta que referida entidade aceite a inserção de capital privado para o custeio de suas atividades institucionais.

7. CARACTERÍSTICAS COMUNS ENTRE OS ENTES DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA☺ São pessoas administrativas;☺ Não legislam;☺ Não possuem autonomia política;☺ Têm patrimônio próprio;☺ Têm personalidade própria;☺ São vinculados (e não subordinados) aos órgãos da Administração Indireta;☺ Realizam atos administrativos e atos de administração;

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☺ Impera a vedação constitucional de não-acumulação de cargos públicos (37, XVII);☺ O ingresso em seus cargos dá-se por concurso público (37,II,CF);☺ Seus atos administrativos típicos gozam da presunção de legitimidade, auto-executoriedade e imperatividade;☺ O seu pessoal é classificado como agente público.

8. OUTRAS PESSOAS JURÍDICAS VINCULADAS AO ESTADO

8.1. Noções Gerais: a Administração Pública se subdivide em Administração Direta e Indireta. Não obstante, há outras pessoas que, embora não integrando o sistema da Administração Indireta, cooperam com o governo, prestando serviço de utilidade pública e se sujeitando ao controle direto ou indireto do Poder Público. Em seu perfil existem aspectos inerentes ao direito privado e outros que as deixam vinculadas ao Estado. Estamos nos referindo às denominadas entidades paraestatais. Tais entidades (paraestatais) possuem as seguintes características gerais: a) são pessoas jurídicas; b) instituídas por particulares; c) têm personalidade jurídica de direito privado; d) não possuem fins lucrativos, embora seus dirigentes possam ser remunerados; e) não são delegatárias de serviço público, uma vez que não atuam em áreas cuja titularidade tenha sido conferida pela CF a determinada entidade política; f) desempenham atividades de interesse público (interesse coletivo); a responsabilidade das paraestatais pelos danos causados ao particular é subjetiva; g) seus dirigentes e empregados estão sujeitos às penalidades da lei de improbidade administrativa (equiparando-se a agentes públicos) quando a entidade recebe incentivos do Poder Público e h) geralmente são incentivadas pelo Estado a atuar no contexto da atividade de fomento. Dentre as atividades de fomento oferecidas pelo Poder Público às entidades paraestatais, citamos: permissão de uso gratuito de bens públicos independente de licitação, dotação de recursos orçamentários, incentivos fiscais (como as isenções) e incentivos creditícios (financiamentos com cobrança de juros facilitados).

Citamos como exemplos de paraestatais: OSCIP, Serviços Sociais Autônomos e Organizações Sociais. Mas podemos destacar, ainda, os partidos políticos, entidades religiosas, ONGs etc.

É relevante destacar que na década de 90, foi elaborado o plano diretor de reforma do Estado na esfera federal, apresentando como principais diretrizes:

a) a parcial substituição dos controles de procedimento pelos controles de resultado, surgindo, para tanto, figuras jurídicas como o “contrato de gestão”, “agências executivas” etc.

b) o afastamento do Estado da prestação direta de diversas atividades atípicas de Estado, mas consideradas como de “interesse coletivo”, com a transferência do exercício de tais serviços à iniciativa privada que atue sem fins lucrativos, como as Organizações Sociais e as OSCIPs. Por óbvio, se o Estado se afasta da prestação direta da atividade, delegando-a a iniciativa privada (e fortalecendo-a através de ações de fomento), assume, em contrapartida, o dever de regular e fiscalizar tal prestação pelos particulares. Surge, então, no cenário administrativo, a figura das “agências reguladoras”.

8.2.São elas:

8.2.1. Pessoas de Cooperação Governamental: São entidades que colaboram com o Poder Público a que são vinculadas, através da execução de alguma atividade caracterizada como serviço de utilidade pública. Alguns as denominam de serviços sociais autônomos. São pessoas jurídicas de direito privado e não integram a Administração Indireta, sendo impróprio considerá-las pessoas administrativas. Não há regra que predetermine a forma jurídica dessas pessoas, podendo ser de categorias jurídicas conhecidas (fundações ou associações) ou ter um delineamento jurídico especial, insuscetível de perfeito enquadramento naquelas categorias, como, aliás, vem ocorrendo com várias delas. Sua criação depende de lei autorizadora, embora não tenham sido elas mencionadas no art. 37, XIX da CF/88. Por receberem recursos oriundos de contribuições pagas compulsoriamente, há necessidade de previsão legal. A sua personalidade jurídica tem início com a inscrição de seu estatuto no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (art. 45 do CC). Os estatutos são delineados através de regimentos internos, normalmente aprovados por decreto do Chefe do Executivo. Neles, desenha-se a organização administrativa da entidade, com a referência aos objetivos, órgãos diretivos, competências e normas relativas aos recursos e à prestação de contas. Essas Pessoas de Cooperação Governamental (Serviços Sociais Autônomos) têm como objeto uma atividade social que representa a prestação de um serviço de utilidade pública, beneficiando certos grupamentos sociais ou profissionais, não se revestindo de qualquer conotação econômica (semelhante às fundações). Não possuem lucro, mas superávit. Podemos distinguir quatro Pessoas tradicionais dessa categoria e os respectivos anos de seus surgimentos:a) SESI/43 (Serviço Social da Indústria), destinado à assistência social a empregados do setor industrial;b) SESC/43 (Serviço Social do Comércio), destinado à assistência social a empregados do setor comercial;c) SENAI/42 (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), destinado à formação profissional e educação para o trabalho com vistas à indústria;d) SENAC/46 (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), destinado à formação profissional e educação para o trabalho com vista ao comércio.

Mais recentemente foram criados:a) SEBRAE/90 (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), destinado a execução de programas de auxílio e orientação a empresas de pequeno porte;

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b) SENAR/91 (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), destinado a organizar, administrar e executar o ensino da formação profissional rural e a promoção social do trabalhador rural;c) SEST/93 (Serviço Social do Transporte) e SENAT (Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte), dirigidos especificamente aos serviços de transporte, seja como empresa, seja como trabalhador autônomo; ed) Apex-Brasil/2003 (Agência de Promoção de Exportações do Brasil), com o objetivo de promover e fomentar a execução de políticas relacionadas a exportações, particularmente quando beneficiem empresas de pequeno porte e propiciem a geração de empregos.

Os recursos das Pessoas de Cooperação originam-se de contribuições parafiscais. A CF/88 refere-se a elas no art. 240 (nesse caso pagas pelos empregadores sobre a folha de salários). Esses recurso não provém do erário público, sendo normalmente arrecadados pelo INSS e repassados diretamente às entidades. Nem por isso deixam de caracterizar-se como dinheiro público. Essas Pessoas submetem-se ao controle pelo Poder Público, estando vinculadas ao Ministério afim (ex. SESI, SESC, SENAC e SENAI estão vinculados ao Ministério do Trabalho). Dispõe o Decreto-Lei 200/67 que “as entidades e organizações em geral, dotadas de personalidade jurídica de direito privado, que recebem contribuições parafiscais e prestam serviços de interesse público ou social, estão sujeitas à fiscalização do Estado nos termos e condições estabelecidos na legislação pertinente a cada uma”. As mesmas deverão prestar contas junto ao Tribunal de Contas respectivo. Essas Pessoas praticam, basicamente, atos de direito privado. Mas, se o ato for decorrente do exercício de função delegada, será equiparado ao ato administrativo, sujeito a controle por vias especiais (mandando de segurança, por exemplo). O TCU, em decisão recente, concluiu pela não obrigatoriedade dessas Pessoas de realizar as licitações dispostas na Lei 8.666/93. O citado estatuto permitiu, porém, a edição de regulamentos próprios, aprovados pela autoridade competente superior, desde que observados os princípios estabelecidos para o procedimento licitatório. O foro competente para dirimir litígios será o da Justiça Estadual, pois são Pessoas de direito privado (inclusive para os mandados de segurança contra ato de agente no exercício de função delegada). Com relação aos privilégios tributários, a CF estendeu sua benesse, dispondo acerca da imunidade sobre o patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, das entidades sindicais dos trabalhadores e das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos. Como as pessoas de cooperação governamental se dedicam à assistência social e à educação para o trabalho, estão enquadradas nessa hipótese constitucional de imunidade.

8.2.2. Organizações Colaboradoras (ou Parceiras): Existem outras pessoas privadas, instituídas pelas fórmulas de direito privado, às quais pode ser atribuído o encargo da prestação de serviços públicos no regime de parceria com a Administração Pública. Estão vinculadas com o Estado, mas os instrumentos de formalização da parceria têm a natureza de verdadeiros convênios, o que as coloca como categoria diversa das pessoas de cooperação governamental (estas terão a sua função definida na lei instituidora, prescindindo de qualquer outro instrumento que formalize o regime de cooperação). Os regimes de parceria, desenvolvidos mais recentemente, permitem que certas pessoas privadas colaboradoras adquiram títulos jurídicos especiais, através dos quais recebem a qualificação de organizações sociais (Lei 9.637/98) e organizações da sociedade civil de interesse público (Lei 9.790/99).

8.2.2.1. Organizações Sociais: são paraestatais com personalidade jurídica de direito privado. Não têm fins lucrativos e suas atividades estatutárias são voltadas ao ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde. Ao receber o título de “Organização Social”, a entidade passa a receber benefícios do Poder Público, v.g., dotações orçamentárias, isenções fiscais, administrar bens e equipamentos do Estado etc, visando desenvolver atividades de interesse coletivo. Referidas dotações integrarão o Orçamento da União. A Administração Pública, dessa forma, transfere às Organizações Sociais o exercício de certas atividade que serão melhor desempenhadas pelo setor privado. Trata-se de uma forma de parceria, com a valorização do “terceiro setor”, ou seja, serviço de interesse público que não necessite ser prestado pelos órgãos e entidades do Estado. O Contrato de gestão é o instrumento que permite a parceria entre o Poder Público e a entidade, qualificando-a como Organização Social. Há um Programa Nacional de Publicização (PNP), cujo objetivo é o de permitir publicização de atividade na área de prestação de serviços não-exclusivos, onde o Estado já vem atuando simultaneamente com outras organizações privadas, como saúde, proteção ambiental, cultura e educação. As Organizações Sociais são um modelo de parceria existente entre o poder Público e a sociedade. O Estado permanecerá fomentando e controlando as atividades publicizadas, cobrando os resultados pactuados no Contrato de gestão. Os dirigentes das Organizações Sociais assumem grandes responsabilidades na gestão da instituição, buscando maior eficiência na qualidade dos serviços, a custos reduzidos. As Organizações Sociais constituem uma nova instituição, mas não uma nova figura jurídica, vez que não pertencem à Administração Direta ou Indireta. Inserem-se na organização pública não-estatal sob a forma de associações civis sem fins lucrativos. Seu título de Organização Social dá-se mediante decreto. O Congresso Nacional participará ativamente do processo de implantação e avaliará o funcionamento das Organizações Sociais, eis que a qualificação dessas entidades, em regra, deverá ocorrer concomitantemente à extinção de sua congênere pertencente à Administração Pública. É o Congresso quem extingue a entidade da Administração Pública e transfere a denominação e os símbolos dela à Organização Social qualificada a absorver suas atividades. As dotações orçamentárias destinadas à execução dos Contratos de Gestão deverão estar previstas na lei Orçamentária que deverá ser aprovada ou não pelo Congresso nacional. Sendo atividades de direito privado, poderão contratar pessoal nas condições de mercado, adotar normas próprias para compras, vendas e contratos e dispor de ampla flexibilidade na execução de seu orçamento. Sendo celetistas os seus funcionários, estarão sujeitos ao

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plano de cargos e salários do regulamento interno da entidade. A aquisição de bens é mais rápida, vez que não se submetem à lei 8.666/93. Veja-se que não há um simples convênio de transferência de recursos, mas um compromisso de implementação das políticas sociais do Estado através das Organizações Sociais. As O.S não são um negócio privado, mas instituições públicas (entidades públicas não-estatais) que atuam fora da Administração Pública. O controle do Estado se dará por meio do chamado “controle por resultados” (resultados estes estabelecidos no Contrato de Gestão). A direção superior será exercida por um “Conselho de Administração”, com participação de representantes da sociedade e do Estado. Seus mandatos submeter-se-ão a regras que limitam a recondução e obrigam a renovação periódica dos conselhos. São O.S: Fundação Roquete Pinto, Associação das Pioneiras Sociais e Laboratório de Luz Síncroton.

9. DESCENTRALIZAÇÃO x DESCONCENTRAÇÃO

Quando as atividades administrativas são prestadas diretamente pela U/E/DF ou M, dizemos que a prestação dos serviços dá-se de maneira CENTRALIZADA. Quando as atividades administrativas NÃO são prestadas diretamente pela U/E/DF ou M, mas por sua Administração Indireta (Autarquias, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista e Fundações Públicas) ou por seus delegatários (concessionários ou permissionários), dizemos que a prestação dos serviços dá-se de maneira DESCENTRALIZADA. A U/E/DF e M poderão prestar DIRETAMENTE suas atividades de maneira CENTRALIZADA e, ao mesmo tempo, DESCONCENTRADA (cuidado, aluno, pois eu disse “desconcentrada” e não “descentralizada”). Isto acontece (a desconcentração) quando referidos entes políticos distribuem suas atividades para que sejam executadas através de seus próprios órgãos. Veja que o serviço, que é centralizado, continua centralizado, porém, desconcentrado. Há uma distribuição eminentemente interna de competências, haja vista que os ÓRGÃOS pertencerão a uma mesma entidade. Dizemos, então, que a desconcentração constitui-se em mera técnica administrativa que visa proporcionar maior eficiência na prestação do serviço. É o que ocorre, por exemplo, com a substituição de um único órgão por dois, com a finalidade de aprimorar e acelerar a prestação do serviço. Citamos como exemplos o desdobramento do Ministério do Trabalho e da Previdência Social (órgão único) em dois outros órgãos, sendo um deles o Ministério do Trabalho e o outro o Ministério da Previdência Social e o desmembramento do Ministério da Educação e Cultura (órgão único) em Ministério da Educação e Ministério da Cultura. As autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas prestarão suas atividades de maneira DESCENTRALIZADA (pois houve a transferência dos serviços da Administração Direta para as entidades da Administração Indireta) e, poderão prestá-las, ao mesmo tempo, de maneira DESCONCENTRADA. Isto acontece quando referidas entidades da Administração Indireta distribuem suas atividades para que sejam executadas através de seus próprios órgãos. Há uma distribuição interna de competências, haja vista que os ÓRGÃOS pertencerão a uma mesma entidade. Pode acontecer do Estado atuar de maneira inversa, restritiva. Isto ocorre quando ele se utiliza da centralização e da concentração. Quando o Estado retoma a execução do serviço, após tê-lo transferido a outra pessoa, executando-o diretamente, estará se utilizando do instituto da centralização. Quando dois ou mais órgãos internos são agrupados em apenas um, surge a concentração. São três as formas (modalidades) tradicionais de descentralização: a) delegação, b) outorga e c) descentralização territorial. Atualmente vem sendo desenvolvida uma quarta modalidade: a do regime de parceria. Assim, podemos afirmar que a descentralização envolve sempre duas pessoas, onde uma delas será uma pessoa jurídica e a outra uma pessoa física ou também jurídica, onde se transfere a titularidade de certa competência ou somente o exercício dela.

10. OUTORGA x DELEGAÇÃO A prestação descentralizada de serviços se dará pela Administração Indireta ou por seus delegatários, conforme visto acima. Quando a prestação dos serviços é realizada descentralizadamente pela Administração Indireta, mediante o fenômeno da OUTORGA dos serviços pela Administração Direta, dizemos que, neste caso, há a transferência da titularidade de certa competência, de uma entidade política a uma entidade administrativa, mediante lei específica e, em regra, por prazo indeterminado. Quando a prestação dos serviços é realizada descentralizadamente pelos particulares não integrantes da Administração Pública Direta ou Indireta (denominados de delegatários, ou seja, concessionários, permissionários ou autorizatários), dizemos que houve DELEGAÇÃO dos serviços públicos pela Administração Direta. Nestes casos, a titularidade dos serviços permanecerá com a Administração Direta que delegou os serviços (tudo em conformidade com o artigo 175 da CF e da Lei pertinente ao caso). Aqui, a prestação é tida como indireta, descentralizada, apesar do serviço não ser prestado pela Administração Indireta. Segundo a professora Maria Sylvia Z. Di Pietro, “descentralização por serviços, funcional ou técnica”, são expressões sinônimas de outorga. Assim, autarquia de serviços é, simplesmente, uma autarquia que se origina pelo fenômeno da outorga.

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SINOPSES

AUTARQUIASAdministração Origem AutonomiaIndireta Criadas por lei, via iniciativa

privativa do Chefe do Executivo (art. 61, § 1º, II, e da CF/88)

Possui autonomia ADMINISTRATIVA.Quem possui autonomia política são os entes da federação (U/E/DF e M).

Natureza Jurídica Desempenho de funçõesTêm personalidade jurídica de direito público. Não incide sobre elas, em sua formação, a disciplina do Código Civil. Para as pessoas jurídicas de Direito Privado, a existência legal começa com a inscrição, no registro próprio, de seus contratos, atos constitutivos ou estatutos. As autarquias, sendo criadas por lei, têm o início de sua existência no mesmo momento em que se inicia a vigência da lei criadora. Portanto, com o início da vigência da lei criadora, tem-se o início da personalidade jurídica das autarquias.

Desempenhar funções que, despidas de caráter econômico, sejam próprias e típicas do Estado. Ex: serviço de assistência a regiões inóspitas do país ou a prestação de um serviço médico. Portanto, executam serviços meramente administrativos ou de cunho social.

Extinção Quanto ao nível federativo responsável pela criação da autarquiaDá-se através de lei, e não por ato administrativo, por ser este último inferior na hierarquia.

As autarquias podem ser federais, estaduais, distritais e municipais. Obs: não são admissíveis autarquias interestaduais ou intermunicipais. Para tanto, deverão ser celebrados convênios ou consórcios administrativos (art. 241, CF/88). Assim, é proibida a vinculação pluripessoal.

Quanto ao ObjetoAutarquias Assistenciais: auxílio a regiões desfavorecidas ou a categorias sociais específicas, minorando as desigualdades regionais e sociais. Ex: ADENE, ADA, INCRA.Autarquias Previdenciárias: trata da assistência social. Ex: INSS.Autarquias Culturais: dirigidas à educação e ensino. Ex: UFRJ.Autarquias Profissionais: cuida da inscrição de profissionais e fiscalização de suas atividades. Ex: OAB e CRM.Autarquias Administrativas: formam a categoria residual. Destinam-se às várias atividades administrativas, incluindo a de fiscalização, quando essa atribuição for da pessoa federativa a que estejam vinculadas. Ex: INMETRO, BACEN, IBAMA.Autarquias de Controle: são as recém-criadas agências autárquicas reguladoras. Controlam entidades que prestam serviços públicos ou atuam na área econômica por força de concessões e permissões de serviços públicos. Ex: ANATEL, ANEEL, ANP.

Exemplos Quanto ao regime jurídicoINSS, INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), CNEN, BACEN, CVM, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra Secas), EMBRATUR, SUSEP, ADENE (Agência de Desenvolvimento do Nordeste), ADA, OAB, CRM, UFRJ, INMETRO, ANATEL, ANEEL, ANP, ANVS, ANA, DETRAN, USP. A nível estadual encontramos a Agência Ambiental de Goiás, o IPASGO (Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores do Estado de Goiás), a AGANP (Agência Goiana de Administração e Negócios Públicos) e a AGR (Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos). A nível municipal, citamos o MUTIRAMA, a SMT (Superintendência

Autarquias comuns (ou de regime comum): sujeitas a uma disciplina jurídica sem qualquer especificidade.Autarquias Especiais (ou de regime especial): regidas por disciplina específica. Têm prerrogativas especiais e diferenciadas. Ex: ANEEL, ANATEL, ANP e ANVS.Têm como privilégios:a) Poder Normativo Técnico: a lei delega competência para que editem normas técnicas complementares de caráter geral, configurando um jus novum.b) Autonomia Decisória: inclusive quanto aos conflitos entre entidades sob seu controle.c) Independência Administrativa: alguns dirigentes são nomeados por prazo legal pré-determinado, não ficando a mercê de critério político do Ministério supervisor. d) Autonomia econômico-financeira: têm recursos próprios e recebem dotações orçamentárias para gestão.São agências reguladoras: BACEN, CNEN, USP, OAB, ANATEL, ANEEL, ANP, ANA, ANVS.

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Municipal de Trânsito) e o DERMU (Departamento de Estradas de Rodagem do Município).

São agências Executivas: INMETRO, ADENE e ADA.

Patrimônio PessoalSão bens públicos os integrantes do patrimônio das pessoas administrativas de direito público. Assim, os bens das autarquias são tidos como bens públicos.Assim sendo, são impenhoráveis, imprescritíveis e a alienação obedecerá às regras legais.

O regime de pessoal poderá ser o estatutário ou o trabalhista, conforme o que a lei do ente federativo dispuser.

Contratos Responsabilidade CivilFora dos contratos típicos de direito privado (compra e venda, permuta, doação), os ajustes firmados por autarquias se caracterizam como contratos administrativos, regidos pela Lei 8.666/93.

Sua responsabilidade é denominada de OBJETIVA, ou seja, é aquela que independe da investigação sobre a culpa na conduta do agente (art. 37, § 6º).

Prerrogativas Autárquicasa) Imunidade Tributária: vedação à instituição de impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços, desde que vinculados às suas finalidades essenciais;b) Impenhorabilidade de seus bens e rendas: não há penhora como garantia do credor. Há os precatórios judiciais;c) Imprescritibilidade de seus bens: seus bens não podem ser usucapidos;d) Prescrição qüinqüenal: dívidas e direitos contra autarquias prescrevem em cinco anos;e) Créditos sujeitos à Execução Fiscal;f) Prazo em dobro para recorrer e em quádruplo para contestar;g) Pagamento das custas judiciais somente ao final, se vencida (art. 27 do CPC); h) Dispensa de exibição de mandado de seus procuradores em juízo ei) Não se sujeitam a concurso de credores ou à habilitação de crédito em falência, concordata ou inventário para cobrança de seus créditos, salvo para estabelecimento de preferência entre as três Fazendas Pública.

AGÊNCIAS REGULADORASFunção Principal Regime JurídicoControlar a prestação dos serviços públicos e o exercício de atividades econômicas (desempenho de atividades típicas do Estado).

São autarquias de regime especial. Obs: não são novas entidades jurídicas no quadro da organização da Administração Indireta.

Exemplos PrerrogativasANEEL, ANATEL, ANP, ANVISA, ANS, ANA, ANTT, ANTAQ, ANCINE, AGR (Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos). Obs: as Casas Severiano Ribeiro (casas de cinema) são fiscalizadas pelo ANCINE. Citamos, ainda, o CSPE (Comissão de Serviços Públicos de Energia do Estado de São Paulo), a ASEP-RJ (Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos no Estado do RJ) e a AGERGS (Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul).

a)Razoável independência administrativa em relação ao poder executivo.b)Autonomia financeira.c)Celebrar contratos.d)Abrir licitações.e)Fiscalizar a execução dos contratos.f)Fixar multas.g) Resolver conflitos de interesses (decisões com caráter final na esfera administrativa).h) Receitas próprias.i) Criação de comandos sub legem (*1)j) Definição do valor das tarifas.Receber denúncias e reclamações.

(*1) – Para a Fundação Carlos Chagas (FCC), as agências reguladoras editam atos normativos da mesma forma que diversos outros órgãos ou entidades administrativas. Contudo, tais normas se limitam a detalhar os decretos editados pelos Chefes do Executivo no exercício do Poder Regulamentar deles. Porém, o CESPE/UNB já mostrou posicionamento contrário, no sentido de que as agências reguladoras teriam, sim, poder normativo propriamente dito para inovar na ordem jurídica, criando direitos e obrigações para os administrados.

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Descentralização Para que?Dá-se por outorga. Reduzir o déficit público, sanear as finanças governamentais e garantir a

qualidade e continuidade dos serviços. Observação: o Estado era, ao mesmo tempo, o prestador e o fiscalizador dos serviços.

Lei que rege a matéria Conceito9.635/98 Agências reguladoras são pessoas jurídicas de direito público interno,

criadas por lei específica, sob a forma de autarquia especial, integrantes da administração indireta, com o objetivo de desempenhar atividades típicas do Estado. Observe-se que há serviços que são exclusivos do próprio estado, tais como a segurança pública, a prestação de justiça, a defesa da soberania nacional, relações diplomáticas, elaboração legislativa etc.

Ordem cronológica dos fatos

Atividades exercidas pelo Estado de maneira dispendiosa → há um abandono da postura de Estado-empresário, deixando de assumir a tarefa de produção direta de bens e serviços → privatização (alienação às pessoas da iniciativa privada) das áreas de telefonia, petroquímica, mineração, eletricidade, transportes e siderurgia (todos sendo serviços públicos desestatizados) → o Estado cria as Agências Autárquicas (também denominadas de governamentais ou reguladoras), intensificando, assim, o exercício de suas prerrogativas de intervenção no domínio econômico → controle e fiscalização das agências reguladoras.

São sujeitos à regulaçãoa) os serviços públicos desestatizados;b) eventuais setores que jamais tenham sido explorados pelo Estado ec) setores que ainda são explorados pelo Estado, porém não mais em regime de exclusividade. Ex: o petróleo é explorado, atualmente, por uma sociedade de economia mista federal, não sendo mais submetido ao regime de exclusividade.

Obs: A atividade regulatória, na verdade, não é exclusiva das agências reguladoras, senão vejamos:a) O sistema financeiro nacional é regulado pelo BACEN e pelo Conselho Monetário Nacional.b) O mercado de capitais é regulado pela CVM.c) A atividade regulatória em sentido amplo é exercida pela Administração Direta e pelo Poder Legislativo.d) A atividade regulatória não incide, necessariamente, sobre um serviço público ou atividade econômica específicos, determinados. Outros órgãos, que não exclusivamente as agências reguladoras, também desempenham referida regulação. Ex: CADE - Conselho Administrativo de Defesa Econômica (órgão de defesa da concorrência), Órgãos de Defesa do Consumidor e dos Órgãos de Defesa do Meio Ambiente.

AGÊNCIAS EXECUTIVAS

Lei Administração Exemplos9.649/98 (Agência Executiva Federal) Autarquias ou Fundações INMETRO

ADENEADA

Função As candidatas a Agência Executiva devem terExercer atividade estatal descentralizada. Podem, até, exercer controle, mas não é sua finalidade precípua.Execução/Operacionalidade.

a) Plano estratégico de reestruturação e de desenvolvimento institucional em andamento. O plano definirá diretrizes políticas e medidas voltadas para a racionalização de estruturas e do quadro de servidores, o desenvolvimento dos recursos humanos e o fortalecimento da identidade institucional da Agência Executiva;b) Ter celebrado Contrato de Gestão com seu Ministério Superior.

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Prazo ObservaçõesTêm prerrogativas apenas temporariamente. Os Contratos de Gestão serão celebrados com periodicidade mínima de um ano.

A qualificação em Agência Executiva dá-se pelo Chefe do Executivo.A Agência Executiva ganha mais autonomia administrativa.

O Contrato de Gestão conteráa) Prazo de duração do contrato;b) Controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidades dos dirigentes;c) Remuneração do pessoal;d) Metas a atingir;e) Penalidades a aplicar;f) Termos de ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira eg) recursos necessários.

EMPRESAS PÚBLICAS E SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA

Adm Patrimônio

NaturezaJurídica

Origem Desempenho de funções

Ex:

Ind. Os bens são privados

(*1)

Pessoa administrativa com personalidade jurídica de direito privado.

Edição de lei ordinária específica que autoriza a instituição de E.P.(*2)

Atividades gerais de caráter econômico ou Prestação de serviços públicos.

(*3)

Obs: ocasionalmente, a SEM pode prestar serviço público, como era o caso da ELETROBRAS.

Empresas Públicas:-ECT-FINEP-CASA DA MOEDA DO BRASIL-BNDES-SERPRO-EMBRAPA-RADIOBRÁS-EPE-CONAB

S.E.M- Banco do Brasil SA (BB)- Banco da Amazônia (BASA)- IRB-PETROBRAS (Petróleo Brasileiro SA)

Extinção

Capital Foro Processual Forma Jurídica

Por lei autorizadora

Empresa Pública: Só é admissível que participem do capital pessoas administrativas, seja qual for seu nível federativo ou sua natureza jurídica (pública ou privada). Terão que ser pessoas integrantes da administração pública. É proibida a participação da iniciativa privada física ou jurídica.São unipessoais quando o capital pertencer exclusivamente à pessoa instituidora.S.E.M: o capital é público e privado. As parcelas de capital são representadas por ações.Ao ente criador pertencerá o domínio da maior parte do capital votante (sempre). Assim, o controle acionário pertencerá ao Estado, que possuirá a gestão.

a) E.P.Fed J.Fed.b) E.P.Est J.Est.c) E.P.M J. Est.d) Litígios trabalhistas Just.Trabalho.e)Protesto pela preferência de crédito em ação de execução já em trâmite na J. Estadual Estadual.

S.E.M: Todas J.Estadual.S.E.M (quando a União intervém como oponente ou assistente) JFLitígios Trabalhistas J.Trabalho.

Empresas Públicas: Qualquer forma admitida em direito: Ltda, SA, em nome coletivo, em comandita simples, de capital e indústria. Porém, não poderá se sociedade em conta de participação, pois esta sociedade não possui personalidade jurídica nem patrimônio próprio.S.E.M: sob a forma de sociedades anônimas, sendo que o controle acionário será da Poder Público. Por terem esta forma societária, são reguladas, basicamente, pela Lei das Sociedades Anônimas.

Privilégios PessoalNo exercício de atividades econômicas, predominam as

Regime Trabalhista Comum (art. 173, II, § 1º).Ingresso via concurso público.

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normas de direito privado (C.Civ. e C.Com.). Não têm privilégios fiscais, salvo se os mesmos forem estendidos aos particulares. Têm as mesmas obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributárias que os particulares (art. 173, § 2º).Na prestação de serviços públicos, para a doutrina, são cabíveis os privilégios fiscais.

Não podem acumular seus empregos com cargos ou funções públicas (art. 37, XVII da CF/88).Cargo Público: Segundo Alexandre de Moraes, “consiste em lugar específico, que possui denominação própria, instituído na organização do serviço público com um conjunto de deveres e atribuições individuais, a ser provido e exercido por um titular”.Função Pública: “Consiste no conjunto de deveres e atribuições cometidos precariamente a determinada categoria profissional ou a determinados servidores, para a execução de serviços públicos eventuais. Na hipótese de determinada função ser exercida por quem já é funcionário, normalmente haverá acréscimo remuneratório.Emprego Público: “Quando a função pública é exercida sob contrato regido pela CLT, teremos caracterizada a conceituação de emprego público”. Ex: empregados das E.P e S.E.M. Observe-se que todo cargo possui funções, porém o inverso não corresponde à realidade, pois a determinada função pode não corresponder cargo específico.São equiparados, pelo Código Penal, a funcionários públicos para fins penais (art. 327 do CP: “Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública”).A Lei 8.429/92, em seu art. 1º, os considera agentes públicos, incidindo sobre eles as sanções impostas em casos de cometimento de improbidade administrativa.Natureza contratual (art. 173, §1º da CF/88).

Atos e Contratos FalênciaSeus atos jurídicos de direito privado são submetidos ao Código Civil e ao Código Comercial. Seus atos administrativos típicos são submetidos às leis públicas.Há incidência da Lei 8.666/93.Licitações são obrigatórias. Realizam concursos públicos para contratação de seu pessoal.

A nova Lei de Falências (Lei 11.101, de 09/02/05), em seu artigo 2º, I, dispõe que “esta lei não se aplica à Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista”.

Estatuto JurídicoLei Ordinária estabelecerá o estatuto jurídico das empresas públicas. As determinações expressas na CF/88 para o estatuto a ser previsto em lei são:a) a função social da empresa e formas de fiscalização pelo Estado e sociedade;b) a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;c) licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da Administração Pública.d) a constituição e o funcionamento dos Conselhos de Administração e Fiscal, com a participação de acionistas minoritários.e) os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores.

(*) Observações:

(*1)a) Sendo bens privados, NÃO são imprescritíveis ou impenhoráveis.b) A administração dos bens, conservação, proteção e alienação são disciplinadas pelos estatutos da entidade. A lei (ou a lei autorizadora) pode limitar o poder de ação dos administradores da empresa. No silêncio da lei, valerão os estatutos e resoluções da diretoria.c) Enquanto pertencentes à pessoa instituidora da E.P, os bens são públicos. Ao passarem para a Empresa, passam à natureza de privados.d) Hely Lopes entende que referidos bens possuem uma destinação especial, podendo ser onerados, utilizados e alienados de acordo com o disposto no estatuto, independentemente de autorização legislativa especial.Qualquer cidadão é parte legítima para propor Ação Popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe.

(*2)a) A lei não cria a entidade, tal como o faz com a autarquia, mas apenas autoriza a criação, que se processa por atos constitutivos do Executivo e transcrição no Registro Público. Portanto, as empresas públicas e sociedades de economia mista são criadas por autorização legal (art. 37, XIX, CF/88). Assim, a lei específica autoriza o executivo, por ato próprio (decreto) a proceder a instituição da pessoa administrativa. O Executivo registrará os estatutos da entidade no registro competente, memento em que nasce a entidade.

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(*3)a) O Estado, só excepcionalmente, pode dedicar-se à exploração direta de atividade econômica: segurança nacional ou relevante interesse coletivo (art. 173, caput da CF/88).b) Não são todos os serviços públicos que poderão ser exercidos pelas empresas públicas, mas somente aqueles que, mesmo sendo prestados por empresa estatal, poderiam sê-lo pela iniciativa privada.c) São serviços exclusivos do Estado: segurança pública, prestação de justiça, defesa da soberania nacional, relações diplomáticas, elaboração legislativa etc. Segundo Marcelo Alexandrino, “a enumeração das atividades consideradas típicas de Estado não é tarefa possível, pois depende, essencialmente, de posições ideológicas”.

Diferenças entre empresas públicas e sociedades de economia mistaEmpresas Públicas Sociedades de Economia MistaPossuem em sua composição acionária unicamente recursos de pessoas jurídicas de direito público e entidades da administração indireta.

Possuem recursos públicos e privados.

Podem assumir qualquer forma societária (civil ou comercial), incluindo forma inédita.

Sempre assumirão a forma de sociedades anônimas.

Se federais, terão foro na Justiça Federal para resolver seus litígios.

O foro será na Justiça Estadual, mesmo sendo Sociedade de Economia Mista federal.

Organizações Sociais

Administração Personalidade Jurídica

Não pertencem à Adm. Direta ou Ind.Fazem parte do 3º Setor (entes privados com fins públicos).São paraestatais.As OS não são um negócio privado, mas instituições públicas não-estatais.As OS são um modelo de organizações públicas não-estatais.Não representam uma nova figura jurídica. Detém, somente, um “rótulo”, um título jurídico conferido.

Têm personalidade jurídica de direito privado.São instituídas por iniciativa de particulares, mas não representam um negócio privado, e sim, uma instituição pública que atua fora da Administração Pública.

Função RecursosSem fins lucrativos (descarta-se qualquer aspecto mercantil ou empresarial), devendo reinvestir os seus excedentes. Aos conselheiros é vedada remuneração; os dirigentes poderão sê-lo, desde que em conformidade com o Contrato e os valores praticados no mercado.Voltadas ao ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde.A Adm. transfere o exercício de certas atividades que serão melhor desempenhadas pelo setor privado (descentralização administrativa).A OS não é delegatária de serviço público, pois não exerce as atividades em nome do Estado, mas em seu próprio nome (delegatárias = concessionárias, permissionárias e autorizatárias).As OS destinam-se a absorver atividades publicizáveis tais como saúde, educação, cultura e proteção ambiental, ou seja, aquelas não exclusivas do Estado. Obs: fiscalização e polícia são atividades exclusivas do poder público. Cabe às OS implementar as políticas sociais do Estado.

Ao receber o título de OS, a entidade passa a receber benefícios do poder público, como dotações orçamentárias.As dotações orçamentárias destinadas à execução dos contratos de gestão deverão estar previstas na Lei Orçamentária que deverá ser aprovada ou não pelo Congresso Nacional.Recebem a permissão de uso de bens públicos necessários à consecução de seus objetivos.As OS não se sujeitam às regras que regulam a gestão do orçamento e finanças da Adm.Púb. As OS têm ampla autonomia na execução do seu orçamento.Há obrigatoriedade de publicar, anualmente, no Diário Oficial da União, o seu relatório financeiro.

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Contrato de Gestão ControleÉ o instrumento que permite a parceria entre o poder público e a entidade, visando o fomento e a execução das atividades pela OS.Uma vez qualificadas como OS, são declaradas como “entidades de interesse social e utilidade pública”.O órgão ou entidade supervisora fiscaliza a OS.Seqüência:1º) Aprovação do contrato de gestão pelo Conselho de Administração da entidade;2º) Submete-se o contrato ao Ministro de Estado ou autoridade supervisora da área. OBS: o contrato respeitará os princípios do LIMP e da economicidade. O contrato de gestão conterá:a) as obrigações da OS, metas, prazos, responsabilidades,

recursos (orçamentário, patrimônio, pessoal etc) e penalidades;

b) critérios objetivos de avaliação de desempenho (não só em termos de qualidade, mas, também, de produtividade);

c) remunerações e vantagens concedidas aos dirigentes e empregados;

d) níveis de autonomia. Obs: a doutrina entende que o termo correto seria "“convênio", pois contrato eqüivale a contraposição de interesses e convênio à cooperação entre as partes, buscando objetivos comuns.

O Estado controlará e fomentará as atividades publicizadas cobrando os resultados pactuados no Contrato de Gestão.O controle do Estado se dará por meio do chamado “controle por resultados”.Estabelecem-se mecanismos de controle finalísticos.Uma vez que diversos segmentos representativos da sociedade civil participam nos Conselhos de Administração, há um estreito controle SOCIAL quanto às ações das OS. Também participarão dos órgãos superiores de deliberação os representantes do poder público.O Congresso Nacional terá participação na implantação das OS, momento em que fiscalizará ativamente o processo de transformação.As dotações orçamentárias que visem a execução do Contrato de Gestão deverão estar expressamente previstas na Lei Orçamentária anual a ser aprovada pelo Legislativo. Há, por parte do Estado, um controle por resultados, previamente estabelecidos no Contrato de Gestão.Seus atos sujeitam-se ao controle do Tribunal de Contas (art. 70, § único, CF/88). Qualquer irregularidade deverá ser comunicada ao TC, sob pena de responsabilização do agente fiscalizador competente.

Forma Jurídica Título de OSInserem-se na organização pública não estatal sob a forma de associações civis sem fins lucrativos.Trata-se de uma forma de propriedade pública não estatal. As OS não são de propriedade de nenhum indivíduo ou grupo.

Dá-se mediante Decreto.Uma vez qualificada como OS, será obrigada a celebrar contrato de gestão.Se desatender a lei ou o Contrato de Gestão, será desqualificada da condição de OS, após a instauração de processo administrativo em que sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa. Seus dirigentes serão responsáveis solidariamente pelos danos causados ao Estado.

Congresso Nacional Administração SuperiorO Congresso, na maioria das vezes, extingue uma entidade da Adm.Púb. (como uma Fundação Pública, por exemplo) e transfere a denominação, os símbolos e as atividades dela à OS. Sindicatos, instituições religiosas, organizações partidárias ou entidades com fins lucrativos não poderão ser qualificadas como OS.

A direção superior se dará através de um Conselho de Administração, com participação (composição) de representantes de entidades da sociedade civil, do Estado, membros eleitos dentre os membros ou associados de associação civil e outros eleitos que possuam notória capacidade profissional e reconhecida idoneidade moral (todos de acordo com o percentual estipulado na lei reguladora).

Pessoal Licitações e ContratosSão celetistas, estando submetidos ao plano de cargos e salários próprio de cada entidade.As OS não se sujeitam às normas que regulam a gestão de recursos humanos da Adm.Púb. Sendo menos burocrática, a OS ganha maior agilidade e qualidade na seleção, manutenção e desligamento de seus funcionários.Já as entidades estatais sujeitam-se ao Regime Jurídico dos Servidores Civis, à realização de concursos públicos, ao SIAPE e à tabela salarial do setor público.

As OS podem adotar normas próprias para compras, vendas e contratação de obras e serviços, não se sujeitando à Lei 8.666/93.O poder público poderá contratar os serviços prestados pelas OS (serviços esses previstos em seus contratos de gestão) sem a obrigatoriedade de realizar licitação (art. 24, XXIV – DISPENSA).

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A contratação de seu pessoal se dará nas condições do mercado. Pode o governo ceder servidor público para atuar na OS, com ônus para o primeiro.

Exemplos LeiFundação Roquete Pinto.Associação das Pioneiras Sociais.Laboratório de Luz Síncroton.Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (visa estudos e pesquisas nas áreas de ciência e tecnologia, conforme Decreto 4.078, de 09/01/2002).Associação Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (visa pesquisa tecnológica, desenvolvimento e operação de meios e serviços de redes avançadas, conforme Decreto 4077, de 09/01/2002).

Lei nº. 9.637/98.

CAPÍTULO IVATOS ADMINISTRATIVOS

1. NOÇÕES GERAIS (alguns conceitos)

Segundo alguns doutrinadores, Ato: é imputável ao homem, pois advém de sua vontade.Ato Jurídico: quando o ato humano interessa ao mundo jurídico, ou seja, quando o mesmo é relevante no campo do direito.Ato jurídico-administrativo: quando ocorre o ato jurídico no âmbito do direito administrativo.Fato: provém de acontecimentos naturais que independem do homem ou que dele dependam apenas indiretamente e que não produzem efeitos jurídicos, sendo irrelevantes para o direito, tal como o raio caindo sobre uma montanha deserta. Fato jurídico: quando o acontecimento natural (fato) interessa ao mundo jurídico, correspondendo à descrição contida na norma legal. Referido fato produz efeitos (conseqüências) jurídicos (no mundo do direito), tal como um raio caindo no veículo devidamente resguardado pela companhia seguradora.Fato jurídico-administrativo (fato administrativo): quando o fato jurídico (o fato descrito na norma legal) ocorre no âmbito do direito administrativo (produção de efeitos), tal como um raio caindo no veículo da SMT devidamente resguardado pela companhia seguradora ou a morte de um servidor ocasionando a vacância do cargo ou o decurso do tempo, que produz a prescrição administrativa. Porém, se o fato não produz qualquer efeito jurídico no campo do Direito Administrativo, estaremos diante do chamado fato da Administração.

Atenção! Outros doutrinadores preferem adotar a teoria de que o fato jurídico é todo acontecimento, seja humano ou natural, que acarrete conseqüências jurídicas. Para estes, o fato jurídico subdivide-se em fatos jurídicos em sentido estrito (acontecimentos da natureza com conseqüências jurídicas, tais como o nascimento, o tempo e a morte) e em atos jurídicos (atos do homem com conseqüências jurídicas, tais como os contratos). Portanto, podemos concluir que os atos administrativos são espécies de atos jurídicos.

São Atos da Administração (ou Atos de Administração): é todo ato praticado no exercício da função administrativa.a) Os atos regidos pelo direito privado, momento em que encontramos uma relação de bilateralidade, de acordo de

vontades. Às vezes a lei exige que o poder público abra mão de sua condição privilegiada e atue em igualdade de condições com o particular, respeitando as mesmas regras que ele. Assim, são atos regidos pelo direito privado: doação, permuta, compra, venda, emissão de um cheque, abertura de conta corrente junto ao banco estadual etc. Além desses exemplos, é de se ressaltar, também, que a lei de licitações e contratos (lei 8.666/93), em seu artigo 63, parágrafo terceiro, elenca alguns contratos celebrados pela administração que são regidos, predominantemente, pelo direito privado, tais como os de seguro, financiamento e do da locação de imóvel (em que a Administração é a locatária). Para o ato da administração ser considerado ATO ADMINISTRATIVO TÍPICO, deverá ser regido pelo direito público, que apresenta como uma de suas características a unilateralidade.

b) Os atos materiais (ou de mera execução) da Administração: são os atos que não contém manifestação de vontade, sendo, tão-somente atos de execução de alguma decisão administrativa, gerando alguma utilidade para o administrado. Estes atos apenas satisfazem a necessidade da Administração ou da sociedade, sem que haja qualquer interferência nas relações jurídicas. Citamos como exemplos a demolição de uma residência, a execução da atividade de um taquígrafo, a apreensão de mercadorias estragadas, a realização de um serviço, a dispersão de manifestantes, a desapropriação de bens privados, a exposição de uma aula pelo professor da rede municipal de ensino, o asfaltamento de uma rua, uma intervenção odontológica, a limpeza das avenidas, o servidor organizando a sua repartição,

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condução de uma viatura pelo servidor da repartição etc. Estes atos sequer podem ser classificados como atos jurídicos, uma vez que não produzem os denominados efeitos jurídicos próprios dos atos jurídicos. São chamados por alguns autores de fatos da Administração, justamente por não produzirem efeitos jurídicos no âmbito administrativo. Se produzissem efeitos jurídicos (se dele se originassem e se extinguissem direitos), tais acontecimentos seriam denominados de fatos administrativos.

Contudo, para alguns doutrinadores (dentre eles José dos Santos Carvalho Filho), estes eventos naturais que repercutem no seio da Administração são suficientes para serem denominados de fatos administrativos, não se levando em consideração a produção ou não de efeitos jurídicos. Assim, para estes últimos, um raio que destrói um bem público ou a realização de qualquer atividade material no exercício da função administrativa são tidos como fatos administrativos.

Conclusão: para alguns doutrinadores, a exposição de uma aula por um professor municipal é tida como um fato da Administração (por configurar a realização de uma atividade material no exercício de uma atividade administrativa sem produzir quaisquer efeitos jurídico-administrativos), ao passo que, para outros, referida aula é tida como um fato administrativo (pois, para eles, não é levada em consideração a produção ou não de efeitos jurídicos).

c) Os atos de conhecimento, de opinião, de juízo ou de valor : atos que não contém manifestação de vontade, não produzindo efeitos jurídicos, tais como os atestados, os votos, os pareceres e as certidões. Comumente chamados de “atos preparatórios”, não produzem efeitos diretamente por dependerem de outro ou de um conjunto de outros atos. Porém, são considerados como parte integrante do ato administrativo resultante. Assim, o voto de um membro de um órgão colegiado não pode ser considerado, por si só, como um ato administrativo, mas a decisão final do colegiado, sim. O mesmo raciocínio se aplica a um parecer técnico que embasará a decisão de uma autoridade superior. Ele se integra naquela decisão, sendo que esta última (a decisão final) é que possui a capacidade de produzir os efeitos jurídicos.

d) Os atos políticos ou de governo (são os atos sujeitos a regime jurídico-constitucional, como ocorre com a iniciativa de lei pelo Executivo, a sanção, o indulto e o veto presidencial).

e) Os atos normativos da Administração (decretos, portarias, resoluções, regimentos, edição de medida provisória; de efeitos gerais e abstratos). São os chamados atos atípicos do Poder Executivo. O mesmo se dá quanto aos atos judiciais praticados por referido poder.

f) Os atos administrativos propriamente ditos. São os chamados atos administrativos típicos, sendo esta a matéria tratada neste capítulo.

2. CONCEITOS DE ATO ADMINISTRATIVOConceito 1: Ato administrativo é um ato jurídico produzido pelo Estado, no exercício da função administrativa,

sob regime jurídico administrativo e sujeito ao controle de legalidade.Observemos que o ato administrativo é um ato jurídico. Vejamos: certas atividades realizadas no dia a dia, tais

como, dormir, tomar banho e almoçar não têm qualquer relevância para o direito. Porém, adquirir bens, pagar contas e assinar contratos são situações que envolvem relações jurídicas entre as pessoas, implicando em direitos e deveres. Por isso, estas últimas atividades são tidas como atos jurídicos, justamente porque se destinam a afetar essas relações jurídicas. Esses atos jurídicos se prestam a criar, modificar, transferir, esclarecer e extinguir essas relações jurídicas.

Conceito 2: Ato administrativo é a exteriorização da vontade de agentes da Administração Pública ou de seus delegatários, nessa condição, que, sob regime de direito público, vise à produção de efeitos jurídicos, com o fim de atender ao interesse público.

Conceito 3: Para Hely Lopes Meirelles, ato administrativo é toda e qualquer manifestação unilateral da Administração Pública, objetivando adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir, declarar direitos ou impor obrigações aos seus administrados ou a si própria.

Conceito 4: Para Maria Sylvia Z. di Pietro, ato administrativo é a “a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário”.

Assim, podemos concluir que o ato, para ser considerado como ATO ADMINISTRATIVO, deverá:

a) Exteriorizar uma vontade unilateral da Administração Direta, Indireta ou de quem lhe faça as vezes (concessionários, permissionários, organizações sociais, serviços sociais autônomos, OSCIPs etc). Esta declaração de vontade é voltada para a obtenção de determinados efeitos jurídicos definidos em lei. b) Estar sujeito ao Regime Jurídico Administrativo (também denominado de “regime jurídico de direito público”). Assim, os atos praticados pelo Estado, ainda que no exercício da função administrativa, mas que estejam sujeitos ao regime de direito privado, regulados pelas normas civis e comerciais, não são atos administrativos.

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c) Produzir efeitos imediatos. Sendo o ato administrativo uma espécie de ato jurídico, ele deverá produzir efeitos jurídicos. Assim, o ato que não produz estes efeitos, não é ato administrativo. Assim, varrer uma avenida ou dirigir um veículo oficial não são tidos como atos administrativos, uma vez que não produzem efeitos jurídicos imediatos.d) Ser passível de controle pelo Poder Judiciário. Lembramos que o ato administrativo não é absolutamente definitivo, podendo ser anulado pelo Poder Judiciário se estiver inquinado de vícios. Já os atos jurisdicionais, contrariamente aos atos administrativos, possuem o atributo da definitividade, produzindo a situação denominada “coisa julgada”, estudada no direito constitucional. Além do controle judiciário, o ato administrativo está sujeito, também, ao controle parlamentar, isto é, daquele oriundo dos órgãos do poder legislativo.e) Ser produzido pelo Estado ou por quem detém os poderes atribuídos pelo Estado no exercício da chamada “função administrativa”. Observemos que o vocábulo “Estado” deve ser entendido não apenas como o Poder Executivo, mas também o Legislativo ou o Judiciário, pois estes dois últimos Poderes exercem funções administrativas, através de atos administrativos, tais como a nomeação de servidor ou a realização de uma licitação. f) Prover de agente (sujeito) competente, a finalidade deverá ser pública e o ato deverá estar revestido de sua forma legal.

3. SUJEITOS ATIVOS DA MANIFESTAÇÃO DA VONTADENão são todas as pessoas que possuem competência para praticar atos administrativos. È necessário que o

sujeito da manifestação volitiva esteja, de alguma forma, vinculado à Administração Pública. Assim, agentes da administração são os que integram a estrutura funcional dos órgãos administrativos das pessoas federativas, em qualquer dos Poderes e as pessoas da Administração Indireta. O único pressuposto exigido para sua caracterização é que exerçam função administrativa. Desta forma, estão excluídos os magistrados e parlamentares quando no exercício de suas funções típicas, quais sejam, proferir sentenças e editar leis, respectivamente. Mas, se estiverem desempenhando, eventualmente, funções administrativas, serão tidos como agentes da Administração para o exercício de atos administrativos, tais como a nomeação de um servidor de um Tribunal ou a licitação realizada pelo Poder Legislativo visando a aquisição de bens. Já os agentes delegatários não integram a estrutura funcional da Administração Pública, mas recebem a incumbência de exercer, via delegação, função administrativa delegada. Quando estiverem no desempenho dessa função, estarão atuando na mesma condição dos agentes da Administração e produzindo atos administrativos. Enquadram-se nestes casos, por exemplo, os agentes de empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos e os de pessoas vinculadas formalmente à Administração, como os serviços sociais autônomos (SESI, SESC etc). Porém, fora do exercício da função delegada, tais agentes praticam negócios e atos jurídicos próprios das pessoas de direito privado. Os atos administrativos de agentes delegatários, quando no exercício da função administrativa, são atos de autoridade pública, sendo cabíveis, por exemplo, o Mandado de Segurança e a Ação Popular contra eles.

Assim, verificamos que o agente que pratica o ato administrativo recebe os seus poderes do próprio Estado, ou seja, dos entes políticos, personificados nas figuras da U/E/DF e M. Às vezes esses atos administrativos são realizados por outras pessoas jurídicas, por entidades criadas pelo próprio Estado (tais como as entidades da Administração Indireta), ou mesmo por particulares. O importante é verificar que a fonte, a origem do poder, vem do próprio Estado e sem lei ou contrato que atribua estes poderes às entidades ou particulares, estes atos não poderão ser praticados por elas.

4. REGIME JURÍDICO DE DIREITO PÚBLICOOs atos administrativos são sujeitos a regime jurídico de direito público, pois tais atos provêm de agentes da

Administração e atendem o interesse público, não podendo ser inteiramente regulados pelo direito privado. Há regras e princípios jurídicos específicos para os atos administrativos que não incidem sobre atos privados, porque aqueles se qualificam como atos de Poder, dotados de prerrogativas especiais, com normas que contemplam os requisitos de validade dos atos administrativos, os princípios da legalidade estrita, da auto-executoriedade e da presunção de legitimidade. Assim, é o regime de direito público que rege basicamente os atos administrativos, cabendo ao direito privado fazê-lo supletivamente, ou seja, em caráter subsidiário e sem contrariar o regramento fundamental específico para os atos públicos. Não é apenas o interesse público concreto, ou o intento de beneficiar a coletividade que caracteriza o ato como sendo tipicamente “administrativo”. Alguns atos assemelham-se aos administrativos, porque estão direcionados às demandas da sociedade. Estando, porém, ao desamparo do regime de direito público, tais condutas propiciam a prática de atos privados. Assim, atos de entidades de caráter assistencial, desprovidas de vínculo jurídico formal com a Administração, não são tidos como atos administrativos, embora haja neles a característica de atenderem o interesse público. Portanto, os atos da diretora de uma determinada escola municipal se qualificam como administrativos, em face do regime de direito público a que se submete o sujeito da vontade. Já os atos do diretor de escola mantida por entidade religiosa privada são, em regra, privados.

Os países que adotam o sistema denominado common law (lei comum) negam que a Administração tenha um regime jurídico próprio, ou seja, um regime jurídico administrativo. Para eles (Estados Unidos e Inglaterra, por exemplo), o direito é comum tanto aos particulares quanto à administração.

Por fim, verifica-se que o ato administrativo difere do ato jurídico privado por seu tratamento jurídico especial, decorrente do regime jurídico administrativo.

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6. ELEMENTOS DE VALIDADE (REQUISITOS, PRESSUPOSTOS OU CONDIÇÕES DE VALIDADE) DO ATO ADMINISTRATIVO.

Tais “elementos de validade” dizem respeito às condições para que se possa considerar o ato administrativo como tendo sido produzido em conformidade com o ordenamento jurídico e os princípios administrativos.

Por este tópico estaremos analisando a infra-estrutura, a anatomia do ato administrativo.Todo ato administrativo - (seja ele vinculado ou discricionário) - deve possuir os cinco elementos descritos

abaixo, sob pena de ser considerado nulo.Veja-se que os elementos dos atos administrativos não são os mesmos elementos do ato jurídico privado, vez

que competência, finalidade, forma, motivo e objeto são elementos dos primeiros, ao passo que apenas “sujeito”, “objeto” e “forma” são elementos do segundo, ficando evidente a diferença entre atos administrativos propriamente ditos e atos privados, dentre outras.

Assim, os elementos (ou requisitos) de validade dos atos administrativos são as condições, os pressupostos para sua produção em conformidade com a lei e os princípios administrativos. São eles:

6.1. CompetênciaSegundo Maria Sylvia Z. di Pietro, competência pode ser definida como “o conjunto de atribuições das pessoas

jurídicas, órgãos e agentes, fixadas pelo direito positivo”. A mesma autora denomina este elemento de “sujeito”, afirmando que “sujeito é aquele a quem a lei atribui competência para a prática do ato”. Já Cretella Júnior adota o vocábulo “agente”. Assim, entende-se a competência como o círculo definido por lei dentro do qual podem os agentes públicos exercer legitimamente sua atividades, ou seja, como o conjunto de poderes conferidos pela lei aos agentes para que eles possam desempenhar suas funções e assegurar o interesse público. A competência tem que decorrer de norma expressa, de lei (vide artigo 61, §1º, II da CF/88 e artigo 25 da ADCT - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias). Não há presunção de competência administrativa. Esta há de originar-se de texto expresso. Assim, a lei é a fonte normal da competência. É nela que se encontram os limites e a dimensão das atribuições cometidas às pessoas administrativas, órgãos e agentes públicos. Mas a lei não é a fonte exclusiva da competência administrativa. Para órgãos e agentes de elevada hierarquia, ou de finalidades específicas, pode a fonte da competência situar-se na própria CF (vide artigos 48, 49, 51, 52, 84 a 87 e 96). Em relação a órgãos de menor hierarquia, pode a competência derivar de normas expressas de atos administrativos organizacionais. Nesse caso, serão tais atos editados por órgãos cuja competência decorre de lei. Em outras palavras, a competência primária do órgão tem origem na lei, e a competência dos segmentos internos dele, de natureza secundária, pode receber definição através de atos organizacionais.

Segundo alguns doutrinadores, a possibilidade conferida ao Presidente da República para dispor mediante decreto sobre organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos, possibilita ao chefe do executivo federal o direito legal de atribuir competências, tendo em vista que, quem organiza tem que definir competências. Concluem, assim, que no âmbito federal, as competências administrativas organizacionais poderão ser definidas por Decreto (vide artigo 84, VI, da CF/88). Na verdade, os que defendem a existência dos “decretos autônomos” baseiam-se, dentre outros argumentos, neste artigo constitucional visando defender sua tese. No entanto, se a organização administrativa vier a acarretar aumento de despesas, o tema deverá ser tratado através de lei, de iniciativa do Chefe do Executivo federal.

Do elemento “competência” decorrem algumas características:

1ª) Inderrogabilidade, ou seja, a competência de um órgão/agente não pode ser alterada (transacionada) por mero acordo de vontades entre as partes, haja vista que a competência é conferida pela lei e somente ela poderá alterá-la (e não através de um ato bilateral celebrado entre agentes públicos). Assim, a inderrogabilidade é tida como uma característica absoluta; 2ª) Improrrogabilidade, ou seja, se um órgão não tem competência para certa função, não poderá vir a tê-la supervenientemente, a menos que a antiga norma definidora seja alterada. Marcelo Alexandrino nos explica que “parte da doutrina menciona a improrrogabilidade como atributo da competência, significando que o fato de um órgão ou agente incompetente praticar um ato não faz com que ele passe a ser considerado competente, salvo disposição legal expressa que assim estabeleça. Vale dizer, a competência não se estende automaticamente a órgão ou agente incompetente pelo simples fato de haver ele praticado o ato ou tomado conhecimento dos fatos que ensejariam a sua prática”. Ainda, pela improrrogabilidade, os agentes não podem atuar, praticar atos para os quais o ordenamento jurídico não lhes conferiu competência. Ao contrário da inderrogabilidade, a improrrogabilidade é relativa, uma vez que é cabível excepcioná-la através dos institutos da delegação e da avocação, momento em que o agente praticará atos originariamente outorgados a outros. Observe que a inderrogabilidade diz respeito à própria competência (à sua titularidade), matéria reservada à lei, ao passo que a improrrogabilidade refere-se ao exercício de competências (produção de atos); 3ª) Decorre sempre de lei; 4a) é de exercício obrigatório para a Administração (pela irrenunciabilidade das competências, o agente é obrigado a exercer suas competências toda vez que o interesse público assim o requer. Esta característica não é absoluta, mas relativa, tendo em vista a possibilidade de delegar ou avocar o exercício de competências. É tida como a principal característica da competência).

5a) É imprescritível, uma vez que o agente não perde a competência com o passar do tempo,utilizando-a ou não; 6a) Se não houver óbice legal, poderá um agente utilizar-se da delegação de competência para transferir a outro (via

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de regra de plano hierárquico inferior) o exercício de funções que originariamente lhe foram atribuídas. Porém, pode a lei impedir a delegação de competência quando se tratar de funções indelegáveis, exclusivas do agente ou do órgão. A lei 9.784/99, por exemplo, que regula o processo administrativo na Administração federal, veda a delegação em se tratando de: edição de atos de caráter normativo, decisão de recursos administrativos ou quando as matérias são de competência exclusiva do órgão ou da autoridade. A mesma lei autoriza a avocação temporária (artigo 15), de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior, se for em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados. Mesmo com a delegação, haverá a competência cumulativa entre delegante e delegado. Porém, quando o órgão superior atrai para si a competência para cumprir determinado ato atribuído a outro (hierarquicamente inferior), ocorre o fenômeno da avocação. Uma das vantagens da avocação é evitar que haja decisões concorrentes e eventualmente contraditórias. A avocação é figura excepcional, só justificável ante os pressupostos que a lei estabelecer.

Observe-se que a Lei 9.784/99 dispõe em seu artigo 11º que a competência é irrenunciável e se exerce pelos órgãos administrativos a que foi atribuída como própria, salvo os casos de delegação e avocação legalmente admitidos. Com relação à possibilidade de delegar competências, Maria Sylvia argumenta que “embora o dispositivo dê a impressão de que a delegação somente é possível quando a lei permita, na realidade, o poder de delegar é inerente à organização hierárquica que caracteriza a Administração Pública”. Para esta autora, a regra é a possibilidade de delegação e a exceção é a impossibilidade de delegação, que somente ocorrerá em se tratando de competência outorgada com exclusividade ao agente ou ao órgão. Continuando seu raciocínio, a professora explica que “essa idéia está presente no artigo 12 da mesma lei, segundo o qual um órgão administrativo e seu titular poderão, se não houver impedimento legal, delegar parte de sua competência a outros órgãos ou titulares, ainda que estes não lhe sejam hierarquicamente subordinados, quando for conveniente, em razão de circunstâncias de índole técnica, social, econômica, jurídica ou territorial”. Acrescentamos, ainda, que a delegação não transfere a competência, mas tão somente o exercício de uma parcela das atribuições cometidas pela lei ao ente delegante, podendo o primeiro exercer referidas atribuições juntamente com o ente delegado, em havendo ressalva de exercício da função delegada. Além disso, poderá a delegação ser revogada pelo delegante, haja vista não se falar em renúncia por parte do primeiro.

Atenção: Não se deve confundir “competência” com “capacidade”, pois são dois institutos jurídicos diferentes. Competência é a outorga oriunda da constituição ou da lei de certa quantidade de poder conferido a determinado agente, órgão ou pessoa jurídica. Dentro da competência encontra-se a capacidade para o exercício de determinado ato. Ter capacidade significa ser titular de direitos e obrigações que possa exercer por si ou por terceiros.

Devemos observar que a atribuição de competência leva em conta os seguintes critérios: a) em razão da matéria (a competência para atuar fica restrita à matéria delineada pelo ordenamento jurídico, em obediência ao princípio da especialidade); b) em razão do território (a competência para atuar fica restrita à área ou zona de atuação territorial delineada pela lei); c) em razão do grau hierárquico (a competência é definida segundo o grau de hierarquia do órgão ou agente e o maior ou menor grau de complexidade e responsabilidade); d) em razão do tempo (a competência deverá ser utilizada dentro do prazo estipulado pela lei, como ocorre com os mandados políticos, por exemplo. Pode ocorrer a proibição de se realizar determinados atos em períodos definidos pela norma, como a nomeação ou exoneração de servidores em período eleitoral); e) em razão do fracionamento (há uma distribuição de competências por órgãos diversos, como nos casos de edição de atos complexos, que serão estudados neste capítulo).

Este requisito, ao lado da finalidade e da forma, é inteiramente vinculado para qualquer ato.

6.2. Objeto (ou conteúdo)Significa o objetivo imediato da vontade exteriorizada pelo ato. É a prescrição do ato. Diz respeito ao efeito

jurídico pretendido pelo ato. Como define Celso Antonio Bandeira de Mello, objeto “é aquilo que o ato dispõe, isto é, o que o ato decide, enuncia, certifica, opina ou modifica na ordem jurídica ... é a própria medida que produz a alteração na ordem jurídica ... é o próprio ato”. Assim, pode-se dizer que o objeto é o efeito jurídico imediato que o ato administrativo produz. E por efeito jurídico entenda-se o ato que, em decorrência dele, adquire-se, extingue-se ou transforma-se um determinado direito. Na verdade, o objeto é a resposta à indagação: “para que serve o ato?” Pode o objeto do ato administrativo consistir na aquisição, no resguardo, na transferência, na modificação, na extinção ou na declaração de direitos, pois todo ato administrativo é uma espécie do gênero ato jurídico. Esse efeito jurídico, portanto, é o objeto do ato administrativo. Assim, uma licença para construção tem por objeto permitir a edificação de forma legítima; o objeto de uma multa é o de punir o infrator da norma; na nomeação, o objeto é admitir o indivíduo no serviço público; numa permissão de transporte urbano, o objeto é permitir a alguém tal atividade. Variável é, pois, o objeto. Para que o ato administrativo seja válido, seu objeto deve ser lícito (em conformidade com a lei), possível (deve ser suscetível de ser realizado), certo (definido em relação aos destinatários do ato, aos efeitos imediatos dele, ao tempo e ao lugar) e moralmente aceito. Veja-se que, na atividade vinculada, o autor do ato limita-se a fixar como objeto dele o mesmo que a lei previamente estabeleceu. Trata-se de objeto vinculado. Portanto, na licença para exercer profissão, se o interessado preenche todos os requisitos legais, não pode o agente público não concedê-la. Mas, diante do objeto discricionário, é possível fixar-se termos, condições e modos (na autorização para funcionamento de um circo, pode o ato fixar o limite máximo de horário, ainda que o interessado tenha formulado pedido em horário além do que o ato veio a permitir).

Segundo Elias Freire, “nos atos discricionários, isto é, quando houver vários objetos possíveis para atingir o mesmo fim, sendo todos eles válidos perante o direito, o objeto fica na dependência da escolha da Administração, constituindo essa liberdade opcional o mérito administrativo, como ocorre quando a lei diz que a Administração pode

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punir o servidor com as penas de suspensão ou de multa”. É por esta razão que se diz que o mérito é a valoração dos motivos e a escolha do objeto.

Observemos, então, que o vício de objeto do ato administrativo ocorre quando o resultado do ato administrativo importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo.

Este requisito é considerado vinculado apenas se o ato for vinculado, caso contrário será tido como elemento discricionário do ato administrativo.

6.3. FormaA forma é o meio pelo qual se exterioriza a vontade. É elemento que integra a própria formação do ato. Sem sua

presença, o ato que vise a produção de efeitos sequer completa o seu ciclo de existência, sendo denominado de ato imperfeito, conforme estudaremos mais abaixo. Assim, não basta simplesmente a exteriorização da vontade pelo agente administrativo. Urge que o faça nos termos em que a lei a estabeleceu, para não ficar o ato com vício de legalidade, suficiente para provocar-lhe a invalidação. No direito privado, vigora o princípio da liberdade das formas. No público, a regra é a solenidade das formas. Como regra, deve o ato ser escrito, registrado (ou arquivado) e publicado. Não obstante, admite-se que em situações singulares possa a vontade administrativa manifestar-se através de outros meios, como é o caso de gestos (de guardas de trânsito), palavras/sinais (atos de polícia de segurança pública, apitos, sirenes) ou símbolos (placas de trânsito). Esses meios são excepcionais e atendem a situações especiais. Não obstante, é preciso reconhecer que a análise da adequação da forma à lei exige carga de comedimento e razoabilidade por parte do intérprete. Em conseqüência, haverá hipóteses em que o vício de forma constitui, em última instância, mera irregularidade sanável, sem afetar a órbita jurídica de quem quer que seja. Em tais casos não precisará haver anulação, mas simples correção, o que se pode formalizar pelo instituto da convalidação do ato (vide parte final deste capítulo). Assim, se o ato foi formalizado por “portaria”, ao invés de sê-lo por “ordem de serviço” como exigia a lei, seria exagero anular o ato, pois que o erro de denominação não interferiu no conteúdo legítimo do ato. Em outras hipóteses, porém, o vício na forma é insanável, porque afeta o ato em seu próprio conteúdo. É o caso, por exemplo, de resolução que declare determinado imóvel como de utilidade pública para fins de desapropriação. Como a lei exige decreto do Chefe do Executivo, aquele ato tem vício insanável e passível de anulação.

Importante trazer à tona os comentários da professora Maria Sylvia, quando a mesma ensina que “A obediência à forma não significa, no entanto, que a Administração esteja sujeita a formas rígidas e sacramentais; o que se exige, a rigor, é que seja adotada, como regra, a forma escrita, para que tudo fique documentado e passível de verificação a todo o momento. A não ser que a lei preveja expressamente determinada forma (como decreto, resolução, portaria etc.), a Administração pode praticar o ato pela forma que lhe parecer mais adequada. Normalmente, as formas mais rigorosas são exigidas quando estejam em jogo direitos dos administrados, como ocorre nos concursos públicos, na licitação, no processo disciplinar.”

Embora se distinga forma de procedimento, no sentido de que aquela indica apenas a exteriorização da vontade e este uma seqüência ordenada de atos e atividades, costuma-se caracterizar os defeitos em ambos como vícios de forma.

Este requisito, ao lado da finalidade e da competência, é inteiramente vinculado para qualquer ato.

6.4. Motivo (ou causa)Para Hely Lopes Meirelles, o motivo (ou causa do ato administrativo) “é a situação de direito (situação

jurídica) ou de fato (situação fática) que determina ou autoriza a realização do ato administrativo. O motivo, como elemento integrante da perfeição do ato, pode vir expresso em lei como pode ser deixado ao critério do administrador. No primeiro caso será um elemento vinculado; no segundo, discricionário, quanto à sua existência e vinculação”. Conforme raciocínio de José dos Santos Carvalho Filho, pode-se conceituar o motivo como a situação de fato ou de direito que gera a vontade do agente quando pratica o ato administrativo. Classifica-se o motivo em motivo de direito e motivo de fato. Motivo de direito é a situação de fato eleita pela lei como ensejadora da vontade administrativa. Motivo de fato é a própria situação de fato ocorrida no mundo empírico, sem descrição na norma legal. Se a situação de fato já está delineada na lei, o agente deve praticar o ato tão logo seja ela configurada. Atua ele como executor da lei em virtude do princípio da legalidade. Caracterizar-se-á, desse modo, a produção de ato vinculado por haver vinculação do agente à lei. Quando a lei não delineia a situação fática e transfere ao agente a verificação de sua ocorrência atendendo a critérios de caráter administrativo (conveniência e oportunidade), permitindo maior liberdade de atuação, embora sem afastamento dos princípios administrativos, sua atividade reveste-se de discricionariedade, redundando na prática de ato discricionário.

Devemos observar que o vício de motivo do ato administrativo se verifica quando a matéria de fato ou de direito em que se fundamenta o ato é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido.

Atenção: motivo e motivação são dois institutos jurídicos diferentes. A motivação é a justificação escrita (exposição das razões) da autoridade que praticou o ato. Na motivação serão apresentadas as razões de fato e de direito que ensejaram a realização do ato, ou seja, serão enunciados os pressupostos que o administrador levou em conta e que deram origem à prática do ato. Enquanto que o motivo é o próprio fato, a motivação é a exposição escrita do motivo. Observe-se que a recente Lei n. 9.784/99 traz em seu artigo 50 a exigência de motivação de diversos atos administrativos e, em seu artigo 2º, erige a motivação como princípio a ser respeitado pela Administração Pública Federal no âmbito dos processos administrativos. Quando a lei impõe que seja apresentada a motivação do ato, o administrador deverá fazê-la, sob pena do ato ser inválido. As divergências doutrinárias surgem quando a lei é omissa quanto à obrigatoriedade da

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motivação. A maioria dos doutrinadores entende que todos os atos devam ser motivados, em obediência ao princípio constitucional implícito da Motivação, com exceção daqueles atos administrativos não praticados de forma escrita.

Pela Teoria dos Motivos Determinantes, que tem origem no Direito francês, o motivo do ato administrativo deve sempre guardar compatibilidade com a situação de fato que gerou a manifestação da vontade. A aplicação mais importante desse princípio incide sobre os atos discricionários. Mesmo não exigindo expressa motivação, esta, se existir, passa a vincular o agente aos termos em que foi mencionada. Se restar comprovado que inexiste a realidade fática mencionada no ato administrativo como determinante da vontade, o ato estará inquinado de vício de legalidade. Assim, se um servidor requer suas férias, pode o superior hierárquico indeferi-las sem deixar expresso no ato o motivo. Se, todavia, indefere o pedido, alegando que há falta de pessoal na repartição e o interessado provar que há excesso, o ato estará viciado no motivo.

Este requisito é considerado vinculado apenas se o ato for vinculado, caso contrário será tido como elemento discricionário do ato administrativo.

6.5. FinalidadeTodo ato administrativo deve estar dirigido ao interesse público. Se assim não o for, haverá desvio de finalidade

(ou de poder). Conduta desse tipo ofende, também, os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa. Há um elo indissociável entre a finalidade e a competência, seja o ato vinculado ou discricionário, pois, quando a lei define a competência do agente, a ela já vincula a finalidade a ser perseguida pelo agente. Observe-se que há distinção entre finalidade e objeto. O objeto representa o fim imediato, ou seja, o resultado prático a ser alcançado pela vontade administrativa. A finalidade, ao contrário, reflete o fim mediato, ou seja, o interesse coletivo. Assim, o objeto é variável conforme o resultado prático buscado pelo agente e a finalidade é invariável para qualquer espécie de ato, sendo sempre o interesse público. Desta forma, numa permissão de transporte urbano, o objeto é permitir a alguém tal atividade; numa licença de construção, o objeto é consentir que alguém edifique; numa admissão, o objeto é autorizar alguém a ingressar em estabelecimento público. Variável é, pois, o objeto, conforme a espécie do ato. Contudo, a finalidade é a mesma em todos os casos: o interesse público.

Para Hely Lopes Meirelles, “a finalidade do ato administrativo é aquela que a lei indica explícita ou implicitamente. Não cabe ao administrador escolher outra, ou substituir a indicada na norma administrativa, ainda que ambas colimem fins públicos. Neste particular, nada resta para a escolha do administrador, que fica vinculado integralmente à vontade legislativa”.

Este elemento de validade pode ser entendido em sentido amplo e em sentido estrito. Pelo primeiro sentido (amplo), podemos afirmar que todo ato administrativo deve visar, sempre, ao interesse público, ao passo que, pelo segundo sentido (estrito), todo ato administrativo deve visar à sua finalidade específica, prevista expressa ou implicitamente na lei.

Este requisito, ao lado da competência e da forma, é inteiramente vinculado para qualquer ato.

7. CARACTERÍSTICAS (ATRIBUTOS) DO ATO ADMINISTRATIVOOs atos administrativos emanam de agentes dotados de parcela do Poder público. Basta essa razão para que

precisem estar revestidos de cercas características (prerrogativas) que os tornem distintos dos atos privados, regidos pelo direito civil e comercial. Os atributos (características inerentes aos atos administrativos) diferenciam-se dos requisitos, que são condições que devem ser observadas para a válida edição do ato. São eles:

7.1. Imperatividade (ou coercibilidade ou coercitividade)Os atos administrativos são cogentes, obrigando a terceiros que se encontrem em seu círculo de incidência,

independente de sua concordância. O princípio da supremacia do interesse público justifica a coercibilidade dos atos administrativos. Decorre da imperatividade o poder que tem a Administração de exigir, unilateralmente, o cumprimento do ato. A exigibilidade, assim, deflui da própria peculiaridade de ser o ato imperativo, o que o diferencia dos atos de natureza privada. Atenção! Em certos atos estará ausente o cunho coercitivo. É o que ocorre, por exemplo, com os atos negociais (licenças, permissões, autorizações) e os atos enunciativos (certidões, declarações, atestados, pareceres etc), mais adiante estudados, em que, ao lado do interesse público de todo ato, há também o interesse privado e também nos atos de expedição de certidões, onde, evidentemente, dispensam a coercitividade para a sua operacionalização. Contudo, ainda neles se pode encontrar um resquício de imperatividade, ao menos no que toca à obrigação do beneficiário de se conduzir dentro dos limites que lhe forem traçados.

7.2. Presunção de Legitimidade ou de VeracidadeOs atos administrativos, quando editados, trazem a presunção de que nasceram em conformidade com a lei, a

bem da continuidade dos serviços públicos, sendo considerados legítimos até que se prove o contrário. Não se trata de presunção absoluta e inquestionável jurídica ou administrativamente. A hipótese é de presunção juris tantum (ou relativa), uma vez que pode ceder à prova em contrário. Assim, a obrigatoriedade de se provar que o ato se encontra viciado será daquele que alegar o vício. É o que comumente denominamos de inversão do ônus da prova.

São efeitos da presunção de legitimidade a auto-executoriedade (que será estudada abaixo) e a inversão do ônus da prova, transferindo a quem alegar não ser o ato legítimo a comprovação da ilegalidade. Na verdade, a presunção de legitimidade é inerente a todo ato do Poder Público, independente de sua natureza, incluindo-se, aqui, os atos de

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natureza privada. A presunção de legitimidade está presente desde o nascimento do ato e dispensa eventuais normas legais que o prevejam. Mesmo que se apontem irregularidades do ato que possam levá-lo à invalidação, o mesmo deverá ser obedecido por todos que se encontrem em seu círculo de atuação. Portanto, enquanto não for decretado pelo Judiciário ou pela própria Administração a nulidade ou a suspensão temporária dos efeitos do ato, através de recursos administrativos que admitam a produção de efeitos suspensivos ou liminares em ação de mandado de segurança, o mesmo deverá ser rigorosamente cumprido, como se fosse válido, perfeito e eficaz.

Em que pese alguns doutrinadores considerarem como expressões sinônimas a “presunção de legitimidade” com a de “veracidade” podemos encontrar diferenças entre elas, vez que pela presunção de veracidade temos a certeza relativa de que os fatos alegados pela Administração são verdadeiros. Por esta razão, dizemos que as certidões, os atestados, as declarações e as informações administrativas possuem fé-pública, sendo portadoras da garantia de que trazem em seu bojo informações condizentes com a realidade dos fatos. Assim, enquanto que a presunção de legitimidade diz respeito à conformidade do ato com a lei, a presunção de veracidade diz respeito à realidade dos fatos apresentados pela Administração.

Outro efeito da presunção de veracidade é que o judiciário não pode apreciar ex officio (ou seja, por iniciativa própria), a validade do ato. Para tanto, há a necessidade de que a pessoa interessada instiga o Judiciário, através de petição, a sair de sua “inércia” e determine a invalidade do ato, para, somente aí, ele deixar de produzir os seus efeitos.

Conforme leciona a professora Maria Sylvia Z. Di Pietro, “em relação ao ato jurídico de direito privado, o art. 168 do Código Civil determina que as nulidades absolutas podem ser alegadas por qualquer interessado ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir, e devem ser pronunciadas pelo juiz quando conhecer do ato ou dos seus efeitos; o mesmo não ocorre em relação ao ato administrativo, cuja nulidade só pode ser decretada pelo Judiciário a pedido da pessoa interessada”. Contudo, para esta mesma autora, somente a presunção de veracidade é que inverte o ônus da prova, obrigando a parte que alega a invalidade do ato ter de prová-la, ao passo que a presunção de legitimidade não produz este efeito de inversão do ônus da prova.

Por fim, ressalte-se que esta presunção decorre do princípio da legalidade que, nos Estados de Direito, informa toda a atuação Administrativa.

7.3. Auto-ExecutoriedadeConsiste na possibilidade de o ato administrativo ser imediata e diretamente posto em execução pela

Administração, sem intervenção do Poder Judiciário. No âmbito do direito privado, regido pelas leis civis e trabalhistas, poucas são as situações onde o particular pode executar suas próprias decisões (citamos a título de exemplo que, na proteção à posse, poderá o possuidor turbado manter-se por sua própria força, contanto que o faça logo – vide o artigo 1210, §1º do Código Civil. São exemplos de execução direta, também, além da legítima defesa, a retenção da bagagem do hóspede inadimplente junto ao hotel onde o mesmo se encontra hospedado e a poda dos galhos da árvore do vizinho que estejam invadindo propriedade particular). Porém, no direito público, é admitida a execução ex offício (por conta/iniciativa própria, de ofício) das decisões administrativas sem intervenção do Judiciário, como, por exemplo, nos casos de destruição de alimentos vencidos, demolição de um prédio em ruínas, embargo de obra irregular, interdição de um estabelecimento comercial, apreensão de mercadorias etc.

Ressalte-se que a auto-executoriedade não é um atributo pertencente a todos os atos da administração, mas sim aos atos administrativos (excluídos novamente os atos administrativos negociais e enunciativos). A auto-executoriedade se faz presente quando a mesma é autorizada explícita ou implicitamente em lei ou, em não havendo previsão legal, quando se tratar de alguma medida urgente que necessite ser auto-executada imediatamente pela Administração sob pena de, não o fazendo, acarretar um prejuízo maior ao interesse público, como nos casos de demolição de prédio que ameaça cair, a internação compulsória de indivíduo com doença contagiosa e a dissolução de reunião que ponha em risco a segurança de coisas ou pessoas. Assim, atos da administração sujeitos ao regime jurídico de direito privado, como o aluguel, a compra, a venda e a doação, por exemplo, não possuem referido atributo.

O fundamento jurídico deste atributo consubstancia-se na necessidade de garantir com eficiência e rapidez o interesse coletivo. Assim, o ato vale como a sentença do magistrado, mesmo estando sujeito a controle exógeno (externo) por parte do Judiciário, tal como ocorre diante da destruição de bens impróprios ao consumo público e da demolição de construção com riscos de desabamento. Verificada a situação que provoca a execução do ato, a autoridade administrativa de pronto o executa, ficando, assim, resguardado o interesse público. Em certas situações, o ato administrativo fica despido desse atributo, o que obriga o Poder Público a recorrer ao Poder Judiciário, como nos casos de cobrança de multa (quando não quitadas espontaneamente pelo particular) ou desapropriação, que exigem o ajuizamento da competente ação judicial (observe, no primeiro caso, que a Administração poderá efetuar o lançamento do débito e notificar o particular a efetuar o pagamento da multa). Os princípios do contraditório e da ampla defesa estabelecem alguns limites ao princípio da executoriedade, impedindo uma atuação exclusiva do administrador. Ameaças de lesão podem ser impedidas, por exemplo, através do mandado de segurança, da ação popular e da ação civil pública.

Encontramos este atributo, com muita freqüência, nos atos realizados pela Administração no uso do seu Poder de Polícia.

Alguns doutrinadores desdobram o atributo da auto-executoriedade em:a) Exigibilidade, através do qual o Poder Público toma decisões executórias criando obrigação para o particular

sem necessitar ir preliminarmente a juízo.

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b) Executoriedade, que corresponde à capacidade da ação ex officio, através da qual a Administração pode executar diretamente a sua decisão através do uso da força.

A diferença entre a exigibilidade e a executoriedade, que reside unicamente no meio coercitivo, está no fato de que, na exigibilidade, a Administração utiliza meios indiretos de coação, devidamente descritos na lei, como nos casos de imposição de multas ou outras penalidades/sanções para o caso de descumprimento do ato pelo particular, a fixação de locais e horários para o desempenho de atividades ou a exigência de construção de uma calçada. Já a executoriedade corresponde ao emprego de meios diretos de coerção, pela Administração, ao particular, compelindo-o materialmente a obedecer ao ato emanado por ela, independentemente mesmo de previsão legal, visando atender, por exemplo, situações de emergência que ponham em risco a segurança ou a saúde da sociedade, como ocorre nos casos de apreensão de mercadorias, fechamento de casas noturnas ou de a própria Administração construir a calçada devidamente exigida e não realizada pelo administrado e mandar-lhe a conta devida. Porém, ressalte-se que ambas as espécies descritas permitem a auto-executoriedade das decisões, com meios coercitivos próprios, pela Administração, sem necessidade de se socorrer do Poder Judiciário para tanto.

Por fim, ressalte que, em algumas situações, poderá o ato ser exigível, porém não executável, como nos casos das multas de trânsito, que podem ser devidamente exigidas pela Administração (através do envio da multa à residência do particular), mas não podem ser auto-executadas por ela, devendo o Poder Público valer-se das ações judiciais cabíveis (execução fiscal, por exemplo) para cobrar a dívida (através do Poder Judiciário). O mesmo raciocínio vale quanto às desapropriações, que podem ser exigidas através de decretos expropriatórios, mas não pode a Administração executar, por si mesma, a retirada forçada dos moradores da propriedade. Desta forma concluímos que:

a) na exigibilidade, independe de participação do Poder Judiciário e os meios de coação contra o administrado são indiretos. Esses meios representam a imposição de uma sanção ao particular que estiver desobedecendo a uma norma legal, porém, não impedem que a lei continue a ser descumprida por ele.

b) a executoriedade é mais gravosa que a exigibilidade, independe do Judiciário e se utiliza de meios diretos de coação contra o particular.

7.4. TipicidadePara Maria Sylvia Z. Di Pietro, “tipicidade é o atributo pelo qual o ato administrativo deve corresponder a

figuras definidas previamente pela lei como aptas a produzir determinados resultados. Para cada finalidade que a Administração pretende alcançar existe um ato definido em lei”. Desta forma, por este atributo, não poderá a Administração produzir os denominados “atos inominados”, produzidos através da autonomia própria de vontade, tal como ocorre nas relações entre os particulares. Desta forma, o particular se encontra protegido contra a prática de atos totalmente discricionários pela Administração dotados de imperatividade e auto-executoriedade sem que haja, para tanto, uma previsão legal. A mesma autora salienta que “a tipicidade só existe com relação aos atos unilaterais; não existe nos contratos porque, com relação a eles, não há imposição de vontade da Administração, que depende sempre da aceitação do particular; nada impede que as partes convencionem um contrato inominado, desde que atenda melhor ao interesse público e ao do particular”.

8. MÉRITO ADMINISTRATIVOConsidera-se mérito administrativo a avaliação da conveniência e da oportunidade relativas ao motivo e ao

objeto do ato discricionário. Em relação ao motivo valoram-se os fatores que o constituem. Quanto ao objeto, o administrador escolhe o que melhor atende o interesse público. Quanto aos elementos competência, finalidade e forma, eis que são elementos SEMPRE vinculados em qualquer hipótese, não são passíveis de avaliação desta oportunidade e conveniência. Observe-se, assim, que não se pode falar em mérito administrativo em se tratando de ato vinculado, haja vista que o motivo e o objeto do ato já constituirão elementos que o legislador quis expressar.

O agente pode fazer valoração de conduta tanto na discricionariedade quanto na aplicação de conceitos jurídicos indeterminados (nesse último caso citamos como hipóteses de conceitos jurídicos indeterminados expressões que não apresentam exatidão em seu sentido, tais como “interesse público”, “ordem pública”, “bons costumes”, “falta grave”).

8.1. Controle do Mérito pelo Poder JudiciárioAo Judiciário é vedado exercer controle judicial sobre o mérito administrativo, haja vista o princípio da

separação e independência dos poderes. O STJ assentou que “é defeso ao Poder Judiciário apreciar o mérito do ato administrativo, cabendo-lhe unicamente examiná-lo sob o aspecto de sua legalidade, isto é, se foi praticado conforme ou contrariamente à lei. Esta solução se funda no princípio da separação dos poderes, de sorte que a verificação das razões de conveniência ou de oportunidade dos atos administrativos escapa ao controle jurisdicional do Estado”.

Então, cuidado na hora da prova! Se a Administração Pública utilizar-se das “vestes” do mérito administrativo para infringir a lei ou a moral administrativa, caberá, sim, interferência do Poder Judiciário, anulando o ato abusivo. Mas, em não havendo ilegalidade alguma, o mérito permanecerá intocável pelo Judiciário, somente podendo ser revogado pela própria Administração editora do ato (ou pelo órgão hierarquicamente superior a ela).

9. CLASSIFICAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

9.8. Quanto à Exeqüibilidade ou eficácia (capacidade para a produção de seus efeitos)

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a) Ato Perfeito: é aquele que cumpriu com todas as etapas normativas/legais de sua formação; que se encontra em condições de produzir seus efeitos jurídicos, vez que já completou todo o ciclo necessário à sua formação, ou seja, que já esgotou todas as fases necessárias à sua produção, estando concluído, finalizado, completo, acabado, reunindo todos os elementos imprescindíveis à sua operatividade. Esta classificação diz respeito à idéia de EXISTÊNCIA OU DE ELABORAÇÃO DO ATO. Não se deve confundir ato perfeito com ato válido. Enquanto que a perfeição diz respeito às etapas legais de formação do ato, a validade diz respeito à conformidade do ato com o ordenamento pátrio.Exemplo: Conforme leciona Maria Sylvia, “um ato que seja motivado, reduzido a escrito, assinado, publicado, está perfeito em sua FORMAÇÃO, se a lei não contiver qualquer outra exigência. A VALIDADE diz respeito à conformidade do ato com a lei: a motivação deve referir-se a motivos reais, a autoridade que assina deve ser a competente, a publicação deve ser a forma exigida para divulgar o ato”. Observe, caro aluno, então, que o ato poderá ser PERFEITO, tendo completado integralmente o seu ciclo de formação, mas NÃO SER VÁLIDO.

b)Ato Imperfeito: em contrapartida, o ato imperfeito é aquele incompleto, carente de um ato complementar (intermediário) que o torne perfeito, concluído, tal como a existência de uma portaria ainda não assinada pelo agente competente ou de um documento aguardando a devida publicação na imprensa oficial. Alguns autores chamam-no de ato “inexistente”, por considerar que o ato sequer chegou a existir.

c) Ato Válido: é aquele praticado em conformidade com as normas superiores que devem regê-lo, estando ajustado às exigências legais ou a outro ato de grau mais elevado. Aqui há uma ausência de vícios. Esta classificação diz respeito à idéia de ADEQUAÇÃO. Assim, o ato válido é aquele que é emanado por agente competente, que possui a formalidade descrita na lei, seu objeto é possível e moralmente aceito, que possui motivos adequados ao conteúdo e que vai ao encontro da finalidade prevista no ordenamento pátrio.

d) Ato Inválido: é aquele que não se encontra ajustado às exigências legais.e) Ato Eficaz: é o ato que se encontra apto a produzir os efeitos típicos que se esperam dele, ou seja, que está

pronto a atingir o fim a que foi destinado. Esta classificação diz respeito à idéia de PRODUÇÃO DE EFEITOS. Já o administrativista - Celso Antonio Bandeira de Melo - prefere utilizar a expressão “Ato Exeqüível”.

f) Ato Ineficaz: ocorre se o ato não for capaz de produzir os seus efeitos típicos, por haver algum fato ou ato capaz de impedir ou de propiciar a produção dos seus efeitos. Portanto, se o ato estiver subordinado a uma condição suspensiva (quando há cláusulas que subordinam o efeito do ato a um fato ou evento futuro e incerto), ou a um termo não verificado (subordinação do efeito do ato a um fato futuro e certo, haja vista que se indica quando se inicia e termina a eficácia dele) ou à prática de outro ato jurídico (como a autorização, aprovação ou homologação), o ato será ineficaz. E continuará ineficaz até que os fatos mencionados venham a ocorrer. Vejamos alguns exemplos: o testamento feito no cartório somente produzirá os seus efeitos após o falecimento do seu autor. Portanto, apesar desse ato ser perfeito e válido, o mesmo é ineficaz. Da mesma forma, a habilitação para dirigir somente produzirá os seus efeitos até a data pré-determinada pela Administração. Nesse caso, estamos diante de um termo. Por último, se você se inscrever em um concurso público e constar no edital que a confirmação da matrícula somente se dará após o pagamento e a compensação do cheque emitido, estaremos diante de uma condição. Alguns autores preferem chamar estes atos de Atos Pendentes (entre eles, Maria Sylvia Zanela di Pietro e Marcelo Alexandrino, dentre outros), ao passo que Celso Bandeira os denomina de Atos Inexeqüíveis. Assim, um testamento, por exemplo, só produzirá seus efeitos jurídicos após o falecimento de quem o produziu. Estamos falando de uma “condição suspensiva”. Já a carteira de habilitação para dirigir produz efeitos até uma data pré-determinada. Neste caso, estamos diante de um “termo”. Se constar no edital de um concurso público que somente após o pagamento da taxa de inscrição é que se formalizará a inscrição definitiva, estaremos diante de uma “condição suspensiva”.

Lembramos que, para o professor Hely Lopes Meirelles, ato eficaz é aquele que já se encontra apto a produzir seus efeitos imediatos, pelo simples fato de estar perfeito, como também aquele ato que dependa de alguma condição ou termo (são os chamados atos ineficazes para os outros doutrinadores), com a diferença de que o primeiro é considerado eficaz e exeqüível, ao passo que o último é considerado eficaz, porém, inexeqüível. Contudo, a doutrina apontada pelo professor Celso Bandeira, acima apresentada, parece estar sendo a mais aceita nos atuais concursos públicos.

g) Ato Consumado: é o ato administrativo cujos efeitos jurídicos encontram-se exauridos. Torna-se definitivo e imodificável e não pode mais ser impugnado administrativa ou judicialmente. Se o ato foi praticado com alguma ilicitude, causando danos a terceiros de boa-fé, poderá ensejar as responsabilidades civis, criminais e administrativas. Desta forma, a licença para a construção de uma casa tornar-se-á consumada a partir da edificação da mesma e o ato que tenha deferido férias ao servidor estará exaurido a partir do momento em que ele as tiver gozado. Estes atos não mais podem ser revogados pela Administração.

h) Ato nulo: é o ato afetado por algum vício insanável, impossível de ser convalidado, e que não gera direitos, devendo ser anulado pela Administração ou pelo Judiciário com efeito ex tunc (efeito retroativo da decisão).

i) Ato anulável: é o ato afetado por algum vício sanável, passível de ser convalidado, uma vez que a nulidade é relativa.j) Ato inexistente: é o ato praticado por um “usurpador da função pública”. É o ato que aparenta ser administrativo, mas não o é. Com relação ao usurpador da função pública, vide os comentários constantes do item 13.6 (invalidação dos atos administrativos), abaixo.

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9.1. Quanto aos Destinatários: esta classificação se baseia na distinção entre destinatários determinados ou indeterminados do ato administrativo.

a) Atos Gerais (ou normativos/regulamentares): regulam uma quantidade indeterminada e imprecisa de pessoas que se encontram na mesma situação jurídica. A finalidade é normativa, assemelhando-se à lei (que é abstrata, impessoal e genérica). Não há um destinatário determinado, certo. Ex: decretos, regulamentos, regimentos, resoluções, deliberações, instruções normativas, circulares ordinatórias de serviços, portarias, edital de concurso (quaisquer indivíduos que preencham os requisitos exigidos no edital podem participar do concurso, uma vez que o ato não foi editado para destinatários certos, determinados) etc. Se produzirem efeitos externos, necessitam de publicação.

b) Atos Individuais (concretos, especiais ou específicos): seu campo de atuação alcança destinatários certos, definidos (individualizados ou individualizáveis, específicos). O ato individual pode abranger um ou vários sujeitos, desde que sejam individualizados. Assim, se for feito apenas um decreto para nomear diversos agentes, na verdade foram praticados diversos atos individuais com destinatários definidos, de sorte que se houver a invalidação da nomeação de um deles, os demais não serão atingidos por ela. Se produzirem efeitos externos, necessitam de publicação. Citamos como exemplos: licença para construção, decreto expropriatório, nomeação de um agente público (decreto de nomeação), outorgas de licenças, permissões e autorizações etc.

Atenção! No confronto entre um ato administrativo geral e um ato administrativo individual, prevalecerá a determinação contida no ato geral.

9.2. Quanto à Supremacia do Poder Público/Quanto ao Objeto (Critério das Prerrogativas)a) Atos de Império (ou de Autoridade): se caracterizam pelo poder de coerção decorrente do jus imperii, não

intervindo a vontade dos administrados para sua prática, pois são atos unilaterais que decorrem da supremacia do interesse público sobre o particular. São exemplos: atos de polícia (como a apreensão de bens e o embargo de obra, desapropriação, interdição de atividades etc) e outros atos, como a edição de decretos de regulamentação etc. Referidos atos podem ser gerais ou individuais, internos ou externos.

b) Atos de Gestão: quando o Estado atua no mesmo plano jurídico dos particulares, no mesmo pé de igualdade, assumindo uma posição de gestor de bens e interesses públicos, realizando atos DE administração, porém não atos administrativos. Os atos de gestão reclamam, na maioria das vezes, soluções negociadas, não dispondo o Estado da garantia da unilateralidade que caracteriza sua atuação e sem usar de sua supremacia ou prerrogativas sobre os administrados. Ex: aquisição ou alienação de bens, venda, contrato de locação, aquisição de imóvel, despachos que determinam a execução de serviços públicos, atos de movimentação de funcionários etc. Referidos atos dizem respeito à própria organização da Administração, funcionamento e gestão de seus interesses, serviços e bens. Não havendo uma diferenciação entre a Administração e o particular, aplica-se a ambos o direito comum. Modernamente, utiliza-se a expressão “atos de direito privado”. Apesar de obedecer a eventuais procedimentos administrativos prévios à prática do ato, tais como licitação, avaliação prévia, autorização legislativa etc, a Administração obedecerá aos ditames do direito privado.

c) Atos de Expediente: são atos de rotina interna destinados a dar andamento aos documentos e processos, tais como o recebimento e expedição de papéis, despachos rotineiros, autuação e protocolo (todos sem decisão do mérito administrativo).

9.3. Quanto ao Regramento (Critério da Liberdade de Ação conferida ao administrador)a) Atos vinculados: são os atos regrados pela lei, trazendo todos os elementos (competência, finalidade, forma,

motivo e objeto) já predeterminados. Há um único comportamento possível frente o caso concreto, sem que se possa fazer qualquer valoração de oportunidade e conveniência (mérito administrativo). É obrigação da Administração motivar estes atos, demonstrando a correspondência entre eles e a lei.

b) Atos discricionários: com relação aos elementos motivo e objeto a lei oferece na prática do ato uma certa margem de opções ao administrador, que irá fazer a sua escolha após análise da oportunidade e conveniência (mérito administrativo). Por esta razão diz-se que os atos discricionários consubstanciam-se pela valoração dos motivos e escolha do objeto. Também são regrados pela lei. Nestes casos, a lei não prevê apenas um único comportamento a ser adotado frente o caso concreto. A discricionariedade existe quando a lei expressamente a confere à Administração (ex: remoção de ofício do servidor), quando a mesma é omissa ou quando a lei prevê determinada competência, mas não estabelece a conduta a ser anotada pelo administrador (ex: poder de polícia).

9.4. Quanto à Formação dos Atos (Critério da Intervenção da Vontade Administrativa)a)Ato simples: decorre da declaração (manifestação) de vontade de um único órgão. O ato está perfeito, assim,

com esta só manifestação ou declaração de vontade, não dependendo de outras manifestações concomitantes ou posteriores para, em princípio, produzir seus efeitos jurídicos. Ex: expedição de licença para dirigir, nomeação de um servidor público pelo governador, exoneração de um servidor comissionado, decisão administrativa proferida pelo Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, despacho de um chefe de seção etc. Nestes casos, somente uma declaração unitária de vontade concorre para a edição do ato, não importando sua natureza, ou seja, se é de um órgão unipessoal (singular) ou colegiado. Desta forma, não interessa o número de agentes a produzir o ato, mas sim a

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expressão de vontade, que deverá ser unitária. Assim, estamos falando de um único órgão e de uma única declaração de vontade.

b)Ato complexo: resulta da manifestação de vontade de dois ou mais órgãos independentes (sejam eles singulares ou colegiados), cujas manifestações homogêneas se fundem, visando formar um único ato. Nenhum dos dois órgãos, isoladamente, é auto-suficiente para produzir o ato complexo, uma vez que o mesmo só se aperfeiçoa e se encontra em condições de gerar direitos e obrigações após a integração da vontade final do Poder Público. Por esta razão, somente se é possível impugnar judicialmente o ato quando todas as manifestações tenham sido expressas, sem as quais o ato não estará, ainda, perfeito. Assim, a vontade final da Administração impõe a intervenção de órgãos ou agentes diversos, havendo certa autonomia em cada uma das manifestações.

Ex: concessão de regimes especiais de tributação que dependem de parecer favorável de diferentes ministérios, como o Ministério da Indústria e Comércio e o Ministério da Fazenda, no caso da isenção relativa a algumas aquisições de bens de informática. A redução de alíquotas de IPI para alguns refrigerantes depende de aprovação integrada do Ministério da Agricultura e da Secretaria da Receita Federal, sendo que as manifestações não são simultâneas e sequer apreciam os mesmos elementos. Também alguns regimes especiais relativos a documentos fiscais somente se aperfeiçoam com a edição de um ato concessivo da Fazenda Estadual e outro da Receita Federal. Também são exemplos os atos normativos editados conjuntamente por órgãos diferentes da Administração Federal, como são comuns as Portarias Conjuntas SRF/PGNF, as Instruções Normativas Conjuntas SRF/STN; nomeação de Ministro do STF, que se dará mediante indicação e nomeação do Presidente da República e sabatina e aprovação do Senado (art. 101, § único, CF) e a nomeação do procurador-geral da justiça pelo governador. Nesses casos, fundem-se as vontades distintas em um só ato administrativo. A prolação do ato exige mais de uma declaração de vontade unitária. Assim, estamos falando de dois ou mais órgãos, de duas ou mais manifestações autônomas e que se fundem, formando UM ato único (uma vontade final).

A professora Maria Sylvia consigna que as vontades podem resultar de vários órgãos de uma mesma entidade ou de entidades públicas distintas.

Não se deve confundir o “ato complexo” com o “procedimento administrativo”. O procedimento é caracterizado por uma seqüência encadeada de atos, pela Administração, visando um objetivo final ou a prática de um ato final, o qual encerra o procedimento administrativo. Trata-se de uma atividade contínua, e não instantânea. Observe-se que estes atos intermediários, isoladamente, podem ser objeto de impugnação administrativa ou judicial. O mesmo não acontece com relação aos atos complexos. Exemplo: o procedimento administrativo de uma licitação é formado por diversos atos intermediários. O licitante irresignado com o edital, com o julgamento das propostas ou com a homologação do resultado poderá ingressar, em cada situação, com os recursos cabíveis, se assim o desejar. Enquanto que o ato complexo se caracteriza pela existência de um único ato, integrado por manifestações homogêneas de vontade de órgãos diversos, o procedimento é composto por uma série deles. É exemplo de ato complexo, para a Fundação Carlos Chagas, o decreto assinado pelo presidente da república e referendado pelo Ministro.

c)Atos compostos: não se compõem de vontades autônomas, apesar de serem múltiplas. Resultam da manifestação da vontade de dois ou mais órgãos (alguns autores preferem defender a tese de que os atos compostos resultam da vontade de um órgão apenas), sendo a vontade de um deles apenas instrumental em relação à vontade do outro, que editará o ato principal. Desta forma, haverá a prática de dois atos: um principal e outro (s) acessório (s). Este último poderá se pressuposto ou complementar daquele. Há, na verdade, uma só vontade autônoma, pois as demais serão apenas instrumentais. Ex: autorização que dependa do visto de uma autoridade superior e a dispensa de licitação devidamente homologada pelo agente superior competente. Assim, atos que dependam de aprovação, parecer, ratificação, laudo, visto ou homologação são classificados como compostos. Estes atos demandam uma vontade unitária, mas dependem de verificação, ratificação ou ciência de outro órgão ou agente para operacionalizar-se. Assim, há dois ou mais órgãos que exteriorizam as suas vontades, sendo uma delas autônoma (principal) e as demais apenas instrumentais (secundárias), formando uma só vontade autônoma. Atenção! A professora Maria Sylvia Zanela Di Pietro classifica o ato de nomeação do Procurador Geral da República, mediante aprovação prévia pelo Senado, como típico ato composto e não complexo. O mesmo raciocínio vale para o ato de nomeação dos Ministros do Supremo Federal.

Não se deve confundir “ato composto” com “procedimento administrativo”, uma vez que o primeiro é representado pela existência de um ato principal e outro acessório, ao passo que o último (procedimento) caracteriza-se por uma sucessão ordenada de operações que propiciam uma formação de um ato final objetivado pelo Poder Público. O procedimento administrativo constitui-se de atos intermediários, preparatórios e autônomos, mas sempre interligados e que se conjugam para dar conteúdo e formar o ato principal.

9.5. Quanto ao Conteúdo (Critério dos Efeitos)a) Atos constitutivos: alteram uma relação jurídica, criando, modificando ou extinguindo direitos ou uma

situação do administrado. Ex: autorização (o direito nasce com a expedição do ato autorizativo), sanção disciplinar, ato de revogação, a demissão de um servidor público, permissão, dispensa etc.Obs: alguns autores consideram que o ato que põe termo a situações jurídicas individuais é tido como ato extintivo, tal como o que cassa determinada autorização, o que determina a encampação de serviço de utilidade pública, o ato que demite um servidor, o ato de nomeação de um servidor, etc.

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b) Atos declaratórios: atos que simplesmente declaram uma situação preexistente. Nestes atos, a Administração não cria, extingue ou modifica direitos, mas simplesmente os reconhece por já existirem antes mesmo da edição do ato. Estes atos visam preservar o direito do administrado. São exemplos: ato que constata que certa obra provoca riscos à integridade física dos transeuntes, isenção, licença (é ato declaratório, pois a Administração apenas declara um direito preexistente), homologação, anulação, admissão etc.

c) Atos enunciativos: indicam juízos de valor que dependerão de outro ato administrativo constitutivo, afinal, este último é que produz efeitos jurídicos. Ex: atestados, declarações, pareceres, vistos, informações, certidões etc. Alguns autores não os consideram como típicos atos administrativos, uma vez que não produzem efeitos jurídicos imediatos. Observe-se, assim, que os atos de conhecimento, de opinião, de juízo ou de valor são atos que não contém manifestação de vontade, não produzindo efeitos jurídicos.

d) Atos modificativos: visam alterar situações preexistentes, contudo, sem suprimir direitos ou obrigações. São exemplos: a alteração do horário de funcionamento e a mudança de local da realização de um evento. Na verdade, estes atos enquadram-se dentro da classificação apresentada na alínea “a” deste tópico, embora sejam apresentados, em separado, por outros autores.

e) Atos abdicativos: Em regra, tais atos são incondicionais e irretratáveis e ocorrem quando o seu titular abre mão de um direito. Ex: renúncia.

Encontramos entre os doutrinadores outra forma de classificação dos atos quanto ao conteúdo:

a) Atos constitutivos: são aqueles que criam situações jurídicas;b) Atos desconstitutivos: são os atos que dão fim a uma situação jurídica preexistente, tais como a cessação

de uma autorização;c) Atos declaratórios: atos que simplesmente declaram direitos e situações pretéritas, tais como as

certidões;d) Atos alienativos: são os atos que visam transferir bens ou direitos de um titular para outro.e) Atos modificativos: têm a finalidade de alterar situações sem extinguir direitos ou obrigações, tais como

a alteração do horário de funcionamento ou de um determinado percurso.f) Atos abdicativos: aqueles em que a Administração Pública abdica, de maneira irretratável, de um direito.

9.6. Quanto à Executoriedade dos Atos ou modo de execução dos atos (Critério da Executoriedade)

a) Atos auto-executórios: tais atos constituem a regra geral. Têm o atributo de serem postos em imediata execução pela própria Administração e que não dependem de qualquer autorização prévia de qualquer Poder, principalmente do Judiciário, ou da concordância de terceiros. Ex: atos de organização administrativa, como as instruções, portarias, circulares etc.

b) Atos não auto-executórios (não-executórios): nestes casos, o Poder público somente pode executar os atos por via indireta, pois é necessário se socorrer ao Poder Judiciário. Ex: a multa, depois de aplicada pela Administração, somente poderá ser cobrada pela via judicial. Em regra, a aplicação em si da multa é ato classificado como auto executório. Os efeitos pecuniários que do ato resultam é que não podem ser consumados diretamente pela Administração. Da mesma forma, é ato não-executório a execução da dívida fiscal.

9.7. Quanto ao Alcancea) Atos internos: conforme leciona Hely Lopes Meirelles, são os atos “destinados a produzir efeitos no recesso

das repartições administrativas, e por isso mesmo incidem, normalmente, sobre os órgãos e agentes da Administração que os expediram. São atos de operatividade caseira que, não produzem efeitos em relação a estranhos. É o caso das portarias e instruções ministeriais, que só deviam dispor para seus servidores, mas contêm imposições aos cidadãos, próprias de atos externos. Atos internos podem ser gerais ou especiais, normativos, ordinatórios, punitivos e de outras espécies, conforme as exigências do serviço público. Não dependem de publicação no órgão oficial para sua vigência, bastando a cientificação direta aos destinatários ou a divulgação regulamentar da repartição”. Portanto, seus efeitos são gerados no âmbito interno da própria Administração Pública. A publicidade que se dá ao caso é interna, independente de publicações nos diários oficiais, uma vez que referidos atos não geram direitos para os administrados e não geram direitos adquiridos a seus destinatários, podendo ser revogados a qualquer tempo pela Administração. A prática administrativa e a ausência de uma legislação codificada têm levado a Administração a se utilizar de institutos como o da portaria (que são tipicamente internos) para realizar atos de alcance externo, necessitando, desta forma, de publicação. São exemplos: portaria de remoção de um agente público; ordens de serviço e portaria de criação de um grupo de trabalho, além de circulares e memorandos.

b)Atos externos: o mesmo autor ressalta que “são todos aqueles que alcançam os administrados, os contratantes e, em certos casos, os próprios servidores, provendo sobre seus direitos, obrigações, negócios ou conduta perante a Administração”. Referidos atos necessitam de publicação externa para que se operem seus efeitos. Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo afirmam que “são também considerados atos externos os que, embora não destinados aos administrados, devam produzir efeitos fora da repartição que os editou ou onerem o patrimônio público, casos em que é imprescindível a observância do princípio da publicidade”.

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9.8. Quanto ao objetivo visado pela Administraçãoa) Ato principal: é o ato que manifesta a vontade final do Poder Público.b) Ato complementar: é o ato que aprova ou ratifica o ato principal.c) Ato intermediário: é o ato que concorre para a formação do ato principal.d) Ato condição: é o ato prévio que necessariamente deverá ser praticado para que o ato posterior tenha

validade. Ex: o concurso público é ato-condição para a nomeação.e) Ato de jurisdição: é o ato que contém decisão sobre matéria controvertida.

10. ESPÉCIES DE ATOS ADMINISTRATIVOS

Apesar das grandes divergências doutrinárias, apresentamos, abaixo, as principais espécies de atos administrativos:

10.1 Atos Normativos Têm comando geral do Executivo e visam explicitar as leis e dar condições para que sejam fielmente

executadas. São atos impessoais, genéricos e abstratos, da mesma forma que as leis oriundas do Poder Legislativo. Contudo, não podem inovar, ou seja, criar um direto novo, uma vez que tal prerrogativa é conferida constitucionalmente ao Poder Legislativo. Os atos normativos têm seu fundamento no art. 84, IV e VI da CF/88. São exemplos: regulamentos, regimentos, decretos, resoluções, deliberações, instruções normativas e as portarias com conteúdo geral e abstrato. Conforme assevera Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo, “a função dos atos normativos não é, entretanto, simplesmente repetir o que se encontra enunciado na lei. Sendo destinados a possibilitar a fiel execução de lei pela Administração, os atos normativos devem esmiuçar, explicitar o conteúdo das leis que regulamentam”. Os atos normativos possuem superioridade hierárquica em relação aos atos individuais, haja vista que os individuais são editados em conformidade com os primeiros (os normativos). Os atos normativos podem ser revogados pela autoridade competente, uma vez que são editados pela Administração com base em seu poder discricionário. Por fim, ressaltamos que, em tese, tais atos não podem ser impugnados diretamente pelo administrado lesado na via judicial ou administrativa. O mesmo poderá, contudo, impugnar uma específica conseqüência do ato com relação à sua situação jurídica. Duguit denomina tais atos de “atos-regra”.

10.2 Atos OrdinatóriosConcretizam-se por meio da emissão de ordens, disciplinando o funcionamento da Administração e a conduta

interna (funcional) de seus agentes, atingindo, portanto, como destinatários, os agentes públicos subordinados à chefia que os expediu, visando o adequado desempenho de suas funções. Desta forma, são atos administrativos internos, não atingindo os administrados e os demais agentes subordinados a outras chefias, não criando direitos ou obrigações para eles. Tendo por fulcro o poder hierárquico, podem ser expedidos por quaisquer chefes de serviço que possuam competência para editá-los. Entre estes atos e os normativos, os últimos são tidos como hierarquicamente superiores. Ex: circulares, avisos, instruções, portarias internas, ordens de serviço, ofícios, provimentos e despachos. Conforme leciona Hely Lopes, “não criam, normalmente, direitos ou obrigações para os administrados, mas geram deveres e prerrogativas para os agentes administrativos a que se dirigem ... esses atos se prestam também à investidura de servidores subalternos em suas funções e à transmissão de determinações superiores gerais ou especiais, concernentes ao serviço e a seus executores”.

10.3 Atos EnunciativosSão atos que não ensejam qualquer manifestação de vontade da Administração, mas tão-somente a certificação,

o atestado ou a emissão de opinião acerca de um fato. São exemplos os atestados, os pareceres normativos ou técnicos, as certidões, as apostilas, as declarações etc.

10.4 Atos PunitivosEnsejam uma penalidade. Ex: interdição de um estabelecimento, aplicação de multa, apreensão de

mercadorias e destruição de coisas.

10.5 Atos NegociaisNestes atos, a pretensão do particular coincide com a vontade da Administração. Por essa razão tais atos são

denominados de negociais. Apesar de parecer um negócio jurídico, não o é, haja vista que não há que se falar em bilateralidade e discussão das cláusulas contratuais pelas partes pactuantes (típicos de um negócio jurídico), mas uma imposição da Administração quanto às regras pré-estipuladas por ela. Mas, não há nestes atos o cunho coercitivo da Administração (imperatividade), uma vez que o particular é quem a procura, voluntariamente, para obter a licença, a permissão ou a autorização. Apesar de alguns atos necessitarem da assinatura de um instrumento contratual, tais atos negociais não são tidos como atos contratuais, mas, sim, como atos administrativos.

São exemplos: autorização, licença, permissão, aprovação, admissão, visto, homologação, dispensa, renúncia e protocolo administrativo.

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10.5.1. Licença

Licença é ato:► administrativo► negocial (espécie)► unilateral ► através dela a Administração exerce o seu poder de polícia fiscalizatório.► a outorga da licença requer um pedido prévio do interessado. Nunca será concedida ex officio.► vinculado, pois, atendidas pelo interessado as exigências da lei, o poder público terá o dever de conceder a licença. Se a concessão de licença for negada, caberá a impetração de mandado de segurança, conforme dispõe o artigo 5º, LXIX da CF/88.► há um direito subjetivo do interessado à obtenção da licença, vez que se trata de um ato vinculado da Administração.► a Administração Pública faculta àquele que preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade material ou a realização de fatos materiais antes vedados ao particular. Não é toda e qualquer atividade que requer um ato de licença da Administração. Mas, aquela que exige o ato, o interessado somente a exercerá de forma legítima se a obtiver.► em regra, é um ato definitivo (presunção de definitividade), haja vista que, uma vez tendo o particular cumprido com todas as exigências legais, não caberá à Administração manifestar-se quanto à oportunidade e conveniência do ato visando revogá-lo. Porém, quando a própria lei que garante o direito à licença determinar o prazo de eficácia da mesma, o ato deixará de ser definitivo, passando a ser temporário. Se a lei não o faz, a licença será definitiva, como todo ato vinculado.► Ex: licenças para dirigir, para o exercício de certa profissão regulamentada em lei, licença de localização de estabelecimento (alvará de funcionamento) e para a construção de uma residência em terreno próprio (alvará de construção).► Em regra, e em respeito ao direito adquirido e ao caráter de ato vinculado, a licença não poderá ser revogada. Exceção ocorre quanto à licença para construção, que poderá ser revogada enquanto não iniciada a obra licenciada, cabendo indenização ao particular pelos prejuízos causados pela Administração. O próprio Supremo Tribunal Federal reafirmou anterior decisão no sentido de que não há ofensa a direito adquirido decisão que, no curso do processo de pedido de licença de construção, em projeto de licenciamento, estabelece novas regras de ocupação de solo, ressalvando-se ao prejudicado o direito à indenização nos casos em que haja ocorrido prejuízos (RE nº 212.780-RJ, Rel. Min. Ilmar Galvão, de 1999).

► Licença é diferente de autorização, pois:Licença AutorizaçãoPor existir um direito do particular à sua obtenção, dizemos que a licença envolve direitos.

Envolve interesses, pois inexiste um direito do particular à prática do ato requerido.

Ato vinculado. Ato discricionário. O ato pode ou não ser praticado pelo Poder Público, a depender de seu juízo de oportunidade e conveniência.

Compete à Administração verificar, tão-somente, diante do caso concreto, se foram devidamente preenchidos os requisitos exigidos pela Lei, para que se outorgue a licença. Em caso positivo, deverá ser expedida a licença, sem possibilidade de recusa por parte do Poder Público.

Mesmo preenchidos todos os requisitos legais, a Administração poderá negar a autorização pleiteada.

É ato declaratório, pois a Administração declara um direito preexistente.

É ato constitutivo, vez que o direito nasce com a expedição do ato administrativo de autorização.

Há um direito subjetivo prévio à concessão da licença. Não há que se falar em direito subjetivo prévio, uma vez que o direito somente surge após a concessão da autorização.

É ato definitivo. Gera direito adquirido. É ato precário, pos a Administração pode revogá-lo a qualquer tempo, inexistindo, em regra, direito à indenização. Assim, tal ato não gera direito adquirido.

Interesse predominante da Administração. Interesse predominante do particular, embora sempre haja um interesse público relacionado.

► Alguns estudiosos do direito (doutrinadores) preferem usar o vocábulo “atos de consentimento estatal”, ao invés de ato “negocial”.

10.5.2. Permissão

Permissão é ato:

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► administrativo apenas quanto à permissão de utilização privativa de bem público. Veja-se que, segundo a doutrina tradicional, a permissão em sentido amplo é tida como ato administrativo. ► negocial (espécie)► unilateral quanto à permissão de utilização privativa de bem público. ► gratuito ou oneroso► dá-se mediante delegação do Poder Público► discricionário ► precário (veja-se que o artigo 2º, IV da Lei 8.987/95 atribui expressamente à permissão de serviço público a característica da precariedade). ► José dos Santos carvalho Filho nos afirma que “como regra, a permissão é ato discricionário e precário, no sentido de que o administrador pode sopesar critérios administrativos para expedi-la, de um lado, e de outro não será conferido ao permissionário o direito à continuidade do que foi permitido, de modo que poderá o consentimento ser posteriormente revogado sem indenização ao prejudicado. Convém observar todavia que este é o sentido clássico do ato de permissão, mas atualmente existem inúmeras restrições e modificações do instituto no sistema normativo vigente.” ► Ainda dentro do sentido clássico de permissão, verificamos que o particular se utilizava desse instituto quando não necessitasse alocar grandes quantias financeiras para a prestação do serviço. Desta forma, caso a Administração desejasse extinguir unilateralmente a permissão, poderia fazê-lo sem causar grandes prejuízos ao permissionário e sem ter de indenizá-lo por isto. Restava, aí, uma das grandes diferenças entre a permissão e a concessão. Contudo, como visto acima, a doutrina clássica sofreu inúmeras modificações e hoje o conceito de permissão torna-se bastante confuso ao estudante de concursos públicos. Como entender que a permissão era (e ainda é) precária se a própria Administração impõe prazos para ela? Depois, veio a CF/88 e, em seu artigo 175 determinou que as permissões deveriam ser precedidas de licitação. Se há licitação, há regras pré-estipuladas e, dentre elas, prazos para a prestação dos serviços. É a chamada permissão condicionada ou qualificada. Por esta razão, autores de peso como Celso Antonio Bandeira de Melo e Maria Sylvia Zanela Di Pietro entendem que se estivermos diante de uma permissão com prazo estipulado pela Administração, a mesma deverá ser entendida como concessão. Em seguida, entrou em cena a Lei 8.987/93 que trouxe em seu texto a obrigatoriedade de se firmar contrato de adesão! Ou seja, estamos diante de um instituto que, classicamente era considerado como ato administrativo e que passou a ter como características a existência de contrato (que nos remete ao acordo de vontades, característica esta não condizente com o conceito de atos administrativos típicos) e de licitação (característica não condizente com a precariedade do ato)! Assim, como entender uma Lei que prevê um contrato precário e revogável unilateralmente pela Administração? Mas como toda permissão deve ter estipulado o seu prazo, por não existir em nosso ordenamento jurídico a permissão eterna, significa dizer que a permissão condicionada deve ser entendida, a meu ver, como uma concessão. Em sentido amplo, a permissão é ato onde:

a) o Poder Público permite ao particular a utilização, em caráter privativo, de um bem público, através do ato denominado “permissão de uso de bem público”, atendendo-se ao mesmo tempo aos interesses público e privado. Observe-se que, na autorização de uso de bem público, o interesse predominante é o do particular, apesar de haver o interesse público em jogo. Na permissão de uso, há um nivelamento entre o interesse privado e o da Administração, onde o primeiro deseja auferir lucros com a utilização privativa do bem, ao passo que o segundo possui algum interesse público na exploração do mesmo. Citamos como exemplos as permissões concedidas para exploração, por particulares, de vestiários públicos, de banheiros públicos e de restaurantes turísticos em prédios pertencentes à Administração Pública. Permissões para instalação de bancas de jornal ou uso de calçadas à frente de bares, lanchonetes e pit-dogs também são citadas por diversos doutrinadores como exemplos típicos de permissões de uso, embora entendamos que estes últimos exemplos devam localizar-se melhor dentro das situações de autorização de uso de bem público, por haver um interesse predominante do particular nestes últimos casos mencionados. Em que pese ser polêmica a discussão quanto à diferença entre autorização de uso e permissão de uso de bem público, o fato é que ambos caracterizam-se por serem atos administrativos, unilaterais e, em regra, discricionários e precários. Já a concessão de uso de bem público formaliza-se através de instrumento contratual administrativo, sendo, portanto, fruto de uma relação bilateral. Da mesma forma que as autorizações e as permissões, as concessões caracterizam-se, também, pela discricionariedade da Administração, que analisará os critérios da oportunidade e da conveniência na concessão do uso do bem público.Sendo um ato intuitu personae, a transferência da permissão de uso de bem público a terceiros dependerá de consentimento expresso do permitente. Se possível, e havendo mais de um interessado no bem público, a Administração deverá realizar licitação, a fim de evitar favorecimento de alguém e desrespeito ao princípio da impessoalidade.

b) o Poder Público permite que o particular, pessoa física ou jurídica (conforme determina a Lei 8.987/95), execute serviço de utilidade pública através do ato denominado “permissão de serviço público”, desde que demonstre capacidade para seu desempenho e o execute por sua conta e risco.► embora esteja em jogo o atendimento pela Administração de uma solicitação privada, o interesse predominante deverá ser o da coletividade. ► Vejamos outro entendimento acerca das permissões para a prestação de serviços públicos: conforme dispõe a Lei 8.987/95, em seu artigo 40, a “permissão” está restringida ao uso de bens públicos, porquanto a permissão de serviços públicos passou a ter natureza jurídica de contrato administrativo bilateral, de adesão, e resultante de atividade vinculada da administração, tendo em vista a exigência legal de licitação para a escolha do contratado (esta afirmativa, considerada

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verdadeira pela banca examinadora da ESAF, fora retirada da prova para a Aneel / Analista Administrativo / realizada em 16-04-2006).► Ocorre que a Lei 8.987/95 e a CF/88 (art. 175) determinam que a permissão de serviços públicos deverá ser precedida de licitação. Havendo licitação, a precariedade do ato de permissão ficará mitigada, vez que o permitente não poderá, a seu exclusivo juízo, dar fim ao ato, salvo quando houver interesse público justificado. ► A permissão, embora seja, em regra, discricionária, poderá ser condicionada (contratual) a partir do momento em que a própria Administração estabelece autolimitações quanto a prazo, razões de revogação, garantias aos permissionários etc, ficando a Administração adstrita às próprias limitações por ela criadas. Assim, o Poder Público poderá revogar livremente uma permissão de uso de bem público se não tiver estipulado qualquer condição, mas se estipular um prazo mínimo de permissão por dois anos, não poderá extinguir o ato antecipadamente, sob pena de ter de indenizar o particular pelos prejuízos causados.► Observe-se que a clássica permissão de serviço público como ato administrativo não mais subsiste em nosso sistema. Antigamente, adotavam-se duas modalidades de prestação de serviços públicos: concessão de serviços públicos, com a natureza jurídica de contrato administrativo e a permissão de serviços públicos, com a natureza de ato administrativo. Contudo, com o advento da Lei 8.987/95, a permissão de serviços públicos fora recepcionada com a natureza jurídica contratual, considerando-a contrato de adesão. Desta forma, a antiga postura legal de que a permissão de serviços públicos dava-se através de ato administrativo foi superada, dando lugar à tese atual retromencionada. ► O certo é que a legislação atual não nos permite diferençar a concessão da permissão de serviços públicos. Até mesmo o STF, no julgamento da ADIN nº. 1.491-DF decidiu, em apertada maioria, que não mais subsiste diferença conceitual entre elas.► Também podemos observar a confusão doutrinária a respeito destes dois institutos – concessão e permissão: a Lei 9.472/97, que dispõe do sistema de telecomunicações, trata a permissão como ato administrativo discricionário e precário (art.118), contrariando, pois, a configuração prevista na Lei nº. 8.987/95.► Os atos de permissão de uso de bens públicos não são disciplinados nem pelo artigo 175 da CF e nem pela Lei nº. 8.987/95.► Assim, temos:► Segundo Marcelo Alexandrino, “A permissão deferida sob condições, especialmente condições onerosas para o permissionário, como a obrigação de realizar determinadas obras ou investimentos de interesse predominante da comunidade, embora não chegue a ter desnaturado seu caráter de precariedade, limita a liberdade da Administração no tocante à sua revogação”.

► Diógenes Gasparini cita, como exemplos, os atos que transferem ao particular a execução dos serviços de transporte coletivo, de produção e distribuição de energia elétrica ou os que trespassam o uso privativo de um bem público imóvel (prédio, terreno) ou móvel (cadeira de rodas) a um particular interessado. Referido autor nos informa que é ato “vinculado se, em relação ao pedido do particular, a Administração Pública não tem liberdade para decidir... e é ato “...discricionário se sobre o pedido a Administração ... tem liberdade para decidir”.

► É muito interessante a explicação da professora Maria Sylvia quanto à inclusão das permissões de serviços públicos nas espécies de atos negociais: para ela, “tradicionalmente, a permissão, como ato unilateral, podia ter por objeto a utilização privativa de bem público por particular ou a exploração de serviço público. Contudo, o artigo 175, parágrafo único, inciso I, da Constituição Federal, permitiu a interpretação de que tanto a concessão como a permissão de serviços públicos são contratos; e a Lei nº. 8.987/95 (que regula as concessões e permissões de serviços públicos) faz referência à permissão como contrato de adesão, com o traço da precariedade. Por essa razão, a permissão de serviço público não é mais incluída no conceito de permissão adotado neste item, que trata apenas dos atos unilaterais da Administração”.

►Segundo Celso Antonio Bandeira de Melo, “a permissão é ato, e não contrato, unilateral e precário, intuito persoane, através do qual o Poder Público transfere a alguém o desempenho de serviço de sua alçada, proporcionando, à moda do que faz na concessão, a possibilidade de cobrança de tarifas dos usuários”.

► Quanto à permissão para uso de bem público, não há divergências doutrinárias: trata-se de ato administrativo.

► A práxis (prática) administrativa, tem demonstrado que a Administração utilizou-se do instituto da permissão em diversos setores que, a rigor, deveriam ser contratados mediante concessão de serviços públicos.

10.5.3. Autorização

Autorização é ato:►administrativo►negocial (espécie)►unilateral►que caracteriza o exercício do poder de polícia estatal sobre a atividade privada.►discricionário, onde a Administração aprecia a pretensão do particular em face do interesse público.►precário (é o mais precário, dentre os atos administrativos, vez que há um maior predomínio do interesse privado ou, até mesmo, um interesse exclusivo do particular).

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►dá-se a autorização pelo fato de a atividade ser perigosa à sociedade►onde o Poder Público a) faculta (outorga) ao indivíduo o uso de bem público ou particular no seu exclusivo ou predominante interesse, apesar de haver um certo interesse público em jogo, através de autorização de uso (como nos casos de fechamento de uma rua para a realização de um evento desportivo), ou b) para que o particular exerça uma atividade material, como nos casos de autorização para prestar serviços de motorista de táxi ou de van, ou c) para a prática de ato/atividade que, sem o consentimento estatal, seria proibido ao particular, como nos casos de autorização para porte de arma de fogo (observe que a Lei de Contravenções Penais utiliza incorretamente o termo “licença”) e d) para que o Poder Público delegue ao particular a exploração de determinados serviços públicos, a título precário, discricionariamente, de competência da União e devidamente elencados no artigo 21, XI e XII da CF/88. Os serviços descritos neste artigo poderão ou não ser delegados ao particular, via autorização (podendo ser, também, através de concessão ou permissão), tendo em vista o poder discricionário conferido à União. ►Exemplos:1) Autorização da União quanto à produção e o comércio de material bélico (art. 21 da CF/88).2) Autorização para porte de arma de fogo (Lei nº. 10.826, de 22/12/2003)3) Autorização (ou concessão) para pesquisa e lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais de energia

hidráulica (art. 176 da CF/88).4) Autorização da União para exploração, mediante autorização, concessão ou permissão, dos serviços de

telecomunicações, de radiodifusão sonora e de sons e imagens, os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, a navegação aérea, aeroespacial e a infra-estrutura aeroportuária, os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros e os portos marítimos, fluviais e lacustres.

►Cuidado com a Lei 9472/97 !!! Ela trata do sistema de telecomunicações e, em seu artigo 131, §1º, qualifica a autorização de serviço de telecomunicações como ato vinculado.► A CF/88 dispõe em seu artigo 22, XXI que compete privativamente à União legislar sobre material bélico. A Lei nº. 10.826, de 22/12/2003, que trata do Estatuto do Desarmamento, atribuiu à Polícia Federal competência administrativa para expedir o ato de autorização competente para o porte de arma de fogo. Contudo, o artigo 4º, §1º, de referida Lei condicionou a outorga da autorização à expedição prévia de outro ato de autorização, de competência do SINARM (Sistema Nacional de Armas – órgão integrante do Ministério da Justiça), para a compra e registro da arma. Observe-se que o Estatuto do Desarmamento, em seu artigo 22, admite a celebração de convênios entre a União e os Estados ou DF visando a expedição de autorização para a posse e o porte de arma de fogo. Apesar de o interessado ter de preencher os requisitos elencados no artigo 10, §1º do Estatuto para a autorização de porte, elementos estes vinculados para a Administração, o ato, para ela, será discricionário, podendo conceder ou não a autorização (após análise da oportunidade e conveniência). Isto significa que não há que se falar em direito subjetivo prévio à posse e ao porte de arma de fogo, salvo nos casos expressamente consignados na lei reguladora em seu artigo 6º. Desta forma, podemos dizer que o direito surge somente após a expedição do ato de autorização. ►As autorizações, uma vez que são concedidas a título precário, não rendem direito a indenização quando revogadas.► Conclusão: Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro, a autorização é conceituada como o “ato administrativo unilateral, discricionário e precário pelo qual a Administração faculta ao particular o uso de bem público (autorização de uso), ou a prestação de serviço público (autorização de serviço público), ou o desempenho de atividade material, ou a prática de ato que, sem esse consentimento, seriam legalmente proibidos (autorização como ato de polícia)”.

RESUMO DESTE ITEM PARA ESTUDO

Licenças Autorizações PermissõesÉ que espécie de ato ?

Negocial. Negocial. Negocial.

Qual classificação quanto ao conteúdo?

É ato Declaratório É ato Constitutivo É ato Constitutivo

Delegação ou Outorga?

Delegação. Delegação. Delegação.

Unilateral ou Bilateral?

Unilateral Unilateral. UPBP- unilateral.PSP(clássico)- unilateral (embora dependa de provocação e aceitação do permissionário).PSP (atual) – é tradicionalmente considerada como ato unilateral, segundo MSZP. É unilateral porque cabe ao Poder Público ditar as regras da permissão.

É ato administrativo ?

Sim. Sim. UPBP – ato administrativo.PSP (clássico)- ato administrativo.PSP (atual) – apesar do art. 40 da Lei

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8.987/95 dar a entender que a PSP trata-se de um contrato (contrato de adesão), a maioria da doutrina e da jurisprudência a considera como sendo um ato administrativo unilateral e não um contrato.

Caracteriza o exercício do Poder de Polícia ?

Sim. Sim. Sim.

Pode ser concedida ex officio?

Não. Requer-se pedido prévio do interessado.

Não. Requer-se pedido prévio do interessado.

Não. Requer-se pedido prévio do interessado.

Vinculado ou Discricionário?

Vinculado. Deve-se conceder se atendidas as exigências legais. Há um direito subjetivo prévio.

Discricionário. UPBP - Discricionário.PSP (clássico) – Discricionário.PSP (atual) – MSZP diz que é considerada, tradicionalmente, como ato discricionário.É discricionário porque a Administração avalia os motivos de oportunidade e conveniência (análise do mérito administrativo), podendo revogá-la a qualquer momento.

Serve para quê? Administração faculta o exercício de uma atividade material ou a realização de fatos materiais antes vedados.

a) uso de bem público ou particular no seu exclusivo ou predominante interesse; b) exercício de atividade que, sem ela, seria proibida; c) exploração/prestação de serviços públicos.

UPBP – utilização privativa de bem público atendendo-se ao mesmo tempo o interesse publico e privado. PSP – prestação de serviços públicos.

Definitivo ou Precário

Em regra, definitivo, salvo se houver prazo.

Precário (é o mais precário dos atos negociais). Não prevê termo final, em regra.

UPBP – precário.PSP (clássico) – precário e sem prazo certo.PSP (atual) – precário

Cabe indenização? Sim, pois são atos definitivos e vinculados.

Não, pois são atos precários e discricionários.

UPBP – não.PSP (clássico) –não, pois os gastos do particular eram de pequena monta.PSP (atual) – a princípio, por ser precário e discricionário não cabe indenização. Mas há regras contratuais que devem ser respeitadas, cabendo indenização se descumpridas, como por exemplo o desrespeito ao prazo estipulado.

Cabe revogação? Não, pois é ato vinculado. Deve-se respeito ao direito adquirido.

Sim, a qualquer tempo. UPBP – sim.PSP (clássico) – sim, pois as despesas do permissionário eram de pequena monta.PSP (atual) – Sim, mas lembramos que a Administração fica adstrita às regras contratuais.

Exemplos Dirigir, exercício de profissão, alvará de funcionamento, construção.

Fechamento de rua para competições; táxi; van; porte de arma;ver art. 21 da CF/88; ver art. 176 da CF/88; trânsito por determinados locais; uso de terrenos municipais para circos e rodeios etc. (*1)

Exploração de vestiários públicos; banheiros públicos e restaurantes turísticos em prédios pertencentes à Administração. Bancas de jornal ou uso de calçadas à frente de bares tb são citadas por diversos doutrinadores como casos de permissões, embora entendamos que estes últimos devam ser de autorização , por haver um interesse predominante do particular .Transporte coletivo e energia.

Exige-se licitação? Não. Não, mas se a Administração quiser, pode realizá-la em se

UPBP – não.PSP (clássico) – não.PSP (atual) – sim, conforme determina o

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tratando de autorização de serviços públicos.

art. 175 da CF/88.

10.3.5. AdmissãoÉ ato administrativo vinculado que garante ao particular, se preenchidos os requisitos legais, o direito de receber

o serviço público ofertado em determinados estabelecimentos oficiais, tais como nas universidades, escolas e hospitais públicos.

10.3.6. AprovaçãoAtravés da Aprovação, que é um ato discricionário, a Administração exerce o controle do ato administrativo,

autorizando a edição do mesmo ou o referendando. Citamos como exemplos: aprovação prévia do Senado para a escolha de Ministro do Tribunal de Contas, de Governador do Território e do Presidente do BACEN (Banco Central).

10.3.7. HomologaçãoAtravés da homologação, a Administração reconhece a legalidade do ato. Dá-se somente após a expedição dele.

É ato unilateral e vinculado. Há, neste caso, a análise exclusiva da legalidade do ato, enquanto que na aprovação observa-se a conveniência e a oportunidade do mesmo. Citamos, como exemplo, a homologação de procedimento licitatório, descrita no artigo 43, VI, da Lei de Licitações e Contratos (Lei 8.666/93)

10.3.9. VistoÉ ato unilateral onde o administrador atesta a legitimidade formal de outro ato administrativo, tal como o visto

da chefia imediata quanto ao requerimento de férias do servidor subalterno. Através do visto, não se está atestando a concordância com o conteúdo do requerimento. Pelo visto, o agente superior demonstra que conhece o pedido e que o controla formalmente. Sendo um ato de conhecimento apenas, não havendo uma manifestação de vontade, é classificado como “mero ato administrativo” e não “ato administrativo propriamente dito” ou “típico”.

10.3.10. Renúncia

Para Hely Lopes, renúncia é o ato pelo qual o Poder Público extingue unilateralmente um crédito ou um direito próprio, liberando definitivamente a pessoa obrigada perante a Administração”. Não admite condição e é irreversível, quando consumada. Depende de lei autorizadora.

11 DEMAIS ESPÉCIES QUANTO À FORMA DE EXTERIORIZAÇÃO

ATOS NORMATIVOS11.1. Decretos

Provêm com exclusividade dos Chefes do Executivo. Dependendo do conteúdo, classificam-se em decretos gerais ou normativos (que têm caráter normativo e traçam regras gerais, tais como o decretos regulamentares ou de execução, que regulamentam as leis) ou individuais (que possuem destinatários individualizados, específicos, tais como os decretos que nomeiam ou exoneram servidores). Em regra, o Decreto é normativo e geral, embora possa ser utilizado, também, como ato individual ou específico.

Sendo ato administrativo, o Decreto se encontra hierarquicamente inferior à Lei (do Legislativo). Apesar de alguns autores, dentre eles o Hely Lopes Meirelles, defenderem a existência e a validade dos

chamados decretos gerais autônomos ou independentes, desde que referidos decretos não tratem de matérias que somente por lei podem ser tratadas, o nosso ordenamento pátrio não os previu.

O decreto geral, sendo ato do Chefe do Executivo, que visa regulamentar a lei, dá-se através da expedição de norma administrativa (ato administrativo). Trata-se, portanto, de atividade de caráter administrativo. José dos Santos Carvalho Filho ressalta que “deve-se registrar, a bem da verdade, que o caráter administrativo decorre do exame do ato sob o aspecto orgânico (o órgão de que emana) e formal (processo de criação idêntico aos dos demais atos administrativos). Não obstante, sob o aspecto material ou substancial, podem os decretos ser considerados como tendo caráter legislativo ou normativo, eis que projetam normas gerais, abstratas e impessoais”. Deve-se observar que alguns autores consideram os regulamentos como espécie de ato administrativo. Apesar da CF/88, em seu art. 84, IV, dispor que compete ao Presidente da República expedir decretos e regulamentos, estes últimos não constituem atos autônomos, pelo contrário, mostram-se sempre como apêndices de outros atos administrativos (em regra, dos decretos). Por esta razão, Hely Lopes Meirelles os qualifica como “atos administrativos postos em vigência por decreto”. Apesar disso, projetam-se dotados de forma própria, pois, se analisados sob o aspecto formal, os regulamentos são atos diversos dos decretos que os aprovam e acompanham. Portanto, podemos concluir que os regulamentos trazem a lume o conteúdo, a matéria que a Administração pretende externar, qual seja, a regulamentação das leis. Para tanto, para que o regulamento possa ser exteriorizado, necessita do revestimento formal: decreto (forma mais comum), resolução, regimento etc.

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11.2. RegulamentosSão atos administrativos (e não legislativos), com eficácia externa e em vigência normalmente através de um

Decreto, que os apresenta e aprova. Sendo atos hierarquicamente inferiores à Lei, não podem modificá-la, e sim, explicitá-la, detalhá-la. Servem para prover sobre minúncias não abrangidas pela norma geral editada pelo Poder Legislativo, sendo denominados de regulamentos de execução. Tais regulamentos devem ser publicados da mesma forma que as leis por eles regulamentadas, uma vez que possuem eficácia externa. Observe-se que algumas leis necessitam de regulamentação para que possam ser executadas, ao passo que outras independem deles, sendo auto-executáveis. De qualquer forma, qualquer Lei pode ser regulamentada, tendo em vista o poder discricionário da Administração Pública. Tais regulamentos emanam do poder regulamentar da Administração.

11.3. Instruções Normativas

São atos administrativos expedidos por Ministros de Estado. Visam a execução das Leis, oriundas do Poder Legislativo, e dos decretos e regulamentos, editados pelo Executivo. Contudo, referidos atos também são utilizados por outros órgãos superiores com o mesmo intuito. O artigo 87, parágrafo único, II, da CF/88 determina que compete ao Ministro de Estado, além de outras atribuições estabelecidas na própria Constituição e na lei, expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos.

11.4. RegimentosSão atos administrativos. Pertencem à espécie de atos normativos. São internos e têm a finalidade de reger o

funcionamento dos órgãos colegiados e das corporações legislativas. Sendo atos internos, deverão obediência a eles somente os que devem executar os serviços por eles regulamentados, ficando os particulares isentos desse desiderato. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles, “os atos regulamentares internos (regimentos) constituem modalidade diversa dos regulamentos externos (... ou de execução) e produzem efeitos mais restritos que estes. Os regulamentos... de execução disciplinam situações gerais e estabelecem relações jurídicas entre a Administração e os administrados; os regimentos destinam-se a prover o funcionamento dos órgãos da Administração, atingindo unicamente as pessoas vinculadas à atividade regimental”. Os regimentos emanam do poder hierárquico da Administração Pública, ou da capacidade de auto-organização interna das corporações legislativas. Em regra, o regimento é posto em vigência através de uma resolução do órgão diretivo do colegiado (Presidência ou Mesa). Os regimentos, ao contrário dos regulamentos, por serem atos internos, podem dispensar a publicação, bastando que os agentes sujeitos às suas regras tomem conhecimento de seu conteúdo. Contudo, com o fim de resguardar a transparência e a moralidade dos atos administrativos, é conveniente que tais atos sejam publicados, até porque podem vir a interessar de maneira indireta os administrados.

Por fim, Hely Lopes Meirelles nos ensina que “pelo regimento, comumente, estabelece-se a tramitação interna dos recursos administrativos e se disciplina o andamento dos papéis no âmbito das repartições. Tratando-se de regimento de corporações legislativas, seu principal objetivo é regular o funcionamento do Plenário para suas deliberações e demais atos de economia interna da Câmara. Quanto às relações entre o Poder Público e os cidadãos, refogem do âmbito regimental, devendo constar de lei ou de decreto regulamentar. Os regimentos se destinam a disciplinar o funcionamento dos serviços públicos, acrescentando às leis e regulamentos disposições de pormenor e de natureza principalmente prática”. Ex: resoluções do JARI (órgão municipal de Goiânia e que possui direção colegiada). Sua competência é a de decidir recursos administrativos relativos a multas de trânsito.

11.5. ResoluçõesSão atos administrativos. Pertencem à espécie de atos normativos e são oriundos dos altos escalões

administrativos (tais como Ministros e Secretários de Estado ou Município ou de algumas pessoas administrativas ligadas ao governo) ou pelos presidentes de tribunais e colegiados administrativos, excluindo-se os Chefes do Executivo, cuja competência é a de expedir privativamente os decretos e regulamentos visando a fiel execução deles. A matéria das resoluções está inserida na competência específica dos agentes administrativos ou pessoas jurídicas responsáveis por sua expedição. Excepcionalmente admitem-se as resoluções individuais, uma vez que, de regra, são atos gerais. Em uma escala hierárquica, as resoluções estão abaixo dos regulamentos e dos regimentos. Da mesma forma que os decretos não podem ferir a lei preexistente a eles, as resoluções não poderão, a seu turno, inovar ou contrariar tais regulamentos e regimentos, mas tão somente complementá-los e explicitá-los. Seus efeitos podem ser internos ou externos. Não devemos confundir essas resoluções com aquelas emanadas do Senado ou Congresso Nacional (que não dependem de sanção presidencial e têm as regras jurídicas de elaboração conforme dispõem o seu Regimento interno ou comum). Essas resoluções, normalmente, tratam de assuntos de interesse direto das Casas Legislativas. Vide arts. 155, §2º, IV e 68, §2º, ambos da CF/88.

11.6. DeliberaçõesSão atos administrativos oriundos de órgãos colegiados e possuem finalidade normativa ou decisória. Quando

as deliberações têm finalidade normativa, classificam-se como atos gerais. Se decisórios, são atos individuais, onde os destinatários desses atos são individualizados, determinados. Quanto à hierarquia, as deliberações normativas são superiores em relação às deliberações decisórias. Assim, as primeiras nunca poderão ser revogadas pela segunda, mas somente por outra deliberação normativa. Hely Lopes declara que “as deliberações devem sempre obediência ao

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regulamento e ao regimento que houver para a organização e funcionamento do colegiado. Quando expedidas em conformidade com as normas superiores são vinculantes para a Administração e podem gerar direitos subjetivos para seus beneficiários”. Assim, as deliberações representam atos simples coletivos, pois têm origem, em regra, de órgãos colegiados (conselhos, comissões, tribunais administrativos), onde normalmente representam a vontade majoritária de seus integrantes. ATOS ORDINATÓRIOS11.7. Instruções

São atos administrativos ordinatórios consubstanciados no poder hierárquico da Administração, através de ordens escritas gerais (orientações) aos subordinados, relativas ao modo e forma do desempenho de determinada função, visando a correta e uniforme execução dos serviços públicos. Servem, portanto, para que o Poder Público organize suas atividades e seus órgãos. Apesar disso, na prática, muitos desses atos são utilizados com caráter normativo, ostentando regras gerais e abstratas, contrariando a finalidade originária de tais atos.

11.8. CircularesSão atos administrativos ordinatórios consubstanciados no poder hierárquico da Administração e de efeito

interno. Conforme assevera Hely Lopes, as “circulares são ordens escritas, de caráter uniforme, expedidas a determinados funcionários ou agentes administrativos incumbidos de certo serviço, ou do desempenho de certas atribuições em circunstâncias especiais. São atos de menor generalidade que as instruções, embora colimem o mesmo objetivo: o ordenamento do serviço”. Servem, portanto, para que o Poder Público organize suas atividades e seus órgãos. Apesar disso, na prática, muitos desses atos são utilizados com caráter normativo, ostentando regras gerais e abstratas, contrariando a finalidade originária de tais atos.

11.9. AvisosOs avisos são modalidades de comunicação oficial expedidos exclusivamente pelos Ministros de Estado para as

autoridades que se encontram em idêntica hierarquia, tendo como finalidade o tratamento de assuntos oficiais afetos aos seus Ministérios.

11.10. OfíciosOs ofícios são modalidades de comunicação oficial escrita expedidos para e pelas autoridades administrativas.

Tem como finalidade o tratamento de assuntos oficiais pelos órgãos administrativos entre si e os particulares. Os ofícios são praticamente idênticos aos avisos, sendo que a única diferença entre eles reside no fato de que os avisos são expedidos exclusivamente pelos Ministros de Estado para as autoridades de mesma hierarquia, enquanto que os ofícios são editados para e pelas demais autoridades públicas. Segundo Hely Lopes Meirelles, os ofícios são “comunicações escritas que as autoridades fazem entre si, entre subalternos e superiores e entre Administração e particulares... e tanto podem conter matéria administrativa como social”.

11.11. MemorandosOs memorandos são atos ordinatórios oficiais internos que se prestam à comunicação entre as unidades

administrativas de um mesmo órgão, que podem estar hierarquicamente em mesmo nível ou não. Tem como característica principal a rapidez e a simplicidade de procedimentos burocráticos. Os despachos devem ser dados no próprio documento, formando um procedimento simplificado.

11.12. PortariasSão atos ordinatórios internos, consubstanciados no poder hierárquico da Administração, expedidos por

Ministros e outras autoridades (chefes de órgãos, repartições ou serviços) contendo instruções gerais ou individuais a seus subordinados acerca da organização e funcionamento dos serviços, além da prática de outros atos de sua competência, como a abertura de sindicância e processo administrativo. Tais atos não atingem os particulares, haja vista que o poder hierárquico conferido à Administração Pública não os atinge. Servem, portanto, para que o Poder Público organize suas atividades e seus órgãos. Citamos como exemplo a portaria que dá exercício ao servidor empossado. Apesar disso, na prática, muitos desses atos são utilizados com caráter normativo, ostentando regras gerais e abstratas, contrariando a finalidade originária de tais atos. Ex: a Portaria n. 5, de 07/02/2002, expedida pelo Chefe da Casa Civil da Presidência da República, aprova o Regimento Interno do Conselho Nacional de Arquivos.

11.13. Ordens de ServiçoConforme leciona Hely Lopes Meirelles, ordens de serviço são “determinações especiais dirigidas aos

responsáveis por obras e serviços públicos autorizando seu início, ou contendo imposições de caráter administrativo, ou especificações técnicas sobre o modo e forma de sua realização. Podem, também, conter autorização para a admissão de operários ou artífices (pessoal de obra), a título precário, desde que haja verba votada para tal fim. Tais ordens comumente são dadas em simples memorando da Administração para início de obra ou, mesmo, para pequenas contratações”.

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11.14. ProvimentosSão atos oficiais ordinatórios, internos, expedidos pela Corregedoria ou pelos tribunais. Contém determinações e

instruções visando a regularização e uniformização dos serviços, principalmente os da Justiça, com o intuito de evitar erros e omissões na observância da lei.

11.15. DespachosSão atos administrativos ordinatórios, internos, que emitem alguma decisão acerca dos requerimentos e

processos sujeitos à apreciação da autoridade administrativa competente. Referidos despachos ocorrem em qualquer Poder (Executivo, Legislativo ou Judiciário), desde que no exercício da função administrativa. Observe que o despacho denominado de normativo (despacho normativo) é aquele que, embora proferido em um caso individual (concreto), a autoridade competente determina que seja aplicado nos demais casos idênticos, passando a vigorar, então, como norma interna da Administração (efeito vinculante).

ATOS ENUNCIATIVOS11.6. Pareceres

São opiniões, manifestações de órgãos técnicos ou agentes administrativos sob matéria submetida à sua apreciação. Em havendo a obrigatoriedade de se apresentar o parecer, o mesmo deverá ser juntado aos autos, sob pena de não o fazendo os mesmos serem considerados nulos. Neste caso, a presença do parecer faz-se necessária, apesar de seu conteúdo não ser vinculante para a Administração, salvo nos casos em que a lei exija o pronunciamento favorável do órgão emitente do parecer.

Quando facultativos, os pareceres não estão obrigados à formalização para que o ato seja considerado válido. Quando a decisão da autoridade competente se limita a aprovar o parecer, fica este integrado naquele como

razão de decidir. Assim, a decisão corresponderá ao motivo do ato. Ao revés, se a decisão for contrária ao parecer, deverá apresentar as razões que levaram a autoridade a decidir de modo contrário sob pena de ser considerado abuso de poder por não render ensejo à verificação da legalidade do ato.

O parecer será normativo quando convertido em norma de procedimento interno. O parecer será técnico quando oriundo de órgão ou agente especializado no assunto. Aqui não prevalece a hierarquia, uma vez que a autoridade competente deverá acatar o conteúdo do parecer haja vista que não há que se falar em subordinação no campo da técnica. Assim, se a junta médica oficial do INSS confirmar que o indivíduo encontra-se permanentemente incapacitado para o trabalho, não poderá o administrador negar-lhe esta incapacidade e deverá conceder a aposentadoria.

11.7. Certidões AdministrativasSão atos enunciativos formalizados através de documentos que expressam fielmente o que contém os livros,

papéis, dossiês, processos e demais documentos originais que se encontram em poder das repartições públicas e que sejam de interesse do requerente. Podem ser resumidas ou de inteiro teor. Nestes atos, a Administração não manifesta sua vontade, mas tão somente relata os fatos que constam em seus documentos ao interessado. Se autenticadas, possuem o mesmo valor probante que os documentos originais. A CF/88, em seu artigo 5, XXXIV, “b”, declara que o fornecimento de certidões independe do pagamento de taxas e deverá ser fornecido ao requerente para defesa de direitos ou esclarecimento de situações de interesse pessoal. A Administração terá o prazo de 15 dias (se a lei específica para o caso não dispuser de outro prazo) para expedir o documento, contado do registro do requerimento, que deverá apresentar os motivos a que se destinam. Citamos como exemplo a Certidão Negativa de Débitos, que comprova a quitação de tributos junto à Administração Fazendária.

11.8. Atestados AdministrativosSão atos enunciativos através dos quais a Administração comprova, declara um fato ou uma situação de que

tenha conhecimento, em razão das atividades desenvolvidas por seus órgãos. Diferem das certidões, uma vez que estas se prestam a reproduzir atos ou fatos constantes em seus arquivos, ao passo que os atestados comprovam fatos ou atos não constantes em seus livros, documentos, dossiês ou papéis. Citamos como exemplos o atestado médico e o atestado de vacina.

11.9. ApostilasApostila é a averbação, feita abaixo dos textos ou no verso de decretos e portarias pessoais (nomeação,

promoção, ascensão, transferência, readaptação, reversão, aproveitamento, reintegração, recondução, remoção, exoneração, demissão, dispensa, disponibilidade e aposentadoria), para que seja corrigida flagrante inexatidão material do texto original (erro na grafia de nomes próprios, lapso na especificação de datas, etc.), desde que essa correção não venha a alterar a substância do ato já publicado.        Tratando-se de erro material em decreto pessoal, a apostila deve ser feita pelo Ministro de Estado que o propôs. Se o lapso houver ocorrido em portaria pessoal, a correção por apostilamento estará a cargo do Ministro ou Secretário

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signatário da portaria. Nos dois casos, a apostila deve sempre ser publicada no Boletim de Serviço ou Boletim Interno correspondente e, quando se tratar de ato referente a Ministro de Estado, também no Diário Oficial da União.        A finalidade da correção de inexatidões materiais por meio de apostila é evitar que se sobrecarregue o Presidente da República com a assinatura de atos repetidos, e que se onere a Imprensa Nacional com a republicação de atos.Fonte: vide manual de redação oficial elaborado pela Presidência da República.

ATOS PUNITIVOS11.10. Multas

Conforme leciona Hely Lopes, é “toda imposição pecuniária a que se sujeita o administrado a título de compensação do dano presumido da infração”.

11.11. Interdição de AtividadeFruto do Poder de Polícia, ocorre quando o Poder Público proíbe alguém da prática de atos sujeitos ao seu

controle.

11.12. Destruição de coisasÉ ato oriundo do poder de polícia administrativa e visa inutilizar objetos nocivos ou legalmente proibidos.

12. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTESHely Lopes Meirelles ensina que a Teoria dos Motivos Determinantes “funda-se na consideração de que os atos

administrativos, quando tiverem sua prática motivada, ficam vinculados aos motivos expostos, para todos os efeitos jurídicos. Tais motivos é que determinam e justificam a realização do ato, e, por isso mesmo, deve haver perfeita correspondência entre eles e a realidade”. Isso quer dizer que os motivos apresentados para a realização do ato, tenham sido eles expostos pelo administrador espontânea ou obrigatoriamente (por força de lei), presumem-se (presunção relativa) determinantes, ou seja, que tenham influído de maneira absolutamente decisiva na formação da vontade da Administração Pública.

13. EXTINÇÃO (ou desfazimento) DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

13.1. Extinção Natural (cumprimento dos efeitos do ato)Uma vez cumpridos todos os efeitos do ato, este se extingue naturalmente. Desta forma, o ato que determina a

destruição de produtos estragados terá cumprido com seu objetivo quando a ordem for efetivamente cumprida, extinguindo-se naturalmente. Da mesma forma, uma licença para construir extinguir-se-á naturalmente quando a edificação estiver realizada e uma autorização de uso concedida por prazo determinado será extinta, naturalmente, quando este prazo tiver se escoado.

13.2. Extinção Subjetiva (desaparecimento do sujeito)Com o desaparecimento do sujeito beneficiário da vontade administrativa, o ato se extingue. Assim, por

exemplo, com a morte do permissionário de um determinado serviço público, por ser um ato personalíssimo em regra, o ato será extinto por falta do elemento subjetivo, da mesma forma que a autorização de uma pessoa para o porte de arma se extinguirá com o óbito dela.

13.3. Extinção Objetiva (desaparecimento do objeto)Uma vez praticado o ato e desaparecendo o seu objeto em razão de um fato superveniente, ocorre a extinção

objetiva dele. O ato fica, assim, sem objeto, desfazendo-se totalmente. Desta forma, se um estabelecimento comercial devidamente interditado (através de um ato administrativo) vier a ser desativado definitivamente pelos seus sócios, então o objeto do ato se extingue e, com ele, o próprio ato de interdição.

13.4. CaducidadeSegundo JSCF, caducidade significa para o ato “a perda de efeitos jurídicos em virtude de norma jurídica

superveniente contrária àquela que respaldava a prática do ato. O ato, que passa a ficar em antagonismo com a nova norma, extingue-se”. Para melhor compreensão do tema, vejamos a seguinte situação: a Administração concede a um particular a prestação de determinado serviço público, haja vista a existência de norma legal autorizativa. Se, após a formalização do ato de permissão, surgir nova regulamentação acerca da matéria, proibindo ao Poder Público delegar referido serviço, o ato anterior de permissão extinguir-se-á por caducidade. Também encontramos o fenômeno da caducidade quando um circo perde antiga permissão para explorar parque de diversões em local doravante proibido, tendo em vista a edição de uma nova lei de zoneamento no setor.

13.5. CassaçãoÉ forma de extinção volitiva do ato, ou seja, dá-se por manifestação de vontade da Administração, ao passo que

as formas de extinção acima descritas ocorrem independentemente da vontade dela. Ocorre quando o beneficiário do ato

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descumpre com as suas obrigações legais ou regulamentares. Observe-se que, para a Administração, a aplicabilidade de uma sanção legal ao infrator da norma configura-se em ato vinculado, mas isto não quer dizer, necessariamente, que a Administração deverá impor, em toda e qualquer circunstância, a penalidade máxima, qual seja, a de cassação do ato. De qualquer sorte, a Administração somente poderá extinguir o ato nas hipóteses previamente determinadas na lei. Além disso, trata-se de ato punitivo, a partir do momento em que há uma sanção contra o beneficiário que deixou de cumprir as condições para a subsistência do ato. Assim, a cassação da autorização para o porte de arma, por exemplo, poderá ser expedida pela Administração caso o beneficiário da mesma seja detido ou abordado em estado de embriaguez ou sob efeito de substâncias químicas ou alucinógenas, em conformidade com o disposto no artigo 10, § 2º da Lei nº. 10.826/03 (Estatuto do Desarmamento) ou quando da cassação de licença para funcionamento de hotel por haver se transformado em cassino ou casa de tolerância.

13.6. Invalidação (ou Anulação), por razões de ilegalidade.É forma de extinção volitiva do ato, resultante de manifestação de vontade administrativa (com base no seu

poder-dever de autotutela) ou judicial (no exercício de sua função típica).Para os adeptos da Teoria Monista, o ato ou é nulo (se possuir algum vício) ou é válido. Assim, simples

existência de ilegalidade no ato produzirá todos os efeitos que emanam de um ato tipicamente nulo.Para os adeptos da Teoria Dualista, os atos administrativos que possuem alguma irregularidade (vício), podem

ser classificados em nulos ou anuláveis, em conformidade com a maior ou menor gravidade do vício. É a teoria mais aceita pelos administrativistas.

Apesar de diversos doutrinadores utilizarem a expressão “anulação” como gênero de atos nulos ou anuláveis, o ideal seria trocá-la pela expressão “invalidação”, para significar qualquer desconformidade do ato com o ordenamento jurídico, evitando-se, assim, que o vocábulo cause a insinuação de que se trata de uma situação de anulabilidade apenas (e não de nulidade). Portanto, a invalidação é forma de extinção volitiva dos atos administrativos em virtude da existência de vícios de legalidade ou da prática de ato em desconformidade com os princípios administrativos.

Para que o ato não seja invalidado, faz-se necessária a observância de todos os seus requisitos de validade. Assim, se houver uma inadequação entre a conduta do agente e as atribuições conferidas a ele pelo legislador, agindo com excesso de poder, estaremos diante de um vício de competência. O mesmo vício se concretiza diante de situações onde o agente pratica o ato sem ter, sequer, as atribuições legais para tanto. Com relação aos vícios de competência, encontramos três situações básicas:

a) Usurpação de função, onde a pessoa praticante do ato não se encontra investida em nenhum cargo, emprego ou função, se apossando, por sua conta e risco, do exercício de atribuições próprias conferidas exclusivamente ao agente público, cometendo o crime tipificado no artigo 328 do Código Penal Brasileiro. É uma situação onde a pessoa não tem titulação legal para agir como agente público. Este ato é considerado pela maioria dos doutrinadores como inexistente, possuindo apenas a aparência de manifestação de vontade da Administração Pública;

b) Excesso de poder, já comentado linhas acima, onde o agente pratica ato fora dos limites legais de sua competência. Aqui, o agente tem titulação legal para exercer as suas atividades públicas, mas extrapola, ultrapassa os poderes conferidos pela lei, invadindo a competência de outra autoridade ou simplesmente praticando ato não previsto na legislação. O crime de abuso de poder está descrito na Lei 4.898/65.

c) Exercício de função de fato (teoria do funcionário de fato ou teoria do agente público de fato ou, simplesmente, exercício de fato), onde a agente praticante do ato encontra-se irregularmente investido no cargo, emprego ou função, porém, sua situação apresenta aparência de legalidade. É uma situação mais branda, se comparada com a do usurpador da função pública. O exemplo clássico é o do servidor aposentado compulsoriamente e que continua exercendo as suas atribuições. É uma situação onde o agente não tem titulação legal para agir como agente público. Este ato é considerado, pela maioria dos doutrinadores, como válido (se por outro motivo não for viciado), desde que tenha havido boa-fé do administrado e do agente, em respeito à “teoria da aparência”, ao princípio da segurança jurídica e à presunção de legitimidade de todos os atos da Administração. Celso Antonio Bandeira de Melo nos ensina que “invalidada a investidura do funcionário de fato, nem por isso ficará ele obrigado a repor aos cofres públicos aquilo que percebeu até então. Isto porque, havendo trabalhado para o Poder Público, se lhe fosse exigida a devolução dos vencimentos auferidos haveria um enriquecimento sem causa do Estado, o qual, destarte, se locupletaria com trabalho gratuito.”

Sendo o vício no elemento “competência”, dependendo da situação, o ato poderá se convalidado (vide item 15, abaixo) ou deverá ser anulado. Assim, vício que diga respeito à matéria ou quando se trate de competência exclusiva de outro agente, não poderá ser convalidado. Portanto, se o Ministro da Cultura expede uma portaria tratando de assuntos relativos ao Ministério da Saúde, ou se um Secretário Estadual edita um decreto regulamentar (que é de competência exclusiva do Chefe do Executivo), referidos atos deverão ser anulados. Ao revés, se o ato tiver sido editado por agente incompetente, e não sendo o mesmo exclusivo, poderá a Administração convalidá-lo, conforme determina o artigo 54 da lei 9.784/99.

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Se o ato for praticado com finalidade diversa daquela expressa na lei, o agente estará praticando abuso de poder, em sua modalidade desvio de poder (ou desvio de finalidade). Haverá, neste caso, vício de finalidade. O vício de forma, conforme assevera José dos Santos Carvalho Filho, “provém do ato que inobserva ou omite o meio de exteriorização exigido para o ato, ou que não atende ao procedimento previsto em lei como necessário à decisão que a Administração deseja tomar”. Para exemplificar a questão, o renomado autor apresenta a hipótese em que a lei exige a motivação do ato e o agente não a apresenta ou quando se pune sumariamente o servidor sem que lhe tenham sido proporcionados a ampla defesa e o contraditório. Ainda em relação aos vícios quanto aos requisitos dos atos administrativos, encontramos o vício do motivo, que poderá dar-se de três maneiras: a) inexistência de fundamento para o ato; b) fundamento inverídico e c) fundamento não conexo com o objetivo pretendido pelo Poder Público. Desta forma, se o administrador pratica ato sem razão, ou se se baseia em fato inexistente ou quando apresenta justificativa não condizente com o objetivo colimado pela Administração estará agindo com vício de motivo. Por último, o vício de objeto ocorre quando a Administração pratica ato dotado de conteúdo diverso do que a lei determina ou autoriza. Há vício de objeto quando o mesmo for contrário à lei ou à moral, se for impossível ou indeterminável. É por esta razão que se houver algum ato administrativo autorizando menores a comprarem e consumirem bebidas alcoólicas, o mesmo será invalidado, por vício de objeto, da mesma forma que o ato que aplica sanção mais severa do que a adequada ao caso concreto.

Em havendo vício de legalidade, tanto a Administração Pública editora do ato (ou o órgão hierarquicamente superior a ela), independente de provocação de terceiros, quanto o Poder Judiciário (mediante provocação do interessado), estarão legitimados a promover a invalidação (anulação) dele. A Administração utiliza o poder de autotutela. O Judiciário, o controle denominado exógeno.

A invalidação do ato administrativo opera efeitos ex tunc (efeitos retroativos). A nulidade é contada desde a edição do ato, retroagindo à origem dele, desfazendo-se todas as relações jurídicas resultantes deste ato declarado nulo. Porém, no intuito de não prejudicar os direitos dos terceiros que tenham agido com boa-fé e que não tenham contribuído para a invalidação do ato, seus direitos ficam resguardados da esfera de incidência do desfazimento. Conforme assevera JSCF, “exemplo clássico é o de um agente coletor de tributos com investidura ilegítima. Invalidada a investidura, produzindo efeitos em relação ao servidor e à Administração, nem por isso se deixará de validar a quitação obtida por contribuintes pelo pagamento de impostos feitos àquele servidor”. Por qual motivo os terceiros de boa-fé têm seus direitos resguardados quanto aos efeitos da anulação do ato irregular? Para encontrar a resposta, basta nos lembrarmos de que todos os atos administrativos nascem com o atributo da presunção de legitimidade. Desta forma, o agente ilegitimamente nomeado para um determinado cargo público deverá ter anulada a sua nomeação, ou seja, a sua relação jurídica com o Poder Público. Porém, não serão anulados os efeitos decorrentes dos atos praticados ilegitimamente por ele no desempenho de suas atribuições, desde que os destinatários sejam pessoas de boa-fé. Autores como Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo nos lembram que “o ato nulo não gera direitos ou obrigações para as partes, não cria situações jurídicas definitivas e não admite convalidação. Mas ensinam que “essa regra – o ato nulo não gera efeitos - , porém, há que ser excepcionada para com os terceiros de boa-fé que tenham sido atingidos pelos efeitos do ato anulado.”

Deve-se observar, contudo, que se o ato é inválido, mas o prazo legal para invalidá-lo já se escoou, o mesmo deverá permanecer como estava, seja qual for o vício de que esteja inquinado. Estamos falando, aqui, da hipótese de prescrição (hoje considerada como decadência) do direito de a Administração anular o ato. A doutrina majoritária entende que a prescrição incide em relação aos atos inválidos e que o prazo para invalidar o ato nulo é de cinco anos (prescrição qüinqüenal), em conformidade com o que determina o Decreto nº. 20.910/32 e o Decreto-Lei nº. 4.5697/42.

Da mesma forma, não há que se falar em invalidação quando as conseqüências jurídicas do ato gerarem tal consolidação fática que a manutenção do ato será mais recomendável por atender ao interesse público do que extingui-lo, criando maiores agravos à sociedade (teoria do fato consumado). O doutrinador Regis Fernandes de Oliveira apresenta uma situação onde a administração municipal autoriza, sem poder, a realização de loteamento em determinada área pertencente ao município. O ato é nulo. Contudo, em vista do ato editado por autoridade competente, diversas famílias edificaram seus imóveis no local, valorizando-o. Nesta situação, a Administração terá a faculdade de convalidar o ato, haja vista que a invalidação do mesmo acarretará maiores prejuízos aos moradores do local que tenham agido de boa-fé (e não com dolo).

Não podemos esquecer, também, que a Lei nº. 9784/99, que trata do processo administrativo federal, trouxe expressamente em seu texto a obrigatoriedade da Administração Pública obedecer ao princípio da segurança jurídica, estudado no capítulo um desta apostila. Lembramos que este princípio visa a impedir que situações jurídicas permaneçam eternamente em grau de instabilidade, criando incertezas aos destinatários dos atos da Administração. Por esta razão, referida Lei, em seu artigo 54, limitou a ação administrativa de anular seus atos que tenham produzido efeitos favoráveis aos destinatários no prazo decadencial de cinco anos, contados da data da prática do ato.

A administrativista, Maria Sylvia Z. di Pietro, nos ensina que “diante de determinados casos concretos, pode acontecer que a manutenção do ato ilegal seja menos prejudicial ao interesse público do que a sua anulação; nesse caso, pode a Administração deixar que o ato prevaleça, desde que não haja dolo, dele não resulte prejuízo ao erário, nem a direitos de terceiros; é o que ocorre, por exemplo, com os atos praticados por funcionários “de fato”.

Importante destacar, por último, que ao particular a ser prejudicado pelo ato extintivo, deve ser oportunizado o direito ao contraditório e à ampla defesa, devidamente mencionados no art. 5º, LV, CF/88, conforme entendimento que vem se fortalecendo entre os doutrinadores pátrios.

13.7. Revogação

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É forma de extinção volitiva do ato, ou seja, dá-se por manifestação de vontade da Administração, mediante juízo de mérito.

Quando desejar a Administração Pública retirar (extinguir) do mundo jurídico atos administrativos válidos, legítimos, perfeitos, por terem se tornado inconvenientes, inoportunos ou desnecessários estaremos diante do instituto da revogação. Observe-se que a revogação somente poderá ser aplicada em se tratando de atos discricionários, por motivos de interesse público superveniente. Portanto, a revogação é um ato discricionário que incidirá sobre outro ato discricionário. Será realizada pelo próprio órgão editor do ato ou por seu superior hierárquico e tem o caráter da definitividade. O poder Judiciário não poderá revogar o ato editado pelo Executivo, mas tão somente quando o ato administrativo tiver sua origem nele próprio. Mas, aí, o Judiciário estará exercendo a sua função administrativa, e não judicial, revogando ato administrativo elaborado pelo próprio Tribunal. Assim, está certo dizer que todos os Poderes políticos (Executivo, Legislativo e Judiciário) de qualquer das esferas administrativas (União, Estados, Distrito Federal ou Municípios) têm competência para revogar os atos administrativos por eles próprios editados e que o Judiciário jamais poderá revogar ato administrativo editado por ele quando estiver no exercício de sua função típica jurisdicional.

Na revogação, deverão ser respeitados os direitos adquiridos e operam-se efeitos ex nunc (efeitos pro ativos, ou seja, da data em diante). Quanto aos efeitos jurídicos já produzidos pelo ato até o momento, os mesmo permanecem intocáveis.

Observe-se, então, que certos atos são irrevogáveis, pois o poder discricionário para revogá-los não é ilimitado. São eles: a) os atos consumados (cujos efeitos jurídicos encontram-se exauridos); b) os atos vinculados; c) os atos que tenham gerado direitos adquiridos, em conformidade com o disposto no artigo 5º, XXXVI, CF/88, tais como àqueles que tenham concedido aposentadoria ao servidor após ele ter preenchido os requisitos legais exigidos para a sua fruição; d) os atos integrativos de um procedimento administrativo (observe-se que se opera a preclusão do ato anterior pela simples prática do ato seguinte). Por esta razão, não se revoga o ato de adjudicação no procedimento licitatório já tendo havido a assinatura do contrato; e) os atestados, pareceres e certidões (são os denominados meros atos administrativos).

Em regra, a revogação não gera para a Administração o dever de indenizar. Em certas circunstâncias, porém, isto poderá ocorrer, tal como ocorre com a revogação de uma permissão onerosa antes do prazo determinado.

15. CONVALIDAÇÃO (não representa forma de extinção dos atos administrativos)Através da convalidação (aperfeiçoamento, saneamento ou sanatória) o Poder Público aproveita atos

administrativos que possuam vícios superáveis, confirmando-os no todo ou em parte. O ato que convalida produz efeitos ex tunc, retroagindo, em seus efeitos, ao momento em que foi praticado o ato originário. Trata-se de ato discricionário (fruto do poder discricionário), haja vista ser uma faculdade conferida à Administração de anular ou não anular o ato administrativo realizado com algum vício sanável.

Devemos observar que, mesmo estando diante de um ato sanável, portanto, passível de convalidação, a Administração não poderá fazê-lo se houver impugnação expressa do interessado ou resistência quanto ao cumprimento dos efeitos ou quando tiver havido prescrição para a prática da convalidação. Observemos, também, que a Lei 9.784/99 contemplou o instituto, declarando em seu artigo 55 que a convalidação poderá dar-se pela Administração quando forem sanáveis os vícios e não sobrevier prejuízo ao interesse público ou a terceiros. Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo dissertam acerca deste tema, ensinando quais são as hipóteses de convalidação previstas na Lei 9.784/99:

“1) Quando os efeitos do ato viciado forem favoráveis ao administrado, a Administração disporá de cinco anos para anulá-lo, prazo este decadencial. Findo este prazo sem manifestação da Administração, convalidado estará o ato e definitivos serão os efeitos dele decorrentes, salvo comprovada má-fé (do beneficiário). Trata-se de hipótese de convalidação tácita.

2) O art. 55 prevê a possibilidade de convalidação expressa, por iniciativa da Administração, quando dos efeitos do ato não resulte lesão ao interesse público ou a terceiros. A lei expressamente utiliza o termo “defeitos sanáveis”, para referir-se a tais vícios ”.

Vale lembrar que a Administração poderá convalidar o ato irregular nas hipóteses em que a sua anulação venha a acarretar maiores prejuízos à coletividade do que a manutenção dele.

Assim, ato praticado com vício no sujeito (competência) possibilita a convalidação se a competência não for exclusiva (ou indelegável). Vício de incompetência em razão da matéria não admite convalidação. Vícios nos elementos finalidade e motivo não admitem convalidação. Objeto ilegal também não admite convalidação e vício na forma (se essencial à validade do ato) também não. Se não for essencial, cabe a convalidação.

CAPÍTULO VBENS PÚBLICOS

1. INTRODUÇÃO

Segundo Celso Antonio Bandeira de Melo, bens públicos são “todos os bens que pertencem às pessoas jurídicas de Direito Público, isto é, União, Estados, Distrito Federal, Municípios, respectivas autarquias e fundações de Direito Público... bem como os que, embora não pertencentes a tais pessoas, estejam afetados à prestação de um serviço

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público”. Portanto, para este autor, as pessoas jurídicas de Direito Público pertencentes à Administração Direta (U/E/DF e M) ou à Administração Indireta (Autarquias e Fundações Públicas com personalidade jurídica de direito público), e as pessoas jurídicas de Direito Privado, prestadoras de serviços públicos e pertencentes à Administração Indireta, tais como as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as fundações públicas de direito privado, possuem, como patrimônio, bens públicos.

Contudo, defendendo uma teoria mais restritiva, alguns doutrinadores ensinam que os bens públicos são aqueles pertencentes - exclusivamente - às pessoas que possuam personalidade jurídica de Direito Público. Desta forma, para estes, os bens pertencentes às empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas de Direito Privado são privados, mesmo que sejam prestadoras de serviços públicos. Estes doutrinadores encontram respaldo no artigo 98 do atual Código Civil que, tratando do tema, esclarece que são bens públicos os do domínio nacional, das pessoas jurídicas de Direito Público interno e são bens particulares todos os demais, seja qual for a pessoa a que pertencerem.

Por último, pautando-se em uma tese mais ampla, verificamos alguns estudiosos que alegam ser públicos TODOS os bens pertencentes à Administração Direta e Indireta.

Particularmente, ficamos com a teoria de Celso Antonio Bandeira de Melo, primeiramente exposta. Sendo assim, defendemos a tese de que os bens das empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista) exploradoras de atividades econômicas não são públicos, uma vez que referidas entidades possuem personalidade jurídica de direito privado. Contudo, as empresas públicas e as sociedades de economia que prestem serviços públicos terão seus bens caracterizados como públicos, não podendo ser penhorados ou gravados com ônus reais, em respeito ao princípio da continuidade dos serviços públicos, uma vez que seus bens se encontram afetados à prestação desses serviços públicos.

Hely Lopes Meirelles considera que os bens pertencentes às empresas públicas e às sociedades de economia mista são tidos como bens públicos com destinação especial, alegando que “a despeito de serem públicos, dada sua destinação especial as organizações de personalidade privada e sua administração em moldes particulares, os bens das empresas estatais prestam-se a oneração como garantia real e sujeitam-se a penhora por dívidas da entidade, como, também, podem ser alienados na forma estatutária, independentemente de lei autorizativa, se móveis. Os bens imóveis dependem de lei para sua alienação (Lei 8.666/93, art. 17, I). No mais, regem-se pelas normas de Direito Público, inclusive quanto à imprescritibilidade por usucapião...”.

2. CLASSIFICAÇÃO DOS BENS PÚBLICOS: observemos que a classificação dos bens públicos é encontrada no artigo 99 do Código Civil.

a) Quanto à titularidade: dependendo do titular, os bens podem ser federais, estaduais, distritais ou municipais.

b) Quanto à destinação: dependendo do objetivo a que se destinam, podem ser:

b.1) Bens de uso comum do povo (ou do domínio público): Conforme assevera Maria Sylvia Zanella Di Pietro, tais bens são aqueles que por determinação legal ou por sua própria natureza, possam ser utilizados por todos em igualdade de condições. Destinam-se, por natureza ou por lei, à utilização geral pela sociedade, independente de autorização específica da Administração, tais como as praças, as ruas, as estradas, os praias, os rios, os mares, os lagos etc. Conforme asseveram Marcelo Alexandrino e Vicente Paula, “esses bens, apesar de destinados à população em geral, estão sujeitos ao poder de polícia do Estado, consubstanciado na regulamentação, na fiscalização e na aplicação de medidas coercitivas, visando à conservação da coisa pública e à proteção do usuário”. Referidos bens são inalienáveis enquanto conservarem a sua qualificação, conforme veremos mais abaixo. b.2) Bens de uso especial (ou do patrimônio administrativo): são aqueles bens móveis ou imóveis, corpóreos ou incorpóreos, utilizados pelo Poder Público para a execução de suas atividades, de seus serviços públicos, ou para o estabelecimento da Administração, visando a consecução de seus fins, tais como os prédios públicos dos três Poderes, os aeroportos, os teatros, as escolas e universidades públicas, os hospitais, as prefeituras, as terras reservadas aos indígenas, os mercados, os veículos oficiais, os navios militares, os terrenos destinados aos serviços públicos, os museus, as bibliotecas, os cemitérios públicos etc. Referidos bens são inalienáveis enquanto conservarem a sua qualificação. Por terem uma finalidade pública permanente, são denominados de bens patrimoniais indisponíveis. Referidos bens são afetados a um serviço ou estabelecimento público. Assim, conforme assevera o artigo 99, II do atual Código Civil, são bens públicos “os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviços ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias”. Os bens não perdem a sua característica de uso especial se estiverem sendo utilizados por particulares objetivando a prestação de serviços públicos via delegação. b.3) Bens dominicais (ou dominiais ou do patrimônio disponível): Pertencem ao Estado como objeto de direito real ou pessoal de cada uma das entidades de direito público, ou seja, sobre eles a Administração exerce “poderes de proprietário”. Constituem, portanto, o patrimônio das pessoas jurídicas de Direito Público. O atual Código Civil os define em seu artigo 99, parágrafo único, como os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado. Assim, são os que não possuem uma destinação pública específica, definida, nem um fim administrativo determinado (é o que comumente chamamos de bens desafetados), podendo ser utilizados pela Administração no intuito de angariar renda. Por exclusão, todos os bens que não se enquadrem nas destinações b.1 e b.2

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acima descritas são tidos na classificação de dominicais, tais como as terras devolutas, os terrenos de marinha, os prédios públicos desativados, a dívida ativa e os móveis inservíveis. Os bens dominicais podem ser alienados, desde que observadas as exigências da lei (vide artigo 101 do Código Civil em vigor e a lei 8.666/93). São denominados, também, como bens patrimoniais disponíveis.

Qual é o critério utilizado para se saber em qual das classificações situa-se determinado bem público? Resposta: é o critério da afetação dos bens. Bem afetado é aquele que possui uma destinação pública específica. Portanto, os bens de uso comum e de uso especial têm afetação e integram o denominado domínio público do Estado. Já os bens dominicais, por não se encontrarem afetados, são tidos como bens de domínio privado do Estado. Os bens do domínio público estão submetidos a regime jurídico especial, enquanto que os do domínio privado encontram-se submetidos a um regime próximo ao do direito privado.

c) Quanto à disponibilidade: os bens podem ser classificados emc.1) Bens indisponíveis por natureza : tendo em vista não possuírem natureza patrimonial, não podem ser alienados ou

onerados, a exemplo dos bens de uso comum do povo.c.2) Bens patrimoniais indisponíveis : embora possuam natureza patrimonial, não podem ser alienados ou onerados,

tendo em vista estar sendo utilizados para alguma finalidade específica, encontrando-se, assim, afetados a alguma destinação pública específica, a exemplo dos bens de uso especial e dos bens de uso comum suscetíveis de avaliação patrimonial, sejam eles móveis ou imóveis. Porém, são indisponíveis apenas enquanto conservarem a sua qualificação.

c.3) Bens patrimoniais disponíveis : são os que possuem natureza patrimonial e podem ser alienados, observadas as exigências da lei, por não se encontrarem afetados a alguma finalidade pública, tais como os bens dominicais em geral.

3. CARACTERÍSTICAS

São características dos bens públicos:

a) Inalienabilidade: os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis enquanto conservarem a sua qualificação, ou seja, enquanto estiverem afetados a alguma destinação pública (vide artigo 100 do Código Civil). Assim, referidos bens só poderão ser alienados quando estiverem desafetados, passando à categoria dos bens dominicais. Já os bens dominicais podem ser alienados, desde que observadas as exigências da lei (vide, também, o artigo 101 do CC). Observe-se que a inalienabilidade não é absoluta, sendo absolutamente inalienáveis os bens que não gozam de valor patrimonial, tais como os rios, mares, lagos etc (denominados de bens de uso comum do povo), classificados como bens indisponíveis por natureza. Já os bens dominicais são suscetíveis de alienação, desde que obedecidos os ditames legais exigidos pela Lei 8.666/93 (Lei de licitações e contratos), que exige: demonstração de haver interesse público na alienação, avaliação prévia, licitação e autorização legislativa (esta última em se tratando de bem imóvel).

b) Impenhorabilidade: conforme asseveram Marcelo Alexandrino e Vivente Paula, “a penhora é instituto de natureza constritiva que recai sobre o patrimônio do devedor para propiciar a satisfação do credor na hipótese de não pagamento da obrigação. O bem penhorado pode ser alienado a terceiros para que o produto da alienação satisfaça o interesse do credor”. Porém, uma vez que os bens públicos são impenhoráveis, a satisfação dos créditos de terceiros (credores) contra a Fazenda Pública (Administração devedora) se dará NÃO SOB O REGIME DA PENHORA DOS BENS PÚBLICOS, mas sob o regime de precatórios, conforme determina o artigo 100 da CF/88. Não há que se falar, assim, em venda de bens públicos em hasta pública, além do que os mesmos não podem ser gravados com direitos reais de garantia.

c) Imprescritibilidade: Observe-se que nenhum destes bens está sujeito a usucapião, sejam eles de uso comum, especiais ou dominicais. Não há que se falar, assim, em usucapião, em se tratando de bens públicos móveis ou imóveis (vide artigos 183, parágrafo terceiro, e artigo 191, parágrafo único, ambos da CF/88 e artigo 102 do Código Civil). A jurisprudência também é pacífica neste assunto, conforme se assevera da súmula 340 do STF que estabelece:“desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião”.

d) Não-onerabilidade: não é possível ao devedor oferecer o bem público ao credor como garantia de pagamento em caso de inadimplemento do devedor, através dos institutos do penhor, da anticrese ou da hipoteca.

4. ESPÉCIES DE BENS PÚBLICOS Vide artigos 20 (bens da União) e 26 (bens dos Estados) da CF/88, Decreto Lei n. 9760/46 (bens imóveis da União), o Código de Águas (que classifica as águas públicas de uso comum das dominicais), o Estatuto da Terra (que dispõe sobre as terras públicas localizadas em área rural), o Código Florestal e o Código de Minas.

a) Terras devolutas: são as terras públicas classificadas como bens dominicais, pois não tem uma destinação específica, sendo indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e

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à preservação ambiental, definidas em lei (vide artigo 20, II da CF/88). Incluem-se entre os bens dos Estados as terras devolutas não compreendidas entre as da União (vide artigo 26, IV da CF/88). b) Terrenos de marinha: são bens pertencentes à União, por imperativos de defesa e de segurança nacional (vide artigo 20, VII, da CF/88 e artigo 13 do Código de Águas). São as áreas (faixas de terra) que, banhadas pelas águas do mar ou dos rios e que sofram a influência das marés, se estendem até a distância de 33 metros para a área terrestre, contados da linha do preamar médio de 1831. A diferença destes terrenos aos terrenos reservados é que nos primeiros existem as influências das marés enquanto que os terrenos reservados ficam fora das influências dessas marés. São bens públicos dominicais, podendo ser explorados pelo Poder Público para a obtenção de renda. O particular pode se utilizar desses terrenos sob o regime da enfiteuse ou do aforamento, estudados no Direito Civil.c) Terrenos acrescidos: são aqueles formados, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha, sendo pertencentes à União.d) Terrenos reservados (marginais ou ribeirinhos): são os que, banhados pelas correntes navegáveis, fora do alcance das marés, se estendem até a distância de 15 metros para a parte da terra, contados desde a linha média das enchentes ordinárias (vide o artigo 14 do Código de Águas). Segundo Celso Antonio Bandeira de Melo, referidos terrenos são bens públicos livres da influencia das marés numa extensão de 15m contados da linha média das enchentes médias ordinárias. Os terrenos reservados ficam nas margens dos rios navegáveis, fora das influências das marés e têm esta denominação porque foram reservados para a servidão pública de trânsito. Segundo o Código de Águas, referidos bens são, em regra, de propriedade dos Estados quando seguirem o destino dos rios e quando não forem marginais de rios federais nem estejam na faixa de fronteira. Contudo, esses bens serão da União quando tais terrenos margearem os rios que se situam em terras do domínio federal. Os terrenos reservados são classificados como bens dominicais, porque a Administração pode utilizá-los visando a obtenção de renda e podem ser utilizados pelos particulares através da concessão.e) Terras ocupadas pelos índios: conforme assevera o artigo 231, parágrafo 1°, da CF/88, são terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, às imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. São pertencentes à União (vide o artigo 20, XI, da CF/88). Por possuírem destinação específica, classificam-se como bens de uso especial, porque estão afetadas ao uso pelos índios, sendo inalienáveis e indisponíveis.f) Plataforma continental: em obediência ao artigo 20, V, da CF/88, referido bem pertence à União.g) Ilhas: porção de terra cercada de água por todos os lados. Classificam-se em marítimas, fluviais e lacustres, dependendo de onde se localizam: mar, rios ou lagos. Em regra, classificam-se como bens dominicais ,contudo, poderão ser classificadas como bens de uso comum do povo, se lhes for dada esta definição específica (afetação). h) Faixa de fronteira: é a faixa de até 150 km de largura que corre paralelamente à linha divisória terrestre entre o território nacional e os países estrangeiros e considerada fundamental para manter a segurança do Brasil (vide Lei 6.634/79 e art.20, II, parágrafo segundo da CF/88 ). i) Águas públicas: as águas públicas são compostas pelos mares, rios e lagos de domínio público (vide Código de Águas - Decreto 24.643/34). Classificam-se como de uso comum do povo os mares territoriais; as correntes, canais e lagos navegáveis ou flutuáveis; as correntes de que se façam essas águas; as fontes e reservatórios públicos; as nascentes que, por si só, constituem a nascente do rio e os braços das correntes públicas quando influam na navegabilidade ou flutuabilidade. As demais águas públicas, não classificadas como de uso comum do povo, são tidas a conta de águas dominicais. São designadas como águas correntes: rios, riachos e mares.São águas dormentes: lagoas e lagos.Segundo o artigo vinte, III, CF, as águas públicas são bens da União se estiverem em terrenos de seu domínio, banhem mais de um estado ou quando sirvam de limite com outros países, ou, ainda, quando se estendam ou provenham de território estrangeiro. Nos demais casos, são do Estado (art. 26, I, CF/88). Nos termos do artigo 20, VIII, CF/88, os potenciais de energia hidráulica são bens do domínio da União.j) Minas e Jazidas: pertencem à União (vide art. 20, IX, CF/88). Os recursos minerais, inclusive os do subsolo, constituem os bens dominicais, haja vista que deles se pode realizar exploração econômica.

Quadro resumo para estudo

Página (quadro) em construção ...

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Pertencem à... Classificam-se como bens...

Terras devolutas. União DominicaisTerras devolutas não pertencentes à União. Estados DominicaisRecursos naturais da Plataforma continental e da Zona Econômica Exclusiva.

União

Potenciais de energia hidráulica UniãoRecursos minerais, inclusive os do subsolo. União DominicaisMar territorial. União Uso comum do povoTerrenos de marinha e seus acrescidos. União DominicaisTerras tradicionalmente ocupadas pelos índios. União Uso EspecialIlhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países.

União Em geral são dominicais, salvo se afetadas.

Ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União.

Estados Em geral são dominicais, salvo se afetadas

Ilhas oceânicas e costeiras UniãoÁreas nas ilhas oceânicas e costeiras que não estão sob o domínio da União, municípios ou terceiros

Estados

Praias marítimas União Uso comum do povoPraias fluviais UniãoTerrenos marginais situados em terras do domínio federal.

União Dominicais

Terrenos marginais que não sigam rios federais e nem estejam na faixa de fronteira.

Estados Dominicais

Lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos do domínio da União.

União Uso comum do povo

Lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos não pertencentes à União.

Estados Uso comum do povo

Lagos, rios e quaisquer correntes de água que banhem mais de um Estado, que sejam limítrofes com outros países ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham.

União Uso comum do povo

Cavidades Naturais subterrâneas. UniãoSítios arqueológicos e pré-históricos. UniãoÁguas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, com a ressalva daquelas que se originem de obras da União.

Estados

5. ALGUMAS OBSERVAÇÕES IMPORTANTES:

5.1. Os bens relacionados no artigo 20 da CF/88 possuem certos critérios ligados à esfera federal, quais sejam: a) Segurança nacional: incisos II (terras devolutas necessárias à defesa das fronteiras, das fortificações e

construções militares), III, VI e VII.b) Proteção à economia do país: incisos V, VIII e IX. c) Interesse público nacional: incisos II (vias federais de comunicação e terras devolutas necessárias à

preservação ambiental), X e XI.d) A extensão do bem: III (lagos e rios que banhem mais de um Estado).

5.2. O Decreto-Lei n. 9.760/46 dispõe acerca dos bens imóveis da União.5.3. O rol de bens descritos no artigo 20 e 26 da CF/88 é meramente exemplificativo e não taxativo, ou seja, pode haver outros bens não elencados nestes artigos constitucionais.

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CAPÍTULO VIRESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO (OU DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA)

A responsabilidade civil da Administração (também denominada de responsabilidade patrimonial extracontratual, aquiliana, ou responsabilidade civil do Estado) consubstancia-se na obrigação que possui o Estado de indenizar o particular pelos danos materiais ou morais, lícitos ou ilícitos, causados aos particulares pelos agentes que estiverem atuando em seu nome. E esta responsabilidade existirá tanto para os atos comissivos (ações) ou omissivos (omissões) de seus agentes, conforme veremos mais abaixo.

A responsabilidade do Estado é de natureza civil. Ele (o Estado) deverá indenizar o particular pelos danos causados. Porém, em relação ao agente público causador do dano, sua responsabilidade poderá ser de natureza civil (com o ressarcimento pecuniário dos danos causados), penal (com a decretação de sua prisão, por exemplo) e administrativa (com o seu afastamento da Administração, através da demissão, conforme o caso).

1. TEORIAS RELACIONADAS À RESPONSABILIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1.1. À época do absolutismo europeu, a teoria adotada era a da irresponsabilidade do Estado, onde o rei ou monarca, considerado como infalível (the king can do no wrong - “o rei não erra”), não poderia ser responsabilizado por qualquer prejuízo causado aos particulares pelos atos de seus agentes (representantes), ou seja, por aquelas pessoas que agiam em seu nome. Obviamente que, por tal teoria, se criavam situações injustas. Esta teoria, que na verdade não trata da responsabilidade, mas da irresponsabilidade do Estado, nunca foi adotada no Brasil.

Anos após, com o advento das Constituições de 1824 e 1891, ainda não se falava expressamente na responsabilidade do Estado, mas, pelo menos, na de seus agentes. Entretanto, já havia algumas leis infraconstitucionais (de fora da constituição) se reportando à responsabilidade do Estado, aceitando-a como solidária com as de seus agentes.

1.2. Após, adotou-se a teoria da responsabilidade subjetiva (ou com culpa civil comum do Estado), também denominada de teoria civilista, através da qual a responsabilidade do Estado se equipara à do particular. Por esta teoria, se houver dolo do agente (intenção de causar dano) ou culpa (o agente não tem a intenção de causar o dano, mas o mesmo ocorre, tendo em vista a prática de ato com negligência, imprudência ou imperícia), deverá haver a indenização à vítima. Tal teoria surgiu com o artigo 15 do antigo Código Civil de 1916, onde o prejudicado (a vítima) deveria demonstrar a culpa, calcada na conduta dolosa (dolo) ou culposa (culpa) do agente público para que surgisse a obrigação de indenização do Estado.

1.3. Pela teoria da culpa administrativa (culpa anônima ou culpa do serviço), a responsabilidade do Estado não se baseia na conduta culposa ou dolosa do agente, acima estudada, mas simplesmente na falta do serviço. Assim, por esta teoria, não se analisa o elemento culpa (conduta dolosa ou culposa do agente público), e sim um elemento mais concreto, qual seja, a falta do serviço. Referida culpa poderia recair sobre o agente omisso (quando possível a sua identificação) ou sobre o serviço, ocorrendo a denominada culpa anônima. A culpa pela prestação do serviço (também denominada de faute du service) ocorre quando:

a) o serviço não funciona (inexistência do serviço);b) o serviço funciona mal (mau funcionamento do serviço);c) o serviço funciona atrasado (morosidade do serviço).Ao particular lesado cabe provar a ocorrência de uma destas três modalidades (situações) para ter direito à

indenização, sem ter de provar a culpa individual do agente público. Observe que estamos diante de uma teoria subjetiva, uma vez que há a necessidade da falta do serviço (omissão) como elemento fundamental para que se configure a obrigação de indenização do Estado. Portanto, se ocorrer um arrastão (ato de terceiros) dentro de um órgão público, e um particular sofrer dano, a Administração somente será responsabilizada se o particular provar que houve ausência ou falha na segurança do prédio. Mas, se o órgão tiver tomado previamente todas as precauções cabíveis no intuito de evitar um ato desta natureza, e o mesmo ocorre, trata-se de uma situação excepcional, não se podendo responsabilizar o poder público por ela. Situação semelhante observa-se com relação aos eventos da natureza (denominados de “força maior” por alguns doutrinadores). Se uma grande chuva causar danos ao particular por ter a Administração deixado de retirar uma árvore

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condenada, e a mesma cair sobre o veículo, haverá, sim, responsabilidade do Estado. Assim, podemos verificar que, pela responsabilidade subjetiva, na modalidade “culpa administrativa”, não há necessidade de que a vítima prove que um agente público determinado (individualizado) absteve-se de agir. Basta que ela demonstre que uma atuação do Estado era devida e não ocorreu, ou ocorreu de maneira deficiente, permitido que o dano ocorresse. A omissão é uma conduta negativa, é um não-fazer e um não-fazer não causa o dano, mas permite que ele venha a ocorrer. Já a ação é uma conduta positiva e é a ação que causa efetiva e diretamente o dano.

1.4. Por último, veio a teoria da responsabilidade objetiva do estado (ou teoria Publicista). Por ela, há a obrigação do Estado de indenizar, tendo em vista um comportamento lícito ou ilícito de seus agentes e que tenha causado dano a vítima. Aqui, não se fala em dolo ou culpa, mas sim na existência de uma relação de causalidade (ou também denominada de nexo de causalidade) entre a conduta do agente e o dano causado à vítima. Referida teoria surgiu com a promulgação da CF/46 e vige até hoje. Esta teoria está relacionada à teoria do risco administrativo, uma vez que a atuação estatal envolve um risco de dano que lhe é inerente no desempenho de suas funções. Podemos encontrar a confirmação da teoria da responsabilidade objetiva no artigo 37, parágrafo sexto, da atual Constituição Federal, que diz: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado, prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. Assim, aquele que sofreu o dano fica dispensado de ter de comprovar a culpa ou o dolo do agente, bastando, unicamente, a comprovação do nexo de causalidade. Conforme assevera a doutrina, a responsabilidade objetiva contempla duas variantes:

1.4.1. Responsabilidade objetiva com base no risco integral, segundo a qual a Administração obriga-se a indenizar o particular pelos prejuízos causados ainda que não tenha dado causa a eles, não podendo invocar, em seu benefício, as excludentes ou atenuantes de responsabilidade, abaixo estudadas. Referida teoria não é aplicada em nosso regime jurídico.

1.4.2. Responsabilidade objetiva com base no risco administrativo, segundo a qual a Administração somente responde pelos prejuízos que efetivamente tenha causado, podendo invocar em sua defesa as excludentes ou atenuantes de responsabilidade (culpa exclusiva ou concorrente do particular). Não se exige, aqui, qualquer análise de conduta dolosa ou culposa do agente ou qualquer verificação de falta de serviço, bastando apenas a comprovação da ação do Estado, do dano injusto causado ao particular e do nexo de causalidade entre a ação e o dano. Esta é a teoria adotada pela CF/88 em seu artigo 36, parágrafo sexto, e se refere às ações (e não às omissões) danosas praticadas pelo Estado: “artigo 37, parágrafo sexto – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. Por esta teoria, verifica-se que o Estado não terá sempre a obrigação de reparar os danos causados aos particulares por seus agentes, pois se o próprio particular for o culpado pelo dano, não caberá qualquer responsabilidade para o Estado, pelo contrário, será ele (o Estado) quem deverá ser indenizado pelos prejuízos suportados do ato ilícito do particular.

2. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA QUE SE CONFIGURE A RESPONSABILIDADE OBJETIVA

Para que seja configurada a responsabilidade objetiva, são necessários os seguintes requisitos:2.1. A pessoa envolvida deverá ter personalidade jurídica de direito público (U/E/DF/M/Autarquias/Fundações

Públicas com natureza jurídica de direito público) ou personalidade jurídica de direito privado (Empresa Públicas/Fundações Públicas com natureza jurídica de direito privado e Sociedades de Economia Mista), mas estas últimas deverão ser prestadoras de serviços públicos (e não exploradoras de atividades tipicamente econômicas, de produção ou comercialização de bens ou serviços!). Ficam excluídas, portanto, da responsabilidade objetiva, as pessoas com personalidade jurídica de direito privado que explorem atividades econômicas (para elas, a responsabilidade é equiparada à das empresas privadas, sendo denominada de “responsabilidade subjetiva”, ou seja, dependente da demonstração de culpa ou dolo do agente público), conforme dispõe o artigo 173, parágrafo primeiro, da CF/88 e não o artigo 37, parágrafo sexto, da Lei Maior (CF). Atenção! Incluem-se nesta responsabilidade (a objetiva) as concessionárias, as permissionárias e as autorizatárias de serviços públicos.

2.2. Deve haver um dano causado pela AÇÃO do Estado ao particular. Assim, a responsabilidade civil dependerá da ocorrência de dano ao Erário ou a terceiro causado por uma AÇÃO lícita ou ilícita do agente. Muita atenção! A omissão ilícita, ou seja, aquela em que o agente deve agir, mas não age, não causa o dano, mas permite que ele venha a ocorrer. Vejamos: se um ladrão rouba a bolsa de uma senhora, o dano é causado pelo assaltante (e não pelo Estado). Se um policial estiver presenciando o fato e nada fizer (quando deveria), sendo omisso, ainda assim a vítima foi lesada diretamente pelo ladrão. Não foi o policial quem a roubou! Mas, se o agente não fosse omisso, poderia ter evitado o dano. Porém, quando a omissão é lícita, não há que se falar em responsabilidade do Estado. Desta forma, se um varredor de ruas presenciasse o assalto e nada fizesse, ele teria agido de maneira omissa, mas esta omissão não seria ilegal. A ação de evitar o roubo era possível, mas não obrigatória por lei. Neste caso, não pode a vítima requerer indenização do Estado em face da omissão lícita do varredor.

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Quando houver uma conduta omissa do Estado, gerada pelo mau funcionamento do serviço, atraso ou não funcionamento dele, a responsabilidade não será a objetiva, mas a subjetiva na modalidade “culpa administrativa”.

O dano causado pela ação administrativa deverá ser:2.2.1. Certo: o dano já deve ter sido experimentado. Dano que ainda vai ocorrer não pode ser indenizado;2.2.2. Especial: o dano a ser indenizado é aquele que pode ser particularizado, individualizado, e não aquele

que atinge a coletividade em geral;2.2.3. Anormal: é aquele dano que ultrapassa as dificuldades corriqueiras do dia a dia. Para

compreendermos melhor esta situação, analisemos o enunciado proposto pelo Cespe, em 2001, na prova de Defensor Público da União:“Considere a seguinte situação hipotética: A interdição de uma via pública, por ato lícito, para a reparação de rede pluvial, impediu, por determinado tempo, o acesso de clientes a um posto comercial de combustíveis de determinada empresa, causando-lhe prejuízo advindo da cessação da venda de seus produtos”. Haverá para o Estado a obrigação de indenizar a empresa pela cessação temporária de suas atividades? Não, pois o dano experimentado por ela é normal, decorrente do exercício regular das atribuições do Poder Público. Pelo contrário, se o dano fosse anormal, desproporcional em comparação ao dano comumente suportado numa situação semelhante, como nos casos de uma paralisação demasiadamente longa ou por tempo indeterminado, aí sim, estaria caracterizada a responsabilidade estatal.

2.2.4. Direto e imediato: o prejuízo sofrido pela vítima deverá ser resultado direto e imediato da ação da Administração.

2.3. O dano deverá ter como autoria o Estado, através de seus agentes públicos (agentes políticos, administrativos e particulares em colaboração com a Administração Pública) no exercício das suas atividades funcionais. Observemos que não importa, aqui, se o dano foi causado por uma conduta legítima (no exercício legal de sua competência) ou ilegítima (fora da competência) do agente. Portanto, se o agente público não estiver em exercício e causar dano a terceiros responderá pessoalmente pelos prejuízos causados ao particular, com base na responsabilidade subjetiva (e não objetiva).

2.4. O agente deverá ter a qualidade de agente público e estar atuando no exercício das suas atribuições. Assim, se o agente público causa dano a terceiros agindo na condição de particular (e não de agente no desempenho de suas atividades), responderá pessoal e subjetivamente (responsabilidade subjetiva) por este dano. Procuremos entender: Se um policial dispara tiros contra um assaltante, ele estará agindo na qualidade de agente público, mesmo que já tenha encerrado seu expediente. Se algum terceiro vier a ser ferido durante o acontecimento, deverá o Estado ressarci-lo pelos prejuízos suportados. Porém, se este mesmo policial se desentender com algum vizinho e, por vingança, dispara contra ele alguns tiros, levando-o a morte, terá agido na condição de simples particular (e não como agente público!). Nesta última situação, portanto, não há que se falar em responsabilidade civil do Estado em relação à família da vítima, posto que o policial não agiu na qualidade de agente público.

Em que momento o agente estará agindo na qualidade, na condição, de agente público? Respondemos: a) Quando ele estiver no exercício efetivo de suas funções. Assim, se um policial mata um inocente ou se um

varredor de ruas destrói uma vidraça, em ambos os casos tais agentes estarão atuando na qualidade de agente públicos.

b) Quando o agente, embora não esteja no exercício de suas funções, causa dano a terceiros em razão da presença de alguma prerrogativa funcional. A prerrogativa funcional se caracteriza como qualquer direito, vantagem ou privilégio de que o agente se utilize pelo simples fato de ser agente público. Vejamos um exemplo: um auditor, valendo-se de suas prerrogativas funcionais, desloca-se para sua residência utilizando-se de uma viatura oficial. Se, no caminho, vier a causar dano a alguém, o Estado será responsabilizado pelos prejuízos causados pelo agente.

3. CAUSAS DE EXCLUSÃO TOTAL OU PARCIAL DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADOCertas situações excluem ou atenuam a responsabilidade do Estado da obrigação de indenizar a vítima. São elas:

1. Força Maior: ocorre diante de um acontecimento imprevisível e estranho à vontade das partes, como as tempestades, terremotos, queda de raio etc. Não havendo um nexo de causalidade entre os danos ocorridos ao particular e o comportamento da Administração, não há que se falar em responsabilidade do Estado, salvo se, aliado ao acontecimento imprevisto, tiver havido alguma omissão do Estado, como nos casos de enchentes agravadas pela falta de limpeza dos bueiros e das galerias fluviais. Em havendo omissão quanto ao dever que competia à Administração, haverá, sim, o dever de indenização, mas nestes casos a mesma se dará com base na denominada responsabilidade subjetiva.

2. Culpa da Vítima: Se houver culpa exclusiva da vítima, não há que se falar em responsabilidade do Estado. Portanto, se um pedestre resolve se atirar na frente de um veículo oficial em movimento, não haverá obrigação

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da Administração em ressarcir eventuais prejuízos causados à pretensa vítima. Entretanto, se houver responsabilidade tanto do Estado quanto do particular (culpa concorrente), a responsabilidade será repartida à proporção da culpa de cada um deles. Diz-se, então, que a responsabilidade do Estado será atenuada, mitigada.

4. AÇÃO DE REGRESSOO Estado poderá ingressar com uma ação judicial contra o agente público causador do dano injusto ao particular,

visando repor ao erário o valor gasto com o pagamento das indenizações à vítima. Para tanto, poderá se utilizar da Ação de Regresso (ação regressiva de ressarcimento), desde que a condenação do Estado já tenha transitado em julgado e haja a caracterização do dolo ou da culpa do agente, pois, neste caso, a responsabilidade do servidor, perante a Administração, será sempre subjetiva. Observe que a ação de regresso é imprescritível, conforme determina o artigo 37, parágrafo quinto da CF/88. Embora não seja mais possível à Administração, após o decurso de certo prazo, impor sanções de natureza penal ou administrativa ao agente causador do dano injusto ao particular, o mesmo não se aplica à responsabilidade civil dele (do agente) em indenizar a Administração pelo valor pago à título de indenização (ao particular). Desta forma, a responsabilidade civil (e não a penal ou administrativa) do agente público subsiste frente ao tempo, podendo ser exigido o pagamento a qualquer momento - pelo Estado - em face do seu agente público, mesmo após a extinção de seu vínculo administrativo-funcional. Além disso, ressalte-se que é possível serem responsabilizados os sucessores do agente falecido (causador do dano) até o limite do valor do patrimônio transferido. É importante que se diga, também, que a Lei 4.619/65 estabelece, em seus artigos 1º e 2º, normas sobre a ação regressiva da União contra seus agentes públicos federais, a ser ajuizada pelo Procurador da República em 60 dias da data em que transitar em julgado a condenação imposta à Fazenda Pública, sob pena de falta funcional.

5. MEIOS DE REPARAÇÃO DOS DANOSA vítima poderá requerer o ressarcimento dos danos suportados através da via administrativa ou judicial.

Lembramos que o particular prejudicado não será obrigado a esgotar primeiramente a via administrativa para, somente após, caso seja negado o seu pedido, recorrer ao Poder Judiciário.

6. PÓLO PASSIVO DA AÇÃO JUDICIALFigurará no pólo passivo da ação judicial o causador do dano, qual seja, o Estado. Mas, se o terceiro

prejudicado preferir demandar (litigar) contra o Estado e o agente ao mesmo tempo, ou contra o agente unicamente, será possível, uma vez que o artigo 37, parágrafo sexo da CF/88 nada dispôs em sentido contrário. Ocorre que o patrimônio do Estado certamente garantirá o pagamento da indenização, ao passo que nem sempre o do agente terá condições de fazê-lo. Com relação à denunciação da lide, prevista no artigo 70, III, do Código de Processo Civil, segundo a qual o Estado, uma vez acionado judicialmente pelo particular prejudicado, faz a denunciação - no processo judicial - do agente público causador do dano, temos a dizer que a doutrina majoritária tem entendido não ser possível ao Estado utilizar-se deste instituto jurídico, uma vez que haveria prejuízo ao particular (autor da ação) tendo em vista o retardamento injusto da finalização do processo. Além disso, a responsabilidade estatal é objetiva ao passo que a do agente é subjetiva.

7. RESPONSABILIDADE DOS ATOS EMANADOS PELO PODER LEGISLATIVOE quando o Poder Legislativo edita leis inconstitucionais abstratas, gerais, genéricas, que causam prejuízo ao

particular? É cabível a responsabilização estatal? Alguns doutrinadores entendem não ser possível responsabilizar o Legislativo pelas leis que edita. Tais estudiosos adotam, assim, a teoria da irresponsabilidade do Estado.

Mas, com relação à edição de leis de efeito concreto, que atingem um determinado grupo da sociedade, entende a doutrina que há, sim, responsabilidade do Estado, justamente por causar danos a uma parcela da sociedade e não à sociedade como um todo. Exemplo desta última hipótese, onde a lei gera efeitos concretos, dá-se em relação a uma lei que transforme uma determinada área em reserva florestal. O proprietário de tal área terá direito à indenização.

8. DA RESPONSABILIDADE DO AGENTEA responsabilidade dos agentes públicos quanto aos atos danosos causados ao particular é regressiva e

subjetiva. É regressiva porque, primeiro, o Estado indeniza a vítima pelos prejuízos causados pelo agente para, somente depois, ingressar com a ação judicial cabível (ação de regresso) contra o efetivo agente causador do dano. É subjetiva porque o agente só indenizará o Estado pelos prejuízos que tenha causado no caso de ter agido com dolo ou culpa devidamente provados pela Administração.

Não devemos nos esquecer que o servidor poderá responder civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular das suas atribuições, conforme o caso em concreto, ao passo que a responsabilidade do Estado será sempre de natureza civil.

8.1. Responsabilidade civil

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A responsabilidade civil decorre de ato omissivo (omissão) ou comissivo (ação), doloso ou culposo, que resulte prejuízo ao erário ou a terceiros. A obrigação de reparar o dano estende-se aos sucessores e contra eles será executada, até o limite do valor da herança recebida.

8.2. Responsabilidade penal

A responsabilidade penal (criminal) abrange crimes e contravenções imputadas ao servidor, nessa qualidade (ou seja, no exercício de suas funções). Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas como crime. Assim, se servidor cometer infração administrativa que configure também infração penal, não será punido administrativamente se ocorrer a prescrição penal, a exemplo do emprego irregular de dinheiros públicos que, no estatuto, é infração punível com demissão cujo prazo prescricional é de 5 anos (art. 132, VIII, c/c artigo 142, I, do Estatuto). No entanto, se aplica o prazo de prescrição da lei penal, que é menor.

8.3. Responsabilidade administrativa

A responsabilidade administrativa do agente resulta de ato comissivo ou omissivo, doloso ou culposo, praticado no desempenho do cargo ou função, em que ele transgrida alguma norma legal ou regulamentar.

8.4. Cumulatividade das sanções

As sanções civis, penais e administrativas poderão cumular-se, sendo, em regra, independentes entre si. Assim, tais sanções poderão ser aplicadas de forma cumulativa tendo em vista a prática de um mesmo fato. Exemplo: se um policial pratica ato abusivo, violando a integridade física de alguém, responderá na esfera administrativa (podendo ser demitido ou suspenso), na esfera civil (tendo de indenizar a Administração no curso de uma ação regressiva, acima estudada) e na esfera penal (sofrendo alguma pena restritiva de liberdade).

Uma vez que as instâncias civil, penal e administrativa são independentes entre si, pode ocorrer do agente ser absolvido na esfera penal (por ausência de provas, por exemplo) e vir a ser condenado nas demais. Exemplo: se não se conseguir provar as lesões corporais praticadas pelo policial, na situação acima descrita, ele será absolvido criminalmente, mas, mesmo assim, poderá ser condenado pelo ato administrativo abusivo, devendo reparar, também, civilmente, o dano injusto causado à vítima.

8.5. Hipóteses em que a decisão na esfera penal vincula a administrativa e a cível

A decisão na esfera criminal vinculará as decisões administrativas e civis em duas hipóteses: a) Condenação do agente;b) Absolvição do agente por inexistência (negativa) do fato ou de sua autoria.

Vejamos a primeira hipótese: imaginemos que o agente seja condenado criminalmente pelo mesmo fato apurado nas esferas administrativa e civil. A sentença penal já transitou em julgado, ou seja, já não cabe qualquer recurso contra a decisão judicial. Por conseqüência, será reconhecida, também, nestas duas esferas, a responsabilidade civil e administrativa do agente. Por quê? Porque a instrução probatória, ou seja, a fase em que se comprova a real ocorrência do fato delituoso, na instância criminal, é mais abrangente, constituindo uma certeza jurídica da responsabilidade do réu. Devemos observar, também, que, em regra, a imputação de um crime a um agente pressupõe a prática de uma conduta dolosa dele, enquanto que nas esferas administrativa e civil o ato ilícito poderá dar-se por ato culposo (negligência, imprudência ou imperícia) ou doloso.

Analisemos, agora, a segunda situação: se a decisão penal definitiva absolver o agente público por negativa do fato, alegando que o mesmo sequer ocorreu, ou absolvê-lo por negativa de autoria, confirmando que o fato ocorreu, mas o agente não foi o autor dele, haverá a vinculação nas demais esferas, quais sejam, a civil e a administrativa. Nestes casos, o agente deverá ser absolvido, também, em referidas áreas.

Mas, atenção! A absolvição penal, para vincular as demais esferas (civil e administrativa), deverá dar-se por negativa de autoria e não por ausência ou insuficiência de provas (ou por qualquer outro motivo) para condenar o agente público. Neste último caso (ausência de provas), ele poderá estar imune à sanção penal, mas, mesmo assim, poderá ser responsabilizado civil e administrativamente. Vejamos um exemplo: um motorista da prefeitura provoca danos injustos no veículo de um particular, tendo agido com imprudência (culpa). Nesta hipótese, resta configurada a sua responsabilidade civil e administrativa diante do Estado. De repente, por um acesso de raiva, o agente público desce do veículo e causa, dolosamente, lesões corporais à vítima. Aqui, configura-se a hipótese de punibilidade penal. Mas, se na ação judicial movida pela vítima, não restar comprovada a

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conduta dolosa praticada pelo agente (restando configurada a sua absolvição por ausência ou insuficiência de provas para condená-lo), o mesmo não poderá ser punido criminalmente, mas o poderá nas demais esferas.

Vejamos um segundo exemplo elucidativo: um agente público é acusado penalmente por ter causado, de maneira dolosa, danos à Administração. Mas, por ausência de provas, ele foi inocentado, pois não se comprovou a existência do dolo (intenção de causar o dano). E então? Ele também deverá ser inocentado nas esferas administrativa e civil? Não necessariamente, pois a prática culposa (sem intenção) de danos à Administração poderá ocasionar a aplicação de sanções nestas demais esferas.

9. DANOS CAUSADOS POR OMISSÃO DO ESTADOEm havendo omissão do Estado, quando o mesmo deveria ter agido, dizemos que o serviço não funcionou,

funcionou mal ou funcionou tardiamente. Nestas situações, a responsabilidade do Estado será subjetiva, uma vez que, por não ter agido, não causou diretamente o dano, mas permitiu que ele viesse a ocorrer causando prejuízos materiais e/ou morais à vítima. Vejamos o seguinte exemplo: um policial testemunha um assalto e não faz nada para evitá-lo, quando deveria. Quem causou diretamente o dano foi o assaltante e não o Estado (o Estado não foi o autor do dano). Contudo, a sua conduta omissa permitiu que o dano viesse a ocorrer e, portanto, deverá ser responsabilizado subjetivamente por isto. Mas, o terceiro prejudicado (particular) deverá provar que era obrigação legal do agente público conduzir-se de forma positiva (ação), de modo a evitar ou reduzir o dano, deixando de fazê-lo por dolo ou culpa.

Situação diferente ocorreria se um agente de limpeza das ruas estivesse diante da prática de um roubo e não fizesse nada. Neste caso, como não era sua obrigação (competência) impedir o assalto, o Estado não se responsabiliza pela omissão legítima (legal) do varredor (agente público).

Embora possa tratar-se de uma culpa não individualizável na pessoa de tal ou qual agente, é necessária a comprovação do dolo ou da culpa da Administração, esta última tipificada na negligência, imprudência ou imperícia, o que faz com que o serviço não funcione, funcione mal ou tardiamente, causando danos aos particulares (é a denominada culpa anônima, falta de serviço ou faute de service dos franceses).

Devemos observar que o artigo 37, parágrafo sexto, da atual CF, que institui a responsabilidade objetiva do Poder Público, refere-se aos danos causados por seus agentes através das ações produzidas por eles (e não por suas omissões).

O Supremo Tribunal Federal já se pronunciou sobre o tema, afirmando que “a falta do serviço não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre a ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro” (RE 172.025/RJ, Ministro Ilmar Galvão, D.J. de 19.12.96).

10. DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ACIDENTES NUCLEARESConforme determina o artigo 21, XXIII, d, da CF/88, a responsabilidade civil por danos nucleares independe da

existência de culpa. Assim, verifica-se que a responsabilidade adotada pela Lei Maior é a objetiva.

11. DA RESPONSABILIDADE DO PODER JUDICIÁRIOJá vimos que o Poder Judiciário, no exercício da sua função atípica, pratica atos administrativos. Nestas

situações, se houver dano, a responsabilidade da Administração será objetiva, na modalidade do risco administrativo e a do magistrado (causador do dano), subjetiva. Cabe, nesta hipótese, o direito à ação regressiva por parte do Poder Público.

Porém, quando o Judiciário estiver no exercício de sua função típica, qual seja, a de julgar, devemos fazer uma diferenciação:

11.1. NA ÁREA CÍVEL:a) Quando o magistrado estiver no exercício de sua função típica jurisdicional (julgar), e proceder com dolo,

causando intencionalmente dano ao particular, deverá ser responsabilizado pessoalmente, conforme determina o artigo 133 do CPC (Código de Processo Civil). Observemos que, se o juiz tiver agido com culpa (negligência, imprudência ou imperícia), o mesmo não será responsabilizado. Assim, se ao julgar, ele tiver cometido um erro grave, “ferindo” o ordenamento jurídico, não poderá o particular lesado requerer qualquer indenização, salvo se comprovar a atitude dolosa da autoridade prolatora da decisão. O mesmo raciocínio se aplica quando o juiz “recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício o a requerimento da parte”.

É importante observarmos que, independente de a atitude do juiz ter causado dano culposo ou doloso, o Estado, em momento algum, será responsabilizado (somente o juiz, pessoalmente, em sendo o ato doloso). Para ele (o Estado), com relação aos atos judiciais, adota-se a teoria da irresponsabilidade estatal.

11.2. NA ÁREA PENAL:

b) Conforme determina o artigo 5º, LXXV, da CF/88, “o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”. Uma vez que a sentença penal acarreta, em regra, o cerceamento da liberdade do indivíduo (prisão), sendo mais gravosa que a sentença cível, deve ser adotada a teoria da responsabilidade objetiva do Estado sempre que o indivíduo for condenado (exclusivamente na esfera penal)

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erroneamente ou ficar preso por período superior ao determinado na decisão judicial, independente do agente público (magistrado, delegado, policial, carcereiro etc.) ter agido com culpa ou dolo. Podemos afirmar que a matéria não é pacífica entre os doutrinadores e que o STF decidiu, recentemente, pela responsabilidade objetiva (ou seja, independente de dolo ou culpa do magistrado) em se tratando do artigo acima mencionado (vide decisão da Primeira Turma no julgamento do RE 505.393, relator Ministro Sepúlveda Pertence, ocorrido em 26.06.2007).

E quando o réu, tendo sido decretada a sua prisão preventiva, provar, ao final, a sua inocência? Terá direito à indenização? Não. O STF assim já se pronunciou: “O decreto judicial de prisão preventiva, quando suficientemente fundamentado e obediente aos pressupostos que o autorizam, não se confunde com o erro judiciário a que alude o inc. LXXV do art. 5º da Constituição da República, mesmo que o réu ao final do processo venha a ser absolvido ou tenha sua sentença condenatória reformada na instância superior” (vide RE 429.518/SC, rel. Min, Carlos Velloso, 17.08.2004).

12. DA RESPONSABILIDADE PELOS DANOS CAUSADOS POR ATOS BILATERAIS DO ESTADO

A responsabilidade extracontratual do Estado, estudada neste capítulo, abrange, exclusivamente, os atos unilaterais. Assim, a responsabilidade pelos danos causados por atos bilaterais seguirá regras próprias, descritas na Lei 8.666/93.

13. PESSOAS OU COISAS SOB RESPONSABILIDADE DO ESTADO

Se o Estado está responsável pela guarda de pessoas ou coisas, zelando pela sua integridade física e moral, sua responsabilidade será objetiva. Vejamos: se um presidiário vem a ser ferido na cadeia, independentemente de ter havido qualquer participação direta do agente prisional (espancamento) ou a omissão dele (falta de segurança) no dever de proteger devidamente o detento, terá o Estado a responsabilidade objetiva sobre o caso, salvo se ocorrer caso fortuito ou força maior (excludentes de responsabilidade do Estado, caracterizados por um evento extraordinário e imprevisível, com força irresistível, que por si só gera o dano). O mesmo raciocínio vale para os alunos de uma escola pública, aos internados em hospital municipal ou às mercadorias detidas em depósito público.

CAPÍTULO VIILEI 9.784/99PROCESSO ADMINISTRATIVO FEDERAL

“Vejamos, abaixo, a Lei 9.784/99, com alguns comentários pertinentes devidamente acompanhados de algumas questões de concursos públicos”.

CAPÍTULO IDAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1o Esta Lei estabelece normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração.

Qual o objeto (ou conteúdo) da Lei 9.784/99? Referida Lei dispõe sobre normas básicas referentes ao processo administrativo.

O artigo 1º ainda determina quais são as pessoas que devem obedecer aos seus ditames. São elas: a Administração Federal Direta (União e seus órgãos federais) e a Administração Federal Indireta (Autarquias, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista e Fundações Públicas, todas federais). Devemos acrescentar, ainda, os órgãos nomeados no parágrafo primeiro deste artigo, quais sejam, os Poderes Legislativo e Judiciário, desde que no exercício das suas funções atípicas administrativas.

A finalidade da Lei 9.784/99 é a proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração.

§ 1o Os preceitos desta Lei também se aplicam aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário da União, quando no desempenho de função administrativa.

§ 2o Para os fins desta Lei, consideram-se:I - órgão - a unidade de atuação integrante da estrutura da Administração direta e da estrutura da Administração indireta;

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II - entidade - a unidade de atuação dotada de personalidade jurídica;III - autoridade - o servidor ou agente público dotado de poder de decisão.

Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

Critérios são padrões a serem observados pelas autoridades nos processos administrativos.

   I - atuação conforme a lei e o Direito (princípio da legalidade);II - atendimento a fins de interesse geral (princípio da finalidade/impessoalidade), vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências (princípio da indisponibilidade), salvo autorização em lei;III - objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades (impessoalidade);IV - atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé (princípio da moralidade);V - divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição (princípio da publicidade);

VI - adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público (princípio da proporcionalidade);VII - indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão (princípio da motivação);VIII – observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados; IX - adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados; (princípio do informalismo para alguns doutrinadores).X - garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio (princípio do contraditório e da ampla defesa);XI - proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei; XII - impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados (visa evitar paralisações e o retardamento das soluções);XIII - interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação (princípio da segurança jurídica).

1. CONCEITO DE PROCESSO OU PROCEDIMENTOProcesso (ou procedimento), para alguns doutrinadores, é uma série de atos relativamente autônomos,

praticados de forma sucessiva e coordenada, resultando na produção de um ato final, encerrando a atuação da Administração. Cada ato do procedimento possui uma finalidade específica, determinada, sendo indispensável a sua edição para que o ato seguinte do procedimento possa ser realizado, até que se possa alcançar o ato final desejado pela Administração. Assim, todos os atos do procedimento têm uma finalidade específica, sendo direcionados para a prática do ato final. Observemos que tais atos intermediários ostentam uma relativa autonomia, o que permite a impugnação judicial de cada um deles, isoladamente. Lembramos que haverá vício no elemento “forma” caso o administrador desrespeite o “procedimento” adotado pela lei ou deixe de praticar algum ato deste mesmo procedimento.

1.1. DO ALCANCE DA LEI 9.784/99

A Lei 9.784/99 trata, através de normas básicas, do processo administrativo. Referida Lei deverá ser obedecida pela Administração Federal Direita e Indireta, e, também, pelos Poderes Legislativo e Judiciário no exercício de suas funções administrativas. A finalidade da Lei 9.784/99 é a de proteger, em especial, os direitos dos administrados e garantir o cumprimento dos fins buscados pela Administração.

Embora a Lei em comento estabeleça regras básicas de observância uniforme no seio da Administração, isto não quer dizer que as demais legislações federais específicas pertinentes a processos administrativos especiais, tais como as referentes às licitações públicas, ao processo administrativo fiscal ou ao processo administrativo disciplinar (todos regidos por leis próprias) estejam revogadas por ela. Para tanto, basta que se dê uma olhada no artigo 69 da Lei 9.784/99, que verificaremos que “os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei”. Aplicação subsidiária significa dizer que, primeiramente, devemos obedecer à lei específica. Porém, se, e somente se, a lei específica for omissa, aí sim, utilizar-se-ão os artigos dispostos na Lei 9.784/99.

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CAPÍTULO IIDOS DIREITOS DOS ADMINISTRADOS

Art. 3o O administrado tem os seguintes direitos perante a Administração, sem prejuízo de outros que lhe sejam assegurados

O artigo 3º apresenta situações exemplificativas (são apenas alguns exemplos de direitos) e não taxativas (se fossem taxativas, os direitos pertencentes aos administrados seriam única e exclusivamente os apresentados nos incisos I a IV). Assim, podem existir outros direitos aos administrados que não estejam expressos neste artigo.

I - ser tratado com respeito pelas autoridades e servidores, que deverão facilitar o exercício de seus direitos e o cumprimento de suas obrigações;II - ter ciência da tramitação dos processos administrativos em que tenha a condição de interessado, ter vista dos autos, obter cópias de documentos neles contidos e conhecer as decisões proferidas;III - formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente;IV - fazer-se assistir, facultativamente, por advogado, salvo quando obrigatória a representação, por força de lei.

CAPÍTULO IIIDOS DEVERES DO ADMINISTRADO

Art. 4o São deveres do administrado perante a Administração, sem prejuízo de outros previstos em ato normativo:

        I - expor os fatos conforme a verdade;        II - proceder com lealdade, urbanidade e boa-fé;

III - não agir de modo temerário;

Segundo o dicionário, temerário é ser imprudente, perigoso, atrevido, precipitado, sem fundamento, sem base...

IV - prestar as informações que lhe forem solicitadas e colaborar para o esclarecimento dos fatos.

CAPÍTULO IVDO INÍCIO DO PROCESSO

Art. 5o O processo administrativo pode iniciar-se de ofício ou a pedido de interessado.       

Art. 6o O requerimento inicial do interessado, salvo casos em que for admitida solicitação oral, deve ser formulado por escrito e conter os seguintes dados:

I - órgão ou autoridade administrativa a que se dirige;II - identificação do interessado ou de quem o represente;III - domicílio do requerente ou local para recebimento de comunicações;IV - formulação do pedido, com exposição dos fatos e de seus fundamentos;V - data e assinatura do requerente ou de seu representante.Parágrafo único. É vedada à Administração a recusa imotivada de recebimento de documentos, devendo o servidor orientar o interessado quanto ao suprimento de eventuais falhas.Art. 7o Os órgãos e entidades administrativas deverão elaborar modelos ou formulários padronizados para assuntos que importem pretensões equivalentes.Art. 8o Quando os pedidos de uma pluralidade de interessados tiverem conteúdo e fundamentos idênticos, poderão ser formulados em um único requerimento, salvo preceito legal em contrário.

CAPÍTULO VDOS INTERESSADOS

Art. 9o São legitimados como interessados no processo administrativo:

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I - pessoas físicas ou jurídicas que o iniciem como titulares de direitos ou interesses individuais ou no exercício do direito de representação;II - aqueles que, sem terem iniciado o processo, têm direitos ou interesses que possam ser afetados pela decisão a ser adotada;III - as organizações e associações representativas, no tocante a direitos e interesses coletivos;IV - as pessoas ou as associações legalmente constituídas quanto a direitos ou interesses difusos.

       

Interesses Difusos: São aqueles interesses indivisíveis, cujos titulares são pessoas indeterminadas ou indetermináveis. Ex: direito à paz e à segurança pública, ao meio ambiente etc. Ex II: a ação que vise impedir a poluição de um rio, pois o direito ao meio ambiente saudável é direito de todas as pessoas indeterminadamente.

Interesses Coletivos: Correspondem aos interesses de natureza indivisível de que seja titular um grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação, um vínculo jurídico. Ex: seria direito coletivo o de ingressar com uma ação que visasse impedir o desrespeito à observância do quinto constitucional na composição dos Tribunais em detrimento da classe de advogados ou dos Membros do Ministério Público. Nesta situação, é impossível a um advogado ou a um membro do Ministério Público ingressar individualmente com uma ação judicial, pois o direito é indivisível, devendo a ação competente ser pleiteada pelo órgão representativo da categoria.

Art. 10. São capazes, para fins de processo administrativo, os maiores de dezoito anos, ressalvada previsão especial em ato normativo próprio.

CAPÍTULO VIDA COMPETÊNCIA       

Art. 11. A competência é irrenunciável e se exerce pelos órgãos administrativos a que foi atribuída como própria, salvo os casos de delegação e avocação legalmente admitidos.Art. 12. Um órgão administrativo e seu titular poderão, se não houver impedimento legal, delegar parte da sua competência a outros órgãos ou titulares, ainda que estes não lhe sejam hierarquicamente subordinados, quando for conveniente, em razão de circunstâncias de índole técnica, social, econômica, jurídica ou territorial.

Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo aplica-se à delegação de competência dos órgãos colegiados aos respectivos presidentes.

        Art. 13. Não podem ser objeto de delegação:        I - a edição de atos de caráter normativo;        II - a decisão de recursos administrativos;        III - as matérias de competência exclusiva do órgão ou autoridade.

Art. 14. O ato de delegação e sua revogação deverão ser publicados no meio oficial.§ 1o O ato de delegação especificará as matérias e poderes transferidos, os limites da atuação do delegado, a duração e os objetivos da delegação e o recurso cabível, podendo conter ressalva de exercício da atribuição delegada.§ 2o O ato de delegação é revogável a qualquer tempo pela autoridade delegante.§ 3o As decisões adotadas por delegação devem mencionar explicitamente esta qualidade e considerar-se-ão editadas pelo delegado.Art. 15. Será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados, a avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior.Art. 16. Os órgãos e entidades administrativas divulgarão publicamente os locais das respectivas sedes e, quando conveniente, a unidade fundacional competente em matéria de interesse especial.Art. 17. Inexistindo competência legal específica, o processo administrativo deverá ser iniciado perante a autoridade de menor grau hierárquico para decidir.

2. DA COMPETÊNCIA

Uma das características da competência é a sua irrenunciabilidade, sendo que a mesma deverá ser exercida pelo órgão administrativo a que foi atribuída como própria. A exceção, quanto ao exercício da competência, ocorre nos casos de delegação e avocação, legalmente admitidas.

Se inexistir lei dispondo quem é o agente competente para dar início ao processo administrativo em relação à determinada matéria, o processo deverá ser iniciado perante a autoridade de menor grau hierárquico para decidir, conforme determina o artigo 17 da Lei 9.784/99.

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2.1. DA DELEGAÇÃO DE COMPETÊNCIAS

Através da leitura do artigo 12 da Lei 9.784/99, verificamos que a delegação de parte da competência (delegação parcial) de um órgão administrativo a outro (ainda que entre eles não haja hierarquia ou subordinação) é possível, desde que não haja proibição legal e desde que a mesma seja conveniente para a Administração, por motivos de ordem técnica, social, econômica, jurídica ou territorial. Portanto, a delegação independe de lei autorizativa para que se configure.

Observe que a delegação de competências poderá dar-se entre órgãos que não sejam hierarquicamente subordinados. Desta forma, há uma considerável ampliação das possibilidades de delegação fora da estrutura hierárquica na esfera federal, conforme determina a Lei 9.784/99 em seu artigo 12. Neste caso, não há uma ordem, um comando que imponha a delegação de um órgão a outro. Mas, se a delegação se der entre órgãos ligados a uma cadeia hierárquica, aí sim, haverá uma imposição do ente delegante e o dever de aceitar a delegação unilateralmente imposta por ele (dever de obediência do subordinado quanto às ordens superiores).

A lei é expressa ao apresentar situações administrativas em que é proibida a delegação, quais sejam: I - a edição de atos de caráter normativo; II - a decisão de recursos administrativos e III - as matérias de competência exclusiva do órgão ou autoridade (artigo 13). Fique muito atento a estas situações, pois são constantemente cobradas nas provas de concursos públicos!

Lembramos que o ato de delegação poderá ser revogado a qualquer tempo pela autoridade delegante. Desta forma, tanto o ato de delegação quanto o de revogação deverão ser publicados no meio de comunicação oficial utilizado pela Administração.

O ato de delegação deverá especificar:

a) as matérias transferidas;b) os poderes transferidos;c) os limites da atuação do delegado;d) a duração (prazo) da delegação;e) os objetivos (finalidades) da delegação; f) o recurso cabível eg) a ressalva (ou não) de exercício da atribuição delegada. A delegação poderá dar-se com ou sem reserva de

poderes. Na delegação “com reserva de poderes” a Administração delegante faz a ressalva de que permanecerá com poderes para praticar os atos que foram delegados. Por outro lado, a delegação “sem reserva de poderes” impede que o ente delegante pratique os atos objeto da delegação enquanto permanecer eficaz a delegação.

Por fim, o ato praticado no exercício da competência delegada terá como autoria o próprio ente delegado, ou seja, o que recebeu a delegação, sendo, portanto, o responsável pelos atos praticados no exercício desta função. Assim, poderá o eventual prejudicado ingressar com a ação de mandado de segurança contra o ato abusivo praticado pelo agente no exercício das atribuições delegadas. Portanto, ao agente que delega a competência, não há que se falar em responsabilidade pelos atos danosos do agente delegado (RDA, 96:77), haja vista que este último não age em nome do delegante, e sim, em seu próprio nome.

2.2. DA AVOCAÇÃO

A Lei 9.784/99, em seu artigo 15, permite a avocação de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior, que se dará:

a) em caráter excepcional (a avocação é exceção e não a regra);b) por motivos relevantes;c) mediante justificativa ed) temporariamente (não sendo a avocação, portanto, um ato definitivo).

CAPÍTULO VIIDOS IMPEDIMENTOS E DA SUSPEIÇÃO       

Art. 18. É impedido de atuar em processo administrativo o servidor ou autoridade que:        I - tenha interesse direto ou indireto na matéria;

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II - tenha participado ou venha a participar como perito, testemunha ou representante, ou se tais situações ocorrem quanto ao cônjuge, companheiro ou parente e afins até o terceiro grau;III - esteja litigando judicial ou administrativamente com o interessado ou respectivo cônjuge ou companheiro.Art. 19. A autoridade ou servidor que incorrer em impedimento deve comunicar o fato à autoridade competente, abstendo-se de atuar.Parágrafo único. A omissão do dever de comunicar o impedimento constitui falta grave, para efeitos disciplinares.Art. 20. Pode ser argüida a suspeição de autoridade ou servidor que tenha amizade íntima ou inimizade notória com algum dos interessados ou com os respectivos cônjuges, companheiros, parentes e afins até o terceiro grau.Art. 21. O indeferimento de alegação de suspeição poderá ser objeto de recurso, sem efeito suspensivo.

CAPÍTULO VIIIDA FORMA, TEMPO E LUGAR DOS ATOS DO PROCESSO       

Art. 22. Os atos do processo administrativo não dependem de forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir.§ 1o Os atos do processo devem ser produzidos por escrito, em vernáculo, com a data e o local de sua realização e a assinatura da autoridade responsável.§ 2o Salvo imposição legal, o reconhecimento de firma somente será exigido quando houver dúvida de autenticidade.§ 3o A autenticação de documentos exigidos em cópia poderá ser feita pelo órgão administrativo.§ 4o O processo deverá ter suas páginas numeradas seqüencialmente e rubricadas.Art. 23. Os atos do processo devem realizar-se em dias úteis, no horário normal de funcionamento da repartição na qual tramitar o processo.Parágrafo único. Serão concluídos depois do horário normal os atos já iniciados, cujo adiamento prejudique o curso regular do procedimento ou cause dano ao interessado ou à Administração.Art. 24. Inexistindo disposição específica, os atos do órgão ou autoridade responsável pelo processo e dos administrados que dele participem devem ser praticados no prazo de cinco dias, salvo motivo de força maior.Parágrafo único. O prazo previsto neste artigo pode ser dilatado até o dobro, mediante comprovada justificação.Art. 25. Os atos do processo devem realizar-se preferencialmente na sede do órgão, cientificando-se o interessado se outro for o local de realização.

CAPÍTULO IXDA COMUNICAÇÃO DOS ATOS       

Art. 26. O órgão competente perante o qual tramita o processo administrativo determinará a intimação do interessado para ciência de decisão ou a efetivação de diligências.

  § 1o A intimação deverá conter:     I - identificação do intimado e nome do órgão ou entidade administrativa;        II - finalidade da intimação;        III - data, hora e local em que deve comparecer;        IV - se o intimado deve comparecer pessoalmente, ou fazer-se representar;

V - informação da continuidade do processo independentemente do seu comparecimento;        VI - indicação dos fatos e fundamentos legais pertinentes.

§ 2o A intimação observará a antecedência mínima de três dias úteis quanto à data de comparecimento.§ 3o A intimação pode ser efetuada por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado.§ 4o No caso de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido, a intimação deve ser efetuada por meio de publicação oficial.§ 5o As intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais, mas o comparecimento do administrado supre sua falta ou irregularidade.Art. 27. O desatendimento da intimação não importa o reconhecimento da verdade dos fatos, nem a renúncia a direito pelo administrado.Parágrafo único. No prosseguimento do processo, será garantido direito de ampla defesa ao interessado.Art. 28. Devem ser objeto de intimação os atos do processo que resultem para o interessado em imposição de deveres, ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades e os atos de outra natureza, de seu interesse.

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CAPÍTULO XDA INSTRUÇÃO

Art. 29. As atividades de instrução destinadas a averiguar e comprovar os dados necessários à tomada de decisão realizam-se de ofício ou mediante impulsão do órgão responsável pelo processo, sem prejuízo do direito dos interessados de propor atuações probatórias.§ 1o O órgão competente para a instrução fará constar dos autos os dados necessários à decisão do processo.§ 2o Os atos de instrução que exijam a atuação dos interessados devem realizar-se do modo menos oneroso para estes.Art. 30. São inadmissíveis no processo administrativo as provas obtidas por meios ilícitos.Art. 31. Quando a matéria do processo envolver assunto de interesse geral, o órgão competente poderá, mediante despacho motivado, abrir período de consulta pública para manifestação de terceiros, antes da decisão do pedido, se não houver prejuízo para a parte interessada.§ 1o A abertura da consulta pública será objeto de divulgação pelos meios oficiais, a fim de que pessoas físicas ou jurídicas possam examinar os autos, fixando-se prazo para oferecimento de alegações escritas.§ 2o O comparecimento à consulta pública não confere, por si, a condição de interessado do processo, mas confere o direito de obter da Administração resposta fundamentada, que poderá ser comum a todas as alegações substancialmente iguais.Art. 32. Antes da tomada de decisão, a juízo da autoridade, diante da relevância da questão, poderá ser realizada audiência pública para debates sobre a matéria do processo.Art. 33. Os órgãos e entidades administrativas, em matéria relevante, poderão estabelecer outros meios de participação de administrados, diretamente ou por meio de organizações e associações legalmente reconhecidas.Art. 34. Os resultados da consulta e audiência pública e de outros meios de participação de administrados deverão ser apresentados com a indicação do procedimento adotado.Art. 35. Quando necessária à instrução do processo, a audiência de outros órgãos ou entidades administrativas poderá ser realizada em reunião conjunta, com a participação de titulares ou representantes dos órgãos competentes, lavrando-se a respectiva ata, a ser juntada aos autos.Art. 36. Cabe ao interessado a prova dos fatos que tenha alegado, sem prejuízo do dever atribuído ao órgão competente para a instrução e do disposto no art. 37 desta Lei.Art. 37. Quando o interessado declarar que fatos e dados estão registrados em documentos existentes na própria Administração responsável pelo processo ou em outro órgão administrativo, o órgão competente para a instrução proverá, de ofício, à obtenção dos documentos ou das respectivas cópias.Art. 38. O interessado poderá, na fase instrutória e antes da tomada da decisão, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo.§ 1o Os elementos probatórios deverão ser considerados na motivação do relatório e da decisão.§ 2o Somente poderão ser recusadas, mediante decisão fundamentada, as provas propostas pelos interessados quando sejam ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias.Art. 39. Quando for necessária a prestação de informações ou a apresentação de provas pelos interessados ou terceiros, serão expedidas intimações para esse fim, mencionando-se data, prazo, forma e condições de atendimento.Parágrafo único. Não sendo atendida a intimação, poderá o órgão competente, se entender relevante a matéria, suprir de ofício a omissão, não se eximindo de proferir a decisão.Art. 40. Quando dados, atuações ou documentos solicitados ao interessado forem necessários à apreciação de pedido formulado, o não atendimento no prazo fixado pela Administração para a respectiva apresentação implicará arquivamento do processo.Art. 41. Os interessados serão intimados de prova ou diligência ordenada, com antecedência mínima de três dias úteis, mencionando-se data, hora e local de realização.Art. 42. Quando deva ser obrigatoriamente ouvido um órgão consultivo, o parecer deverá ser emitido no prazo máximo de quinze dias, salvo norma especial ou comprovada necessidade de maior prazo.§ 1o Se um parecer obrigatório e vinculante deixar de ser emitido no prazo fixado, o processo não terá seguimento até a respectiva apresentação, responsabilizando-se quem der causa ao atraso.§ 2o Se um parecer obrigatório e não vinculante deixar de ser emitido no prazo fixado, o processo poderá ter prosseguimento e ser decidido com sua dispensa, sem prejuízo da responsabilidade de quem se omitiu no atendimento.Art. 43. Quando por disposição de ato normativo devam ser previamente obtidos laudos técnicos de órgãos administrativos e estes não cumprirem o encargo no prazo assinalado, o órgão responsável pela

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instrução deverá solicitar laudo técnico de outro órgão dotado de qualificação e capacidade técnica equivalentes.Art. 44. Encerrada a instrução, o interessado terá o direito de manifestar-se no prazo máximo de dez dias, salvo se outro prazo for legalmente fixado.Art. 45. Em caso de risco iminente, a Administração Pública poderá motivadamente adotar providências acauteladoras sem a prévia manifestação do interessado.Art. 46. Os interessados têm direito à vista do processo e a obter certidões ou cópias reprográficas dos dados e documentos que o integram, ressalvados os dados e documentos de terceiros protegidos por sigilo ou pelo direito à privacidade, à honra e à imagem.Art. 47. O órgão de instrução que não for competente para emitir a decisão final elaborará relatório indicando o pedido inicial, o conteúdo das fases do procedimento e formulará proposta de decisão, objetivamente justificada, encaminhando o processo à autoridade competente.

CAPÍTULO XIDO DEVER DE DECIDIR

Art. 48. A Administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações, em matéria de sua competência.Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.

CAPÍTULO XIIDA MOTIVAÇÃO

Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:

        I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;

        III - decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;        IV - dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;        V - decidam recursos administrativos;        VI - decorram de reexame de ofício;

VII - deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;VIII - importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.§ 1o A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.§ 2o Na solução de vários assuntos da mesma natureza, pode ser utilizado meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que não prejudique direito ou garantia dos interessados.§ 3o A motivação das decisões de órgãos colegiados e comissões ou de decisões orais constará da respectiva ata ou de termo escrito.

3. DA MOTIVAÇÃO DOS ATOSA motivação de um ato administrativo é a justificativa expressa, escrita, dos motivos que levaram a

Administração Pública à prática do ato. Em outras palavras, é a exposição, por escrito, dos motivos de fato e de direito que culminaram na prática do ato administrativo.

Observemos que o artigo 50 da Lei 9.784/99 traz expressamente as circunstâncias em que é obrigatória a motivação do ato administrativo, sugerindo, assim, que os demais atos praticados pela Administração estão dispensados dela. Vejamos:

“Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos quando:I – neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;II – imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;III – decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;IV – dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;V – decidam recursos administrativos;VI – decorram de reexame de ofício;VII – deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;

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VIII – “importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.”

O fato é que a edição deste artigo não proíbe a Administração de motivar outros atos que não estejam expressos nele, tais como os atos “ampliativos de direitos”, os que reconhecem um direito do particular ou aumentam a abrangência de um direito já reconhecido. Contudo, não podemos nos esquecer de que a maioria dos doutrinadores defendem, ainda, a tese de que todos os atos vinculados praticados pela Administração devem ser motivados. Com relação aos atos discricionários, se a lei for omissa quanto à obrigatoriedade de motivação, entendem os estudiosos do ramo que, da mesma forma que os atos vinculados, também devem ser motivados. Apesar deste posicionamento da doutrina, o artigo 50 da Lei 9.784/99 inovou, pelo menos na esfera federal, apresentando expressamente as hipóteses que devem ser motivadas, independente de os atos serem vinculados ou discricionários, levando em consideração a importância deles. DA DESISTÊNCIA E OUTROS CASOS DE EXTINÇÃO DO PROCESSO

Art. 51. O interessado poderá, mediante manifestação escrita, desistir total ou parcialmente do pedido formulado ou, ainda, renunciar a direitos disponíveis.§ 1o Havendo vários interessados, a desistência ou renúncia atinge somente quem a tenha formulado.§ 2o A desistência ou renúncia do interessado, conforme o caso, não prejudica o prosseguimento do processo, se a Administração considerar que o interesse público assim o exige.Art. 52. O órgão competente poderá declarar extinto o processo quando exaurida sua finalidade ou o objeto da decisão se tornar impossível, inútil ou prejudicado por fato superveniente.

CAPÍTULO XIVDA ANULAÇÃO, REVOGAÇÃO E CONVALIDAÇÃO       

Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.§ 1o No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.§ 2o Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à  validade do ato.Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração.

4. Da ConvalidaçãoConvalidação (ou sanatória) é a correção de um ato administrativo eivado de vícios passíveis de correção (haja

vista que tais vícios não são graves), com eficácia retroativa (ex tunc). Nestes casos, o ato é denominado de “ato anulável”. Lembramos que o ato não passível de convalidação (por conter vício grave) é tido como “nulo” (e não anulável).

Mas o ato portador de defeitos sanáveis (passível de correção) somente poderá ser convalidado expressamente se não houver prejuízo ao interesse público ou a terceiros.

Conforme dispõem os doutrinadores, são sanáveis os atos com:a) vício no elemento “competência”, quando não-exclusiva do órgão ou da autoridade eb) vício no elemento “forma”, quando não essencial à validade do ato.O prazo legal para a Administração anular seus atos irregulares, independente do vício que apresentam, é de

cinco anos. Após este período, que a doutrina e a própria lei 9.784/99 denominam de decadencial, não poderá mais o ato ser anulado e diz-se ter havido a convalidação tácita. Ressalva se faz quando o particular tiver agido com má-fé, haja vista que, nestas situações, deverá a Administração anular o ato (mesmo após o período retro mencionado).

Resumindo, verificamos o seguinte:a) Os atos benéficos aos administrados (salvo comprovada má-fé de sua parte), mas com

irregularidades insanáveis, deverão ser anulados pela Administração. Mas se esta, dentro do prazo de cinco anos, assim não proceder, ocorrerá a denominada convalidação tácita (subentendida) e o ato não mais poderá ser anulado, estando definitivamente assegurados os direitos dele decorrentes. O que não pode ocorrer nesta situação é a convalidação expressa, uma vez que o defeito do ato é grave, insanável;

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b) Os atos portadores de defeitos sanáveis podem (discricionariamente) ser convalidados expressamente pela Administração desde que tal medida não resulte em lesão ao interesse público ou a terceiros (convalidação expressa). Se tais atos não forem anulados e nem convalidados expressamente, subentende-se que foram convalidados tacitamente (convalidação tácita).

c) Em verdade, na convalidação tácita, não importa se o defeito do ato administrativo é sanável ou não. Depois de transcorrido o prazo decadencial de cinco anos, a Administração Pública não mais poderá anulá-lo, salvo se comprovada má-fé do beneficiário do ato.

CAPÍTULO XVDO RECURSO ADMINISTRATIVO E DA REVISÃO

Art. 56. Das decisões administrativas cabe recurso, em face de razões de legalidade e de mérito.§ 1o O recurso será dirigido à autoridade que proferiu a decisão, a qual, se não a reconsiderar no prazo de cinco dias, o encaminhará à autoridade superior.§ 2o Salvo exigência legal, a interposição de recurso administrativo independe de caução.§ 3o  Se o recorrente alegar que a decisão administrativa contraria enunciado da súmula vinculante, caberá à autoridade prolatora da decisão impugnada, se não a reconsiderar, explicitar, antes de encaminhar o recurso à autoridade superior, as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 11.417, de 2006).

Art. 57 O recurso administrativo tramitará no máximo por três instâncias administrativas, salvo disposição legal diversa.

Se a lei, em seu artigo 57, determina que haverá, no máximo (salvo disposição legal em contrário), três instâncias recursais, isto significa que, em regra, o processo como um todo tramitará por, no máximo, quatro instâncias (a inicial e mais três recursais).

        Art. 58. Têm legitimidade para interpor recurso administrativo:        I - os titulares de direitos e interesses que forem parte no processo;

Com relação ao inciso I, observamos que, se o particular possui o direito constitucional de petição, certamente também terá o direito de ingressar com o recurso competente contra a decisão proferida pela autoridade administrativa.        

III - aqueles cujos direitos ou interesses forem indiretamente afetados pela decisão recorrida;

Quanto ao inciso II, é de se notar que, mesmo não sendo o particular uma das “partes” do processo, poderá ingressar com recurso administrativo caso a decisão venha a afetar indiretamente um direito ou interesse dele; direito este que sequer estava sendo discutido no processo administrativo. Citamos como exemplo o fato da Administração revogar ato de permissão para instalar um restaurante turístico em uma determinada área pública. O particular, dono do estabelecimento, que teve a permissão revogada, poderá interpor recurso administrativo. Um fornecedor de bebidas, que mantinha contrato em vigor com o permissionário (titular do direito), por se sentir prejudicado, também terá legitimidade para recorrer da decisão da Administração, uma vez que a decisão afeta indiretamente os interesses dele.

III - as organizações e associações representativas, no tocante a direitos e interesses coletivos;        IV - os cidadãos ou associações, quanto a direitos ou interesses difusos.

Art. 59. Salvo disposição legal específica, é de dez dias o prazo para interposição de recurso administrativo, contado a partir da ciência ou divulgação oficial da decisão recorrida.§ 1o Quando a lei não fixar prazo diferente, o recurso administrativo deverá ser decidido no prazo máximo de trinta dias, a partir do recebimento dos autos pelo órgão competente.§ 2o O prazo mencionado no parágrafo anterior poderá ser prorrogado por igual período, ante justificativa explícita.Art. 60. O recurso interpõe-se por meio de requerimento no qual o recorrente deverá expor os fundamentos do pedido de reexame, podendo juntar os documentos que julgar convenientes.Art. 61. Salvo disposição legal em contrário, o recurso não tem efeito suspensivo.

Se o recurso contra a decisão administrativa não tiver efeito suspensivo, então a decisão recorrida pelo particular, uma vez prolatada pela Administração, já se encontra apta a produzir seus normais efeitos. Porém, se o recurso tiver efeito suspensivo, a decisão administrativa terá seus efeitos suspensos até a decisão do recurso. Enquanto isto, não há que se falar em decisão produzindo efeitos. Assim, com base no dispositivo legal estudado, vimos que, como regra geral, os recursos administrativos não possuem efeito suspensivo, salvo se houver lei em contrário tratando do tema ou se ficar caracterizada a circunstância descrita no parágrafo único abaixo citado.

Parágrafo único. Havendo justo receio de prejuízo de difícil ou incerta reparação decorrente da execução, a autoridade recorrida ou a imediatamente superior poderá, de ofício ou a pedido, dar efeito suspensivo ao recurso.

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A Administração poderá, por iniciativa própria (de ofício), dar efeito suspensivo ao recurso. O recorrente (particular que ingressou com o recurso) também poderá requerê-lo.Lembremos que a Administração possui o Poder Hierárquico, o que faz com que as decisões prolatadas por uma autoridade possam ser revogadas ou anuladas pela autoridade hierarquicamente superior a ela (autotutela da Administração).

Art. 62. Interposto o recurso, o órgão competente para dele conhecer deverá intimar os demais interessados para que, no prazo de cinco dias úteis, apresentem alegações.

       Art. 63. O recurso não será conhecido quando interposto:        I - fora do prazo;        II - perante órgão incompetente;        III - por quem não seja legitimado;        IV - após exaurida a esfera administrativa.Quando o recorrente satisfaz todas as exigências procedimentais para ingressar com um recurso administrativo, dizemos que ele cumpriu com os requisitos ou pressupostos de admissibilidade do recurso. Desta forma, a Administração conhecerá do recurso e prolatará a sua decisão. Contudo, os incisos I a IV do artigo 63 descrevem situações que, ocorrendo, ensejam o não conhecimento do recurso. Assim, o recurso sequer será julgado pela Administração.

§ 1o Na hipótese do inciso II, será indicada ao recorrente a autoridade competente, sendo-lhe devolvido o prazo para recurso.§ 2o O não conhecimento do recurso não impede a Administração de rever de ofício o ato ilegal, desde que não ocorrida preclusão administrativa.

Por este dispositivo legal, mesmo que o recurso interposto pelo particular não seja recebido, por não ter preenchido os requisitos de admissibilidade dele, poderá a Administração rever, por iniciativa própria (de ofício), o ato que apresente vício de legalidade. Mas, para rever o ato, não poderá ter ocorrido a preclusão administrativa, ou seja, o encerramento das vias administrativas.

Art. 64. O órgão competente para decidir o recurso poderá confirmar, modificar, anular ou revogar, total ou parcialmente, a decisão recorrida, se a matéria for de sua competência.Parágrafo único. Se da aplicação do disposto neste artigo puder decorrer gravame à situação do recorrente, este deverá ser cientificado para que formule suas alegações antes da decisão.Art. 64-A.  Se o recorrente alegar violação de enunciado da súmula vinculante, o órgão competente para decidir o recurso explicitará as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 11.417, de 2006).Art. 64-B.  Acolhida pelo Supremo Tribunal Federal a reclamação fundada em violação de enunciado da súmula vinculante, dar-se-á ciência à autoridade prolatora e ao órgão competente para o julgamento do recurso, que deverão adequar as futuras decisões administrativas em casos semelhantes, sob pena de responsabilização pessoal nas esferas cível, administrativa e penal. (Incluído pela Lei nº 11.417, de 2006).Art. 65. Os processos administrativos de que resultem sanções poderão ser revistos, a qualquer tempo, a pedido ou de ofício, quando surgirem fatos novos ou circunstâncias relevantes suscetíveis de justificar a inadequação da sanção aplicada.Parágrafo único. Da revisão do processo não poderá resultar agravamento da sanção.

CAPÍTULO XVIDOS PRAZOS

Art. 66. Os prazos começam a correr a partir da data da cientificação oficial, excluindo-se da contagem o dia do começo e incluindo-se o do vencimento.§ 1o Considera-se prorrogado o prazo até o primeiro dia útil seguinte se o vencimento cair em dia em que não houver expediente ou este for encerrado antes da hora normal.

        § 2o Os prazos expressos em dias contam-se de modo contínuo.§ 3o Os prazos fixados em meses ou anos contam-se de data a data. Se no mês do vencimento não houver o dia equivalente àquele do início do prazo, tem-se como termo o último dia do mês.Art. 67. Salvo motivo de força maior devidamente comprovado, os prazos processuais não se suspendem.

CAPÍTULO XVIIDAS SANÇÕES       

Art. 68. As sanções, a serem aplicadas por autoridade competente, terão natureza pecuniária ou consistirão em obrigação de fazer ou de não fazer, assegurado sempre o direito de defesa.

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CAPÍTULO XVIIIDAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 69. Os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei.

        Art. 70. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.        Brasília 29 de janeiro de 1999; 178o da Independência e 111o da República.

CAPÍTULO VIIILEI 8.429/92(LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA)

1. IntroduçãoDiz o artigo 37, parágrafo quarto, da CF/88 que “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão

dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”. Posteriormente, regulamentando o artigo 37 acima exposto, foi editada a Lei 8.429/92, que dispõe sobre os atos de improbidade administrativa praticados por agente público (servidor ou não) contra o Poder Público, nas três esferas de governo: federal, estadual ou municipal.

2. Dos deveres do administrador públicoÉ sabido que, dentre os deveres do administrador público, está o de pautar-se pelos princípios da honestidade e

moralidade, quer em face dos administrados, quer em face da Administração Pública.

3. Conceitos de Improbidade Administrativa

3.1. Kiyoshi Harada nos trás o conceito de improbidade administrativa, como sendo “aquele praticado por agente público, contrário às normas da moral, à lei e aos bons costumes, ou seja, aquele ato que indica falta de honradez e de retidão de conduta no modo de proceder perante a Administração pública direta, indireta, ou fundacional, nas três esferas políticas”.

3.2. Para Alexandre de Moraes, os atos de improbidade administrativa “são aqueles que, possuindo natureza civil e devidamente tipificados em lei federal, ferem direta ou indiretamente os princípios constitucionais e legais da administração pública, independentemente de importarem enriquecimento ilícito ou de causarem prejuízo material ao erário público”.

4. Perguntas referentes à Lei 8.429/92

4.1. Qual é o objeto (ou conteúdo) da Lei 8.429/92? Diz a Lei: A Lei de Improbidade administrativa dispõe acerca das sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública.

Comentários do professor: Atenção! Embora a Lei em estudo disponha, em seu preâmbulo, que seu conteúdo trata das sanções aplicáveis aos agentes que tenham enriquecido ilicitamente no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, podemos verificar, mais abaixo, que os atos de improbidade são classificados em três espécies, a saber: a) os que dão ensejo a enriquecimento ilícito; b) os que geram prejuízo ao erário e c) os que atentam contra os princípios da Administração pública.

4.2. Quem poderá vir a ser considerado como autor de ato de improbidade administrativa? Diz a Lei: Qualquer agente público seja ele servidor ou não.

Comentários do professor: Na verdade, devemos observar que a lei de improbidade administrativa tem como destinatários todos os agentes públicos (independente de qual for a vinculação que os mesmos têm com o Poder Público), bem como os que, não sendo agentes públicos, induzam ou concorram para as condutas de improbidade ou delas se beneficiem, direta ou indiretamente. Neste último caso, verificamos que um particular pode cometer ato de improbidade administrativa, desde que haja a presença de um agente público na perpetração do ilícito e ele tenha induzido ou concorrido na prática do ato de improbidade.Caso contrário, se o ilícito causador de dano à Administração for praticado pelo particular sem a concorrência de um agente público, não há que se falar na prática de um ato de improbidade descrito na Lei 8.429/92, mas tão-somente na prática de um ato ilícito danoso ao Poder Pùblico. Por óbvio, não haverá para o particular a perda da função pública, por estar ausente tal requisito.

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4.3. O ato de improbidade se dará contra quem, ou seja, quem poderá ser a pessoa lesada com o ato de improbidade administrativa praticado pelo agente público? Diz a Lei: a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.

4.4. Quem podemos considerar como agentes públicos para os efeitos desta lei? Diz a Lei: reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas na pergunta anterior.

Comentários do professor: Segundo alguns doutrinadores, os agentes públicos podem ser classificados em:

a) agentes políticos: são os componentes do Governo nos seus primeiros escalões, investidos em cargos, funções, mandatos ou comissões, possuindo funções de direção e orientação delineadas na CF/88. Portanto, suas atribuições são oriundas diretamente da Constituição. Normalmente suas funções são de caráter transitório. Em regra, sua investidura se dá por eleição, nomeação, delegação ou designação, sem necessidade de concurso público, que lhes confere (a investidura) o direito a um mandato eletivo, não se sujeitando às regras comuns, ou seja, aos regimes jurídicos funcionais aplicáveis aos servidores e empregados públicos em geral, e sim, às regras estabelecidas pela própria Constituição. Desta forma, não se lhes aplica a Lei 8.112/90, mas basicamente as prerrogativas constantes no Direito Constitucional. São exemplos: Chefes do Executivo (presidente, governadores e prefeitos); Ministros, Secretários Estaduais, Secretários Municipais e Distritais (todos auxiliares dos Chefes do Executivo) e os Parlamentares (membros do Poder Legislativo: Senadores, Deputados Federais/Estaduais/Distritais e Vereadores). Quanto aos parlamentares, temos a dizer que seus suplentes não são considerados agentes públicos enquanto não estiverem no exercício da função pública. É de se verificar, também, que os agentes políticos não são hierarquizados entre si, exercendo suas atribuições com independência funcional. Exceção ocorre quanto aos auxiliares diretos dos Chefes do Executivo, tais como os Ministros de Estado e Secretários Estaduais e Municipais, haja vista serem diretamente subordinados aos seus respectivos Chefes.

Atenção! Hely Lopes Meirelles acresce, ainda, a esta classificação, os Magistrados (desde os que atuam na Primeira Instância Judiciária até os Ministros dos Tribunais Superiores e do STF), os membros do Ministério Público Federal ou Estadual e os Ministros e Conselheiros dos Tribunais de Contas. Mas, diga-se de passagem, este último raciocínio não é aceito por alguns doutrinadores de renome, tais como Celso Antonio Bandeira de Mello, Maria Sylvia Di Pietro, Celso Antonio Bandeira de Mello e José dos Santos Carvalho Filho. Aliás, este último acrescenta em sua obra que “o que caracteriza o agente político não é o só fato de serem mencionados na Constituição, mas sim o de exercerem efetivamente (e não eventualmente) função política, de governo e administração, de comando e, sobretudo, de fixação das estratégias de ação, ou seja, aos agentes políticos é que cabe realmente traçar os destinos do país.” Seguindo este raciocínio, observamos que os magistrados, por exemplo, não interferem diretamente nos objetivos políticos da nação. Contudo, diversas provas de concursos públicos acatam a doutrina defendida por Hely Lopes Meirelles, sendo que a mesma é aceita, também, pelo Supremo Tribunal Federal.

b) Agentes Particulares Colaboradores com o Poder Público: embora sejam particulares, são requisitados para a execução de certas funções especiais qualificadas como públicas, haja vista a existência de um vínculo jurídico os ligando ao Estado. Desta forma, desempenham um múnus público (dever de cidadania). Suas funções são transitórias e, em regra, não remuneradas. Em compensação, recebem benefícios colaterais, como o apostilamento da situação nos prontuários funcionais ou a concessão de um período de descanso remunerado após o desempenho das tarefas. Ex: jurados, mesários nas eleições, comissários de menores voluntários, os titulares de ofícios de notas e de registro não oficializados (art. 236 da CF/88) e os concessionários e permissionários de serviços públicos. Podemos acrescentar, ainda, segundo alguns doutrinadores, os recrutados para o serviço militar obrigatório e os contratados por locação civil de serviços (como um advogado de notório saber. Os agentes honoríficos, delegados e credenciados, segundo a classificação adotada pelo professor Hely Lopes Meirelles enquadram-se nesta categoria (agentes particulares colaboradores com o Poder Pùblico), adotada por outros doutrinadores.

c) Servidores Estatais: é a categoria que engloba o maior número de integrantes. Alguns autores preferem utilizar a expressão “agentes administrativos”, e outros, a de “funcionários públicos” (esta última expressão foi

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banida pela atual Constituição). Integram a Administração Direta e Indireta. Possuem, em regra, vínculo permanente de trabalho. Atuam mediante subordinação (hierarquia) no desempenho de suas atividades funcionais e recebimento de remuneração pelas atividades executadas (vencimentos, para os servidores, e salário para os trabalhadores da iniciativa privada). Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, os agentes estatais compreendem: a) os servidores titulares de cargos públicos na Administração Direta, autárquica e fundacional de direito público, b) os servidores empregados da Administração Direta e de todas as entidades da Administração Indireta, e c) os contratados temporariamente para atender à necessidade transitória de excepcional interesse público;

Mas, muita Atenção ! segundo a classificação adotada pelo professor Hely Lopes Meirelles, muito cobrada em concursos públicos, os agentes públicos compõem-se de cinco grupos/espécies a saber:

a) Agentes Políticos: vide conceito acima exposto.

b) Agentes Administrativos: esta classificação é constituída por todos aqueles que exercem um cargo, emprego ou função pública, com vínculo empregatício junto ao Poder Público (ou seja, exercem suas funções a título de profissão), com subordinação hierárquica e mediante remuneração (portanto, não atuam de forma gratuita), exercendo as atribuições a eles cometidas pela lei. Os agentes administrativos estão sujeitos à hierarquia funcional do órgão ou entidade a qual desempenham suas atribuições. Integram os quadros da Administração Direta e Indireta. Incluem-se nesta classificação os servidores públicos (titulares de cargos efetivos ou em comissão), os empregados públicos e os contratados temporários (em virtude de necessidade excepcional de interesse público).

b.1. Servidores Públicos: são agentes administrativos. Ocupam cargos efetivos (mediante aprovação em concurso público) ou em comissão (livre nomeação e exoneração). Estão sujeitos ao regime estatutário, de natureza eminentemente legal, e passível de alteração unilateral, desde que respeitados os direitos adquiridos do servidor. Integram a Administração Direta, suas autarquias e fundações públicas com personalidade jurídica de direito público. Os servidores ocupantes de cargo efetivo podem adquirir a estabilidade.

b.2. Empregados Públicos: são agentes administrativos. Necessitam de aprovação em concurso público. Ocupam permanentemente um emprego público. Encontram-se regrados pela CLT. Seu vínculo com a Administração tem caráter contratual, não sendo passível de alteração unilateral. Integram a Administração Direta e Indireta (ressalvadas as funções típicas de Estado). Atenção! A atual Constituição não adotou a expressão “funcionário público”, motivo pelo qual referido vocábulo encontra-se em franco desuso, salvo, ainda, no âmbito do direito penal. Assim, a expressão funcionário público, no Direito Penal, deve ser entendida como agente público no Direito Administrativo, devendo cada uma ser utilizada em suas respectivas áreas jurídicas.

c) Agentes Honoríficos: são agentes públicos. Através de requisição, designação ou nomeação prestam serviços públicos relevantes. Desempenham suas tarefas a título de múnus público, ou seja, no cumprimento de um dever de cidadania. Em regra, não há vínculo profissional com o Estado e seu trabalho é não-remunerado. Mas esta regra não é absoluta, uma vez que os conscritos, por exemplo, possuem relação de emprego com o Estado e são remunerados pelo exercício de suas atividades. Da mesma forma, os membros dos Conselhos Tutelares são atualmente remunerados em diversos Estados brasileiros. Para fins penais, são tidos como funcionários públicos. Ex: mesários, jurados, membros de conselhos em geral e os conscritos (os que estão prestando o serviço militar obrigatório).

d) Agentes Delegados: são agentes públicos. Compõe esta espécie os particulares que prestam atividades, serviços públicos ou executam obras em seu próprio nome e por sua conta e risco (portanto, não são tidos como agentes administrativos, uma vez que não há subordinação entre eles e Poder Público). Assim, enquanto que os demais agentes atuam em nome do Poder Público, os delegados – e somente eles - agem em seu próprio nome. Em regra, tais agentes desempenham suas tarefas mediante delegação do Estado. Ex: tradutores, intérpretes, leiloeiros públicos, autorizatários, permissionários e concessionários de serviços públicos.

e) Agentes Credenciados: são agentes públicos. Compõe esta espécie os convocados ou convidados a fim de representar o Poder Público em determinada solenidade ou para desempenhar alguma tarefa específica. Não têm vínculo profissional com o Estado. O que os diferencia dos agentes honoríficos está no fato de, em regra, serem remunerados pelo exercício de suas atividades. Para fins penais, são tidos como funcionários públicos. Ex: agente convocado para representar o país numa solenidade internacional ou o convite endereçado a um notório advogado para pertencer a uma comissão responsável pela elaboração de um projeto de lei.

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4.5. As disposições da lei de improbidade poderão alcançar, também, outras pessoas que não sejam classificadas como agentes públicos? Diz a Lei: as disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àqueles que, mesmo não sendo agentes públicos, induzam ou concorram para a prática do ato de improbidade administrativa ou dele se beneficiem sob qualquer forma direta ou indireta.

Comentários do professor: Caso o terceiro (que não é agente público) seja beneficiado com a ação ilícita de outrem, incorrerá nas disposições previstas na lei de improbidade administrativa. Verifica-se, assim, que a Lei de Improbidade não exige que o agente seja servidor público, prevendo taxativamente que não se exigirá tal condição para aplicação das disposições nela previstas. Portanto, mesmo que um particular não induza ou concorra com o agente público para a prática de um ato de improbidade, ele estará sujeito às disposições da Lei 8.429/92 sempre que se beneficiar (direta ou indiretamente), de um ato de improbidade praticado pelo agente público. Exemplo: se o pai de um agente ímprobo recebe de presente um automóvel, deverá devolvê-lo ao Poder Público.

4.6. Quais princípios expressos pela lei de improbidade devem ser observados por todos os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia? Diz a Lei: Legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade.

Comentários do professor: embora a lei de improbidade administrativa não tenha trazido expressamente os demais princípios que a administração deve obediência (eficiência, motivação, proporcionalidade, razoabilidade etc.), ela deverá respeitá-los.

4.7. Em quais situações dar-se-á o integral ressarcimento do dano (lesão) causado ao patrimônio público? Diz a Lei: nos casos de ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente público ou de terceiro.

4.8. Em havendo enriquecimento ilícito, qual será a conseqüência? Diz a Lei: O agente público ou terceiro beneficiário perderão os bens e valores acrescidos indevidamente ao seu patrimônio.

4.9. Em quais situações deverá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público para a indisponibilidade dos bens do indiciado que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito? Diz a Lei: Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito.

4.10. Os sucessores daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se enriquecer ilicitamente também estarão sujeitos às cominações da lei 8.429/92? Diz a Lei: Sim, porém se responsabilizarão somente até o limite do valor da herança deixada pelo falecido.

Comentários do professor: esta é uma regra geral de responsabilidade aplicável aos herdeiros e legatários do “de cujus” (falecido) que enriqueceu ilicitamente ou causou dano ao erário (quando em vida), por ato doloso ou culposo, e que vem expressa, também, na Lei 8.429/92 em seu artigo 8º.

4.11. Cite as espécies de atos de improbidade administrativa: a) os que importam enriquecimento ilícito; b) os que causam prejuízo ao erário e c) os que atentam contra os princípios da Administração Pública.

4.12. Quando o ato de improbidade administrativa importa enriquecimento ilícito? Quando o agente público ou terceiro:

a) auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º da Lei 8.429/92;

Comentários do professor: Citamos como exemplos de vantagens patrimoniais indevidas o ato de receber quaisquer títulos ou documentos representativos de valor, tais como títulos da dívida pública, ações, cheques, notas promissórias etc; obter empréstimos ou adquirir ações ou cotas de sociedades por preço inferior ao real praticado no mercado, ou utilizar serviços, locar móveis ou imóveis, transporte ou hospedagens gratuitos.

b) receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;

c) perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas no art. 1° da Lei 8.429/92 por preço superior ao valor de mercado;

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       d) perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação, permuta ou locação de bem público ou o fornecimento de serviço por ente estatal por preço inferior ao valor de mercado;

e) utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1° da Lei 8.429/92, bem como o trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros contratados por essas entidades;

        f) receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar a exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de contrabando, de usura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou aceitar promessa de tal vantagem;

        g) receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer declaração falsa sobre medição ou avaliação em obras públicas ou qualquer outro serviço, ou sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens fornecidos a qualquer das entidades mencionadas no art. 1º da lei 8.429/92;

        h) adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público;

        i) aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento para pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a atividade;

        j) perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba pública de qualquer natureza;

        l) receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado;

        m) incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° da Lei 8.429/92;

        n) usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° da Lei 8.429/92.

Comentários do professor: observemos que o rol de condutas da lei é apenas exemplificativo.

4.13. Quando o ato de improbidade administrativa importa prejuízo (lesão) ao erário?

a) qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

        b) facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;

        c) permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;

        d) doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie;

        e) permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta lei, ou ainda a prestação de serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado;

        f) permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado;

        g) realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares ou aceitar garantia insuficiente ou inidônea;

        h) conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;

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        i) frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;

        j) ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;

        l) agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público;

        m) liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;

        n) permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;

        o) permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de servidor público, empregados ou terceiros contratados por essas entidades;

        p) celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na lei; (Incluído pela Lei nº 11.107, de 2005);

        q) celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei. (Incluído pela Lei nº 11.107, de 2005)

4.14. Quando o ato de improbidade administrativa importa ATENTADO CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA?

a) qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente;

        b) praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

        c) retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;

        d) revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo;

        e) negar publicidade aos atos oficiais;

        f) frustrar a licitude de concurso público;

        g) deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;

        h) revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.

CAPÍTULO IIIDas Penas

4.15. O responsável pelo ato de improbidade administrativa estará sujeito às cominações (penalidades) descritas na Lei 8.429-92. Mas, além destas cominações, poderá ele estar sujeito, ainda, às sanções penais, civis ou administrativas previstas na legislação específica? Diz a Lei: sim, conforme determina o artigo 12 da Lei 8.429/92.

Comentários do professor: Conforme nos ensina Marcelo Figueiredo em sua obra, Probidade Administrativa, “A responsabilidade penal decorre da prática de crimes funcionais previstos no Código Penal. A responsabilidade civil decorre da prática ou omissão, dolosa ou culposa, de atos de servidores causadores de um dano patrimonial à Administração. Por fim, a responsabilidade administrativa advém do descumprimento de regras da administração, da violação de normas funcionais, do irregular desempenho da função pública”. E continua o renomado autor: “A ação de improbidade é ação de natureza civil, de rito ordinário, e tem por escopo fundamental identificar e punir atos de improbidade... Permite a ação de improbidade identificar o agente, classificar a conduta e puni-lo com ressarcimento do patrimônio público, se for o caso. A Lei de Improbidade, recorde-se, não é norma penal, adotada a visão clássica de privação de liberdade. Restringe direitos políticos, bloqueia bens e direitos, atinge o patrimônio, o crédito e o regular desenvolvimento da atividade da pessoa ou da empresa.”

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Não devemos nos esquecer de que a CF/88 faz referência, em seu artigo 37, parágrafo quarto, às seguintes penalidades: suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

4.16. Qual será a cominação (pena) imposta pela Lei 8.429/92 quando o ato de improbidade administrativa tiver importado enriquecimento ilícito? Diz a Lei: Perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.

4.17. Qual será a cominação (pena) imposta pela Lei 8.429/92 quando o ato de improbidade administrativa tiver importado prejuízo (lesão) ao erário? Diz a Lei: Ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.

4.18. Qual será a cominação (pena) imposta pela Lei 8.429/92 quando o ato de improbidade administrativa tiver importado atentado contra os princípios da administração pública? Diz a Lei: Ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

Comentários do professor: podemos visualizar esta parte da matéria através da seguinte tabela:

EnriquecimentoIlícito

Dano ao PatrimônioPúblico

Atentado a Princípios

Perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio.

Sim. Sim, se concorrer esta circunstância. ------

Ressarcimento integral do dano.

Sim, quando houver. Sim. Sim, se houver.

Perda da função pública. Sim. Sim. Sim.Suspensão dos direitos políticos.

De 8 a 10 anos. De 5 a 8 anos. De 3 a 5 anos.

Pagamento de multa civil.

De até 3x o valor do acréscimo patrimonial.

De até 2x o valor do dano. de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente

Proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos.

Pelo prazo de 10 anos. Pelo prazo de 05 anos. Pelo prazo de 03 anos.

4.19. Qual critério adotará o juiz para fixar as penas previstas na Lei 8.429/92 acima estudadas? Diz a Lei: Na fixação das penas previstas na Lei 8.429/92 o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.

CAPÍTULO IVDa Declaração de Bens

4.20. Visando obedecer às determinações da Lei de Improbidade, como deve proceder a Administração Pública diante dos atos de posse e de exercício de seus agentes públicos? Diz a Lei: a posse e o exercício de agente público ficam condicionados à apresentação de declaração dos bens e valores que compõem o seu patrimônio privado, a fim de ser arquivada no serviço de pessoal competente.

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4.21. Quais informações devem constar da declaração de bens e valores apresentada pelo agente público? Diz a Lei: a declaração compreenderá imóveis, móveis, semoventes, dinheiro, títulos, ações, e qualquer outra espécie de bens e valores patrimoniais, localizados no País ou no exterior, e, quando for o caso, abrangerá os bens e valores patrimoniais do cônjuge ou companheiro, dos filhos e de outras pessoas que vivam sob a dependência econômica do declarante, excluídos apenas os objetos e utensílios de uso doméstico.

4.22. Com qual periodicidade deve ser apresentada a declaração de bens e valores pelo agente público?  Diz a Lei: a declaração de bens será anualmente atualizada e na data em que o agente público deixar o exercício do mandato, cargo, emprego ou função.

4.23. Qual é a penalidade aplicada pela Administração caso o agente público apresente declaração falsa ou se recuse a prestá-la dentro do prazo determinado? Diz a Lei: o agente público será punido com a pena de demissão, a bem do serviço público, sem prejuízo de outras sanções cabíveis. Observação: o agente público (declarante), se assim o desejar, poderá entregar cópia da declaração anual de bens apresentada à Delegacia da Receita Federal, com as necessárias atualizações, para suprir a exigência contida no caput e no § 2° deste artigo .

CAPÍTULO VDo Procedimento Administrativo e do Processo Judicial

4.24. Quais são as pessoas com capacidade para representar à autoridade administrativa competente para que seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade? Diz a Lei: Qualquer pessoa.

4.25. De que forma se dará a representação? Diz a Lei: a representação se dará na forma escrita ou oral (mas, neste último caso, a representação será reduzida a termo) e deverá ser assinada.

4.26. Quais informações deverão estar presentes na representação? A qualificação do representante, as informações sobre o fato e sua autoria e a indicação das provas de que tenha conhecimento.

4.27. Pode a autoridade administrativa competente rejeitar a representação? Sim, se a representação não contiver as formalidades acima requeridas. Porém, ressalte-se que a rejeição não impede a representação ao Ministério Público.

4.28. A rejeição da representação deverá ser motivada? Sim. A autoridade administrativa deverá apresentar despacho fundamentado justificando o porquê da rejeição da representação.

OBS: Atendidos os requisitos da representação, a autoridade determinará a imediata apuração dos fatos que, em se tratando de servidores federais, será processada na forma prevista nos arts. 148 a 182 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990 e, em se tratando de servidor militar, de acordo com os respectivos regulamentos disciplinares.

4.29. Em havendo procedimento formalizado para apuração da prática de ato de improbidade administrativa, qual providência deverá ser adotada pela comissão processante? Diz a Lei: Referida comissão deverá dar conhecimento ao Ministério Público e ao Tribunal ou Conselho de Contas da existência de procedimento administrativo para apurar a prática de ato de improbidade, sendo que o Ministério Público ou Tribunal ou Conselho de Contas poderá, a requerimento, designar representante para acompanhar o procedimento administrativo.

4.30. Como deverá agir a comissão em havendo fundados indícios de responsabilidade? A comissão representará ao Ministério Público ou à procuradoria do órgão para que requeira ao juízo competente a decretação do seqüestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimônio público. O pedido de seqüestro será processado de acordo com o disposto nos arts. 822 e 825 do Código de Processo Civil.

OBS: Quando for o caso, o pedido incluirá a investigação, o exame e o bloqueio de bens, contas bancárias e aplicações financeiras mantidas pelo indiciado no exterior, nos termos da lei e dos tratados internacionais.

A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput.

        § 2º A Fazenda Pública, quando for o caso, promoverá as ações necessárias à complementação do ressarcimento do patrimônio público.

        § 3o  No caso de a ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se, no que couber, o disposto no § 3 o do art. 6 o da Lei n o 4.717, de 29 de junho de 1965 .

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        § 4º O Ministério Público, se não intervir no processo como parte, atuará obrigatoriamente, como fiscal da lei, sob pena de nulidade.

        § 5o  (Vide Medida Provisória nº 2.180-34, de 2001)

        § 6o  (Vide Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

        § 7o  (Vide Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

        § 8o  (Vide Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

        § 9o  (Vide Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

        § 10. (Vide Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

        § 11. (Vide Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

        § 12.(Vide Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)

        Art. 18. A sentença que julgar procedente ação civil de reparação de dano ou decretar a perda dos bens havidos ilicitamente determinará o pagamento ou a reversão dos bens, conforme o caso, em favor da pessoa jurídica prejudicada pelo ilícito.

CAPÍTULO VIDas Disposições Penais

Qual é a penalidade para aquele que apresenta uma representação por ato de improbidade contra agente público ou terceiro beneficiário, quando o autor da denúncia o sabe inocente? Constitui crime, punível com a detenção de seis a dez meses e multa. Além da sanção penal, o denunciante está sujeito a indenizar o denunciado pelos danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado.

Comentários do professor: Conforme dispõe a súmula 37 do STJ, “são cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato”.

Em qual momento poderá o agente público perder a função pública e ter seus direitos políticos suspensos? Somente após o trânsito em julgado da sentença (decisão) condenatória na ação de improbidade.

Como poderá atuar a autoridade judicial ou administrativa competente diante da instrução processual? Quaisquer destas autoridades poderão determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.

Atenção! A aplicação das sanções previstas na Lei de Improbidade independe da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público ou da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas.

Atenção! Para apurar qualquer ilícito previsto na Lei de Improbidade Administrativa, o Ministério Público, de ofício, a requerimento de autoridade administrativa ou mediante representação formulada de acordo com o disposto no art. 14 da Lei, poderá requisitar a instauração de inquérito policial ou procedimento administrativo.

CAPÍTULO VIIDa Prescrição

Qual é o prazo prescricional para interpor as ações destinadas a levar a efeito as sanções previstas na lei de improbidade?

a) até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança   ou,

b) dentro do prazo prescricional previsto em lei específica, para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.

Comentários do professor:

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Prescrição administrativa corresponde à não possibilidade da Administração ingressar com uma ação, em virtude da sua própria inércia durante certo lapso de tempo.

Conforme determina o artigo 142 da Lei 8.112/90, aplicável exclusivamente aos servidores civis da esfera federal, a ação disciplinar prescreverá em:

I – cinco anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;

II – em dois anos quanto à suspensão e

III – em cento e oitenta dias, quanto à advertência.

Podemos observar que a lei de improbidade se utiliza da expressão genérica - “dentro do prazo prescricional previsto em lei específica” – haja vista que os Estados e Municípios terão, cada um, seus prazos prescricionais próprios, devidamente determinados em seus estatutos e leis locais.

CAPÍTULO VIIIDas Disposições Finais

Quando entrou a Lei de Improbidade em vigor? Na data de sua publicação, qual seja, em 02/06/92.

CAPÍTULO IXSERVIÇOS PÚBLICOS

I – SENTIDOS

a) Sentido Subjetivo: por este sentido, leva-se em conta os órgãos do Estado, responsáveis pela execução das atividades. Assim, são serviços públicos: o INSS, o INCRA, o IBAMA etc.

b) Sentido Objetivo: leva-se em conta a atividade em si prestada pelo Estado. Não importa, neste sentido, quem executa a atividade. Há três correntes, a saber:b.1) 1ª Corrente: Baseia-se no critério orgânico, segundo o qual o serviço público é o prestado por órgão público, ou seja, pelo próprio Estado. Qual é o erro desta teoria? Há diversas atividades públicas não restritas apenas ao Estado, mas também delegadas a particulares.b.2.) 2ª Corrente: Baseia-se no critério formal, segundo o qual será serviço público o disciplinado por regime de direito público. O erro nesta teoria está no fato de que as pessoas privadas, como as empresas públicas e as sociedades de economia mista, sujeitas ao regime jurídico de direito privado, também prestam serviços públicos.b.3.) 3ª Corrente: Baseia-se no critério material, segundo o qual será serviço público o que atender direta e essencialmente a comunidade. O erro nesta teoria reside no fato de que algumas atividades não atendem diretamente os indivíduos, mas sim, indiretamente. Algumas vezes a atividade é secundária, mas nem por isto menos relevante à comunidade.

As três correntes isoladas são insuficientes para que possamos conceituar serviços públicos sob uma ótica mais moderna. Assim, todas elas devem ser consideradas para fins de formar um conceito moderno de serviço público.

II – CONCEITOS DE SERVIÇO PÚBLICO

Segundo Hely Lopes Meirelles, “serviço público é todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegatários, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade, ou simples conveniências do Estado”.

Maria Sylvia Z. di Pietro considera serviço público como “toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente de direito público”.

Para José dos Santos Carvalho Filho, é serviço público “toda atividade prestada elo Estado ou por seus delegados, basicamente sob regime de direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e secundárias da coletividade”.

Celso Antonio Bandeira de Mello conceitua serviço público como “toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestado pelo Estado ou por quem lhe faça as

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vezes, sob um regime jurídico de direito público – consagrador de prerrogativas e sujeições – instituído pelo Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios do sistema normativo”.

III – CARACTERÍSTICAS

a) Os serviços públicos são criados e regulamentados pelo Poder Público, a quem incumbe a fiscalização e a prestação (art. 175 da CF/88 ). A delegação da prestação não descaracteriza o serviço como público.

b) Os serviços públicos são prestados visando os interesses coletivos primários (ou essenciais), que correspondem ao atendimento das demandas principais da coletividade, ou dos interesses coletivos secundários (ou não essenciais). Observe-se, assim, que a essencialidade ou não da prestação do serviço público não é o fator que determina se o serviço será delegável ou não, vez que há serviços públicos essenciais que poderão ser delegados a particulares, mediante controle e fiscalização da Administração delegante.

c) O serviço público se submete ao regime jurídico de direito público, total ou parcialmente. Neste último caso, será predominante o regime público. Exemplos: normas que impõem a fiscalização dos serviços; supremacia do Estado quanto à execução dos serviços; prestação de contas etc. Assim, posto de saúde municipal presta serviço público, ao passo que uma entidade religiosa prestadora dos mesmos serviços, não.

IV - CLASSIFICAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS

Não há um consenso doutrinário ou jurisprudencial (decisões judiciais) quanto às classificações para os serviços públicos. Abaixo, apresentamos a classificação adotada pelo professor José dos Santos Carvalho Filho:

a) Serviços delegáveis: são os que, por sua natureza, ou por disposição legal, possam ser executados pelo Estado ou por particulares colaboradores. Exemplos: transporte coletivo, energia elétrica e serviços de telefonia.

b) Serviços indelegáveis: São os que só podem ser prestados pelo Estado diretamente. Exemplos: defesa nacional; segurança interna; fiscalização de atividades etc. Assim, tais serviços são inerentes ao Poder Público centralizado e às entidades autárquicas e fundacionais, não podendo ser transferidos a particulares, para segurança do próprio Estado. Observamos que os serviços ditos essenciais não são necessariamente indelegáveis, pois podem vir a ser delegados pelo titular dos mesmos.

c) Serviços Administrativos: são os executados pelo Estado para compor melhor sua organização. Exemplo: edição da imprensa oficial.

d) Serviços de utilidade pública: são os que se destinam diretamente aos indivíduos para sua fruição direta. Exemplos: energia domiciliar; gás residencial; ensino; atendimento em postos médicos, etc.

e) Serviços Coletivos/Gerais (ou uti universi): são os prestados a agrupamentos indeterminados ou indetermináveis de indivíduos, não sendo possível à Administração identificar separadamente os beneficiários do serviço ou mensurar a parcela utilizada por cada um deles. Exemplo: pavimentação de ruas; iluminação pública; implantação do serviço de abastecimento de água, limpeza urbana, conservação de logradouros públicos, policiamento urbano, garantia da segurança nacional etc. A remuneração destes serviços dá-se através do pagamento de impostos.

f) Serviços Singulares/Individuais (ou uti singuli): são os prestados a destinatários individualizados ou individualizáveis, podendo-se mensurar a utilização do serviço por cada um deles. Por esta razão, Hely Lopes Meirelles nos ensina que “esses serviços, desde que implantados, geram direito subjetivo à sua obtenção para todos os administrados que se encontrem na área de sua prestação ou fornecimento e satisfaçam as exigências regulamentares”. Ex: energia elétrica domiciliar, coleta domiciliar de lixo, água residencial, serviço postal e linha telefônica. A remuneração de tais serviços dá-se através do pagamento de taxas (regime legal) ou tarifas (regime contratual).

g) Serviços Sociais: representam a prestação de serviços de comodidade relevante, assistenciais ou protetivos. Exemplos serviços de assistência à criança e ao adolescente; assistência educacional; assistência a comunidades carentes; assistência médica e hospitalar; apoio a regiões menos favorecidas etc.

h) Serviços Econômicos (ou serviços industriais e comerciais): são os que representam as atividades de caráter mais industrial e comercial, almejando o lucro. Devemos observar que a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme determina a Constituição Federal em seu artigo 173. Em algumas situações, detém o Estado o monopólio de certa atividade econômica, conforme se verifica pelo teor do artigo 177, V, da CF: “Constituem monopólio da União: a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21 desta Constituição Federal (redação dada pela Emenda Constitucional nº. 49, de 2006)” . Por fim, devemos

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verificar, também, o artigo 21, XII, “b”, da CF/88, que trata da prestação deste tipo de serviços econômicos: “Art. 21. Compete à União: XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão: b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos”.

Segue, abaixo, a classificação apresentada pelos professores Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo:

a) Serviços propriamente estatais (ou serviços típicos de Estado): segurança nacional, segurança pública, serviços judiciais, serviços prestados pela Defensoria Pública etc.

b) Serviços de Utilidade Pública: são serviços que, embora públicos, podem ser prestados por entidades de direito privado, ou mesmo por particulares, através da delegação. Dentre os serviços não propriamente estatais, podemos subdividi-los em: b.1.) serviços que seriam apenas de utilidade pública: neste grupo, encontramos os serviços ditos prescindíveis, pelo menos teoricamente, tais como: serviço postal, de fornecimento de energia elétrica, educação etc. b.2.) serviços essenciais ao interesse público: neste grupo, encontramos os serviços absolutamente imprescindíveis à coletividade, tais como: abastecimento de água e de esgoto sanitário, coleta de lixo, saúde etc.

Vejamos, agora, a classificação dos serviços públicos quanto à sua natureza, apresentada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) no julgamento do RE 89.876 (Relator Ministro Moreira Alves):

a) Serviços públicos propriamente estatais: são os serviços em que o Estado atua no exercício de sua soberania, sendo indelegáveis e remunerados necessariamente através de taxas. Exemplo: serviço judiciário.

b) Serviços públicos essenciais ao interesse público: são os serviços prestados no interesse da comunidade, sendo, também, remunerados por taxa, que incidirá sobre a utilização efetiva ou potencial dos serviços, desde que, nesta última hipótese, a lei os defina como de utilização compulsória. Ex: coleta domiciliar de lixo.

c) Serviços públicos não essenciais: em regra são delegáveis e podem ser remunerados através de preço público (tarifas). Ex: serviço postal, telefônico, telegráfico, energia elétrica residencial, gás etc.

V - TITULARIDADE

5. Competência

As três esferas de nossa federação têm competência para prestar serviços públicos, conforme determina a Constituição Federal. Assim, as competências da União encontram-se descritas no artigo 21. As dos Estados (também chamadas de competências remanescentes), no artigo 25, parágrafo primeiro e as competências dos Municípios encontram-se arroladas no artigo 30. Lembramos que ao DF cabe a prestação dos serviços públicos da competência dos Estados e, cumulativamente, dos Municípios, conforme dispõe o artigo 32, parágrafo primeiro, do texto constitucional.

a) Serviços Privativos: são os atribuídos a apenas uma das esferas da federação. Exemplos: União (artigo 21, VII, X, XXII, que trata da emissão de moedas, do serviço postal e da polícia marítima e aérea). Estados (artigo 25, parágrafo segundo, que trata da distribuição de gás canalizado). Municípios (artigo 30, III e V, que trata da arrecadação de tributos municipais e do transporte coletivo intramunicipal).

b) Serviços Comuns (competência comum): são os que podem ser prestados por mais de uma pessoa federativa. Ex: serviços de saúde pública (art.23, II), promoção de programas de construção de moradias (art. 23, IX), proteção do meio ambiente (art. 23, VI), preservação das florestas, fauna e flora (art. 23, VII) etc.

Quanto aos serviços de fornecimento de água e saneamento urbano, os mesmos eram prestados, anteriormente à atual Constituição, pelos Estados, através de sua Administração Indireta Estadual (autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista). No entendimento de José dos Santos Carvalho Filho, a competência privativa para tais serviços é atualmente dos Municípios, tendo em vista o que determinam os artigos 30, I (assuntos de interesse local) e V (organização e prestação dos serviços públicos de interesse local).

5.1. Regulamentação

A regulamentação dos serviços públicos cabe ao Poder Público, indiferentemente se é ele quem o presta diretamente (execução direta) ou não (execução indireta). Para que sejam executados, os serviços públicos devem ser normatizados através de decretos e outros atos regulamentares.

5.2. Controle/Fiscalização

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Ao titular do serviço cabe o controle/fiscalização do mesmo, que será interno (quando a aferição se voltar aos órgãos e entidades da Administração que prestam o serviço) ou externo (quando a Administração fiscaliza os particulares delegatários prestadores do serviço). É o que determina o artigo 3º da Lei 8.987/95: “as concessões e permissões sujeitar-se-ão à fiscalização pelo poder concedente responsável pela delegação, com a cooperação dos usuários”. Os usuários, portanto, também poderão cooperar com o Poder Público na fiscalização dos serviços públicos prestados. Por este motivo o artigo 22 da lei retro mencionada dispõe que qualquer pessoa tem o direito de obter certidões sobre atos, contratos, decisões ou pareceres relativos à licitação ou às próprias concessões e permissões de serviços públicos. Não nos esqueçamos de que compete, também, ao Poder Judiciário, a apreciação de qualquer lesão ou ameaça a direito.

VI – PRINCÍPIOS REGEDORES DOS SERVIÇOS PÚBLICOS (REQUISITOS)

Considera-se adequado o serviço público que satisfaça as exigências legais, as normas pertinentes e os respectivos contratos. Assim, como requisitos mínimos para que o serviço seja considerado adequado, é necessária a obediência aos seguintes princípios (condições):

a) Princípio da Generalidade (ou princípio da igualdade dos usuários): os serviços públicos devem ser prestados com a maior amplitude possível, beneficiando-se, assim, o maior número possível de administrados. Tais serviços devem ser prestados sem discriminação entre os usuários, quando tenham estes as mesmas condições técnicas e jurídicas para a sua fruição, respeitando-se, por conseqüência, os princípios da isonomia e da impessoalidade. Desta forma, se o serviço de telefonia residencial se encontra disponível em uma determinada avenida de Goiânia, todos os moradores que se localizam nesta área terão direito a usufruir do serviço, desde que atendam às exigências legais para usufruir do serviço.

b) Princípio da Continuidade (ou da Permanência): os serviços públicos não devem sofrer interrupção. Sua prestação deve ser contínua. Mas eles podem ser suspensos. Segundo alguns doutrinadores, podemos nos deparar com as seguintes situações:b.1.) O usuário dos serviços deixa de observar os requisitos técnicos para a prestação: neste caso, enquanto perdurar tal situação, o Poder Público poderá suspender a prestação do serviço. Exemplo: imaginemos que uma residência tenha o seu poste residencial de energia danificado em virtude de um acidente automobilístico. Após o concerto do poste, o usuário readquire o direito de ver o serviço restabelecido;b.2.) Quando o usuário deixa de pagar por um serviço facultativo: neste caso, o Poder Pùblico poderá suspender a prestação do serviço (o que guarda coerência com a facultatividade em sua obtenção).b.3.) Quando o usuário deixa de pagar por um serviço compulsório: não será permitida a suspensão do serviço, haja vista que o Estado o impôs coercitivamente. Além disso, o Poder Público possui meios próprios visando a cobrança forçada das taxas não adimplidas (não quitadas), tais como as execuções fiscais. b.4.) Emergência: o serviço poderá ser suspenso, independentemente de aviso prévio.

Segundo o professor José dos Santos Carvalho Filho, “a doutrina tem consignado que os serviços públicos específicos e divisíveis podem ser remunerados por taxa ou preço (do qual a tarifa é uma das modalidades). No primeiro caso, os serviços são prestados pelo Estado investido de seu ius imperii, sendo inerentes à sua soberania, de forma que não podem ser transferidos ao particular, pois que, afinal, visam apenas a cobrir os custos da execução (ex.: taxa de incêndio ou taxa judiciária); no segundo, a remuneração tem natureza contratual, e os serviços, que possibilitam a obtenção de lucros, podem ser delegados a particulares, e o próprio Estado, quando os executa, despe-se de sua potestade, atuando como particular (tarifas de transportes, de energia elétrica, de uso de linha telefônica ou, com algumas divergências, de consumo de água).”

E quanto à água? Hely Lopes Meirelles entende que o abastecimento de água não pode ser suspenso em caso de inadimplemento do usuário, haja vista ser imposto pelo Poder Público e remunerado por taxa, havendo decisões judiciais neste sentido. Vejamos: “O fornecimento de água, por se tratar de serviço público fundamental, não pode ser suspenso pelo atraso do pagamento das respectivas tarifas, já que o Poder Pùblico dispõe dos meios cabíveis para a cobrança dos débitos dos usuários (REsp 201.112-SC, 1ª Turma, 20/04/99).” Observemos que o REsp n. 782.270-MG da 1ª Turma, julgado em 18/10/2005, considerou ser “taxa” a remuneração do serviço, ainda que prestado por concessionária.

Porém, não devemos nos esquecer que, cada vez mais, o serviço de abastecimento de água tem sido delegado a particulares (concessionárias), sendo pago, portanto, através de “tarifas” e passível de suspensão por inadimplência do usuário. O próprio STF já decidiu que a remuneração do serviço de água se caracteriza como preço público (tarifa), não possuindo natureza tributária e podendo, assim, ser fixado por Decreto do Chefe do Poder Executivo (vide RE-Agr 201. 630-DF, DJ de 2/8/2002).

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Devido à controvérsia, há doutrinador que ensina que o serviço de água deve ser cobrado através de preço público (tarifa), mas que, em tese, pode ser cobrado via “taxa”.

Mas, como agir diante do Código de Defesa do Consumidor, que exige em seu artigo 22 a continuidade dos serviços essenciais? O STJ, por sua 2ª Turma, entendeu que a norma que prevalece no caso é a expressa no artigo 6º, parágrafo terceiro, da Lei n. 8.987/95 (que trata das concessões e permissões de serviços públicos) e não o artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor. Por tal lei, as concessionárias podem, sim, suspender a prestação do serviço no caso de não adimplência do usuário (vide Resp n.337.965-MG, 2ª Turma, julg. em 2/9/2003 e Resp n. 363.943-MG, 1ª Seção, de 12/11/2003).

Qual é a conclusão que podemos tirar de toda esta confusão doutrinária (se é que podemos tirar alguma)? A posição, razoavelmente pacificada na doutrina, é a de que o Estado somente poderá suspender a prestação do serviço de abastecimento de água quando o mesmo for remunerado por preço público (tarifa), independente de o serviço ser compulsório ou não, ou seja, imposto ou não pelo Poder Público.

E quando o usuário inadimplente for o Poder Público? Há decisões judiciais no sentido que, mesmo sendo pago por tarifas, é inadmissível a suspensão do serviço, senão vejamos: “a concessionária dos serviços de energia elétrica não pode interromper o fornecimento aos prédios públicos, mesmo que o município esteja em débito, sobrelevando o interesse público ao da empresa” (vide decisão do TJ-MG, ApCív n.110.283/9, 4ª CCív, publicada no Diário Oficial em 10/3/99). Mas é importante que se diga que a suspensão do serviço poderá atingir certos órgãos não essenciais, tais como ginásio de esportes e bibliotecas municipais. Já as escolas e hospitais, por exemplo, não.

c) Princípio da Eficiência: O artigo 175 da CF/88, em seu inciso IV, exige a manutenção de um serviço adequado por parte daquele que o presta. Para tanto, deverá haver a atualização do serviço mediante a implantação de novos processos tecnológicos e a constante avaliação por parte dos usuários do serviço a fim de averiguar a eficiência na prestação do mesmo.

d) Princípio da Modicidade: cobrança de preços módicos, para que todos os usuários tenham condições de utilizar os serviços prestados, uma vez que o lucro não é objetivo da função administrativa. Assim, a remuneração do serviço será razoável, sendo proibida a obtenção de lucros extraordinários. Lembramos que os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico financeiro deles.

e) Atualidade: utilização de técnicas, equipamentos e instalações modernas.

f) Segurança

g) Cortesia na prestação

h) Generalidade: o atendimento deve ser assegurado a todos que se localizem na área abrangida pelo serviço, desde que atendam aos requisitos legais e regulamentares. Além disso, deve-se assegurar atendimento abrangente ao mercado sem exclusão das populações de baixa renda e das áreas de baixa densidade populacional (inclusive as rurais), como determina o artigo 3º, IV, da Lei 9.074/95.

VII – REMUNERAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS

Os serviços públicos podem ser gratuitos ou remunerados. Os gratuitos têm natureza predominantemente social, tais como: assistência médica, educação, apoio a coletividades carentes etc.

Para os serviços ditos remunerados, o usuário deverá pagar: a) taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos

específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição (artigo 145, II, CF/88). Quando o serviço é imposto pelo Poder Público, será ele remunerado através de taxas, como nos casos de taxa de prevenção de incêndio e coleta individual de lixo. Neste último caso, devemos observar que o serviço de coleta de lixo extraordinário, destinado a pessoas físicas ou jurídicas produtoras de quantidades anormais de resíduos, poderá ser delegado a concessionários, mediante a cobrança de tarifas pela prestação do serviço. Advirta-se, ainda, que o pagamento da taxa é devido mesmo quando o serviço não é utilizado pelo particular, uma vez que basta, apenas, à Administração, colocar o serviço à disposição do usuário. Porém, uma vez que o serviço remunerado por taxa tem a característica de ser imposto ao administrado, não poderá o Estado suspendê-lo em caso de inadimplência dele, podendo, para tanto, se utilizar das ações judiciais cabíveis, como a Execução

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fiscal, por exemplo. José dos Santos Carvalho Filho nos adverte que “a cobrança só é legítima se o serviço público, prestado ou disponibilizado ao usuário for específico e divisível. Será específico, quando tiver linhas próprias de identificação, e divisível, quando o usuário receber parcelas individualizadas do serviço”. Pela razão acima exposta, podemos verificar que o serviço de iluminação pública e o de varredura das vias públicas não podem ser cobrados através de taxas, tendo em vista a generalidade e a indiscriminação dos serviços.

b) tarifas: já os serviços facultativos serão remunerados através da cobrança de tarifas. Assim, poderá o usuário se utilizar deles ou não. A doutrina considera que, nestas ocasiões, o Estado ou seus delegatários estão executando serviços econômicos (industriais ou comerciais), tais como transportes urbanos, energia elétrica, TV a cabo etc e que poderão ser suspensos em caso de inadimplência do usuário.

c) Outros tributos: Por último, devemos observar que os serviços públicos poderão, também, ser remunerados por outras espécies de tributos, como os impostos (para a execução de serviços gerais do Estado) ou contribuições de melhoria (pelas obras públicas que valorizam o imóvel do particular).

VIII – EXECUÇÃO DO SERVIÇO

a) Execução direta: ocorre quando o serviço é prestado pela própria Administração Direta, através de seus órgãos (Ministérios, Secretarias Estaduais e Municipais, Delegacias e Coordenadorias etc.). São estes órgãos os formadores da denominada “administração centralizada”. Aqui, fala-se em “serviços centralizados”.

b) Execução Indireta: ocorre quando os serviços são prestados por entidades diversas das pessoas federativas. Desta forma, ocorre a transferência da prestação do serviço, pelo Estado, a outras pessoas. Aqui, fala-se em serviços “descentralizados”.

IX – EXECUÇÃO INDIRETA Descentralização: ocorre quando há transferência de execução de atividade Estatal (da Administração Direta) a outra pessoa integrante da Administração (Administração Indireta) ou não (através da delegação a particulares, por meio de celebração de contratos de concessão e permissão de serviços públicos). Conforme assevera José dos Santos Carvalho Filho, “pode considerar-se também execução indireta aquela que decorre de contratação com terceiros por parte da pessoa incumbida da prestação do serviço. Exemplo: sociedade de economia mista quando contrata com outras empresas para executar o serviço de manutenção de redes elétricas”.

São formas de descentralização:

a) Por outorga: dá-se através de lei. Por ela é admitida a descentralização do serviço e autorizada a criação de pessoa administrativa (autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação pública) com a finalidade de executá-lo. Essa pessoa administrativa pertencerá ao quadro da Administração indireta (ou descentralizada).

b) Por delegação: é a transferência de serviços públicos a “particulares em colaboração com o Estado”, tais como os concessionários e os permissionários. A delegação dá-se através de contrato administrativo (em relação às concessões) e de contratos de adesão (em relação aos permissionários).

X – DESESTATIZAÇÃO

Com referência ao Programa Nacional de Desestatização (Lei n. 9.491/97), alguns aspectos merecem destaque. Vejamos:

Cumpre ressaltar, primeiramente, que a Lei anterior (Lei n. 8.031/90), já revogada pela Lei 9.491/97, utilizava a expressão “privatização”, o que causava interpretações jurídicas equivocados. Hoje, com o advento da Lei 9.491/97, o legislador optou pela utilização do termo “desestatização”.

Dentre os objetivos fundamentais do programa, podemos observar o posicionamento do Poder Público em reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público, viando, assim, a redução da dívida pública líquida (vide artigo 1º, I e II) e a concentração da Administração em atividades nas quais seja fundamental a presença do Estado em vista das prioridades nacionais (art. 1º, V). Percebe-se claramente, assim, que, com a desestatização, afasta-se o Estado da posição de executor de certas atividades e serviços.

Com a desestatização, ou seja, com a retirada do Estado de certo setor de atividades, será possível permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada (vide art. 1º, III),

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propiciando o fortalecimento do mercado de capitais pela oferta de valores mobiliários e a reestruturação do setor privado para aumentar sua competitividade e modernizar sua infra-estrutura (vide artigo 1, VI e IV).

Com o objetivo de cumprir com os fins almejados pelo Programa de Desestatização, podemos nos perguntar: quais áreas poderão ser submetidas à desestatização? O artigo 2º da Lei 9.491/97 nos responde a indagação, afirmando que poderão submeter-se à desestatização:

a) as empresas, incluídas as instituições financeiras, controladas direta ou indiretamente pela União;b) as empresas criadas pelo setor privado que, por qualquer razão, passaram ao controle da União;c) os serviços públicos objeto de concessão, permissão ou autorização ed) as instituições financeiras públicas estaduais que tenham sofrido desapropriação de ações de seu capital social.

E o artigo 4º, I a VI, nos apresenta as formas pelas quais poderão se processar as desestatizações, quais sejam:

a) alienação de participação societária, inclusive de controle acionário;b) abertura de capital;c) aumento de capital, com o Estado renunciando aos direitos de subscrição ou cedendo-os, total ou parcialmente;d) alienação, arrendamento, locação, comodato ou cessão de bens e instalações;e) dissolução de sociedades ou desativação parcial de seus empreendimentos, sendo alienados os seus ativos;f) concessão, permissão ou autorização de serviços públicos.

Como nos ensina o professor José dos Santos Carvalho Filho, “o Estado, depois de abraçar, por vários anos, a execução de muitas atividades empresariais e serviços públicos, com os quais sempre teve gastos infindáveis e pouca eficiência quanto aos resultados, resolveu imprimir nova estratégia governamental: seu afastamento e a transferência das atividades e serviços para sociedades e grupos empresariais”. Mas, advirta-se, no que se refere aos serviços públicos, o Estado continuou sendo o titular dos mesmos, apenas transferindo a execução dos serviços através da delegação.

Uma vez que a execução dos serviços fora delegada a particulares, o Estado fez surgir no cenário governamental as agências autárquicas reguladoras (ou agências governamentais), cujo papel principal é o de controlar as empresas privadas prestadoras de serviços públicos.

XI – GESTÃO ASSOCIADA

O regime adotado na CF/88 é o federativo. Caracteriza-se pelos círculos especiais de competência outorgados às entidades federativas. Para que os serviços públicos privativos ou concorrentes sejam executados com maior celeridade e eficiência, é necessário que se estabeleçam mecanismos de vinculação entre os entes federativos. Para tanto, a CF previu na reforma administrativa, através da emenda constitucional n. 19/98, a gestão associada na prestação de serviços públicos. Esta associação, portanto, se dará entre pessoas exclusivamente da Administração Pública. Referida gestão será implementada, através de lei, por convênios de cooperação e consórcios administrativos, cujos signatários serão a União, os Estados, o DF e os Municípios. Devemos nos lembrar que os “convênios de cooperação” e os “consórcios públicos” são espécies do gênero convênios administrativos. Ambos visam a associação entre pessoas para alcançar o interesse público. Alguns doutrinadores defendem a tese de que os consórcios públicos são formados por pessoas de mesmo nível, enquanto que, nos convênios administrativos, elas são distintas. O certo é que tanto os convênios quanto os consórcios indicam formas de atuação conjunta, formando a gestão associada. Assim, se o serviço é federal, a União deverá geri-lo ou controlá-lo por si ou por Estados-membros e Municípios, se assim for melhor.

XII – REGIMES DE PARCERIA

Pode, também, o Estado, executar os serviços públicos através dos denominados regimes de parceria, que se caracteriza pela aliança entre o Poder Pùblico e entidades privadas, via delegação. Por este regime, a parceria do Estado é formalizada com pessoas de direito privado e da iniciativa privada, ou seja, aquelas que não sofrem ingerência estatal em sua estrutura orgânica. Assim, são pessoas privadas que desempenham função pública, sendo denominadas de entidades do terceiro setor. Tais pessoas não integram a Administração Direta ou Indireta, compondo um agrupamento de entidades responsáveis por novas formas de prestação de serviços públicos. Com relação aos regimes de parceria, podemos destacar três grupos:

a) Regime de convênios administrativos: aqui, as regras que demarcam os direitos e os deveres das partes contratantes (Administração e entidade privada) são estipuladas através da assinatura de convênios administrativos. O objetivo de tal convênio é o de alcançar resultados de interesses comuns. Exemplo desta situação ocorre quando a União firma convênio administrativo com fundações instituídas por particulares das indústrias automobilísticas, com o objetivo de garantir o avanço tecnológico da indústria nacional no setor.

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b) Regime dos contratos de gestão (Organizações Sociais): o Estado viu-se na necessidade de ampliar ainda mais a descentralização na prestação dos serviços públicos, o que fez com que ele adotasse o denominado Programa Nacional de Publicização, instituído através da Lei 9.637/98. Por este programa, algumas atividades de cunho social, hoje exercidas por pessoas e órgãos administrativos de direito público, poderão ser posteriormente absorvidas por pessoas de direito privado – as Organizações Sociais - (vide artigo 20 da lei retro citada), extinguindo-se, por conseqüência, àqueles órgãos e pessoas de direito público. As Organizações Sociais não representam nova categoria de pessoas jurídicas. Trata-se, apenas, de uma qualificação especial concedida por lei, (mediante uso do poder discricionário do Ministério competente para supervisionar ou regular a área de atividade correspondente ao objeto social da entidade) a determinadas entidades privadas que atendam às exigências nela especificadas. Tais entidades parceiras, no desempenho de suas atividades de interesse público, devem: 1) ter personalidade jurídica de direito privado; 2) não ter fins lucrativos e 3) destinar-se ao ensino, à cultura, à pesquisa científica, à saúde, ao desenvolvimento tecnológico e à preservação do meio ambiente (vide artigo 1º da Lei 9.637/98). Uma vez recebendo o status de Organização Social, poderá a entidade: a) receber recursos orçamentários; b) usar bens públicos através da permissão de uso; c) ser beneficiada através da cessão especial de servidores públicos, com ônus do pagamento dos vencimentos devidos para o governo. Para habilitar-se como Organização Social, é necessário que sejam cumpridos diversos requisitos, dentre eles: 1) definição do objeto social da entidade; 2) finalidade não lucrativa; 3) proibição de distribuição de bens ou parcelas do patrimônio líquido; 4) publicação anual no Diário Oficial da União de relatório financeiro; 5) constituição de um Conselho de Administração com representantes do Poder Público e de entidade da sociedade civil e membros eleitos dentre associados de associação civil e outros eleitos com notória capacidade profissional e reconhecida idoneidade moral, etc. E o que pode acontecer à Organização Social se ela descumprir com as cláusulas pactuadas no contrato de gestão? Ela sofrerá: 1º) a desqualificação de seu título mediante processo administrativo em que lhe seja assegurado o contraditório e a ampla defesa; 2º) reversão dos bens usados sob permissão; 3º) devolução dos recursos alocados à entidade etc.

Quando se fala em contrato, supõe-se a existência de uma contraposição de interesses entre as partes signatárias do mesmo. Uma vez que não há esta contraposição de interesses entre o Estado e a Organização Social, o vocábulo jurídico correto deveria ser “convênio”, uma vez que, neste, há objetivos de interesses comuns (e não opostos) entre as partes.

Em se tratando da Lei 8.666/93, José dos Santos Carvalho Filho nos ensina que, “em virtude do caráter específico de tais contratos, nos quais há verdadeira cooperação entre as partes no que toca ao interesse público a ser perseguido, descartando-se qualquer aspecto mercantil ou empresarial, a lei prevê hipótese de dispensa de licitação, admitindo, em conseqüência, a contratação direta com a organização social”.

Com relação aos recursos financeiros recebidos pela organização social, compete ao Poder Público examinar-lhe as contas, comunicando imediatamente ao Tribunal de Contas competente qualquer irregularidade, sob pena de responsabilização do agente fiscalizador. Em havendo malversação dos bens ou recursos públicos, deverá, ainda, a autoridade fiscalizadora, representar ao Ministério Público, à Advocacia-Geral da União ou à Procuradoria da entidade com a finalidade de que sejam decretados judicialmente a indisponibilidade dos bens da entidade e o seqüestro dos bens dos dirigentes e dos agentes e terceiros envolvidos no fato delituoso.

Por último, devemos observar que lei 9.637/98 é de observância obrigatória apenas para a União. Portanto, incide unicamente sobre os serviços públicos federais. Porém, nada impede que as demais pessoas federativas (estados, DF e municípios) criem suas formas legais próprias de descentralização de serviços públicos.

c) Gestão por colaboração (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público): deste regime participam as entidades da iniciativa privada, usualmente representativas dos diversos segmentos da sociedade civil. Suas ações são de utilidade pública. Há uma delegação do Estado a tais entidades, constituindo-se em forma de descentralização de serviços. O instituto é regulado pela Lei 9.790/99, devidamente regulamentado pelo Decreto n. 3.100/99. As OSCIPS não constituem nova categoria de pessoa jurídica. Apenas ostentam uma específica qualificação jurídica e têm como características: a) a personalidade jurídica de direito privado; b) sem fins lucrativos. Conforme dispõe o artigo 3º, I a XII, seus objetivos são: 1) promoção da educação, da saúde, da cultura, da assistência social e da segurança alimentar e nutricional; 2) proteção e defesa do meio ambiente; 3) promoção e desenvolvimento econômico e social, incluindo o combate à pobreza; 4)experimentação de novos modelos socioprodutivos; 5) promoção de valores universais (ética, paz, cidadania, direitos humanos, democracia e, também, a promoção de assistência jurídica complementar); 6) promoção do voluntariado e 7) estudos, pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas, divulgação de informações e conhecimentos concernentes a todos os objetivos citados.

A lei exige como requisitos para a qualificação de OSCIP: I- observância aos princípios do LIMPE, economicidade, aos princípios básicos da contabilidade, publicidade de relatórios de atividades e sujeição a auditorias externas independentes.

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O requerimento da qualificação é protocolado no Ministério da Justiça, que terá competência para expedir o certificado de qualificação.

Não poderão requerer a qualificação como OSCIP: a) sociedades comerciais, inclusive as que comercializam planos de saúde e as cooperativas; b) organizações creditícias relacionadas com o sistema financeiro; c) entidades de representação de classe e sindical; d) instituições partidárias; d) entidades religiosas; e) hospitais e escolas sem gratuidade; f) pessoas, inclusive fundações, instituídas pelo Poder Público e g) Organizações Sociais.

As OSCIP podem cooperar com o Poder Público de três maneiras: 1ª) pela execução direta de projetos, programas e planos de ação; 2ª) através da entrega de recursos humanos, físicos ou financeiros e 3ª) através da prestação de atividades de apoio a outras entidades sem fins lucrativos.

Os direitos e obrigações entre a OSCIP e o Poder Público estarão consignados no termo de parceria. Citamos como diferenças principais entre as Organizações Sociais e a OSCIP: a) nas Organizações

Sociais exige-se a participação de agentes do Poder Público na estrutura da entidade, mais precisamente nos Conselhos de Administração. Nas OSCIP, não. B) Nas Organizações Sociais a formalização da parceria dá-se através da assinatura de contrato de gestão. Na OSCIP, o instrumento jurídico utilizado é o termo de parceria. C) As linhas da disciplina jurídica das Organizações Sociais as colocam um pouco mais atreladas ao Poder Público dos que as OSCIP.

XIII – DOS DIREITOS DOS USUÁRIOS

Os direitos dos usuários dos serviços públicos encontram-se descritos no artigo 7º da Lei 8.987/95, quais sejam:

a) o direito de receber um serviço adequado;b) de receber do poder público concedente e da concessionária informações para a defesa de interesses

coletivos e individuais;c) de obter e utilizar o serviço, com liberdade de escolha entre vários prestadores de serviços, quando for o

caso, observadas as normas do poder concedente;d) levar ao conhecimento do Poder Público e da concessionária as irregularidades de que tenham

conhecimento, referentes aos serviços prestados;e) comunicar às autoridades competentes os atos ilícitos de que tenham conhecimento e que tenham sido

praticados pela concessionária na prestação do serviço.

XIV – DAS OBRIGAÇÕES DO USUÁRIO

Dentre as obrigações do usuário, a Lei 8.987/95 estabelece a de “contribuir para a permanência das boas condições dos bens públicos através dos quais lhes são prestados os serviços”.

FIM DA APOSTILA

(AGUARDE OS PRÓXIMOS CAPÍTULOS E ATUALIZAÇÕES)

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