Apostila direito e Globalização

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DIREITO E GLOBALIZAOAULA 1 Jul/2011 Usos e abusos do termo Globalizao 1 Introduo ao tema: polissemia do termo globalizao 1.1 Dicionrio Houaiss Acepes substantivo feminino 1 2 ato ou efeito de globalizar(-se) Rubrica: sociologia.

Processo pelo qual a vida social e cultural nos diversos pases do mundo cada vez mais afetada por influncias internacionais em razo de injunes polticas e econmicas. 2.1 Rubrica: economia, poltica.

Intercmbio econmico e cultural entre diversos pases, devido informatizao, ao desenvolvimento dos meios de comunicao e transporte, ao neocolonialista de empresas transnacionais e presso poltica no sentido da abdicao de medidas protecionistas. 2.2 Rubrica: economia, poltica.

Espcie de mercado financeiro mundial criado a partir da unio dos mercados de diferentes pases e da quebra das fronteiras entre esses mercados. Obs.: cf. capital voltil 2.3 Rubrica: economia, poltica.

Integrao cada vez maior das empresas transnacionais, num contexto mundial de livre-comrcio e de diminuio da presena do Estado, em que empresas podem operar simultaneamente em muitos pases diferentes e explorar em vantagem prpria as variaes nas condies locais. 3 Rubrica: pedagogia.

Processo de percepo e aquisio mais sinttico do que analtico, caracterstico da estrutura mental ou psquica da criana. Etimologia globalizar + -o; ver glob(i/o)1.2 Significado do termo globalizao no aspecto econmico, social, cultural e poltico 1

A globalizao um dos processos de aprofundamento da integrao econmica, social, cultural, poltica, que teria sido impulsionado pelo barateamento dos meios de transporte e comunicao dos pases do mundo no final do sculo XX e incio do sculo XXI. um fenmeno gerado pela necessidade da dinmica do capitalismo de formar uma aldeia global que permita maiores mercados para os pases centrais (ditos desenvolvidos) cujos mercados internos j esto saturados. O processo de Globalizao diz respeito forma como os pases interagem e aproximam pessoas, ou seja, interliga o mundo, levando em considerao aspectos econmicos, sociais, culturais e polticos. Com isso, gerando a fase da expanso capitalista, onde possvel realizar transaes financeiras, expandir seu negcio at ento restrito ao seu mercado de atuao para mercados distantes e emergentes, sem necessariamente um investimento alto de capital financeiro, pois a comunicao no mundo globalizado permite tal expanso, porm, obtm-se como consequncia o aumento acirrado da concorrncia. 1.3 Significado do termo globalizao no sentido ideolgico A expresso "globalizao" tem sido utilizada mais recentemente num sentido marcadamente ideolgico, no qual assiste-se no mundo inteiro a um processo de integrao econmica sob a gide do neoliberalismo, caraterizado pelo predomnio dos interesses financeiros, pela desregulamentao dos mercados, pelas privatizaes das empresas estatais, e pelo abandono do estado de bemestar social. Esta uma das razes dos crticos acusarem-na, a globalizao, de ser responsvel pela intensificao da excluso social (com o aumento do nmero de pobres e de desempregados) e de provocar crises econmicas sucessivas, arruinando milhares de poupadores e de pequenos empreendimentos. 1.4 - Conceitos O que Globalizao? Antes de entender como os pases se adaptaram ao processo de globalizao, faz-se necessrio definir globalizao. No h consenso sobre um conceito fechado do que seja a globalizao e sua origem. Pode-se analisar os fatos que colaboraram para os seu desenvolvimento e discutir conceitos defendidos por alguns autores. H uma grande discusso que defende que a globalizao teve seu incio e comeou a desenvolver-se de fato, com a empreitada europeia em direo aos outros continentes. Outros defendem que comeou ainda antes com a expanso do imprio romano por Alexandre, o Grande. O Autor Thomas L. Friedman no livro Os Lexos da Oliveira, denomina a globalizao como uma vertente da fragmentao da poltica, que teve seu auge a partir do ano de 1945, com o final da Segunda Guerra Mundial, at 1989, com a queda do muro de Berlim, o que simbolizou o insucesso do Socialismo. O processo de finalizao da poltica bipolar ocorreu em funo do final da Segunda Guerra Mundial, que teve seu desenvolvimento baseado em argumentos ideolgicos onde havia apenas um inimigo a quem se opor. 2

Dessa maneira, a poltica externa mundial era baseada em princpios e disputas estabelecidas pelos pases lderes dos divergentes sistemas econmicos vigentes naquele momento. A popularizao do termo globalizao ocorreu em meados de 1980, e rapidamente passou a ser associado aos aspectos financeiros inerentes a esse processo. Dessa forma, o processo de globalizao passou a ser considerado como uma constante no mundo moderno. H que ressaltar que esse fenmeno no se restringe apenas s transaes comerciais e termos econmicos, mesmo sendo esses aspectos os principais focos do processo de globalizao. Porm, fato que, alm das relaes econmicas, esse processo envolve as demais reas que integram as sociedades, como os mbitos cultural, social e poltico. A globalizao um fenmeno amplamente debatido, porm a compreenso das entradas que esse processo oferece s sociedades no pode ser definida, interpretada ou compreendida sem uma profunda reflexo, uma vez que, de acordo com David Held e Antony McGrew: No existe uma definio nica e universalmente aceita para a globalizao. Como acontece com todos os conceitos nucleares das cincias, seu sentido exato contestvel. A globalizao tem sido (quando os altos dos agentes sociais de um lugar podem ter consequncias significativas para terceiros distantes; como compreenso espao temporal (numa referencia ao modo como a comunicao instantnea vem desgastando as limitaes da distncia e do tempo na organizao e na interao social); como interdependncia acelerada entendida como a intensificao do entrelaamento entre economias e sociedades nacionais, de tal modo que os acontecimentos de um pas tm impacto direto em outros; como um mundo em processo de encolhimento (eroso das fronteiras e das barreiras geogrficas a atividade socioeconmica); e, entre outros conceitos, como integrao global, reordenao das relaes de poder inter-regionais, conscincia da situao global e intensificao da interligao inter-regional. A globalizao caracteriza-se por um processo de integrao global que induz ao crescimento da interdependncia entre as naes, objetivando um claro entendimento quanto aos princpios desse processo, concordando com a perspectiva de David Held e Anthony McGrew, para uma clara compreenso o seguinte conceito de globalizao ser adotado: o conjunto de transformaes na ordem poltica e econmica mundial que vem acontecendo nas ltimas dcadas. O ponto de mudanas a integrao dos mercados numa aldeia-global, explorada pelas grandes corporaes internacionais. Os Estados abandonam gradativamente as barreiras tarifrias para proteger sua produo da concorrncia dos produtos estrangeiros e abrem-se ao comrcio e ao capital internacional. Esse processo tem sido acompanhado de uma intensa revoluo nas tecnologias de informao telefones, computadores e televiso. As fontes de informao tambm se 3

uniformizam devido ao alcance mundial e crescente popularizao dos canais de televiso por assinatura e da lnternet. Isso faz com que os desdobramentos da globalizao ultrapassem os limites da economia e comecem a provocar uma certa homogeneizao cultural entre os pases. Uma das ntidas consequncias do processo de globalizao foi o impulso dado a uma transformao nos padres de interligao mundial, dessa maneira: O conceito de globalizao denota muito mais do que a ampliao de relaes e atividades sociais atravessando regies e fronteiras. E que ele sugere uma magnitude ou intensidade crescente de fluxos globais, de tal monta que Estados e sociedades ficam cada vez mais enredados em sistemas mundiais e redes de interao. Em consequncia disso, ocorrncias e fenmenos distantes podem passar a ter srios impactos internos, enquanto os acontecimentos locais podem gerar repercusses globais de peso. Em outras palavras, a globalizao representa uma mudana significativa no alcance espacial da ao e da organizao social, que passa para uma escala inter-regional ou intercontinental. Esse fenmeno proporciona maior visibilidade poltica interna dos pases em um cenrio global, com maior velocidade na interao social, passando os acontecimentos a ter um impacto no apenas local, mas mundial em um efeito imediato. De acordo com Nestor Garcia Canclini a globalizao denota a escala crescente, a magnitude progressiva, a acelerao e o aprofundamento do impacto dos fluxos e padres inter-regionais de interao social. A partir disso, todas as esferas da sociedade passam a sofrer influencias oriundas desse processo, integrando aspectos que no possuia na sua gnese. 1.5 Efeitos culturais da globalizao Ns vivemos na era da globalizao, tudo converge, os limites vo desaparecendo. Quem no ouviu, no mnimo, uma destas expresses nos ltimos anos? A globalizao um chavo de nosso tempo, uma discusso que est na moda, onde opinies fatalistas conflitam com afirmaes crticas, e o temor de uma homogeneizao est no centro do debate. Suposies de uma sociedade mundial, de uma paz mundial ou, simplesmente, de uma economia mundial, surgem seguidamente, cujas consequncias levariam a processos de unificao e adaptao, aos mesmos modelos de consumo e a uma massificao cultural. Mas h que se perguntar: trata-se apenas de conceitos em disputa ou h algo que aponte, de fato, nesta direo? Quais so, afinal, os efeitos culturais da globalizao? O processo de constituio de uma economia de carter mundial no nada novo. J no perodo colonial houve tentativas de integrar espaos intercontinentais num nico imprio, quando a ideia de dominar o mundo ficou cada vez mais prxima. Por outro lado, a integrao das diferentes culturas e povos como um mundo j foi desejada h muito tempo e continua como meta para muitas geraes. Sob esta tica, o conceito de globalizao poderia ter um 4

duplo sentido, se ele no fosse to marcado pelo desenvolvimento neoliberal da poltica internacional. Conforme o socilogo alemo Ulrich Beck, com o termo globalizao so identificados processos que tm por consequncia a subjugao e a ligao transversal dos estados nacionais e sua soberania atravs de atores transnacionais, suas oportunidades de mercado, orientaes, identidades e redes. Por isso, ouvimos falar de defensores da globalizao e de crticos globalizao, num conflito pelo qual diferentes organizaes se tornam cada vez mais conhecidas. Neste sentido, no se trata de um conflito stricto sensu sobre a globalizao, mas sobre a prepotncia e a mundializao do capital. Esse processo, da forma como ele atualmente vem acontecendo, no deveria sequer ser chamado de globalizao, j que atinge o globo de forma diferenciada e exclui a sua maior parte se observamos a circulao mundial de capital, podemos constatar que a maioria da populao mundial (na sia, na frica e na Amrica Latina) permanece excluda. Essa forma de globalizao significa a predominncia da economia de mercado e do livre mercado, uma situao em que o mximo possvel mercantilizado e privatizado, com o agravante do desmonte social. Concretamente, isso leva ao domnio mundial do sistema financeiro, reduo do espao de ao para os governos os pases so obrigados a aderir ao neoliberalismo ao aprofundamento da diviso internacional do trabalho e da concorrncia e, no por ltimo, crise de endividamento dos estados nacionais. Condies para que essa globalizao pudesse se desenvolver foram a interconexo mundial dos meios de comunicao e a equiparao da oferta de mercadorias, das moedas nacionais e das lnguas, o que se deu de forma progressiva nas ltimas dcadas. A concentrao do capital e o crescente abismo entre ricos e pobres (48 empresrios possuem a mesma renda de 600 milhes de outras pessoas em conjunto) e o crescimento do desemprego (1,2 bilhes de pessoas no mundo) e da pobreza (800 milhes de pessoas passam fome) so os principais problemas sociais da globalizao neoliberal e que vm ganhando cada vez mais significado. evidente que essa situao tem efeitos sobre a cultura da humanidade, especialmente nos pases pobres, onde os contrastes sociais so ainda mais perceptveis. Em primeiro lugar, podemos falar de uma espcie de conformidade e adaptao. Em funo da exigncia de competitividade, cada um se v como adversrio dos outros e pretende lutar pela manuteno de seu lugar de trabalho. Os excludos so taxados de incompetentes e os pobres tendem a ser responsabilizados pela sua prpria pobreza. Paralelamente a isso, surge nos pases industrializados uma nova forma de extremismo de direita, de forma que a xenofobia e a violncia aparecem entrelaada com a luta por espaos de trabalho. claro que a violncia surge tambm como reao dos excludos, e a lgica do sistema, baseada na competio, desenvolve uma crescente cultura da violncia na sociedade. Tambm no podemos esquecer que o prprio crime organizado oferece oportunidades de trabalho e segurana aos excludos.

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Embora tenham sido desenvolvidos e disponibilizados mais meios de comunicao, presenciamos um crescente isolamento dos indivduos, de forma que as alternativas de socializao tm sido, paradoxalmente, reduzidas. A excluso de muitos grupos na sociedade e a separao entre camadas sociais tm contribudo para que a to propalada integrao entre diferentes povos no se efetive; pelo contrrio, isso tm levado a um processo de atomizao da sociedade. O valor est no fragmento, de modo que o engajamento poltico da maioria ocorre de forma isolada como, por exemplo, o feminismo, o movimento ambientalista, movimentos contra a discriminao tica e sexual, etc. Tudo isso sem que se perceba um fio condutor que possa unificar as lutas isoladas num projeto coletivo de sociedade. Nessa perspectiva fala-se de um fim das utopias, que se combina com uma nova forma de relativismo: a verdade em si no existe; a maioria a define. No que se refere educao, cresce a sobrevalorizao do pragmatismo, da eficincia meramente tcnica e do conformismo. O mais importante a formao profissional, concebida como nico meio de acesso ao mercado de trabalho. A ideia a de que, com uma melhor qualificao tcnica, se tenha maiores possibilidades de conseguir um emprego num mercado de trabalho em declnio. Em consequncia a isso, a reflexo sobre os problemas da sociedade assume cada vez menos importncia; e valores como engajamento, mobilizao social, solidariedade e comunidade perdem seus significados. Importante o luxo, o lucro, o egocentrismo, a liberdade do indivduo e um lugar no bem-estar dos poucos. Esses valores so difundidos pelos grandes meios de comunicao e os jovens so, nisto, os mais atingidos. A diminuio do sujeito/indivduo surge como decorrncia, pois o ser humano cada vez mais encarado como coisa e estimulado a satisfazer prazeres suprfluos. Os excludos so descartados sem perspectiva e encontram cada vez menos espao na sociedade que, afinal de contas, est voltada aos consumidores, enquanto o acesso pblico continuamente reduzido. Por outro lado, h reaes que se desenvolvem internacionalmente contra essa tendncia. A ampliao das possibilidades de comunicao tem contribudo para que protestos isolados pudessem se encontrar e constituir redes. O lema: pensar globalmente e agir localmente pde ser superado, de forma que uma ao global se tornou possvel, o que alterou a viso de mundo e os limites de tempo e espao. Para alm das diferenas tnicas, religiosas e lingusticas dos povos, podemos falar de uma nova diviso do mundo: de um lado, uma minoria que beneficiada pela globalizao neoliberal e, de outro, a maioria que prejudicada com a ampliao do livre mercado. Esse conflito est no centro do debate atual da humanidade, cujos efeitos caracterizam o esprito do nosso tempo e influenciaro a cultura da humanidade futura. Se a imagem das futuras geraes ser fragmentada ou mais homogeneizada ainda no se sabe, mas a possibilidade de uma crescente desumanizao muito grande.

2 - Histria

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A globalizao um fenmeno capitalista e complexo que comeou na era dos descobrimentos e que se desenvolveu a partir da Revoluo Industrial. Mas o seu contedo passou despercebido por muito tempo, e hoje muitos economistas analisam a globalizao como resultado do ps Segunda Guerra Mundial, ou como resultado da Revoluo Tecnolgica. Sua origem pode ser traada do perodo mercantilista iniciado aproximadamente no sculo XV e durando at o sculo XVIII, com a queda dos custos de transporte martimo, e aumento da complexidade das relaes polticas europeias durante o perodo. Este perodo viu grande aumento no fluxo de fora de trabalho entre os pases e continentes, particularmente nas novas colnias europeias. J em meio Segunda Guerra Mundial surgiu, em 1941, um dos primeiros sintomas da globalizao das comunicaes: o pacote cultural-ideolgico dos Estados Unidos inclua vrias edies dirias de O Reprter Esso, uma sntese noticiosa de cinco minutos rigidamente cronometrados, a primeira de carter global, transmitido em 14 pases do continente americano por 59 estaes de rdio, constituindo-se na mais ampla rede radiofnica mundial. tido como incio da globalizao moderna o fim da Segunda Guerra mundial, e a vontade de impedir que uma monstruosidade como ela ocorresse novamente no futuro, sendo que as naes vitoriosas da guerra e as devastadas potncias do eixo chegaram a concluso que era de suma importncia para o futuro da humanidade a criao de mecanismos diplomticos e comerciais para aproximar cada vez mais as naes uma das outras. Deste consenso nasceu as Naes Unidas, e comeou a surgir o conceito de bloco econmico pouco aps isso com a fundao da Comunidade Europeia do Carvo e do Ao - CECA. A necessidade de expandir seus mercados levou as naes a, aos poucos, comearem a se abrir para produtos de outros pases, marcando o crescimento da ideologia econmica do liberalismo. Atualmente os grandes beneficirios da globalizao so os grandes pases emergentes, especialmente o BRIC (Brasil, Rssia, ndia, China), com grandes economias de exportao, grande mercado interno e cada vez maior presena mundial. Antes do BRIC, outros pases fizeram uso da globalizao e economias voltadas a exportao para obter rpido crescimento e chegar ao primeiro mundo, como os tigres asiticos na dcada de 1980 e Japo na dcada de 1970. Enquanto Paul Singer (economista austraco, com cidadania brasileria, estudou na USP) v a expanso comercial e martima europeia como um caminho pelo qual o capitalismo se desenvolveu assim como a globalizao, Maria da Conceio Tavares (economista portuguesa naturalizada brasileira) aposta o seu surgimento na acentuao do mercado financeiro, com o surgimento de novos produtos financeiros. 3 - Impacto 7

A caracterstica mais notvel da globalizao a presena de marcas mundiais, como coca cola, Fridays, McDonalds, etc. A globalizao afeta todas as reas da sociedade, principalmente comunicao, comrcio internacional, direito e liberdade de movimentao, com diferente intensidade dependendo do nvel de desenvolvimento e integrao das naes ao redor do planeta. 4 A utilizao da globalizao em diferentes disciplinas e definies possveis 4.1 - Comunicao A globalizao das comunicaes tem sua face mais visvel na internet, a rede mundial de computadores, possvel graas a acordos e protocolos entre diferentes entidades privadas da rea de telecomunicaes e governos no mundo. Isto permitiu um fluxo de troca de ideias e informaes sem critrios na histria da humanidade. Se antes uma pessoa estava limitada a imprensa local, agora ela mesma pode se tornar parte da imprensa e observar as tendncias do mundo inteiro, tendo apenas como fator de limitao a barreira lingustica. Outra caracterstica da globalizao das comunicaes o aumento da universalizao do acesso a meios de comunicao, graas ao barateamento dos aparelhos, principalmente celulares e os de infraestrutura para as operadoras, com aumento da cobertura e incremento geral da qualidade graas a inovao tecnolgica. Hoje uma inovao criada no Japo pode aparecer no mercado portugus ou brasileiro em poucos dias e virar sucesso de mercado. Um exemplo da universalizao do acesso a informao pode ser o prprio Brasil, hoje com 42 milhes de telefones instalados, e um aumento ainda maior de nmero de telefone celular em relao a dcada de 1980, ultrapassando a barreira de 100 milhes de aparelhos em 2002. Redes de televiso e imprensa multimdia em geral tambm sofreram um grande impacto da globalizao. Um pas com imprensa livre hoje em dia pode ter acesso, alguma vezes por televiso por assinatura ou satlite, a emissoras do mundo inteiro, desde NHK do Japo at Cartoon Network americana. Pode-se dizer que este incremento no acesso comunicao em massa acionado pela globalizao tem impactado at mesmo nas estruturas de poder estabelecidas, com forte conotao a democracia, ajudando pessoas antes alienadas a um pequeno grupo de radiodifuso de informao a terem acesso a informao de todo o mundo, mostrando a elas como o mundo e se comporta. Mas infelizmente este mesmo livre fluxo de informaes tido como uma ameaa para determinados governos ou entidades religiosas com poderes na sociedade, que tem gasto enorme quantidade de recursos para limitar o tipo de informao que seus cidados tem acesso.

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Na China, onde a internet tem registrado crescimento espetacular, j contando com 136 milhes de usurios graas evoluo, iniciada em 1978, de uma economia centralmente planejada para uma nova economia socialista de mercado, outro exemplo de nao notria por tentar limitar a visualizao de certos contedos considerados "sensveis" pelo governo, como do Protesto na Praa Tiananmem em 1989, alm disso em torno de 923 sites de notcias ao redor do mundo esto bloqueados, incluindo CNN e BBC, sites de governos como Taiwan tambm so proibidos o acesso e sites de defesa da independncia do Tibete. O nmero de pessoas presas na China por "ao subversiva" por ter publicado contedos crticos ao governo estimado em mais de 40 ao ano. A prpria Wikipdia j sofreu diversos bloqueios por parte do governo chins. No Ir, Arbia Saudita e outros pases islmicos com grande influncia da religio nas esferas governamentais, a internet sofre uma enorme presso do estado, que tenta implementar diversas vezes barreiras e dificuldades para o acesso a rede mundial, como bloqueio de sites de redes de relacionamentos sociais como Orkut e MySpace, bloqueio de sites de noticias como CNN e BBC. Acesso a contedo ertico tambm proibido. 4.2 - Qualidade de vida O acesso instantneo de tecnologias, principalmente novos medicamentos, novos equipamentos cirrgicos e tcnicas, aumento na produo de alimentos e barateamento no custo dos mesmos, tem causado nas ltimas dcadas um aumento generalizado da longevidade dos pases emergentes e desenvolvidos. De 1981 a 2001, o nmero de pessoas vivendo com menos de US$1 por dia caiu de 1,5 bilho de pessoas para 1,1 bilho, sendo a maior queda da pobreza registrada exatamente nos pases mais liberais e abertos a globalizao. Na China, aps a flexibilizao de sua economia comunista centralmente planejada para uma nova economia socialista de mercado, e uma relativa abertura de alguns de seus mercados, a porcentagem de pessoas vivendo com menos de US$2 caiu 50,1%, contra um aumento de 2,2% na frica subsaariana. Na Amrica Latina, houve reduo de 22% das pessoas vivendo em pobreza extrema de 1981 at 2002. Embora alguns estudos sugiram que atualmente a distribuio de renda ou est estvel ou est melhorando, sendo que as naes com maior melhora so as que possuem alta liberdade econmica pelo ndice de Liberdade Econmica, outros estudos mais recentes da ONU indicam que "a 'globalizao' e 'liberalizao', como motores do crescimento econmico e o desenvolvimento dos pases, no reduziram as desigualdades e a pobreza nas ltimas dcadas". Para o prmio Nobel em economia Stiglitz (economista estadunidense), a globalizao, que poderia ser uma fora propulsora de desenvolvimento e da reduo das desigualdades internacionais, est sendo corrompida por um comportamento hipcrita que no contribui para a construo de uma ordem econmica mais justa e para um mundo com menos conflitos. Esta , em 9

sntese, a tese defendida em seu livro A globalizao e seus malefcios: a promessa no-cumprida de benefcios globais. Crticos argumentam que a globalizao fracassou em alguns pases, exatamente por motivos opostos aos defendidos por Stiglitz: Porque foi refreada por uma influncia indesejada dos governos nas taxas de juros e na reforma tributria. 4.3 - Efeitos na indstria e servios Os efeitos no mercado de trabalho da globalizao so evidentes, com a criao da modalidade de outsourcing de empregos ( a transferncia das atividades conhecidas como atividades meio, e nunca as atividades fins (produto final), para uma empresa terceirizada. Terceirizao) para pases com mo-de-obra mais baratas para execuo de servios que no necessrio alta qualificao, com a produo distribuda entre vrios pases, seja para criao de um nico produto, onde cada empresa cria uma parte, seja para criao do mesmo produto em vrios pases para reduo de custos e ganhar vantagem competitivas no acesso de mercados regionais. O ponto mais evidente o que o colunista David Brooks (jornalista americano) definiu como "Era Cognitiva", onde a capacidade de uma pessoa em processar informaes ficou mais importante que sua capacidade de trabalhar como operrio em uma empresa graas a automao, tambm conhecida como Era da Informao, uma transio da exausta era industrial para a era psindustrial. Nicholas A. Ashford, acadmico do MIT (Massachusetts Institute of Technology, centro universitrio de educao e pesquisa privado localizado em Cambridge, Massachusetts, nos Estados Unidos. O MIT um dos lderes mundiais em cincia e tecnologia, bem como outros campos, como administrao, economia, lingustica, cincia poltica e filosofia), conclui que a globalizao aumenta o ritmo das mudanas disruptivas nos meios de produo, tendendo a um aumento de tecnologias limpas e sustentveis, apesar que isto ir requerer uma mudana de atitude por parte dos governos se este quiser continuar relevante mundialmente, com aumento da qualidade da educao, agir como evangelista do uso de novas tecnologias e investir em pesquisa e desenvolvimento de cincias revolucionrias ou novas como nanotecnologia ou fuso nuclear. O acadmico nota, porm, que a globalizao por si s no traz estes benefcios sem um governo pr-ativo nestes questes, exemplificando o cada vez mais globalizado mercados EUA, com aumento das disparidades de salrios cada vez maior, e os Pases Baixos, integrante da UE, que se foca no comrcio dentro da prpria UE em vez de mundialmente, e as disparidades esto em reduo. 4.4 Globalizao econmica, avano tecnolgico e direito do trabalho. As grandes transformaes no mundo mostra uma sociedade exposta a srios problemas que atingiram em escala internacional e mundial os sistemas econmicos capitalistas. Os empregos diminuram, cresceram outras formas de trabalho sem vnculo de emprego, as empresas passaram a produzir mais com

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pouca mo de obra, a informtica e a robtica trouxeram produtividade crescente e trabalho decrescente. A globalizao da economia no um fenmeno novo, j que mesmo antes da 1 Guerra Mundial havia comrcio internacional e investimentos privados em outros pases. Porm, passou a interessar ao direito do trabalho com o aumento da sua amplitude, a interligao entre os pases, a maior facilidade de circulao de bens, mercadorias e trabalhadores sem fronteiras e o extraordinrio progresso tecnolgico e dos sistemas de comunicao, tudo facilitando o desenvolvimento de uma nova realidade, que afetou as relaes de trabalho. Em Denver, Colorado, em 1997, reuniram-se os chefes de Estado e de Governo do Grupo dos Oito (principais pases industrializados) e publicaram um comunicado apontando a globalizao como principal fator responsvel pelo crescimento da prosperidade mundial nos ltimos anos. Nem todos os especialistas de direito do trabalho concordam com a afirmao acima, ressaltando que a globalizao um fator perverso de imposio de imperativos da economia em detrimento do avano social das populaes, cada vez mais pobres. A OIT tambm se revela preocupada temendo que a atual precria situao do emprego se agrave, eis que os rpidos progressos tcnicos esto trazendo consigo um crescimento que no cria empregos e coloca-nos diante de um quadro de deteriorao quase universal das condies de trabalho, com diminuio do pessoal, supresso de postos de trabalho e reduo dos salrios dos trabalhadores no qualificados, mas afirma que no se pode estabelecer uma relao direta entre a liberalizao do comrcio internacional e as perdas de empregos, preconizando uma poltica econmica e social coordenada com o desenvolvimento de programas de ao, que devem ser apreciados sob o prisma da justia social. A Declarao sobre justia social para uma globalizao equitativa (2008) aponta as duas faces da globalizao: - benfica: permite altas taxas de crescimento, criao de empregos e incremento para ampliar o nmero de produtos e circulao das ideias; - negativa: obriga muitos pases a enfrentar o problema da desigualdade de rendas, altos nveis de desemprego e pobreza, vulnerabilidade econmica diante de crises externas e crescimento do trabalho informal. Surgiram unies regionais destinadas a facilitar a livre circulao de bens e trabalhadores. Em 1951, a Comunidade Econmica de Carvo e do Ao transformou-se em Comunidade Econmica Europia (CEE) e, atravs do Tratado de Maastricht (1992), institucionalizou-se como ordenamento poltico e jurdico, regido por normas jurdicas aprovadas pelo Parlamento da Comunidade, deu origem a Unio Europia, da surgindo o direito comunitrio.

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Na Amrica do sul foi institudo o Mercosul, atravs do Tratado de Assuno (1991), do qual so signatrios Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, seguindo-se o Protocolo de Ouro Preto (1994). A competitividade entre empresas de diferentes pases intensificou-se com as maiores facilidades proporcionadas pela velocidade e agilidade das comunicaes e comrcio, provocando uma concorrncia maior, que as levou a iniciativas com a finalidade de reduzir custos da produo, dentre os quais o nmero de empregados, os salrios, as formas de contratao e a jornada de trabalho, o que se refletiu sobre o direito do trabalho. Tanto a descentralizao da produo como a possibilidade de produzir no exterior, e no apenas internamente, e o aumento do desemprego reduziram a capacidade de negociao coletiva dos sindicatos de trabalhadores diante da pulverizao das suas unidades de produo, o que levou a um aumento das negociaes coletivas em nvel de empresa e reduo em nvel de categoria ou outro mais amplo. Para evitar o dumping social, alguns acordos comerciais passaram a conter clusulas sociais. A reduo dos nveis de proteo ao trabalhador passou a ser admitida por uma corrente que entende que uma forma de diminuir o desemprego a diminuio dos altos encargos trabalhistas, sem restries a resciso do contrato de trabalho, facilitando o ajuste direto de acordo com os interesses do empregador e empregado. O direito do trabalho passou a defrontar com novas figuras jurdicas: - ampliao do uso do contrato a prazo fixo, com formas diversificadas; - reduo da jornada norma e da carga semanal de trabalho por meio de negociao coletiva, visando criar novos empregos, em alguns casos com a reduo de salrios e em outros com a manuteno dos nveis salariais; - compensao de horrios, dias ou semanas de trabalho ou a anualidade da jornada normal, com o acrscimo pago pelas horas extraordinrias no caso de excesso do total de horas normais estabelecidas para o ano; - reduo dos encargos previdencirios, que oneram o empregador, como meio de incentivo para a contratao de trabalhadores; - trabalho de meio expediente; - programas de reciclagem profissional para os trabalhadores; - programas especficos para a gerao de emprego para deficientes; - multifuncionalidade do empregado, com aptido para exercer mais de uma tarefa na empresa; - derrogao das vantagens asseguradas pelo contrato individual atravs de acordos coletivos sindicais; - temporariedade do emprego; - remunerao condicionada produtividade; - trabalho social ou de interesse pblico; - trabalho voluntrio de finalidade assistencial. Atualmente, necessrio a retipificao dos contratos de trabalho, ante a flexibilizao, intervencionismo diante da fragmentao do mercado de trabalho e da reduo de empregos. 12

Estamos diante do perodo agudo da histria do direito do trabalho no qual desenhado um novo paradigma de emprego. A era das tecnologias da informao, com o avana tecnolgico e da informtica. A tecnologia substitui os empregados pelo software e a desnecessidade de um quadro numeroso de empregados para que a empresa consiga a mesma produo. A flexibilizao visa assegurar um conjunto de regras mnimas ao trabalhador e, em contrapartida, a sobrevivncia da empresa, por meio da modificao de comandos legais, procurando garantir aos trabalhadores certos direitos mnimos e ao empregador a possibilidade de adaptao de seu negcio, mormente em pocas de crise econmica. Para fiscalizar essa flexibilizao, com essa maleabilidade, que o sindicato passa a ter o papel principal, ou seja, na participao das negociaes coletivas que conduziro ao acordo ou conveno coletiva de trabalho, de modo a permitir tambm a continuidade do emprego do trabalhador e a sobrevivncia da empresa, assegurando um grau de lucro razovel ltima e certas garantias mnimas ao trabalhador. uma forma de adaptao das normas vigentes s necessidades e convenincias de trabalhadores e empresas. O fenmeno da flexibilizao encarado tambm sob o enfoque da desregulamentao normativa, que pode ser imposta unilateralmente pelo Estado (flexibilizao heternoma), a qual consiste em derrogar vantagens trabalhistas, substituindo-as por benefcios inferiores, ou pela negociao coletiva, que pressupe a substituio das garantias legais pelas garantias convencionais (flexibilizao autnoma). Para Amauri Mascaro Nascimento, desregulamentao a poltica legislativa de reduo da interferncia da lei nas relaes coletivas de trabalho, para que se desenvolvam segundo o princpio da liberdade sindical e a ausncia de leis do Estado que dificultem o exerccio dessa liberdade, o que permite maior desenvoltura do movimento sindical e das representaes de trabalhadores, para que, por meio de aes coletivas, possam pleitear novas normas e condies de trabalho em direto entendimento com as representaes empresariais ou com os empregadores. Diferena entre desregulamentao e flexibilizao: Desregulamentao Flexibilizao Vocbulo restrito ao direito coletivo do Aplicado ao direito individual trabalho. trabalho. do

A CF, art. 8, VI, dispe sobre a obrigatoriedade da participao dos sindicatos nas negociaes coletivas de trabalho, reconhecendo o acordo e conveno coletivos (art. 7, XXVI). 4.4.1 Efeitos da globalizao Sobre o emprego: - reduo de empregos; 13

- ampliao setorial de empregos, com a criao de novos setores produtivos e do crescimento do setor de servios; - descentralizao das atividades da empresa para empreendedores perifricos, por meio da subcontratao; - informatizao do trabalho da pessoa fsica, com o crescimento do trabalho autnomo e o uso de formas parassubordinadas de contratao do trabalho. Trabalho parassubordinado trabalho contnuo desenvolvido pelo trabalhador, sem estar subordinado ao poder diretivo do empregador, tomador de servios; - requalificao profissional do trabalhador, com a valorizao do ensino geral e profissional. Funes que desapareceram: operrios, secretrias, recepcionistas, auxiliares de escritrio, vendedores (venda pela internet), caixas de banco (caixas eletrnicos), telefonistas, bibliotecrias, atacadistas, gerentes mdios. Sobre o salrio: - diminuio de salrios em alguns setores e aumento em outros, como para executivos top; - novas formas de remunerao do trabalho conectado ao aumento da produtividade e ao desempenho das empresas, enfrentando as incidncias salariais e os encargos salariais; - jornadas de trabalho redefinidas para reduzir gastos. Sobre os tipos de contratos de trabalho: - retificao dos contratos individuais de trabalho; - aumento dos contratos a prazo determinado, como contrato a prazo em larga escala; - novas formas de contratos de trabalho, como: trabalho autnomo, trabalho intermitente, contrato de trabalho a chamada, o teletrabalho, contrato parttime, contrato a projeto, contrato de trabalho continuativo, de colaborao e coordenao etc. Sobre a jornada de trabalho: ampliao da compensao de horas com o banco de horas. Na Alemanha, atravs de acordo coletivo firmado entre a Volkswagen e o Sindicato dos trabalhadores, ocorreu a reduo da jornada de trabalho, permitindo a conservao de cerca de 30.000 empregos, medida em que o tempo preenchido em horas extras com um empregado poderia servir ocupao de outro. Sobre a suspenso do contrato: instituda a suspenso temporria do contrato de trabalho diante de causas econmicas, atravs da ratificao da Conveno da OIT 168 sobre promoo de emprego e proteo contra o desemprego, com vigncia a partir de maro de 1993 (fora de lei federal). Sobre a descentralizao das atividades: com a ampliao da terceirizao, surgiram as cooperativas fraudulentas, usadas abusivamente como alternativa para aliviar custos do trabalho sob a forma de emprego.

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Sobre a mobilidade internacional da mo-de-obra: - pases nos quais os ndices salariais so menores so acusados de dumping social pelos pases desenvolvidos na discusso sobre os mercados internacionais, como China. - surgimento de regies econmico-jurdicas supranacionais com ordenamento jurdico prprio e sobreposto aos nacionais, ante o aumento do nmero de expatriados em movimentao entre pases. Sobre o contrato de trabalho: - reduo de direitos dos trabalhadores resultado da necessidade da reduo de custos das empresas na disputa pela competitividade nacional e internacional; - no preservao de empregos e geram dvida sobre a sua necessidade; Na Espanha, autorizou-se os contratos de trabalho por prazo determinado, visando a reduo de encargos sociais, com o objetivo de promover a absoro de desempregados na medida da reduo do custo do trabalho no trmino do vnculo jurdico. Sobre o movimento sindical e a negociao coletiva: - principal reivindicao: manuteno de empregos existentes, discusso sobre demisses coletivas e suspenses coletivas dos contratos de trabalho. - dimenso comunitria e transnacional atravs da globalizao do mercado, na esfera internacional, na formao de um direito do trabalho comunitrio e de convenes coletivas, em nvel de empresa, comuns a mais de um pas. 5 - Teorias da Globalizao A globalizao, por ser um fenmeno espontneo decorrente da evoluo do mercado capitalista no direcionado por uma nica entidade ou pessoa, possui vrias linhas tericas que tentam explicar sua origem e seu impacto no mundo atual. A rigor, as sociedades do mundo esto em processo de globalizao desde o incio da Histria, acelerado pela poca dos Descobrimentos. Mas o processo histrico a que se denomina Globalizao bem mais recente, datando (dependendo da conceituao e da interpretao) do colapso do bloco socialista e o consequente fim da Guerra Fria (entre 1989 e 1991), do refluxo capitalista com a estagnao econmica da URSS (a partir de 1975) ou ainda do prprio fim da Segunda Guerra Mundial. No geral a globalizao vista por alguns cientistas polticos como o movimento sob o qual se constri o processo de ampliao da hegemonia econmica, poltica e cultural ocidental sobre as demais naes. Ou ainda que a globalizao a reinveno do processo expansionista americano no perodo ps guerra-fria (esta reinveno tardaria quase 10 anos para ganhar forma) com a imposio (forosa ou no) dos modelos polticos (democracia), ideolgico (liberalismo, hedonismo filosofia que propugna uma concepo mais ampla de prazer entendida como felicidade para o maior nmero de 15

pessoas, e individualismo) e econmico (abertura de mercados e livre competio). Vale ressaltar que este projeto no uma criao exclusiva do estado norteamericano e que tampouco atende exclusivamente aos interesses deste, mas tambm um projeto das empresas, em especial das grandes empresas transnacionais, e governos do mundo inteiro. Nesta ponta surge a interrelao entre a Globalizao e o Consenso de Washington. Antonio Negri O pensador italiano Antonio Negri defende, em seu livro "Imprio", que a nova realidade scio-poltica do mundo definida por uma forma de organizao diferente da hierarquia vertical ou das estruturas de poder "arborizadas" (ou seja, partindo de um tronco nico para diversas ramificaes ou galhos cada vez menores). Para Negri, esta nova dominao (que ele batiza de "Imprio") constituda por redes assimtricas, e as relaes de poder se do mais por via cultural e econmica do que uso coercitivo de fora. Negri entende que entidades organizadas como redes (tais como corporaes, ONGs e at grupos terroristas) tm mais poder e mobilidade (portanto, mais chances de sobrevivncia no novo ambiente) do que instituies paradigmticas da modernidade (como o Estado, partidos e empresas tradicionais). Mrio Murteira O economista portugus Mrio Murteira, autor de uma das abordagens cientficas mais antigas e consistentes sobre o fenmeno da Globalizao, defende que, no sculo XXI, se verifica uma 'desocidentalizao' da Globalizao, visto que se constata que os pases do Oriente, como a China, so os principais atores atuais do processo de Globalizao e a hegemonia do Ocidente, no sistema econmico mundial, est a aproximar-se do seu ocaso, pelo que outras dinmicas regionais, sobretudo na sia do Pacfico, ganharam mais fora a nvel global. Para Mrio Murteira, a Globalizao est relacionada com um novo tipo de capitalismo em que o mercado de conhecimento o elemento mais influente no processo de acumulao de capital e de crescimento econmico no capitalismo atual, ou seja, o ncleo duro que determina a evoluo de todo o sistema econmico mundial do presente sculo XXI. Stuart Hall Em A Identidade cultural na Ps-Modernidade, Stuart Hall (2003) busca avaliar o processo de deslocamento das estruturas tradicionais ocorrido nas sociedades modernas, assim como o descentramento dos quadros de referncias que ligavam o indivduo ao seu mundo social e cultural. Tais mudanas teriam sido ocasionadas, na contemporaneidade, principalmente, pelo processo de globalizao. A globalizao alteraria as noes de tempo e de espao, desalojaria o sistema social e as estruturas por muito tempo consideradas como fixas e possibilitaria o surgimento de uma pluralizao dos centros de exerccio do poder. Quanto ao descentramento dos sistemas de 16

referncias, Hall considera seus efeitos nas identidades modernas, enfatizando as identidades nacionais, observando o que gerou, quais as formas e quais as consequncias da crise dos paradigmas do final do sculo XX. Benjamin Barber Em seu artigo "Jihad vs. McWorld", Benjamin Barber expe sua viso dualista para a organizao geopoltica global num futuro prximo. Os dois caminhos que ele enxerga no apenas como possveis, mas tambm provveis so o do McMundo e o da Jihad. Mesmo que se utilizando de um termo especfico da religio islmica (cujo significado, segundo ele, genericamente "luta", geralmente a "luta da alma contra o mal", e por extenso "guerra santa"), Barber no v como exclusivamente muulmana a tendncia antiglobalizao e pr-tribalista, ou pr-comunitria. Ele classifica nesta corrente inmeros movimentos de luta contra a ao globalizante, inclusive ocidentais, como os zapatistas e outras guerrilhas latino-americanas. Est claro que a democracia, como regime de governo particular do modo de produo da sociedade industrial, no se aplica mais realidade contempornea. Nem se aplicar tampouco a quaisquer dos futuros econmicos pretendidos pelas duas tendncias apontadas por Barber: ou o pr-industrialismo tribalista ou o ps-industrialismo globalizado. Os modos de produo de ambos exigem outros tipos de organizao poltica cujas demandas o sistema democrtico no capaz de atender. Daniele Conversi Para Conversi, os acadmicos ainda no chegaram a um acordo sobre o real significado do termo globalizao, para o qual ainda no h uma definio coerente e universal: alguns autores se concentram nos aspectos econmicos, outros nos efeitos polticos e legislativos, e assim por diante. Para Conversi, a 'globalizao cultural' , possivelmente, sua forma mais visvel e efetiva enquanto "ela caminha na sua trajetria letal de destruio global, removendo todas as seguranas e barreiras tradicionais em seu caminho. tambm a forma de globalizao que pode ser mais facilmente identificada com uma dominao pelos Estados Unidos. Conversi v uma correlao entre a globalizao cultural e seu conceito gmeo de 'segurana cultural', tal como desenvolvido por Jean Tardiff, e outros. Conversi prope a anlise da 'globalizao cultural' em trs linhas principais: a primeira se concentra nos efeitos polticos das alteraes scio-culturais, que se identificam com a 'insegurana social'. A segunda, paradoxalmente chamada de 'falha de comunicao', tem como seu argumento principal o fato de que a 'ordem mundial' atual tem uma estrutura vertical, na realidade piramidal, onde os diversos grupos sociais tm cada vez menos oportunidades de se intercomunicar, ou interagir de maneira relevante e consoante suas tradies; de acordo com essa teoria no estaria havendo uma 'globalizao' propriamente dita, mas, ao contrrio, estariam sendo construdas ligaesponte, e estaria ocorrendo uma eroso do entendimento, sob a fachada de uma homogenizao global causando o colapso da comunicao intertnica e 17

internacional, em consequncia direta de uma 'americanizao' superficial. A terceira linha de anlise se concentra numa forma mais real e concreta de globalizao: a importncia crescente da dispora na poltica internacional e no nascimento do que se chamou de 'nacionalismo de e-mail" - uma expresso criada por Benedict Anderson (1992). "A expanso da Internet propiciou a criao de redes etnopolticas que s podem ser limitadas pelas fronteiras nacionais s custas de violaes de direitos humanos". Samuel P. Huntington O cientista poltico Samuel P. Huntington, idelogo do neoconservadorismo norte-americano, enxerga a globalizao como processo de expanso da cultura ocidental e do sistema capitalista sobre os demais modos de vida e de produo do mundo, que conduziria inevitavelmente a um "choque de civilizaes". Antiglobalizao Apesar das contradies h um certo consenso a respeito das caractersticas da globalizao que envolve o aumento dos riscos globais de transaes financeiras, perda de parte da soberania dos Estados com a nfase das organizaes supra-governamentais, aumento do volume e velocidade como os recursos vm sendo transacionados pelo mundo, atravs do desenvolvimento tecnolgico etc. Alm das discusses que envolvem a definio do conceito, h controvrsias em relao aos resultados da globalizao. Tanto podemos encontrar pessoas que se posicionam a favor como contra (movimentos antiglobalizao). A globalizao um fenmeno moderno que surgiu com a evoluo dos novos meios de comunicao cada vez mais rpidos e mais eficazes. H, no entanto, aspectos tanto positivos quanto negativos na globalizao. No que concerne aos aspectos negativos h a referir a facilidade com que tudo circula no havendo grande controle como se pode facilmente depreender pelos atentados de 11 de Setembro nos Estados Unidos da Amrica. Esta globalizao serve para os mais fracos se equipararem aos mais fortes, pois tudo se consegue adquirir atravs desta grande autoestrada informacional do mundo que a Internet. Outro dos aspectos negativos a grande instabilidade econmica que se cria no mundo, pois qualquer fenmeno que acontece num determinado pas atinge rapidamente outros pases criando-se contgios que tal como as epidemias se alastram a todos os pontos do globo como se de um nico ponto se tratasse. Os pases cada vez esto mais dependentes uns dos outros e j no h possibilidade de se isolarem ou remeterem-se no seu ninho, pois ningum imune a estes contgios positivos ou negativos. Como aspectos positivos, temos sem sombra de dvida, a facilidade com que as inovaes se propagam entre pases e continentes, o acesso fcil e rpido informao e aos bens. Com a ressalva de que para as classes menos favorecidas economicamente, especialmente nos pases em desenvolvimento, esse acesso no "fcil" (porque seu custo elevado) e no ser rpido.

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6 As principais vises sobre a Globalizao Anthony Giddens referiu a propsito da globalizao: Dada esta popularidade sbita no de surpreender que o significado do termo nem sempre seja claro, como no devemos estranhar que houvesse uma reaco intelectual contra ele. A globalizao tem algo a ver com a tese de que agora vivemos todos num nico mundo. Mas como, exactamente? E ser a ideia realmente vlida? Nos debates que irromperam nestes anos mais recentes, o conceito de globalizao tem sido definido em termos contraditrios por diversos pensadores. Nos nossos dias, a aceitao de que vivemos num mundo nico no unnime pelo que se podem dividir as opinies sobre a globalizao em trs correntes de pensamento diferentes: hiperglobalizadores, transformacionalistas e cpticos. So essencialmente estas trs correntes de pensamento que fazem com haja contradies no conceito de globalizao aceite no mundo. Os cpticos defendem que se exagera na ideia de globalizao. Acreditam que os atuais nveis de interdependncia econmica no so inauditos. Defende que h mais contato entre os pases de hoje em dia mas que a economia mundial no est suficientemente integrada para se falar numa economia globalizada. Para estes pensadores, a economia mundial est mais regionalizada do que globalizada e consequentemente menos integrada, defendem tambm que os governos nacionais continuam a ser figuras-chave na regulao e coordenao da atividade econmica. Ao invs, os hiperglobalizadores adoptam uma viso da globalizao completamente oposta aos cpticos, defendendo que a globalizao um fenmeno bem real e cujas consequncias se fazem sentir em todo o lado. Segundo estes autores a globalizao um processo indiferente s fronteiras nacionais que afeta tudo e todos sem excepo, e que afeta muito o papel do Estado-Nao que deixa de controlar as suas economias graas liberalizao e desregulamentao do comrcio mundial. Organizaes supranacionais como a UE ou a OMC ou at mesmo ONGs tm vindo a ter um papel preponderante na definio de polticas mundiais. Por fim, os transformacionalistas adoptam uma viso intermdia. Concebem a globalizao como forma motriz de um conjunto de mudanas que esto a alterar as sociedades modernas, sendo que inmeros padres tradicionais continuam a existir assim como algum poder por parte dos governos nacionais. A globalizao um processo descentrado e reflexivo caracterizado por uma srie de ligaes e fluxos culturais que operam de forma multidireccional sendo um produto de inmeras redes globais interligadas. Defendem que os pases esto a reestruturar-se para responder s novas foras de organizao social e econmica. Concluindo, a globalizao no de fato um termo claro, e tem havido inmeras reaes sobre o fenmeno de que vivemos num mundo nico. Esta ideia de facto vlida, pelo que os cpticos esto equivocados, na medida em 19

que no tm em conta o quanto o mundo est a mudar, os hiperglobalizadores veem a globalizao como um fenmeno demasiado econmico e apenas num sentido, sendo ento os transformacionalistas aqueles que se aproximam mais da realidade. 6.1 - Hiperglobalistas Professor de economia poltica internacional de Harvard, o economista Dani Rodrik um crtico mordaz da hiperglobalizao (no da globalizao) e do modelo econmico dos anos 1990. Para ele, o risco mais srio para a economia mundial a falta de coordenao macroeconmica e como lidar com os fluxos de capital que isso gera. Para lidar com os desequilbrios causados pela poltica monetria expansionista dos EUA e o yuan desvalorizado, ele diz que importante haver avanos rpidos na direo de um sistema multilateral de superviso de desequilbrios externos. Os princpios seriam dados pelo G20 e o trabalho mais tcnico poderia ser feito pelo FMI. E prope que o Fundo tenha mais autoridade e poder de superviso. Em compensao, a OMC teria que ser enfraquecida porque na opinio dele a evoluo das regras da OMC teve como efeito colateral indesejado fazer com que a China use moeda desvalorizada para sustentar o crescimento econmico. No comeo dos anos 80,se iniciou a hiperglobalizao. Um modelo em que a reduo de barreiras comerciais e a liberalizao de fluxos de capitais se tornou quase um fim em si mesmo e o papel das polticas governamentais passou a ser definido quase que unicamente sob a perspectiva do que era necessrio para se integrar economia mundial. A hiperglobalizao teve duas consequncias: ampliou o impacto e a severidade das crises financeiras e erodiu a legitimidade do sistema de comrcio internacional. No Brasil, ele ressalta que uma coisa importante mudar a relao entre poupana e investimentos. Infelizmente, no sabemos muito sobre como elevar poupana e investimentos no curto prazo. O que se sabe, porm, que o dficit fiscal uma parte importante da poupana domstica e o que puder ser feito para melhorar a situao fiscal ter um impacto positivo. A outra coisa que se sabe que uma boa parte do aumento na poupana que experimentado por pases bem-sucedidos resultado de maior crescimento econmico. O importante iniciar uma espcie de ciclo virtuoso no Brasil, em que se comece com algumas polticas, incluindo uma poltica fiscal mais apertada que aumente a poupana domstica. Isso abre espao para quedas na taxa de juros que, por sua vez, reduzem a presso no cmbio. Uma moeda mais competitiva viabiliza mais poupana, mais investimento e esse processo de crescimento realimenta um aumento na poupana domstica. O economista Dani Rodrik, professor da Universidade Harvard, um crtico implacvel do processo de globalizao econmica, centrado na abertura comercial e financeira. Em seu novo livro, The globalization paradox: democracy and the future of the world economy (O paradoxo da globalizao: democracia e o futuro da economia mundial), recm-lanado nos Estados Unidos, ele diz que a ditadura dos mercados foi longe demais e representa uma ameaa democracia e soberania das naes. Segundo Rodrik, os pases que se deram melhor na globalizao no foram aqueles que abriram de forma indiscriminada suas fronteiras, mas os que se integraram de forma

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gradual na economia mundial e adotaram polticas comerciais e industriais para desenvolver e diversificar suas economias. O paradoxo da globalizao so dois. O primeiro que a globalizao demanda instrumentos muito fortes de governana que dependem de governos nacionais. Ao mesmo tempo, os governos nacionais representam o principal obstculo para o aprofundamento da globalizao. O segundo que uma globalizao saudvel aquela que no ultrapassa os limites dos interesses nacionais. Uma globalizao mais equilibrada com os interesses das naes muito mais saudvel para a economia mundial do que o que eu chamo de hiperglobalizao, que o estmulo abertura indiscriminada do comrcio e das finanas. A globalizao deve ter um limite. Isso tem ligao com o primeiro paradoxo. A globalizao precisa de mecanismos de regulao, estabilizao, legitimao, que s os governos nacionais podem fornecer. E esses governos tm um carter eminentemente nacional. A nica forma de implementar a hiperglobalizao pelo enfraquecimento dos mecanismos nacionais de governana. Isso no bom, porque pode levar a questionamentos sobre a legitimidade do sistema internacional de comrcio ou a instabilidades financeiras como a atual crise global. A globalizao e o livre-comrcio no beneficiam os pases e as populaes? uma questo de equilbrio. Os pases que se deram melhor com a globalizao no foram aqueles que abriram suas economias de forma indiscriminada. Os pases mais bem-sucedidos foram os asiticos, como Japo, China, Coreia do Sul e ndia, que se integraram na economia mundial, mas de acordo com suas prprias regras. Eles abriram suas economias de forma gradual e adotaram polticas comerciais e industriais para promover e diversificar suas economias. Conseguiram se beneficiar da globalizao, mas adotaram medidas para restringir o comrcio e o fluxo de capitais que so conflitantes com a ideia de uma economia aberta. Se os pases no abrirem suas economias, a ineficincia vai aumentar. No final, as empresas e os consumidores pagaro a conta. Isso no um contrassenso? H uma compensao. A imposio de restries ao comrcio e ao capital gera custos adicionais, mas traz benefcios. Um pas vulnervel ao hot Money e ao fluxo de capitais no ser bem-sucedido. Em relao ao comrcio, sabemos que os pases emergentes no se desenvolvem e se industrializam automaticamente. Isso no algo que o mercado faz por si mesmo. Ento, acaba havendo uma compensao entre a elevao do custo para o consumidor e para as empresas, provocada pela adoo de restries ao comrcio e ao fluxo de capitais, e os benefcios trazidos por uma economia mais forte, na qual se estimulam alguns setores que de outra forma no poderiam se desenvolver. No Brasil, havia uma poltica de reserva de mercado na rea de informtica para estimular a indstria local. S que, alm de o setor no ter se desenvolvido, os computadores eram caros, o contrabando se multiplicou e o Brasil perdeu terreno para outros pases, que abriram seus mercados na rea. 21

A poltica brasileira de informtica foi claramente um fracasso, pelas razes que voc mencionou. Mas em muitos outros setores a poltica industrial do pas foi um sucesso. A indstria aeronutica, a siderrgica e outros setores importantes da economia brasileira no teriam se desenvolvido sem o estmulo e a proteo que receberam no passado. Em geral, o resultado das primeiras polticas industriais do pas foi muito positivo. O ndice brasileiro de produtividade melhorou muito durante a era de substituio das importaes. Isso revela que preciso manter um equilbrio entre a integrao na economia global e o estmulo ao desenvolvimento da indstria nacional. No significa que a implementao dessas polticas ser sempre bem-sucedida. Mas acredito que, se os governos no implementarem polticas industriais para estimular o crescimento das empresas locais, estaro cometendo um erro. A globalizao uma ameaa democracia e soberania das naes. Se voc quiser ter mercados globais totalmente integrados, um processo que eu chamo de hiperglobalizao, significa que voc precisa ter um conjunto de regras comuns. Isso quer dizer que voc precisa ter regras comuns para adequao de capital para os bancos poderem operar internacionalmente, sem custos adicionais. Significa que precisa haver regras comuns para sade e segurana, para as grandes multinacionais poderem operar sem ter custos diferentes em cada local. Significa, enfim, que preciso ter regras comuns em quesitos como tributos para as empresas. Se um pas quiser ter impostos mais altos, as empresas iro para outro lugar, onde eles so menores. Para ter um mercado global to integrado quanto os mercados domsticos, necessrio ter polticas comuns em nvel internacional. Isso estreitaria, de forma progressiva, o espao para que os polticos locais respondessem s necessidades de seu eleitorado. Voc estaria reduzindo o espao para a promoo de polticas normalmente identificadas com a democracia. Em relao globalizao financeira e de algumas reas de comrcio, a globalizao foi longe demais. Mas h outras reas em que a globalizao andou muito pouco. Uma rea sobre a qual falamos pouco a mobilidade do trabalho. Em termos de mobilidade global de trabalhadores, principalmente os no especializados, estamos basicamente no mesmo lugar que em 1950. Se os polticos do mundo quiserem aumentar a eficincia da economia global, acho que haveria ganhos muito maiores com o relaxamento das restries mobilidade de trabalhadores do que nas reas comercial e financeira. O processo de globalizao sofrer uma grande mudana, a partir do novo papel que a China est assumindo na economia mundial. No vamos voltar mais ao velho modelo centrado nos EUA e na Europa Ocidental. No novo modelo, a China e alguns outros pases, como o Brasil, vo desempenhar papis cada vez mais importantes na determinao das regras do jogo. A China um pas que pe em evidncia a independncia e a soberania nacional. A delegao de autoridade para organizaes internacionais e multilaterais ter um limite. A nova face da economia mundial j est criando grandes dificuldades para um mundo governado pelos mercados e pela governana global.

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6.2 - Cticos Existem diferentes vises e definies a respeito da globalizao. Alguns analistas a consideram simplesmente como um fenmeno econmico que se reporta quase que exclusivamente integrao de mercados financeiros e comerciais. Outros procuram dar mais ateno aos aspectos relativos dimenso de comunicao do fenmeno ou, ento, a dimenses culturais, tecnolgicas, migratrias ou ecolgicas, para afianarem a existncia de um processo de interdependncia mundial. Nesse emaranhado de referncias h claramente nfases e esquecimentos. As nfases recaem nas dimenses acima mencionadas, enquanto muito pouca ateno dispensada aos problemas relativos ao fluxo de mo-de-obra entre pases e regies ou aos diversos impactos que se podem observar na vida social das pessoas, na vida poltica das sociedades, bem como no plano da subjetividade. Sabemos que o processo de mundializao se iniciou com a expanso da Europa Ocidental a partir dos sculos XV e XVI. Desde ento esse processo, sob a gide do Ocidente europeu, imparvel diante de quaisquer obstculos, assumiu vrias formas e modificou-se permanentemente com o passar do tempo. Foi o Ocidente que construiu as noes de Novo Mundo, Oriente, frica, etc. Todas essas regies do globo sofreram o impacto da expanso dos europeus e, depois, dos norte-americanos. Em todas elas estabeleceu-se uma dialtica de conquista, destruio e antagonismo, ao mesmo tempo em que tambm se processaram aspectos de convergncia, diversidade e integrao. Em outras palavras, sabemos que esse processo agrediu, mutilou e at mesmo eliminou povos inteiros, com suas estruturas socioculturais e civilizatrias. Contudo, sabemos tambm que os povos dos vrios lugares do mundo que foram impactados pelo mercantilismo, pelo colonialismo e pelo imperialismo sempre demonstraram capacidade de assimilar e traduzir em seu beneficio os elementos e caractersticas civilizatrias dos dominadores, inclusive para elaborar perspectivas de auto-afirmao e superao da sua situao de colonizado ou dominado. Mas no exclusivamente a esse processo histrico que nos referimos quando falamos de globalizao. importante lembrar que globalizao um termo que aparece e se fixa na linguagem contempornea primeiro, acadmica e, depois, coloquial nas ltimas dcadas do sculo XX. Refletindo sobre esse momento da Histria, h autores, como Samuel Huntington (1994), que veem nos processos que sacudiram as duas ltimas dcadas do sculo XX, como o colapso e desaparecimento do comunismo histrico e a retomada da democracia poltica em vrias partes do mundo, o embasamento conjuntural da globalizao. Esta seria, portanto, o resultado e a expresso de uma nova onda democratizante. Em outras palavras, a globalizao estaria conectada expanso da democracia pelo mundo. Independentemente da validade ou no dessa interpretao, h um reconhecimento quase unnime de que o mundo e as pessoas dentro dele vivem uma situao nova. Numa palavra: a partir do estabelecimento da globalizao, o mundo ficou menor, as distncias assumiram outra perspectiva, 23

e o contato entre os seres humanos se tornou muito mais efetivo do que antes. Como observou A. Giddens (2000), passamos a estar em contato regular com outros que pensam diferentemente e vivem de forma distinta de ns. Aprofundando a reflexo em torno das mudanas promovidas pela globalizao e procurando ver suas potencialidades mais profundas em relao histria da humanidade, o socilogo Octavio Ianni (2000), a partir de uma outra perspectiva, procurou definir a globalizao como um novo surto de universalizao do capitalismo, como modo de produo e processo civilizatrio. Para o saudoso socilogo brasileiro, a globalizao um processo que simultaneamente desafia, rompe, subordina, mutila, destri ou recria outras formas sociais de vida e de trabalho, compreendendo modos de ser, pensar, agir, sentir e imaginar. Estabelecido esse processo, emergiria uma sociedade global que pode ser pensada, de acordo com Ianni, como uma totalidade abrangente, complexa e contraditria. O desafio estaria, ento, em compreender os traos e as caractersticas dessa nova realidade social, o que no uma questo simples. Essa sociedade global , em alguns lugares, evidente e inquestionvel e, em outros, ao mesmo tempo incgnita, fugaz, invertebrada ou imaginria. Ela no pode ser definida como um processo de homogeneizao e integrao, sem ao mesmo tempo ser pensada tambm como uma sociedade de diferenciao e fragmentao. Octavio Ianni procura se aproximar ao mximo de uma compreenso dessa nova realidade, afirmando que: a sociedade global est sendo tecida por relaes, processos e estruturas de dominao e apropriao, integrao e antagonismo, soberania e hegemonia. Trata-se de uma configurao histrica problemtica, atravessada pelo desenvolvimento desigual, combinado e contraditrio. [...] Desde o princpio, pois, a sociedade global traz no seu bojo as bases do seu movimento. Ela necessariamente plural, mltipla, caleidoscpica (Ianni, 2000). De forma mais ampla e tambm mais contundente, o filsofo espanhol Fernando Quesada (2004) construiu uma reflexo segundo a qual a globalizao um processo que tem realizado, at o momento, uma verdadeira ruptura no imaginrio poltico que se construiu no mundo ocidental desde os incios da modernidade, cuja base fundamental a ideia do contrato social. Para Quesada, inclusive, se poderia tambm pensar que a globalizao estaria abrindo as possibilidades de produo de um novo imaginrio poltico, que, com todos os problemas que possa vir a apresentar, ainda assim superaria tanto o longnquo imaginrio poltico grego (baseado no pertencimento plis) quanto aquele aberto com a modernidade, a que nos referimos acima. Este breve inventrio no poderia deixar de resgatar a anlise de dois grandes especialistas no tema, David Held e Antony McGrew. Estes autores (2001) entendem que se poderia pensar a globalizao no como um artifcio ardiloso e incompreensvel, mas como algo bastante reconhecvel. Na chave interpretativa desses dois investigadores, a globalizao , antes de mais nada, um termo que visa identificar a escala ampliada, a magnitude crescente, a acelerao e o aprofundamento do impacto dos fluxos e padres transcontinentais de interao social. Com ela alterou-se a escala da organizao humana; a partir dela enlaou-se todo o planeta, uma vez que as 24

relaes de poder expandiram-se por todo o seu traado. Com a globalizao evidenciou-se a dificuldade ou at o equvoco de se pensar separadamente os assuntos internos e externos dos pases, em todos os mbitos. Por essa razo, as principais tradies da poltica ocidental, tais como o conservadorismo, o liberalismo e o socialismo, no conseguiram oferecer, at o momento, interpretaes coerentes e tampouco respostas adequadas a um mundo marcado pela globalizao. De qualquer maneira, independentemente da definio que se queira dar globalizao, uma questo deve ser registrada como uma dimenso em nada irrelevante: sabemos que os impactos da globalizao no so homogneos e, por isso, em qualquer anlise desse fenmeno, h que se observar sempre o grau e a magnitude de integrao a ele de pases, regies ou mesmo grupos sociais. Em outras palavras, a globalizao efetivamente um processo irregular e no vivida nem experimentada de maneira uniforme. No seria incorreto afirmar, portanto, que adentramos no sculo XXI sem termos uma definio da globalizao ou da sociedade global que tenha alcanado condio de ortodoxia nos crculos acadmicos. Em outras palavras, a globalizao est em debate e no h consenso satisfatrio sobre o seu significado. No emaranhado das tentativas de definio sobre o que a globalizao e nesse artigo apenas sugerimos algumas , possvel identificar, de acordo com David Held e Antony McGrew (2001), duas grandes correntes de interpretao: os globalistas e os cticos. Os primeiros entendem que a globalizao um processo real e profundamente transformador; os segundos consideram exagerado esse diagnstico e, por essa razo, afirmam que bastante mais complicado compreender verdadeiramente as foras que esto modelando a sociedade atual e tambm as opes polticas que se apresentam no cenrio mundial. No difcil reconhecer que essa disjuntiva entre globalistas e cticos expressa um dualismo bastante tosco e se baseia em interpretaes contrapostas extradas de argumentos e opinies que, em muitos casos, podem ser entendidas como aproximveis. Essa disjuntiva d base, portanto, a uma configurao de dois tipos ideais, teis do ponto de vista analtico e investigativo para indicar reas de consenso e disputa em torno da questo central, a globalizao. Apesar das suas imensas diferenas que mencionaremos em seguida , ambos os lados compartilham algumas avaliaes comuns a respeito da realidade atual. Seguindo a Held e a McGrew (2001), podemos destacar pelo menos cinco pontos de convergncia: [1] ambos consideram que, nas ltimas dcadas, ocorreu um notvel crescimento da interconexo econmica dentro das regies e entre elas, ainda que com consequncias multilaterais e desiguais em diferentes comunidades; [2] a competio (poltica, econmica e global) inter-regional e global desafia as velhas hierarquias e gera novas desigualdades de riqueza, poder, privilgio e conhecimento; [3] os problemas transnacionais e transfronteirios, tais como a extenso da produo de alimentos geneticamente modificados, a lavagem de dinheiro e o terrorismo global, tm demandado crescente protagonismo, colocando em questo 25

diversos aspectos do papel, das funes e das instituies tradicionais de prestao de contas dos governos nacionais; (4) expandiu-se a governana internacional nos mbitos regional e global da Unio Europia OMC , o que coloca importantes questes normativas sobre o tipo de ordem mundial que se est construindo e quais so os interesses a que ela serve; e [5] esses desenvolvimentos exigem novas maneiras de pensar sobre a poltica, a economia e a mudana cultural; exigem tambm respostas imaginativas por parte dos polticos e dos gestores sobre as futuras possibilidades e formas de regulao poltica efetiva e de controle democrtico. Apesar do reconhecimento, por parte dessas duas correntes, de que existe um processo agudo e profundo de mundializao, seria importante, contudo, demarcarmos as diferenas entre globalistas e cticos, pelo menos no que se refere aos elementos centrais da divergncia entre ambos. Para os cticos, o que se entende por globalizao no mais do que um conjunto de processos de internacionalizao, isto , um crescente vnculo entre economias e sociedades nacionais essencialmente distintas, de regionalizao e de triadizao, ou seja, de agrupamentos geogrficos e econmicos transfronteirios que estruturam atualmente os plos econmicos mundiais hegemonizados por EUA, Europa e Japo. Os cticos chamam a ateno para o fato de que a histria da humanidade j vivenciou processos como esses e argumentam tambm que h um claro descompasso entre o discurso da globalizao e um mundo no qual a maior parte da vida cotidiana das pessoas est dominada por circunstncias nacionais e locais. Por fim, para os cticos, a globalizao uma construo mitolgica necessria no sentido de justificar e legitimar o processo global neoliberal, ou seja, a criao de um mercado livre global e a consolidao do capitalismo anglo-americano nas principais regies econmicas do mundo (Held & Mcgrew, 2003). Em termos gerais, essa viso compartilhada por alguns pensadores marxistas, para os quais a globalizao uma nova forma de imperialismo, fundada nas necessidades e nas exigncias do capital financeiro central e garantida pelos mecanismos de controle e vigilncia multinacionais (G7, Banco Mundial, etc.). Na situao atual, alguns intrpretes que comungam potentes crticas globalizao afirmam categoricamente que a nova ordem mundial no se sustentaria sem a hegemonia norte-americana e que a globalizao no outra coisa seno a ameaa de americanizao integral do planeta. Alm das objees acima apresentadas, possvel tambm recolher vises surpreendentemente mais radicais contra a globalizao. Segundo George Soros (2002), um homem que fez fortuna com a especulao financeira mundial, a globalizao anulou os avanos alcanados pelo Estado de bemestar social, deixando milhes de pessoas sem uma proteo razovel. Alm disso, a globalizao , para ele, extraordinariamente perversa porque permite aos capitais um movimento inaudito ao redor do mundo, enquanto cria imensas dificuldades para o movimento das pessoas. A globalizao concentra riquezas e, por isso, distribui mal os recursos. Enfim, para Soros, a globalizao cria um cenrio de insegurana e, mais do que isso, est baseada em mercados financeiros globais fortemente propensos a crises descontroladas. 26

A todas essas vises os globalistas respondem por meio de vrios argumentos, procurando rechaar a afirmao segundo a qual globalizao sinnimo de americanizao ou de imperialismo ocidental. Para esses, a globalizao resultado de mudanas estruturais mais profundas na escala da organizao social moderna. Essas transformaes teriam sido causadas por desenvolvimentos em diversas dimenses da atividade humana, o que permitiu um crescimento sem precedente das corporaes multinacionais e dos mercados financeiros mundiais, bem como uma ampliao tanto da difuso da cultura popular quanto da importncia da ateno em relao degradao do meio ambiente. Por outro lado, para os globalistas, o enfoque espacial essencial na compreenso do fenmeno da globalizao. Divergindo dos crticos da globalizao, os globalistas entendem que necessrio ver as atividades e relaes que estruturam a escala inter-regional e intercontinental, e no apenas a escala local e nacional; todas elas devem ser vistas no em termos hierrquicos e excludentes, mas sim nas inter-relaes entre essas diferentes escalas, consideradas de maneira fluida e dinmica. No somente a dimenso espacial-geogrfica importante para os globalistas. Eles pensam tambm a partir da Histria, a partir da ideia da longa durao, ou seja, da perspectiva dos padres de longo alcance para a mudana histrica secular. Em outras palavras, para se compreender a globalizao preciso localiz-la no contexto das tendncias seculares do desenvolvimento histrico mundial (Held & Mcgrew, 2003). Assim, preciso compreender as fases desse desenvolvimento e suas diferenas, suas formas histricas distintas. Nesse sentido, de acordo com Held & Mcgrew (2003), deve-se verificar como variaram os padres da globalizao ao longo do tempo para se poder assim estabelecer o que o mais caracterstico da fase atual. Por essa razo, os globalistas procuram enfatizar as investigaes em torno de trs aspectos principais: [1] as transformaes que ocorrem nos padres tradicionais de organizao socioeconmica; [2] as transformaes frente aos princpios territoriais estabelecidos; e [3] as transformaes na esfera do poder. Esse ltimo aspecto , por assim, dizer, a preocupao mais forte dos globalistas. O que se quer nesse ltimo ponto compreender essencialmente sua instrumentalizao, sua configurao e distribuio, e seu impacto. Da a razo pela qual um dos ncleos essenciais da discusso dos globalistas ser a busca dos vnculos entre as ideias de governana democrtica e cidadania global. Como dissemos acima, o debate em torno da globalizao no se esgotou nem tampouco foi cancelado. Se considerarmos a globalizao como um fenmeno complexo, cheio de nuances ou possibilidades, e no como algo estabelecido pelo padro geral da chamada globalizao econmica, que tem por base os fundamentos do neoliberalismo, poderamos supor uma perspectiva ou uma estratgia de ao que enfrentasse os desafios colocados por essa nova fase. Assim, antes do brado um outro mundo possvel, o reconhecimento da existncia da globalizao demandaria uma indagao formulada em outros termos: possvel uma outra globalizao? As indicaes de David Held (2000) so, ao nosso ver, altamente sugestivas no sentido de apresentarmos uma rede de alternativas, pensadas no somente na 27

perspectiva de se adaptar globalizao mas tambm na perspectiva de se refletir a respeito de novas formas de globalizao ou de uma outra globalizao. O pesquisador ingls sugere cinco encaminhamentos para a construo daquilo que ele conceitua como concepo cosmopolita da democracia: Em primeiro lugar, a regulao da volatilidade dos mercados financeiros internacionais e da busca especulativa de lucros a curto prazo. Isso poderia ser feito por meio do incremento substancial da regulao e da transparncia das operaes bancrias e financeiras, da aplicao de impostos que incidam sobre essas mesmas operaes e sobre aquelas que envolvessem divisas internacionais. Essas medidas expressariam uma opo poltica pela reteno, por parte dos governos, do controle dos capitais e visariam forar os mercados de curto prazo a concordarem com as intervenes democrticas na vida econmica. Claro est que essas medidas contraditam fortemente a globalizao entendida a partir do ponto de vista neoliberal. Em segundo lugar, em um plano tambm global, seria necessrio construir novas formas de coordenao econmica. Seria fundamental a criao de uma nova entidade internacional de coordenao econmica, uma vez que no cenrio atual predomina a fragmentao de polticas entre FMI, Banco Mundial, OECD e G7. Neste ponto, o essencial o reconhecimento de que haja uma autoridade econmica internacional de coordenao que garanta e oriente as polticas econmicas j estabelecidas ou, ento, seja capaz de implantar novas estas ltimas tambm demandando a presena das autoridades pblicas na sua elaborao e reconhecimento. De acordo com Held, necessrio, em terceiro lugar, ampliar a legislao no sentido de estabelecer um contrapeso aos custos impostos pelo mercado, tanto em termos ambientais quanto sociais. Entretanto, h que se ter sutileza nesse empreendimento, uma vez que se trata da alterao de normas de livre mercado e do sistema mundial de comrcio para atuar no sentido da defesa tanto de objetivos de proteo social quanto de defesa do meio ambiente. O objetivo aqui introduzir novas condies que potencializem investimentos e aumentem responsabilidades no interior do sistema econmico global, a fim de suprir e complementar acordos coletivos e medidas de bem-estar social, quer em mbito nacional, quer regional. Enfim, preciso construir um sistema que introduza a responsabilidade e a regulao nos mecanismos institucionais com o propsito de coordenar o investimento, a produo e o comrcio. Em outras palavras, visa-se construir um novo pacto entre poder econmico, democracia e Estado de bem-estar social. Em quarto lugar, h que se propor uma nova ordem internacional que considere a reverso do predomnio das grandes potncias nos organismos institucionais globais, para que se possam adotar medidas que enfrentem a pobreza e os obstculos ao desenvolvimento econmico, como, por exemplo, o cancelamento das dvidas dos pases pobres, no sentido de se criar as bases para um fortalecimento do capitalismo global, resultante e compatvel com a aplicao de uma srie de procedimentos e mecanismos democrticos.

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Por fim, estaria apontada a perspectiva de criao de um sistema de prestao de contas em escala global, que teria todas as condies de ser iniciado e aprofundado na Unio Europeia, a partir da superao dos dficits democrticos que se estabeleceram no momento da sua organizao. Esse movimento contaria efetivamente com uma maior valorizao do Parlamento Europeu como rgo de tomada de decises. No que se refere ao mbito institucional mais global, haveria que se apresentar um projeto concreto de reestruturao do Conselho de Segurana das Naes Unidas para dar mais presena e poder aos pases em desenvolvimento. Fariam parte tambm dessa estratgia de estabelecimento das bases iniciais de um governo mundial o melhoramento dos mecanismos de prestao de contas das entidades econmicas internacionais e/ou transnacionais e, da mesma maneira, o fortalecimento da capacidade, entre outras instituies, daquelas vinculadas defesa dos direitos humanos. O que nos apresenta David Held (2000), efetivamente, uma perspectiva ativa de intervir na nova situao mundial marcada pela globalizao, no sentido de preparar e de visualizar o cidado como uma entidade no apenas nacional ou local, mas sem prescindir dessas dimenses. De acordo com Held, no futuro, os cidados no apenas devero ser cidados de suas prprias comunidades, mas das zonas em que vivem e tambm da prpria ordem global. Devem participar de distintas comunidades polticas, de cidades e reas subnacionais, de pases, zonas supranacionais e redes globais mais amplas. Esse projeto cosmopolita, de acordo com Held, admite que, nos dias de hoje, j se iniciou o processo que procura desvincular a autoridade poltica legtima dos Estados e suas fronteiras estabelecidas, ao mesmo tempo que institui, no conjunto do pas, formas legtimas de governo. Mas faz questo de agregar que essa dinmica estar integrada ao projeto de democracia cosmopolita, desde que esse processo esteja circunscrito a um extenso compromisso com os direitos e os deveres democrticos. Entre cticos e globalistas, a proposta da democracia cosmopolita abre uma generosa alameda para a reflexo daqueles que pensam em superar as barreiras do presente. Imersos na globalizao, pelo menos de uma coisa ns sabemos: ela no a prefigurao de uma sociedade mundial harmoniosa, como muitos imaginaram ou ainda imaginam. No tampouco um processo universal de integrao global desprovido de conflitos culturais e civilizatrios. Ampliando a interdependncia, a globalizao tanto pode abrigar futuras animosidades ou antagonismos como tambm engendrar a xenofobia ou alimentar polticas reacionrias. O desafio imaginar que ela possa, ao contrrio, unificar o gnero humano. E, nesse caso, a resposta somente pode advir de uma perspectiva democrtica. 6.2.1 - Cticos - Corrente terica dos cticos Para a corrente terica dos cticos a globalizao um mito, pois esta no um processo nico na histria, no causou rupturas, pois este mito foi criado para reduzir o papel do Estado. Portanto, o que esta corrente prega uma anlise crtica sobre a economia internacional, pois no h uma novidade histrica neste processo. Por isso, cticos econmicos como Hirst e Thompson 29

argumentam que o conceito de globalizao subestima a realidade, exagerando-a, e que neste caso no houve tantas alteraes assim pois (Globalizao: Arautos, Cticos e Crticos, pg. 118): 1. o nvel de integrao alcanado hoje pela economia mundial no indito; 2. companhias genuinamente transnacionais so relativamente raras; 3. a mobilidade do capital no tem levado ao macio redirecionamento dos investimentos e do emprego dos pases avanados para as naes em desenvolvimento; 4. tal como reconhecem at mesmo alguns dos advogados da globalizao, a economia mundial est longe de ser "global", uma vez que comrcio, investimento e fluxos financeiro concentram-se na "Trade" (Europa, EUA e Japo), e tal predomnio tende a permanecer e 5. estas trs potncias so capazes, portanto, especialmente se coordenarem as respectivas polticas, de exercer forte influncia sobre a economia mundial; assim, os mercados globais seguem ao alcance do controle e regulamentao governamental. J para os cticos polticos todo o debate gira em torno dos Estados, Kenneth Waltz um dos maiores cticos polticos argumenta que os Estados no so os nicos atores importantes do sistema internacional, que existe sim atores relevantes como as multinacionais e as atividades transnacionais, porm deixa claro que toda a estrutura poltica internacional continua a ser definida a partir da interao dos Estados; os movimentos transnacionais operam dentro dessa estrutura (Globalizao: Arautos, Cticos e Crticos, pg. 126). Com isso, nas dcadas de 1970/1980 a globalizao acabou misturando-se com a questo da interdependncia, pois os entusiastas da globalizao afirmavam que a maior interdependncia aumentava as chances da manuteno da paz. Contudo, Waltz rebate esta ideia, pois segundo ele, a maior proximidade, ao contrrio, eleva a probabilidade de conflito ocasional. "Se a interdependncia crescer mais depressa de que o desenvolvimento de um "controle central", acabar por precipitar o momento da guerra" (Globalizao: Arautos, Cticos e Crticos, pg. 126-127). Portanto, neste sentido, Waltz argumenta que s vai existir interdependncia entre duas partes, por exemplo (contexto da Guerra Fria), quando o custo de romper o intercmbio que as vincula aproximadamente idntico para ambas. Por fim, para outros cticos polticos como Robert Keohane e Joseph Nye o processo da globalizao merece maior ateno principalmente por afetar diretamente o papel dos Estados, discordando das idias realistas doWaltz, pois afirmam que existe sim a continuidade de alguns processos, mas que tambm houve algumas mudanas/transformaes, como por exemplo que: "os avanos da tecnologia e o aumento das transaes econmicas internacionais levaro ao um novo mundo no qual os Estados, e seu controle sobre a fora, deixaro de ser importantes" (Globalizao: Arautos, Cticos e Crticos, pg. 128). Neste sentido, a interdependncia surge entre os atores, pois " interdependncia significa dependncia mtua, situaes em que o relacionamento implica reduo recproca, mas no necessariamente simtrica, da autonomia entre pases, ou entre atores situados em diferentes 30

naes[...] relaes de interdependncia assimtrica constituem fontes de poder entre atores, estatais e no-estatais"(Globalizao: Arautos, Cticos e Crticos, pg. 128). 6.3 - Transformacionalistas As aes locais esto ligadas ao cenrio social que compreende o mundo como um todo (conexo entre o local e o global). Os socilogos usam o termo globalizao para referirem-se queles processos que esto intensificando as relaes e a interdependncia sociais globais. um fenmeno social com vastas implicaes. Globalizao est relacionada ao desenvolvimento de redes mundiais e tambm um fenmeno local, o que faz com que as pessoas tenham mais conscincia de sua ligao com os povos de outras sociedades, e dos problemas que o mundo enfrenta: que nossas aes tm consequncias para outros e que os problemas do mundo tm consequncias para ns. Anthony Giddens explica que no entendimento dos transformacionalistas, a globalizao uma fora de reordenao das relaes inter-regionais e das aes distncia, que est transformando o governo e as polticas mundiais, pois um processo aberto e dinmico que est sujeito influncia e mudana. A ordem global est se transformando (na esfera econmica, poltica, cultural e pessoal), mas velhos modelos ainda restam, e os governos ainda detm bastante poder apesar do avano da interdependncia global. Ainda, a globalizao entendida como um fluxo de imagens, informaes e influncias que corre em duas mos. A migrao, a mdia e as telecomunicaes globais contribuem na difuso de influncias culturais, por isso, a globalizao um processo descentrado e reflexivo, caracterizado por conexes e fluxos culturais que funcionam de um modo multidirecional. Os pases esto passando por um processo de reestruturao que responde s novas formas de organizao econmica e social desprovidas de base territorial (corporaes, movimentos sociais, organismos internacionais), e os governos esto sendo forados a adotar uma postura mais ativa e aberta ao exterior, que os leve governana dentro das complexas condies da globalizao. A globalizao muito retratada apenas como um fenmeno econmico (papel das corporaes transnacionais, que influenciam os processos de produo global e a distribuio internacional do trabalho), mas globalizao tambm criada pela convergncia de fatores polticos, sociais, culturais e econmicos. Entendido em termos gerais a definio adotada no presente trabalho sobre globalizao, importa ressaltar que ela um processo aberto e internamente contraditrio, que produz resultados que so difceis de prever e controlar (riscos). Muitas mudanas geradas pela globalizao so apresentadas como novas formas de risco que diferem daquelas que existiam antigamente (riscos externos secas, terremotos, escassez, tempestades, entre outros). Hoje os riscos so incalculveis na origem e indeterminados nas suas consequncias (alguns chamam de riscos invisveis, como por exemplo, os vrus eletrnicos). A acelerao industrial e o desenvolvimento tecnolgico causam a expanso da interferncia do homem na natureza, o que gerou o incio de uma destruio 31

ambiental generalizada (causa indeterminada e consequncias difceis de calcular): aquecimento global, mudana de padres climticos. Por serem os riscos ambientais difusos em sua origem, no se sabe como enfrent-los nem quem tem a responsabilidade de faz-lo. O aquecimento global, o desenvolvimento de novas doenas, a discusso sobre a comida geneticamente modificada e outros riscos manufaturados colocam os indivduos perante novas escolhas e desafios de suas vidas quotidianas. Assim, por no haver um mapa sobre os novos perigos (o que dificulta o controle dos riscos ambientais), os indivduos, os pases e as organizaes transnacionais devem negociar riscos medida que fazem escolhas - decises sobre quais riscos se est preparado a assumir. A maioria das questes referentes ao meio ambiente esto relacionadas com o risco, so resultado da expanso da cincia e da tecnologia (incertezas). Ulrich Beck foi o primeiro a introduzir a ideia de sociedade do risco, entendendo que muitos dos riscos enfrentados pelas pessoas so riscos globais, no discriminatrios em termos de nacionalidade, riqueza ou origem social. Anthony Giddens cita o socilogo Ulrich Beck, precursor sobre o risco e a globalizao, que analisa os riscos como um fator de contribuio para a formao da sociedade de risco global: A sociedade de risco, segundo ele, no est limitada somente aos riscos de sade e ambientais inclui toda uma srie de muda