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ÁREA DE HISTÓRIA Luísa Alvarenga Turini, 5ª série, 2009 Matheus Silva Viana, 6ª série, 2009 Produção de alunos do Prof. Getúlio Ribeiro relativa a reflexões sobre homem, tempo e espaço na história. Sala: 1N313 Campus Educação Física (CAp ESEBA/UFU) Docentes Prof. Dr. André Luis Bertelli Duarte Prof. Dr. Christian Alves Martins Prof. Ms. Getúlio Ribeiro Profª. Drª. Leila Floresta Profª. Mª. Roberta Paula Gomes Silva Concepções de EnsinoAprendizagem da Área de História A Área de História do Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Uberlândia (CAp ESEBA/UFU) atua na formação dos estudantes do 4º ao 9º ano do Ensino Fundamental e do 6º ao 9º ano da Educação de Jovens e Adultos com o objetivo de estimular o pensamento crítico e a compreensão do mundo no qual estão inseridos. A ênfase da formação, nesta perspectiva, se dá sobre aquilo que consideramos o desenvolvimento da consciência histórica dos sujeitos, isto é, a compreensão de que

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ÁREA DE HISTÓRIA

Luísa Alvarenga Turini, 5ª série, 2009 Matheus Silva Viana, 6ª série, 2009

Produção de alunos do Prof. Getúlio Ribeiro relativa a reflexões sobre homem, tempo e espaço na história.

Sala: 1N313 – Campus Educação Física (CAp ESEBA/UFU)

Docentes

Prof. Dr. André Luis Bertelli Duarte

Prof. Dr. Christian Alves Martins

Prof. Ms. Getúlio Ribeiro

Profª. Drª. Leila Floresta

Profª. Mª. Roberta Paula Gomes Silva

Concepções de Ensino–Aprendizagem da Área de História

A Área de História do Colégio de Aplicação da Universidade Federal de

Uberlândia (CAp ESEBA/UFU) atua na formação dos estudantes do 4º ao 9º ano do

Ensino Fundamental e do 6º ao 9º ano da Educação de Jovens e Adultos com o objetivo

de estimular o pensamento crítico e a compreensão do mundo no qual estão inseridos. A

ênfase da formação, nesta perspectiva, se dá sobre aquilo que consideramos o

desenvolvimento da consciência histórica dos sujeitos, isto é, a compreensão de que

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cada sujeito nasce e se desenvolve em um determinado contexto histórico e social que

engloba diferentes construções discursivas, práticas culturais, relações de poder etc, que

influencia a sua visão do mundo, do outro (alteridade) e de si mesmo.

Do ponto de vista metodológico, a Área de História trabalha na perspectiva de

que o conhecimento sobre o passado não se encontra dado e encerrado, mas é parte

fundamental na construção dos sentidos do tempo presente, ou seja, o olhar para a ação

dos homens, mulheres e crianças do passado procura responder a determinados

questionamentos, angústias e sensações que fazem parte da sociedade atual, de sua

necessidade em construir significados para suas práticas. Além disso, também se

trabalha na perspectiva de que a própria construção do conhecimento histórico ocorre de

maneiras distintas, a partir de diferentes pontos de vista, o que propicia a ampliação da

capacidade interpretativa dos estudantes.

A elaboração de conhecimentos e interpretações sobre o passado, portanto,

busca contribuir para o desenvolvimento subjetivo dos alunos e alunas, principalmente,

de sua capacidade em compreender o mundo que os cerca, a diversidade cultural, as

relações socioeconômicas, a participação política etc, para que eles se percebam como

sujeitos históricos responsáveis pela construção da realidade a qual pertencem.

Princípios do currículo de história

Foco na habilidade: como o conteúdo pode contribuir para a aquisição de uma

competência específica.

“O que significa a aquisição de habilidades nas aulas de história, de que minha

filha tem falado tanto?”, perguntou certa vez a mãe de uma estudante.

A implementação do ensino visando o desenvolvimento de competências consta

no texto da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996. Mas antes de tudo, precisamos

compreender o que se entende por competência. Segundo Perrenoud:

Define-se uma competência como a aptidão para enfrentar uma

família de situações análogas, mobilizando de uma forma correta,

rápida, pertinente e criativa, múltiplos recursos cognitivos: saberes,

capacidades, microcompetências, informações, valores, atitudes,

esquemas de percepção, de avaliação e de raciocínio (Perrenoud,

2002, p. 19).

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Percebe-se que constitui um atributo que o estudante poderá mobilizar em sua

própria vida na solução de problemas. Desse modo, focar na habilidade no ensino de

história, significa utilizar o conhecimento específico como recurso de compreensão e

intervenção na própria realidade, revelando-se uma perspectiva mais transformadora do

currículo escolar.

Trata-se de uma importante mudança de paradigma nos objetivos de ensino, na

qual altera-se o foco tradicional único do conhecimento de um conteúdo para o

gerenciamento de habilidades específicas a partir do sujeito e de determinadas situações.

Exemplo: a abordagem da 2ª. Guerra Mundial (1939-1945), outrora ensinada de

forma factual nos bancos escolares, torna-se um “recurso cognitivo” poderoso para que

o estudante desenvolva, paradoxalmente, a capacidade de pacificação de seus próprios

conflitos, e, por conseguinte, contribui para a própria pacificação da sociedade a partir

da seleção, comparação, opinião e elaboração de novos conceitos a partir de suas

próprias vivências. Portanto, significa pensar com a História e não pensar “a” História.

Esse movimento faz com que o conteúdo vinculado a competências desenvolva

um sentimento de pertença para o discente, apresentando uma abordagem mais profunda

a partir de sua própria realidade, deslocando o estudante da centralização do conteúdo

conceitual. Essa perspectiva pragmática da produção de conhecimento fomentará

inclusive a compreensão de um procedimento investigativo, fazendo com que os

estudantes-pesquisadores compreendam, no processo, a função social da atividade que

estão realizando.

Esta concepção transcende a necessidade dos alunos e das alunas de estarem

aptos para a aprovação em exames, mas, para muito além disso, fazendo com que os

mesmos sejam educados para a vida.

Metodologia ativa: foco na solução de problemas históricos e cotidianos; trabalha a

responsabilidade, identidade do aluno diante do problema; professor como orientador

do processo.

“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua

produção ou a sua construção” (FREIRE, 1996, p. 25). Com essas palavras de Paulo

Freire, delimitamos o terreno do que chamamos de “metodologia ativa”, que consiste

em um método de ensino que estabelece o aluno como sujeito ativo na elaboração do

conhecimento histórico.

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Do ponto de vista da formação do aluno, a proposta se alinha aos Objetivos

Gerais de História instituídos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, segundo os

quais o aluno deverá ser capaz de:

- questionar sua realidade, identificando problemas e possíveis

soluções, conhecendo formas político-institucionais e organizações da

sociedade civil que possibilitem modos de atuação;

- dominar procedimentos de pesquisa escolar e de produção de texto,

aprendendo a observar e colher informações de diferentes paisagens e

registros escritos, iconográficos, sonoros e materiais.

A efetivação de tal proposta depende, ao nosso ver, de dois principais fatores: a

elaboração de um currículo e metodologia que favoreçam uma maior interação do aluno

com os conteúdos e procedimentos do conhecimento histórico; e um

redimensionamento do papel do professor no processo.

No que se refere ao primeiro fator, o currículo da Área de História do CAp

ESEBA/UFU se encontra organizado a partir de grandes eixos temáticos, eleitos tendo

como importante critério a sua correlação com temáticas e conteúdos significativos para

os alunos dentro de cada faixa etária e ciclo de formação correspondente. As

metodologias de ensino e avaliação, por sua vez, vão ao encontro de práticas que

permitam aos alunos organizar as próprias ideias, afirmar posições, fundamentar

argumentações, e desenvolver o senso crítico e a criatividade, tais como:

➢ Produção de texto;

➢ Interpretação de texto através da elaboração de desenho;

➢ Produção de texto através da interpretação de desenhos;

➢ Interpretação/produção de charge;

➢ Interpretação/produção de música;

➢ Interpretação/produção de poesia;

➢ Interpretação de documentos;

➢ Produção de História em Quadrinhos;

➢ Produção de jornal escrito;

➢ Organização de ideias em torno de um assunto através de questões

dissertativas;

➢ Elaboração de maquetes e cartazes;

➢ Metodologias que utilizam linguagem oral: apresentação teatral,

debates, seminários, outros;

➢ Pesquisa: entendemos a pesquisa como um estudo que pressupõe

diferentes etapas: delimitação do tema a ser pesquisado,

problematização e definição dos objetivos da pesquisa, levantamento

e seleção das fontes, definição da metodologia a ser utilizada, análise

dos dados e materiais, conclusões. Embora não tenhamos a

prerrogativa de transformar os/as nossos/as alunos/as em

historiadores profissionais, é possível lidar com os procedimentos

acima descritos dentro das condições de reflexão, análise e abstração

dos/as alunos/as.

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No que se refere à redefinição do papel do professor de História, tomamos como

referência o trabalho de Oldimar Cardoso, que busca reunir parâmetros para uma

“Didática da História”, definindo-a mais como uma subárea da História do que da

Didática. O trecho a seguir nos dá um vislumbre da perspectiva sobre a atuação do

professor de História a partir dessa concepção:

Quando reconhecemos a autonomia das disciplinas escolares, a

Didatica da Historia perde seu carater prescritivo, deixa de ser um

conjunto de procedimentos para melhor transmitir aos alunos a

‘Historia dos historiadores’. A Didatica da Historia tambem perde o

status de ‘dramaturgia do ensino’ ou ‘arte de ensinar’ — Lehrkunst,

que ela tinha tal como concebida no seculo XVII por Jan Comenius.

(CARDOSO, 2008, p. 158)

Seguindo esta abordagem, o professor de História abandona a tradicional

posição daquele que domina a “arte” de “transmitir” didaticamente aos seus alunos um

conhecimento histórico elaborado em uma dimensão que não é a sua, para que o seu

fazer se torne uma dimensão legítima da produção desse conhecimento. E, para tal,

afirmamos que este professor deve contar sempre com seu aluno como sujeito ativo

nessa construção. Percebemos que a ideia do professor de História que transmite

conteúdos se apoia em uma noção mais ampla da própria ideia de Didática, a qual exclui

o aluno da posição de sujeito. Incorporando a perspectiva freiriana anteriormente

exposta, formulamos a imagem do professor de História não mais como um transmissor

de conhecimentos previamente elaborados, mas sim um criador de possibilidades para a

elaboração deste conhecimento em correlação com seus alunos.

Conteúdos que se relacionem com a vivência dos estudantes: foco na relação

passado / presente e no contexto econômico e sociocultural que o estudante está

inserido.

O currículo de história possui como diretriz basilar a experiência discente, pois

acreditamos que ensinar não constitui meramente a transferência de conhecimento. Por

isso, para se compreender este princípio do currículo de história recorremos a referência

de Paulo Freire que afirmava a importância de se relacionar o currículo de uma

disciplina com a própria realidade dos discentes tomando a escola como um espaço

formativo.

Ele acreditava que através da educação o ser poderia exercer o empoderamento

de sua própria realidade, a partir do desenvolvimento de práticas que partissem do

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contexto do próprio educando. A grosso modo, “a uva é da vovó” das cartilhas escolares

teria que ser substituída por “o caju é da vovó” em algumas regiões do Nordeste, pois

do contrário, essa “educação bancária” seria realizada com depósitos de uma moeda

diferente, sem valor para os educandos.

Essa vivência seria vinculada ao conhecimento conceitual, no caso histórico,

favorecendo uma leitura produtiva das mudanças e permanências na sociedade. A partir

daí, poderemos perceber que a disciplina não seria apenas um conjunto de fatos

históricos isolados que aconteceram no passado, mas um processo que cria pontes entre

o passado e o presente e cujo conhecimento é importante para entendermos nossa

inserção no mundo.

Nesse sentido, os programas de ensino escolares, embora estejam alinhados a

diretrizes gerais, não poderão se furtar às especificidades manifestadas por um

determinado grupo de alunos e alunas.

Julgamos pertinente incorporar esse princípio fundamental por acreditarmos que

a compreensão do mundo em que os estudantes estão inseridos, deverá ser realizada de

dentro para fora, a partir da vivência dos próprios discentes numa perspectiva histórica,

promovendo uma qualidade social na educação.

Elaboração das reflexões à luz do conceito de historicidade

O conceito de historicidade, apesar de sua difícil definição, é fundamental para a

construção de um currículo de história capaz de contribuir para a formação humana dos

discentes.

Historiadores e filósofos que se debruçam sobre a história têm como dado

essencial desta ciência o fato de que todo indivíduo nasce e se desenvolve em

determinadas condições históricas, condições estas que serão apropriadas material,

intelectual e simbolicamente por este indivíduo ao longo de sua vida e que serão

fundamentais em seu processo de atribuição de sentido do mundo, dos outros e de si

mesmo (ARENDT, 2011).

Esta “condição humana universal” aponta, do mesmo modo, para o fato de que

todo indivíduo vive, pensa, atribui sentido ao mundo e a si mesmo a partir de uma

determinada historicidade, isto é, a partir da elaboração de categorias temporais – em

nosso caso utilizamos, geralmente, as categorias do passado, presente e futuro.

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O historiador alemão Reinhart Koselleck utilizou as categorias espaço de

experiência e horizonte de expectativa para explicar este processo de apropriação

humana do tempo histórico como dado antropológico. Segundo ele, a experiência é “o

passado atual, aquele no qual acontecimentos foram incorporados e podem ser

lembrados”. Além disso, na experiência de cada um, transmitida por gerações e

instituições, está presente um elemento interpessoal, outras experiências, alheias, que

formam aquilo que os sujeitos e os grupos sociais definirão como seu espaço de

experiência. O horizonte de expectativa, por sua vez, também é “ligado à pessoa e ao

interpessoal, também [...] se realiza no hoje, é futuro presente, voltado para o ainda não,

para o não experimentado, para o que apenas pode ser previsto”. [...] “Esperança e

medo, desejo e vontade, a inquietude, mas também a análise racional, a visão receptiva

ou a curiosidade fazem parte da expectativa e a constituem” (KOSELLECK, 2011, p.

310).

As palavras e definições de Koselleck são importantes para refletirmos sobre as

categorias temporais que usamos para dar sentido à nossa existência. De acordo com

ele, o passado, o presente e o futuro não são espaços temporais naturais, mas antes

construções realizadas no presente para nos situarmos no mundo. Deste modo, tanto o

passado (experiência) como o futuro (expectativa) são construídos pelos sujeitos num

processo de compreensão do mundo e da sociedade em que vivem.

Estas construções temporais nem sempre são simétricas e equilibradas e variam

de acordo com a importância que a sociedade dá a cada uma delas. Nas sociedades

antigas, por exemplo, a experiência era mais valorizada que a expectativa, de modo que

os romanos consideravam a história como “mestra da vida”; já as sociedades muito

impactadas pelos avanços tecnológicos, por outro lado, investem seus esforços muito

mais na expectativa e promovem mesmo rupturas com pensamentos e formas

consagradas pela experiência. A construção mais aceita atualmente, entretanto, diz que a

sociedade atual está vivenciando um processo de “crise do tempo”, onde as categorias

de experiência (passado) e expectativas (futuro) estão esvaziadas de sentido; estaríamos

vivendo, assim, uma espécie de “presentismo”: o passado já não teria mais nada a nos

ensinar – e isso explica o pouco valor dado à História e ao Patrimônio pelas gerações

atuais – e o futuro se apresenta como sombrio e obscuro – ameaças atômicas,

aquecimento global, racionamento de água etc. Tudo isso contribuiria para o

diagnóstico de que os indivíduos contemporâneos vivem num mundo marcado pelo

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consumo exacerbado do presente, do imediatismo, do efêmero, sem preocupar-se com o

antes e o depois (HARTOG, 2014).

Para a problematização deste panorama entendemos que o ensino de história tem

um papel fundamental na formação humana dos sujeitos. O ensino da história busca

colaborar no processo de conscientização dos discentes da historicidade de suas

existências pessoais e interpessoais, isto é, contribuir para que eles se percebam como

seres histórica e temporalmente constituídos por um antes (experiências daqueles que os

precederam) e por um depois (expectativas das quais eles serão os principais sujeitos).

Decorrente disto, o currículo de história busca colocar em evidência a historicidade dos

temas e questões situadas no tempo presente, na realidade vivida e vivenciada pelos

estudantes, como forma de ampliação de suas respectivas visões de mundo e, sobretudo,

das construções temporais que dão sentido às suas existências.

A alteridade como construção do sujeito e das relações sociais

A compreensão de que os seres e as sociedades humanas são capazes de produzir

diferentes modos de vida sem que, necessariamente, um seja considerado melhor que o

outro é uma conquista relativamente recente na história das ciências humanas. De fato,

até o início do século passado acreditava-se que as diferenças culturais entre as

sociedades eram fruto de processos de desenvolvimento que se encontravam em

estágios diferentes da evolução dos seres humanos.

De lá para cá, entretanto, cresceu entre os estudiosos das sociedades humanas a

certeza de que umas das principais características que definem os seres humanos é

justamente sua capacidade de produzir diversos modos de vida, ou seja, sua

potencialidade quase infinita de “produzir cultura”. Este reconhecimento, ainda que

tardio, mudou completamente a forma de olharmos para os encontros, choques e

estranhamentos provocados pelo contato e estudo de diferentes culturas. Neste contexto,

o conceito de alteridade ganhou particular relevo, entendido como um processo de

atribuição de sentido de si a partir do contato com aquilo que é estranho e diferente de

si. Esforçar-se por compreender a especificidade do outro, “colocar-se no lugar do

outro”, é visto, então, como um processo fundamental de construção da identidade dos

sujeitos e grupos sociais (TODOROV, 1993), na medida em que é a partir do

estranhamento provocado pelo contato com culturas diferentes da nossa que somos

capazes de modificar o olhar que temos sobre nós mesmos:

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De fato, presos a uma única cultura, somos não apenas cegos à dos

outros, mas míopes quando se trata da nossa. A experiência da

alteridade (e a elaboração desta experiência) leva-nos a ver aquilo que

nem teríamos conseguido imaginar, dada a nossa dificuldade em fixar

nossa atenção no que nos é habitual, familiar, cotidiano, e que

consideramos “evidente”. [...] Começamos, então, a nos surpreender

com aquilo que diz respeito a nós mesmos, a nos espiar. O

conhecimento da nossa cultura passa inevitavelmente pelo

conhecimento das outras culturas; e devemos especialmente

reconhecer que somos uma cultura possível entre tantas outras, mas

não a única (LAPLANTINE, 1991, p. 21).

O estudo dos seres humanos, e de suas diferentes formas de construção cultural e

social, vistos a partir de uma perspectiva histórica, nos auxilia, portanto, a perceber que

as nossas próprias formas culturais não são “naturais”, mas historicamente construídas

de uma entre muitas maneiras possíveis. Este reconhecimento possui um caráter político

evidente: por meio dele, tomamos consciência de que a sociedade atual e o seu futuro

não são dados, mas construídos na interação entre os seus diversos sujeitos.

Além disso, o foco na alteridade como construção do sujeito e das relações

sociais se constitui uma ferramenta fundamental para o estímulo do convívio respeitoso

entre as diferenças, o que contribui para a elaboração de aprendizados atitudinais

importantes para a vida em sociedade.

Ênfase no sujeito histórico: aluno que se projete como propositor de ações que

possibilitem a ressignificação do seu meio.

Entendemos que o nosso estudante é um sujeito (da) e (na) história, pois são

indivíduos constituídos de historicidade, valores de mundo, preferências e

subjetividades e que fazem parte da história assim como podem intervir no curso da

mesma, deixando de lado aquela ideia clássica de que os sujeitos da história são os

grandes nomes, como os políticos, reis, rainhas e entre outros. Dessa forma, é

importante que o estudante compreenda a história enquanto resultado da ação de

diferentes sujeitos, classes e grupos sociais.

Gradativamente, buscamos construir por meio do processo de

ensino/aprendizagem a noção de sujeito (na) e (da) história com os nossos estudantes,

tomando como ponto de partida a história cotidiana do estudante em seu tempo e

espaço, incorporando outros contextos históricos diferente do que nós conhecemos.

Assim, ao estudar o passado, o fazemos a partir das questões do presente, almejando

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dessa forma que o estudante possa ser propositivo com ações que venham intervir na

realidade em que estão inseridos e na relação com outros grupos sociais, distanciando

dessa forma do ensino de história meramente factual.

Desse modo, adotamos uma

Proposta de metodologia de Ensino de História que valoriza a

problematização, a análise crítica da realidade, concebe alunos e

professores como sujeitos que produzem história e conhecimento em sala

de aula. Logo, são pessoas, sujeitos históricos, que cotidianamente atuam,

transformam, lutam e resistem nos diversos espaços de vivências: em

casa, no trabalho, na escola, ... Essa concepção de ensino e aprendizagem

facilita a revisão do conceito de cidadania abstrata, pois ela nem é apenas

herdada via nacionalidade, nem liga-se a um único caminho de

transformação política. Ao contrário de restringir a condição de cidadão a

de mero trabalhador e consumidor, a cidadania possui um caráter humano

e construtivo, em condições concretas de existência (FONSECA, 2006, p.

18).

Na medida que os estudantes percebem que eles fazem parte da história e que

são sujeitos dessa mesma história, cria-se uma noção de pertença e, ao mesmo tempo,

de identidade social. Dessa forma, o saber histórico escolar contribui para que os

estudantes possam refletir criticamente sobre a sua realidade social, compreendendo

melhor a situação em que estão inseridos e, ao mesmo tempo, possibilita construir

reflexões frente às dúvidas e questionamentos sobre as questões do seu próprio tempo.

Temas e Eixos integradores

2º CICLO

• Pluralidade cultural / Meio Ambiente / Ética / Cidade e Campo

3º CICLO

• Meio Ambiente, trabalho e consumo / Ética / Migrações / Tecnologia

4º CICLO

• Identidade sexual / Política / Tecnologia / Juventude, linguagens e comunicação

PROEJA

• Identidade e Cultura / Natureza e Qualidade de Ensino / Sociedade e Tecnologia

/ Trabalho e Tecnologia

Propostas curriculares

2º CICLO

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Diversidade Cultural e Infância

• Conceito de cultura e alteridade.

• Infância: O que é ser criança no Brasil?

• Crianças em diferentes tempos e lugares.

• Infância: mudanças e permanências ao longo da História.

• Diversidade histórica e contemporânea: valorizando a infância

• A criança enquanto cidadã: seus direitos e deveres: o Estatuto da Criança

e do Adolescente (ECA)

• As diversas fontes históricas (textual, iconográficas, sonoras entre

outras) utilizadas pelos historiadores na construção dos fatos históricos.

O tempo da/na História e as experiências da infância no Continente Africano

• Lei 11.645: História e cultura afrobrasileira e dos povos indígenas no

Brasil;

• O tempo cronológico e sua contagem: dia, mês, ano, década, século,

milênio.

• Instrumentos de medida do tempo criados pelos seres humanos ao longo

da História.

• Diferentes tipos de calendários.(Cristão, Chinês entre outros).

• Crianças africanas no passado e no presente.

Experiências da infância na cultura Indígena

• Modo de brincar e se relacionar em grupo.

• Imagens e representações das crianças indígenas.

• Sua relação com o meio ambiente.

• Narrativas mitológicas.

• Rituais de passagem.

Meio ambiente

• Recursos energéticos, consumo e meio ambiente.

o A construção de noções históricas e as contradições entre consumo e

meio ambiente

• Apropriações históricas do meio ambiente pelos seres humanos.

o Pré-história: Imigrações e o povoamento da América

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• Recursos naturais e desenvolvimento das sociedades humanas.

o Estudo de caso: Crescente fértil

• Explorações dos recursos naturais e seus aspectos políticos, econômicos

e sociais no Brasil;

o História e meio ambiente: Somos espectadores ou atores da história?

• Reapropriações históricas do meio ambiente

o Povos indígenas do triângulo mineiro: passado e presente de uma

história.

• Movimentos ambientalistas e o debate político contemporâneo.

Territórios: cidade e campo

• A cidade como espaço educativo e mutável.

• Espaços de vivências e sociabilidades.

o A formação das cidades brasileiras: Diferentes processos.

• Trânsitos econômicos, demográficos e culturais entre o campo e a cidade

no Brasil;

o Riquezas brasileiras: do pau-brasil à cana-de-açúcar

• Manifestações do campo na cidade e da cidade no campo.

o Em busca de novas riquezas: do ouro ao café

• Ocupação histórica do território de Uberlândia e do Triângulo Mineiro.

o De São Pedro de Uberabinha à Uberlândia: o processo de formação e

transformação de nosso município.

• Espaços de conflitos e lutas políticas.

o O Bairro Patrimônio: entre preconceitos e ricas manifestações culturais.

3º CICLO

Tecnologia

• Afinal, o que é Tecnologia?

• Avanços tecnológicos e suas implicações nas organizações sociais e

representações nas primeiras comunidades humanas:

o a influência das técnicas no desenvolvimento físico e intelectual dos

seres humanos.

o o surgimento da capacidade de abstração: por que é importante

imaginar?

• Tecnologia, relações de poder e dominação:

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o desenvolvimento tecnológico e as guerras de conquista no mundo

antigo.

• Da manufatura a maquinofatura: produção e distribuição de mercadorias

e relações sociais na história do capitalismo;

• A Revolução industrial e seus impactos no modo de vida das sociedades

humanas;

• Usos e abusos da tecnologia: meio ambiente, saúde e economia.

• Tecnologias da informação na história:

o o mundo virtual, suas consequências e possibilidades.

Trabalho e Consumo

• Relações de trabalho nos primeiros agrupamentos humanos;

• Sedentarização e surgimento da propriedade privada;

• Relações sociais no mundo do trabalho:

o trabalho escravo no mundo contemporâneo.

o trabalho assalariado: uma luta dos trabalhadores.

• Escravidão e trabalho livre no Brasil:

o escravidão indígena: tentativas de mão-de-obra escrava nativa.

o o tráfico negreiro e a escravidão de africanos.

o Casa-Grande e Senzala: relações de interdependência entre dois

“mundos”.

o homens e mulheres livres pobres na sociedade colonial brasileira.

• Consumismo, individualismo e subjetividade.

Deslocamentos e migrações

• Ocupação e povoamento do planeta Terra;

• Teorias de povoamento da América:

o um Brasil “inexplorado”.

• Deslocamentos e migrações dos povos indígenas no Brasil atual: das

aldeias para as cidades;

• A chegada de diferentes povos no Brasil ao longo do tempo:

o os europeus e o “mito de origem”.

o a imigração ontem e hoje e seus impactos sociais.

• Experiências e representações da diáspora africana nas Américas;

• Os refugiados do mundo contemporâneo e suas sensibilidades;

• As migrações e deslocamentos no Brasil republicano:

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o desenvolvimento econômico e êxodo rural na segunda metade do século

20.

o as “sociedades transitórias” no Brasil contemporâneo.

4º CICLO

Política

• O que é política?

• A institucionalização da política

o A formação do Estado brasileiro;

• Fundamentos da experiência democrática

o A democracia ateniense;

o O Iluminismo e a república jacobina;

o A República brasileira;

• Democracia liberal, comunismo e fascismo no século XX;

• O Anarquismo: fundamentos e principais movimentos.

Relações de gênero

• Patriarcalismo no Brasil colonial e atual

• Divisão sexual do trabalho na História

• Protagonismo feminino e sujeitos históricos

• Emancipação política das minorias sexuais

• Democracia e relações de gênero

• Representações artísticas de gênero e sexualidade

Mídias e informação

• Revolução tecnológica do século XX

• Publicidade, propaganda e estratégias políticas

o Propaganda nos regimes nazista, comunista e democracia liberal

estadunidense no século XX;

o O DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) no Estado Novo e

o populismo de Vargas no Brasil;

• Rádio e cinema no Brasil republicano

• Surgimento da televisão: sociabilidades e padrões de consumo

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• Internet: “democratização” do conhecimento, relação público/privado e

percepções de espaço/tempo

• O ciberespaço como lugar de expressão política.

Juventude

• O que é ser jovem hoje?

• Juventude e política

o O movimento estudantil brasileiro;

o Maio de 68: juventude, educação e política;

o A juventude na ditadura militar brasileira;

o Juventude e expressão política no Brasil atual;

• Juventude e comportamento

o A juventude romântica do século XIX;

o A juventude e as gangs;

o O rock’n roll;

o A Contracultura e seus desdobramentos;

o Anarquismo jovem, cultura punk e pós-punk;

o O movimento Skinhead;

o O movimento Hip-Hop;

o Expressões da juventude brasileira contemporânea;

PROEJA

Identidade e Cultura

• Introdução aos estudos históricos:

o Qual a importância do estudo da História?

o A noção de sujeito histórico: quem faz a História?

o Diferentes interpretações históricas.

• Histórias de vida e noções de tempo:

o Narrativas pessoais e o conceito de sujeito histórico: quem são e como

vivem os alunos do 6º ANO EJA.

o Histórias de vida na dinâmica estrutural da sociedade capitalista brasileira.

• Uberlândia revisitada: Ontem e hoje.

o Transformações e permanências no mundo urbano local.

• A ocupação do Triangulo Mineiro:

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o Bandeirantismo.

o Ciclo da mineração.

• O processo “civilizatório”:

o O Processo de ocupação da terra no Brasil.

o Colonização da América: Colonizados e colonizadores.

Natureza e Qualidade de vida

• Corpo que trabalha: escravidão, servidão e trabalho assalariado.

o O trabalho nas sociedades primitivas.

o Tráfico de escravos mercantilismo

o Escravidão indígena e africana na agricultura, mineração e espaços

urbanos.

• O ideário iluminista.

o A ideia de cidadania no pensamento iluminista.

o O Ideário republicano e a questão da cidadania no Brasil.

o De súdito a cidadão: o estado e as políticas públicas para os indivíduos.

Sociedade e Tecnologia

• Da manufatura a era digital.

• Trabalho em diferentes tempos e espaços.

• A revolução Industrial Inglesa.

• Urbanização e industrialização no Brasil no século XIX.

• Noção de capital e capitalismo.

• Conceito de burguesia e proletariado.

• Mais valia.

Trabalho e Tecnologia

• Taylorismo e Fordismo

• Especialização das funções e crescimento da produção

• O estado e as políticas públicas para os indivíduos

• Ideias de contestação ao capitalismo: socialismo e anarquismo

• O desenvolvimento no mundo moderno e suas relações com as mudanças no

mundo do trabalho.

• Os direitos humanos e a relação do indivíduo com a contemporaneidade.

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• Direitos sociais na constituição brasileira.

Bibliografia básica

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para a educação das relações étnico-raciais e para o ensino de história e cultura afro-

brasileira e africana”: uma conversa com historiadores. Estudos Históricos, Rio de

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FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São

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