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INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE Uma proposta para o bairro da Cova da Moura Luís Pedro Cardoso de Freitas Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em ARQUITECTURA Juri: Orientador: Prof. Jorge Gonçalves Co-Orientador: Prof. Teresa Heitor Maio 2011

ARQUITECTURA - fenix.tecnico.ulisboa.pt · INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA 3 ABSTRACT This Project Report aims

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INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

DA CIDADE

Uma proposta para o bairro da Cova da Moura

Luís Pedro Cardoso de Freitas

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

ARQUITECTURA

Juri:

Orientador: Prof. Jorge Gonçalves

Co-Orientador: Prof. Teresa Heitor

Maio 2011

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2

RESUMO

O presente Relatório de Projecto tem como objectivo geral a análise pós-concepção de

estratégias urbanas no Bairro da Cova da Moura, elaboradas no âmbito do Concurso Universidades

da Trienal de Arquitectura 2010 e da disciplina de Projecto Final do 5º ano, no ano lectivo de

2009/2010, sob o enfoque a influência do desenho urbano na insegurança.

Este relatório estrutura-se em três capítulos: 1) Delinquência e Insegurança; 2) Influência do

Desenho Urbano na Insegurança; e 3) Projecto.

O primeiro capítulo aborda as definições, causas e consequências, da delinquência e/ou

comportamentos transgressivos e a constituição do sentimento de insegurança em áreas urbanas.

Destaca-se a relevância da influência do espaço, como situação de confronto entre vítima e

agressor, na ocorrência de comportamentos ilícitos e/ou transgressivos.

Posteriormente, analisaram-se estratégias e concepções projectuais, dentro das cidades, na

possível prevenção de actos delinquentes e anti-sociais e, consecutivamente, na mudança do

sentimento de insegurança para uma melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, ressalvando-se a

importância dos trabalhos de Jane Jacobs (1961), Oscar Newman (1972), Ray Jeffery (1971) e Bill

Hillier (1984). Observa-se a concordância nestes autores na relevância da organização e da

disposição das características do espaço na influência da vigilância natural. Apesar de divergirem

quanto à composição dos vigilantes e nas propostas de conceptualização da organização espacial.

No último capítulo, após uma contextualização abrangente do objecto de estudo, apresenta-

se a proposta realizada. Esta procura colmatar as principais carências identificadas nos bairros da

Cova da Moura e adjacentes, tendo ainda em consideração os problemas de insegurança existentes.

Perante uma área urbana caracterizada pela exclusão social e urbana, a concepção teórica

partilhada por Jacobs e Hillier, de abertura e permeabilidade, apresenta-se como pertinente para

reduzir a vulnerabilidade do espaço urbano. Salienta-se a intervenção ao nível do espaço público,

como elemento de referência da proposta, devido às carências do bairro nesta questão. A

intervenção desenvolvida a partir dessa óptica, é configurada por uma forma racional que contrasta

com a densa e espontânea malha da Cova da Moura. O espaço público proposto sugere a sua

descoberta ao longo das ruas que conduzem ao local onde se acumulam as sinergias das ruas e da

vivência do bairro: A Praça.

Ressalva-se a pertinência deste trabalho na reflexão da importância do papel dos

arquitectos, urbanistas e técnicos em geral, na concepção do espaço urbano e consequentemente na

influência sobre a vulnerabilidade deste.

PALAVRAS CHAVE: Bairro da Cova da Moura | Desenho Urbano | Insegurança | Praça

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3

ABSTRACT

This Project Report aims generally to the analysis of post-conception of urban strategies in

the neighborhood of Cova da Moura, developed under the Universities Competition of Architecture

Triennale 2010 and the discipline of Final Project of the 5th year, in the academic year of 2009/2010,

under the approach of the influence of urban design in insecurity.

This report is structured into three chapters: 1) delinquency and insecurity, 2) Influence of

Urban Design in Insecurity, and 3) Project.

The first chapter discusses definitions, causes and consequences of delinquency and / or

transgressive behavior and the constitution of the feeling of insecurity in urban areas. The study

highlights the importance of the influence of space, as a situation of confrontation between victim and

aggressor, in the occurrence of unlawful and/or transgressive conduct.

Subsequently, was analyzed the strategies and projective concepts, within cities, in the

possible prevention of offenses and anti-social behavior and consecutively the change in the feeling

of insecurity for a better quality of life of citizens, stressing the importance of the works of Jane

Jacobs (1961), Oscar Newman (1972), Ray Jeffery (1971) and Bill Hillier (1984). It is observed that

these authors agree on the relevance of the organization and layout of the characteristics of space on

the influence of natural surveillance. Although differ as regards the composition of the vigilantes and

the proposed design of spatial organization.

In the last chapter, after a comprehensive background of the object of study, presents the

proposal carried out. This seeks to overcome the main deficiencies identified in the neighborhood of

Cova da Moura and the surrounding, also taking into consideration the existing problems of insecurity.

Faced with an urban area characterized by social and urban exclusion, the design theory shared by

Jacobs and Hillier, of openness and permeability, is presented as relevant to reduce the vulnerability

of urban space. Was emphasized the intervention in terms of public space as a reference element of

the proposal, due to shortcomings in the neighborhood on this issue. The intervention developed from

this perspective, is shaped by a rational manner that contrasts with the dense mesh and spontaneous

of Cova da Moura. The proposed public space suggests the discovery along the streets leading to the

place where they accumulate synergies from the streets and the living in the neighborhood: The

Square.

The relevance of this work is appointed in the reflection of the importance in the role of architects,

planners and technicians in general, in the design of urban space and consequently in influencing the

vulnerability of this last one.

KEY WORDS: Bairro da Cova da Moura | Urban Design | Insecurity | Square

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

4

AGRADECIMENTOS

Ao professor Jorge Gonçalves pela sua disponibilidade, pertinência, confiança e apoio no

desenvolvimento deste trabalho, assim como pela sua boa disposição perante as minhas “inúmeras”

dúvidas.

À professora Teresa Heitor pela sua paciência e disponibilidade, assim como pelo seu

contributo neste trabalho.

Aos meus colegas que me acompanharam no processo da Semana Relâmpago 2010 até ao

Concurso da Trienal, assim como aqueles que através dos seus contributos e amizade me ajudaram

no meu percurso académico. Destes nomeio, com igual importância, o Francisco Amado, Luís Araújo

e o João Lourenço, sempre presentes e disponíveis para aqueles longos telefonemas de dúvidas.

À minha família pela sua compreensão e motivação, e em especial ao meu irmão por me

permitir uma compreensão mais abrangente da “relatividade” da vida.

Por fim, e não por último, à Inês pela sua paciência, colaboração e apoio incondicional.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

5

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

6

ÍNDICE

RESUMO _______________________________________________________________________ 2

ABSTRACT ______________________________________________________________________ 3

AGRADECIMENTOS _____________________________________________________________ 4

ÍNDICE _________________________________________________________________________ 6

LISTA DE FIGURAS _______________________________________________________________ 7

LISTA DE TABELAS _______________________________________________________________ 8

LISTA DE ABREVIATURAS _________________________________________________________ 9

0.INTRODUÇÃO _______________________________________________________________ 10

0.1 Objectivos e objecto de estudo __________________________________________________ 12

0.2 Motivações _____________________________________________________________________ 13

0.3 Desenvolvimento metodológico e Organização do trabalho _______________________ 14

1.DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA ______________________________________________ 16

1.1 Delinquência e Comportamento Anti-Social ______________________________________ 18

1.2 Delinquente | Evolução Teórica da Criminologia __________________________________ 23

1.3 Espaço | Delinquência em Espaço Urbano _______________________________________ 29

1.4 Vítima | Medo e Insegurança ____________________________________________________ 32

1.5 Prevenção ______________________________________________________________________ 40

2.INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA _________________________ 44

2. Influência do Desenho Urbano na Insegurança _____________________________________ 46

3.PROJECTO __________________________________________________________________ 64

3.1 Análise __________________________________________________________________________ 66

3.2 Proposta ________________________________________________________________________ 83

4.CONCLUSÃO ________________________________________________________________ 98

4. Conclusão ______________________________________________________________________ 100

5.BIBLIOGRAFIA _______________________________________________________________ 102

6.ANEXOS ____________________________________________________________________ 108

6.1 Anexo I – Dados sobre a Caracterização da Cova da Moura _____________________ 110

6.2 Anexo II – Dados sobre a Caracterização da Cova da Moura _____________________ 111

6.3 Anexo III – Levantamento Fotográfico ____________________________________________ 114

6.4 Anexo IV – Evolução Projectual __________________________________________________ 116

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

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LISTA DE FIGURAS

1.DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

Fig. 1.1 Ilustrações de Lombroso – http://www.crimeculture.com .................................................... 24

Fig. 1.2 Chicago segundo o modelo de anéis concêntricos de Park e Burgess (1925) –

http://www.huzzam.com ..................................................................................................................... 25

Fig. 1.3 Uma fachada vandalizada de Pruitt-Igoe – Newman, O. (1996) .............................................. 35

Fig. 1.4 Sinais indicativos da presença do programa Neighborhood Watch –

http://www.virginiamn.us; http://www.dalycity.org ........................................................................... 38

2.INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

Fig. 2.1 Um corredor comum em Pruitt-Igoe antes da demolição – Newman, O. (1996) .................... 50

Fig. 2.2 O processo de demolição de Pruitt-Igoe – Newman, O. (1996) ............................................... 51

Fig. 2.3 Carr Square Village – Newman, O. (1996) ................................................................................ 51

Fig. 2.4 Esquema hierárquico espacial de Newman (1973) – Colquhoun, I. (2004) ............................. 52

Fig. 2.5 Esquemas habitacionais de Alice Coleman (1985) – Colquhoun, I. (2004) .............................. 54

Fig. 2.6 Planta de Sebiliusparken – Colquhoun, I. (2004) ..................................................................... 58

Fig. 2.7 Detalhes dos muretes e entradas – Colquhoun, I. (2004) ........................................................ 59

Fig. 2.8 Entrada tipo das habitações – Colquhoun, I. (2004) ................................................................ 59

Fig. 2.9 Planta de Barnsbury na área norte de Londres – Hillier, B. (1984) .......................................... 60

Fig. 2.10 Mapa Axial de Barnsbury – Hillier, B. (1984) .......................................................................... 60

3.PROJECTO

Fig. 3.1 Localização do Bairro da Cova da Moura na região de Lisboa – Google maps ........................ 66

Fig. 3.2 Localização do Bairro da Cova da Moura e dos bairros envolventes – Google maps .............. 67

Fig. 3.3 Desenvolvimento urbano do Bairro da Cova da Moura – http://www.vascodacunha-

projectos.pt ........................................................................................................................................... 69

Fig. 3.4 Planta do bairro da Cova da Moura - Autor ............................................................................. 72

Fig. 3.5 Mapa de ruas – Google maps ................................................................................................... 73

Fig. 3.6 Barreiras físicas e equipamentos – Google maps; Autor ......................................................... 74

Fig. 3.7 Exemplos de edifícios de dois e três pisos – http://www.trienaldelisboa.pt........................... 75

Fig. 3.8 Número de pisos por edifício – LNEC (2008) ............................................................................ 76

Fig. 3.9 Distribuição dos edifícios por uso – LNEC (2008) ..................................................................... 76

Fig. 3.10 Percentagem de lotes por “Nível de Reabilitação” – LNEC (2008) ......................................... 77

Fig. 3.11 Rua do Moinho - Autor ........................................................................................................... 79

Fig. 3.12 Rua do Vale - Autor ................................................................................................................ 79

Fig. 3.13 Ruas com maior ocorrência de criminalidade – Iniativa Bairros Críticos (2006) .................... 80

Fig. 3.14 Esquema da Intenção Projectual – Google maps; Autor ........................................................ 85

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

8

Fig. 3.15 Continuidades Urbanas - Autor .............................................................................................. 86

Fig. 3.16 Planta da Cova da Moura com a intervenção proposta - Autor ............................................. 88

Fig. 3.17 Maquetes ilustrativas da evolução formal da proposta - Autor ............................................ 89

Fig. 3.18 Perspectiva da Praça - Autor .................................................................................................. 90

Fig. 3.19 Perspectiva da Praça da Rua da Palmeira - Autor .................................................................. 92

Fig. 3.20 Perspectiva da Praça da Rua do Vale - Autor ......................................................................... 85

Fig. 3.21 Perspectivas da Praça - Autor ................................................................................................. 86

Fig. 3.22 Perspectiva da Praça - Autor .................................................................................................. 86

Fig. 3.23 Perspectiva da Praça - Autor .................................................................................................. 87

Fig. 3.24 Corte da Praça - Autor ............................................................................................................ 87

Fig. 3.25 Esquema dos acessos e permeabilidades da Praça - Autor ................................................... 95

Fig. 3.26 Plantas extrudidas da Praça - Autor ....................................................................................... 95

LISTA DE TABELAS

Tabela 1.1 Taxa de Criminalidade (‰) em alguns concelhos e regiões de Portugal –

http://www.ine.pt ................................................................................................................................ 20

Tabela 3.1 Estrutura Etária do Concelho da Amadora, Buraca, Damaia e Cova da Moura - Iniciativa

Bairros Críticos (2006) ........................................................................................................................... 70

Tabela 3.2 Naturalidade da população da Cova da Moura - Iniciativa Bairros Críticos (2006) ............ 70

Tabela 3.3 Nível de Instrução da população da Cova da Moura - Iniciativa Bairros Críticos (2006) .... 70

Tabela 3.4 Análise Comparativa da retenção nas escolas EB1/J1 no concelho da Amadora - Iniciativa

Bairros Críticos (2006) ........................................................................................................................... 71

Tabela 3.5 Tipologias de Criminalidade na Cova da Moura - Iniciativa Bairros Críticos (2006) ............ 79

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

9

LISTA DE ABREVIATURAS

ASB – Anti–Social Behavior

Av. - Avenida

CPTED – Crime Prevention Trough Environmental Design

CRIL – Circular regional interna de Lisboa

GNR – Guarda Nacional Republicana

IC 19 – Itinerário Complementar 19

IHRU – Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana

INE – Instituto Nacional de Estatística

ONU – Organização das Nações Unidas

PALOP – Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa

PSP – Policia de Segurança Pública

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

10

0.INTRODUÇÃO

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

11

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

0. INTRODUÇÃO 12

0.1 Objectivos e objecto de estudo

O presente Relatório de Projecto tem como objectivo geral a análise pós-concepção de

estratégias urbanas no Bairro da Cova da Moura, elaboradas no âmbito do Concurso Universidades

da Trienal de Arquitectura 2010 e da disciplina de Projecto Final do 5º ano do Mestrado Integrado em

Arquitectura, no ano lectivo de 2009/2010. Esta análise tem como enfoque a influência do desenho

urbano na insegurança, a qual entende-se estar relacionada com a possibilidade e/ou ocorrência da

delinquência e/ou de comportamentos anti-sociais.

O bairro de génese ilegal da Cova da Moura, localizado no concelho da Amadora, confronta-

se com diversos problemas de saneamento, estabilidade construtiva e de exclusão social, económica

e urbana, as quais fomentam a imagem negativa e a insegurança existente no bairro. Tanto a Cova

da Moura como os outros bairros intersticiais da Damaia e Buraca têm em comum uma condição de

isolamento face ao tecido urbano envolvente. Este é devido à presença de barreiras físicas impostas

pelas infra-estruturas de mobilidade de escala metropolitana (linha de comboio, CRIL e IC 19) bem

como a descontinuidades, ao nível da malha urbana quer em termos de traçado quer da tipologia do

edificado, reforçadas pela topografia acidentada dos lugares. O projecto elaborado, objecto de

estudo deste trabalho, comporta a definição e clarificação das ligações entre os bairros da Cova da

Moura, Damaia e Buraca, de modo a que possam beneficiar de uma relação simbiótica, aproveitando

as sinergias e características urbanas, culturais, sociais e étnicas de cada um. Foram identificados

dois eixos estruturais ao longo dos quais são propostas intervenções pontuais de espaços de oferta à

existência de actividades (de carácter edificável ou não), onde se destaca a proposta de um espaço

público. A estratégia de intervenção desenvolvida visou colmatar a lacuna urbana consequente da

ausência de um espaço público de qualidade. Assim, a intervenção maior foi desenvolvida a partir

dessa óptica, com a proposta de um espaço configurado por uma forma racional que contrasta com a

densa e espontânea malha da Cova da Moura. O espaço público proposto sugere a sua descoberta

ao longo das ruas que conduzem ao local onde se acumulam as sinergias das ruas e da vivência do

bairro: A Praça.

Como objectivo específico, destaca-se a identificação e relevância da reflexão teórica dos

principais conceitos, sob a óptica da influência do desenho urbano na insegurança, na elaboração da

proposta para o bairro da Cova da Moura. De modo a compreender a extensão e influência da

insegurança e criminalidade na percepção de qualidade de vida urbana, são explorados os conceitos

supracitados numa perspectiva de análise e identificação dos factores, causas e consequências,

assim como o espaço onde ocorre o acto delinquente/transgressivo.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

13 0. INTRODUÇÃO

0.2 Motivações

A região de Lisboa registou um elevado crescimento demográfico na segunda metade do

séc. XX, derivado de movimentos migratórios provenientes de áreas rurais (a partir da década de

50), do regresso dos retornados das antigas províncias ultramarinas africanas (1975-76) e de

imigrantes provenientes dos países PALOP (a partir de meados da década de 80). Este aumento

populacional traduziu-se numa demanda na procura de habitação e na respectiva incapacidade de

absorver essa mesma procura. Como consequência, verificou-se a generalização de tecidos urbanos

indiferenciados e bairros de génese ilegal na periferia de Lisboa, entre os quais o da Cova da Moura.

Na paisagem urbana da região de Lisboa, verifica-se a existência de inúmeros problemas

advindos de um ordenamento territorial inadequado que concorrem para a promoção da exclusão

social e urbana. Alguns destes problemas são consequentes do modelo de desenvolvimento de infra-

estruturas urbanas, da sua qualidade construtiva e da ausência de um planeamento estruturado em

termos de eficácia de mobilidade. O bairro da Cova da Moura é exemplo desta realidade. Como tal, o

Concurso Universidades da Trienal de Arquitectura 2010 procurou promover, uma leitura propositiva

sobre este território, através de uma intervenção arquitectónica que visasse atenuar alguns dos

problemas decorrentes da existência de uma rede urbana complexa na área intersticial de Lisboa.

As questões decorrentes da exclusão social, económica e urbana reflectem-se igualmente na

problemática da insegurança urbana, a qual prejudica gravemente a qualidade de vida dos seus

habitantes. O espaço urbano onde ocorre os delitos surge como um factor influente no sucesso ou

insucesso do acto criminoso assim como na insegurança dos seus residentes.

Assim, a pertinência deste trabalho passa pela procura da sensibilização de arquitectos e

urbanistas na leitura efectuada pelos utilizadores do espaço criado, em relação à percepção do efeito

da insegurança urbana.

Neste relatório de projecto destaca-se igualmente o interesse pessoal no confronto das

intenções projectuais do autor com as reflexões desenvolvidas sob a óptica da insegurança.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

0. INTRODUÇÃO 14

0.3 Desenvolvimento metodológico e Organização do trabalho

Este relatório estrutura-se em três capítulos: 1) Delinquência e Insegurança; 2) Influência do

Desenho Urbano na Insegurança; e 3) Projecto.

1. Delinquência e Insegurança

O primeiro capítulo aborda as definições, causas e consequências, da delinquência e/ou

comportamentos transgressivos e a constituição do sentimento de insegurança em áreas urbanas.

Destaca-se a importância de três variáveis para a sua formulação: o delinquente, a vítima e o espaço

de confronto. O presente trabalho focaliza-se neste último factor, dada a importância de arquitectos e

urbanistas na concepção do espaço urbano. Este capítulo, após abordar as diferentes temáticas

relacionadas com a delinquência e insegurança, incide sobre a pertinência das estratégias e

concepções projectuais, dentro das cidades, na possível prevenção de actos delinquentes e anti-

sociais e, consecutivamente, na mudança do sentimento de insegurança para uma melhoria da

qualidade de vida dos cidadãos.

2. Influência do Desenho Urbano na Insegurança Urbana

Após a compreensão da importância do desenho urbano como estratégia de prevenção de

delitos e/ou comportamentos transgressivos, este capitulo analisa as diferentes concepções e

modelos teóricos formulados e utilizados. Destaca-se a importância dos trabalhos de Jane Jacobs

(1961), Oscar Newman (1972), Ray Jeffery (1971) e Bill Hillier (1984), pela sua relevância no estudo

do espaço urbano como cenário de delinquência e insegurança e na respectiva elaboração de

estratégias preventivas. Observa-se a concordância em que organização e a disposição das

características do espaço influenciam a vigilância natural, a qual necessita de agentes activos, mas

divergem em relação às propostas de conceptualização da organização espacial e à composição dos

vigilantes activos.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

15 0. INTRODUÇÃO

3. Projecto

Este capítulo faz uma contextualização abrangente do objecto de estudo, efectuando a

caracterização geográfica, sócio-demográfica, urbana, assim como o seu desenvolvimento, e a

análise dos factores relacionados com a mobilidade e a insegurança do bairro da Cova da Moura. O

conteúdo desta contextualização é o resultado da pesquisa realizada antes da concretização de uma

proposta para o bairro. As problemáticas relacionadas com a integração das malhas urbanas, do

bairro da Cova da Moura com as áreas intersticiais, reabilitação e (re)qualificação das condições de

vida dos moradores, através do espaço publico, ruas, habitações e construções existentes e

equipamentos de qualidade são evidenciadas como influência para a fomentação da imagem

negativa e da insegurança existente no bairro. Estas premissas foram importantes para a elaboração

da proposta.

Posteriormente a esta análise apresenta-se a proposta realizada, desenvolvida no âmbito da

unidade curricular de Projecto do 5º ano e do Concurso Universidades da Trienal de Arquitectura

2010. A proposta destaca-se pelos princípios inerentes, de modo a reduzir a imagem negativa e a

insegurança existente no bairro. A estratégia projectual estrutura-se com diferentes intervenções,

desenvolvida ao longo dos bairros da Cova da Moura, Damaia e Buraca. Salienta-se a intervenção

ao nível do espaço público, como elemento de referência da proposta, devido às carências do bairro

nesta questão. O desenho deste espaço urbano teve em conta a coexistência simbiótica entre o

edificado existente e a intervenção proposta, e a sugestão de um espaço ser descoberto ao longo

das ruas adjacentes, através das suas entradas por entre o edificado e pelos seus pátios, e a

concentração das sinergias e dinâmicas urbanas e sociais da Cova da Moura e dos bairros

envolventes: a Praça. Neste espaço destaca-se a integração de diversas actividades de natureza

educativa e sócio-cultural, como a escola primária, biblioteca, centro comunitário, espaço destinado a

actividades físicas e outras, de forma a gerar actividades e estimular as relações sociais entre a

comunidade e com os restantes bairros, as quais reduzem o sentimento de insegurança.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

16

1.DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

17

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 18

1.1 Delinquência e Comportamento Anti-Social

O crime é definido, como “todo o delito previsto e punido por lei penal” (Porto Editora, 2009),

onde se conclui tratar de um comportamento sancionável, realizado por um ou mais indivíduos. Para

que este seja considerado efectivamente sancionável tem que ocorrer a elaboração de um sistema

penal, o qual atribui a aplicação ou não, juntamente com o responsável pelo processo judicial, de

uma pena ao indivíduo acusado da prática criminosa.

A constituição de um sistema penal pressupõe a validação do poder do estado na sociedade,

na qual a “(…) criminalidade põe em xeque o projecto da legitimação e autoridade do Estado porque,

justamente, mina o reino da legalidade e constitui-se como «mau exemplo» à segurança e liberdade

do cidadão” (Subtil, 1991: 87). O primeiro sistema penal português reúne-se nas Ordenações

Afonsinas, datadas do séc. XV no reinado de D. Afonso V, apesar de concentrar outras áreas

relacionadas com o direito. Posteriormente com a mudança do regime absolutista para o estado

liberal, e a respectiva separação de poderes em funções executivas, judiciais e legislativas, à luz dos

ideais iluministas de 1820, a filosofia penal adquiriu características próximas do regime penal

contemporâneo. José Subtil afirma que “(…) em simultaneidade com a abolição das penas corporais

e infamantes são enunciados dois grandes princípios: a igualdade de todos perante a lei e o Habeas

Corpus. O estatuto das Ordenações que diferenciava os estratos sociais em relação à lei é, agora,

contrariado pelos liberais vintistas que, doravante, prescrevem exigências legais para a formação de

culpa e obrigam à informação ao cidadão de que é acusado” (1991: 84).

O código penal vigente em Portugal data de 1982, apesar das sucessivas actualizações (a

última ocorreu em 2007), “(…) traça um sistema punitivo que arranca do pensamento fundamental de

que as penas devem ser sempre executadas com um sentido pedagógico e ressocializador

(…)”(Bessa Pacheco et al., 2002: 332). Dispõe o art. 40.º, n.º1, do Código Penal: “A aplicação de

penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na

sociedade (…)”. Concebe uma descrição para o comportamento criminoso, segundo o art. 1.º, nº1 do

Código Penal, como “(…) o facto descrito e declarado passível de pena criminal por lei anterior ao

momento da sua prática (…)”, o qual depreende uma acção que é punível.

A conceptualização do crime tem sofrido alterações ao longo do tempo consoante a

sociedade, reflectindo-se no código penal. “A relatividade do conceito de crime aplica-se tanto no

tempo como no espaço, na medida em que os actos hoje não considerados delituosos, já o foram há

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

19 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

algumas décadas atrás e vice-versa, e acções classificadas em alguns países como criminais, não o

são noutros (…)” (Esteves, 1999: 15).

Podemos observar na legislação portuguesa a influência do factor temporal em relação ao

crime contra a vida intra-uterina, onde, excluindo os factores de exclusão de ilicitude, a interrupção

voluntária da gravidez constituía um delito até à alteração legislativa de 2007. Em relação à influência

do espaço onde ocorre o crime, distingue-se, nomeadamente, a legislação holandesa favorável ao

consumo e comercialização de alguns estupefacientes enquanto esta é explicitamente proibida em

Portugal. Ressalva-se também a variabilidade das penas aplicadas, apesar de a gravidade ser

idêntica dentro dos códigos penais e do factor temporal não ser relevante, como é o caso da

aplicabilidade nos Estados Unidos da América, em alguns estados, da pena de morte como pena

máxima, enquanto em Portugal essa penalização não existe: “Estabelece o art. 24º, nº2, da

Constituição da República Portuguesa que em caso algum haverá pena de morte (…) A pena de

morte é injustificada à luz dos fins das penas do Direito Penal de um princípio de humanidade em

matéria político-criminal (…)” (Bessa Pacheco et al, 2002: 331 e 332).

Outro aspecto a ter em atenção relaciona-se com a inimputabilidade, de quem pratica actos

criminosos, devido à idade. No sistema penal português menores de 14 anos estão excluídos de

qualquer pena, com excepção a medidas correctivas, e os jovens entre 16 e 21 anos estão sujeitos a

um Regime Penal Especial, conforme previsto no artigo 9º do Código Penal Português, e detalhado

pelo decreto-lei nº 401/82, de 23 de Setembro de 1982.

Segundo Figueiredo Dias e Costa Andrade (1984), na teoria das estruturas de oportunidade,

o acto criminoso implica a existência de três variáveis: alvo/vítima, agressor/delinquente e situação:

“Trata-se de um complexo desiderato em que a oportunidade ocorre do confronto entre o (potencial)

transgressor/delinquente e o (potencial) alvo/vitima quando este último se encontra numa situação

vulnerável, em regra associada a ausência de vigilância” (Heitor 2009). O confronto destes factores

determina o sucesso ou insucesso do comportamento criminoso.

Afirma Indovina (2001: 19), em relação aos delitos urbanos, que “(…) pode-se afirmar a

existência de uma específica violência de lugar, nas cidades, decorrente da convivência e da

aglomeração; no campo, pelo contrário, ligada ao isolamento.” A área urbana estabelece condições

privilegiadas para a ocorrência da criminalidade devido às suas características derivadas da

concentração de oportunidades. Esta concentração será directamente proporcional à importância

social, económica e cultural assim como à densidade populacional. Assim, devido à importância do

espaço urbano na formação do sentimento de insegurança, este será objecto de análise ao longo

deste trabalho.

O autor supracitado, salienta igualmente para o crescente individualismo nas áreas urbanas,

onde é formado o “(…) encerramento no próprio perímetro individual (…)” como consequência de

uma rejeição de “(…) instrumentos colectivos, fundados na solidariedade e na iniciativa, para

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 20

modificar a situação de facto (…)” (idem, ibidem: 21). A indiferença por parte da população poderá

eventualmente contribuir para o aumento da criminalidade, como salienta Ian Colquhoun “(…) crime

could increase if social values become eroded (…)”1 (2004: 12).

Observando os dados estatísticos da Criminalidade, do Instituto Nacional de Estatística (INE)

em 2006, conclui-se que as grandes áreas populacionais com elevada densidade populacional detêm

os maiores valores relacionados com o número de crimes registados por cada mil habitantes. Lisboa

e Porto, e suas respectivas áreas metropolitanas, apresentam elevados valores de densidade

populacional e igualmente altas taxas de criminalidade comparativamente com as médias nacionais.

Tabela 1.1 Taxa de Criminalidade (‰) em alguns concelhos e regiões de Portugal

Em furtos/roubos por esticão e na via pública, Lisboa e Porto assinalam, respectivamente,

10,7 e 5,6 por cada mil habitantes, enquanto a média nacional encontra-se nos 1,7. Os concelhos da

1 “(…) crime pode aumentar se os valores sociais deteriorarem (…)” Tradução livre

Localização geográfica

Taxa de criminalidade (‰) por Localização geográfica e Categoria de crime; Anual

Período de referência dos dados

2006

Categoria de crime

Total Crimes contra a integridade

física

Furto/roubo por esticão e na via pública

Furto de veículo e em

veículo motorizado

Crimes contra o

património

‰ ‰ ‰ ‰ ‰

PORTUGAL 36,8 5,6 1,7 6,4 20,3

GRANDE PORTO 38,8 6,9 2,2 7,1 21,6

Espinho 40,2 8,5 1,2 4,4 18,5

Gondomar 28,6 5,6 1,6 7,0 17,3

Matosinhos 43,9 7,3 2,7 7,5 25,1

PORTO 66,2 11,6 5,6 10,6 34,8

Vila Nova de Gaia 30,9 5,8 1,2 5,4 17,1

GRANDE LISBOA 48,5 6,3 4,8 9,0 30,3

Amadora 45,4 6,0 5,8 11,1 29,2

Cascais 52,3 7,7 2,6 12,0 29,6

LISBOA 84,5 9,1 10,7 12,8 56,6

Loures 33,3 5,4 3,3 7,0 20,5

Odivelas 31,8 5,6 3,2 5,8 17,2

Oeiras 34,4 4,8 2,4 5,8 19,5

PENÍNSULA DE SETÚBAL 43,7 6,6 1,9 10,7 26,0

Almada 45,7 5,3 1,9 13,1 30,4

Barreiro 38,7 6,7 2,6 9,1 22,6

Moita 39,2 7,6 1,9 7,6 20,7

Seixal 33,7 5,1 2,1 9,1 20,4

Sesimbra 44,6 5,1 0,7 12,0 26,3

Setúbal 58,6 11,3 2,6 13,1 31,6

ALGARVE 65,0 6,7 1,9 11,8 41,3

Albufeira 160,6 8,0 4,3 20,1 90,3

Faro 54,1 7,4 2,4 11,7 33,3

Loulé 77,6 6,7 2,3 18,7 57,6

Portimão 64,7 8,0 3,4 13,1 43,0 Taxa de criminalidade (‰) por Localização geográfica e Categoria de crime; Anual - Direcção-Geral da Política de Justiça

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

21 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

Amadora, Loures e Odivelas pertencentes à zona periférica de Lisboa registam valores igualmente

elevados (5,8 para Amadora e para Loures e Odivelas 3,3 e 3,2, respectivamente). Em relação a

crimes contra a integridade física a taxa média portuguesa centra-se nos 5,6 e enquanto em Lisboa

(9,1), Setúbal (11,3) e Porto (11,6) encontra-se valores superiores. Em crimes contra o património

observa-se igualmente elevados valores nas principais cidades com destaque para Lisboa e sua

periferia, Porto e Setúbal. Nos furtos de veículo e em veículo motorizado a região metropolitana de

Lisboa, Porto, Braga e Setúbal assinalam valores acima das 10 ocorrências por cada mil habitantes

em comparação com 6,4 no restante país.

No caso do Algarve denota-se o efeito da sazonalidade turística nos concelhos de Albufeira,

Portimão, Loulé ou Lagos nas taxas de criminalidade contra património, furtos/roubos por esticão e

de veículos. A “(…) relação entre turismo e crime é um dado observável (…)”(Brás e Rodrigues,

2010:65) visto a “(…) tendência do turista para reduzir a sua consciência de segurança enquanto

está de férias, o entrar em comportamentos de risco e/ou frequentar ambientes estranhos, aumenta a

sua vulnerabilidade e exposição a actividades criminosas” (idem, ibidem:60).

Depreende-se um impacto negativo na qualidade de vida nos habitantes que são informados

da ocorrência de delitos. O estudo Villaverde e Schmidt (2009) nomeia o grau de importância, por

parte dos residentes, de diversos factores que influenciam a qualidade de vida em Lisboa, onde a

Segurança e o Policiamento encimam as principais preocupações por parte dos Lisboetas. Mais de

75% dos inquiridos apontam como “muito importante” a valorização do aspecto da segurança na

cidade. A problemática da insegurança, desenvolvida ao longo deste capítulo, constitui um dos

maiores obstáculos ao uso do espaço urbano, apesar de nem sempre ser justificada com a realidade

da criminalidade.

No entanto, não só actos que possam ser punidos contribuem para uma perda de qualidade

de vida. Os comportamentos anti-sociais ou transgressivos, que não sendo sancionáveis ou

levemente puníveis pelo sistema penal, são perante a sociedade, repreensíveis e influenciam de

forma negativa o modo como os habitantes usufruem o espaço urbano. Segundo Heitor estes

comportamentos “(…) denotam um propósito agressivo e, por vezes, deliberadamente ofensivo como

a destruição de equipamento e de mobiliário urbano de uso público; na quebra de vidros e na

danificação de iluminação pública bem como na marcação de superfícies exteriores ou dos

paramentos de edifícios com inscrições do tipo „graffiti‟ (…)” (2009). Em relação a esta temática, as

autoridades inglesas elaboraram uma legislação direccionada para comportamentos anti-sociais,

ASB (Anti-Social Behaviour), devido a uma forte pressão da agenda política. Tony Blair (cit. in Millie,

2006) proferiu a propósito que “(…) ASB is for many the number one item of concern right on their

doorstep (…)”2. Através do Anti-Social Act (2003) estabelece punições, que podem ir até 5 anos de

2 “(…) ASB é considerado por muitos a preocupação número um perto da entrada de suas casas (…)” Tradução

livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 22

prisão, a diversos comportamentos que “(…) causes harassment, alarm or distress to one of more

persons not of the same household (…)”3(Millie, 2006).

Finda a abordagem dos factores relacionados com o alvo/vitima e situação onde ocorre o

acto criminoso e/ou transgressivo, segue-se o desenvolvimento da análise do agressor/delinquente,

e consequente passagem ao delito. Este último elemento da tríade, será abordado em seguida,

fazendo parte deste, a compreensão, nomeadamente, da motivação e lógica formal que induz à

execução do acto criminoso e/ou transgressivo.

3 “(…) causem, ou possam causar, ameaças, distúrbios, alarme ou aflição a um ou mais indivíduos, não

pertencentes à mesma residência (…)” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

23 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

1.2 Delinquente | Evolução Teórica da Criminologia

O estudo da criminologia foi objecto de estudo, de uma forma mais intensiva, a partir do fim

do séc. XIX e no início do séc. XX, após as crises económicas (1873, 1893 e 1907) e da 1ª Guerra

Mundial. Tendo como objectivo compreender a passagem, pelo criminoso, ao acto delinquente, as

diferentes abordagens teóricas reflectem o contexto social da altura.

Breccaria, no seu livro Dei Delitti e Dele Pene (1764) marca o princípio do Direito Penal

Moderno, assinalando a igualdade de direitos e deveres. A política criminal proposta, baseada em

princípios iluministas, assentava no facto de que havendo consciência que a pena a aplicar excedia

os benefícios obtidos pelo crime, esta seria o suficiente para demover a prática da transgressão. A

pena seria imposta, caso a dissuasão legislativa falhasse (Robert, 2007).

Não estava contemplado, na lógica de Breccaria, a prática de um crime, havendo de

antemão o conhecimento da existência de uma legislação aplicável. Não obstante, se o crime se

efectivasse, o cumprimento da pena, demoveria o transgressor de uma prática futura. Perspectivava-

se, então, que quem reincidisse no crime, seria detentor de uma patologia que estaria na causa do

seu comportamento.

Partindo deste pressuposto, o estudo da criminologia, em vez de se debruçar sobre a análise

do crime em si, direccionou-se na busca de uma explicação, médico-psiquiátrica, para a motivação

criminal, a par da detecção de factores/características predisponentes à delinquência.

Influenciado por este último autor, Lombroso, em L’Uomo Delinquente (1876), juntamente

com Garofalo e Ferri, define os criminosos em cinco categorias: criminoso nato; habitual; ocasional;

passional e louco (Delgado, 1998). Procura encontrar, usando diversas metodologias entre as quais

a frenologia4, indícios que possam definir um indivíduo propenso a praticar determinados crimes; um

“criminoso nato”. Deste modo através de sinais físicos: saliências na cabeça, maxilares

proeminentes, maceteres salientes, nariz achatado, arrebitado ou em forma de bico de águia, orelhas

de abano, lábios carnudos, barba cerrada, alopecia, braços longos e insensibilidade à dor; sinais

psíquicos, entre os quais a ausência de sensibilidade moral e manifestações de vaidade, concluía

que o criminoso seria atávico, detentor de características pré-humanas.

4 Frenologia é o estudo da estrutura do crânio de modo a determinar o carácter da pessoa e a sua capacidade

mental. Desenvolvido por Franz-Joseph Gall, no fim do séc. XVIII, onde, através de uma detecção por inspecção

visual do crânio, localiza as faculdades mentais, denominadas por “órgãos cerebrais”, localizadas na superfície

da cabeça.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 24

Os factores sociológicos e espaciais foram posteriormente introduzidos por Garofalo (1885),

em Criminologia, e Ferri (1881), em Sociologia Criminale, que apesar de ter como foco o criminoso,

deram importância e relevância à realização de estudos de localização espacial do crime, os quais já

ocorriam desde o início do séc. XIX.

Recorrendo a cartas geográficas e à recolha e interpretação de dados estatísticos, relativos

ao tipo e número de delitos, a escola Franco-Belga, através de Guérry (1833), e Quételet (1835), foi

pioneira no desenvolvimento da sociologia criminal, ao associar o crime ao espaço onde este ocorre.

Nestes estudos conclui-se que a taxa e o tipo de criminalidade difere de zonas rurais para zonas

industrializadas. Em áreas industrializadas os crimes contra propriedades eram mais elevados do

que em zonas rurais, onde o fenómeno inverso era verificado em relação a crimes violentos. Estudos

realizados posteriormente na Alemanha e Inglaterra encontraram uma situação semelhante, no qual

as cidades detinham um maior número de crimes em comparação com zonas rurais, nas quais os

crimes contra pessoas eram maiores. Tal levou a concluir que as diferenças legislativas entre países

não teriam grande impacto sobre a delinquência (Delgado, 1998).

No entanto, o grande passo para a criminologia distanciar-se de causas meramente medico-

psiquiátricas foi dado por Durkheim, que, discordando de Garofalo, entende que o estudo sociológico

do crime não deveria, à priori, separar delitos considerados “naturais” ou “verdadeiros” descartando

os restantes. Defendendo uma associação entre o crime e a sociedade, "(…) as maneiras colectivas

de agir e de pensar têm uma realidade exterior aos indivíduos que, em cada momento do tempo, a

elas se conformam (…)” (Durkheim, 1995: 23) e, mais que isso, "(…) são não só exteriores ao

indivíduo, como dotados de um poder imperativo e coercivo em virtude do qual se lhe impõem”

(idem, ibidem: 30). A publicação de Les règles de la méthode sociologique (1894) tornou-se basilar

no desenvolvimento da criminologia contemporânea.

Fig. 1.1 Ilustrações de Lombroso

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

25 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

As teorias de Durkheim foram postas de parte, pelos seus colegas europeus, e o estudo

sociológico do crime apenas obteve eco no outro lado do Atlântico (Robert, 2007). Burgess, e

futuramente a escola de Chicago, nos Estados Unidos da América, teorizam sobre os efeitos

sociológicos e espaciais na criminologia, considerando como factores a distância ao centro das

cidades e as consequências das migrações para os Estados Unidos da América, no início do séc.

XX. Em 1916, após um estudo na cidade de Lawrence, em Kansas, Burgess observa a distribuição

residencial dos criminosos, onde conclui que as áreas, onde se observavam as maiores

concentrações, ficavam na proximidade do centro de negócios da cidade, congregadoras de

oportunidades para o crime.

Observando a expansão da cidade de Chicago, Burgess, em 1926, retrata um fenómeno

social segundo um plano radial: Os mais ricos iam para as zonas suburbanas, e os pobres, oriundos

de migrações, instalavam-se nas proximidades dos centros urbanos, onde a habitação era mais

barata e precária. Esta situação reproduzia-se sem cessar, pelos emigrantes (provenientes

maioritariamente de países europeus), onde as áreas intersticiais ao centro urbano sofriam de uma

renovação populacional pelos novos imigrantes que ocupavam as áreas deixadas por antecedentes

emigrantes, caracterizando a zona como intranquila. Devido à incapacidade da cidade de constituir

entidades e equipamentos eficazes de acolhimento e à perda, pelos emigrantes, de padrões/normas

convencionais, que asseguravam anteriormente o controlo social informal, levou a elevados níveis de

criminalidade e consequentemente a uma cultura favorável ao delito. As ruas, sítios onde conviviam

as crianças, reinavam os valores associados à delinquência (Robert, 2007).

Fig. 2.2 Chicago segundo o modelo de anéis concêntricos de Park e Burgess (1925)

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 26

As conclusões de Burgess, sobre a existência de zonas que podem ser invariavelmente

relacionadas com níveis altos de criminalidade e a noção de que a sociedade é composta por grupos

sociais e pelas suas interacções, influenciaram a constituição da criminologia ambiental, a qual foi

desenvolvida pela escola de Chicago.

Shaw e McKay (1929) utilizam a teoria da desorganização social, seguindo os conceitos de

Burgess, para explicar padrões de delinquência na cidade de Chicago. Através da elaboração de

mapas com a localização da residência dos criminosos e com a distribuição de outros factores, tais

como a pobreza, mobilidade e heterogeneidade da população, foi possível concluir que a junção

destes factores favorece a criminalidade. No estudo Delinquency Areas (1929), descrevem a

distribuição da variedade de problemas sociais na cidade de Chicago. No seu estudo destacam-se as

conclusões de que “(…) relatively high rates have persisted in certain areas notwithstanding the fact

that the composition of population has changed markedly (…)”5(Shaw e McKay, 1929: 204) e o

argumento de que “(…) when business and industry invade a community, the community thus

invaded ceases to function effectively as a means of social control. Traditional norms and standards

of the conventional community weaken and disappear. Resistance on the part of the community to

delinquent and criminal behavior is low, and such behavior is tolerated and may even become

accepted and approved”6 (idem, ibidem: 204 e 205)

A importância da delinquência juvenil é ressaltada por Shaw e McKay, como consequência

de um ambiente de tolerância e aceitação da criminalidade por uma comunidade. A associação

destes autores no departamento de Sociologia no Institute for Juvenile Research, de Chicago

contribui para a metodologia de combinação de esforços quantitativos (determinação de taxas e

cálculos por zona urbana) e de esforços qualitativos (história de vida dos delinquentes).

Seguindo o modo de pensamento da escola de Chicago, Sutherland teoriza, em 1924, no

tratado Criminology, posteriormente reeditado (1934, 1939 e 1947) como Principles of Criminology,

sobre as causas associadas à criminologia sistemática. Procura não se cingir só à criminalidade das

classes populares, através do seu trabalho em 1949, sobre a delinquência empresarial, white collar

crime.

Sutherland considera que o comportamento criminoso é aprendido, tal como Shaw e Mckay,

mediante um processo de comunicação, através de uma cultura existente dentro de um grupo restrito

de relações pessoais. Reconhecendo que a noção de cultura supõe a heterogeneidade cultural da

sociedade americana, e a consequência desta no surgimento de conflitos sociais, acolhe a ideia da

Associação Diferencial: a aprendizagem social - a qual não se desenvolve em todos da mesma

5 “(…) taxas relativamente altas persistiram em certas áreas apesar da composição da população ter mudado

bastante (…)” Tradução livre 6 “(…) quando a industria e o comércio invade uma comunidade, essa mesma cessa de funcionar efectivamente

em termos de controlo social. Normas e conceitos tradicionais da comunidade enfraquecem e desaparecem. A

resistência da comunidade à delinquência e ao comportamento criminal é baixo, e o mesmo comportamento é

tolerado e até poderá ser aceite e aprovado” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

27 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

maneira. Segundo Sutherland, a socialização no meio de um grupo contrário às leis estabelecidas

explica a formação de um criminoso, apesar deste considerar que a mesma não pode ter um carácter

universal, pois a criminologia deve lograr “(...) uma explicação teórica, possuindo as mesmas

características que as demais teorias científicas” (Sutherland e Cressey cit. in Delgado, 1998).

A mudança para um pensamento relacionado com a criminalidade a nível nacional em

detrimento das problemáticas urbanas, ocorre a partir da década de 1930, após a Grande

Depressão. É neste contexto, onde se destaca a gradual redução da importância de Chicago na

sociologia americana, que Merton, em 1938, na sua obra Social Structure and Anomie, explana o

deviate behavior (o comportamento desviante) pelas tensões entre a distribuição de valores, normas

e interesses e a distribuição de posições sociais e de status, que determinam um acesso

diferenciado aos meios de aquisição desses valores. Portanto Anomie (anomia) é entendida por

Merton como consequência da reacção do indivíduo, o qual estando incapacitado para atingir os

seus objectivos, irá utilizar meios não legais para alcança-los, na estrutura desigual criada pela

própria sociedade, derivando em comportamento delinquente.

Cohen, em 1955, na obra Delinquent Boys: The Culture of the Gang, combina a teoria da

Anomia, como explicação das estatísticas da delinquência, e a teoria da Associação Diferencial,

como justificação da transmissão social do desvio. Através desta combinação desenvolve a ideia de

Subcultura, a qual expõe a transmissão do comportamento delinquente e desviante, resultante da

disparidade de oportunidades dentro da sociedade, dentro de gangues de jovens.

A partir da década de 1950, Becker, Goffman, Matza, Erikson e Cicourel, foram

desenvolvendo uma perspectiva interacionista no estudo da delinquência. Em vez de procurar os

motivos do comportamento desviante através das características dos delinquentes, os interacionistas

analisam as ligações entre as partes implicadas no desvio, directa ou indirectamente:

“Questionavam-se quais os critérios em nome dos quais certas pessoas, e só elas, são

estigmatizadas como delinquentes (variável dependente) e quais as consequências desta

estigmatização (variável independente)” (Dias e Andrade cit. in Delgado, 1998). Quando o desviante

se insere num processo de rotulagem social, torna-se cada vez mais difícil o retorno às afiliações

convencionais e existe uma maior distância social entre este e a restante sociedade não-delinquente.

Em consequência deste processo, o desviante afasta-se, assim, de oportunidades legítimas e

"autojustifica" o recurso a instrumentos ilegítimos. A perspectiva interacionista defende que é

necessário uma margem de tolerância para os comportamentos desviantes, resultantes do processo

de estigmatização, equacionando soluções informais e não institucionalizadas e padronizadas.

No fim da década de 1960, com o surgimento das contestações, contra a guerra do Vietname

e dos campos universitários, o conflito tornou-se o ponto central no estudo da criminologia. A

problemática da delinquência não estaria relacionada com o factor comportamental, mas sim com

factores políticos e com a distribuição do poder, pois a criação e a aplicação da lei penal estaria

concentrada num grupo restrito. É nesta linha de pensamento que Quinney (1970), em The Problem

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 28

of Crime, e Chambliss (1971), em Law, Order, and Power, desenvolvem a teoria do conflito, onde

questionam o conflito de interesses na concepção das leis, e da incapacidade das mesmas

modificarem perante as mudanças sociais.

Num contexto de globalização, e o respectivo alargamento da actividade económica, assim

como o enfraquecimento do Estado social, nos países desenvolvidos, o estudo da delinquência foi

progressivamente desviando a atenção do criminoso para a vítima e para a situação onde ocorre o

crime. Felson (1994) explora a importância da oportunidade na explicação dos crimes e a respectiva

necessidade de redução do risco associado à vítima. A importância e influência do sítio/situação,

onde ocorre o confrontamento entre vítima e criminoso, na decisão de cometer o acto criminoso são

exploradas por Jane Jacobs (1961), Ray Jeffery (1971) e Óscar Newman (1972), entre outros, que

serão posteriormente desenvolvido nos capítulos seguintes.

Todas as teorias concebidas surgiram consoante os problemas particulares de uma época:

as migrações populacionais e os respectivos bairros intersticiais em Chicago no caso de Burgess,

Shaw e McKay; a delinquência profissional em Sutherland; ou o conflito universitário para Quinney e

Chambliss. A tentativa de dotar estas teorias de um carácter global, com validade para qualquer

crime em qualquer época, seria sempre posta de parte assim que o contexto ou as circunstâncias

mudassem, mas será necessário considerá-las ao analisar situações futuras como instrumentos de

pesquisa na criminalidade.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

29 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

1.3 Espaço | Delinquência em Espaço Urbano

Foi a partir da Revolução Industrial, início do séc. XIX, que a Europa, particularmente a

Inglaterra, França e Alemanha, assistiu a um crescimento das suas cidades devido às migrações

oriundas das áreas rurais. Segundo dados da ONU (2005), a parcela da população urbana no total

da população mundial tem vindo a crescer constantemente, onde no fim do séc. XX reconhece a sua

maior expressão: no início do século XIX, 20,3 milhões de pessoas viviam em cidades (3% da

população total mundial); em 1900, esse número já era 220 milhões de pessoas (13%); em 1950,

732 milhões de pessoas (29%); em 2005, 3,2 mil milhões de pessoas vivem em cidades (49%);

estima-se que em 2030, o número aumente para 4,9 mil milhões (60%).

A causa para este aumento prende-se pelo crescimento natural, da população residente,

apesar de segundo Esteves (1999: 26) as “(...) cidades, dentro dos seus limites administrativos,

apresentarem em alguns países mais desenvolvidos, taxas de crescimento natural negativas

essencialmente devido à terciarização, conseguindo as respectivas áreas metropolitanas contrariar

esta tendência (...)”, e, sobretudo, pela migração de pessoas, das áreas rurais para as cidades e de

países estrangeiros paras as grandes metrópoles. No caso português, este fenómeno é observável

entre 1991 e 2009 na cidade de Lisboa, onde, segundo dados estatísticos do INE, existe um

crescimento negativo da população residente de 669.290 para 479.884, mas no entanto na área

metropolitana nota-se um crescimento positivo de 1.917.760 para 2.033.756 dos residentes. A busca

de melhores condições de vida, através de melhores remunerações e pelo acesso a infra-estruturas,

bens e serviços (não disponíveis nos anteriores locais de residência), formam as razões pelas quais

se originam as migrações para as áreas urbanas.

O aumento da dimensão assim como a densidade e a heterogeneidade da população dos

aglomerados urbanos está relacionada com a prática de actos delituosos, pois estes tendem “(…) a

enfraquecer os sistemas informais de controlo social e a favorecer a anonimização das relações

interindividuais (…)" (Almeida cit.in Esteves, 1999) e por consequência a aumentar as oportunidades

para a execução de crimes no espaço público. Comprova-se uma “(…) situação de conflito latente

que é típica das situações urbanas e que é caracterizada, contudo, por uma desigual distribuição dos

recursos necessários para satisfazer as necessidades humanas (…)”, como assegura Francesco

Indovina (2001: 20).

O crescimento das cidades gera igualmente problemas de cariz social que contribuem

directamente para o aumento da criminalidade. Com a vinda de um grande número de pessoas para

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 30

as áreas urbanas associada à ausência de estruturas físicas, económicas e sociais de acolhimento

assim como baixos níveis de qualificação literária e profissional, por parte da população (i)migrante,

leva esta a instalar-se em áreas degradadas da cidade, assim como nas suas periferias. Shaw e

McKay, nos seus trabalhos anteriormente referidos (1929), analisam através da teoria da

Desorganização Social as consequências da marginalização económica e social (contribuindo os

baixos salários auferidos e a precariedade do emprego assim como o desemprego), na segregação e

no desenraizamento da população. Onde o enfraquecimento e o desaparecimento de normas,

conceitos e padrões convencionais da comunidade, que asseguravam o controlo social informal,

levam à tolerância e aceitação e aprovação da delinquência.

No entanto não é justificável a associação efectiva entre recém-chegados e a criminalidade

urbana. Francesco Indovina comenta que para assumir um estado de maior segurança procede-se à

supressão de elementos relacionados com a “diversidade”, onde em “(…) algumas situações, e é um

dos aspectos mais graves da questão, recai sobre o imigrante (como elemento principal da

“diversidade”) a responsabilidade principal de “criar” situações de insegurança (…)” (2001: 20).

O tráfico e o consumo de drogas contribui igualmente para o aumento da taxa de

criminalidade. Destaca-se igualmente o papel dos traficantes nas consequências na criminalidade,

como afirma Aguiar (cit. in Esteves, 1999) “Na actualidade, uma das maiores problemáticas inerentes

à propagação do crime, nas quais estão subjacentes motivações económico-financeiras, são as

poderosas redes intercontinentais de narcotráfico (…)”.

A generalização preconceituosa, de quem pratica actos ilícitos, é criticada por Indovina

quando afirma que, “(…) em substância presume-se que a propensão para a delinquência esteja

num elemento perfeita e simplesmente individualizável no próprio aspecto (uma espécie de neo-

lombrosismo), ao passo que talvez seja precisamente contrário – os que querem delinquir tendem à

mimetização (…)” (2001: 24). Esta crítica é observável no exemplo das pessoas que já habitam a

cidade há varias gerações, que descriminados por diversas razões, podem tornar-se delinquentes.

Os jovens com poucas hipóteses de melhorar a sua situação económica, e de ascender na

hierarquia social, e habitando em ambientes propiciadores à delinquência, podem constituir também

parte dos agentes da criminalidade na cidade. Não se enquadrando em nenhum grupo social,

tendem a formar grupos marginais à sociedade, “gangs”, constituindo regras próprias aos seus

associados, os quais praticam comportamentos delinquentes e/ou transgressivos.

Estes comportamentos transgressivos ou anti-sociais caracterizam-se pela sua (quase)

inimputabilidade e pelos efeitos negativos na insegurança da sociedade. “(…) ASB (Anti Social

Behaviour) can be regarded as straddling both „subcriminal‟ and minor criminal behaviour - but

excluding serious criminal activity (…) recent evidence suggests that concerns about ASB are

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

31 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

spatially concentrated in deprived and/or urban areas and in town and city centre districts (…)”7

(Millie, 2006). O Anti-Social Act (2003), aprovado pelo parlamento inglês, define estes

comportamentos como causadores de ameaças, distúrbios, alarme ou aflição a outros indivíduos.

Das condutas visadas destaca-se: incidentes no uso de armas de ar comprimido ou réplicas de

armas verdadeiras e de fogos-de-artifício, comunicação maliciosa, inscrição tipo graffiti em

património de privados ou em mobiliário urbano, incómodo causado por barulho, consumo de álcool

e embriaguez em espaço público e conduta anticívica com resíduos urbanos. Segundo dados do

governo Britânico, observa-se uma redução deste tipo de comportamentos em Inglaterra e no País

de Gales desde 2004, com 3.479 delitos levados a julgamento para 1.671 em 2009.

Os crimes praticados em espaço público possuem diversas formas, que, segundo o Código

Penal Português (2007), são constituídos em: Crime contra as pessoas – entre os quais contra

vida, integridade física, liberdade pessoal, liberdade e autodeterminação sexual e reserva da vida

privada-, contra património – furto, roubo, dano e extorsão -, contra identidade cultural e

integridade pessoal contra vida em sociedade – discriminação racial, religiosa ou sexual -, contra

vida em sociedade – incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas e contra a

ordem e tranquilidade públicas.

Na cidade de Lisboa e na respectiva área metropolitana, segundo dados estatísticos do INE

entre 1998 e 2010, verificou-se que a maioria dos crimes registados, pelas autoridades policiais, são

contra o património. O mesmo estudo denota um decréscimo, ou um aumento suave, dos registos na

maioria dos tipos de crime, na área em questão. Destacam-se os crimes contra património, de

32.468 para 26.052 ocorrências em Lisboa, entre 1998 e 2010, e de 62.342 para 58.719 na Grande

Lisboa; contra pessoas, de 8.512 para 5.894 no caso de Lisboa e, respectivamente, na área

metropolitana um suave aumento de 18.612 para 18.896; e nos crimes contra vida em sociedade, de

6.574 para 4.630 em Lisboa e de 9.111 para 10.247 na zona da Grande Lisboa (Anexo I).

Devido ao aumento das taxas de criminalidade e da respectiva mediatização, gera-se na

população residente o sentimento de insegurança, o qual prejudica fortemente a qualidade de vida

das mesmas, assim como o usufruto do espaço urbano e o exercício da sua quotidianidade, tendo

esta consequências diferenciadas segundo as características (entre as quais a idade e o género) dos

habitantes.

7 “(…) ASB pode ser considerado como evolvendo tanto comportamentos criminais menores e “subcriminais” –

mas excluindo actividade criminal grave (…) evidências recentes sugerem que as preocupações com ASB são

concentradas espacialmente nos bairros e/ou em áreas urbanas e nas cidades e nos distritos relacionados com

o centro das cidades (…)” Tradução Livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 32

1.4 Vítima | Medo e Insegurança

Para compreender a insegurança e a sua extensão em cada indivíduo, será necessário

entender as suas causas e origens. O modo como cada indivíduo percepciona o meio envolvente

depende da sua capacidade de ler e interpretar o mesmo, o qual resulta na codificação da

informação. Por isso derivado de diferentes modos de vida, formação intelectual e educativa, o modo

como se forma a imagem na mente de cada um assume um carácter idiossincrático.

A imagem mental define-se como “(...) conjunto de informações conceptuais provenientes da

memória a longo prazo, e perceptivas, resultantes da experiência directa dos sentidos, que existem

na presença de objectos observados (…)” (Dias cit. in Esteves, 1999:32). Como a imagem mental

influencia a tomada de decisões e o comportamento de cada indivíduo, será importante entender a

maneira como os cidadãos observam e analisam o meio envolvente. Um instrumento relevante para

arquitectos, sociólogos, geógrafos e urbanistas em geral será conhecer a leitura que os cidadãos, os

quais constituem o objectivo alvo da realização do planeamento, fazem do espaço criado.

Como factores influentes na elaboração da imagem mental encontramos a

profissão/ocupação de cada um, o meio de transporte utilizado, o grupo socioeconómico ao qual

pertence, a idade e o respectivo género.

A profissão/ocupação influencia a formação da imagem mental por determinar a durabilidade

e a constância das deslocações no espaço. Consoante as necessidades de movimentos nos meios

onde ocorre a sua actividade, implica condicionamentos no estabelecimento da imagem mental. Uma

actividade concentrada num espaço restrito reflecte uma imagem detalhada desse espaço, ao

contrário de uma imagem vaga e abrangente, derivada de uma actividade estabelecida em múltiplos

espaços.

O modo como se desloca através do espaço, concede análises e leituras diferentes do

mesmo, devido aos trajectos e velocidades efectuados. Uma leitura realizada através de um percurso

a pé fornece mais detalhes do que uma viagem através de um meio de transporte rápido.

Um outro factor que influencia a informação directa e indirecta, contribuindo para a formação

de imagens mentais, para além como a quantidade e qualidade, é o grupo socioeconómico ao qual

pertence cada indivíduo. Esteves aponta que “(...) a imagem da cidade que os cidadãos dos bairros

de rendimentos muito elevados têm é muito maior, além de mais completa (...) que a imagem dos

habitantes de menores rendimentos (...)” (1999: 35 e 36). O rendimento familiar influencia o acesso

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

33 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

às fontes de informação primárias, obtida através de contactos directos com o meio, e secundárias,

maioritariamente através dos meios de comunicação social, na medida do aumento de oportunidades

e de possibilidades de adquirir informação.

Os meios de comunicação, apesar da sua importância para a obtenção de imagens mentais,

são condicionados por diversos factores que distorcem a sua cobertura noticiosa. Entre eles

destacam-se, como refere Esteves (1999), a distância, relevância e importância histórica, cultural e

económica do local da notícia, assim como a espectacularidade e peculiaridade desta, os objectivos

de amplitude geográfica dos meios de comunicação e as pressões e controlos por parte de

interesses de grupos, organismos ou governos. Em relação à distância ao local da ocorrência, esta é

inversamente proporcional ao volume da transmissão da notícia. No que confere à relevância do

lugar, esta gera uma hierarquia noticiosa e maior atenção pelas agências e meios de comunicação.

Relativamente à importância das relações históricas, culturais e económicos, estas condicionam a

frequência e volume de notícias. No que concerne à amplitude geográfica - regional, nacional ou

internacional – esta dependerá dos objectivos de transmissão dos meios de comunicação em causa.

Com base no aumento de oportunidades de contacto com o meio envolvente, assim como a

sua ocupação e o grau e o detalhe de conhecimento, a idade de cada indivíduo influencia a formação

da imagem mental.

A diferenciação entre género masculino e feminino modifica igualmente a sensibilidade de

cada indivíduo, no qual se destacam factores de ordem cultural e psicológico, perante situações de

análise do meio envolvente.

A elaboração da imagem mental, resultante da análise e percepção do meio envolvente, está

directamente conectada com a formação do medo. Este pode ser definido por um “sentimento de

inquietação que se sente com a ideia de um perigo real ou aparente” (Porto Editora, 2009). O medo

resulta da percepção de uma situação ou local que é potencial ou realmente perigoso para ser

usufruído. Tal facto faz emergir o sentimento de insegurança.

Indovina salienta o factor colectivo na insegurança, o qual considera uma “construção social”,

“(…) no sentido que ela não deriva directamente de uma efectiva situação de perigo, em que a

população se possa encontrar, mas, antes, de um “estado” de ânimo, na construção do qual

participam vários fenómenos (…)” (2001: 23). As condições psicológicas, sociais e culturais

associam-se à materialização da insegurança, que, como afirma Teixeira e Porto, aumenta “(…) a

angústia existencial e a necessidade de exorcizar o medo pela imaginação (…)”, na qual conclui

sobre a importância do “(…) papel que o imaginário do medo exerce nas sociedades modernas

(…)”(1998:55).

Segundo Esteves (1999), existem quatro factores para a formação do medo relativamente ao

crime, conduzindo à insegurança: contacto directo ou indirecto com o crime, informações difundidas

pelos meios de comunicação, insatisfação com a justiça e indicadores do meio envolvente.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 34

A experiência própria, enquanto contacto directo ou de experiências de familiares, vizinhos

ou amigos, com o acto criminoso, é um factor importantíssimo na criação de um sentimento de receio

com o crime em geral. A influência deste factor reflecte na insegurança, onde “(…) o medo do crime

parece aumentar consideravelmente quando as pessoas entrevistadas estão informadas sobre os

delitos em que as vítimas eram conhecidos ou vizinhos, em particular se estas pessoas apresentam

características sociais semelhantes (…)” (Rico e Salas, cit. in Esteves, 1999:43). No inquérito,

realizado por Espírito Santo (2001), sobre os motivos da insegurança na zona de residência assinala

os valores de 18% “porque já foi assaltado” e 25% “porque ouviu falar de assaltos na zona”,

reflectindo a importância da experiência própria ou de outros conhecidos na insegurança.

A influência das informações divulgadas pelos meios de comunicação sobre a criminalidade

é outro factor a ter em conta na génese do medo do crime. O ênfase dado aos crimes violentos e à

espectacularidade do modo como são divulgadas as notícias, tendo como alvo o público mais

vulnerável à criminalidade, suscita à alteração do volume e gravidade da realidade do crime. Esteves

afirma que “(…) a transmissão de imagens estereotipadas e por vezes incorrectas, sobrevalorizando

algum elemento mais chocante, conduz à alteração da realidade sobre o crime (…) a inevitabilidade

da conversa em família ou entre amigos destes temas, depende não só da proximidade física da

ocorrência (…) mas também da proximidade social e cultural (…)”(1999: 44). No entanto, segundo o

estudo da Segurança no concelho de Lisboa, por Espírito Santo (2001), só 3% da população

inquirida admite o efeito dos meios de comunicação na formação do sentimento de insegurança.

Apesar de não ser explícito o efeito dos média nos restantes motivos apresentados, para conceber o

sentimento de insegurança, tais como: “porque os tempos de hoje são mais violentos” (14%) e

“porque ouviu falar de assaltos na zona” (25%).

O desagrado e a insatisfação com a situação do sistema penal é um factor a ter em conta

para a formação do medo em relação ao crime. A incapacidade devido a morosidades burocráticas,

prevenção ineficaz de delitos e legislação ineficiente são motivos para uma desconfiança

generalizada por parte dos cidadãos. A actuação por parte das autoridades face às vítimas de crime

e criminosos também é tida em conta no sentimento de desconfiança. A incerteza em relação ao

número real de ocorrências criminais e os valores revelados por estatísticas oficiais, onde este último

varia consoante a voluntariedade da população em denunciar – o qual depende do relacionamento

com a polícia, existência de represálias, seguros e da avaliação subjectiva da gravidade do crime – e

do interesse por parte das autoridades em registar. Segundo dados fornecidos pelo INE, a lentidão e

a impugnabilidade reflectem-se na diferença entre os arguidos/suspeitos e os efectivamente

condenados, em julgamento findo. Em 2008 registaram-se 96.362 arguidos/suspeitos de crimes

contra as pessoas, identificados pela PSP (Policia de Segurança Pública) e GNR (Guarda Nacional

Republicana), enquanto se verificou a condenação de 12.247 indivíduos. Ressalva-se que, entre

1998 e 2008, tanto os crimes contra pessoas e património assinalam, sensivelmente, o mesmo

número de arguidos/suspeitos enquanto que, em relação a condenados verificou-se uma ligeira

evolução crescente (Anexo I).

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

35 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

O conjunto de indicadores como as condições de habitação de uma área residencial, a

coesão entre vizinhos e os comportamentos condenáveis pela sociedade por parte de alguns

indivíduos constitui alguns dos factores que influenciam o sentimento de insegurança. A influência

por parte da condição espacial na formação desse sentimento na população será analisada ao longo

deste trabalho.

Gibson, em 1979, considera a influência latente que os factores relacionados com o

ambiente, aquando da sua percepção, têm no comportamento humano como affordance. Este

conceito explora a capacidade do espaço de interagir como o mesmo, onde se este transmitir

vulnerabilidade e facilitar oportunidades aumenta a possibilidade de ocorrência de delitos.

A Broken Windows Theory, introduzida em 1982 por Wilson e Kelling, considera as questões

relacionadas com as condições de habitação de um bairro e a prática de comportamentos anti-

sociais como responsáveis pela elaboração de ambiente favorável a eventuais comportamentos

ilícitos e ao sentimento de insegurança da população. O anonimato, indícios de desocupação, tais

como janelas partidas ou acumulação de lixo, e consequentemente diminuição do risco de detecção

do meio envolvente, contribui para a generalização de actividades ilícitas. “(…) if a window in a

building is broken and is left unrepaired, all the rest of the windows will soon be broken (…) Window-

breaking does not necessarily occur on a large scale because some areas are inhabited by

determined window-breakers whereas others are populated by window-lovers; rather, one unrepaired

broken window is a signal that no one cares, and so breaking more windows costs nothing (it has

always been fun) (…)”8 (Wilson e Kelling, 1982: 2 e 3). Em Nova Iorque, nos Estados Unidos da

América, o Mayor Rudy Giuliani adoptou uma estratégia baseada no princípio da Broken Windows

Theory, onde institui tolerância zero nas práticas anti-sociais e de pequeno delito. Os efeitos foram

bastante positivos com o declínio constante da criminalidade, mesmo depois de terminado o mandato

de Rudy Giuliani.

8 “(…) se uma janela num edifício se parte ou não é reparada, o resto das janelas em breve também serão

partidas (…) partir janelas não ocorre necessariamente em larga escala devido a algumas áreas serem

habitadas por pessoas que gostam de partir janelas enquanto noutras por amantes de janelas; antes, uma janela

deixada sem reparo é um sinal de que ninguém quer saber, e por isso partir outras janelas não custa nada (até é

divertido) (…)” Tradução livre

Fig. 1.3 Uma fachada vandalizada de Pruitt-Igoe

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 36

Existe uma diferenciação quanto ao modo como é sentida a insegurança entre homens e

mulheres e, igualmente, em relação à idade. A população feminina demonstra um maior receio

comparativamente ao género oposto, devido a factores de ordem psicológica e cultural e

relacionados com uma maior sensibilidade e vulnerabilidade física. Segundo o estudo de Espírito

Santo (2001) referencia a disparidade dos valores relativos à sensibilidade do conhecimento “de

casos de assalto na zona”, onde 60% das respostas pertencem ao sexo feminino contra 40% de

homens, na formação da insegurança. O estudo toma em atenção a diferença no receio de “andar

sozinhos em veículos próprios” e em “casa” e “andar na rua durante o dia”, onde claramente as

mulheres inquiridas mostram-se mais inseguras. No entanto “(…) os estudos sobre a ocorrência de

delitos sobre pessoas demonstram que as mulheres são francamente menos alvo dos criminosos do

que os homens, excepto no delito de violação” (Esteves, 1999:49). Esta diferença de vitimização é

justificada pela menor exposição a actividades criminosas devido à adopção de medidas de

protecção, de uma forma ciente ou não, que serão explanadas adiante.

O receio de ser vítima não é igual em todos os escalões etários da população. Este

sentimento aumenta gradualmente, de modo geral, nos mais jovens, até aos 30 anos, e nos mais

idosos, após os 60 anos. Apesar deste último ser um dos grupos menos vitimados devido a

assunção de medidas de protecção que diminuem as hipóteses de serem alvo de actos criminosos.

A população mais idosa constitui-se como a que mais teme ser vítima de criminosos. A justificação

para tal fenómeno passa pela maior probabilidade desta, de desenvolver malefícios a nível físico e

psicológico quando deparados com um crime, devido a questões de fragilidade física impeditiva de

defesa pessoal. Acresce a carência económica do sector mais idoso, que impossibilita a recuperação

dos seus pertences após uma situação de subtracção ilícita. Ressalva-se igualmente a participação

dos idosos na vida pública da comunidade que, devido a problemas de saúde e de falta de

oportunidade, impede uma relação mais próxima com as actividades e com a população, da área de

residência, resultando numa desconfiança perante o próximo. O inquérito de Espírito Santo (2001: 4)

reflecte o peso da insegurança no sector mais idoso, onde numa das afirmações esclarece que “(…)

o grupo onde o sentimento de insegurança é maior é o dos que têm mais de 58 anos (…)”. No estudo

de Villaverde e Schmidt (2009: 101 e 106) retrata a importância da insegurança na área de

residência para os mais idosos, “(…) à medida que se avança na idade, a Segurança e Policiamento

vai adquirindo ainda mais peso que a saúde (…)”, concluindo que relativamente à insegurança “(…) a

discordância aumenta à medida que avança a idade dos inquiridos, ou seja, quanto mais velhos mais

inseguros se sentem (…)”.

Perante um crescente receio de vitimização, a população em geral tendencialmente toma

medidas para se proteger a si e o seu património de actos delinquentes. Estas reacções diferem

entre a mudança de hábitos, que podem diminuir consideravelmente a sua qualidade de vida,

investimento em medidas pessoais de protecção e de segurança e o recurso a ajuda de vizinhos e

amigos, associações civis, serviços de empresas de segurança e ao sistema público.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

37 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

A mudança de hábitos ligada a uma redução na exposição a situações, onde pode ocorrer o

crime, consiste no evitamento de trajectos, e de aproximação de pessoas, que são potencialmente

perigosos e na não utilização de meios de transporte públicos. No estudo de Espírito Santo (2001)

alude às medidas de mudança de hábitos, onde os inquiridos evitam zonas e ruas (26%), evitam

saídas nocturnas (23%) e previnem ao não usar objectos de valor (23%).

Como medidas individuais de protecção destaca-se a aquisição de armas, sprays ou outros

objectos para defesa pessoal, o investimento na prática de desportos de defesa pessoal (karate,

judo, krav maga, etc...) e no acompanhamento por cães treinados na defesa dos donos. Estas

medidas têm como principal objectivo diminuir a vulnerabilidade física perante o potencial atacante,

adquirindo um carácter dissuasor.

O recurso à ajuda de vizinhos e amigos, através de estratégias de vigia de pertences,

constitui outra situação de prevenção da criminalidade. Destaca-se a verificação das habitações

durante a ausência dos donos e na elaboração de actividades que indiquem a ocupação das

mesmas, como a recolha de correspondência, apagar e acender luzes e cuidar do jardim, as quais

possuem características dissuasoras para potenciais delinquentes.

Um sentimento generalizado de insegurança por parte de vizinhos, amigos ou conhecidos

pode levar à constituição de grupos orientados para medidas de protecção para a comunidade. Estes

grupos habitualmente são centrados num bairro e são constituídos maioritariamente por residentes

da mesma área residencial. Em 1964, o New York Times noticia o homicídio de Catherine Genovese

em Queens, nos Estados Unidos da América, que foi alvo de grande polémica. “(…) For 35 minutes

38 people simply watched – the word is right there in the lead- as Moseley (killer) slaughtered their

pretty young neighbor. One witness explained (…) with a phrase that became infamous: “I didn‟t want

to get involved” (…)”9Rasenberg (2006). Apesar da incerteza do número correcto de testemunhas

oculares10

, este caso levou posteriormente à formação de associações de grupos de cidadãos para

vigiar e controlar os seus bairros. Em 1972, a National Sheriff‟s Association institui o programa

nacional de Neighborhood Watch de modo a que os cidadãos contribuam para o trabalho das

autoridades e assim previnam actos delituosos e/ou transgressivos e, consequentemente, diminuam

o sentimento de insegurança. No Reino Unido nos anos 80 surge um movimento semelhante ao dos

Estados Unidos da América, e posteriormente noutros países formam-se associações com os

mesmos objectivos.

9 “(…) Por 35 minutos, 38 pessoas simplesmente olharam – a palavra é a correcta – enquanto a sua bonita

jovem vizinha era morta por Moseley (o assassino). Uma das testemunhas explicou (…) com uma frase que

ficou infame: ”Não quis envolver-me” (…)” Tradução livre 10

Posteriormente, após investigação sobre este caso, conclui-se que as testemunhas não seriam mais que seis

ou sete, e nem todas se aperceberam do motivo do barulho.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 38

O recurso aos poderes públicos na busca de medidas de protecção, com menor ou maior

expressividade, constitui uma reacção por parte de vítimas ou potenciais vitimas para diminuir a

insegurança. No entanto o desânimo, já descrito anteriormente, com a ineficiência, morosidade e

pouca flexibilidade do sistema judicial, assim como o sistema administrativo leva a uma procura de

soluções por parte de entidades privadas.

A aquisição de serviços em empresas especializadas na protecção e de segurança de bens e

pessoas constitui uma das medidas mais utilizadas e igualmente dispendiosas. A instalação de

câmaras de vigilância, alarmes, fechaduras e portas blindadas e outros sistemas de protecção assim

como a constituição de seguros contra roubo, furto e de vandalismo abrangem todo o tipo de imóveis

(habitações, escritórios, indústrias, comércio) assim como móveis (veículos, recheio da casa,

objectos de luxo e de colecção). Segundo dados do INE observa-se um crescente número de

pessoas que desenvolvem funções ao serviço de empresas de investigação e segurança, onde entre

1982 e 1992 registou-se um aumento de 11.745 para 34.432 empregados e em 2007 para 37.748.

Segundo o mesmo organismo aponta para a existência de 575 empresas desta natureza, com uma

distribuição irregular no país, onde a região metropolitana de Lisboa concentra a maioria dos locais

de trabalho11

.

O reforço de dispositivos de segurança contribui também para uma alimentação da ideia de

uma sociedade violenta, indo ao encontro dos interesses das empresas especializadas, no sector da

11

A área metropolitana de Lisboa, excluindo a margem sul do Tejo, emprega cerca de 32.600 pessoas, num

total de 37.748 trabalhadores em todo o país (dados referentes a 2007 do INE).

Fig. 1.3 Sinais indicativos da presença do programa Neighborhood Watch

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

39 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

protecção e segurança, que ao capitalizar um sentimento de insegurança aumenta as suas margens

de lucro na prestação de serviços.

Além do trauma emocional, infligido às vítimas, decorrente do crime, acrescem as despesas

materiais subtraídas de forma ilícita assim como, já anteriormente mencionadas, custos

consequentes das medidas de protecção e segurança.

Perante uma crescente importância da problemática da insegurança e o respectivo impacto

da vivência urbana, acresce a necessidade de elaborar estratégias para actuar directamente e/ou

indirectamente no sentimento de receio de criminalidade.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 40

1.5 Prevenção

O tema da insegurança urbana tem sofrido uma utilização política onde substitui a reflexão

social, sobre o estado real da situação, por uma postura de aproveitamento da população que sofre

com o sentimento de insegurança e com intervenções cada vez mais repressivas na sociedade com

o intuito de obter votos. As medidas propostas, geralmente, dividem-se pela via legislativa e

administrativa. Este tipo de estratégias “(…) envolve esforços direccionados quer para o policiamento

mais visível e eficaz, de integração e proximidade, com vista à detecção de delinquentes e à

protecção da população, quer para a criação de novos instrumentos jurídicos (…), ou para a

eliminação das principais fontes de risco (…)” (Heitor, 2007: 33). Este tipo de legislação insere-se por

vezes num quadro de “tolerância zero”, que segundo Francesco Indovina (2001) promove a

intolerância e a necessidade de ainda mais medidas repressivas, por indiferenciação de actos

criminosos e comportamentos socialmente reprováveis ou indecorosos.

Os resultados esperados pelo investimento nas vias legislativas e administrativas foram

considerados ineficazes por indicadores estatísticos, que leva a questionar a elaboração de

estratégias ligadas à prevenção. “(…) É fundamental a antecipação de motivações e necessidades

com o auxilio de estudos de diagnóstico social, cultural, económico, que aprofundem os problemas e

não os observem apenas a nível das manifestações mais evidentes, publicas, imediatas (…)”

(Espírito Santo, 2001).

Como foi referido anteriormente, de acordo com a teoria das estruturas de oportunidade, de

Figueiredo Dias e Costa Andrade (1984), um dos factores que contribui para o sucesso de um acto

criminoso é a situação onde ocorre o confronto entre a vítima e o delinquente. Patricia Brantingham e

Paul Brantingham (1975) elaboram um estudo onde comparam blocos de apartamentos em zonas

centrais e intersticiais dentro de bairros homogéneos, onde relatam a existência de um maior número

de assaltos nos blocos periféricos do bairro em contraste com semelhantes situados em zonas

centralizadas deste. Concluem que os potenciais delinquentes possuem diferentes razões para agir,

dividindo em motivos emocionais/impulsivos, como violações e vandalismo, e instrumentais, como

roubo e furto. Dado a motivação do ofensor, a passagem ao acto baseia-se num processo de

selecção da vítima mais apropriada, onde a importância deste factor é maior nos casos de

transgressões planeadas. Esta racionalidade supõe num balanço efectuado pelo potencial criminoso

entre custos e benefícios, onde “(…) salvo situações excepcionais, (…) tende a não actuar em

ambientes que envolvam demasiados riscos de ser detectado e impedido de agir com sucesso

(…)”(Heitor, 2007: 35).

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

41 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

Bennett (1989: 177) afirma que “(…) Within this perspective, opportunities for crime were

regarded not simply as open windows or unlocked doors, but as comprising a balance of a variety of

favourable and unfavourable situational factors, including the risks involved, the likely rewards and the

ease or effort of committing the offence (…)”12

. Na pesquisa inquire 128 detidos, por assaltos a

residências, que indicaram factores de risco para o acto criminoso após observação de imagens de

zonas urbanas distintas. As variáveis relacionadas com a possibilidade de detecção (risk), os

impedimentos à intrusão (ease) e a possível recompensa proveniente do acto criminoso (reward),

constituem os principais factores que influenciam a prática criminosa. Ressalva-se a proximidade de

outras habitações e eventual presença dos ocupantes, nas preocupações relativas à detecção, e a

existência de dispositivos de segurança, como dificuldades ao acto ilícito. Bennett (ibidem: 180)

conclui que“(…) When houses were found unsuitable, almost two-thirds of the offenders mentioned

unfavourable risk factors, one-fifth reported unfavourable reward factors and fewer than 10 per cent

noted difficulties relating to entry (…)”13

.

Perante as informações, que a situação fornece ao potencial transgressor e por sua vez

influencia a tomada de decisão sobre o alvo, destaca-se os factores inibidores de controlo/vigilância.

Segundo Heitor (2009), estes distinguem-se em via activa/natural e/ou passiva/artificial. Em relação à

primeira, a vigilância natural e o controlo social constituem as estratégias abordadas na intervenção

sobre o acto em curso pela presença de pessoas e de actividades. A vigilância natural depreende

uma frequência constante de transeuntes, diversificada em relação ao género sexual e à idade, em

espaços exteriores. Quanto ao controlo social constitui-se como o “(…) conjunto de relações sociais

caracterizadas por um (re)conhecimento mútuo mínimo, entre indivíduos que habitam numa certa

proximidade física, e pela utilização não-forçada nem pré-estabelecida, dos mesmos locais,

resultante do exercício da quotidianeidade urbana (…)” (Heitor, 2009).

Em relação à via passiva/artificial, aborda estratégias referentes à manipulação das

condições do uso e da visualização do espaço privado (ex. muros e obstruções) e na utilização de

aparelhos mecânicos de vigilância e controlo (ex. circuitos de vídeo-vigilância e alarmes).

No entanto ressalva-se que as actividades delituosas variam consoante as características

espaciais do espaço urbano, que devido a uma disposição assimétrica de dinâmicas e de pessoas

diverge igualmente a distribuição das práticas delituosas e/ou anti-sociais. As oportunidades para a

ocorrência ilícita advêm tanto de muita (carteiristas) ou pouca (assaltos a veículos) movimentação e

uso do espaço, devido à lógica espacial que caracteriza o acto delinquente.

12

“(…) dentro desta perspectiva, as oportunidades para o crime são consideradas não apenas como janelas

abertas ou portas destrancadas, mas sim como um compromisso entre uma variedade de factores situacionais

favoráveis e desfavoráveis, incluindo os riscos envolvidos, a possível recompensa e a facilidade ou esforço para

cometer a ofença (…)” Tradução livre 13

“(…) quando as casas são consideradas como inadequadas, quase dois terços dos infractores mencionaram

factores de risco desfavoráveis, um quinto reportou factores de recompensa desfavoráveis e menos de 10%

notou dificuldades de acesso (…)” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA 42

O espaço construído assume, assim, uma grande influência na capacidade de gerar

circunstâncias para a constituição espontânea da vigilância natural e no controlo social. As quais

aumentam o risco de detecção para o potencial transgressor e respectivamente, através do seu

carácter dissuasor, diminuem as oportunidades para a ocorrência das práticas delinquentes e/ou

transgressoras.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

43 1. DELINQUÊNCIA E INSEGURANÇA

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

44

2.INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

45

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA 46

2. Influência do Desenho Urbano na Insegurança

A percepção da influência do desenho urbano na insegurança não é um dado recente, sendo

visível nas primeiras cidades construídas, pela colocação de barreiras físicas com o intuito de

protecção e controlo da comunidade de ameaças maioritariamente exteriores, e interiores. Segundo

Mora (2008), estas barreiras de carácter militar ganharam relevância na própria forma das cidades,

onde se destacam os portões, muralhas e paliçadas, ameias, pontes levadiças e torres de vigia.

Estas barreiras perderam influência perante a evolução das estratégias militares, onde a

presença das mesmas nas cidades passou a ser desnecessária, e perante um crescimento da

importância das ameaças vindas do interior da cidade, advindos de comportamentos ilícitos e/ou

agressivos, proporcionalmente inverso às exteriores. Mediante um crescimento das áreas urbanas e

a respectiva diluição dos seus limites, que anteriormente configuravam a cidade tradicional, levou,

segundo Heitor (2007: 33) a “uma alteração na percepção do medo”. Le Goff (cit. in Heitor, 2007:33)

acrescenta que “(…) na cidade tradicional o perigo estava para lá dos seus limites, na cidade

contemporânea este é necessariamente percepcionado a partir do seu interior, já que se trata de um

território alargado e difuso na sua organização”.

Como foi anteriormente mencionado, num esforço de prevenção e controlo de ocorrências de

delitos e comportamentos transgressivos, elaboram-se diversas estratégias, onde as relacionadas

com medidas legislativas e administrativas, foram posteriormente consideradas ineficazes.

Relativamente à década de 60, Heitor (2007) refere o surgimento de diversas reflexões sobre a

desintegração física e degradação vivencial das cidades contemporâneas e das respectivas

condições de revitalização. Perante uma separação, tanto física como social, entre os centros e

periferias, estas reflexões criticam o modelo de desenvolvimento urbano, o qual consideram “(…)

provocar a exclusão social e respectivamente a marginalização, delinquência, violência e

desestruturação dos factores de convivência, a par da perda do sentido do bem comum e de laços

afectivos com o lugar de residência” (Wacquant cit. In Heitor, 2007: 31).

Elizabeth Wood, no seu livro Housing Design: A Social Theory, em 1961, reflecte a

experiência acumulada, pelo seu papel como directora da Chicago Housing Authority (1934-1954) e

pela elaboração de vários projectos de Habitação Social, Integrada e Inclusiva, para Afro-

Americanos, no foco dado à problemática da criminalidade relativamente à vigilância natural através

do desenho urbano. “As she attempted to bring about design changes aimed at enhancing quality of

life for residents and increasing the aesthetic qualities of the residential environment, she also

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

47 2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

developed a series of guidelines for improving security conditions of these environments”14

(Newman

cit. in Robinson, 1999).

No seu livro, destaca a importância para a melhoria da visibilidade dos playground’s,

colocando bancos e casas nas suas proximidades para garantir uma vigilância constante por parte

de adultos, e das entradas dos edifícios, considerando-os como locais de encontro que necessitam

de ser visíveis da rua e bem iluminados. “Wood‟s concept of social control is based on the presence

of and natural surveillance by residents (…) areas out of sight is seen as areas out of control (…) she

realized that spontaneous social control could be eliminated by negligent design”15

(Newman cit. in

Coetzer, 2003: 95).

Ressalta igualmente o valor dado à adolescência de modo a prevenir o vandalismo, pois,

segundo a autora, os jovens, em grupos, sentem mais ou menos necessidade de “hang around” e de

danificar a propriedade alheia se não houver bons espaços recreativos e de lazer, os quais devem

ser dotados de anti-vandalismo.

Através da sua participação na “Chicago Housing Authority”, focou-se em criar “(…) more

fulfilling environments for low-income populations, advocating for recreational facilities, meeting

places of all types, shops, churches and centres to be accommodated within the housing project

grounds” (Newman cit. in Coetzer, 2003:95). A sua visão de uma Habitação Social Integrada e

Inclusiva foi muito criticada, numa altura de segregação racial nos Estados Unidos, e após uma

reacção violenta de residentes brancos, em 1953, contra a colocação de uma família afro-americana

no seu bairro social, provocou a sua saída, assim como a saída da sua equipa no ano seguinte.

No mesmo ano, em que Elizabeth Wood lança o seu livro, Jane Jacobs, concentra as suas

opiniões e teorias sobre o desenvolvimento da Habitação, nos Estados Unidos da América, em The

Death and Life of Great American Cities, no qual tece uma dura crítica aos modelos urbanísticos

seguidos no pós-guerra, relativamente aos efeitos que produzem. A autora ironiza ao afirmar que “To

build city districts that are custom made for easy crime is idiotic. Yet that is what we do”16

(Jacobs,

1961: 31).

O modelo de hierarquização e de separação por usos das cidades é condenado por Jacobs,

na medida em que conduz a uma deterioração e marginalização do espaço urbano, “(…) these

amputated areas typically develop galloping gangrene. To house people in this planned fashion (…)

each sorted-out chunk of price-tagged populace lives in growing suspicion and tension against the

14

“(…) enquanto procurou mudanças projectuais visando melhorar a qualidade de vida dos residentes,

aumentando a qualidade estética do ambiente residencial, também desenvolveu uma série de orientações para

melhorar as condições de segurança desses ambientes (…)” Tradução livre 15

“(…) o conceito de Wood sobre o controlo social é baseado na presença de/e da vigilância natural de

residentes (…) áreas fora da vista são áreas fora de controlo (…) ela apercebeu-se que o controlo social

espontâneo pode ser eliminado por um desenho negligente (…)” Tradução livre 16

“(…) construir bairros de cidade que são feitos para o crime fácil é idiota. No entanto é o que fazemos (…)”

Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA 48

surrounding city (…) Monopolistic shopping centers and monumental cultural centers cloak (…) the

subtraction of commerce and of culture too, from the intimate and casual life of cities”17

(Jacobs,

1961: 4).

Para Jacobs torna-se fundamental que a nova Habitação retorne ao modelo das ruas

tradicionais com diversos usos, em vez de estar rodeada de espaços ajardinados e longe dos

arruamentos, de modo a que a criminalidade fosse dissuadida pela permanente presença de

residentes e passantes, contacto social, que fornecem uma vigilância natural do espaço, que é

referido no livro como eyes on the street. Na estratégia, seguida pela autora, para promoção da

segurança na cidade é de destacar a defesa por uma estrutura urbana suportada por quarteirões de

dimensão reduzida, na qual deve conjugar residentes de diferentes faixas etárias, sociais,

económicas e raciais, na demarcação clara entre espaços públicos e privados e na integração de

espaços exteriores de estada na rede de espaços de circulação (Heitor 2007). A importância do

contacto social é fundamental para uma permanência de actividades nas ruas, pois para Jacobs será

necessário que as pessoas nas ruas estejam atentas ao que se passa no exterior. Reflecte-se a sua

convicção quando afirmar que “The sidewalk must have users on it fairly continuously, both to add to

the number of effective eyes on the street (…) the buildings on the street equipped to handle

strangers and to insure the safety of both residents and strangers, must be oriented to the street (…)

they cannot turn their backs or blank sides on it and leave it blind”18

(Jacobs, 1961: 35)

Jacobs foi posteriormente criticada por misturar o conceito de segurança com a realidade

efectiva de ocorrências delituosas. A vigilância natural pretendida pela autora relaciona-se com a

percepção de insegurança da população, visto que em espaços percebidos como seguros por vezes

não o são, como nas zonas centrais das cidades, tal como acontece na ordem inversa (Heitor, 2007).

A consideração por parte de Jacobs em relação a “quarteirões ou bloco de dimensão reduzida” foi

criticada por Christopher Alexander19

, pois, para este autor, a complexidade do espaço urbano,

propriedades e factores subentendidos das suas formas, não era limitado a uma visão simplista e

limitadora (Heitor, 1997).

No entanto, as teorias de Jacobs tiveram grande repercussão, perante a comunidade dos

arquitectos e urbanistas, para uma mudança de paradigma no modelo de desenvolvimento urbano e

respectiva relação com a criminalidade. Jeffery considera que foi Jacobs quem despoletou o

interesse pelas condições ambientais relacionadas com a prevenção do crime, o que levou ele

próprio a pensar em escrever um livro sobre prevenção do crime (Jeffery cit. in Robinson, 1999).

17

“(...) estas áreas amputadas desenvolvem tipicamente gangrenas galopantes. Para alojar pessoas desta

maneira (…) cada grupo de pessoas classificadas como lixo vive numa crescente desconfiança e tensão contra

a cidade envolvente (…) centros comerciais monopolistas e centros comunitários monumentais mascaram (…) a

subtracção de comercio e cultura da vida íntima e casual das cidades (…)” Tradução livre 18

“(…) os passeios devem ter utilizadores de forma continuada, para adicionar o número de olhos efectivos na

rua (…) os edifícios nas ruas devem estar orientados para a rua de modo a estar equipados para lidar com

estranhos e para assegurar a segurança de ambos os residentes e estranhos (…) eles não podem estar de

costas voltadas ou com os lados cegos para a rua e deixá-la cega (…)” Tradução livre 19

Em Pattern Language (1977), Christopher Alexander desenvolve posteriormente as suas teorias.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

49 2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

No fim da década de 60, Angel apresenta, na sua tese de doutoramento, Discouraging Crime

Through City Planning (1968), um estudo sobre a criminalidade de rua em Oakland, onde relata a

necessidade de um papel activo por parte da população em relação ao crime e diagnostica

ambientes favoráveis à delinquência.

Aponta para a relação entre áreas urbanas com elevadas taxas de criminalidade com as

oportunidades concebidas para os possíveis delinquentes. Perante um balanço entre as variáveis de

risco, esforço e possíveis ganhos decorrentes da prática de um delito, estes influenciam a decisão

final da passagem ao acto por parte do delinquente20

. “The class of crimes identified in this study

contains a strong opportunistic, unplanned element (…) in many of these criminal cases the offenders

are not “full-time” professional criminals, but rather engage in criminal behavior as a victim is spotted

under agreeable circumstances, namely when the criminal act can be easily carried out”21

(Angel,

1968:8).

O autor enumera vários factores dissuasores de criminalidade, como o patrulhamento e

presença da polícia, a qual considera ter uma eficácia limitativa devido à incapacidade das

autoridades estarem sempre presentes, consciencialização da comunidade, onde a actividade

suspeita pode ser identificada pela população e assim alertar as autoridades, número efectivo de

testemunhas, “(…) the more people in the street, the safer it is in relation to street crimes of violence”

22(Angel, 1968:12), e condições de visibilidade geral, “(…) people feel safer and policemen feel

secure when the areas they are passing through are well lit (…)”23

(idem, ibidem:12). Denota-se uma

importante influência em Angel por parte das teorias divulgadas por Jacobs, sete anos antes, na

constituição de condições favoráveis à vigilância natural no espaço urbano, apesar de considerar que

“(…) it is not conceivable that sprinkling these establishments along the streets will improve the city

safety in any significant way (…) the trend toward suburbanization has to be taken into account when

attempting to awser the (…) question (…)”24

(idem, ibidem:2).

As suas propostas defendem, assim, um balanço entre a intensidade do número de

transeuntes numa determinada área e o número de actividades da mesma. Locais com baixa

intensidade de uso reduz a criminalidade, por inexistência de potenciais vítimas, e áreas com

elevada densidade de uso proporcionam um grande número de testemunhas efectivas, os locais

20

Factores que Bennett (1989), em Burglar’s Choise of Tragets, explora posteriormente. 21

“(…) a classe dos crimes identificados neste estudo contêm um forte elemento oportunista, não planeado (…)

em muitos destes casos criminais os infractores não são profissionais a tempo inteiro, mas antes efectuam

comportamentos criminosos quando uma vitima é notada em circunstâncias agradáveis, nomeadamente quando

o acto criminoso pode ser facilmente realizado (…)” Tradução livre 22

“(…) quanto mais pessoas estão na rua, mais segura esta se torna em relação a crimes violentos de rua (…)”

Tradução livre 23

“(…) pessoas sentem-se seguras e os policias sentem-se seguros quando as áreas por onde passam estão

bem iluminadas (…)” Tradução livre 24

“(…) não é concebível que polvilhar estes estabelecimentos ao longo das ruas vá melhorar a segurança

urbana de uma maneira significativa (…) a tendência para uma suburbanização tem que se ter em conta

aquando da tentativa de resposta a esta (…) questão (…)” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA 50

Fig. 2.1 Um corredor comum em Pruitt-Igoe antes da demolição

entre densidade elevada e baixa de usos, com muitas oportunidades e poucas testemunhas, eram

pontos críticos na criminalidade (Newman cit. in Robinson, 1999). O autor explana que quando a

intensidade é muito baixa “(…) there will be virtually no crimes, as not enough potential victims are

present and the likeliness of rewarding opportunity is small (…) as intensity of use increases, enough

potential victims are on the scene (…) but there are not enough people to provide for an adequate

surveillance function (…) this is the critical intensity zone (…) as intensity increases further and the

street or channel section becomes populated, the street becomes safer again”25

(Angel, 1968:17).

Apesar da importância deste trabalho para o estudo das condições espaciais urbanas na

insegurança, apenas referencia os crimes de violência visíveis de zonas públicas em detrimento dos

crimes contra o património, os quais, em áreas residenciais, provêem de oportunidades com uma

fraca intensidade de testemunhas.

Em 1972, Oscar Newman elabora um livro onde desenvolve o conceito de defensible space,

o qual relaciona a influência territorial do espaço urbano na vigilância e controlo por parte da

população de modo a prevenir a criminalidade. Afirma que na observação do empreendimento Pruitt-

Igoe, construído sob o ideal modernista, comparativamente com Carr SquareVillage influenciou o

conceito de espaço defensivo. “(Pruitt-Igoe) followed the planning principles of Le Corbusier (…)

occupied by single-parent, welfare families, the design proved a disaster. Because all the grounds

were common and disassociated from the units, residents could not identify with them (…) across the

street from Pruitt-Igoe was an older, smaller, row-house complex, Carr SquareVillage, occupied by an

identical population. It had remainedfully occupied and trouble-freethroughout the construction,

occupancy, and decline of Pruitt-Igoe. With social variables constant in the two developments, what, I

asked, was the significance of the physical differences that enabled one to survive while the other

was destroyed?”26

(Newman,1996:9 e 10).

25

“(…) não haverá virtualmente crimes , enquanto não existir potenciais vitimas em numero suficiente e a

possibilidade de uma oportunidade recompensadora for baixa (…) quando a intensidade de usos aumenta,

existe vitimas em numero suficiente em cena (…) mas não há pessoas suficientes para prever uma adequada

vigilância (…) esta é uma zona de intensidade crítica (…) à medida que aumenta mais a intensidade e as ruas

ou canais tornam-se preenchidos, a rua torna-se novamente segura (…)” Tradução livre 26

“(…) (Pruitt-Igoe) seguiu os princípios de planeamento de Le Corbusier (…) ocupado por famílias mono-

funcionais, subsidiadas por entidades estatais, o projecto foi um desastre. Porque todas as áreas eram comuns

e dissociadas dos fogos, os moradores não se identificavam com elas (…) no outro lado da rua de Pruitt-Igoe,

existe um Carr Square Village mais velha, pequena e com casas em banda, ocupada por uma população

idêntica. Estava ainda ocupada e livre de problemas na construção, ocupação e declínio de Pruitt-Igoe. Com

variáveis sociais constantes nestes dois empreendimentos, o que eu perguntei, foi o significado das diferenças

físicas que permitiram a um sobreviver, enquanto o outro foi destruído? (…)” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

51 2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

Fig. 2.2 O processo de demolição de Pruitt-Igoe

Fig. 2.3 Carr Square Village

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA 52

O conceito de defensible space estrutura-se em quatro factores: territoriality, natural

surveillance, safe areas (milieu) e image and aesthetics (Newman cit. in Coetzer, 2009). Em relação

à territoriality ou territorialidade, Newman considera necessário o uso de barreiras reais ou simbólicas

para demarcar áreas urbanas identificáveis com os residentes. Destaca, entre outros, as paredes,

cercas e portões como barreiras físicas e, respectivamente, em termos simbólicos, mudanças de

nível e degraus. Considera também importante o controlo e influência por parte dos residentes nos

espaços exteriores e interiores dos edifícios, assim como a localização de áreas comuns externas na

proximidade e/ou na esfera privada dos edifícios rodeantes (Colquhoun, 2004); Para atingir a natural

surveillance ou vigilância natural, o autor supracitado, propõe um posicionamento das janelas e das

entradas principais dos edifícios, para vigiar o espaço público e as ruas, e uma disposição das áreas

comuns dos edifícios e respectivas escadas de incêndio, de modo a serem visíveis da rua; Quanto

ao factor safe areas (milieu), Newman refere para uma justaposição das áreas residenciais com

outras instalações de carácter comercial e social, de forma a melhorar a segurança na zona;

Finalmente em relação à image and aesthetics o autor alude para um uso de materiais e de projectos

de arquitectura de qualidade para evitar a estigmatização e a exclusão por parte dos residentes.

Ressalva também para acabamentos e mobiliário robusto, mas atractivo para os moradores, nos

interiores dos edifícios e mobiliário urbano com características de anti-vandalismo no exterior (idem,

ibidem).

Newman defende uma clara demarcação e uma hierarquia territorial entre espaços públicos e

privados, de modo a não tornar os espaços anónimos e impessoais que levam à pratica de

comportamentos delituosos e/ou transgressivos. Esta preocupação de tornar o espaço humanizavel

e separado por características públicas e privadas foi também seguida por Jacobs. Mas ao contrário

desta última, Newman considera necessário a restrição e inibição do acesso, físico e visual, a

estranhos através da aplicação de barreiras físicas e/ou simbólicas, anteriormente mencionadas

(Heitor, 2009). O factor relacionado com a passagem de pessoas exteriores é abordado de maneira

bastante diferente entre estes dois autores. Enquanto Jacobs menciona áreas urbanas abertas com

Fig. 2.4 Esquema hierárquico espacial de Newman (1973)

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

53 2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

espaços permeáveis, suportados pela vigilância natural advinda tanto de residentes como

transeuntes, promotores do contacto social, Newman defende um traçado urbano baseado em

espaços restritos e controlados por residentes, onde os transeuntes são um eventual perigo (Heitor,

2009).

Como arquitecto, o trabalho de Newman obteve grande repercussão na concepção de

espaços e edifícios em bairros residenciais, onde, em apenas dois anos após o lançamento do livro,

vários institutos estatais, dos Estados Unidos da América, fomentaram o desenvolvimento do estudo

da relação entre espaço urbano e criminalidade. “Newman's ideas may still be greatly influencing the

design of public housing all over the world (…)”27

(Clarke cit. in Robinson, 1999).

Em Utopia on Trial: Vision and Reality in Planned Housing (1985), Alice Coleman, reflecte o

estudo de mais de 4000 blocos de apartamentos e pequenos edifícios residenciais, onde descreve a

existência de características projectuais que criam problemas, “(…) litter, graffiti, vandalism (…)

burglary, theft, arson, criminal damage, vehicle crime, violence and sexual assaults (…)”28

(Colquhoun

2004: 45), aos utilizadores. As características, anteriormente mencionadas, agrupam-se em quatro

grupos: dimensão, circulação, variáveis relacionadas com a entrada e disposição territorial.

Em relação à dimensão, Coleman considera que fogos por edifício e por cada entrada devem

ter um limite, respectivamente de 12 e 6, visto que quanto mais residentes partilham o edifício mais

anónimo se torna o ambiente. A autora considera que o número máximo de andares deveria ser de

apenas três. Considera ser necessário a escolha de apartamentos em detrimento de vivendas, visto

que as estas últimas são melhores para grandes famílias.

Quanto à circulação, referencia que quanto mais fácil for a movimentação dentro e entre os

edifícios, aumenta a possibilidade de possíveis criminosos de encontrarem oportunidades para os

delitos. Destaca as passagens aéreas entre o edificado, saídas, elevadores e escadarias

interconectadas e longos corredores como facilitadores para a ocorrência de comportamentos

delituosos e/ou transgressivos.

Nas variáveis relacionadas com a entrada dos edifícios, destaca que estas, visto serem um

ponto de acesso fulcral, devem ser favoráveis aos residentes e dissuasoras para intrusos. A autora

supracitada considera importante o tipo e a posição da entrada, assim como portas e aberturas, para

prevenir a criminalidade. “(…) communal entrance to serve only the upper floors, and for each

ground-floor flat to have a separate individual entrance fronted by its own wall and gated front garden

(…) front private gardens act as a buffer zone to would-be criminals (…) waist-high walls facilitate

27

“(…) as ideias de Newman ainda influenciam o desenho das habitações sociais por todo o mundo (…)”

Tradução livre 28

“(…) lixo, grafitti, vandalismo (…) roubo, furto, fogo posto, dano criminoso, criminalidade automóvel, violência

e violação (…)” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA 54

residents‟ surveillance of the road in front of the blocks and the persons entering, which deters

criminal activity and reduces the fear of crime”29

(Colquhoun 2004: 46).

Em relação à disposição territorial, Coleman atenta para a territorialidade dos edifícios de

habitação em relação ao espaço circundante, onde defende uma disposição em torno da rua, de

modo a controlar a entrada principal e para barreiras físicas dissuasoras no lado tardoz dos edifícios.

Denota-se uma grande influência das teorias de Newman nas propostas de Alice Coleman na

territorialidade do espaço, através das restrições aos acessos das habitações, na implantação de

barreiras físicas e de jardins frontais e tardozes à volta do edificado.

Segundo Heitor (1997), o trabalho de Coleman foi duramente criticado pela ideia que o

desenho urbano determinava, em vez de influenciar, o comportamento humano, pelo pragmatismo e

rigidez das suas propostas, assim como pelo tom crítico dirigido à classe profissional dos arquitectos

e urbanistas. No entanto, a importância do trabalho de Coleman foi reconhecida pela primeira-

ministra do Reino Unido da altura, Margaret Tacher, que possibilitou a formação do DICE (The

Design Improvement Controlled Experiment), no início dos anos 90, para a intervenção de diversos

bairros com problemas sociais. O resultado final deste projecto é inconclusivo. “(…) at the Mozart

Estate (Westminster), following the removal of the overhead walkways, the injection of new roads to

make the estate more accessible and permeable, and other design changes, residents were divided

over whether the change had been worthwhile (…) the changes had not brought about reductions in

burglaries (…)”30

(Colquhoun 2004: 48). “(…) at Bennett Street, residents felt much safer (and still do)

29

“(…) entradas comuns que sirvam apenas os andares superiores, e cada piso térreo deve ter uma entrada

individual separada com uma frente murada e jardim (…) jardins privados frontais actuam como zona dissuasora

de possíveis criminosos (…) muros ao nível da cintura facilitam a vigilância dos residentes para a rua em frente

e entrada de pessoas, o que impede a actividade criminosa e reduz o medo do crime (…)” Tradução livre 30

“(…) no empreendimento de Mozart (Westminster), após a remoção das passagens aéreas e injecção de

novas ruas para tornar o espaço mais acessível e permeável, além de outras mudanças projectuais, os residentes ficaram divididos acerca do aproveitamento das mudanças (…) as mudanças não trouxeram reduções nos roubos (…)” Tradução livre

Fig. 2.5 Esquemas habitacionais de Alice Coleman (1985)

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

55 2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

after the changes (...) however, the scheme failed to achieve sufficient quality of improvement in

overall terms to ensure the estate‟s long-term sustainability as suggested by the many boarded-up

flats”31

(idem, ibidem: 48).

Soczka (1984) reflecte sobre diversas teorias psico-ambientais que originam o

comportamento agressivo em áreas urbanas. Refere que “(…) vários estudos levam a crer que o

sentimento de perda de identidade e o anonimato percebido levam a reacções emocionais negativas

na situação de adensamento populacional, constituindo assim um importante factor de stress e um

precipitador das respostas agressivas (…)” (Bell cit. in Soczka, 1984: 7).

Adoptando uma leitura semelhante à de Newman, relaciona a espaciação percepcionada e a

dimensão óptima da comunidade com as características espaciais urbanas. Destaca como

elementos importantes, para garantir a insegurança, a fácil orientação e localização do espaço, o

controlo visual e restrição de acessibilidades, “(…) espaços rectangulares apenas abertos

unilateralmente, ou abertos multilateralmente, mas sobrelevados (…)” e o “(…) encerramento

espacial bilateral, conjugado com a possibilidade de observações fáceis dentro de um espaço

geométrico muito regular, estruturado por eixos perpendiculares entre si (…)” (Baptista Coelho,

2011).

Um ano antes do lançamento do livro de Newman, o criminologista Ray Jeffery elabora o

termo CPTED (Crime Prevention Through Environmental Design), no seu livro de mesmo nome

(1971), onde considera que a actividade criminal provém das oportunidades presenteadas pelo

ambiente físico, e assim, ao proceder a uma mudança nesse ambiente, a probabilidade da

ocorrência de delitos diminui. Fernandes (2011) acrescenta: “Este conceito representou um grande

avanço na teoria criminológica e lançou as bases para uma perspectiva única a aplicar ao estudo do

crime, a perspectiva de “sistemas integrados (…)”.

No seu livro Jeffery reflecte a experiência advinda de projectos reabilitativos de escolas em

Washington, onde enfatiza o uso do espaço físico para controlar o comportamento humano, e assim

a criminalidade. Critica a opção de mediadas legislativas e administrativas relacionadas com o

policiamento para lidar com a criminalidade. “Deterrence and punishment are failures; treatment and

rehabilitation are failures; the criminal justice system is a failure from police to courts to corrections

(…) nothing that we do today in the criminal justice system is a success. The public is not protected;

the criminal is not protected. Police are totally ineffective except within a crime prevention framework.

Courts are totally ineffective to handle the crime problem. Prisons brutalize and make hardened

31

“(…) Na rua Bennett, os moradores sentiram-se muito mais seguros (e ainda o sentem) depois das mudanças

(…) embora o modelo projectual tenha falhado em alcançar uma qualidade no melhoramento em geral para

assegurar que a sustentabilidade a longo prazo do empreendimento como foi sugestionada por muitos

habitantes (…)” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA 56

criminals out of those unfortunate to be put into them. The only way to handle the crime problem is to

prevent it (…)”32

(Jeffery, 1977:9, cit. in Robinson, 1999).

No fim da década de 70, reedita o livro com o mesmo nome (1977), onde estabelece

estratégias para a redução da criminalidade através do desenho urbano e da participação da

comunidade (Heitor, 2007). Adopta em relação ao primeiro um reforço na vigilância natural e/ou

passiva e no envolvimento da população na gerência e conservação dos espaços públicos. É

possível obter um paralelismo das suas opções estratégicas em relação às de Jacobs, no sentido de

fomentar a convivência urbana, destacando o investimento em espaços públicos e a respectiva

participação da população, presença continuada de transeuntes e na diversidade de usos nas ruas.

Observa-se igualmente semelhança às opções de Newman, na defesa do controlo social como

objectivo de aumentar o risco para o possível delinquente, apesar de sustentado com boa visibilidade

em vez da opção de barreiras visuais ou físicas (Heitor 2007). Ao contrário de Newman, as

estratégias do CPTED abordam além do espaço residencial e procuram mudanças não só no

ambiente físico, mas também social.

Actualmente o CPTED constitui-se como um movimento internacional, onde disponibiliza um

conjunto de estratégias de apoio à concepção do espaço urbano, o qual foi alimentado e influenciou

diversos autores posteriores a Jeffery, como Clarke e Mayhew (1980) no Situational Crime

Prevention, Poyner (1983), Crowe (1991), e Pascoe (1992).

Durante a década de 70, o governo do Reino Unido, apoia diversos estudos sobre a

prevenção da delinquência, onde, neste contexto, Clarke e Mayhew formulam o conceito de SCP

(Situational Crime Prevention), presente no livro Designing out Crime (1980), focando a diminuição

da criminalidade através da restrição das oportunidades para a ocorrência da criminalidade, através

das condições espaciais, em vez das características dos possíveis delinquentes. Propõem diversas

estratégias preventivas relacionadas com o “reforço” e/ou remoção de possíveis alvos, como

materiais mais robustos ou evitar situações de perigo, reduzir situações de facilidade e de

recompensa para o delito, aumento da vigilância passiva e por transeuntes e mudança através da

gestão do ambiente urbano, como “(…) housing measures such as avoiding housing a high

percentage of young people in a complex (…)”33

(Colquhoun 2004: 54).

Analisam padrões na actividade criminal, advindos de escolhas racionais pelo delinquente,

concluindo existir concentrações de oportunidades para os delitos, considerados hot spots. As

propostas de controlo social, vigilância passiva e/ou natural, a qual constituída igualmente por

32

“(…) Dissuasão e punição são falhanços; tratamento e reabilitação são falhanços; o sistema de justiça

criminal é um falhanço desde a polícia aos tribunais para correcções (…) nada do que se faz hoje em dia na

justiça criminal é um sucesso. O público não está protegido; o criminoso não está protegido. A Policia é

completamente ineficaz excepto dentro de uma prevenção da criminalidade enquadrada. Tribunais são

totalmente ineficazes para lidar com o problema do crime. As prisões brutalizam e endurecem em criminosos, os

infelizes que são lá colocados. O único caminho para lidar com o crime é preveni-lo (…)” Tradução livre 33

“(…) medidas na habitação como evitar uma elevada percentagem de jovens no complexo habitacional (…)”

Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

57 2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

transeuntes, e a noção clara da redução de oportunidades, para actividades delituosas, advindas das

condições espaciais, encontram-se dentro das teorias defendidas pelo CPTED.

Crowe (1991) em Crime Prevention Through Environmental Design - Applications of

Architectural Design and Space Management Concepts, aprofunda certos temas onde o CPTED

original de Jeffery é alvo de críticas. Destaca-se a ausência de um pensamento em conjunto de

“actores” que deveriam participar no processo de concepção e manutenção do espaço, a importância

dada ao espaço físico e à concepção arquitectónica e urbana em detrimento do factor social,

subvalorizando o agressor e vítima (Fernandes, 2011). Assim, Crowe, procura uma maior

incorporação da dimensão social, “(…) de forma a assegurar que o espaço se torne defensible pelos

seus residentes, e por outro a preocupar-se com a criação de actividades sociais positivas e

diversificadas para encorajar os residentes a apropriarem-se do espaço e a retirar proveito da

vigilância natural” (Cozens cit. in Fernandes, 2011).

Crowe baseia-se na ideia que uma concepção e utilização adequada, de um espaço, de

forma a responder às necessidades físicas, sociais e psicológicas dos utilizadores, reduzem a

possibilidade de ocorrência criminal. Segundo Fernandes (2011), as teorias de Crowe estão

imbuídas do pensamento de Newman, onde os factores estruturantes da aplicabilidade do CPTED

são: a territorialidade, vigilância natural, manutenção do espaço novo ou recuperado e o controlo

natural dos acessos, de modo a criar áreas seguras.

Saville e Cleveland (1998) referenciam o nome 2nd Generation CPTED, como a renovação

necessária das teorias de Jeffery de modo a adequar às necessidades e alterações do meio humano

na entrada para o séc. XXI. Consideram que os valores de uma comunidade segura não advêm de

estruturas de tijolo e argamassa, mas sim nas “(…) structures of family, of thought and, most

importantly of behavior (…) We may benefit from starting with an examination of the physical aspects

of place, but we must end up looking at the social aspects of home and neighborhood – the affective

environment (…)”34

(Saville e Cleveland, 1998: 1 e 2). Apelam para um maior interesse do CPTED

nas temáticas relacionadas com a sustentabilidade, saúde e empowerment e socialização das

comunidades.

Gronlund (2000), na Dinamarca, contribui para a pesquisa do CPTED, relacionando-o com a

Open Society, na qual questiona até que ponto a sociedade aceita a criminalidade, em contraponto

com barreiras físicas e medidas de protecção, com o intuito de uma melhor qualidade de vida. “(…)

what level of risk is acceptable as the starting point of this? (…)”35

(Gronlund cit. in Colquhoun, 2004).

Este autor salienta diversas questões, as quais considera necessárias serem reflectidas: a relação do

CPTED com o medo do crime real ou aparente; a falta de interesse por parte de governos,

34

“(…) estruturas de família, de pensamento e , mais importante, de comportamento (…) Podemos tirar proveito

de começar com um exame aos aspectos físicos do espaço, mas devemos olhar para os aspectos sociais da

casa e do bairro – o ambiente afectivo (…)” Tradução livre 35

“(…) que nível de risco é aceitável como ponto de partida ? (…)” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA 58

arquitectos e empreendedores; o conflito de interesses por parte das empresas de segurança e

respectivamente de possíveis empreendimentos com desígnio CPTED de modo a lucrar com a

insegurança; e as diferenças sociais entre diversos locais e a sua influência no CPTED.

Destaca um projecto de habitação social, Sibeliusparken, construído em 1994 nas

proximidades de Copenhaga, onde, perante um contexto urbano industrial precário, tem em conta a

preocupação pela segurança e protecção através da concepção projectual. Esta área depara-se com

diversos problemas de índole social, como elevado desemprego, poucos rendimentos e famílias

mono-funcionais. “This demographic and social composition would normally present problems, but

this does not appear to be the case here”36

(Colquhoun, 2004: 59). Neste bairro observa-se uma clara

demarcação entre espaços públicos, semi-públicos e privados, a disposição dos edifícios em torno

das ruas e praças, a importância dada à visibilidade para a rua, nas entradas das habitações e

escadarias comuns, e na concepção pormenorizada de mobiliário urbano e de barreiras simbólicas

de modo a exercer a territorialidade. Após a sua construção verificou-se uma efectiva redução de

criminalidade, “(…) crime in the scheme is very low, around 50 per cent of the rate experienced in

other areas (…) car theft is extraordinarily low and burglaries about one-fifth of the normal (…)

investigation confirmed that well arranged external spaces and a good overview close to entrances

and gardens prevents burglaries and vandalism to a very high extent (…)”37

(idem, ibidem: 60 e 61).

36

“(…) a composição social e demográfica pode normalmente causar problemas, mas não parece ser o caso

aqui (…)” Tradução livre 37

“(…) crime no empreendimento é muito baixo, cerca de 50% da taxa experienciada noutras áreas (…) roubo

de carros é extraordinariamente baixo e roubos a acerca de um quinto do normal (…) investigação confirmou

que espaços exteriores bem arranjados e com boa visibilidade para as entradas e jardins, previne roubos e

vandalismo de forma elevada (…)” Tradução livre

Fig. 2.6 Planta de Sebiliusparken

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

59 2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

Em 1977, Christopher Alexander publica o livro A Pattern Language : Towns, Buildings

Construction, onde reflecte sobre a diversidade de padrões que constituem a linguagem

arquitectónica e urbana. O autor sublinha para a necessidade de os utilizadores projectarem as suas

próprias habitações, ruas e comunidades, o que implicaria uma transformação radical na profissão da

arquitectura, “(…) it comes simply from the observation that most of the wonderful places of the world

were not made by architects but by the people (…)”38

(Alexander cit. in Colquhoun, 2004: 64).

O autor compara uma linguagem, onde as palavras para se conectarem entre si necessitam

de relações gramáticas e semânticas, com as opções projectuais. Estas denotam problemas e

soluções que tendem a repetir-se, apesar dos respectivos problemas e soluções que podem variar

tanto ao nível geral como específico, constituindo padrões de uma mais vasta linguagem

arquitectónica. A pattern language conta com princípios chave em relação ao tamanho da

comunidade, do bairro e do agrupamento de casas, para não ficarem sobredimensionados, à altura

dos edifícios, onde Alexander considera importante o contacto com chão de modo a fomentar as

relações sociais, a uma maior diversidade geracional e sentimento de comunidade no bairro, à

implantação de jardins privados e de terraços, de forma a promover hábitos sustentáveis e

saudáveis, e a necessidade de qualificação de equipamentos sociais e urbanos e de espaços

públicos para difundir a socialização dentro da comunidade (Colquhoun, 2004).

Bill Hillier e Julienne Hanson (1984) criticam as propostas de Newman e Coleman em relação

à standardização e rigidez da concepção de espaços mono-funcionais, onde provoca uma sub-

utilização, excesso de controlo e nega a complexidade do espaço urbano (Heitor 1997). Defendem

que a presença de transeuntes e relações entre indivíduos espontâneas e naturais, sendo estes

residentes ou estranhos, na partilha de um espaço, asseguram a vigilância natural, uma perspectiva

38

“(…) vem com a simples observação de que a maioria dos lugares mais maravilhosos do mundo não foram

feitos por arquitectos, mas sim pelas pessoas (…)” Tradução livre

Fig. 2.7 Detalhes dos muretes e entradas Fig. 2.8 Entrada tipo das habitações

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA 60

próxima das teorias de Jacobs. Esta é, assim, estabelecida pelo sentimento de comunidade de todos

os indivíduos num determinado espaço que constituem, designadamente, a comunidade virtual. Para

a formação desta comunidade, Hillier descreve a necessidade de um conjunto de factores presentes

na natureza morfológica do espaço: a capacidade de o espaço ser acessível, estar integrado nos

espaços de domínio público, ser permeável, conectando-se directamente com outros espaços, ser

visível, poder ser percepcionado a partir de outros espaços envolventes e facilitar a leitura da

movimentação dos transeuntes, ser legível e previsível, de forma a permitir uma correcta orientação

por parte dos utilizadores, e de gerar actividades (Heitor 1997).

Através da Space Syntax, ou teoria da Sintaxe Espacial, Hillier, analisa o comportamento

humano e as condições espaciais, onde este ocorre. Estas condições, para o autor, estão

relacionadas, não com as características visuais, mas sim com sequencialidade do uso dos espaços.

Através de um modelo descritivo, baseado em representações gráficas, retrata e interpreta como o

espaço é usufruído nas relações de acessibilidade física e visual. As representações são designadas

como mapas axiais, correspondendo à continuidade física e visual pelos utilizadores, que quantificam

“(…) as relações em que a informação é retirada directamente da representação e aquelas em que é

necessário introduzir informação adicional, como é o caso dos padrões de actividade pedonal (…)”

(Heitor, 2007: 41). Para quantificar as relações espaciais, conectividades e distâncias, utiliza-se o

grafo axial, onde “(…) os vértices ou nós correspondem às linhas, sendo que dois vértices são

adjacentes se e só se as linhas correspondentes se intersectam (…) o grafo axial contém, assim,

informação acerca das conexões de cada linha com todas as outras que constituem o sistema (…)”

(idem, ibidem: 41).

Fig. 2.9 Planta de Barnsbury na área norte de Londres Fig. 2.10 Mapa Axial de Barnsbury

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

61 2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA

Assim, através destes processos, pode-se proceder a uma análise dos padrões de

criminalidade e da utilização e acessibilidades do espaço, que consecutivamente influenciam a

vigilância natural. Permitindo examinar a existência de espaços menos conectados e isolados,

vulneráveis à degradação e delinquência. As interpretações realizadas por estes estudos permitem a

constituição de um instrumento valioso para as estratégias projectuais. No entanto ressalva-se que

as actividades delituosas variam consoante as características espaciais, nas quais as oportunidades

para a ocorrência ilícita advêm tanto de muita ou pouca movimentação e uso do espaço.

Em A Vulnerabilidade do Espaço em Chelas, Heitor (1997) aborda estratégias semelhantes a

Hillier em relação à vulnerabilidade do espaço à ocorrência de actos delinquentes, o qual a vigilância

natural e o controlo social constituem factores dissuasores. Defende a existência de três variáveis,

pelas quais influenciam a vulnerabilidade: acessibilidade, visibilidade e comunicabilidade.

Em relação à acessibilidade do espaço, referencia a capacidade de circulação no seu interior

e para o exterior, a qual condiciona a utilização na “(…) distribuição e caracterização da actividade

pedonal e, em particular, no que se refere à orientação das deslocações, à selecção de percursos e

locais de permanência, à polarização ou dispersão de actividade de convívio e de encontro, à

composição dos grupos de útil-izadores e ao tipo de actividades realizadas (…)” (Heitor, 1997:14).

Quanto à visibilidade corresponde ao estabelecimento de relações visuais entre espaços, as

quais podem não ser simétricas, visto que um espaço tem alcance visual para outro que não possui a

mesma relação reciproca. Este factor afecta a utilização do espaço, devido ao condicionamento da

vigilância natural, a qual influencia a escolha do lugar e a composição, comportamento e actividades

dos seus utilizadores.

A comunicação do exterior à massa edificada, tanto a sua frequência, a quantidade e

concentração de possíveis acessos e a separação entre espaços públicos e privados, constitui a

variável comunicabilidade. Esta influi na atractividade do espaço para a ocorrência de actividades, na

composição e escolhas, de percursos e de espaços, dos utilizadores e na vigilância do próprio

espaço.

Baptista Coelho publica na Infohabitar, em 2011, a sua opinião em relação à influência do

espaço na insegurança vivenciada nas áreas urbanas. Defende limitações na altura dos edifícios e

na densidade e composição populacional, na qual critica o excesso de concentração de pessoa

socialmente desfavorecidas, e apela ao bom senso na definição, controlo visual e visibilidade

espacial. O autor encara a segurança como um sentimento de bem-estar, onde pode ser

comprometido pelo excesso de controlo e intrusão na liberdade do usufruto do espaço. Baptista

Coelho considera que as estratégias ligadas ao desenho urbano devem ter em atenção à

continuidade urbana, através da sequencialidade de ruas e actividades, legibilidade e visibilidade

espacial, ao cuidado do desenho projectual, de modo a não ocorrer “(…) situações em que o espaço

se escapa pelas esquinas, e entre blocos com grande empenas cegas (…)”(Baptista Coelho, 2011),

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

2. INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA 62

manutenção participativa, para “(…) desenvolver (…) estima dos habitantes relativamente aos seus

espaços de habitar (…) para a sua mais efectiva auto-protecção (…)”(idem, 2011), e previsão do

cenário nocturno.

Denota-se uma aproximação às teorias de Hillier e de Jacobs quando defende um espaço

público disponível, apelativo à convivência urbana e sem barreiras físicas, “(…) permitindo-nos

utilizá-lo com uma estimulante fluidez de usos e uma ampla, inesperada e estimulante diversidade de

utentes (…)” (Baptista Coelho, 2011) e na clara definição, acessibilidade e vigilância natural dos

espaços, de modo a que sejam “(…) definidos, circunscritos, com acessibilidades bem estruturadas

e naturalmente controladas (…) e caracterizados por condições de acessibilidade urbana global,

evitando-se, ao máximo, espaços fora do fluxo urbano e pouco visíveis (…) tendencialmente sítios de

maus usos e de delinquência”(idem, ibidem).

Destaca a importância dos residentes mais vulneráveis, crianças e idosos, que apesar desta

condição são os que mais usufruem e dinamizam o espaço publico diariamente.

Considerações Finais

Perante as diversas abordagens sobre a insegurança urbana, observa-se concordância que

a organização e a disposição das características do espaço influenciam a vigilância natural, a qual

necessita de agentes activos. Divergem em relação às propostas e conceptualização da organização

espacial e à composição dos vigilantes activos. Onde se destaca Jacobs e Hillier e a importância

dada a tanto residentes e transeuntes para garantir a vigilância natural, e o modelo urbano

permeável, acessível e gerador de actividades. Enquanto Newman e os seus seguidores apoiam

uma organização restrita e hierarquizada do espaço, considerando indivíduos exteriores uma

eventual fonte de perigo. Estas duas estratégias não podem ser consideradas antagonistas mas sim

complementares, pois consoante as características espaciais do espaço urbano diverge a

distribuição tanto de pessoas como o tipo de oportunidades, para a ocorrência de delitos. Perante

este facto, uma estratégia conceptual de permeabilidade e de abertura a transeuntes num contexto

urbano onde a presença de passantes é considerada incomum, legitima a insegurança, assim como

o caso inverso.

A mudança da lógica espacial nas actividades delinquentes e/ou anti-sociais sugerem

estratégias projectuais urbanas consoante o espaço e o contexto em causa. No entanto, como

Baptista Coelho e Gronlund afirmam, compete fazer um balanço entre ganhos e perdas advindas de

um traçado urbano e arquitectónico preocupado com a questão da insegurança nas questões de

bem-estar e vivência da comunidade, pois existe uma grande diferença entre espaço urbano

securitário e seguro, “(…) uma das condições para um habitar humanizado (…)”(Baptista Coelho,

2011).

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

63

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

64

3.PROJECTO

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

65

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 66

3.1 Análise

A área de intervenção da proposta localiza-se no bairro, de génese ilegal, do Alto da Cova da

Moura, geralmente designado por Cova da Moura, na área metropolitana de Lisboa. Este bairro foi

alvo de vários episódios mediáticos relacionados com a insegurança, assim como no questionamento

do lugar dos bairros de génese ilegal nas cidades. Perante várias estratégias propostas, desde a

demolição à inclusão urbana do bairro, a Iniciativa Bairros Críticos, da responsabilidade do IRHU,

visa quebrar o impasse com a qualificação e reinserção urbana do bairro assim como a elaboração

de um plano de pormenor. O sucesso de uma proposta e/ou estratégia no bairro da Cova da Moura

depende da compreensão da realidade e a complexidade social, cultural, étnica e da identidade e

história desta comunidade.

BAIRRO DA COVA DA

MOURA

AMADORA

OEIRAS

LISBOA

N

Fig. 3.1 Localização do Bairro da Cova da Moura na região de Lisboa

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

67 3. PROJECTO

Localização

Dividido entre as freguesias da Damaia e Buraca, na zona oriental do concelho da Amadora,

o bairro da Cova da Moura localiza-se nas imediações da freguesia de Benfica, em Lisboa. Com uma

área aproximada de 16,5 ha., o bairro da Cova da Moura desenvolve-se sobre uma colina de declive

acentuado. Tal facto leva ao destaque visual da Cova da Moura, do resto da paisagem urbana

circundante. Tanto o bairro como as áreas urbanas envolventes têm em comum o isolamento face ao

tecido urbano envolvente. Destaca-se os condicionalismos decorrentes das barreiras físicas impostas

pelas infra-estruturas de mobilidade de escala distrital e às descontinuidades, tanto da malha urbana

como da topográfica. Tanto a Norte, Este e Sul o bairro é delimitado por estruturas rodoviárias, IC 19

e a Avenida da República composta por quatro vias, o eixo ferroviário, linha de Sintra, e o

equipamento da Santa Casa da Misericórdia. Ressalva-se igualmente a Oeste a presença das

vedações da escola D.João V e do conjunto de edifícios, com cerca de quatro e cinco pisos, de

carácter residencial privado que contribui para a segregação do bairro.

DAMAIA

BURACA

ALFRAGIDE

ALTO DA DAMAIA VENDA NOVA

BENFICA REBOLEIRA

Fig. 3.2 Localização do Bairro da Cova da Moura e dos bairros envolventes

N

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 68

Desenvolvimento Urbano

A região metropolitana de Lisboa registou, desde a década de 50, um crescimento

demográfico devido a diversas afluências migratórias. Destaca-se o fenómeno do êxodo rural, o

regresso dos retornados das antigas províncias ultramarinas, nos anos de 1975-76, e a imigração

proveniente dos PALOP‟s. O concelho da Amadora dotado de proximidade à capital, facilidade de

acesso através da linha ferroviária de Sintra e com uma presença significativa de territórios em

processo de expectância devido ao abandono da actividade agrícola e à não existência de

instrumentos de planeamento eficazes, que apoiassem a sua transformação em terrenos urbanos,

por via legal, tornou-se uma área preferencial para receber os movimentos migratórios, em particular

os de menores recursos económicos. Como consequência, verificou-se uma procura de terrenos

livres por auto-construção. Assim, a paisagem urbana, da periferia de Lisboa, verificou uma

generalização de bairros de génese ilegal, entre os quais se destaca a Cova da Moura.

Originalmente, na área do bairro da Cova da Moura, situava-se a exploração agrícola da

Quinta do Outeiro dedicada ao cultivo de trigo, onde se destacavam algumas construções de

carácter habitacional, uma vacaria a sul e uma pedreira, na altura desactivada, na extremidade norte.

Após o abandono da quinta, no final da década de 50, verificou-se o uso do terreno para pequenas

hortas, associado a uma agricultura de subsistência, por residentes de bairros vizinhos e pela

população, proveniente da migração de áreas rurais, que consecutivamente ocupavam as áreas

junto à antiga pedreira.

Posteriormente ao 25 de Abril, de 1974, assiste-se nos anos seguintes ao regresso dos

retornados, o consecutivo aumento populacional do bairro da Cova da Moura. As zonas próximas

das principais acessibilidades acolhem a preferência dos novos moradores e constituem em 1978

uma Comissão de Moradores para definir um plano de ruas e de áreas a construir. Este plano foi

seguido e consentido pelas Câmaras municipais de Oeiras, e mais tarde pela da Amadora, onde se

procedeu à instalação de infra-estruturas básicas como a rede de esgotos, água e de iluminação

pública.

No fim da segunda metade da década de 1970 e início da década de 1980, regista-se um

movimento migratório oriundo dos PALOP‟s, maioritariamente de Cabo Verde, e ao respectivo

aumento populacional de grande expressão no bairro, originando uma densificação intensa e algo

desordenada. Desde então, após ocupação de terrenos livres, assinala-se um crescimento gradual

em altura das construções tendo em vista uma resposta à procura de habitação, a qual indica uma

evolução constante. Aires Mateus (cit. in Sardo, 2010: 141) constata que “A Cova da Moura é um

lugar, muito ao contrário daquelas não-identidades que estão em torno (…) Não é como a Cova da

Moura que é um organismo que poderá deixar-se crescer e continuar.”

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

69 3. PROJECTO

O bairro da Cova da Moura, (LNEC 2008) conta actualmente com cerca de 5.000 habitantes

resultantes de um desenvolvimento urbano com diversas culturas, o qual resulta numa rede

complexa e viva que constitui a realidade social específica desta comunidade. “É um bairro que

possui uma história que se cruza indissociavelmente com a história recente de Portugal, com a

descolonização e com os movimentos migratórios dos Países Africanos” (Sardo, 2010: 35 e 36).

Caracterização Socio-Demográfica

A população do bairro da Cova da Moura é maioritariamente composta por portugueses,

provenientes de ex-províncias ultramarinas e áreas rurais, e por imigrantes de origem africana, com

claro destaque para Cabo Verde (cerca de 30% da população) mas também Angola, Moçambique,

Guiné-Bissau e S. Tomé e Príncipe. Ressalva-se em número reduzido a existência de Brasileiros e

de trabalhadores da Europa de Leste, os quais geralmente apenas residem temporariamente.

Segundo o estudo da Iniciativa Bairros Críticos (2006) evidencia a existência de 40% da população

ser de nacionalidade portuguesa, ressalvando-se a expansão da segunda geração de descendentes

de imigrantes. O mesmo estudo retrata o bairro como jovem, denotando, em questões demográficas,

22% de menores de 14 anos (a média do concelho da Amadora é de 15%) e 45% de menores de 24,

Década 50 Década 60 Década 70

Actualmente Década 90 Década 80

Fig. 3.3 Desenvolvimento urbano do Bairro da Cova da Moura

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 70

destacando-se igualmente o valor de 7% da população com mais de 64 anos e os valores restantes

para a população activa (24-64 anos).

As habilitações literárias da população são, maioritariamente baixas, não excedendo o 3º

ciclo do Ensino Básico. Verifica-se uma taxa de 10% de analfabetismo e um elevado nível de

abandono e insucesso escolar. Estes factos advêm de um desinteresse pela progressão escolar, que

parte dos progenitores para os filhos, e das dificuldades económicas que levam à procura precoce do

mercado de trabalho, normalmente no sector da construção civil para os homens e no sector

comercial e serviços domésticos para as mulheres.

Tabela 3.1 Estrutura Etária do Concelho da Amadora, Buraca, Damaia e Cova da Moura

Tabela 2.2 Naturalidade da população da Cova da Moura Tabela 3.3 Nível de Instrução da população da Cova da Moura 1- Não sabe Ler e Escrever

2- Sabe Ler e Escrever sem possuir Grau de Ensino

3- Ensino Básico de 1º Ciclo

4- Ensino Básico de 2º Ciclo

5- Ensino Secundário

6- Ensino Médio

7- Ensino Superior

8- Curso Técnico Profissional

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

71 3. PROJECTO

Em relação ao insucesso escolar presente na Escola EB1/J1 da Cova da Moura, observa-se

valores elevados comparativamente com as restantes escolas primárias do concelho da Amadora.

Segundo a Iniciativa Bairros Críticos (2006) regista 12,5 % de taxa de retenção escolar, segundo

maior valor em relação às escolas do concelho, e um valor de 1,6% para a taxa de abandono

escolar, uma das taxas mais elevadas (Anexo II).

Estabelecimento de Educação e

Ensino

Retenção Escolar

(2004/2006) Total Alunos

Taxa de Retenção

Escolar (%)

EB1/JI Alfragide 3 174 1,7

EB1/JI Quinta Grande 2 251 0,8

EB1/JI Alto do Moinho 28 166 16,9

EB1/JI Orlando Gonçalves 9 187 4,8

EB1/JI Casal da Mira 32 273 11,7

EB1/JI Moinhos da Funcheira 17 230 7,4

EB1/JI Terra dos Arcos 6 315 1,9

EB1/JI Vasco Martins Rebolo 16 207 7,7

EB1/JI José Ruy 44 302 14,6

Sede-EB1/JI Alice Vieira 36 469 7,7

EB1/JI Cova da Moura 32 255 12,5

EB1/JI Águas Livres 14 170 8,2

EB1/JI Condes da Lousã 19 177 10,7

EB1/JI Manuel Heleno 6 138 4,3

EB1/JI Raquel Gameiro 5 175 2,9

Tabela 3.4 Análise Comparativa da retenção nas escolas EB1/J1 no concelho da Amadora

Denota-se diversos problemas sociais relacionados com a saúde, como a tuberculose

pulmonar, devido a questões de salubridade e higieno-sanitárias, alcoolismo, Hepatite B e C e o vírus

HIV/SIDA. Os dois últimos advêm do tráfico e consumo de drogas por parte de toxicodependentes.

Verifica-se, segundo o estudo da Iniciativa Bairros Críticos (2006: 27), um “(…) forte

sentimento de proximidade, quase familiar, nos diversos quarteirões que compõem o bairro, com

laços de solidariedade, coesão e forte ligação às tradições (Kola San Dijon e outras), que respondem

a um sentimento de estigmatização e descriminação, como se tratassem de estratégias de

sobrevivência e auto-defesa.” A relação entre os habitantes do bairro é notória no acompanhamento

de crianças pelos vizinhos e no processo de procura de emprego. A realidade social da Cova da

Moura pode ser retratada como“(…) um lugar intenso, por vezes caótico e socialmente complexo,

mas possui uma estrutura urbana que tem construído a sua viabilidade, com uma população que tem

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 72

desenvolvido formas fundamentais de associativismo que tem construído uma consciência de

comunidade (…)” (Sardo, 2010: 35 e 36).

Caracterização Urbana

O bairro de génese ilegal da Cova da Moura, como foi anteriormente descrito, foi constituído

perante condicionalismos decorrentes de barreiras físicas formadas por infra-estruturas urbanas

rodoviárias e ferroviárias e por edificados privados. Tal facto levou à descontinuidade urbana entre o

bairro e as áreas urbanas vizinhas, da Damaia e Buraca, e à exclusão social e urbana da Cova da

Moura, responsável por carências ao nível da salubridade, insegurança e do espaço urbano. O bairro

constitui-se num tecido urbano de grande flexibilidade, através da sucessiva consolidação das

construções, pelos seus habitantes, e das infra-estruturas básicas como a rede de esgotos, água,

iluminação pública, arruamentos e equipamentos colectivos.

Fig. 3.4 Planta do bairro da Cova da Moura

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

73 3. PROJECTO

A Cova da Moura estrutura-se ao longo das ruas da Palmeira, Alecrim e Santa Filomena, que

semi-circundam interiormente o bairro desde Nordeste até Sudeste; a rua Principal atravessa o bairro

de Norte a Sul, dividindo o bairro entre Oeste e Este, e a rua do Moinho, percorrendo o limite poente.

Por este último, regista-se um antigo moinho, que apesar de abandonado, encima a colina da Cova

da Moura, sendo um elemento de referência do bairro.

Fig. 3.5 Mapa de ruas

2

1

4 5

6

3

7

8

9

10

1 – Rua do Moinho

2 – Rua dos Reis

3 – Rua do Vale

4 – Rua da Palmeira

5 – Rua do Alecrim

6 – Rua de Santa Filomena

7 – Rua Principal

8 – Rua da Ladeira

9 – Rua 8 de Dezembro

10 – Av. da República

11 – Jardim dos Aromas

12 – Rua Luís de Camões

12

13

14

11

13– Rua Manuel da Maia

14 – Rua Teófilo Braga

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 74

Destaca-se igualmente a presença do Aqueduto das Águas Livres paralelo à linha ferroviária.

Nos equipamentos presentes no bairro enumera-se a Associação dos Moradores, que representa

legalmente os moradores e os seus interesses, o Clube Desportivo, promovendo a prática desportiva

IC19

Av. da República

Linha de comboio

Barreira física

Barreira permeável

Fig. 3.6 Barreiras físicas e equipamentos

1

2

3

4

4

5

6

7

8

9

1 – Escola Primária 2 – Ass. Solidariedade da Cova M. 3 – Creche S.Gerardo 4 – Santa Casa da Misericórdia 5 – Campo de jogos 6 – Creche 7 – Associação do Moinho da Juventude 8 – Centro Paroquial S.Gerardo 9 – Associação de Moradores

Equipamentos Aqueduto das Águas Livres

Moinho

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

75 3. PROJECTO

e de recreio, a Associação Cultural do Moinho da Juventude, com objectivos relacionados com a

formação profissional dos jovens e na promoção cultural do bairro. Ressalva-se os equipamentos

institucionalizados da Santa Casa da Misericórdia, Centro Paroquial e Social N.ª Sr.ª Mãe de Deus

da Buraca, Escola Básica do 1º Ciclo, e duas Creches.

Em relação ao espaço público no bairro da Cova da Moura, o estudo Iniciativa Bairros

Críticos (2006) salienta a predominância do uso da rua como lugar de estadia onde converge as

funções ligadas ao trabalho, habitar e lazer. A rua estabelece-se como um prolongamento da

habitação proporcionando uma convivência e sociabilização com os restantes moradores do bairro.

Verifica-se a negação da afirmação clara de um espaço público amplificado para usufruto da

comunidade, onde a convergência de ruas origina os alargamentos espaciais. Existem alguns

exemplos como o cruzamento entre a Rua de Santa Filomena e a Rua de S. Domingos, que favorece

o encontro durante as festas populares e feriados, o alargamento da Rua 8 de Dezembro e da Rua

de Santa Filomena, estabelecendo-se como uma entrada nascente do bairro. Todos estes espaços

públicos, supracitados, são desprovidos de mobiliário público. Os espaços verdes são escassos,

onde o único exemplar situa-se no exterior da área do equipamento da Santa Casa da Misericórdia, e

desaproveitados, como os terrenos no limite norte do bairro.

Em LNEC (2008) identifica-se a diversidade construtiva do bairro da Cova da Moura ao nível

volumétrico, onde existe a predominância de edifícios com 2 e 3 pisos agrupados em pequenos

quarteirões quase sem logradouros privados. Identifica-se no estudo Iniciativa Bairros Críticos (2006)

uma distribuição da população pelo bairro segundo a naturalidade, onde a Norte predomina os

residentes de naturalidade portuguesa – na rua da Palmeira e ao longo da avenida da República – e

a Sul prevalece a população maioritariamente africana. Esta distribuição populacional e cultural

reflecte-se em termos urbanos, pois a Sul predominam ruas estreitas e sinuosas de carácter

labiríntico enquanto que, a Norte regista-se uma organização ortogonal com arruamentos

pavimentados e casas circundadas por terrenos privados. Ainda em LNEC (2008) a maioria do

edificado construído no bairro, tem um uso residencial (86,7%), distribuindo-se de forma restante por

serviços (6,5%), comércio (2,5%) e outros.

Fig. 3.7 Exemplos de edifícios de dois e três pisos

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 76

De acordo com o estudo supracitado, o sistema construtivo, da maioria do edificado, é

composto por uma estrutura de pilar e viga de betão armado, com pavimentos em lajes aligeiradas

de vigotas pré-esforçadas de betão. Em relação às fundações o estudo é inconclusivo mas aponta

para sapatas de betão armado. A cobertura é maioritariamente inclinada, 68%, e 19% possui

cobertura plana com o restante edificado a optar por um sistema misto. A preferência por alvenaria

Fig. 3.8 Número de pisos por edifício

Fig. 3.9 Distribuição dos edifícios por uso

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

77 3. PROJECTO

de tijolo para constituir a estrutura das paredes exteriores é maioritária em 98% do edificado (Anexo

II). Devido à adopção de alvenaria de tijolo de só um pano, com normalmente espessura de 15cm, o

estudo do LNEC (2008:13) aponta para “(…) condições de conforto e salubridade precárias e de

incumprimento das disposições regulamentares, designadamente as contidas no RGEU.”

O estudo supracitado faz referência à existência de variadas anomalias dos elementos

construtivos e funcionais, espaciais e de relação entre edifícios. Quanto ao aspecto construtivo, mais

de 50% do edificado regista anomalias em relação à cobertura (com casos de falta de estanqueidade

e ausência de isolamento térmico), paredes (por vezes sem revestimento), escadas (com exemplos

de degraus e estrutura bastante degradada, sem revestimento ou com deformações importantes) e

dispositivos de protecção contra queda. O estudo destaca igualmente anomalias consideradas

médias e graves em 50% do edificado em coberturas e escadas com difícil intervenção de reparo. É

de ressalvar, igualmente, anomalias graves relativas às instalações de gás, e nas instalações de

ventilação, as quais levam a uma reduzida capacidade de estanqueidade à água e ao deficiente

isolamento térmico e humidade.

Nas anomalias espaciais o estudo do LNEC (2008: 22) referencia que, devido à ocupação

dos espaços vagos pelo edificado, houve a uma diminuição dos “(…) espaços de circulação publica e

colectiva, caminhos de evacuação em caso de emergência, e acesso da luz natural e da insolação

(…)”. Regista-se por isso, diversas anomalias relacionadas com iluminação natural em 70% dos

edifícios, com a existência de um pé-direito reduzido em 30% do edificado e áreas reduzidas para

compartimentos interiores.

Ao nível das anomalias nas relações entre edifícios, o estudo, acima citado, sublinha essa

problemática na distância entre vãos de edifícios confrontantes, existência de partes do edifício sobre

ou sob outras construções e na proximidade entre habitações. Este último é descrito como “(…)

pequenos espaços entre edifícios, formando ruas e becos, em geral não-lineares e de largura

variável e frequentemente reduzida; uma situação que potencia o risco de propagação de incêndio, a

dificuldade de evacuação de pessoas e ao combate contra o fogo, a falta de privacidade nas

unidades e a insalubridade por falta de insolação” LNEC (2008: 30).

Fig. 3.10 Percentagem de lotes por “Nível de Reabilitação”

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 78

O estudo do LNEC (2008) conclui que, num cenário de reabilitação do bairro da Cova da

Moura, mais de 50% do edificado necessitará de uma intervenção de carácter profunda e média, com

destaque nas áreas a Sul e nas extremidades a Oeste e Este do bairro.

Em relação às actividades económicas do bairro, o estudo Bairros Críticos – Cap. 4 (2006)

regista cerca de 35 actividades diferentes num total de 148 estabelecimentos. Destes últimos, a

maioria constitui-se entre pastelarias e cafés, cabeleireiros e barbearias, restaurantes, mercearias e

algumas oficinas de reparações e serralharias (Anexo II). Denota-se igualmente uma longevidade

nos estabelecimentos, com 68% destes com 20 ou mais anos de existência, e um dinamismo

económico local, com 17% dos estabelecimentos a serem inaugurados num intervalo de 3 anos

antes da conclusão do estudo. Aires Mateus (cit. in Sardo, 2010: 144) afirma que “(…) basta ver o

numero de cabeleireiros e de restaurantes para perceber que estas actividades não servem só o

bairro”. Segundo o estudo Bairros Críticos (2006), retrata a distribuição das actividades comerciais da

Cova da Moura na Rua Principal e ao longo das ruas do Moinho e do Vale e na Avenida da

República. Conclui que “ (…) ao longo da Av. República localizam-se as actividades que necessitam

de uma maior área de construção e que servem, não só a população, como também a envolvente

(…) na área central do bairro predominam as actividades ligadas à satisfação das necessidades

básicas, como o comércio alimentar” (Iniciativa Bairros Críticos, 2006: 104).

Mobilidade

Um dos pontos fortes do bairro da Cova da Moura centra-se nas acessibilidades viárias e

ferroviárias. Como anteriormente foi referido, a nascente destaca-se a linha de comboio Lisboa-Sinta

e a rede viária externa ao bairro, Avenida da República, com a ligação ao IC19. O bairro, em relação

aos transportes públicos rodoviários possui diversas paragens a reduzida distância pedonal,

permitindo um acesso a diversos pontos centrais da cidade de Lisboa.

Em relação à estrutura interna viária, hierarquiza-se segundo a sua função e pavimentação,

onde se destacam as ruas de atravessamento Norte-Sul - Rua do Moinho e Central – e o

atravessamento de poente a nascente e sul – entre as ruas da Palmeira, Alecrim e Santa Filomena.

Apesar de uma grande variedade de oferta de transportes públicos, a Cova da Moura caracteriza-se

por poucas acessibilidades de entrada do bairro, destacando-se as ruas Principal, Santa Filomena e

do Moinho que garantem as principais entradas viárias. O estudo Bairros Críticos – Cap. 3 (2006)

ressalva também as limitações das ruas devido a uma desadequada largura das vias, para a

circulação de viaturas e veículos de segurança e para estacionamento, e à inclinação, a qual atinge

mais de 20% em algumas extensões das ruas do Moinho e Principal, dificultando a circulação e

mobilidade das ruas.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

79 3. PROJECTO

(In)Segurança

A questão da insegurança no bairro da Cova da Moura tem sido alvo mediático por parte dos

meios de comunicação, os quais difundem uma imagem negativa e estigmatizada. No entanto é

necessário aprofundar a problemática da insegurança e esclarecer a sua verdadeira dimensão.

Segundo o estudo da Iniciativa Bairros Críticos (2006), comparativamente com a Área

Metropolitana de Lisboa e o Concelho da Amadora, o bairro da Cova da Moura apresenta valores

semelhantes em relação à incidência da criminalidade, no entanto destaca-se certos tipos de delitos

com elevada expressão no bairro. Os crimes contra as pessoas, cujo estudo aponta numa

associação destes com o roubo, e os previstos em legislação avulsa, que incluem o tráfico e posse

de estupefacientes.

Tipo de crime

2004 2005 Valor

absoluto

Abs. % Abs. %

Ofensas à integridade física simples 49 15,4 29 10,2 -20

Ofensas à integridade física graves 14 4,4 10 3,5 -4

Ameaças 12 3,8 8 2,8 -4

Difamação e injúria 5 1,6 2 0,7 -3

Roubo (incluindo esticão) 40 12,6 57 20,1 17

Furto de veículo 39 12,3 26 9,2 -13

Furto do interior de veículo 29 9,1 14 4,9 -15

Furto de residência 12 3,8 12 4,2 0

Furto estabelecimento comercial 9 2,8 7 2,5 -2

Outros furtos 9 2,8 7 2,5 -2

Danos à propriedade 20 6,3 21 7,4 1

Tráfico de substâncias 40 12,6 47 16,5 7

Detenção de arma proibida 4 1,3 6 2,1 2

Condução ilegal 32 10,1 25 8,8 -7

Outros crimes 4 1,3 13 4,6 9

TOTAL 318 100 284 100 -34

Tabela 3.5 Tipologias de Criminalidade na Cova da Moura

Fig. 3.11 Rua do Moinho Fig. 3.12 Rua do Vale

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 80

No estudo supracitado, os crimes contra pessoas, são praticados maioritariamente por jovens

(entre 15 e os 25 anos) do género masculino, motivados por uma cultura intra-grupo de desafio e

violência, sensação de revolta e procura por determinados níveis de consumo. Para a ocorrência

destes crimes contribui, igualmente, a facilidade de aquisição de armas. Embora a reduzida

gravidade, estes actos, de forma continuada, promovem a sensação de insegurança por parte da

população e podem orientar para, posteriormente, uma criminalidade mais violenta e perigosa.

Quanto ao tráfico de estupefacientes, o bairro da Cova da Moura estabelece-se como um

ponto de armazenamento e distribuição, verificando-se no entanto, segundo o estudo da Iniciativa

Bairros Críticos (2006), uma baixa taxa de consumo entre os seus residentes. Apesar de parte da

população obter rendimentos através do tráfego de droga, o bairro não se posiciona como elemento

central do sistema de tráfico mas sim como um ponto de abastecimento e circulação.

Os arruamentos onde se regista maior ocorrência de criminalidade são as ruas Principal, do

Moinho, do Vale, da Palmeira, do Outeiro, 8 de Dezembro, de Santa Filomena e a da Ladeira,

respondente às ruas de maior circulação e suas variantes.

Fig. 3.13 Ruas com maior ocorrência de criminalidade

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

81 3. PROJECTO

Com o propósito de reduzir a criminalidade, a polícia de segurança pública desenvolveu

estratégias divididas entre policiamento de proximidade, com dois agentes a tempo permanente

acompanhando os moradores e os jovens, e policiamento convencional, com carros de patrulha e de

intervenção. Apesar de o estudo, em questão, apontar para uma ligeira diminuição da criminalidade,

regista-se valores ainda muito elevados nos crimes contra pessoas e no tráfico de estupefacientes.

Um dos aspectos que contribui significativamente para a formação de uma imagem negativa

e de um sentimento de insegurança por parte de indivíduos exteriores ao bairro, é o impacto das

notícias divulgadas pelos meios de comunicação social em relação à Cova da Moura. Os factores da

criminalidade e da violência surgem com mais frequência, e de uma forma negativa e

sensacionalista, nas notícias relacionadas com o bairro, comparativamente com factores de futuro e

esperança, diversidade cultural e social. Esta situação promove uma visão distorcida sobre o bairro e

a uma exclusão social e “guetização” do mesmo. Apesar de não se considerar um propósito, por

parte dos meios de comunicação, denegrir o bairro, como foi anteriormente descrito, os valores de

delinquência elevados, são reais.

A imagem transmitida da Cova da Moura leva à formação de um sentimento de insegurança,

e posteriormente de agressividade e protecção, tanto por parte da população do concelho da

Amadora como da população em geral. A estigmatização gera na população residente desconforto e

angústia, principalmente nos mais jovens que, como indica o estudo da Iniciativa Bairros Críticos

(2006), são associados a práticas de comportamentos desadequados quando se encontram em

contacto com não-residentes e em visitas de estudo.

Em relação aos moradores das áreas urbanas envolventes, o estudo supramencionado, após

uma divisão em zonas intersticiais ao bairro e mais distantes, relata uma preocupação maior pela

insegurança nas áreas mais perto do bairro da Cova da Moura. Regista-se a preocupação dos

moradores das áreas envolventes, com a imagem do bairro, mas também a opinião de que preferem

o bairro da Cova da Moura renovado e não demolido. Apesar de considerarem a imagem da Cova da

Moura realista, existe uma parte significativa da população inquirida que a considera exagerada.

Considerações Finais

A Câmara Municipal da Amadora apresenta, em 2003, a proposta de um plano para o bairro

da Cova da Moura no qual se previa a demolição de cerca de 75% das construções e manutenção

das restantes, assim como novas vias de acesso e de atravessamento, bem como novos espaços

públicos (8,3 ha.), ajardinados (2,0 ha.) e para equipamentos (1,6 ha.). A proposta consideraria o

realojamento dos moradores desalojados nas novas habitações a construir (cerca de mil fogos). Os

moradores reagiram perante esta proposta elaborando um abaixo-assinado, através da comissão de

bairro, de modo a impedir a intervenção e a propor novas soluções.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 82

A iniciativa URBAN II, financiada pela união europeia, que decorreu entre 2000 e 2006, visou

não só a melhoria da qualidade de vida do bairro da Cova da Moura mas também das áreas urbanas

intersticiais da Buraca e Damaia. Assentou numa estratégia de intervenção dividida entre a

construção e coesão do espaço público, inclusão social, valorização sócio-económica e profissional e

de revitalização social, cultural e desportiva. Através de algumas intervenções pontuais e de

projectos imateriais, visa-se a prevenção da exclusão social e urbana da Cova da Moura e das áreas

adjacentes, assim como a revitalização, socialização e o diálogo entre bairros.

Posteriormente, tendo em vista a elaboração de um plano de pormenor para o bairro da Cova

da Moura, a Iniciativa Bairros Críticos, lançada em 2006, estruturou-se numa análise detalhada e

extensiva dos problemas, ameaças, potencialidades e pontos fortes do bairro da Cova da Moura para

a sua qualificação. O estudo conclui que uma intervenção que opte pelo realojamento dos moradores

será mais dispendiosa que o processo de legalização e regularização do edificado existente,

realçando o valor sentimental das construções, pela população que a considera património pessoal.

Acrescenta que parte dos residentes obtêm rendimentos através do arrendamento de partes das

suas casas, o que, caso se proceda por uma política de realojamento, estes pressupostos

económicos deixam de existir. Apesar de considerar ser necessário o procedimento de demolição em

alguns casos, visto que, segundo o estudo da Iniciativa Bairros Críticos (2006: 137) “(…) a densidade

de alguns quarteirões, a qualidade das suas construções e a estrutura urbana existente, não são

susceptíveis de reabilitação.”

A Iniciativa Bairros Críticos aponta igualmente para um cuidado com a problemática da

insegurança proveniente de actividades ilícitas, onde a actuação policial com mostras de força e

rusgas temporárias mostram-se ineficientes. Ressalva igualmente a importância da exclusão sócio-

espacial e da imagem negativa do bairro na insegurança, os quais promovem a desconfiança por

parte da população envolvente, e da restante, devido ao desconhecimento da realidade da Cova da

Moura.

O estudo acima referido, aponta igualmente para a necessidade de um investimento em

equipamentos públicos, onde referencia a falta de atracção do bairro, em infra-estruturas, redes de

águas, esgotos e electricidade, na concepção de um espaço público de qualidade, na eliminação de

barreiras físicas, que estimulam a exclusão, e na clarificação quanto à irregularidade jurídica dos

terrenos do bairro.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

83 3. PROJECTO

3.2 Proposta

Contextualização

Como já foi referido, a proposta para o bairro da Cova da Moura surgiu da oportunidade do

Concurso Universidades da Trienal de Arquitectura 2010, tendo sido desenvolvida no âmbito da

disciplina de Projecto Final do 5º ano, do ano lectivo de 2009/201039

.

No desenvolvimento da proposta, procedeu-se primeiro à identificação das problemáticas e

dos aspectos tendencialmente negativos, assim como dos pontos fortes a explorar mais importantes

relacionados com o bairro. Como já mencionado anteriormente, reconhece-se a existência de

problemas de saneamento, estabilidade construtiva, exclusão social, económica, profissional e

urbana, insegurança e carência de espaços públicos e equipamentos. Tais questões são necessárias

ter em conta, para que as estratégias projectuais, a realizar, possam contribuir para uma resolução

das mesmas. A proposta pressupõe obter, igualmente, uma relação recíproca e potenciadora com os

aspectos positivos do bairro, onde destaca-se a realidade social, cultural, étnica e de identidade,

história e associativismo.

Identificar a área a intervir foi igualmente estratégico. Identificam-se problemas inerentes,

relativos à exclusão social e urbana e carências de espaços públicos e para a existência de

actividades, não só ao nível do bairro da Cova da Moura, mas também à restante área urbana

envolvente. Os bairros da Damaia e Buraca caracterizam-se por tecidos urbanos indiferenciados,

atributo que Luis Scozka (1984:12) considera “(…) por si, um factor de violência, sendo ela mesma

uma violência (…)”. A existência destas problemáticas, semelhantes entre bairros, foi tida em conta

para que a intervenção não se restringisse à área afecta a este bairro, mas também à restante área

circundante, a qual caracteriza-se pela indiferenciação do espaço.

Assim, a proposta desenvolvida procura, como intenção, promover a integração das malhas

urbanas, do bairro da Cova da Moura com as áreas intersticiais, reabilitar e (re)qualificar as

condições de vida dos moradores, através do espaço publico, ruas, habitações e construções

existentes e equipamentos de qualidade. Através deste processo tenciona-se reduzir a imagem

negativa e a insegurança existente no bairro, assim como incentivar a melhoria das condições

39

Esta foi inicialmente apresentada no âmbito da Semana Relâmpago 2010, surgindo de uma reflexão proposta por um grupo de sete alunos de vários anos do Mestrado Integrado em Arquitectura. Posteriormente foi dada a oportunidade para ser desenvolvida de modo mais aprofundado para ser apresentada ao Concurso Universidades da Trienal de Arquitectura 2010, tendo recebido uma menção honrosa (Anexo IV).

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 84

económicas, através da qualificação profissional e da redução do insucesso escolar e da

infoexclusão.

Tendo em conta o estudo do LNEC (2008), em relação à questão da problemática da

estabilidade e qualidade construtiva do edificado existente, estabeleceu-se um programa que visa a

melhoria das condições físicas, funcionais e vivenciais deste, onde os moradores e técnicos em

equipa multidisciplinar (entre os quais os arquitectos, engenheiros, sociólogos, juristas e geógrafos)

possam intervir na regularização fundiária e jurídica e na qualidade construtiva das respectivas

habitações. Será necessário ter em conta o respeito pela diversidade e espontaneidade dos métodos

e técnicas construtivas, caracterizantes do bairro, as quais reflectem-se no sentimento presenciado

pelos residentes, de património pessoal pelo respectivo edificado. No processo de intervenção do

parque habitacional da Cova da Moura, a estratégia proposta pondera o recurso a estratégias que

fomentem a participação da comunidade no processo. Tal justifica-se pela elevada taxa de

população residente a trabalhar no sector da construção civil, entendendo também este modo de

participação como uma forma de fomentar a empregabilidade e proporcionar um sentimento de

estima pelas novas construções e/ou espaços. Baptista Coelho (2011) afirma, a este registo, que é

necessário “(…) uma eficaz e contínua gestão local de proximidade, procurando-se desenvolver uma

elevada estima dos habitantes relativamente aos seus espaços de habitar, às suas vizinhanças e aos

seus espaços públicos.”

Princípios de Intervenção

Tendo em conta a problemática relacionada com a imagem negativa e a insegurança do

bairro e respectivas áreas intersticiais, que são sintomáticas da exclusão social e urbana, a proposta

opta por uma concepção espacial favorável à vigilância natural e ao controlo social.

Como princípios de intervenção procura-se desenvolver, de acordo com as teorias de Hillier,

mencionadas anteriormente, um sentimento de comunidade entre os bairros da Cova da Moura,

Buraca e Damaia na constituição de uma comunidade virtual, onde possam partilhar espaços e

vivências. Segundo Hillier, esta comunidade “(…) it is form of group awareness in a collectivity (…)”40

(Hillier et al., 1987:248) e possui a designação de virtual porque “(…) it has not yet been realized

through interaction among its members (…)”41

(idem, ibidem:248).

Em relação à reabilitação e (re)qualificação dos espaços públicos e das ruas do bairro,

defende-se que estes devem ser acessíveis, tanto à população da Cova da Moura como ao exterior;

permeáveis, favorecendo uma sequenciação de espaços e actividades; visíveis, de forma a promover

a vigilância natural tanto dos residentes como dos transeuntes; legíveis e previsíveis, para permitir

uma correcta orientação dos utilizadores e contrastando com a irregularidade dos espaços do bairro;

40

“(…) é formada pela consciência colectiva do grupo (…)” Tradução livre 41

“(…) ainda não foi realizada através da interacção entre os seus membros (…)” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

85 3. PROJECTO

e capazes de gerar actividades, de forma a promover a quotidianidade e as relações sociais dos

utilizadores, tanto do bairro como exteriores a este.

Estratégia de Intervenção

A estratégia adoptada pela proposta define-se hierarquicamente através de diferentes

escalas, desde a inserção urbana, do bairro da Cova da Moura e a sua articulação com as áreas

envolventes, até ao nível da rua e do espaço público exterior.

Atendendo às barreiras físicas impostas pela Avenida da República e pelo conjunto edificado,

a noroeste, e pelas descontinuidades urbanas e topográficas, foi estratégica a clarificação e o

estabelecimento das ligações entre os bairros da Damaia, Cova da Moura e Buraca, nas intenções

projectuais, de modo a que estes possam beneficiar de uma relação simbiótica, aproveitando as

sinergias e as características urbanas, sociais, culturais e étnicas de cada um. As ligações

estabelecidas prendem-se com a possibilidade de uma maior permeabilidade entre as malhas

urbanas e suas centralidades. Baptista Coelho (2011), a propósito da continuidade urbana, defende

que “(…) nestas matérias há regras básicas do bom urbanismo que são igualmente regras básicas

da segurança, designadamente a continuidade urbana a todo o custo (…)”. Sugere-se, igualmente, a

possibilidade de extensão das ligações entre os bairros, referidos previamente, e as áreas urbanas a

noroeste, Reboleira e Alto da Damaia, e a sudeste, Alfragide e Benfica. Ao longo destas ligações

entre bairros são propostas diversas intervenções de uso mútuo por parte das diferentes áreas

urbanas, promovendo a convivência social por parte das populações de diferentes bairros, para

colmatar carências ao nível do espaço público e equipamentos.

DAMAIA

BURACA

Fig. 3.14 Esquema da Intenção Projectual

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 86

.

Foram identificados dois eixos estruturais à continuidade urbana: a ligação da Avenida

Manuel da Maia (Damaia) – Rua do Moinho (Cova da Moura) – Rua Luís de Camões (Buraca) e a

ligação da Rua Teófilo Braga (Damaia) – Rua da Palmeira/Alecrim/Santa Filomena (Cova da Moura)

– Jardim dos Aromas (Buraca). Estes eixos procuram interligar os centros urbanos da Damaia e

Buraca, onde verifica-se a existência de um número maior de actividades, e o bairro da Cova da

Moura. Identifica-se alguns edifícios pré-existentes, localizados entre a Rua do Moinho/Rua Manuel

da Maia e entre a Rua Teófilo de Braga/Rua da Palmeira, nos quais se propõe a demolição dos

mesmos, para o estabelecimento de uma relação física e visual entre as ruas mencionadas

anteriormente. Ao longo das ligações atrás referidas, são propostas intervenções pontuais de

espaços de oferta à existência de actividades, de carácter edificável ou não, que podem servir a

Cova da Moura e os bairros envolventes.

Estas intervenções sugerem-se estar relacionadas com as características culturais e sociais

da Cova da Moura e assim, estabelecer relações sociais e físicas entre os bairros circundantes.

Jacobs destaca a importância do uso das ruas de forma a que “(…) the sidewalk must have users on

it fairly continuously, both to add to the number of effective eyes on the street and to induce the

people in buildings along the street to watch the sidewalks in sufficient numbers (…)”42

(Jacobs,

1961:35), de modo a garantir a vigilância natural. A autora afirma ainda que “(…) if a city's streets

look interesting, the city looks interesting (…)”43

(idem, ibidem: 37), e assim, se o espaço é atractivo

42

“(…) os passeios devem ter utilizadores de forma continuada, para adicionar o número de olhos efectivos na

rua e para induzir as pessoas dentro dos edifícios, ao longo da rua, a olhar para os passeios em número

suficiente (…)” Tradução livre 43

“(…) se as ruas de uma cidade parecem ser interessantes, a cidade parece ser interessante (…)” Tradução

livre

Fig. 3.15 Continuidades Urbanas

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

87 3. PROJECTO

promove a movimentação de pessoas e “(…) the sight of people attracts still other people (…)”44

(idem, ibidem: 37). Para garantir essa vigilância natural, decorrente dos transeuntes, Jacobs defende

a necessidade de actividades que “(…) insure the presence of people who go outdoors on different

schedules and are in the place for different purposes, but who are able to use many facilities in

common (…)”45

(idem, ibidem:151).

A localização destas intervenções dependerá do balanço entre as variáveis da área de

influência e/ou do objectivo da intervenção, de carácter inter-bairro ou de rua, e da possibilidade da

existência de espaço livre para a construção e/ou identificação de edifícios como devolutos, para

posteriormente serem demolidos (Anexo II).

Através destes eixos pretende-se um usufruto de diversas actividades e vivências ao longo

das ruas, onde o acesso ao automóvel e pedonal coexistem de forma harmoniosa, tendo em conta o

dimensionamento e o declive das ruas. As ligações, anteriormente referidas, sugerem o explorar de

novas possibilidades de permeabilidades e de intervenções, noutros pontos dos bairros, num

processo de ramificação da influência das mesmas.

A carência de um espaço público de qualidade, que sirva as necessidades sociais do bairro,

foi uma preocupação fulcral no desenvolvimento da estratégia projectual. Assim, na intersecção dos

eixos, dentro do bairro da Cova da Moura, coincide a intervenção proposta que, tanto a nível social e

urbano, destaca-se claramente das restantes, pela sua dimensão e relevância: o desenho de um

espaço urbano que concentre as sinergias e dinâmicas urbanas e sociais da Cova da Moura e dos

bairros envolventes. Aires Mateus, (cit. in Sardo, 2010: 144) afirma que, relativamente às

necessidades da comunidade da Cova da Moura, que o bairro “(…) precisa de praças, ruas, que

fazem parte do investimento público de qualquer zona (…)”.

Como foi referido anteriormente, a intervenção do espaço público proposto surge da

necessidade da projecção de um espaço de forte identidade sócio-cultural com dimensão urbana que

funcione como elemento-chave para o desenvolvimento das restantes intervenções ao longo dos

eixos, previamente mencionados, com vista à promoção das interacções com a Cova da Moura e

com os bairros adjacentes. A importância destas relações é anotada por Jacobs quando refere que

“(…) is a feeling for the public identity of people, a web of public respect and trust, and a resource in

time of personal or neighborhood need (…)”46

(Jacobs, 1961:56).

44

“(…) o avistar de pessoas atrai mais pessoas (…)” Tradução livre 45

“(…) garantir a presença de pessoas que usam o espaço exterior em diferentes horários e que estão no local

para diferentes propósitos, mas que podem utilizar equipamentos em comum (…)” Tradução livre 46

“(…) é o sentimento de identidade publica das pessoas, uma teia de respeito mútuo e de confiança, e um

recurso em tempo de necessidade pessoal ou do bairro (…)” Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 88

Local de Intervenção

A intervenção proposta de espaço público situa-se na área circunscrita pelas ruas do Moinho,

do Vale, dos Reis e da Palmeira e pelas respectivas habitações adjacentes, onde actualmente ergue-

se a escola EB1/J1 Cova da Moura (Anexo III). A localização do espaço público proposto resulta da

combinação de diversos factores: incompatibilidade da implantação da escola com a restante malha

urbana do bairro, centralidade da área em causa em relação ao tecido urbano da Cova da Moura e à

intersecção das ligações urbanas propostas, o facto de esta se assumir uma das poucas áreas do

bairro onde uma intervenção desta escala não resultaria no desalojamento de moradores e, pelo

facto de este terreno, desde a década de 60, ser destinado à implantação de equipamentos para o

bairro47

. A demolição da escola primária é proposta, além das razões mencionadas anteriormente,

pela insuficiência do espaço escolar para a quantidade de alunos onde, apesar do seu bom estado

de conservação, verifica-se a existência de dois contentores para 4 salas pré-fabricadas, incluindo

instalação sanitária, no terreno do recreio.

47

Observa-se nas fotografias aéreas das décadas de 60 e 70 a inexistência de qualquer construção, aquando

da consolidação urbana da Cova da Moura.

Fig. 3.16 Planta da Cova da Moura com a intervenção proposta

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

89 3. PROJECTO

Ao longo da elaboração desta proposta para o espaço público, colocou-se diferentes

questões relacionadas com a dimensão, características formais, acessibilidades, e as relações

físicas e visuais desta com o edificado pré-existente e com as ruas envolventes. Estas questões

influenciaram o estudo de diferentes opções projectuais ao longo do desenvolvimento da proposta,

como se observa nas figuras seguintes (3.17) e em anexo (IV).

Fig. 3.17 Maquetes ilustrativas da evolução formal da proposta

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 90

O polígono regular medeia, através do seu contraste e referência, o espaço urbano

indiferenciado dos bairros da envolvente com a irregularidade da Cova da Moura. Características que

permitem uma legibilidade e previsibilidade nos percursos definidos pelos utilizadores, garantindo

uma maior sensação de segurança (Heitor 2007).

O terreno para a implantação da intervenção tem um declive acentuado, que dificulta o

estabelecimento de um espaço público. Assim, a intervenção proposta surge da subtracção

topográfica do terreno, onde o edificado proposto insere-se debaixo do mesmo.

A coexistência entre o edificado existente e a intervenção proposta é simbiótica,

proporcionando um espaço público que se sugere ser descoberto ao longo das ruas adjacentes,

através das suas entradas por entre o edificado e pelos seus pátios descobertos, pelos quais se

percorre até ao espaço onde se acumulam as dinâmicas das ruas e da vivência da Cova da Moura: a

Praça.

A Praça

A Praça é constituída por uma área central, a qual funciona como um ponto agregador social,

cultural, urbano e de sinergias, circundada pelo edificado proposto, destacando-se a escola primária,

o centro comunitário e a biblioteca. Estas actividades garantem a vigilância natural da Praça, tal

como Angel (1968:31 e 33) aconselha que “(…) all establishments in the square are oriented toward

the public areas. People can see inside from the public areas and people from inside establishments

Fig. 3.18 Perspectiva da Praça

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

91 3. PROJECTO

should be able to survey the public area. Displays do not obstruct visibility from inside out and vice

versa. Maximum unobstructed visibility of pedestrian approaches to square (…) to see the activities

inside and provisions for stopping, turning, etc, after seeing it (…)”48

. As fachadas do edificado

envolvem o espaço público, referenciando uma leitura vertical, devido aos elementos estruturantes,

contrastante com a horizontalidade e a extensão do espaço da Praça.

Circundando a Praça acima do edificado proposto, encontra-se um espaço aberto à

convivência dos moradores e mediador entre a o espaço público e as construções existentes.

Estabelece-se assim, um contacto visual permanente entre o plano superior que circunda a Praça e

esta última, garantindo uma permanente vigilância natural, a qual Hillier garante que “(…) by breaking

up (…) low visibility public spaces (…) the more difficult the burglars job will be (…)”49

(Hillier,

2004:10).

O percurso e a ascensão até à cota mais alta do terreno, marcada pelo Moinho, e os

acessos, pelas ruas do Moinho, do Vale e dos Reis, sugerem o movimento de um plano diagonal

formado pelo terreno debaixo do qual se insere o edificado proposto. Esta superfície pontua-se por

duas aberturas de forma quadrangular e circular de forma a proporcionar entradas de luz e

acessibilidades ao conjunto edificado, abaixo do mesmo, assim como à Praça.

A primeira abertura corresponde a um pátio descoberto de estrutura quadrangular, o qual é

acedido pelo Moinho e pela Praça. Este pátio proporciona a comunicação ao centro comunitário

proposto. A norte destaca-se uma entrada de forma circular, a qual permite estabelecer o acesso da

Praça ao nível superior do plano diagonal que a encima e respectivamente à Rua do Moinho.

Sugestiona-se, numa fase posterior de desenvolvimento da proposta, uma reflexão sobre a

pertinência da concepção espacial de Newman, sobre a aplicação da territoriality ou territorialidade

em relação às aberturas, anteriormente descritas, dado a sua menor visibilidade para os espaços

envolventes.

48

“(…) todos os estabelecimentos numa praça devem ser orientados para as áreas públicas. Para as pessoas

poderem observar o interior das zonas públicas e para pessoas dentro dos estabelecimentos conseguirem ser

capazes de vigiar as áreas públicas. Com uma disposição que não obstrua a visibilidade de dentro para fora ou

vice-versa. Visibilidade com desobstrução máxima para pedestres que se aproximam da praça (…) para

observarem as actividades interiores e incentivar a paragem, virar, etc, após observação (…)” Tradução livre 49

“(…) quebrando com (…) a fraca visibilidade dos espaços públicos (…) mais difícil se torna o trabalho dos

ladrões (…) Tradução livre

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 92

A cota inferior do plano diagonal, referido anteriormente, coincide com o acesso, de carácter

principal, à Praça pela Rua da Palmeira. Graças à semelhança entre cotas, proporciona uma entrada

ao nível da rua, a qual proporciona o estabelecimento de uma ligação visual para as fachadas

envolventes da praça e para a abertura decorrente do pátio descoberto de forma quadrangular. Na

Rua do Vale, devido à diferença de alturas, o acesso è efectuado através de uma rampa encoberta

pelo plano diagonal. O Moinho é acedido pela sequência de rampas desde a cota da Praça e

consecutivamente pelo pátio descoberto do centro comunitário. A Praça estabelece assim, uma

comunicação física directa com as ruas da Palmeira e do Vale e com o conjunto edificado da escola,

biblioteca e centro comunitário, constituindo um espaço público permeável e acessível. Este espaço

é igualmente visível pelas ruas que o circundam, assim como pelos espaços envolventes a diferentes

cotas e respectivas habitações. Advindo da sua forma quadrangular, possui características legíveis e

previsíveis.

Fig. 3.19 Perspectiva da Praça da Rua da Palmeira

Fig. 3.20 Perspectiva da Praça da Rua do Vale

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

93 3. PROJECTO

Fig. 3.22 Perspectiva da Praça

Fig. 3.21 Perspectivas da Praça

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 94

Na intervenção proposta destaca-se a implementação de diversas actividades como a escola

primária, biblioteca, centro comunitário, espaço destinado a actividades físicas e outras.

Correspondendo a um espaço público capaz de gerar actividades e estimular as relações sociais

entre a comunidade e com os restantes bairros

.

Fig. 3.24 Corte da Praça

Fig. 3.23 Perspectiva da Praça

Escola Primária

Centro Comunitário

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

95 3. PROJECTO

É de realçar o deslocamento das antigas instalações para a nova escola primária projectada,

acedida pela Praça, de forma a colmatar a insuficiência de espaço da actual escola e fornecendo

condições para futuras ampliações. A abertura circular, anteriormente referida, proporciona uma

entrada de luz para o conjunto edificado da escola. O ensino escolar é um dos factores que podem

levar a uma melhoria das condições sociais e económicas de cada indivíduo, e influenciam,

indirectamente, a diminuição de delitos e actos anti-sociais. Luis Scozka (1990:68) refere que “(…) a

escolarização é um fenómeno particularmente propício para se ensaiar a abordagem

multidimensional e integrada dos fenómenos geradores e reprodutores de desigualdade social (…),

particularmente em meio urbano onde (…) podem levar a não priorizar os graves problemas intra e

extra-escolares que condicionam a própria reposta escolar das crianças. Esta abordagem requer um

processo colectivo e interactivo dos diversos actores nela implicados (…)” (Scozka, 1990: 68).

O edificado proposto é complementado por uma biblioteca dividida por vários espaços,

proporcionando um acesso público e privado. Esta sugere-se como zona de transição entre a escola

e o centro comunitário, assim como com o edificado e o exterior. Através deste equipamento

pretende-se fornecer condições necessárias para fomentar as qualificações literárias, assim como

combater a infoexclusão tanto dos alunos da escola como dos restantes moradores.

RU

A D

A P

ALM

EIR

A

RU

A D

OS R

EIS

RUA DO VALE

RUA DO MOINHO

BIBLIOTECA

CENTRO

COMUNITÁRIO

Fig. 3.25 Esquema dos acessos e permeabilidades da Praça

ESCOLA

PRIMÁRIA

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

3. PROJECTO 96

A componente da valorização e

dinamização sócio-económico-

profissional e cultural é tida em conta

através da proposta de inclusão de um

centro comunitário, o qual contém

espaços dedicados à realização de

actividades de valorização profissional

assim como actividades de âmbito

cultural. Através do pátio descoberto,

desenhado por uma forma quadrangular,

são organizadas as instalações do

centro comunitário. Este estabelece uma

comunicação visual e física entre a

Praça e o Moinho, elemento de

referência que encima o bairro, o qual é

acedido através de uma sucessão de

rampas, por entre as habitações

existentes, até ao espaço do centro

comunitário. O centro é complementado

pelas instalações de um refeitório e de

espaço para actividades desportivas

cobertas, de uso para os alunos da

escola primária e para a população

restante, a quais se sugerem em

interacção com a área exterior da praça.

Coloca-se a possibilidade de

existência de outros espaços, que

possam igualmente estabelecer-se como

pontos de atracção para o espaço

público e estimuladores para a

constituição de uma comunidade virtual,

“(…) which the interdependence and

interactivity brought (…) imposes a

collective identity on a group (…)”50

(Hillier et al., 1987: 249).

50

“(…) a qual traz uma interdependência e interactividade (…) impondo uma identidade colectiva num grupo

(…)” Tradução livre

Fig. 3.26 Plantas extrudidas da Praça

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

97

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

98

4.CONCLUSÃO

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

99 4. CONCLUSÃO

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

4. CONCLUSÃO 100

4. Conclusão

A proposta apresentada neste trabalho procurou responder ao âmbito do Concurso

Universidades da Trienal de Arquitectura 2010 e da disciplina de Projecto Final do 5º ano do

Mestrado Integrado em Arquitectura, no ano lectivo de 2009/2010, no sentido de encontrar

possibilidades de intervenção arquitectónica no bairro da Cova da Moura adequadas ao fomento da

melhoria da qualidade de vida.

Ao longo deste trabalho exploraram-se os conceitos relacionados com a delinquência e/ou

actos transgressivos e a elaboração do sentimento de insegurança, com a preocupação de analisar

as suas relações, causas e consequências com a qualidade de vida urbana. Destacou-se a

importância do espaço urbano, e da sua vulnerabilidade, para a ocorrência de delitos assim como

para a formação da percepção de insegurança. Tendo em consideração esta importância, este

trabalho abordou diversas concepções e estratégias, definidas por diferentes autores, na prevenção

de actos delinquentes e anti-sociais, assim como na mudança do sentimento de insegurança através

da manipulação da variável espacial. Destaca-se os trabalhos de Jane Jacobs (1961), Oscar

Newman (1972), Ray Jeffery (1971) e Bill Hillier (1984) tanto pela sua relevância no estudo do

espaço urbano como cenário de delinquência e insegurança, como pelo contributo e inspiração para

posteriores autores. A temática da vigilância natural e controlo social por parte da comunidade é

abordada por todos os autores referidos como medidas dissuasores de actos ilícitos, apesar da

discordância da composição dos vigilantes activos, em relação à inclusão nestes de elementos

exteriores à comunidade. Entre os autores referidos destaca-se igualmente a discordância em

relação às propostas de conceptualização da organização espacial, entre traçados urbanos abertos e

permeáveis e os controlados e restritos nos seus acessos por barreiras físicas, visuais e simbólicas.

Este contexto teórico permitiu enquadrar as principais intenções projectuais da proposta no

bairro da Cova da Moura. Com efeito este bairro depara-se com problemas de exclusão social e

segregação urbana associado a carências de infra-estruturas, equipamentos e desqualificação dos

espaços exteriores e do edificado do parque habitacional. A imagem negativa e a insegurança

existente no bairro são sintomáticas da existência destes problemas.

Assim, a proposta desenvolvida procura colmatar as principais carências identificadas nos

bairros da Cova da Moura e adjacentes, tendo ainda em consideração os problemas de insegurança

existentes. Perante uma área urbana caracterizada pela exclusão social e urbana, a concepção

teórica partilhada por Jacobs e Hillier, de abertura e permeabilidade, apresenta-se como pertinente

para reduzir a vulnerabilidade do espaço urbano.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

101 4. CONCLUSÃO

Identificaram-se princípios de intervenção relacionados com a concepção teórica de Hillier,

no que se refere ao fomento de um sentimento de “comunidade virtual” entre os bairros da Cova da

Moura, Buraca e Damaia, através da partilha de espaços e vivências. Assim, a proposta procurou

integrar na malha urbana existente espaços acessíveis, permeáveis, visíveis, legíveis e previsíveis, e

capazes de gerar actividades. Com base nestes princípios procurou estabelecer-se um factor

dissuasor tanto para a prática delinquente e/ou transgressiva como na formação do sentimento de

insegurança por parte da comunidade. De forma a tornar mais explicita a intensa articulação e

integração entre a proposta e o seu suporte teórico, optou-se por uma permanente associação das

soluções projectuais adoptadas com os contributos conceptuais dos autores mencionados.

A proposta apresentada procura fomentar as condições da qualidade de vida da comunidade,

através da integração das malhas urbanas, do bairro da Cova da Moura com as áreas intersticiais, da

reabilitação e da (re)qualificação do espaço publico, ruas, habitações e construções existentes e de

equipamentos de qualidade, e da redução da imagem negativa e insegurança urbana existente.

No entanto, devido ao âmbito académico do Concurso Universidades da Trienal de

Arquitectura 2010, esta proposta deixa em aberto a continuação do desenvolvimento da mesma, no

qual se sugere o aprofundamento das reflexões teóricas explanadas anteriormente. Designadamente

a consideração das teorias de Newman, de territorialidade espacial, numa fase posterior de

elaboração da concepção da Praça.

Ressalva-se a pertinência deste trabalho na reflexão do tipo de abordagem interventiva a

efectuar neste bairro, assim como na relevância do papel dos arquitectos, urbanistas e técnicos em

geral na concepção do espaço urbano e consequentemente na influência sobre a vulnerabilidade

deste. Destaca-se, no entanto, a necessidade de uma permanente ponderação e avaliação das

questões de insegurança, bem-estar e vivência da comunidade, pois existe uma grande diferença

entre uma concepção espacial segura e securitária.

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

102

5.BIBLIOGRAFIA

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

103

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

5. BIBLIOGRAFIA 104

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http://www.dalycity.org

http://www.homeoffice.gov.uk

http://www.huzzam.com

http://www.ine.pt

http://www.moinhodajuventude.pt

http://www.trienaldelisboa.pt

http://www.vascodacunha-projectos.pt

http://www.virginiamn.us

http://www.wikipedia.com

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

108

6.ANEXOS

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

109

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

6. ANEXOS 110

6.1 Anexo I – Dados sobre a Caracterização da Cova da Moura

Categoria de crime

Arguidos/ suspeitos identificados em crimes registados pela PSP e GNR (N.º) por Sexo

e Categoria de crime; Anual

Período de referência dos dados

2008 2004 1998

Localização geográfica

Portugal

N.º N.º N.º

Crimes contra as pessoas 96 362 // 104 965 94 944

Crimes contra o património 73 284 // 98 814 71 370

Crimes contra a paz e humanidade/ crimes contra a vida em sociedade

28 093 // 27 707 17 503

Crimes contra o Estado 5 557 // 5 947 2 925

Crimes previstos em legislação avulsa

30 280 // 30 620 19 243

Localização geográfica

Crimes registados (N.º) pelas autoridades policiais por Localização geográfica e Categoria de crime; Anual

Período de referência dos dados

2010 1998

Categoria de crime

Crimes contra

as pessoas

Crimes contra o

património

Crimes contra a vida em

sociedade

Crimes previstos

em legislação

avulsa

Crimes contra

as pessoas

Crimes contra o

património

Crimes contra a vida em

sociedade

Crimes previstos

em legislação

avulsa

N.º N.º N.º N.º N.º N.º N.º N.º

Portugal 96 729 224 752 50 700 45 741 83 173 193 495 34 282 27 190

Norte 33 069 64 998 16 419 10 434 24 757 62 873 8 635 6 520

Grande Porto 12 839 28 344 4 900 4 882 9 202 37 888 2 704 3 066

Maia 1 098 2 627 292 324 774 2 042 186 171

Matosinhos 1 503 4 063 473 433 1 854 5 063 217 263

Porto 3 516 9 003 2 229 2 589 2 228 18 941 1 463 1 589

Vila Nova de Gaia 2 783 5 130 772 678 1 038 4 410 243 364

Centro 18 653 42 527 9 349 6 118 17 023 27 080 7 856 4 564

Grande Lisboa 18 896 58 719 10 247 9 939 18 612 62 342 9 111 7 163

Amadora 1 798 5 275 704 747 1 427 5 080 171 430

Lisboa 5 894 26 052 4 630 4 218 8 512 32 468 6 574 4 295

Loures 2 048 4 224 934 855 2 356 5 731 512 645

Odivelas 1 000 2 515 555 474 - - - -

Vila Franca de Xira 1 073 2 082 377 474 765 1 754 157 306

Almada 1 538 4 435 608 738 1 522 4 621 333 629

Barreiro 795 1 912 169 289 789 1 448 198 274

Seixal 1 351 3 567 620 500 967 2 681 282 189

Setúbal 1 158 3 602 495 668 1 763 2 536 831 655

Alentejo 6 105 11 871 2 967 2 249 5 690 7 046 2 830 2 122

Algarve 5 002 17 565 2 873 1 760 4 422 11 834 1 730 1 339

Albufeira 553 3 391 405 186 459 2 300 407 142

Faro 705 1 972 495 241 469 1 381 251 241

Loulé 736 3 340 418 211 1 259 2 313 206 217

Portimão 721 1 887 338 268 483 1 186 285 228

Crimes registados (N.º) pelas autoridades policiais por Localização geográfica e Categoria de crime; Anual

Fonte : INE

Arguidos/ suspeitos identificados em crimes registados pela PSP e GNR (N.º) por Sexo e Categoria de crime; Anual

Fonte : INE

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

111 6. ANEXOS

Categoria de crime

Condenados em processos crime na fase de julgamento findos (N.º) por Sexo e Categoria de crime; Anual

Período de referência dos dados

2008 2004 1998

Localização geográfica

Portugal

N.º N.º N.º

Crimes contra as pessoas 12 247 9 441 6 667

Crimes contra o património 12 147 8 384 8 359

Crimes contra a paz e humanidade/ crimes contra a vida em sociedade

24 959 22 188 13 038

Crimes contra o Estado 7 140 5 843 2 444

Crimes previstos em legislação avulsa

31 329 23 990 10 096

6.2 Anexo II – Dados sobre a Caracterização da Cova da Moura

Estabelecimento de Educação e

Ensino

Abandono

(2004/2005) Total Alunos

Taxa de Abandono

Escolar (%)

EB1/JI Alfragide 7 174 4,0

EB1/JI Quinta Grande 0 251 0,0

EB1/JI Alto do Moinho 2 166 1,2

EB1/JI Orlando Gonçalves 0 187 0,0

EB1/JI Casal da Mira 1 273 0,4

EB1/JI Terra dos Arcos 5 315 1,6

EB1/JI Vasco Martins Rebolo 1 207 0,5

EB1/JI José Ruy 3 302 1,0

Sede-EB1/JI Alice Vieira 2 469 0,4

EB1/JI Cova da Moura 4 255 1,6

EB1/JI Águas Livres 1 170 0,6

Condenados em processos crime na fase de julgamento findos (N.º) por Sexo e Categoria de crime; Anual

Fonte : INE

Análise comparativa do abandono escolar nas escolas EB1/JI no concelho da Amadora

Fonte : INE

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

6. ANEXOS 112

Tipo de utilização do edificado no bairro da Cova da Moura

Fonte : INE

Distribuição dos edifícios por tipo de fundação e por

elementos estruturais verticais no bairro da Cova da Moura

Fonte : LNEC (2008)

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

113 6. ANEXOS

Distribuição dos edifícios por tipo de pavimento e por

estrutura de cobertura no bairro da Cova da Moura Fonte :

LNEC (2008)

Edifícios devolutos no bairro da Cova da Moura

Fonte : LNEC (2008)

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

6. ANEXOS 114

6.3 Anexo III – Levantamento Fotográfico

1

2

3 4

5 6

7

8

9

10

1 – Rua do Moinho

2 – Rua do Moinho

3 – Rua do Moinho

4 – Rua da Palmeira

5 – Rua da Palmeira

6 – Rua do Vale

7 – Rua do Vale

8 – Rua do Vale

9 – Rua dos Reis

10 – Rua dos Reis

1

3 4

2

Levantamento Fotográfico

Fonte : Google Earth e Autor

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

115 6. ANEXOS

5 6

7 8

9

10

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

6. ANEXOS 116

6.4 Anexo IV – Evolução Projectual

Esta proposta foi inicialmente apresentada no âmbito da Semana Relâmpago 2010, uma

iniciativa do Mestrado Integrado em Arquitectura do Instituto Superior Técnico, na qual são

constituídos grupos com alunos de diversos anos lectivos. Tal como o nome sugere, esta iniciativa

propôs o mesmo enunciado do Concurso Universidades Trienal de Arquitectura 2010 de modo a

elaborar estratégias projectuais em apenas oito dias. A reflexão projectual constituída ao longo da

Semana Relâmpago 2010, apontou estratégias relativas a intervenções no espaço público da Cova

da Moura e na procura de uma continuidade urbana entre o bairro em causa e a restante área

envolvente.

Posteriormente, o grupo, no qual foi elaborada a proposta apresentada neste relatório, foi

convidado a dar continuidade ao seu trabalho de forma a elaborar uma proposta, ao longo de três

meses, para o âmbito do Concurso Universidades Trienal de Arquitectura 2010. Ressalva-se o

contributo das apresentações intercalares, com todos os docentes de projecto de arquitectura, e

especialmente da realizada na presença do arquitecto convidado Herman Hertzberger.

Denota-se, desde a Semana Relâmpago 2010, uma evolução da proposta na sua

materialização e na clarificação das estratégias projectuais ao nível das continuidades urbanas.

O Concurso Universidades Trienal de Arquitectura 2010 acolheu cerca de 77 propostas de

dezasseis escolas de Arquitectura e de Arquitectura Paisagista de Portugal, das quais foram

seleccionadas 30 para exposição no Museu da Electricidade em Lisboa. A proposta apresentada

neste relatório foi galardoada com uma Menção Honrosa.

Exposição da Semana Relâmpago 2010

Fonte : http://nuclear.ist.utl.pt/

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

117 6. ANEXOS

Painel apresentado na Semana Relâmpago 2010

Fonte : Autor

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

6. ANEXOS 118

Maquete apresentada na Semana Relâmpago 2010

Fonte : Autor

Maquete apresentada na Semana Relâmpago 2010

Fonte : Autor

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

119 6. ANEXOS

Produção realizada para o Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

Produção realizada para o Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

Produção realizada para o Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

6. ANEXOS 120

Esquissos representativos realizados para o Concurso Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

121 6. ANEXOS

Painel 1 apresentado no Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

6. ANEXOS 122

Painel 2 apresentado no Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

123 6. ANEXOS

Maquete esquemática apresentada no Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

Maquete esquemática apresentada no Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

6. ANEXOS 124

Maquete apresentada no Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

Maquete apresentada no Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

Maquete apresentada no Concurso

Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor

INFLUÊNCIA DO DESENHO URBANO NA INSEGURANÇA DA CIDADE – UMA PROPOSTA PARA O BAIRRO DA COVA DA MOURA

125 6. ANEXOS

Exposição Concurso Universidades Trienal de Arquitectura 2010

Fonte : Autor