Arranjos para silêncio e presságio

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  • 8/13/2019 Arranjos para silncio e pressgio

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    Tadeu Sarmento

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    pressgio

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    Brrke ke ke kex koax koax. Brrke ke ke kex koax koax. Brrke ke ke kex koax koax

    Samuel Rawet.

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    4ada de mais !rgil a#uele de%em-ro precipitado, o -rusco da#ueles dias em #ue sem te

    conhecer costurava a ossatura do #ue seria teu corpo em todos os o-jetos da mem"ria. 5ma

    mem"ria sem passado, uma lem-ran a de voc no lcool -ranco do sonho, onde acordava

    aleijado de saudade, saudade cega, sem marca $o no calendrio, vagarosa, dolorida, com

    l minas !inas e cont nuas a rasgar o desejo de um tempo #ue n$o vivi, seu nome uma

    doen a impressa em meus l-ios, consumindo minhas noites, dentro do meu #uarto

    6santurio da dor7, crepitando po as de chagas na minha pele um arrepio de unha, seu nome

    uma gl ndula viva, pulsando l #uida dentro de mim, minha geogra!ia estranha, ntima,

    como uma irm$ sem consolo chorando sangue nos olhos, deitada so-re uma #ueimadura no

    tempo, o tempo.

    8i%ia seu nome nesses dias, nessas noites de de%em-ro, so%inho, !erido pela agress$o da

    gavetas #ue guardavam tuas !otos, escrevendo vacilante em pap'is a%uis tua crueldade,

    imaginando uma linhagem suicida #ue me pertencesse, tua crueldade sendo o nome de

    todas as coisas #ue te tocavam antes de mim* ventos, !lores, gua, sangue, vinho, ah, eu

    odiava a 8eus por isso, 8eus o animal #uadr)pede, a respira $o hidrulica de todas as

    coisas #ue me !eriam antes de voc.

    u era, no crisol das horas, o dem0nio da minha pr"pria morte, o rel"gio !antasma e sem

    molas, onde nada de mais !rgil da#uele de%em-ro precipitado, do -rusco da#ueles dias em

    #ue desejava morrer vagaroso nos teus -ra os, como uma v tima.

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    Antes de voc, um lugar #ue n$o e iste, a!ogado em lem-ran as rasas, entre os parnteses

    de uma neurose ( era l #ue eu vivia, vitimado.

    Sem sonhos, um pavor germinando desde o h)mus da carne, a mente invlida sa-endo o

    #ue di%er sem no entanto sa-ercomo. :eu lugar ine istente um museu geogr!ico de ossos.

    :astigava o-sess;es, antes do de%em-ro, rememorando um passado sem certe%a de ter

    acontecido.

    4$o sei* ainda n$o. ra como se morto levitasse so- os espasmos do tempo, so!rendo de

    uma melancolia condescendente, tendo pena de mim, macio como um porco o perd$o #ue

    n$o me dava. 8esejava ser perdoado, aceito, a-ra ado novamente / in! ncia #ue n$o tive.

    :inha voca $o para santo* padecer da mesma doen a de meu pai, meu pai terno, um len o

    -ranco en ugando&lhe o suor da testa, os olhos tristes, amargurado, morrendo atrav's de um

    conta&gotas seu colgeno de c ncer.

    Antes de voc eu era um morrer delicado, uma ausncia, morno e inocente e palpitando

    vidros dentro da ins0nia. stava velho, va%io, com dores nas costas e gravatas prontas para

    servirem&me de !orca.

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    havia um sopro #ue pensava por mim, uma l mpada apagada no corredor / ra%$o do

    des!ile das som-ras.

    5m centro #ue intu a como pressgio, um hlito de sa-er voc paralela /s horas #ue se

    passavam, longe.

    >oc o meu espelho, em algum lugar, em algum momento nosso sangue cosido junto,

    entrela ado, um ramo de art'rias, !lorescendo. m algum lugar nossos corpos no mesmo

    re!le o, movendo&se em !ic ;es alienadas da dist ncia.

    era assim, nesse deserto, atrav's da palpita $o som-ria do tempo, #ue algo se unia a n"s,

    e o sopro agora um incndio nos pulm;es, a l mpada um !oco de sangue ensurdecido, o

    centro des!eito em linhos de retas costuradas. Sem dist ncias, sem espelhos, nossos corpos

    leves, imaculados, gmeos dissolvidos.

    ?

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    Sua vo% um m)ltiplo de gua, e me chegava como nascesse ali, no mesmo instante em #ue

    a ouvia, inclinada, a!lorando, um poema conce-ido no sono, na d)vida, !eito tecida em

    outras l nguas ancestrais / sua, vo% de h muito, mon"logo no pesadelo !ri ssimo onde uma

    lua, de om-ros nus, desenhe mar!ins no c'u, e !osse um verso engolindo -icicletas,

    telegramas, janelas acesas na madrugada suicida encerrada em uma !oto ao som de um

    clarinete )mido, de umidade surda, colorida, verte-ral.

    u entre o nada e o nada, sonhando suas m$os em si -emol.

    Sua vo% nascida em plos, cativando meus pulm;es silenciosos, t$o calados #ue tanto me

    es#ue o deles #uanto de um rel"gio tra-alhando a tra a do tempo, meu cora $o o pr"prio

    -al$o #ue se cativa, m#uina dos reservat"rios de gua, com pei es dentro, de-atendo&se,

    um so!rimento convulso, !erruginoso, sua vo% um pssaro atrs da cortina. eu t$o

    so%inho, amor, e a pr"pria palavraamorme espantando a -oca, meus l-ios con!undidos

    nos teus distantes, um n)mero, meu corpo* um estudo do eclipse, sem soma, !lores secas, a

    mem"ria um cinema in)til sem voc.

    apenas tua vo% conhecia, e tua ausncia, e a saudade um gramo!one repetindo pragas, sua

    vo% a nostalgia suja e acorrentada dos !antasmas, serrilhando alpercatas invis veis no

    assoalho crescente. apenas teu gesto oculto imaginado, revelando minha perda, minha

    morte !ria, estando eu dentro de minhas roupas, /s ve%es nu, sempre so%inho, /s ve%es !eit

    de -orracha e inseto. Sua vo% agora um m)ltiplo de sangue.

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    retorno / in! ncia, assim como tudo. Pois todas as coisas do mundo j !oram pe#uenas,

    !rgeis, mortais, a !ragilidade uma esp'cie de crime, de mcula, n"doa sorrindo na -lusa,

    tecido va%io delicado so-re a cadeira. Sim, o pr"prio mundo teve uma in! ncia, um

    come o, lugar onde n$o se via gravidade, inaudito, #uando palavras voavam livres sem

    o-jetos #ue as aprisionassem. eram vivas e rancorosas, as palavras, !lutuavam nuas um

    algod$o #ueimando, livres e p'talas em silncio. eram rel"gios antes do tempo, e !acas

    antes da l mina, as palavras, e assim eram pedras, -engalas, rvores, !ogo, sonhos, m#uina

    de costura.

    :as, antes de voc, !ui pe#ueno e triste, as m$os a-ertas, uma asma comportada / mesa,

    segurando os talheres do jeito certo, sem !0lego, uma roupa a%ul me vestindo nostalgias, a

    respira $o amarga e lenta, as so-rancelhas presas, os ossos mal se sustentando no acr lico

    ine istente do corpo.

    u era assim, e tive irm$os. Binco ao todo.

    Recordo dois meninos e trs meninas, movendo&se* uma lu% sem peso no ar. Bomigo* s

    ao todo, desli%ando no sa-$o da varanda, cinco sem mim, como agora, #ue n$o sei #uantos

    desli%ando.

    Cavia inspira $o na minha in! ncia, onde vivia as palavras sem sa-er #ue as escreveria

    logo, em -reve, em mim apenas um pressgio, a no $o do gnio, as trs irm$s nadando em

    um mar per!umado, espantoso, o mar a pai $o !ria das mulheres, os dois irm$os ouvindo

    m)sica, correndo atrs da -ola, os ca-elos soltos !eito as palavras #ue viv amos. n$o era a

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    in! ncia do mundo, mas a nossa. 4o nosso tempo, o mundo j era velho, a !elicidade gasta,

    o pr"prio 8eus uma ideia em desuso. 4a nossa in! ncia, -al;es incendirios, e a lucide%

    dolorosa de sa-&la passando rpido, rpido, assim como tudo. Tudo, a velocidade de um

    anti#urio inundado no estouro da -arragem.

    tive um guarda&chuva em minha in! ncia, e uma doen a nervosa, e um cavalo de pau e

    um -alan o, dois pares de -otas #ue andavam so%inhos, tive uma m$e e um av0, um pai

    !lcido e idiota, e catapora, tive sarampo, !e-re, discos de vinil e alucina ;es, -onecos de

    plstico, livros e loucura. conversava com o dem0nio, e era um mgico, um assassino, e

    isso antes de arle#uim, e#uili-rista, !oca amestrada. tive irm$os, cinco ao todo, comigo

    seis, mas agora nem sei #uantos, #ue os perdi, e por tanto me culpo, e por tanto detesto

    calendrios e rel"gios, al'm de varandas lavadas.

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    Ainda a minha in! ncia, onde recordo andar na praia trope ando em maremotos, espelhos

    de areia, e ercitando o es#uecimento em um caderno no #ual julgava escrever poemas.

    4ada al'm de um pedante, a praia deserta / minha !rente um corpo su-misso so-re o #ual

    pisava, a carne calcria das conchas, do mar vo%es de mortos emergindo em sal crescendo

    entre os n"s do ar #ue respirava, as guelras telepticas, a-ertas.

    :eu caderno de-ai o do -ra o, es#uerdo, as escler"ticas movendo&se so-re a mem-rana de

    meus olhos acesos, urinrios, en#uanto seguia pensando pensar as grandes #uest;es da

    vida. 4ada al'm de um pedante, de um garoto pouco prtico. nada era escrito por mim,

    meu caderno cheio de palavras va%ias, sem sentido, verdades. nada era pensado por mim,

    meu c're-ro um est0mago digerindo pesadelos, pois tinha dois est0magos / 'poca.

    Sim.

    :as ouvia a vo% dos mortos, o eco dela costurando suas veias em meus nervos, a gramtica

    imper!eita de sua agonia, semeando em minha mem"ria imagens de nau!rgios,

    a!ogamentos, suic dios, tu-ar;es com dentes de mar!im devorando. tive a vis$o de uma

    menina e#uili-rando uma gua&viva nas m$os. 5m tecido as!i iado a co-ria, na#uela tarde

    completava tre%e anos, os olhos verdes, a pele de leite congelado, o tecido #uase

    transparente, a pele idem, #uase di!ana, #uase um sussurro, um gemido #uando me

    depositou a gua&viva na palma es#uerda, #ue #ueimou, emS , en#uanto ela sorrindo

    des!a%ia&se no vento !eito destecendo&se dos pr"prios linhos, na praia, desaparecendo e

    seu aniversrio, a menina do nau!rgio.

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    Retorno ao meu #uarto, portanto longe de voc e da in! ncia, novamente, deitado ao centro

    escuro desse #uarto, onde som-ras gesticulam uma m)sica estranha, cere-ral, as m$os

    tran adas so-re o corpo s$o ra %es, meu corpo, costura enervada de silncio, de sono, so- o

    centro a l mpada apagada, muda, escrnio de smen gelado, en#uanto penso os o-jetos

    loucos e !rios ( cadeiras, pginas, cadernos ( #ue gravitam diante de mim. 8iante de mim,

    a loucura em nu !rontal, acordada comigo.

    Rece-i sua carta, minha assassina sim'trica, minha pele suando videiras de "leo, a )car,

    vinagre, sorrindo ao sa-er de sua caligra!ia nervosa, dan arina, sinta e de lepra girando

    convulsa em saia cigana, oleosa, gramtica v'rte-ra #ue trepida, sangue !lorindo dos vasos.

    Gmaginei sua respira $o nos poros da pgina, em cada um deles, sonhei voc entre as linhas

    sonhei seu cheiro, sua pele, a con!us$o de seus dedos ao do-rar o envelope, sim, as !otos

    vieram, amanh$ colarei na parede* cada uma delas, ao lado da minha cama, para sempre

    admir&las, como #uem olhando um campo !lorido, morresse.

    H4"s somos loucos, nem nos conhecemos pessoalmenteI, voc escreveu. Sim, loucos,

    loucos, -el ssimo isso de ser louco, de viver de ideias !i as, desesperado, ouvindo sinos de

    vidro dentro da mem"ria -adalando, clarinetes, carross'is, rdios e multid;es. 4$o importa.

    Amanh$ morrerei, olhando o campo !lorido.

    >oc, simetria da minha morte, !loresce.

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    Gmerso na#uele setem-ro plido, #uando voc me escreveu, di%endo haver lido algo #u

    escrevi 6sim, !inalmente, um escritor, depois de tantos cadernos va%ios de-ai o do -ra o

    es#uerdo7, suas palavras soando como m)sica, como valsa #ue uma vitrola espargisse entre

    espa os verte-rais. Suas m$os a-andonadas de mim escreveram rpidas a#uela !rase curta,

    curta, mas de m)sica alta, sim, !eito !ossem uma imensa minoria de pssaros de vidro

    revoando no o-sceno espelho do c'u. >oc soprou para dentro de mim um mist'rio lils,

    meus pulm;es angustiados se encheram de mgica, de pressgio, e se !i%eram asas sem

    cautela #uerendo voar. u estava em pa% antes de sa-er suas palavras, antes de voc me

    achar, em pa%, sua imagem um violino a-erto tocando uma escala alucinada, me

    enlou#ueceu.

    m pa% com meu desespero, minha solid$o, minha lordose do esp rito. m pa% com minha

    doen a mental, meus vinis antigos, com minha lepra, deitado e em-e-ido em metros e

    metros de descaso. m pa% com meus mortos, em meu hosp cio, com meu salrio m nimo e

    minhas contas. m pa% com meus e ames de AG8S, meus v cios, meu desejo da morte,

    sereno e calmo o-servando #uil0metros e #uil0metros de cru%es negras da hansen ase. u

    estava em pa% de-ai o do meu guarda&chuva, !a%endo testes de malria, desenhando

    nuvens, empilhando garra!as so-re a mesa, tramando suic dios. m pa% #uando voc

    chegou, tra%endo o o-scuro sonam-ulismo do sonho para minha vida.

    voc veio, e criminosa envenenou meus reservat"rios de gua estagnada. >oc com sua

    o-scura gramtica devorou meus dicionrios irregulares, meu pensamento agora

    !lorescendo apenas para imagin&la. a pa% algo insuportvel agora, a pa% agora um c nce

    nos rins do meu rel"gio.

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    Recordo seu so-renome aceso como um sol no #uarto escuro, ao centro dele, somando&se

    era uma m)sica de cordas surdas tocando dentro do #uarto, a mem"ria de um sonho com

    espelhos, suas letras som-rias compondo a pauta de um silncio dentro da noite, em seu

    cerne, cavalgando.

    Cavia uma v'rte-ra nele, outra ossatura costurada em outro pano, uma imagem pro!unda

    como uma pedra, um guarda&chuva, a perda da mem"ria, a prata dentro dos rel"gios

    regulares.

    *******, disse ao l&lo ( +++++++ ( a repeti&lo, e minha l ngua movendo&se no 'ter, na

    noturna leitura do espanto #ue seu so-renome evocava. 5m crime de gua desli%ando, seu

    so-renome, circular e estrangeiro, com sete letras duras, speras, estranhas, minerais.

    K #ue signi!icava a#uele seteL A#uelas sete l minas !i as !erindo o con!orto dos meus

    olhos, j me tomando a -oca em salto s'tuplo da#uele setem-ro velo%L

    *******, eu cantava, --ado, enlou#uecendo respira ;es de sangue, reescrevendo suas

    letras so-re a pgina va%ia, placa de cer mica no tempo, talve% para entend&lo.

    4unca em minha vida nada se chamou +++++++. 4ada so!ria desse peso, dessa soma de

    assom-ros dando n"s. u era virgem para a nova palavra #ue nascia, seu so-renome, entre

    as h'lices do sonho. Talve% 8eus atendesse por*******, ou o 8em0nio, n$o sei. Talve%

    !osse ******* o nome de uma nova cincia, de uma nova cor, laranja ensangJentada

    !lorindo no deserto dos vernculos.

    MoucoL 4$o, mas sem os o-jetos #ue a correspondessem. >irgemL Sim, para a palavra

    +++++++, seu so-renome, #ue nascia. Portanto virgem para voc.

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    havia seu nome, sonoro e comum, respirando un ssono na costura do mundo outros

    nomes #ue n$o voc, seu nome a-erto em linhos #ue deci!ravam outros tecidos antes dos

    teus, todos esgar ados e -elos, so-re o dicionrio das m#uinas, todos di%endo ru dos teus

    so-re o poema ainda n$o escrito, n$o !eito, veloc ssimo dentro da noite, versos acima do

    silncio aparente das coisas, pairando um vestido va%io em acr lico, oco por#ue te

    esperando, desenhando ar a ranger os dentes na -ranca sala de espera.

    havia seu nome, dissolvido na mem"ria do mundo, dentro do seu clculo !rio, so-re os

    campos onde o vento varria as camisas -rancas, seu nome invadindo as janelas a-ertas em

    "pera de insetos e pssaros, gesticulando seu movimento sonoro diante de tudo #ue n$o te

    di%ia, o mundo.

    ra a -ailarina estudando a !onte dos gestos, seu nome. A !lorista #ue morreu atropelada na

    !ai a -ranca ( um cravo de sangue entre os ca-elos. Seu nome a secretria #ue colocou os

    #uadros no escrit"rio, a compositora de noturnos, melanc"lica, a escritora #ue alimentava o

    gato siams.

    Seu nome a prostituta desprotegida da chuva, a louca #ue estrangulou os !ilhos com a corda

    do piano. Seu nome a recepcionista, a vendedora de sorvetes na pra a incendiando, a

    trape%ista #ue amava o palha o e !lutuava, !lutuava, !lutuava, varando o ar #ue tam-'m n$o

    te di%ia, e assim como n$o te di%ia a mulher do !uncionrio p)-lico* a dan arina #ue perdeu

    o pai a!ogado.

    Pois havia seu nome, sonoro e comum, di%endo so-re o mundo todo o seu contorno. Por#ue

    seu nome era la, assim como tudo.

    1=

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    8esde crian a o espanto pelas palavras, os cotovelos -ai ados so-re a inclina $o da noite.

    A casa va%ia, teatral, sempre va%ia, sempre silncio #ue se de-ru a al'm da -ele%a de uma

    a-ertura pulmonar sangrando. A casa va%ia, en#uanto o menino pensa a palavra*vrtebra, e

    se espanta, um p nico entrela ado / pr"pria linha a do esp rito. K espanta a m)sica da

    palavra*vrtebrasoando, indo al'm dos dicionrios. 4a casa va%ia, ele n$o sa-e o o-jeto da

    palavra*vrtebra, por isso a v dan ando / sua !rente, em epilepsia sem gramtica. 4a casa

    va%ia, h livros vagarosos demais para o seu pensamento. Pginas surdas em algod$o

    voltado para dentro, sem #uadris ou olhos, pulm;es ouvrtebra. >olta a enlou#uecer ao

    pens&la novamente*vrtebra, vrtebra, a casa va%ia, sem amigos ou gatos, e avrtebral,

    -ailarina sem !ace, a pele de salsa o-scura.

    Se n$o estivesse so%inho, talve% n$o pensasse nela assim, ecoando*vrtebra, vrtebra,

    vrtebra. :as est, ao seu redor um deserto de vernculo e pessoas, nada para aonde

    avan ar, encetar conversa, dirigir palavra, a casa va%ia e sem sentido, uma o!icina de

    violinos #ue-rados.

    A m$e !oi em-ora, o pai n$o e iste, as irm$s -rincam em silncio como se mortas. :$e pai

    e irm$s agora apenas palavras, dessas #ue n$o o espantam mais, por#ue j as sa-e o-jetos.

    :as n$o vrtebra, ah, ela n$o. K #ue diria avrtebraso-re o mundo, so-re sua triste%aL

    4ada, talve%.

    Talve%vrtebraseja um lugar para onde ir, um re!)gio. Talve% emvrtebrae ista algu'm

    para conversar. Talve%, talve%.

    1?

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    8esde crian a, imerso no espanto das palavras. Antes do seu nome e so-renome, havia

    vrtebra, um cardume delas. 8epois* salsa mercrio n meral! le"ra e cle"si#ra. $ ar#a%

    c& va. 8epois,voc', em nome e so-renome, e a casa #ue nunca mais va%ia.

    1@

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    Ku a* s$o palavras girando convulsas, suspensas, cegas em suas saias, demoradas, sem

    o-jetos #ue #ueiram di%&las. S$o varais as palavras suspensas so- as plpe-ras do sono

    esticadas, no va%io numeral do sono. est$o antes da pgina em -ranco, antes de seu

    min'rio, sementes !i as girando.

    Ku a* a pgina em -ranco ' onde cai a noite, a noite, a m$o presa em sua !ace mineral.

    ntre as pginas e as palavras* a m$o ( a longa ins0nia dos dedos sestros do autor.

    >eja* h um pensamento comum #uerendo norte&las, o pensamento uma pedra so-re a

    mem"ria, ou so-re a perda dela, n$o importa* uma pedra. C instinto nesse pensamento, um

    semear de p"len na escurid$o de palavras #ue giram. Nus#ue o pensamento, dei e !luir o

    sangue so-re a pedra so-re a mem"ria ou sua perda e n$o es#ue a* h um te to se !a%endo,

    dos sestros dedos, #uerendo a pgina um campo !lorido de o-jetos un nimes. Ku a. >eja.

    4orteie as palavras.

    Semeie.

    1D

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    Pois nunca se sa-e onde ' o te to, sa-e&se outra ve% nascido, apenas, do es#uecimento ou

    da lem-ran a, o te to, onde as palavras tornam&se outras, gramticas, apenas seu re!le o

    girando, desde as costas ao espelho dos olhos.

    K te to* pedra #ue o pensamento poliu, deu medida, !orma, m)sica, soprou dentro um

    desespero. K te to !ruto do engenho do o! cio, erguido da pauta seu a )car negro, sua noite

    mal&dormida de nau!rgio.

    K te to, pesadelo compacto, nomea $o escrita na pgina a -at&la de dentro seu min'rio. K

    te to um n)mero de palavras #ue romperam, !i%eram&se.

    K te to, poema talve%, tocado por teus dedos, inoculou em sua retina a pedra da noite em

    #ue !oi !eito, #uando as palavras assumiram novos o-jetos, novas !ormas, novas inten ;es

    de uso.

    HOuero pedir mais te tos ao autor #ue o escreveuI voc pensou, e em silncio me disse de

    longe sua !rase.

    A mim, #ue possu a uma mesa surda, uma caneta, al'm de pginas e pginas e pginas.

    mim #ue n$o possu a nada al'm do pressgio.

    1E

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    1?

    Retorno aona#a #e mais (r) il a+ ele #e,embro "reci"ita#o, onde um rel"gio surdo /

    minha nervura move&se em resina lenta, lenta, rigorosa, dedicando suas molas arrastadas ao

    meu desespero. Pertur-a $o.

    K tempo ( alum nio intestinal ( digere a pressa das horas dentro de uma cer mica !i a.

    4ada parece mover, e nada move, em tudo um peso de mil p'talas, em tudo o dia j

    nascendo pregui oso, complicado, severo, lento, so-re um estacionamento de -ocejos.

    Ks ossos do dia n$o passam nunca, voc cindindo !eridas / !or a de lei sancionada, !eridas

    em tudo #ue toco, #ue ao meu redor e iste, e dentro de mim ainda, suas escoria ;es de

    saudade.

    Retorno aona#a #e mais (r) il a+ ele #e,embro "reci"ita#o, #uando minha l ngua

    adiantou&se a di%er #ue te ama, estalando uma curva met"dica de m)sica, lepra r gida a

    #ueimando peristltica, ao meio, em !lora $o de agonia. HTe amoI ela disse, e o dia esta

    entorpecente pregui a, anloga / nostalgia do meu sonho, e contra o avan o #ue desejo para

    as horas.

    K tempo* um a-ismo deslocando&se, assim como entre n"s a dist ncia um cardume de

    corais, respirando mrmore dentro de um oceano intestino, imenso, indi!erente a n"s em

    sua hidrulica elo#uente, vasta, perempt"ria. :as irei, / e igncia de ritmo acelerado,

    en!orcar meu desespero nesses pndulos, nesse rel"gio surdo e resinoso, e esperar, esperar,

    mas de pulm;es em movimento, e art'rias, e veias, e mem"ria ( cora $o suspenso em

    sangue.

    HQ comprei as passagensI eu disse, na#uele de%em-ro precipitado.

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    1D

    Retorno aoa casa n-o mais va,ia! recor#a, onde cai a noite, tam-'m severamente, so-re

    um pavimento de mem"ria.

    H st mortoI, alguns disseram, acerca de mim. HA casa antes era va%ia, agora cheia de

    #uLI, outros di%endo, a l ngua solta no h)mus e#uidistante das -ocas.

    4$o en ergavam a dan a #ue era para mim seus movimentos, so- a noite #ue ca a, laje do

    c"rte cere-ral, caindo. H4$o est morto, mas loucoI outros disseram, em -al' de s !ilis

    terciria. H

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    1E

    A#uilo #ue tocava ( devagar, atonal, lacustre ( estava desde a in! ncia, adormecendo,

    costurada / lu% do agouro num'rico das coisas.

    4a in! ncia* minha, mas tam-'m do mundo, #uando palavras eram tens;es na escala de

    uma m)sica, em silncio.

    K #ue tocava ( desde a solid$o das garra!as va%ias aos pre!cios levados pelo vento ( o

    !a%ia de um jeito leve de sono, #uerendo acord&la.

    8esperta.

    le disse* seu nome adormece nas ra %es de tudo, ' para onde convergem todos os

    sin0nimos do mundo, a radial de todas as veias, art'rias, ' a#uela #ue toco.

    4o sangue das super! cies.

    tocava, pressentia, tentava acordar, !a%endo emergir do p nico a pele do #ue tocava,

    como #uisesse mostrar /s coisas son m-ulas dela, a essncia de sua soma, essncia #ue

    nela ha-itando ( pressentida, tocada, desperta ( emergia em pavor agora nomeado.

    Poema.

    Muminosa, dita, urgente, dando nova cor ao cromatismo dos espelhos ( estava nas invers;es

    e ningu'm via, no uso genu no do mar!im calcinando os ossos ( de-ru ada so-re as horas,

    os a#urios, na delicada melancolia das crian as* era ela a#uilo #ue se tocava ao cerne de

    tudo, do metal dos martelos / automo-il stica da !ecundidade.

    la, seu nome de vidro aceso.

    ra ela* pairando so-re os espasmos, #uando veio e disse ( ' sua.

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    Bome ava em segredo* a dist ncia, em conluio com as molas do tempo, dos rel"gios, do

    avan ar o tempo em petr"leo, em !i-ra tensa, de cent metros a metros de #uil0metros,

    come ava em segredo o avan o ( mastigando.

    8o homem* suas horas, o mist'rio !rio de suas e#ua ;es. Bome ava lento a ritmo de

    algod$o, depois, mais velo%, velo%, tomado de agonia, desespero, arame circinal tecend

    sangue, circunvoluindo.

    Bome ava em segredo seu nome de silncio, de posse da morte um cravo / !aca soerguida,

    prata progredindo no sono reclinado do merc)rio, em segredo seu nome, respirando nos

    pulm;es macios da mem"ria.

    Oue pulsava.

    A!lorava no n" da noite, sonora noite de halo )mido, vi-rat"rio, seu nome um ramo de !ruta

    adocicando a l mina dos l-ios do homem #ue atravessava a dist ncia, velo%, velo%, como

    engolisse -icicletas.

    8 namos.

    >encia o homem a nuvem precipitada, de encontro / tra#ueia gravitacional, a cada palmo

    um suspiro entregue aos aros.

    s h'lices, girando.

    Bome ava em segredo o -ranco dia !uturo, aonde ele ia* avan ando.

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    Semear as palavras ao a-andono da pgina. Tecer caligra!ia so-re as convuls;es do mundo.

    Romper da reclus$o das ideias uma rosa intacta, sem ntica, e dissolv&la no ar como um

    p"len !etal, irrevers vel.

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    Retorno aoe &avia m so"ro + e "ensava "or mim! ma l0m"a#a a"a a#a no corre#or 1

    ra,-o #o #es(ile #as sombras, onde h sanguessugas ladeando a l mpada, circulares,

    lavrando com seus dentes sua lu% escassa, digerindo&a, !a-ricando estios entre as som-ra

    arti!iciais. stou s", a solid$o um ar#uip'lago, um guarda&chuva, um par de -otas imerso

    em miasmas.

    ou o a o!icina dos cr nios* s$o sanguessugas polindo a digest$o teleptica. Tudo o #ue '

    sonoro resvala em mim um sangue salpicado, !erruginoso, corre em assoalho de l ngua

    rever-erando a m)sica cautelosa das esp'cies som-rias ( sanguessugas, guarda&chuvas, par

    de -otas )midas, armrios tocando sonatas.

    4oturnos.

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    Couve de%em-ro, sua precipita $o, paisagem erguida em vertigem, respirando al'm do

    tecido rotativo dos calendrios. 5m ms plido, lento, delicado, como um acr lico entre os

    pulm;es, mas, pr"spero em sua pregui a de passar, palpitando de promessas e pressgios,

    sua m)sica. 5m cora $o de animal inocente* ele houve, e istiu, em violncia noturna

    demonstrada de seus dias, negros.

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    Recorda, costurava&se no tempo da#uela tarde, tarde na#uela praia de pulm;es a!ogados,

    gesticulando, onde ondas desdi%iam todo o silncio do a!ogamento, dos gestos, na#uela

    tarde. la estava l, a dor intolervel de sua presen a, pressentida, antecipando o terror dos

    meses j ditos ( era o corpo inclinado so-re a !ome, sendo lido.

    K tempo, imensa massa circular, m"vel, cin%enta, esculpida nos instintos originais da terra

    ( recorda, a pedra em seu discurso es#uecido, a pregui a lacert lia da pedra, pedra /s

    avessas, pedra !eita de pluma, sa-$o, a #ual sua m$o lan ou ao mar como um pre!cio

    antigo. Recorda, costurava&se no desespero transparente das guas, ao arco descrito da

    pedra* seu monumento de sonho.

    stava onde ningu'm atrav's da mem"ria esteve. ncenava&se na corros$o da morte, a

    lem-ran a a elei $o eterna do !uturo, sendo o passado o c"rte !i o na gramtica o-scura

    dos instrumentos.

    rguia&se, suspensa e m stica, com seus len os de t'tano a-ertos, so-re a sonolncia dos

    solos, das pedras, convocando / e ecu $o toda nostalgia, cada dor especular, as omoplatas

    rangendo em sua gravita $o de sangue.

    ra ela em orgia larval, pontilhada nos meridionais das horas, elstica para #uem se

    despede, no livre del rio de seus movimentos. Pulmonares* ao monumento de sonho #ue se

    ergueu, #uando passou.

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    Retorne aoe retorno 1 in(0ncia! assim como t #o, onde seus irm$os s$o imensos e

    assustadores, arteriais movendo&se, ao redor deles palavras ngremes e nuas, livres,

    nomeando inclinadas.

    ra o dia a-erto ponta a ponta, o primeiro espa o do tempo, argiloso, empurrando as idades

    em dire $o ao a-ismo.

    Agarre&se / !i-ra t til da mem"ria ( !lor cavada em um canteiro d gua ( e te a o #ue

    precisa ser dito acerca do incesto.

    Sim, a nervura, o so-ressalto ju-iloso* v al'm disso* to#ue a toalha das imagens, recolha

    dos ru dos sua e press$o m ima de so!rimento e indi#ue* ela estava l.

    ra ela o a-ismo para onde as idades iam sendo empurradas. K tempo, a resina do tempo

    estreito, tecendo a seda devorada de sal, e pandindo&se deglutida, enri#uecendo na des!olha

    das rvores sua cloro!ila de ar.

    RecordaL Retorne aos irm$os imensos, su-mersos, cinco ao todo, com cravos de suor na

    palma das m$os. K-serve as irm$s* eram m#uinas suaves, a !lor do estupro entre as co as,

    recorde #ue enlou#ueciam, #ue possu am ostras menstruando dentro, nos ovrios de

    cer mica, dentro, coalho coarctado ao a%edo do sangue, germinando, germinando,

    enlou#ueciam, sua denti $o de inocncia.

    Agora, os irm$os* eram asmas oleosas, sonolentas, a lavratura da s !ilis nos olhos, impressa,

    recorde #ue cresciam, #ue lhes do a o smen apodrecendo nas c nulas, no lume oleaginoso,

    dentro deles a rai% !incada no esterco hidrulico, grelando, grelando, suas hortali as em

    p nico.

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    Sim, o !asc culo de !i-ras na placenta, seu rev'r-ero diagonal* v al'm disso* roce com a

    l ngua o carpir desses ossos e diga* ela estava l. ra ela a seda. K so!rimento. A ostra. A

    s !ilis. K smen.

    K pressgio.

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    havia a m$e* a m$e acidental, tumular, )nica, nervura costurada em mrmore, deitada

    como deita o aneurisma so-re a seda, a lepra contra as cru%es, de ca-elos negros, sul!)ricos,

    os seios inclinados e )midos, melanc"licos, a m$e ( encharcada de sono, de loucura,

    mortal.

    Sem destino ou princ pio, sem a!astar de si seu dem0nio, a m$e* v'rte-ra originria,

    geradora do caos das demais v'rte-ras, com ra %es #ue a cincia s" e plica atrav's do

    co-alto, dos intestinos. A m$e ttil, sussurrando, nomenclatura da pertur-a $o, m$e original

    e em-e-ida na eletr"lise, sua carne a sopa org nica de onde sa ram todos os animais de

    #uatro patas ( eu, inclusive.

    !icava l* a m$e, imensa lepra im"vel, tumoral, negra nas omoplatas, nos a-ismos,

    tentacular, !i a e si!il tica, me chamando.

    Sua vo% era o som seco #ue rangia, seu veludo -em tratado, sua pel)cia macia, espessa,

    card aca.

    Sua vo% o centro para onde convergiam todas as alimrias ( eu, so-retudo.

    Oue ia, a #uatro patas, asma #uadr)pede e silenciosa, sem essncia pro!unda, sem

    totalidade, com a !ace partida dentro de um espelho cristalogr!ico.

    A%ul.

    estava l* a m$e imemorial, perp'tua, nua como uma plpe-ra, pulsando, cantando entre

    os l-ios a nostalgia suja do meu nome, a se ciliar meu nome desenhado em m mica, mas

    dito com pavor e nojo.

    8esejo.

    H>emI.

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    eu ia, e indo como se contra as pedras, como se me / espreita um 8eus gutural, !aminto,

    cartilaginoso.

    Pornogr!ico.

    :as voc estava l, tam-'m* dando !orma e estrutura aos cristais do espelho onde minha

    !ace, !ragmentada, se partia.

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    Recordar ' estar entre escom-ros* tra a jantando livros de magia. estar ante o rumor alto

    e crescente ( de -otas, de a o surdo, !rente ao hlito lacert lio das esperas. 8esesperado,

    !erido pela hansen ase, recompondo. Recordar ' erguer da linha a mem"ria em-a ada, sua

    imagina $o de nusea, seu va%io de lavat"rio, negro, negro* escor-uto.

    reviver novamente* elegendo cansa os, colet neas de chagas, -u#us de -orracha.

    Recordaro amor e s a "ervers-o3 a tr plice desse interl)dio, #uando a as!i ia era secreta,

    secreta, demon aca, espessa, irritadi a.

    Recordar ' estar entre tais visitas indesejadas* sa-er&se animal novamente, de v sceras

    voluntariosas, relem-rando. estar !rente ao to#ue urinrio do del rio* derru do, v treo,

    assenhoreado.

    C epit!ios para as recorda ;es, pesadelos inominveis, velas !a%endo -uracos no escuro.

    5m m)sculo #ue cresce / rai% de espasmos, palavra por palavra* retesando&se. dentro do

    epit!io* vrias !ormas de se morrer em casa ( na cama onde nasceram suas dores. dentro

    do pesadelo* uma denti $o vertical esperando sua nomea $o de retorno ( retorno. so-re a

    vela acesa* um cais de som-ras acenando seus m)sculos de l ngua ( l ngua.

    Recordar ' estar entre os mortos, novamente.

    3@

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    Poderia retornar aona#a #e mais (r) il a+ ele #e,embro "reci"ita#o, ou aoera toca#a em

    t #o! 1 veloci#a#e #e es"el&o, mas* n$o.

    Retornaria, se #uisesse. Talve% at' / vagem mineral onde !ora um !eto verte-rado, )mido,

    acoplado a signos ainda goros, gorado ele mesmo* #uadr)pede surdo ( alcati!ado aos

    intestinos, irregular, s"rdido, ine#u voco, perverso, mas* n$o.

    Agora resta avan ar, em m mica raciocinada, e atrav's do gestual das !issuras so-re o

    tempo seus acidentes. Avan ar* como avan am os cogulos, o c ncer, o !'retro negro

    atrav's do cont nuo cilindro dos espasmos. Avan ar, apenas, a seda son m-ula acenando.

    avan ando retornar at' ela, ao seu a%ul agudo, sua olaria num'rica, seu sentido intestinal

    de espera. Retornar ao #ue era tocada, em silncio, dentro das lojas do sono. Retornar ao

    #ue antes de e istir condenava todos os o-jetos /s #uatro patas.

    sem hesita $o, sem a soma dos medos e istente no mundo. Gr ao encontro, !inalmente, do

    #ue n$o se poder descrever em palavras, #uando tocado.

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    >iver ' reagir /s escoria ;es da vida. Pensou so-re isso en#uanto o avi$o pousava ( canela

    soprada no prato ( no cimento !rio do sonho.

    Sim, um sonho, seu monumento erguido atrav's do so!rimento dos s'culos, despontando

    desde a in! ncia 6sua e do mundo7 uma promessa de !i-ra cont nua.

    Respirada.

    As escoria ;es da vida se ganha ao galg&la* espelho hori%ontal da l mina a es!olar a

    epiderme.

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    a #ue era tocada, a #ue come ava em segredo, semeada, a #ue se costurava no tempo das

    tardes, a #ue o #ue tocava imprimia em convuls$o todos os sonhos, todos os pesadelos. la,

    a #ue n$o poder ser dita #uando tocada, !inalmente, por seus dedos. la, #uando o #ue a

    tocava disse* e 8eus ' anal.

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    Toc&la em seda o #ue o corpo n$o mais ocultar* o #ue !a-ricava em silncio, o corpo,

    desde h muito, duplicando. Toc&la o to#ue em suspenso, sua mediatri% sangu nea, a

    carnadura elevada e nua ( o sopro, sopro, tonal. Toc&la a dissolu $o, a v'rte-ra, o #ue n$o

    se nomeia #uadro a #uadro ( o acr'scimo caluniado da pr"pria divindade.

    Toc&la como tocaria a gramtica se a conhecesse, se as palavras a pudessem di%er, nomea

    di%er dela dentro da agress$o dos versos. la assim* a #ue ser tocada, em varivel, e acima

    da compreens$o geom'trica do mundo. la* o monumento do sonho* tocar.

    Toc&la como um hospedeiro, por dentro, e da#ui a pouco. 5m irm$o duplicado e gmeo,

    atuando em sopro intenso, dentro. Toc&la o #ue as palavras n$o poder$o, suas !lores

    vaginais. A verdade revelada tocar com a ponta, dos dedos, !eito #uilhas, recortando a gua.

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    Atrav's da mem"ria, da m)sica erguida em secre $o acr lica ( de seus ossos ( chegou&se ao

    a-ismo alienado dos erros, t midos. >eja* h palavras rami!icadas no negro dele ( do

    a-ismo ( cortadas em -issetri% de silncio. 4ada poder di%er, as palavras, nada poder

    tocar de original al'm da assepsia surda de suas inutilidades.

    4ada di%, nada toca, cogulo so-re cogulo, nada implora um gesto de vida nessas linhas,

    desarticuladas, escritas, se#uer.

    Partir do tormento, apenas, da ang)stia geradora de todas as demais, como a lem-ran a de

    uma cauda s mia movendo&se na -ase em cada!also do c"cci .

    Ao menos, a cauda servia para espantar insetos.

    Bomo direi#ir) #ue ela estava onde sempre esteve, mel&eesperando, sua simples presen a

    #ue-rando a l"gica das alimriasL Ela estava l)! o es"eran#on$o di% nada, nada di%, nada

    al'm dos dedos do assassino em terceira pessoa, sangu nea. :as estava, e desde a#uela

    tarde imensa da praia, imersa em seu va%io numeral, sua dist ncia in!initiva. Bomo di%er

    isso depois de, !inalmente, toc&laL

    4$o, nada pode ser acrescentado / super! cie em seu conjunto. rente / rai% %ool"gica do

    mundo* cala&se, ou cala&se.

    Como #irei + e a ) a%viva me + eima at &o4e5 6 e ( i #ani(ica#o "elo amor + e

    "ressentia5 6 e o "ress) io #esvelava%se "ara mim como ma ca sa ( sica "er(eita5 Ao

    92

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    ( ncionamento #os me s rel7 ios! #e min&a (lora visceral5 6 e De s imenso! s r#o!

    elatinoso! mas + e "oss i vrtebras5

    8-o! n-o #irei na#a alm #o sil'ncio e se s arran4os.

    A#ui aca-a a pgina, onde se inicia a medula do assom-ro.