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  • L u i z C a r l o s A s s i s I a s b e c k

    Doutor em Comunicao e Semitica pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC-SP)

    Professor e pesquisador no Curso de Comunicao Social da Universidade Catlica de Braslia (UCB)

    Professor de Comunicao Empresarial nos cursos de Turismo, Administrao,Marketing e Contabilidade da UPIS Faculdades Integradas, DF

    Professor de Jornalismo Empresarial e Comunicao Integrada nos cursos de Jornalismo e Cinema do Instituto de Educao Superior de Braslia (IESB)

    Coordenador do MBA Comunicao Organizacional da UPIS Faculdades Integradas, DF

    Representante do Brasil junto Federacin Latinoamericana de Semitica (Fels) Autor de A arte dos slogans (Annablume: So Paulo, 2002) e dezenas de captulos de

    livros de organizao, artigos cientficos e ensaios, publicados no Brasil e no exterior [email protected]

    Imagem e reputao na gesto da identidade organizacional

  • Resumo

    Imagem e reputao so aqui estudadas vista dos conceitos de discurso e identida-de. A gesto da identidade se d pela compatibilizao das intenes do discurso comas impresses interpretantes (imagem). A imagem estudada como construo men-tal, fugaz e inconstante, pautada em sensaes e afetividades, ao passo que a reputa-o entendida e questionada como imagem consolidada, como resposta impres-so causada pelos estmulos discursivos.

    PALAVRAS-CHAVE: DISCURSO IDENTIDADE IMAGEM REPUTAO

    Abstract

    Image and reputation are studied here in the light of the concepts of discourse andidentity. Identity management is applied through alignment of the intentions of thespeech with the impressions made on consumers (image). Image is thus seen as mentalconstruction, which is short-lived and unpredictable, ruled by feelings and affection,while reputation is perceived and questioned as a consolidated image, in response tothe impression made by the stimuli of the discourse.

    KEYWORDS: DISCOURSE IDENTITY IMAGE REPUTATION

    Resumen

    Imagen y reputacin se estudian aqu en vista de los conceptos de identidad y discur-so. La gestin de la identidad est dada por la aproximacin de las intenciones del dis-curso a las impresiones interpretantes (imagen). La imagen se estudia como una cons-truccin mental, fugaz e inconstante, y se basa en sensaciones y afectividades, mientrasque la reputacin es la imagen consolidada, una respuesta a la impresin causada porlos estmulos discursivos.

    PALABRAS CLAVE: DISCURSO IDENTIDAD IMAGEN REPUTACIN

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    Uma das principais dificuldades com que se deparam os pesquisadores e estudiososda comunicao est ligada compreenso de conceitos-chave de sua rea de traba-lho. Alm de complexos, e por isso mesmo confusos, alguns conceitos, antes de seremsuficientemente elucidados, passam a ser difundidos na prtica comunicacional de ma-neira indiscriminada, sem o necessrio cuidado exploratrio, proporcionando desvios me-todolgicos e concluses inconsistentes em estudos muitas vezes bem encaminhados.

    No pretendemos aqui resolver tal problema, mas levantar a questo em torno de al-guns conceitos que tm vigorado na Comunicao Organizacional.

    Como a Comunicao uma cincia eminentemente multidisciplinar, ela herda con-ceitos originrios de outras reas do conhecimento, dando-lhes feies prprias econtornos coerentes com o corpus epistemolgico que a sustenta. Essa migrao trazmuitos ganhos ao conhecimento, mas pode causar tambm grandes danos.

    Deteremo-nos, neste ensaio, no estudo dos conceitos de imagem, identidade e reputa-o, essenciais ao estudo da gesto da comunicao nas organizaes.

    Do discurso imagem

    Em nossa tese de doutoramento1 j levantramos a questo da identidade como de-terminante para o entendimento de outros dois conceitos que interagem na sua pro-duo: o discurso e a imagem.

    O discurso um conceito herdado da tradio lingstico-textual, mais precisamentedo estruturalismo e da semiologia europia (GREIMAS et alii, 1967; MAINGUENEAU,1998; LOZANO et alii, 2002 e DUCROT, 1975). Da produo de estruturas textuais,migrou, ampliando seu espectro para a produo de todo e qualquer conjunto de lin-guagens que caracterizam a cultura (LOTMAN, 2002) e outras prticas especficas(GREIMAS e COURTS, 1982; ORLANDI, 1986), sendo abordado no campo das or-ganizaes (SCHWARSTEIN, 1985), das cincias comportamentais (FOUCAULT,1996), da publicidade (PEREZ TORNERO, 1982), das religies (JORGE, 1998), da po-ltica (ORLANDI, 1983), da psicanlise (LACAN, 1978), entre outros.

    1 A administrao da identidade um estudo semitico da comunicao e da cultura nas organizaes,Programa de Estudos Ps-graduados em Comunicao e Semitica, PUC-SP, 1997.

  • Entendemos o discurso como organizao e produo de informao em linguagens,com o fim de explicitar e caracterizar intenes, desejos, crenas e convices, mo-dos de ser e atuar no mundo, enfim, como um conjunto organizado de textos naacepo que Lotman (2002) empresta a esse termo que expressa algo a respeito dequem o produz ou emite.

    As contribuies de Mikhail Bakhtin amplitude do conceito de discurso diversifica-ram sobremaneira seu espectro. Em sua tese de doutoramento de 1941, sobre a obrade Franois Rabelais2, Bakhtin desenvolveu o conceito do que ele denominou dialo-gismo, evidenciando que todo discurso embute em si mesmo a pressuposio de umpossvel discurso do interlocutor (e da cultura) que com ele interage. Dessa forma,no h como considerarmos o discurso isoladamente do pblico ao qual se destina,do receptor e do ambiente do qual emergem esses textos organizados e com funo(LOTMAN, 2002).

    Levados ao campo da recepo, identificamos ainda em nossa tese de doutoramen-to (IASBECK, 1997) a emergncia daquilo que denominamos imagem, ou seja, aconfigurao mental e sobretudo afetiva que o receptor elabora com base na relaodo discurso que recebe e suas prprias idiossincrasias, experincias anteriores, visesde mundo, desejos e necessidades.

    Para delimitarmos o conceito de imagem, apoiamo-nos na obra fundamental do nor-te-americano W. J. T. Mitchell, Iconology: image, text, ideology, publicada inicialmenteem 1986 pela The University of Chicago Press. J no primeiro captulo (What is a ima-ge?), Mitchell nos mostra as fronteiras existentes entre aquilo que denomina famliade imagens, relacionando as competncias de significao desse conceito em diver-sas possibilidades de aplicao. Ele nos fala das imagens grficas impressas e escul-pidas, a exemplo das pinturas, esttuas e designs ; das imagens pticas de projeoe espelhadas ; das imagens perceptuais captadas pelos rgos dos sentidos, a aparn-cia das coisas, as espcies etc. ; das imagens verbais advindas das metforas, descri-es e narraes literrias e, enfim, das imagens mentais formadas pelos sonhos,pela memria, pelas idias, fantasias e fantasmas.

    Embora tal classificao nos parea rgida e despregada da realidade sempre um ema-ranhado dessas possibilidades , Mitchell tem o mrito de nos situar textualmente nocampo da observao e da ponderao cientfica que pretendemos ao nos referirmosao material resultante da interpretao do discurso recebido num ato de comunica-o qualquer e, aqui especificamente, no contexto do discurso organizacional.

    Ao optarmos por classificar como imagem mental aquela formada pelo consumi-dor vista dos anncios publicitrios, da sua experincia pessoal de atendimento nu-

    IMAGEM E REPUTAO NA GESTO DA IDENTIDADE ORGANIZACIONAL LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK

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    2 A cultura popular na idade mdia e no renascimento. Hucitec: So Paulo, 1993.

  • ma empresa, num determinado tempo e lugar, dos diversos estmulos visuais, acsti-cos, olfativos, tteis e dependendo do caso gustativos de um mesmo emissor, es-tamos tambm assumindo a complexidade de tal formulao no que concerne im-bricao desses estmulos na mente do receptor.

    Dessa forma, recorremos Teoria Geral do Signo, de Charles Sanders Peirce3, paracaracterizar as nuances significativas da imagem mental para aquele que a produz. Apsanalisarmos as possibilidades icnicas, indiciais e simblicas da imagem mental pro-duzida pelos discursos organizacionais, localizamos no campo do cone a mais fortede todas as impresses. Ou seja, a impresso causada pelos discursos organizacio-nais na mente de quem os recebe tende a ser fortemente icnica e, portanto, eivadade emoes, humores, sensaes, qualidades estticas e afetivas. Isso no quer dizerque a imagem no indica ou simboliza, mas que todos os demais atributos advm dacompetncia afetiva. Por esse motivo, a imagem das organizaes na mente dos seusdiversos pblicos (e tambm na mente daqueles que a integram) tende a ser fugaz,efmera, vulnervel a alteraes de toda ordem (humores, condies de tempo, am-bientes e contextos, relaes extratextuais etc.).

    Evidentemente, aferir uma imagem to inconstante e instvel, alm de ser temer-rio, pode ser mesmo uma atitude organizacionalmente irresponsvel, uma vez quepesquisas dessa monta tm elevado custo e resultam em informaes pouco teis pa-ra os formuladores do discurso. Urgia, pois, buscarmos novas alternativas, produtiva-mente viveis, de aferir a qualidade da imagem, de modo a subsidiar as reformulaesdo discurso. Ainda que no nos ocorram formas de deter a imagem, entendemos quetoda pesquisa nessa direo deveria contemplar a instabilidade dos seus resultados.Portanto, as pesquisas deveriam ser constantes e no apenas sazonais , de forma acontemplar as oscilaes da qualidade da imagem no tempo e no espao.

    A aferio da imagem pela satisfao: uma experincia

    No perodo de 1998 a 2001, testamos no Banco do Brasil uma pesquisa de satisfaodo cliente que buscava to-somente aferir a qualidade de sensao provocada pelo dis-curso da empresa nos seus diversos pblicos. Disponibilizada de forma randmica nosterminais de atendimento informatizado da empresa, de vasta capilaridade no terri-trio nacional, a pesquisa aferia a satisfao do cliente no momento de sua manifes-tao. Ao mesmo tempo, todos os dados registrados eram agregados em sistemas in-formatizados que os categorizavam e transformavam em pontuao os resultados

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    3 In: SANTAELLA, Lcia. A teoria geral dos signos: semiose e autogerao. So Paulo: Ed. tica, 1995. p.83-108.

  • obtidos, fornecendo, assim, empresa, em tempo real, os dados de que ela necessita-va para repensar seu discurso e localizar eventuais problemas de comunicao.

    Por ter carter eminentemente icnico (sentimental, afetivo), a pesquisa de satisfaoretratava oscilaes muito significativas no tempo, o que nos levava a identificar osmomentos de variao com a produo e transmisso dos textos que constituam odiscurso empresarial. Dessa forma e apenas aproximadamente conseguamos ela-borar quadros referenciais de feedback com alto grau de confiabilidade (uma vez quepartiam dos prprios usurios) e de baixssimo custo operacional ( j que nos serva-mos de um sistema de capilaridade j existente para o auto-atendimento).

    Se dessa forma obtnhamos resultados aparentemente objetivos sobre questes to sub-jetivas quanto a satisfao do cliente, de outra forma no tnhamos condies de pre-cisar os caminhos que deveriam ser seguidos para minorar os problemas e otimizar aqualidade do atendimento. A necessidade de buscar sugestes e localizar com maiorpreciso os pontos de estrangulamento que determinavam baixa satisfao (ou mes-mo insatisfao) levou-nos a explorar a imagem sobre outras bases. No caso, sobrefundamentos simblicos, mais consistentes e duradouros, ainda que tambm mut-veis e sujeitos instabilidade.

    Da imagem reputao

    Convencidos de que seria necessrio obter maior regularidade na captao das impres-ses ou imagens mentais, buscamos desenvolver nossas pesquisas em torno do con-ceito de identidade, uma vez que nomeramos o processo de reformulao do discur-so via dados da imagem como um processo de Administrao da Identidade.

    Cabe aqui, resumidamente, esclarecer que fundamentamos o estudo de tal processonos conceitos de identidade desenvolvidos desde Aristteles4, passando pela teoria ma-temtica de Leibniz, as teorias psicolgicas do carter e da personalidade (CLAPIER-VALADON, 1988), as teorias relacionais de F. Waismann, da Escola de Viena(ABBAGNANO, 1986) e tambm as teorias sociolgicas que trabalham a relaes en-tre indivduos e organizaes (CIAMPA, 1989, ETKIN e SCHWARSTEIN, 1995).

    Optamos pela possibilidade de conceituarmos identidade como o resultado da rela-o produtiva entre discurso e imagem, ou seja, o que surge de afinidade entre as in-tenes do discurso e as impresses do receptor. Essa afinidade no se d apenaspor congruncias, mas tambm pelas diferenas geradas e esperadas por ambos os la-dos da relao. Para tanto, o conceito de identidade de F. Waismann pareceu-nos maisadequado porque operativo para nossos propsitos de pesquisa.

    IMAGEM E REPUTAO NA GESTO DA IDENTIDADE ORGANIZACIONAL LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK

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    4 In: Organon, livro III, 3Analtica. Bauru, SP: Edipro, 2005. (Traduo de Edson Bini)

  • Assim, identidade um conceito que surge da relao entre o emissor do discursoe o receptor desses estmulos. E administr-la corresponde a coordenar a produo, areproduo e a reformulao do discurso vista dos dados obtidos pela pesquisa deimagem.

    Instvel, como nos parecia (e aparecia), a imagem mental (MITCHELL, 1986) no pro-porcionava dados seguros para a promoo de uma gesto efetiva da identidade or-ganizacional.

    nesse sentido e nessa oportunidade que o conceito de reputao emerge para tra-zer novas possibilidades exploratrias administrao da identidade. A reputao es-taria relacionada opinio dos outros (FLYNN, 2007), assim como a imagem estrelacionada satisfao dos outros? o que discutiremos a seguir.

    Reputao e metodologia de pesquisa

    bastante comum, na prtica mercadolgica, associar a imagem de um produto, deuma marca ou de uma empresa ao conjunto das opinies que um determinado p-blico normalmente o pblico-alvo , expressa em pesquisas de carter quantitativoe qualitativo.

    A imagem mental a que nos referamos formada, em grande parte, com contribui-es do imaginrio do pblico, que se agregam aos estmulos recebidos de forma nemsempre previsvel e administrvel. Assim, quando nos referimos imagem, falamosdo produto dinmico da elaborao mental (imaginao) de quem mantm com o ob-jeto de sua percepo e experincia uma relao comunicativa. Nessa relao, o ob-jeto da percepo se mescla com os dados do imaginrio do percebedor e o resulta-do poderia ser a impresso causada nessa mente interpretante. Poderamos simplesmentedenomin-la impresso.

    Quando alguns pesquisadores sobretudo da rea do marketing optam por utilizaro termo reputao, no esto apenas substituindo terminologicamente a mesma idia,mas alterando substancialmente significados que fazem muita diferena: enquanto aimagem, como vimos, se forma na mente do receptor com base em estmulos maisdensamente povoados por sensaes e qualidades (IASBECK, 1998, p. 173-192 eCOSTA, 1999, p. 59-62), a reputao formada por juzos de carter lgico e alicer-ada em argumentos, opinies e at mesmo convices, crenas consolidadas (JABLIN,2001, p. 754-756 e FLYNN, 2007).

    Dados estatsticos obtidos por meio de uma grande variedade de metodologias inqui-sitrias tm sido normalmente aceitos como vlidos pelas organizaes para deter-minar a performance comercial de produtos e servios, no obstante as distores e

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    distanciamentos que tais modelos propiciam (BESSON, 1995, p. 25-73). E mais: con-ferem carter pretensamente cientfico e, portanto, objetivo s informaes obti-das, diluindo a desconfiana na relatividade das opinies subjetivas do pblico.

    Hoje, institutos de pesquisa de comunicao e organizaes interessadas em conhe-cer seus clientes demandam metodologias capazes de detectar desde os sonhos do con-sumidor at suas mais prementes necessidades do dia-a-dia (PINHEIRO et alii, 2006,p. 63-73). As informaes que apuram por amostragem precisam ser configuradas co-mo espelhos da realidade para convencerem os produtores do discurso. Geralmente,o que se promove nessas pesquisas so manobras tcnicas de afunilamento das dife-renas subjetivas em favor da pasteurizao dos dados obtidos em torno de um ou maiselementos considerados universais ou invariantes. As concluses assim obtidas po-dem aparecer tambm vinculadas a imagens, textos ou at mesmo sons (BAUER eGASKELL, 2002, p. 15-17), em relaes associativas sensoriais ou sinestsicas.

    Por isso, convencem. Fornecem os contornos de uma possvel imagem real do ob-jeto pesquisado, mas, por no levarem em conta a inconstncia das informaes5, noexpressam necessariamente uma imagem, muito menos uma reputao.

    A opinio assim aferida, alm de manipulada, manipuladora, pois compreende efaz compreender, age e faz agir, metaboliza e faz transformar seu objeto, deixandodefinitivamente a passividade que lhe conferem as mais ingnuas teorias do how to ma-ke, que algumas correntes do marketing e da administrao de empresas elegeram co-mo balizadoras da boa performance (ETKIN e SCHVARSTEIN, 1995, p. 5-10).

    O que nos interessa nesta reflexo questionar no as escolhas metodolgicas dos ins-titutos de pesquisa ou a ingenuidade dos consumidores de informaes simplificadas,mas o entendimento e o consentimento tcito daquilo que se denomina opinio p-blica na formao da reputao das organizaes.

    Reputao e opinio

    Para tanto, valemo-nos do ensaio A opinio pblica e seus porta-vozes, do semioticistaEric Landowski6, no qual so discutidas questes que relativizam a pretensa cientifi-cidade dessa modalidade de opinio coletiva.

    5 ...as escolhas carecem de permanncia e consistncia nos hbitos dos entrevistados... (SHET, MITTAle NEWMAN, 2001, p. 473-475).

    6 In: A sociedade refletida. So Paulo: Educ-Pontes, 1992. p. 19-43.

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    Segundo Landowski, h dois tipos de especialistas em opinio pblica: Uns interro-gam-se sobre o seu modo de existncia e sobre as condies de sua manifestao, ou-tros respondem por sua existncia e se encarregam, por profisso, de manifest-la(1992, p. 27).

    A preciso e o rigor cientficos caractersticas que imprimem credibilidade aos re-sultados das pesquisas so, porm, a grande preocupao de uns e outros: enquan-to os profissionais dos institutos de opinio enquadram dados em modelos matem-ticos e estatsticos, os estudiosos das cincias sociais e da semitica da cultura investigamo modo de formao e de transformao dessa opinio, procurando detectar a plura-lidade de fatores que interferem na sua dinmica.

    Landowski adverte que, como fenmeno que subsume a pluralidade das opinies sin-gulares (1992, p. 19), a opinio pblica pode manifestar-se tambm e muito comu-mente por profissionais que mantm estreito contato com o pblico, tais como osjornalistas e os polticos. O misterioso sentido inato de opinio pblica (LANDOVSKI,1992, p. 19) que manifestam apia-se em prticas que concebem a opinio como umaespcie de pessoa7. Os homens de propaganda e marketing, assim como os jornalis-tas, funcionam como porta-vozes de um pblico que no lhes legitimou representa-tividade, mas que susceptvel de ser manipulado pelas prticas da provocao, da in-timidao, da tentao e da seduo, artifcios narrativos to utilizados pela propagandae pelos rgos de imprensa em matrias interpretativas e opinativas.

    Estaria, dessa forma, a reputao de uma organizao marcada e manipulada pelosprprios instrumentos que buscam capt-la por meio de pesquisas? Haveria, ento, duasimagens distintas, uma imagem captada pelas pesquisas e outra produzida na mentedos consumidores e inacessvel, pelos parmetros da cientificidade, s metodologiasconhecidas?

    Antes de buscar resposta a essas perguntas, preciso assumir que a opinio pblicaprecisa existir para que por ela se pautem as anlises da eficincia e da efetividade dosdiscursos; ela que explica, justifica e fundamenta a reputao; a maioria dos proble-mas que dificultam sua deteco est relacionada, segundo Landowski, multiplici-dade das acepes... de que os socilogos foram os primeiros a tomar conscincia(1992, p. 20).

    Para distinguir duas categorias importantes de opinio pblica a do pblico e a dosintrpretes do sentimento pblico , Landowski reporta-se organizao do teatrogrego antigo, no qual havia o palco (logeion), local em que se desenvolvia a cena, e aorquestra, de onde o coro observava a cena e a comentava para o pblico nas arqui-bancadas da platia (koilon). A reao do pblico era observada e provocada, em mui-

    7 Expresso usada por Ferdinand Brunot, historiador da lngua francesa, citado por Landowski (1992).

  • tos momentos, pelos integrantes do coro, que cumpriam dupla funo: a de interpre-tar as cenas para o pblico e a de instigar os protagonistas da pea no sentido das ex-pectativas desse mesmo pblico.

    Nesse caso, fica visvel a existncia de instncias intermedirias entre a opinio cole-tiva e o destinatrio final dessa opinio, o destinador-ator. As transformaes e rear-rumaes de carter afetivo, lgico e argumental por que passam as reaes percebi-das da platia ensejam o surgimento de uma meta-opinio que pode, ou no,corresponder em diferentes nveis e graus ao sentimento do pblico.

    A mdia e a formao da reputao

    possvel perceber, assim, que o grande pblico tanto do teatro grego quanto dasempresas e de seus produtos produz suas prprias imagens e opinies (reputaes)em sistema de intermediao. Tudo nos leva a crer que na sociedade moderna, co-mercial e capitalista, so os discursos da mdia os grandes formadores de opinio,ao congregarem tambm os discursos de lderes comunitrios e sindicais, de polti-cos, empresrios, intelectuais, artistas e outros. Assim representado, o consumidor, osfornecedores, enfim todos os pblicos de interesse de uma organizao tendem a afu-nilar suas perspectivas para um discurso unificador e miditico que os estratifica me-dida que, paradoxalmente, os massifica.

    Os esforos para segmentar a clientela (KOTLER, 2000, p. 277-301) no constituem,dessa forma, seno a manifestao de um desejo de especificar caractersticas que se-ro, num segundo momento, pasteurizadas para significarem os mesmos elementosestruturais invariantes que caracterizavam a grande massa disforme de pblicos deinteresse.

    Voltamos, portanto, ao ponto de partida, com um agravante: o crescente avano dastecnologias de informao tende a diminuir ainda mais o tempo de recepo e respos-ta aos estmulos discursivos, evidenciando a dinmica interativa entre destinador e des-tinatrio e a premncia da implementao de meios estveis e altamente flexveis pa-ra a reciclagem do discurso (IASBECK, 1997, p. 45).

    Porque os contornos da imagem pblica de uma empresa oscilam a todo momento,as pesquisas e sondagens de carter cientfico (matemtico e estatstico) que conge-lam maneira de uma fotografia um instante possvel e limitado da percepo nodevem ser entendidas como definitivas e consideradas como absolutamente vlidas,espelhos da realidade na qual se pretende atuar, num espectro de tempo maior do queo momento em que foi limitadamente produzida. Em outras palavras, a imagem ins-tvel no pode ser consumida como uma perene reputao.

    IMAGEM E REPUTAO NA GESTO DA IDENTIDADE ORGANIZACIONAL LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK

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  • IMAGEM E REPUTAO NA GESTO DA IDENTIDADE ORGANIZACIONAL LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK

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    A captao da reputao pela filtragem da mediao

    A criao de meios permanentes e monitorveis de resposta imediata do pblico seja por meio de comentrios e sugestes, seja por crticas e reclamaes afigura-se como procedimento desejvel para um mapeamento indefinivelmente provis-rio dos contornos da imagem pblica da empresa, via anlise dos dados obtidos, po-dendo, dessa forma, fornecerem subsdios para a formao de uma reputaosustentvel.

    Na anlise dos dados assim obtidos, os resultados do contato direto e aparentementedesintermediado com o pblico que se expressa voluntariamente devem ser so-mados aos esforos de leitura das interpretaes miditicas, disponveis nos jornais,revistas, programas de TV, eventos de massa, dentre outros, e ao contato direto comaquele pblico privilegiado, os formadores de opinio.

    Tal confrontao pode gerar uma conformao? possvel, desde que os dados maisestveis (da reputao) estejam permeando aqueles mais fugazes e indefinveis (da ima-gem). E essa uma hiptese que ainda precisa ser demonstrada por instrumentos ten-tativos de aferio da imagem. E se comprovada, os subsdios a serem gerados para areciclagem do discurso (IASBECK, 1997, p. 197) tendero a ser mais substanciosos, me-nos onerosos e mais facilmente operacionalizveis por estratgias de comunicao.

    Assim seria possvel minimizar o alto risco de se investir na mensurao e no delinea-mento dos contornos da imagem com base em invariantes e universais, tcnicacomumente adotada pelos institutos de opinio. Estaria afastada tambm a possibili-dade de se produzir, ao final, resultados tecnicamente previsveis, muito prximos scertezas do senso inato de opinio, como diz Landowski.

    A reputao, as razes do pblico, os interesses das organizaes

    Um conhecido ditado popular afirma que, nas relaes comerciais, o cliente tem sem-pre razo. Os resultados desta pesquisa pautada pela filtragem da mediao, comoaqui proposta, podero inverter a aparente ditadura da reputao do receptor sobreas intenes estratgicas do emissor, sugerindo uma parceria de interesses em tornode desafios comuns.

    A relevncia de se criar e se manter instrumentos eficazes de aferio da imagem e dareputao se justifica pelo fato de ser esta a condio essencial para que uma organi-zao seja pblica, seja privada possa dispor de mecanismos eficazes de adminis-trao de sua identidade (IASBECK, 1998). Uma imagem favorvel ou desfavorvel notem, evidentemente, um fim em si mesma. Ela se torna imprescindvel, porm, noprocesso dinmico de gesto da identidade, cuja finalidade nas atividades comerciais

  • obter o maior grau possvel de adeso e empatia por parte dos diversos pblicosde interesse.

    Por isso, nas prticas comerciais busca-se primordialmente alargar os espaos da iden-tidade, que podem ser traduzidos por graus incertos e no totalmente previsveis deafinidade entre produo e recepo, entre os interesses, desejos e necessidades de quemproduz e os interesses, desejos e necessidades de quem consome.

    Esse incerto grau ainda que nunca lquido e certo precisa ser ocupado proativa-mente pelo discurso das organizaes; deve estar presente em suas preocupaes es-tratgicas e constituir um espao virtual de experimentaes. Ainda que jamais pos-sa ser abolido, pode se administrado fornecer elementos necessrios para transformarespontaneamente imagens em reputao e reputao em novas imagens, criando umciclo renovvel de expectativas duradouras e satisfaes provisrias.

    nesse contexto que o conhecimento operativo da imagem e da reputao pode oti-mizar os recursos de comunicao de uma organizao, tornando-a competente e com-petitiva num mercado pleno de possibilidades e to carente de solues inovadoras.

    Referncias

    ABBAGNANO, N. Dicionrio de filosofia. Mxico: Fondo de Cultura Econmica, 1986.

    ARISTTELES. rganon. Bauru, SP: Edipro, 2005. (Texto integral. Traduo de Edson Bini).

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    IMAGEM E REPUTAO NA GESTO DA IDENTIDADE ORGANIZACIONAL LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK

    organicom ANO 4 NMERO 7 2 SEMESTRE DE 200796

  • FLYNN, Terry. Corporate reputation management and branding. Curso de Especializao Comunicao Empresarial - SyracuseUniversity 12/4/2007. In: GARCIA, Aislan et alii. A cultura organizacional como alicerce da reputao corporativa. Textoapresentado no I Sembrarp. Salvador, outubro de 2007.

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    IMAGEM E REPUTAO NA GESTO DA IDENTIDADE ORGANIZACIONAL LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK

    97ANO 4 NMERO 7 2 SEMESTRE DE 2007 organicom