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20 JUNHO 10 21 JUNHO 10 EM ANÁLISE EM ANÁLISE Como o Benfica chegou à liderança Quando no título deste tra- balho se fala em chegar à liderança, a ideia não é a de chegar ao primeiro lugar, como aconteceu com a equi- pa principal de futebol do Benfica esta época no cam- peonato nacional. É mais do que isso, é a de chegar a um nível em que se pode dizer claramente que existe no futebol do clube uma ver- dadeira liderança. E é essa liderança que permite, depois, ganhar campeonatos. Quatro profissionais de recursos hu- manos, todos eles benfiquis- tas, ajudam-nos a perceber o que esteve na base da grande transformação que o Benfica registou esta época. © Sport Lisboa e Benfica Texto: António Manuel Venda

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Como oBenfica chegouà liderança

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Benfica esta época no cam-peonato nacional. É mais do que isso, é a de chegar a um nível em que se pode dizer

claramente que existe no futebol do clube uma ver-dadeira liderança. E é essa

liderança que permite, depois, ganhar campeonatos. Quatro profissionais de recursos hu-manos, todos eles benfiquis-tas, ajudam-nos a perceber o que esteve na base da grande transformação que o Benfica

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não têm limites. A estrutura dirigente trabalhou no sentido de formar uma equipa altamente competitiva e todas as decisões que tomou nesse sentido prima-ram pela excelência. Os jogadores que reforçaram o plantel são de excepcional qualidade e a escolha do timoneiro não poderia ter sido mais conseguida, porque Jorge Jesus é um treinador de recursos abso-lutamente confirmados. E Rui Costa soube estabilizar e disciplinar o futebol profissional do clube. Este é o grande mérito da liderança de Luís Filipe Vieira, uma liderança carismática, reflectida na interacção com os seus pares e na forma como é seguido e respeitado dentro da organização.»Carlos Perdigão afirma que o que mais o impressionou ao longo da época, «para além da qualidade dos es-pectáculos produzidos, foi a coesão do grupo e o seu grau de motivação». Cita mesmo uma frase que alguém disse, com graça, «o êxito para um novo treinador sig-nifica manter os cinco jogadores que o odeiam afasta-dos dos seis que ainda não decidiram odiá-lo», para depois referir que «ao longo da época viu-se um grupo muito unido, coeso e motivado e esse é um crédito que deve ser reconhecido a Jorge Jesus e a toda a estrutura do futebol liderada por Rui Costa, sem esquecer que as opções foram assumidas pelo presidente Luís Filipe Vieira». Nesse sentido – conclui –, «são muito notórias as diferenças em relação ao passado recente».Como pontos fortes da actual liderança do futebol do Benfica, Carlos Perdigão destaca a coesão, a mo-tivação, o respeito, a lealdade e a cooperação. «Tudo num contexto de muito maior exigência, rigor e profis-sionalismo. A administração da Sociedade Anónima Desportiva (SAD) assumiu publicamente que, con-cluído o período de construção das infra-estruturas desportivas e de consolidação do Grupo Benfica, a prioridade ia por inteiro para o relançamento do futebol. E os resultados não se fizeram esperar.» Já no que diz respeito a pontos que poderão ainda ser desenvolvidos, o seu comentário é de que se atingiu «um patamar que é preciso manter, sendo que essa manutenção constitui por si só um enorme desafio». Ou seja: «É necessário que o Benfica consolide a sua posição no panorama do futebol português, mas é também necessário que o clube regresse aos bons velhos tempos na Europa. Nesta década já esteve nos quartos-de-final da Liga dos Campeões e em idêntica fase da Liga Europa, obteve mesmo os dois últimos melhores registos de equipas portuguesas em provas da UEFA, mas há que ser mais ambicioso e procurar ir mais além. Nesse aspecto, o discurso de Jesus é muito avisado e assertivo.»Os três principais rostos da liderança no clube, Jorge Jesus, Rui Costa e Luís Filipe Vieira (treinador, director de futebol e presidente, respectivamente) são vistos da seguinte forma pelo jurista: «Luís Filipe Vieira já está, por mérito próprio, entre os grandes presidentes da história do clube. Relançou o Benfica num momen-

to de grandes dificuldades e está a colocá-lo a um ní-vel que há bem pouco tempo se julgava impossível. É um visionário e um gestor de alto calibre. E percebeu que tinha em mãos o destino de uma colectividade ímpar, capaz de empresas impossíveis, constituída por gente de uma dedicação e de uma generosida-de sem limites. A forma com que devolveu o clube aos sócios e potenciou esse capital de esperança e de emoção fazem dele um líder de forte carisma e grande interacção com a massa associativa. Rui Cos-ta serenou e estabilizou o Departamento de Futebol Profissional, onde há muito não se via um sector de prospecção com os méritos do actual. Jorge Jesus fez aquilo por que há muito os benfiquistas ambiciona-vam e que era adiado de ano para ano: formou uma equipa e colocou-a no relvado a exibir um futebol de alta qualidade e extremamente competitivo, ilustrado por resultados excepcionais.»Uma última pergunta que colocámos teve a ver com o nome que vem imediatamente à cabeça quando se fala em líder, em futebol e em Benfica. Carlos Perdigão diz que «seria fácil, neste momento, responder Jorge Jesus», mas ainda assim julga «dever prevalecer o nome de Luís Filipe Vieira». Afinal, «é ele, em última instância, o responsável pela contratação de Jorge Je-sus e pelo desenho organizacional do futebol profis-sional do Benfica». Na opinião do advogado, «o que merece ser sublinhado é o espírito de grupo reinante, porque ninguém ganha nada sozinho, por muito forte que possa ser a sua liderança». Daí concluir que «o compromisso, a partilha de responsabilidades e o es-pírito de lealdade e cooperação que foram instituídos foram a chave do sucesso».Carlos Perdigão é advogado da LCA – Abalada Matos, Lorena de Sèves, Cunhal Sendim e Associados. Pós- -graduado em Direito do Trabalho pela Universidade Lusíada de Lisboa e pela Universidade de Salamanca, integra os corpos sociais da Associação Portugue-sa dos Gestores e técnicos dos Recursos Humanos (APG). Desempenhou cargos de topo em várias em-presas, em gestão de recursos humanos.

Maria Vieira«Esta liderança foi mais estável, mais determina-da e menos sujeita a influências externas.»Outra especialista com quem falámos foi Maria Viei-ra, que integra a consultora Ideias & Desafios, sendo aí a ‘partner’ responsável pela área de Dinamização Empresarial. Apaixonada pela leitura de livros de ‘marketing’, gestão e motivação pessoal, tem partici-pado em acções de formação com personalidades como Jay Levinson, Anthony Robbins, Jake Canfield e Jeffrey Guitomer. Lidera programas de Dinamização Empresarial que apoiam a performance de empresas e equipas.Para Maria Vieira, na mudança que o Benfica conhe-ceu esta época em termos de resultados desportivos da equipa principal de futebol, o papel da liderança «foi decisivo, pois com a sua dinâmica, a estabilidade e a persistência deu aos jogadores a capacidade de acreditarem e de não se desmotivarem». A actual li-derança, em paralelo com aquilo que existia no clube em épocas anteriores, é vista pela consultora como «mais estável, mais determinada e menos sujeita a influências externas», o que levou a que a equipa de futebol estivesse «mais coesa, enfrentando os adver-sários de uma forma muito mais consistente em ter-mos de performance», sendo que «as vitórias foram contagiando os jogadores e os adeptos e o título foi sempre uma certeza e não um talvez».Persistência, determinação e não se deixar abalar por nada são os pontos fortes referidos por Maria Vieira, que acha que pode haver melhorias ao nível da co-municação, nomeadamente «ser mais fluida com os ‘media’ por parte do treinador e haver mais empatia com o público».Maria Vieira fala também dos papéis de Jorge Jesus, Rui Costa e Luís Filipe Vieira, assinalando que são «obviamente de relevo» e fazendo notar que «existe uma grande sinergia entre os três, o que ajuda não só os jogadores mas também os adeptos a estabelece-rem um elo ainda mais forte com o clube». Quanto a um nome que lhe venha imediatamente à cabeça ao

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Carlos Perdigão«O que mais me impressionou foi a coesão do gru-po e o seu grau de motivação.»A primeira opinião que ouvimos sobre a grande trans-formação do futebol do Benfica esta época foi de Car-los Perdigão, actualmente a exercer advocacia mas com uma longa carreira profissional ligada à gestão de recursos humanos. O advogado fala da mudança que o Benfica conheceu esta época em termos de re-sultados desportivos da equipa principal de futebol da seguinte forma: «O Benfica percebeu uma coisa relativamente simples – com uma grande equipa de futebol e com o apoio associativo de que dispõe, sem paralelo em qualquer parte do mundo, as ambições

«Vem dos tempos da escola primária e dos campeões europeus da década de 1960 a minha relação com o Benfica, e cedo se tornou numa imensa paixão. Aos 18 anos ingressei no quadro redactorial do jornal do clube, pela mão de Paulino Gomes Júnior (dirigente histórico e autor do hino do Benfica) e de Vasco Santos (então chefe da redacção do jornal), ambos já falecidos. Foi uma relação que perdurou muitos anos, 10 dos quais (1973/ 1983) com grande intensidade e com uma presença semanal muito significativa nas páginas do jornal. Foi um tempo de muitas amizades e tertúlias e de uma vivência única nos meandros do clube, em particular do seu futebol. Na altura, o enviado especial do jornal seguia na comitiva com dirigentes e jogadores. A relação que então pude estabelecer com muitos dos grandes vultos do futebol do Benfica foi especialmente estreita. Tive o raro privilégio de transportar muitas dessas vivências para os livros sobre o historial do clube em que participei e que são hoje geralmente reconhecidos como o melhor que se produziu em termos da bibliografia do Sport Lisboa e Benfica. Continuo a colaborar com o clube sempre que a minha contribuição pode ser útil. Tenho lugar cativo no estádio; aliás, vivo a escassos minutos da ‘Catedral’ (uma opção que não aconteceu por mero acaso...). O Benfica tem-me proporcionado alguns dos momentos mais empolgantes da minha vida. Para citar Artur Portela Filho, é de facto uma das raras solidariedades possíveis.»

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«A minha relação com o Benfica é de espectadora curiosa desde há muitos anos. Não sendo adepta acérrima de futebol, gosto no entanto de apreciar certos jogos, o comportamento dos jogadores dentro e fora do campo, os treinadores e a sua ca-pacidade de gerir uma equipa e conseguir que atinjam os objectivos. Além disso, é interessante ver como uma equipa se move em campo e como consegue estar foca-da. No fundo, tem muito a ver com as empresas e podem criar-se paralelismos muito engraçados. A motivação para uma meta ambicionada há muito tempo, ser campeão nacional. A criação de âncoras fortes e símbolos duradouros, pois o Benfica é uma instituição que vai além fronteiras, sendo o maior clube nacional em número de só-cios. Depois, temos os jogadores e o treinador. Este campeonato foi a prova de que um bom clube tem de ser a envolvência perfeita entre os jogadores e o líder. Foi possível com determinação, focalização e muita motivação fazer um campeonato excelente, com poucas falhas e sempre com a força de se acreditar, o que anima os adeptos e a equipa em si. Foi ainda possível ver que cada jogador teve um papel fundamental no trabalho de equipa e que houve mais coesão entre todos – só um grande líder consegue potenciar as características positivas de cada um e eviden-ciá-las de modo a todos beneficiarem disso mesmo.»

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falar-se-lhe em líder, em futebol e em Benfica, a con-sultora refere outra pessoa que não estas três: Eusé-bio. Na sua opinião, o Pantera Negra é «um ícone do futebol nacional e obviamente do Benfica» que, «sem nunca ter sido treinador e por isso sem nunca ter sido um líder em funções, é um líder de motivação e uma imagem extremamente positiva do clube».

Rodolfo Begonha«Uma lagarta com pouco fôlego, feia e lenta transfor-mou-se numa fantástica borboleta que soube voar.»A frequentar um doutoramento, o gestor Rodolfo Be-gonha assinala vários aspectos que condicionam os resultados e a mudança, incluindo «a gestão, toda a máquina profissional que tem de estar bem oleada e obviamente a política de contratações, entrando aqui inequivocamente o treinador, que influencia de for-ma determinante a liderança e a mudança». Vê Jorge Jesus como «uma força da natureza que instituiu uma relação muito especial com a equipa do Benfica» e considera que «a liderança protagonizada pelo trei-nador foi fundamental», sobretudo pelos seguintes aspectos: «certificar-se de que a comunicação é bem entendida, recorrendo se necessário em momentos cruciais a alguma dureza em nome dos objectivos; obtenção da legitimidade da liderança por parte do

grupo, necessária para assimilar as orientações e para as mesmas serem cumpridas; incutir disciplina, rigor e rotinas desenhadas conforme as capacidades dos jogadores; conseguir uma atitude competitiva, de não desistência, de luta, de ambição, o que só se conse-gue com uma dinâmica muito orientada para a vitória e com uma forte motivação; obtenção de rendimento por parte dos jogadores, em alguns casos com mais polivalência, outros ajustando-os a lugares onde pos-suem maior rendimento, outros ainda conseguindo desempenho acrescido, outros refreando tendências individualistas e colocando as suas capacidades com sucesso ao serviço da equipa; os jogadores cumprem a sua missão durante todo o jogo, dando a ideia de o fazerem com gosto, no fundo eles jogam; a equipa está entrosada, acerta passes, faz jogadas, joga bem, marca golos, conquista os adeptos e enche o está-dio, situação que não se verificava». Posto isto, ser campeão foi «um corolário lógico para a época que a equipa fez».Tendo presente o que aconteceu noutras épocas, Ro-dolfo Begonha diz que agora se afigura como básico que «a liderança é um aspecto decisivo, que se com-preende perfeitamente atendendo aos resultados obtidos pelo Benfica e à mudança fundamental da performance, incluindo jogadores que já integravam o plantel». Metaforicamente, arrisca dizer que «a lide-rança proporcionada pelo timoneiro Jesus proporcio-nou uma metamorfose, que transformou uma lagarta com pouco fôlego, feia, lenta, sem se coordenar, sem se acertar, sem resultados, numa fantástica borbole-ta que soube voar, com graciosidade, com velocida-de, com ritmo, simultaneamente com força e beleza, conquistando a assistência como há bastante tempo não ocorria». Destaca ainda que «o público corres-pondeu muito positivamente e constitui-se como reforço do bom clima gerado e que qualquer crítico mais ou menos isento reconhecerá a metamorfose verificada, porque se trata de um processo que salta à vista». E acaba por deixar duas perguntas: «Não será uma possível prova disso o facto de eu ter recebido felicitações – devidas em face da recente vitória – de amigos que são adeptos do Futebol Clube do Porto? Apesar do excelente e surpreendente desempenho do Braga, ficarão dúvidas quanto à justiça da vitória do Benfica?»Sobre os pontos que se destacam na actual liderança, o gestor opta por aquilo que classifica como «peque-nos e simples exemplos», que devem ser entendidos em sintonia com o que anteriormente focou: «a for-mulação de grandes expectativas leva a uma onda motivadora e a grandes resultados, por oposição à falta de ambição; a liderança é legitimada pelos li-derados, tendo em vista aquilo que vêem, aquilo que sentem, tendo pela frente um treinador firme, com carácter forte, com ideias determinadas, mas que já trazia um bom trabalho no seu currículo e que a nível técnico sabe de futebol; contribui para a afirmação

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de uma boa liderança o reconhecimento pelos lide-rados de que o treinador sabe o que está a fazer, sabe tirar 100% de rendimento de cada um, maximizando as suas capacidades no terreno, tornando-se respei-tado quer na cabine, quer nos treinos, quer durante os jogos». Já em relação a pontos que poderão ainda ser desenvolvidos, alonga-se um pouco mais: «Apesar da inquestionável vitória no campeonato e das ines-quecíveis exibições do Benfica, há sempre acertos que têm de ser levados a cabo, e avaliando a época no seu conjunto apercebemo-nos de certas fragilidades que exigem melhorias. Além disso, há que ter em con-sideração que ocorrerão sempre saídas e entradas de jogadores, pretendendo-se que apesar disso subsista um conjunto harmónico e com a mesma atitude luta-dora. Julgo que poderão ser ainda tratados profissio-nalmente alguns aspectos mais relacionados com a área psicológica, nomeadamente no eixo treinador/ jogadores. Esta ideia ganhou maior intensidade na minha mente após a análise que efectuei das derrotas do Benfica em Liverpool e em casa do Futebol Clube do Porto.» Exemplos de problemas a equacionar são os seguintes: «actuar sobre possíveis excessos de confiança individuais e colectivos; agir ainda sobre algumas réstias de nervosismo dos jogadores; reflec-tir acerca da enorme emotividade do treinador e da forma como a mesma se processa em campo durante momentos de crise, com alguma possível desorienta-ção e potencial contágio da equipa; a filosofia de não contenção e de contínuo jogo ofensivo, esquecendo que em certos momentos deve haver alguma frieza estratégica e contenção muito racional de jogo, que exige muita auto-disciplina e concentração, pode ter efeitos perversos que são clássicos (por um lado gera enorme satisfação na assistência e pode ser coroada de êxito se os golos aparecerem, todavia as coisas podem correr mal e a equipa pode ser apanhada de surpresa e sofrer golos); se fixarmos o prestígio do clube e os decisivos interesses económicos em jogo,

entende-se que o Benfica tem de encarar todas as provas como potencial candidato, o que provavel-mente exige sacrifícios acrescidos e uma gestão dife-rente da equipa.»Pensando nos papéis de Jorge Jesus, Rui Costa e Luís Filipe Vieira, nos cargos que desempenham, Rodolfo Begonha não tem dúvidas de que Jorge Jesus é «de momento o astro, por tudo o que já se disse e se com-preende». Quanto a Rui Costa, «pelo seu passado e pelo reconhecimento do profundo amor ao Benfica, é uma figura muito querida e geradora de uma certa sensação de estabilidade e credibilidade, exigindo- -se que consiga gerir com equilíbrio a sua posição, o que nem sempre se afigura como fácil». Já Luís Filipe Vieira «tem estado a trabalhar para esta vitória, que obviamente também é dele». Rodolfo Begonha acha que o presidente «tem procurado melhorar a gestão do seu nível de envolvimento no futebol e a sua es-tratégia de comunicação», salientando que «seria in-justo esquecer que é necessário acertar na selecção de novos jogadores que possam assumir-se como reforços, que é fundamental saber negociar e tomar as decisões certas, conseguindo ainda angariar o im-prescindível suporte financeiro para tal». No fundo, «são actos de gestão que não podem ser esquecidos e que integram todo um processo», diz, trazendo à liça um exemplo do rival Futebol Clube do Porto, que «comparativamente se reforçou pior do que o Benfi-ca, considerando as saídas de jogadores importantes, e que além disso poderá não ter havido rendimento imediato das novas aquisições».Quanto a um nome que lhe venha imediatamente à cabeça quando se fala em líder, em futebol e em Ben-fica, tendo até em conta o que afirmou e também «os resultados desportivos e as transformações visíveis operadas no Benfica, e observando o clima de festa que se vive neste momento», Rodolfo Begonha des-taca «incontornavelmente o treinador Jorge Jesus».Rodolfo Begonha é director-adjunto da Gradiva Pu-

«Recordo ainda os finais da carreira do fantástico Eusébio, em tem-pos cintilantes do Benfica, mas ‘cinzentos’ do nosso país. Tornei--me conscientemente benfiquista quando comecei a frequentar o antigo Estádio da Luz, partilhando com o meu avô materno uma cadeira no camarote número 83, teria eu talvez oito anos. Depois, fui acompanhando sempre as evoluções do clube como apoian-te incondicional, com maior ou mais distanciamento conforme a vida académica, profissional e/ ou pessoal foram permitindo. Mui-tas alegrias e algumas decepções histórias marcam a minha vida de adepto e de sócio número 12.676 (há mais de 30 anos).»

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blicações. Tem quatro livros editados e é doutorando em Sociologia Económica e das Organizações, mestre em Sistemas Sócio-Organizacionais da Actividade Económica e licenciado em Gestão de Empresas (com especialização em Gestão de Recursos Humanos).

Helder Figueiredo«Foi muito importante ter uma liderança com visão.»Finalmente, Helder Figueiredo, que dirige actualmente a consultora Smart-LMI, depois de durante vários anos ter sido director de recursos humanos na FNAC e no Grupo Construtora do Tâmega, além de ter trabalhado como consultor de recursos humanos na Accenture (ex-Andersen Consulting) e de ter sido docente do Ins-tituto Português de Administração e Marketing (IPAM) e ainda formador.Para o sucesso do futebol do Benfica, Helder Figuei-redo acredita que «foi muito importante ter uma li-derança com visão, mas também uma liderança que conseguiu transmitir aos jogadores e aos adeptos a visualização do que seria voltar a ter ‘um Benfica à Benfica’». Essa visualização positiva «foi fundamen-tal para, numa equipa que na sua componente central era a mesma do ano anterior, fazer de forma diferen-te», afirma, frisando que desde o primeiro jogo que não duvidava que o resultado fosse a vitória no cam-peonato. «Venceu a persistência e a consistência na forma de encarar cada jogo. Viu-se alegria a jogar e no essencial uma equipa e não estrelas individuais. Ao longo da época, o discurso de todos foi sempre ‘nós’, ‘a equipa’, ‘estou disponível para ajudar a equipa’… Viver este tipo de discurso faz toda a diferença.»Sobre a liderança do clube, e sobretudo da equipa principal de futebol, Helder Figueiredo defende que «cada um dos líderes, Luís Filipe Vieira, Rui Costa e Jorge Jesus, soube interpretar os seus diferentes

papéis, sem que se atropelassem», sendo que «a co-erência e a consistência nos discursos e nas acções consequentes fizeram acreditar que era possível cum-prir o sonho», e depois «a realidade encarregou-se de fazer o resto». Ou seja, «a diferença para as épocas anteriores esteve nos líderes», mesmo que dois deles já viessem de trás. Nesta nova liderança, o consultor destaca «a visão, a consistência, a emoção, a organi-zação, o planeamento, a acção, o espírito de equipa e a gestão do talento». Quanto a pontos que podem ainda ser desenvolvidos, socorre-se de uma perso-nagem do filme «Toy Story» [«é o defeito de ter tantos filhos e ver demasiados filmes infantis», desculpa-se]: «o Buzz diz ‘para o infinito e mais além’, e é isso, é preciso desenvolver em cada um dos jogadores e na equipa no seu todo a capacidade de superação», algo que «transformará o Benfica para ser ainda melhor, com capacidade para vencer a Liga dos Campeões na próxima época».Sobre os papéis de Jorge Jesus, Rui Costa e Luís Filipe Vieira nos respectivos cargos, Helder Figueiredo acha que «cada um soube ocupar o seu lugar», algo que considera ter sido «fundamental para o equilíbrio e a paz de espírito que se viveu ao longo do ano dentro da organização Benfica, no seu todo, entre os adeptos e na relação entre ambos». O mesmo, diz, acontece com as empresas, aí este também é «um aspecto mui-to importante, cada um saber exactamente qual é o seu papel e saber interpretá-lo».Para acabar, um nome que lhe venha imediatamente à cabeça quando se fala em líder, em futebol e em Ben-fica? Acaba por se sair com dois, primeiro Jorge Jesus, escolha óbvia, pelo que foi dizendo; e a seguir lembra--se, imagine-se, de José Mourinho. «Também regressa-rá à Luz, não por dinheiro, mas por orgulho. E se ele é orgulhoso…»

«Lembro-me da ideia de ser benfiquista aí pela idade da escola primária. Não sendo sócio, faço parte dos outros seis milhões de adeptos. Vi-bro com os jogos e sofro o suficiente pelo Benfica para saber discutir sobre o tema mais universal de todos. Ain-da há cerca de um mês estive num congresso mundial da nossa empresa, nos Estados Unidos, e o tema que serviu de base à maior parte das conversas com colegas de todo o mundo foi o inevi-tável futebol… E o Benfica, que é muito grande. Os meus heróis têm nomes como Cha-lana, Nené, Bento, Carlos Manuel, Shéu… Foi essa a geração de futebolistas que comecei a acompanhar.»

Helder Figueiredo

São indiscutivelmente os três protagonistas da liderança do Sport Lisboa e Benfica: o presidente Luís Filipe Vieira, o director do futebol Rui Costa e o treinador Jorge Jesus. Pedimos aos quatros entrevistados deste trabalho para pontuarem de zero (sem importância) a cinco (máxima importância) o contributo de cada um deles para a mudança operada na equipa de futebol do Benfica ao longo da presente época. Nos resultados que obtivemos nota-se uma tendência para repartir os méritos pelos três responsáveis e atribuindo-lhes pontuações elevadas. De qualquer forma, Jorge Jesus acaba por destacar-se, quase atingindo o máximo possível (que seria 20 pon-tos). Luís Filipe Vieira e Rui Costa ficam um pouco abaixo, os dois ao mesmo nível. Nas justificações para as pontuações atribuídas acaba por ser recorrente a ideia de haver a necessidade de destacar o papel do treinador nos resultados obtidos pela equipa principal do Benfica. MSA

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