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ROBERTO DUAILIBI A ARTE DA GUERRA e não tem nada a ver com Sun Tzu Batalhas sempre foram um tema importante para artistas. Porque sempre foram importantes para a humanidade. Você está onde está hoje porque no passado houve batalhas como a das Termópilas, a de Alcácer Quibir, Trafalgar, a Guerra de Secessão e a de Guararapes. Batalha do Avaí, óleo de Pedro Américo sobre um dos últimos episódios da Guerra do Paraguai.

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ROBERTO DUAILIBI

A ARTE DA GUERRAe não tem nada a ver

com Sun TzuBatalhas sempre foram um tema importante para artistas. Porque sempre foram importantes para a humanidade. Você está onde está hoje porque no passado houve batalhas como a das Termópilas, a de Alcácer Quibir, Trafalgar, a Guerra de Secessão e a de Guararapes.

Batalha do Avaí, óleo de Pedro Américo sobre um dos últimos episódios da Guerra do Paraguai.

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m tempos modernos, a produção de arte inspirada em batalhas atinge talvez o seu auge com Guernica, de Pablo Picasso, e Os Horrores da Guerra, de Goya. E, em termos práticos, desde a Primeira Guerra, a produção artística com fins de registro ou motivação é considerada “war job”, ou seja, uma atividade tão crucial quanto a de engenheiros, oficiais e soldados; ela se reflete em quadros, filmes, objetos, design em geral, símbolos gráficos, ban-deiras, uniformes e todas as outras mani-festações que exigem uma apresentação que, por sua boa concepção e acabamento, impõe respeito e tenha valor histórico. O urbanismo e a arquitetura também se inspiram em cenas de batalhas – os obeliscos, os monumentos das grandes ci-dades, o cinema, as histórias em quadrinhos,

o romance e a literatura em geral. E, na escultura, temos de citar o maior monu-mento equestre do mundo, o Duque de Caxias de Victor Brecheret, um pouco esquecido na Praça Princesa Isabel de São Paulo. O Brasil, aliás, é provavelmente o único país cujos símbolos pictóricos maiores não são representados por exércitos em confronto: a Primeira Missa, de Victor Meirelles, e o Grito do Ipiranga, de Pedro Américo, são cenas pacíficas. Até mesmo a Proclamação da República, tanto a de Benedito Calixto quanto a de Henrique Bernardelli, apesar de ter sido liderada por um Marechal, é mais um evento do que um momento crucial da História. Isso, apesar de a primeira representação do país, as gravuras dos livros de Hans Staden, reproduzir não apenas guerras entre

E

Guernica, óleo de Pablo Picasso, representa o bombardeio sofrido pela cidade espanhola.

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tribos, mas onde os vencedores devoravam os vencidos. No Brasil, os únicos lugares onde se veem pinturas de batalhas são as sedes dos Comandos das Forças Armadas e os Museus Nacional de Belas Artes e Ipiranga. Mesmo que em nosso país, segundo Her-nani Donato, tenhamos tido uma batalha por dia desde a sua descoberta, poucos são os registros em pinturas. O próprio Forte de Copacabana tem muitas obras em suas diversas salas, com grande valor de ilustração; o Museu Militar Conde de Linhares, aqui no Rio, que merece ser visitado pelo seu grande acervo bélico, tem também algu-mas peças interessantes. O Museu Naval e Oceanográfico, na Praça 15, tem alguns quadros de Carlos Balliester, que pintou os vasos de guerra brasileiros e produziu

uma coleção de primeira categoria nessa especialidade. Cenas de batalha são, como não podiam deixar de ser, pintadas de memória, descritas por quem as viveu, e pesquisadas à exaustão pelos artistas, noque se refere aos uniformes, à topografia do terreno, às condições climáticas. E, ao contrário dos pintores viajantes, mari nheiros que registraram as primeiras paisagens brasileiras, algumas batalhas da Guerra do Paraguai, apesar de retratadas posteriormente por Victor Meirelles, só foram registradas ao vivo pelo jovem soldado argentino Candido Lópes, em telas valorizadíssimas. Quadros de batalhas são executados em sua maioria por encomenda de alguém – e em geral servem a propósitos de pro-paganda. Por isso, algumas das melhores artes do gênero encontram-se expressas

Independência ou Morte, de Pedro Américo.

Batalha do Guararapes, por Victor Meirelles.

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nos cartazes americanos e europeus tanto da Primeira quanto da Segunda Guerras Mundiais. Aliás, o cartaz mais reproduzido nos dias de hoje, “Keep calm and carry on”, foi um de três encomendados pelas autoridades inglesas no ano de 1939. Rejeitado na época em favor de outros dois, só recentemente foi descoberto em um sebo de Londres e transformou-se em um sucesso no mundo inteiro. Mesmo aqui no Brasil, por inicia-tiva da FUNCEB-Fundação Cultural Exército Brasileiro, tentou-se estimular membros da Força Terrestre a pintarem temas bélicos, mas entre os grandes sucessos da Fundação estão os concursos fotográ-ficos que geraram um acervo maravilhoso. Agora, em memória (não em comemoração) aos 75 anos do início do conflito que marcou a vida de todos nós, um grupo de jovens artistas brasileiros, por sua própria iniciativa, resolveu pesquisar

e registrar momentos em que o Brasil se envolveu na Segunda Guerra Mundial. E são alguns nomes consagrados em exposições anteriores e reconhecidos por sua seriedade no ensino e na execução de arte, a começar do professor Alexandre Reider, curador da mostra e excelente pai-sagista. Os trabalhos – desenhos, aquare-las, óleos e acrílicos – têm uma orientação fundamentalmente acadêmica, e revelam artistas do Rio de Janeiro, de São Paulo, do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais que têm grande domínio do desenho e da técnica que escolheram. Durante meses estudaram todos os detalhes das cenas que retratam e submeteram o resultado a historiadores. A mostra pretende percorrer todo o Brasil. Mas não poderia haver lugar melhor para inaugurá-la do que o Forte de Copa-cabana, cujos comandantes, através dos anos, criaram uma tradição de apoio entusiástico a atividades culturais de várias naturezas.

A Primeira Missa no Brasil, por Victor Meirelles. A arte produzindo a história.

Poster motivacional produzido pelo governo do Reino Unido durante o início da 2ª Guerra.