23

Click here to load reader

Artigo Ciborguiza o Docente Julho 2010

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Na atualidade o corpo vem ganhando novos recursos e sendo ciborguizado

Citation preview

Page 1: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

A ciborguização dos professores: corpos em mutação para imersão na Cibercultura

 

Maristela Midlej

Narciso das Neves Soares

Sofia Souza

Edvaldo Couto

1. Introdução

 

Com o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) as relações sociais, sobretudo na educação, passaram por redimensionamentos quanto aos seus efeitos e possibilidades. Esta reconfiguração não se relaciona apenas com a evolução tecnológica, mas com uma seqüência de informações e conhecimentos contemporâneos da geração digital, que convergem e potencializam-se nas práticas do ensino-aprendizagem implicando em diferenciações no trabalho e saberes do professor. Neste contexto, a estética da máquina que modifica o paradigma social, reelabora também a relação homem-máquina na escola, como uma mutação simbiótica, (re) criando praticas docentes inseridas em cenário digital.

Diante do universo tecnológico que reconstrói o atual paradigma social, se configura conceitos de trabalho, espaço e individuo sob a ótica virtual. A remodelagem do ser humano como ator social mantém um estrito relacionamento orgânico  em amplo aparato tecnológico, considerando as necessidades das TIC que o envolve, criando assim, o conceito hibrido e dialeticamente superior do homem-máquina chamado de ciborguização do individuo (SANTAELLA, 2004).

Desta forma, o processo de ciborguização,  na educação estimulam questionamentos sobre a pratica docente inerente as necessidades das TIC, trazendo em discussão recente a temática a ser desenvolvida neste trabalho sobre a ciborguização do professor. Indo além, trata-se da compreensão do metarmofismo da máquina sensória humana (cognição, visão e audição) imperativa na sociedade digital e, na escola inerente ao aprendizado do aluno, que ampliou as potencialidades cerebrais e capacidades cognitivas. Neste processo, como se estabelecem as práticas e saberes docentes que abarquem a complexidade da apropriação da TIC no processo ensino-aprendizagem? 

O objetivo deste artigo é apresentar considerações exploratórias sobre a temática que envolve a ciborguização na educação, mais especificamente a ciborguização docente. Neste contexto será apresentado uma revisão teórica sobre a ciborguização da cultura contemporânea na educação, onde contemplamos os saberes necessários a ciborguização docente, seguida de uma breve contextualização do projeto Irecê e Tapiramutá, que se  trata de um curso de Pedagogia, com a característica especifica de Formação em Exercício de Professores. Deste levantamento foi construída a base de dados da proposta empírica a partir: das  postagens dos professores cursistas do projeto, dos Fóruns criados no Ambiente Virtual de Aprendizagem, da plataforma Moodle, e dos relatos de experiências no processo de ciborguização destes professores em exercício,

Page 2: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

no curso de Pedagogia, dos projetos Irecê e Tapiramutá -BA. Nesse estudo, trataremos das experiências de duas dimensões de trabalho: o curso Educação e Cibercultura e a oficina Software Livre no Ensino da Matemática.

 2. A Ciborguização na Cultura Contemporânea 

O impulso social projetado pela TIC transcendeu as expectativas humanas na captação desta evolução. Sendo o tempo de compreensão, sobreposto pelo momento concomitante do aprender e fazer em simultaneidade considera-se que a máquina tecnológica prolifera metáforas associadas à ampliação das potencialidades humanas comparando-as ao fazer robotizado da máquina. Entretanto, o termo homem máquina trata-se de uma simplificação míope das capacidades humanas que sempre demonstraram superioridades na produção de conhecimentos, sendo então necessária uma percepção mais ampla das potencialidades cognitivas do homem.  

A percepção do homem máquina se amplia quando projeta o conceito de ciborguização do individuo. Uma vez que a este tema está associado a um processo de informação complexo e cibernético,que transgride a fronteira entre “(...) o orgânico e o maquinico, do vivo e do não vivo, do humano e da máquina” (LIMA,2007, p 31). Que contempla, necessariamente a ampliação das capacidades humanas, através do inconsciente intelectual que os possibilitam a decodificarem mais facilmente a linguagem não verbal, do teclado, plugados ou não a internet, chamados “cabeças digitais” (ABREU, 2006, p. 174), ou no tema deste trabalho que incorpora de forma mais ampla, alunos ciborgues (ARRUDA, 2004), e que para tal necessitam de um professor também ciborgue.

Segundo Lemos (2002) há  na cultura contemporânea conceitos como o lugar do artificial de tekhné e do natural de phusis e  o termo de  ciborgue como a essência da cibercultura. Estudos mostram que a artificialidade esteve presente desde a formação do homem e das primeiras sociedades. Em nenhuma fase de sua evolução o homem esteve dependente apenas do orgânico ou do instintivo. No dizer de Lemos (2002, p. 178),

(...) A sociedade constitui-se, justamente, na afirmação de sua independência em relação à natureza (irracionalidade, acaso, animalidade, instintos etc.), numa posição de defesa contra as intempéries do mundo natural. A sociedade é, nesse sentido, uma contra natureza. A questão do artificial se desloca, assim, de uma possível dicotomia com o natural, pois a sociedade e o homem se formam no processo de artificialização do mundo.

É ainda o referido autor que aponta que o artificial é profundamente humano, visto que é tudo aquilo produzido pelo homem e que não tem por si mesmo a possibilidade de se auto-reproduzir (auto-poético) ou de criar um gênero. Dessa forma, a dicotomia entre o artificial e o natural perde sentido e a questão do ciborgue pode ser colocada como estrutural da própria humanidade e como característica da cibercultura. É nesse sentido que pensamos a ciborguização da cultura contemporânea (LEMOS, 2002, COUTO, 2009). O mais antigo dos ciborgues é o primeiro homem que de uma pedra fez uma arma e um instrumento.

A crescente evolução das tecnologias, a que muitos têm chamado de pós-humanas (como a realidade virtual-RV), comunicação global, protética e nanotecnologia, redes neurais, algoritmos genéticos, manipulação genética e vida artificial têm potencializado inúmeras transformações do corpo e da mente, trazendo

Page 3: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

renovados modos de ser, pensar, agir, conseqüentemente implicam em novas formas de ensinar e aprender. Nas palavras de Edvaldo Couto (2009, p.8):

O pós-humano é a conectividade crescente e irreversível dos sistemas biológicos e artificiais. É a condição humana expandida pelas tecnologias. Diz respeito ao agir, pensar e sentir de um homem cada vez mais acoplado a ambientes artificiais e digitais. Diz respeito à vida que se alimenta e configura estreitas e criativas interfaces com as tecnologias, pois as interfaces ampliam a sensorialidade, a inteligência e a memória, potencializa a cognição e a ação de pessoas em situações antes inalcançadas.

Mesmo considerando todas essas transformações, esse estudo se concentra nas referentes à dos corpos plugados no computador para entrada e saída de fluxos de informações. A esses corpos interfaceados no ciberespaço, numa espécie de hibridização homem-máquina, podemos chamar dos mais recentes ciborgues. Para Santaella (2003, p. 202), quando os corpos estão plugados, eles sempre apresentam algum nível de imersão que varia, desde o nível mais superficial, por exemplo, quando se usa o computador para simplesmente escrever um texto, até o nível mais imersivo que se dá nas cavernas da realidade virtual. . Assim, a autora subdivide esse tipo de corpo em uma gama de cinco graus de intensidade crescente de imersão, que podemos inspirados nela, definir da forma a seguir.

Na imersão 1, denominada por Conexão, o corpo fica plugado no computador, enquanto, através do acionamento dos sentidos, visão e tato especialmente, a mente navega através de conexões hipertextuais e hipermidiáticas, tanto nos interiores dos CD-Roms, quanto nas redes.

Para a imersão 2, realizada através de Avatares1, a imersão avança um passo, pois, quando o internauta incorpora um avatar, produz-se uma duplicação na sua identidade, uma hesitação entre presença e ausência, estar e não-estar, ser e não ser, certeza e fingimento, aqui e lá.

A imersão 3, chamada de Híbrida, é a que vem sendo intensamente explorada nas performances e danças performáticas, quando os movimentos do(a) dançarino(a) encontra-se com designs de interface, sistemas interativos, visualizações em 3D ou ambientes imersivos, mundos virtuais ou outros sistemas gerativos de design. Aplica-se também aos casos de mistura de paisagens geográficas com ciberpaisagens, misturas entre campos presenciais e campos virtuais.

Já na imersão 4, intitulada Telepresença, a autora se refere ao sentimento de estar presente em um local físico distante. Nas aplicações de telepresença, tecnologias de realidade virtual são conectadas a sistemas robóticos que estão fisicamente presentes em algum lugar distante. O corpo do participante vê, toca e se movimenta pelo lugar distante graças às conexões com o robô – câmeras, microfones, sensores de toque etc. e “efetores”, os braços do robô. São as experiências de presença e ação à distância que exploram a ubiquidade e a simultaneidade.

1 É a representação visual de um utilizador em realidade virtual. De acordo com a tecnologia, pode variar desde um sofisticado modelo 3D até uma simples imagem. São normalmente pequenos, de tamanhos variados, mas deixando espaço livre para a função principal do site, programa ou jogo que se está a usar.

Page 4: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

E como nível mais profundo de imersão, a imersão 5, temos os Ambientes Virtuais (AV). Nesses AV (sinônimos de Realidade Virtual-RV), cada instrumento de saída, que conecta a ordem sensorial ao mundo exterior, é planejado com o intuito de iludir os olhos, as orelhas, as mãos e o corpo do usuário. Os instrumentos de entrada servem para monitorar os movimentos corporais dos usuários e suas respostas.

É importante chamar atenção de que estas imersões não precisam acontecer necessariamente nesta ordem, é possível, que em determinadas situações não ocorram certos níveis de imersão.

Em uma de suas pesquisas, detectou três tipos de usuários da rede, os novatos, os leigos e os expertos, o que para nós são traços que demarcam o processo de ciborguização de usuários de computadores e internet. A autora percebeu que os usuários expertos entram na rede pelo menos uma vez ao dia, o que indica que a freqüência de uso das redes e a prática conseqüente é um fator primordial para a aquisição da competência de navegar e imergir-nos AVA. Ela  revela os principais traços de cada um desses tipos.

Nos novatos, os principais traços revelados são: desorientação diante da profusão de signos que se apresentam na tela, ansiedade e insegurança nas operações de navegação, se desesperam e desistem, pedindo ajuda. Os usuários leigos é aquele que tem conhecimento de algumas rotas e vai se virando para encontrar outras, examina a situação a cada passo e já sabe eliminar alternativas falsas e escolher as corretas, avança por tentativa e erro. O experto tem conhecimento dos aplicativos no seu todo, manipulando ferramentas e os comandos com desenvoltura e velocidade. Esse último transita pela rede com familiaridade em função da representação mental clara que tem da estrutura, da qualidade e das idiossincrasias dos mecanismos de navegação. Santaella (2004, p. 52) sinaliza que quanto maior a interatividade, mais profunda será a experiência de imersão do leitor, imersão que se expressa na sua concentração, atenção, compreensão da informação e na sua interação instantânea.

Nessa imersão mais intensa, o leitor se torna ao mesmo tempo autor, tornando-se co-autor, reconstruindo o texto lido. Assim, o leitor é convertido em escritor, Característica inerente à comunicação humana – toda linguagem é intrinsecamente interação, diálogo - na interatividade digital há uma complexidade maior para sua análise, dado que o receptor é solicitado pelo texto a construir, individualmente, seu próprio percurso de leitura, a partir de uma unidade textual ofertada. A seqüência de leitura é criada individualmente. (...) Além disso, o sujeito pode dispor de certos recursos interativos que possibilitam que o usuário seja simultaneamente emissor e receptor. (Natansohn, 2010)

A facilidade de publicação de conteúdos e objetos de aprendizagem, assim como a possibilidade de interatividade e imersão (essências da Cibercultura) têm feito da TIC presença inseparável na vida humana, radicalizando o paradoxo presença-ausência com atividades online, seja em cursos à distância ou como apoio a sala de presencial. 

2.1 A Ciborguização Dos Professores: Saberes Docentes Necessários Para Atuação No Cotidiano Escolar Dos Alunos Ciborgues

Com a imersão natural dos ambientes escolares na cibercultura, e a integração das TIC, como apoios incondicionais a esta imersão, cabe aos professores novas responsabilidades, não previstas nas suas atividades tradicionais. São “novos” saberes a serem constituídos. Os professores se veem diante de novos saberes a serem adquiridos.

Page 5: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

Devem ser ao mesmo tempo, aprendizes de novos modos de ensinar e aprender, de novos conteúdos, orientadores de percursos de aprendizagens e tudo isso com recursos que para eles é uma novidade, necessitando de tempo para apreendê-la, por outro lado, seus alunos estão bastante familiarizados.

No entanto, neste processo de mudança didático pedagógica, que devem se dar não apenas em exercício da função docente, mas principalmente na academia, os professores contam com a seguinte vantagem: as informações disponíveis na internet não são conhecimentos, a priori; são apenas dados, necessários, porém não é suficiente; é o docente que ajuda o aluno a transformá-la em conhecimento.

Neste novo modo de aprender e de ensinar a interatividade com os demais são fatores essenciais. A colaboração e a construção de conteúdos, debate, críticas etc. produzem outro modo de se relacionar com a informação e com os demais integrantes que estão ao seu redor; consideramos que é uma nova e melhor maneira de construção de conhecimento. Em síntese, implica a construção de uma identidade na rede de troca e construção, em que seus interesses, possibilidades e responsabilidades se revelam para todos. Esta busca, então, implica o uso responsável das TIC, já que pressupõe um compromisso ativo e permanente de revisão de conteúdos, interesses e uma constante exploração de possíveis narrativas.  

A contemporaneidade tem sido marcada pela intensa conexão entre as pessoas e as máquinas. Neste contexto, o desenvolvimento do conceito de ciborguização docente perpassa pela desconstrução das oposições tradicionais como comentado por Lima (2007) na premissa do orgânico/mecânico, na dimensão ensino aprendizagem. Tais conexões trazem muitas questões para o campo educacional, que se vê com a incumbência de analisar as implicações produzidas pela inserção cada vez mais crescente das tecnologias digitais no processo educacional. 

O ciborgue designa um ser hibrido uma montagem que desfaz o dualismo, já que elimina os limites entre o homem e a máquina, e combina a configuração do aluno ciborgue. Este cenário digital traz a concepção do aluno ciborgue que se constitui em um modo de transgredir as fronteiras do ensino tradicionalmente conhecido. Assim, ao aproximar o conceito ciborgue para o aluno há a concepção de características que o diferencia. Este ser passa a incorporar a tecnologia intensamente em diversos meios digitais e linguagens próprias, além de ampliar consideravelmente o aprendizado em diferentes meios e construções não lineares. A não linearidade cria desafios ao professor que precisa de um desempenho mais dinâmico como ator neste processo.

Diante deste perfil de aluno ciborgue, há a necessidade da construção de novos saberes docentes para atuação do cotidiano escolar. Entretanto, diante de uma lacuna teórica quanto ao conceito deste perfil de professor, este trabalho buscara subsídios em teóricos que desenvolvem estudos sobre a formação de professores na cibercultura.

Sabemos que as TIC por si só não mudam a comunicação na aprendizagem, porém, potencializam alguns aspectos significativos que contribuem para a prática pedagógica, a saber: o trabalho colaborativo; um processo de ensino e aprendizagem mais interativo, onde não há centros fixos, ora ele está no professor, ora no aluno, ora no material didático; alunos e professores assumem novos papéis; a criação de novos espaços de ensino e aprendizagem que possibilitam a escola na internet (em contraponto com a internet na escola); ao professor e aos alunos uma grande quantidade de

Page 6: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

informações; a aquisição de hábitos de pesquisar informação e documentos para que a aprendizagem não se limite a um espaço/tempo pré-determinados ou se reduza somente à escola. Pode-se trabalhar com uma variedade de conteúdos polifônicos, polissêmicos que possibilitem a reflexão crítica e dê asas à criatividade daqueles que se valem dessas ferramentas. Portanto, torna-se importante, nos espaços de formação, distinguir junto aos educadores duas formas de uso das tecnologias na educação: uma como instrumentalidade e outra como fundamento (PRETTO, 1996). Em relação à primeira forma, é colocá-la como recurso didático-pedagógico, para “animar a aula”, “prender a atenção do aluno”, “motivar o aluno”.  Numa visão como essa, a educação continua como está, apenas inserindo novos e avançados recursos tecnológicos, o que implica dizer que o professor está usando a tecnologia para substituir a aula, substituindo um espaço que poderia ser de comunicação interativa, dialógica, de construção colaborativa de conhecimento e focando numa lógica de transmissão. Quanto à incorporação das TIC como fundamento, seria utilizá-la como um elemento carregado de conteúdo (e não apenas como instrumento), simbolizando novas maneiras de pensar e sentir.

Nesse sentido, vale destacar as afirmações de Bonilla (2005, p. 201) ao sinalizar para o cuidado que se deve ter nas ações de formação para que não se reduzam a treinar utilizadores em lugar de formação de professores, pois este é um processo amplo, complexo, que envolve muitos fatores, além do uso prático das tecnologias. Para a autora,

(...) Isso não quer dizer que as ações práticas não sejam importantes e até fundamentais. No entanto, não são suficientes. Para além de o professor saber manusear o mouse, utilizar um editor de texto ou imagem necessita serem capaz de perceber as potencialidades das tecnologias para a transformação das práticas pedagógicas instituídas, conhecerem suas características, as possibilidades de articulação com as demais linguagens já em uso na escola e como é possível trabalhar com elas sem as sufocar.

Para Maria Corrêa, no prefacio do livro de Arruda (2004, p. 11), coloca que para alunos ciborgues, um professor também ciborgue, preparado para integrar todos os dispositivos/artefatos, tecnologias de seu tempo ao processo ensino e aprendizagem em que se consolida a sua transformação em mediador nesse processo de construção de conhecimento. 

3. O Projeto Irecê/Tapiramutá: Situando O Contexto de Formação dos Professores do Caso em Estudo

O Programa de Formação Continuada de Professores para os Municípios de Irecê e Tapiramutá2 visa integrar em rede, tecnológica ou não, diferentes projetos que incrementam, em diversas vertentes, o processo de formação dos professores, disponibilizando-lhes uma estrutura pedagógica, comunicacional e administrativa

2 Ação conveniada entre a Faculdade de Educação da UFBA e as Secretarias Municipais de Educação dos referidos municípios, se constitui em uma experiência de prática pedagógica que exercida em uma dinâmica de horizontalidade tem como máximas fundamentadoras o respeito aos processos cotidianos e a valorização plena do sujeito É um projeto elaborado em parceria entre os professores da UFBA e da rede municipal dos municípios envolvidos respeitando as singularidades locais.Para conhecer mais sobre o Projeto, visite o site http://wiki.dcc.ufba.br/UFBAIrece/WebPrograma.

Page 7: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

interativa e flexível. Esse programa tem uma abrangência de diversos projetos, mas trataremos nesse trabalho do Curso semi-presencial de Formação de Professores em nível Superior que confere aos professores em serviço aprovados o título de licenciado em Pedagogia em Educação Infantil e Ensino fundamental nas séries iniciais.

A referida proposta reconhece que o grande avanço tecnológico, que possibilitou e foi possibilitado pelas mudanças nas mais diversas áreas da atuação humana, afeta toda a prática social, facultando a construção de novos “mapas culturais”, novos valores e referências, configurando múltiplos padrões de sociabilidade e de subjetividades, trazendo a exigência do desenvolvimento de novas competências por parte do cidadão-trabalhador, tendo em vista a emergência constante de novos conhecimentos.

 Assim, o profissional da área de educação tem sobre si a exigência da construção e socialização de conhecimentos, habilidades e competências com a tarefa de participar, como docente, pesquisador e gestor do processo de formação de crianças, jovens e adultos. Portanto, a partir dessas múltiplas demandas transfere para o processo de formação de profissionais em educação, a exigência de ser ele próprio, constituído como uma ação inter-relacional, que contemple a diversidade de perspectivas de apreensão do real, a polifonia dos discursos veiculados e a apropriação das tecnologias que estão a serviço do conhecimento contemporâneo. A concepção desse curso se sustenta na formação em exercício. Nesse sentido, o eixo norteador do programa é a práxis pedagógica, como espaço-tempo no qual ocorrem as reflexões e as ações que dão sentido ao cotidiano de cada escola, ao trabalho de cada professora e cada professor, que repercutem no processo de formação e produção de conhecimento desenvolvido pelo conjunto da comunidade escolar. O curso é realizado no período mínimo de três anos, com atividades síncronas e assíncronas de ensino semipresencial, com a intenção de que seja possível o uso intensivo e convergente das tecnologias da informação e comunicação, que estruturarão a base do Projeto e da práxis pedagógica dos professores.

O processo de trabalho docente, como é hoje compreendido, requer um profissional que alie habilidades do fazer pedagógico com outras referentes ao pensar permanente de sua própria prática, conforme as exigências de perfil para o cidadão-trabalhador na sociedade contemporânea: aquele que acrescente aos conhecimentos básicos para o desenvolvimento de função específica, conhecimentos e habilidades de gestão de seu próprio trabalho. Para tanto, torna-se necessário pensar uma pedagogia, aquela que está umbilicalmente ligada à presença das tecnologias da informação e comunicação, que se coadune criativamente com o momento histórico contemporâneo. Essa assertiva está em consonância com uma inovadora estrutura curricular, o labirinto, numa perspectiva não-linear da educação, e numa ressignificação do modelo tradicional de espaço-tempo escolar, extrapolando a educação bancária que ainda reina nas práticas pedagógicas, como propõe Bonilla e Picanço (2005, p. 220) a partir de seus estudos:

(...) Para além do caminho único, ou uma orientação a ser delimitada, as proposições que estamos desenvolvendo buscam provocar o diálogo entre os diferentes sujeitos da educação e para além deles, ampliando a rede de relações ao envolver outros sujeitos que podem contribuir para dinamizar o processo. A dinâmica das interações envolve encontros em espaço-tempo comuns e não-comuns aos sujeitos explorando, desse modo, o potencial interativo das TIC.

Page 8: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

A importância desse modo de organização é a vivência da singularidade de cada contexto e a convivência plural das múltiplas subjetividades. Nesse cenário, o tradicional papel do professor como guardião e transmissor de conhecimentos vem se aliando a uma prática de um professor que se constitua num negociador permanente das diferenças (Pretto, 2001), atuando como um mediador das aprendizagens.

A partir de sua concepção pedagógica e da proposta de um currículo em rede, o projeto possui âncoras para nortear as suas ações, a saber: processos horizontais, processos coletivos, centros instáveis, currículo hipertextual, participação efetiva, formação permanente e continuada cooperação, simultaneidade entre a escrita e a oralidade, sincronicidade na aprendizagem. A partir de Deleuze e Guatarri (2004), podemos relacionar esses princípios a algumas idéias que norteiam a construção de conhecimento na Cibercultura, numa perspectiva rizomática: conexão e heteroneidade: qualquer ponto de um rizoma pode ser conectado a qualquer outro e deve sê-lo; a multiplicidade, onde não se reduz nem a um objeto único ou sujeito único, hibridizando-os, sem unificá-los; a ruptura a-siginificante, contra os cortes demasiado significantes que separam as estruturas, ou que atravessam uma estrutura. Assim, um rizoma pode ser rompido, quebrado em um lugar qualquer e também retoma segundo uma ou outra de suas linhas e segundo outras linhas; a cartografia e a decalcomania, um rizoma não pode ser justificado por nenhum modelo estrutural ou gerativo. Portanto, o rizoma traz a idéia de mapa e não de decalque. Fazer o mapa, não o decalque. O mapa não reproduz um inconsciente fechado sobre ele mesmo, ele o constrói. É aberto, é conectável em todas as dimensões, suscetível a receber modificações a qualquer momento.

Na sua organização curricular, visando atingir essas injunções conceituais apresentadas, a análise está dividida em ciclos. Em cada ciclo é oferecido um conjunto de Atividades Curriculares, criado especificamente para aquele ciclo. Cada professor-cursista escolhe o ciclo, com o auxílio da equipe de orientação, as Atividades Curriculares de suas necessidades e interesses, tanto acadêmico-pedagógicos como burocráticos, construindo assim seu próprio percurso de aprendizagem. A opção por esta específica organização curricular está embasada por um entendimento de currículo, consonante com os atuais documentos que tratam sobre a questão curricular no país, que o define como o “processo social realizado no espaço concreto escola” (Burnham, 1993), que, engloba, através de ações discentes e docentes, os percursos de aprendizagens a serem construídos em um determinado processo de formação. Possuem dimensões epistemológicas, políticas, econômicas, técnicas, ideológicas, estéticas, históricas (Apple, 1988). Em virtude da estrutura, cada professor-cursista construirá, ao longo do curso, seu próprio percurso de aprendizagem, escolhendo as atividades que desejar realizar até totalizar a carga horária requerida pelo Projeto.

4. Ciborguização dos Professores: Os Casos de Irecê e Tapiramutá

Em consonância com a proposta curricular do projeto, as atividades do curso de formação de professores acontecem em espaço-tempo diferenciados se apropriando das interfaces de informação e comunicação dos ambientes virtuais como novos espaços de aprendizagem, ampliando o contexto físico da sala de aula e contribuindo para o processo de ciborguização dos professores-cursistas. Entre os diversos ambientes online, os mais utilizados são as listas de discussão, o Moodle e os blogs.

Page 9: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

A seguir, serão apresentadas algumas etapas, não lineares, de construção de saberes em relação a determinados graus de imersão e interatividade nos ambientes citados para realização das atividades, o que representa os processos de ciborguização dos professores-cursistas. Para que haja um processo de imersão nesses AVA, é preciso que haja uma compreensão dos princípios da aprendizagem na cibercultura, como interatividade, aprendizagem compartilhada e suas novas possibilidades de avaliação, e as consequências de todo esse cenário na prática docente. Nos processos formativos, devem-se incluir os usos dessas TIC na aprendizagem, na organização do currículo e na organização dos espaços-tempo da escola, portanto uma ampla discussão sobre a sua inclusão nos projetos pedagógicos.

As listas de discussão são utilizadas para interação virtual entre professores, cursistas e demais participantes das atividades acadêmicas, são elas que dão a dinâmica de redes sociais, são imperativas na rede, por serem (aparentemente) de mais fácil acesso, e por estarem em conexão com os e-mails pessoais de cada membro da lista. Nessa lista, os professores orientam os alunos sobre as atividades, enviam avisos prévios sobre as atividades que serão realizadas pessoalmente, compartilham leituras, tiram dúvidas dos alunos, socializam eventos na área de educação. É onde se percebe o mais alto grau de imersão dos cursistas e dos docentes do curso. Até mesmo as discussões que deveriam ser realizadas no Moodle, em alguns casos são realizadas nesse espaço.

O Moodle é o espaço destinado para disponibilização do material de todas as atividades do curso, e principalmente como ambiente de interatividade. No entanto, poucos se apropriam das possibilidades do meio. Percebe-se que os professores-formadores ainda se encontram em diferentes níveis de imersão e interatividade no ciberespaço, o que traz consequência para pouca ou nenhuma intensidade de interatividade nesse ambiente. No AVA, há uma interface de interatividade bastante utilizada no curso, o fórum de discussão, o que se apresenta como um recurso que contribui para dinamizar o processo de aprendizagem e a construção colaborativa de conhecimentos. Neles, os cursistas discutem temáticas de interesses comuns, acompanham as discussões abertas, complementa-as, refuta-as e propõem novos temas para o debate.

Os blogs se configuram como espaços de reflexão das atividades desenvolvidas. Em decorrência plasticidade do digital, o blog ou diário online permite a manipulação e edição de imagens, podendo o autor narrar as suas histórias e ilustrá-las, com inúmeras possibilidades de linguagens mixadas e em formato hipertextual. Se compartilhado, através do seu potencial interativo, permite a troca e partilha de sentidos entre formadores e cursistas e entre os próprios cursistas. Para Santos (2006, p. 136), com a emergência da educação online e do potencial dos AVA, os diários eletrônicos começam a indicar a possibilidade concreta na mediação de processos reflexivos (na ação e sobre a ação) em cenários de formação. Nele, os cursistas registram as observações efetuadas, as situações que se destacaram, como: procedimentos utilizados, estratégias desenvolvidas, participação, interesse, angústias, aprendizados, dificuldades, dilemas. O diário é um documento de reflexões, em que o autor dialoga consigo mesmo, analisando atividades realizadas, revendo encaminhamentos, documentando seu percurso.

Em relação a estes recursos e sua aprendizagem, os cursistas são bastante otimistas quanto a necessidade desses, estarem presentes no seu processo formativo, e

Page 10: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

de sua importância na interação pelas redes sociais, é o que podemos observar na fala de uma das professoras cursista, quando coloca que em relação a estes recursos:

(...) devemos primeiro conhecê-lo, para a partir daí nos posicionar frente a esses avanços tecnológicos, que de alguma forma fazem parte de nosso cotidiano. A internet, por exemplo, está possibilitando cada vez mais aproximação entre pessoas de todo o mundo, através dos fóruns de discussão, listas de discussões, e-mail, comunidades virtuais, entre outros. E nós enquanto professores em formação não podemos deixar de utilizar essa forma de comunicação e sociabilidade” (Elizabete Novais).3

Outros recursos como twiter, facebook e orkut, muito utilizados para interações sociais, aparecem com menos frequência nas relações destes professores-cursistas com suas atividades formativas. A seguir são apresentados duas atividades curriculares que utilizaram principalmente, o moodle, as listas e os blogs, como recursos contínuos e característicos da formação semipresencial nos AVA.

O Curso Educação e Cibercultura teve como objetivo identificar e compreender os conceitos básicos da Cibercultura e suas implicações nos processos de aprendizagem mediados pelos ambientes virtuais de aprendizagem, seja nos cursos a distância ou nas aulas presenciais. Em uma das atividades práticas, puderam vivenciar, navegando na internet, o processo de pesquisa escolar, refletindo sobre conceitos de links e hipertexto, e compreendendo o que ocorre com seus alunos, quando estão imersos nos ambientes virtuais em busca do entendimento sobre uma determinada temática. Foi proposta uma atividade de pesquisa de um tema de interesse, e o registro do que foi esse percurso: deixando explícito os caminhos percorridos e suas impressões e sentimentos ao realizar essa atividade. Uma das professas cursista, inspirada no poema Navegar a deriva de Marcos Vinicius, em depoimento no moodle, relata bem o que é esse processo:

Todos nós de alguma forma vivemos à deriva em algum momento de nossas vidas, só pelo prazer da busca ou da espera do desconhecido, muitos acabam afogando outros atracar a qualquer porto. Pior do que estar à deriva é não saber pra onde os ventos estão nos levando. Mas quem sabe no vai e vem desses ventos não encontremos um porto seguro onde possamos ancorar. Do mesmo jeito que o poema fala de uma embarcação em alto mar, da mesma forma a internet nos convida a navegar. Entrar neste mundo da tecnologia e a navegar por oceanos em escala mundial (Euma).

A atividade Software Livre no Ensino de Matemática, oferecida para o projeto Irecê, se deu na forma de uma oficina. A proposta foi tomar conhecimento de softwares livres disponíveis para o ensino de matemática, discutir suas aplicabilidades e utilizar em sala de aula alguns destes softwares, e para tal apresentamos material disponibilizado na internet pelo projeto Matemática Interativa Linux-MIL. Como atividade avaliativa desta oficina, os professores cursistas desenvolveram aulas com seus alunos, nos espaços disponíveis na escola ou para além da escola, como: inforcentro, tabuleiro digital, laboratório de informática. Para que a oficina não fosse compreendida apenas como utilitarista, foram abertos espaços de discussões no AVA, no formato de fóruns no Moodle para postagens de impressões a respeito das aplicabilidades das TIC e de suas percepções sobre a importância do ciberespaço e suas

3 Neste artigo permanecemos com os nomes dos depoentes, tendo em vista que seus depoimentos foram dados em ambientes virtuais, de acesso público.

Page 11: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

potencialidades educativas, além de discussões que afloraram na lista do grupo Irecê. Para apresentar os resultados de suas imersões nas TIC, os cursistas postaram os relatos de suas atividades nos seus blogs, como forma de socializar suas experiências formativas na atividade curricular proposta.

Em ambas as atividades os professores cursistas utilizaram com bastante intensidade os Blogs para suas reflexões e acompanharam as reflexões dos colegas, deixando comentários por onde navegam. Assim como a utilização do diário como instrumento capaz de contribuir para a reorganização da aprendizagem, bem como fornecer ao formador e, principalmente, ao próprio cursista, informações sobre a aprendizagem4.

Além desses espaços de (in)formação e comunicação, em todos os ciclos são realizadas atividades voltadas para a utilização da tecnologia na educação. A exemplo destas atividades, podemos citar: em Irecê: curso ambiente de rede, curso Educação e Cibercultura, oficinas de software livre, oficina de produção de vídeo, oficina de produção de áudio; em Tapiramutá: curso ambiente de rede, oficinas de software livre, oficina de produção de vídeo, oficina de produção de áudio. A intenção dessas atividades não é limitar-se a desenvolver competências e possibilitar o contato com o computador, mas abordar questões epistemológicas e políticas, relacionadas às características e as linguagens das diversas tecnologias no contexto atual, assim como as consequências para a prática pedagógica. Vale informar, que outras atividades curriculares, tanto de Irecê quanto de Tapiramutá, também se utilizam do AVA, porém com menos intensidade que as atividades mencionadas.

Nos meios interativos utilizados para discussão da temática proposta, percebe-se que o grau de imersão desses cursistas se encontra em um avançado nível, pois há uma grande participação, com repostas fundamentadas em textos lidos, complementação nas falas dos colegas e respondendo as provocações dos professores formadores. Os cursistas não apenas contemplam as mensagens postadas, mas interagem com as mesmas, co-criam, ressignificam, relacionando com suas experiências de vida e profissional. Vejamos a seguir, trecho de uma discussão no moodle a partir da questão: Como essa nova cultura nova cultura (tecnológica) pode afetar os processos de ensino e aprendizagem na sala de aula? Questão proposta em fórum de discussão da atividade Software Livre e Ensino de Matemática:

por Ana Cristina Cordeiro - sexta, 16 abril 2010, 05:21

 

É interessante que os professores recebam capacitação adequada para poder trabalhar de maneira eficaz com os alunos, pois não basta simplesmente ter os recursos tecnológicos se os professores não estão preparados para trabalharem de forma contextualizada. Utilizando e-mails, blogs e diferentes sites de relacionamento e que o aluno seja um sujeito ativo para poder criar jogos e manusear programas.

por Dulcenalva Alecrim - sábado, 24 abril 2010, 00:49

 

Com certeza a capacitação é necessária, porém se as escolas e os demais envolvidos no processo educacional tivessem a atenção voltada para essa situação, penso que todos os professores já estariam desenvolvendo bons projetos. O problema é que fica tudo no discurso. Emperra na burocracia e na mania que têm de achar que a educação é lenta e, dependendo "deles" vamos seguindo com passos de tartaruga.

por Paula Rodrigues - segunda, 26 abril 2010, 00:52

4 Como uma amostra da imersão dos cursistas nesse espaço, sugerimos a visita ao blog de uma das cursistas, no endereço http://gicelia.blogspot.com [u1]  

Page 12: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

 

É verdade Dulcenalva, depois eles cobram o que não é pra ser cobrado. Possibilitar a escola com as tecnologias é fazer com que a escola ande em novos horizontes. É como você falou andamos em passos de tartarugas, mais mesmo assim nada é resolvido.

Existe uma constatação unânime entre os professores cursistas participantes das discussões nos fóruns - há necessidade de estarem plugados nos ambientes virtuais - portanto que devem imergir nesse novo meio, como pode ser visto na fala de Dulcenalva Alecrim (quarta, 28 abril 2010, 01:40), ao postar no fórum sobre a questão: Como vocês enfrentam e se posicionam diante da cibercultura com o que ela potencializa a partir do computador e da internet ? Colocando que:

No momento, estou na posição de aprendiz. O curso de Pedagogia proporcionou essa inserção digital, a qual eu conhecia apenas indiretamente. Hoje sei que a internet é um meio de interação universal, com um potencial capaz de mover o mundo, não trazendo somente coisas benéficas, o que requer dos pais e professores um olhar mais atento. O homem deve usá-la a seu favor e não contra.

Esta declaração demonstra que a professora percebe que novos saberes devem ser construídos para a sua prática docente, que para utilizar essas tecnologias, não basta conhecimento técnico, mas aspectos como interatividade e aprendizagem colaborativa devem ser considerados. O discurso da cursista mostra ainda que estes percebem a importância na sua formação no uso das TIC

Os depoimentos revelam a necessidade de uma maior imersão nos AVA, como está explicito na fala de Ana Cristina Cordeiro (domingo, 9 maio 2010, 06:35):

Esta cultura pode afetar os alunos e professores quando estão inteirados a participar de diferentes ambientes virtuais, interagindo com outras pessoas de diferentes grupos, compartilhando e trocando conhecimento de forma afetiva e colaborativa, pois desta maneira a aprendizagem será contextualizada e os vínculos serão construídos de forma de troca e  de uma boa comunicação.

Os cursistas também destacam que a falta de infraestrutura dificulta a utilização na sala de aula, como pode ser visto no depoimento de Paula Rodrigues (segunda, 26 abril 2010, 00:46), ao responder o questionamento: Vocês se sentem preparados para enfrentarem, como docentes, tais questões ? Quais as dificuldades?

Às vezes não é estar preparados, mas a disponibilidade de maquinas que não temos nas nossas escolas e isso faz com que o professor fique distante dessa tecnologia e assim dificulta o trabalho.

Nesse processo de ciborguização, aparecem diversos dilemas, entre eles, o de não ter as máquinas na escola, mas ao mesmo tempo percebem que podem incluí-las como recursos em suas atividades, utilizando outros espaços fora da escola. O desejo de utilizá-las para ajudar na construção do conhecimento pelo aluno fica muito forte nas falas dos sujeitos, como nos mostra o cursista Gervasio Mendes Mozine (terça, 20 abril 2010, 00:29):

Senti vontade de estar com meus alunos no momento em que participava do encontro com Narciso. Ele fazia uma viagem pelos

Page 13: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

softwares livres capazes de tornar uma aula de matemática bem mais atrativa em relação a que fazemos hoje sem o uso do computador e da internet. Uma atividade pela lousa pode reduzir a capacidade do aluno refletir sobre o que está fazendo. Uma atividade oferecida através do jogo, além de estimular o aluno a fazer, oferece inúmeras oportunidades de realizá-la e seguir para a próxima.

Freitas (2009, p. 71) mostra que os professores só estarão imergindo seus alunos nesses novos ambientes de aprendizagem depois de uma “experiência direta, quando se sentem capazes de dominar aquilo que lhes parecia no inicio tão difícil, quando começam a ver as possibilidades reais de uso na própria prática e na de seus companheiros”.

O processo de ciborguização se dá gradativamente, no inicio, meio receosos de mexer com a máquina, sem o domínio dos instrumentos, depois, aos poucos, diante de um trabalho em conjunto com seus pares, vão se soltando, tirando suas dúvidas, compartilhando suas angústias e aprendendo em parceria, deixando de serem leitores contemplativos, para leitores-autores imersivos. Por outro lado, devemos ter clareza que para a imersão dos sujeitos-aprendentes é preciso que se tenha liberdade de escolhas entre nexos – dada pelo docente-formador e sentida por eles- e que se tenha iniciativa de busca e direções e rotas, caso contrário, a leitura imersiva não se realiza.

Durante o processo formativo pelo qual passam os professores cursistas, que participaram das atividades mencionadas na introdução deste artigo, se apresenta de maneira intensa o uso das tecnologias, com elevada imersão na cibercultura, aqui temos uma caracterização prática das imersões apontadas por Santaella (2003). Os corpos plugados dos professores, a exemplo, se inserem na imersão I a partir do início do curso, com a ambientação dos professores cursistas na rede mundial de computadores (internet). As atividades apresentadas ocorreram no IV ciclo do curso, o que nos permitiu lhe dar com professores em um processo diferenciado de ciborguização docente que demonstrou que esta competência não esta relacionada com ambientes próximos de centros com intensividade tecnológica. Tal dimensão de inserção está mais para culturas com características sociais de cibercultura do que ambiente com estruturas tecnológicas reconhecidamente intensivas.

  

5. Considerações Finais

Esse trabalho apresentou algumas dimensões de um processo que denominamos de “ciborguização de professores” no contexto de formação. A discussão desse processo foi descrito e analisado através de percepções acerca dos graus de imersão nos ambientes virtuais. Assim, a pesquisa que subsidia este trabalho explorou a percepção do uso da tecnologia e a relação do usuário com a TIC.

Os discursos dos Professores formadores se cruzam transversalmente com dos professores cursistas, o que permite reflexões subjetivas que reafirmam posturas e condutas ciborgues já amplamente percebida nos dois espaços sociais.

A análise dos dados demonstra que a ciborguização se materializa nas práticas acadêmicas e profissionais do professor, demonstrando características implícitas de conectividade intensa na atividade e a correlata dependência da TIC no processo ensino-aprendizagem. Uma vez que o processo de ciborguização conduz esses professores

Page 14: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

cursistas à incorporação das TIC na sua prática pedagógica, e que demonstram em seus discursos a importância destas ferramentas.

Outra perspectiva apresentada na pesquisa foi à aproximação com a tecnologia apresentada pelos professores, ao qualificarem a  TIC com percepção afetiva e com construção de vínculos, demonstrando a tênue ou ausência de limite entre o homem e a máquina, além de uma recíproca relação que contribui com a aprendizagem contextualizada com vínculos construídos pelas TIC. 

No entanto, há a inadequada estrutura tecnológica que torne acessível à disseminação entre alunos e professores na atividade digital. O que confirma a dificuldade de cidades afastadas da capital ou de centros mais desenvolvidos de serem contempladas com investimentos tecnológicos, mas demonstra que esta escassez de recursos digitais independe para que seja criada uma atmosfera cultural em tecnologia. A cibercultura torna-se uma etapa coadjuvante no processo de ciborguização, mas não inerente a esta conquista.

Fica evidenciado que a conduta e a consciência do docente na sua atuação profissional, muitas vezes transgridem as fronteiras e limites culturalmente produzidos pela coletividade. Há uma ênfase a vontade de se desenvolver e fazer acontecer um processo inovador de ensino aprendizagem, consciente do papel reformador na mediação pedagógica e o desafio das carências tecnológicas que dificultam a evolução do processo educacional. 

Referências: 

ARRUDA, Eucidio. Ciberprofessor: novas tecnologias, ensino e trabalho docente.Belo Horizonte: Autêntica/FCH-FUMEC, 2004.

BONILLA, Maria Helena S. e PICANÇO, Alessandra de A. Construindo novas educações. In: Pretto, Nelson (org.).Tecnologia e novas educações. Salvador: EDUFBA, 2005.

COUTO, Edvaldo Souza. Politicas do Pós-humano: interfaces dos corpos, das sexualidades e das tecnologias digitais. Trabalho encomendado do “GT 23 – Gênero, Sexualidade e Educação”, apresentado na 32ª reunião anual da ANPED, Caxambu-MG, em 05/10/2009.

DELEUZE, Gilles e GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Trad. Aurélio Guerra Neto e Célia Pinto Costa. Rio de janeiro: Ed. 34, 2004.

FREITAS, Maria Teresa de A. A formação de professores diante dos desafios da cibercultura. In: FREITAS, Maria Teresa de A., Cibercultura e formação de professores. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009.p.57-86.

LEMOS, André. Cibercultura: tecnologia e vida social na cultura contemporânea. Porto Alegre; Sulina, 2002.

NATANSOHN, L. Graciela O que há e o que falta nos estudos sobre recepção e leitura na web? Disponível em: <http://www.compos.org.br/files/08_graciela.pdf> Acesso em 22 junho 2010

Page 15: Artigo Ciborguiza o Docente  Julho 2010

SANTAELLA, Lúcia. Culturas e artes do pós-humano: da cultura das mídias á cibercultura. São Paulo: Paulus, 2003.

_______________. Navegar no ciberespaço: o perfil cognitivo do leitor imersivo. São Paulo: Paulus, 2004.