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ISBN: 978-972-9171-86-4

Artigo V Congresso OTOC set. 2015 - occ.pt · Uma vez analisado o conceito de BPHAC, uma questão que se coloca é se, pelas suas características, poderemos dizer que estes bens

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ISBN: 978-972-9171-86-4

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O RECONHECIMENTO DOS BENS DO PATRIMÓNIO HISTÓRICO, ARTÍSTICO

E CULTURAL: ESTUDO DE CASO DOS MUNICÍPIOS

DA SUB-REGIÃO MINHO-LIMA

Susana Catarino Rua

Prof. Adjunta do Departamento de Contabilidade e Fiscalidade

Escola Superior de Gestão do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave

Campus do IPCA, 4750 – 810 Barcelos (Portugal)

Telf.: +351 965843812

Email: [email protected]

Áreas Temáticas: A3) Normalização contabilística; A4) Contabilidade Pública

Metodologia de Investigação: M2) Case/Field Study

Palavras-chave: Reconhecimento; BPHAC; Municípios; Minho-Lima.

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O RECONHECIMENTO DOS BENS DO PATRIMÓNIO HISTÓRICO, ARTÍSTICO

E CULTURAL: ESTUDO DE CASO DOS MUNICÍPIOS

DA SUB-REGIÃO MINHO-LIMA

RESUMO

Este trabalho tem por objetivos analisar o disposto no POCAL (1999), na NICSP nº 17 do

IPSASB (2006c), e na opinião de diversos autores, quanto ao reconhecimento dos bens do

património, histórico, artístico e cultural (BPHAC); bem como, verificar se poderão existir

problemas inerentes ao reconhecimento destes bens, na sub-região Minho-Lima,

ultrapassáveis com a adoção das NICSP em Portugal. Do estudo efetuado, concluímos que o

POCAL (1999) não apresenta os requisitos para o reconhecimento dos ativos. A NICSP nº 17

(IPSASB, 2006c) refere que, se a entidade reconhecer esses elementos como ativos, deve

observar os requisitos para o reconhecimento dos ativos fixos tangíveis mencionados nessa

norma. Atendendo também a que alguns dos municípios portugueses sentem dificuldades no

reconhecimento dos bens do património, histórico, artístico e cultural, concluímos que adotar

um novo Sistema de Normalização Contabilística aplicável à Administração Pública (SNC-

AP), assente nas NICSP, poderá ser a solução para ultrapassar tais dificuldades e garantir

alguma comparabilidade da informação.

PALAVRAS-CHAVE: Reconhecimento; BPHAC; Municípios; Minho-Lima.

ABSTRACT

This study aims to analyze the mentioned of POCAL (1999), IPSAS of IPSASB (2006c), and

in the opinion of many authors, regarding the recognition of heritage assets; as well as to

check if there may be problems inherent to the recognition of heritage assets in the Minho-

Lima sub-region, bridgeable with the adoption of IPSAS in Portugal. With this study, we

conclude that the POCAL (1999) lacks the recognition criteria of assets. The IPSAS 17

(IPSASB, 2006c) states that if an entity recognize those elements as assets, must comply the

requirements for the recognition of tangible assets mentioned in this standard. Also

considering that some of the Portuguese municipalities have difficulties in recognition of

these elements, we conclude that adopting a new Accounting Standards System applicable to

Public Administration (SNC-AP), based on the IPSAS, may be the solution to overcome these

difficulties and ensure some comparability of information.

KEYWORDS: Recognition; Heritage assets; Municipalities: Minho-Lima.

3

1. Introdução

Face à atual visão da contabilidade pública, direcionada para a determinação do valor do

património, importa reconhecer os diversos tipos de ativos públicos, nomeadamente os bens

do património, histórico, artístico e cultural (BPHAC), também conhecidos por heritage

assets1.

Reconhecer os elementos das demonstrações financeiras, nomeadamente dos ativos, enquanto

um dos elementos da estrutura conceptual (Rua & Carvalho, 2006, p. 144), significa

“incorporar na demonstração financeira apropriada um item que satisfaça a definição de um

elemento e possa ser mensurado de um modo que atenda às características qualitativas da

informação” (IPSASB, 2012, §7.1.).

Assim, reconhecer um elemento numa demonstração financeira, implica que este cumpra

cumulativamente dois requisitos, a saber:

• Requisito 1: preencha o conceito da classe (massa patrimonial) em que se

enquadra; e, simultaneamente,

• Requisito 2: cumpra com os critérios para o seu reconhecimento, definidos nas

estruturas conceptuais existentes, ou nas respetivas normas.

Relativamente a estes requisitos, o Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais

(POCAL) (1999), e restantes planos públicos setoriais portugueses, nada referem a esse

respeito. Este plano apenas menciona as demonstrações financeiras e os elementos que as

compõem, o que evidencia as carências conceptuais existentes em Portugal, em virtude da

inexistência, neste país, de uma estrutura conceptual para a Contabilidade Pública.

Recorrendo às normas do International Public Sector Accounting Standards Board

(IPSASB), para colmatar as lacunas conceptuais da legislação portuguesa de âmbito público,

na sua Norma Internacional de Contabilidade para o Setor Público (NICSP) nº 1 (IPSASB,

2006b), faz referência ao primeiro requisito de reconhecimento, ou seja, define ativo como

sendo “recursos controlados por uma entidade como resultado de eventos passados e dos

quais se espera que fluam para a entidade, benefícios económicos futuros ou potencial de

serviço”.

1 Heritage Assets é a terminologia utilizada nas normas internacionais de contabilidade, referindo-se ao que em Portugal, e neste trabalho, designamos de bens do património, histórico, artístico e cultural.

4

Quanto ao segundo requisito de reconhecimento, e atendendo especificamente aos ativos fixos

tangíveis (AFT), o §14 da NICSP nº 17 do IPSASB (2006c), refere que “o custo de um item

de um ativo fixo tangível, deve ser reconhecido como um ativo se, e apenas se:

• É provável que benefícios económicos futuros ou potencial de serviços associados

com o item fluirão para a entidade; e

• O custo ou justo valor do item pode ser mensurado fiavelmente”.

Se um elemento não preencher cumulativamente os referidos requisitos, não deverá ser

incluído nas demonstrações financeiras. Contudo, conforme refere o §87 da estrutura

conceptual do International Accounting Standards Board (IASB) (1989), e também de acordo

com a Asociación Española de Contabilidad y Administración de Empresas (AECA) (2001,

§262), qualquer elemento que hoje não possa ser reconhecido, porque não preenche os

requisitos para tal, pode qualificar-se para um reconhecimento futuro quando, por condições

de vária ordem, passe a cumprir tais requisitos de reconhecimento.

Por outro lado, um elemento reconhecido numa demonstração financeira, não está

reconhecido para sempre, uma vez que, deixando de cumprir os requisitos que justificaram o

seu reconhecimento, deixará de poder constar na demonstração financeira em causa e,

portanto, dá-se o seu desreconhecimento.

No que se refere ao reconhecimento dos BPHAC, e apesar deste tipo de bens constituírem

uma parte considerável do património das entidades públicas, ainda existem muitos autores

que consideram que estes não devem ser reconhecidos como ativos, pelo simples facto de não

produzirem quaisquer rendimentos para estas entidades e, portanto, segundo eles não

preencherem os requisitos para o reconhecimento de um ativo.

Todavia, outros autores têm opiniões contrárias, argumentando que os BPHAC devem ser

reconhecidos como ativos, sob pena do património das entidades públicas ficar subvalorado

sem a sua inclusão.

Na verdade, esta tem sido uma questão bastante polémica, e que muitas divergências tem

levantado, mesmo ao nível dos sistemas normativos dos mais diversos países.

Tendo presente estes aspetos, este trabalho tem por objetivos, em primeiro lugar, analisar se

os BPHAC cumprem, ou não, os requisitos para o reconhecimento de um ativo, atendendo a

diversas opiniões doutrinais, bem como, aos normativos portugueses e internacionais; e, em

segundo lugar, analisar a proporção de BPHAC reconhecidos pelos municípios da sub-região

portuguesa Minho-Lima, face ao total do seu ativo, de forma a identificar se poderão existir

5

problemas inerentes ao seu reconhecimento, ultrapassáveis com a adoção das NICSP do

IPSASB em Portugal.

Para o efeito, é apresentada no capítulo dois deste trabalho, uma revisão de literatura, na qual

é estudado o polémico reconhecimento dos BPHAC, atendendo à opinião de diversos autores

e ao disposto nos normativos portugueses e internacionais; e, no capítulo três, é apresentado

um estudo acerca dos BPHAC reconhecidos pelos municípios da sub-região Minho-Lima.

2. Revisão de Literatura: O reconhecimento dos bens do património, histórico, artístico

e cultural

2.1. Primeiro requisito de reconhecimento: o conceito de bens do património, histórico,

artístico e cultural versus o conceito de ativo

Os BPHAC encontram-se, no âmbito do POCAL (1999), integrados nos bens de domínio

público.

Entendem-se como bens de domínio público, ou bens dominiais, os bens que pertencem a

uma pessoa coletiva de direito público e que se encontram afetos a um fim de utilidade

pública.

Apesar dos bens de domínio público também serem, na generalidade2, materiais ou corpóreos,

e de alguns deles estarem mencionados, por exemplo, na NICSP nº 17 do IPSASB (2006c),

como “Property, plant and equipment”, isto é, ativos fixos tangíveis, eles possuem

características que os distinguem destes, nomeadamente, entre outras, o facto de não

possuírem um objetivo comercial mas sim social e, portanto, não terem por objetivo a

obtenção de fluxos de caixa, e serem utilizados, ou estarem disponíveis para serem utilizados,

diretamente pela Comunidade, ou público em geral.

Os BPHAC possuem de uma forma “mais vincada” as características dos bens dominiais, por

isso os classificamos como um dos tipos desses bens. O IPSASB (2006c), no §10 da NICSP

nº 17, faz referência aos BPHAC, mencionando também que muitos ativos são classificados

como tal em virtude da sua importância cultural e histórica.

A AECA (2005), no §80, refere que o património histórico, artístico e cultural é formado por

“bens imóveis e objetos móveis de interesse artístico, histórico, paleontológico, arqueológico,

2 Note-se que poderão existir casos especiais de bens de domínio público intangíveis (Flores Jimeno, 2006).

6

etnográfico, científico ou técnico; coleções, o património documental e bibliográfico; as

minas e zonas arqueológicas, assim como os sítios naturais, jardins e parques que tenham

valor artístico, histórico ou antropológico”. Igual definição é também apresentada no ponto 3º

da 2ª parte do Plan General de Contabilidad Pública (PGCP) (2010) espanhol.

Atendendo a estes conceitos de BPHAC, e de acordo com o §10 da NICSP nº 17 do IPSASB

(2006c), e também com o ponto 3º, da 2ª parte, do PGCP (2010) espanhol, existem

características evidenciadas por estes ativos, mas que não são exclusivas destes ativos, como

sejam:

- O seu valor em termos, nomeadamente, culturais e históricos, é improvável que

seja totalmente refletido num valor financeiro baseado apenas em valores de

mercado;

- As imposições legais e estatutárias impõem proibições ou restrições severas na sua

venda;

- Eles são amiúde insubstituíveis, e o seu valor está constantemente a aumentar

apesar das suas condições físicas se deteriorarem;

- É difícil estimar a sua vida útil, que em muitos casos pode atingir centenas de

anos3.

A estas características, referidas nomeadamente pelo IPSASB, importa ainda acrescentar que

estes ativos são detidos geralmente para fins sociais, e não para propósitos administrativos ou

financeiros.

Em suma, os BPHAC podem ser definidos como elementos do património das entidades

públicas, com características de natureza histórica, artística, cultural, científica e tecnológica,

utilizados pelo público em geral na prestação de serviços públicos.

Tratando-se de um bem em cujo uso predominem outras funções próprias da atividade da

entidade, para além das específicas desses ativos, “o elemento (…) entraria na categoria de

bens do património histórico, artístico e cultural de carácter multi-uso, ‘multi-use heritage

assets’4 na terminologia anglo-saxónica (…) o qual em determinadas jurisdições não se

diferencia dos ativos fixos tangíveis e seria tratado como tal” (Buch Gómez & Cabaleiro

Casal, 2007, p.7).

3 Podendo mesmo ser infinita, ou até mesmo indeterminada. 4 Ou, o que o Accounting Standards Board – South Africa (ASB-SA) (2005) denomina de “multi purposes heritage assets”.

7

Uma vez analisado o conceito de BPHAC, uma questão que se coloca é se, pelas suas

características, poderemos dizer que estes bens cumprem o conceito de ativo e se, portanto,

devem ser classificados como tal.

Apesar de, até aqui, nos termos referido a estes elementos como ativos, existem opiniões

divergentes quanto à sua classificação como ativos, sobretudo se pensarmos nos benefícios

que advêm dos mesmos. Por esta ser uma questão que está relacionada não só com o conceito

de ativo como também com o seu primeiro critério de reconhecimento, será abordada no

subponto seguinte deste trabalho.

2.2. Segundo requisito de reconhecimento: os critérios de reconhecimento dos ativos

Nos subpontos seguintes analisaremos a aplicação e o cumprimento, ou não, dos dois critérios

de reconhecimento dos ativos, por parte dos BPHAC.

a) Benefícios económicos futuros e potencial de serviços

Os bens de domínio público, nomeadamente os BPHAC, possuem elevados custos de

manutenção, não são utilizados com fins económicos mas sim sociais, não sendo cobrados

quaisquer valores, ou sendo cobradas quantias irrisórias, na sua utilização na prestação de

serviços à comunidade, quantias estas que não compensam os elevados custos da sua

manutenção, e que são inferiores ao custo dos serviços prestados (Glazer & Jaenicke, 1991).

Portanto, dizemos que estes ativos geram, na maioria dos casos, fluxos de caixa negativos.

Se atendermos ao primeiro critério de reconhecimento dos ativos, tal como o IASB (1989) o

define, fluírem do elemento benefícios económicos futuros, e que este entende enquanto

rendimentos, ou fluxos de caixa positivos, será que poderemos classificar ou reconhecer estes

elementos como ativos?

Esta questão tem sido amplamente discutida por diversos autores. Mautz (1981) considera que

estes bens não produzem rendimentos, ou fluxos de caixa positivos e que, por isso, não podem

ser reconhecidos como ativos. Assim, de acordo com este autor, e atendendo apenas à

interpretação dada pelo IASB (1989) aos critérios de reconhecimento, estes ativos não

cumprem com o primeiro critério. Para além disso, estando este critério associado ao conceito

8

de ativo, Mautz (1981) considera que estes bens também não cumprem com esse conceito e,

portanto, não devem ser classificados como tal.

Também Barton (2000, pp.225, 226; 2004, p.437) considerou que os bens de domínio

público, e mais especificamente os BPHAC, não possuem os atributos para serem

reconhecidos como ativos, porque destes, de forma idêntica ao expressado por Mautz, não se

esperam benefícios económicos futuros, seja sob a forma de rendimentos, pois produzem

fluxos de caixa negativos, seja sob a forma de mais-valias resultantes da sua alienação, pois

regra geral são inalienáveis, ou porque as alienações são proibidas ou porque possuem severas

restrições. Este autor refere que estes bens produzem benefícios sociais e não económicos ou

financeiros (Barton, 2000, pp.226, 227). Como destes bens não provém dinheiro para o

reembolso, ou pagamento, dos passivos da entidade, Barton (2000, p.229; 2004, p.437)

considera que não é apropriado que sejam contrapostos face a esses passivos, na determinação

da situação financeira da entidade, defendendo que tais bens não devem ser incluídos nas

demonstrações sobre a posição financeira da entidade.

Como alternativa à não classificação destes bens como ativos, Mautz (1988) criou uma nova

tipologia de elementos, na qual enquadra este tipo de bens e que denominou de “facilities”,

que define como sendo aqueles bens que, em cumprimento da sua habitual função na

entidade, geram fluxos de caixa negativos, devendo ser contabilizados separadamente,

podendo converter-se em ativos se forem vendidos por um preço certo, proporcionando

consequentemente um fluxo líquido positivo para a entidade (Mautz, 1988, p.125). Vela

Bargues (1991, p.589) refere-se a estas “facilities”, que traduziu como “facilidades”, como

sendo “propriedades essenciais aos propósitos de uma organização sem fim lucrativo que se

adquirem para facilitar a transferência de recursos para o exterior”.

De forma idêntica à opinião de Mautz, Barton (2000) também não reconhece os BPHAC

como ativos, refindo que tais bens enquadram-se na classificação do que ele denomina de

“bens públicos”5 (“public goods”), enquanto bens com fins sociais, e já não comerciais ou

financeiros, que visam “aumentar o bem estar social da Nação” (Barton, 2004, p.436), cujos

benefícios sociais ultrapassam os custos financeiros, e cujas características diferem dos

existentes no setor privado. Dessas características dos bens públicos, face aos privados,

destacam-se nomeadamente as seguintes (Barton, 2004, p.435): a sua utilização não reduz o

volume de serviços disponíveis para outros utilizadores (a menos que haja

5 Ou na terminologia de Musgrave e Musgrave (1988) denominados de “bens públicos mistos” (“mixed public goods”).

9

congestionamento); esses bens estão disponíveis para todos os cidadãos, não podendo nenhum

deles negar o acesso aos restantes cidadãos; podem ser usados pelos cidadãos, embora estes

não possuam direitos de propriedade sobre os mesmos. Mais especificamente, este autor

denomina a estes bens públicos de “bens em depósito” (“ trust assets”), enquanto “ativos das

pessoas, geridos e controlados pelo Governo em benefício dos cidadãos” (Barton, 2000,

p.230); isto porque, na maioria das vezes, não são propriedade do ente público, mas sim este

apenas tem a obrigação de gerir adequadamente tais bens, em benefício dos cidadãos em

geral, e de os conservar para a prosperidade (Barton, 2004, p.438). Por serem também bens

com fins não financeiros, considera que devem ter um tratamento separado dos restantes

elementos que designa de ativos (operacionais) das entidades públicas, não os incluindo no

balanço, mas sim sendo relatados numa demonstração não financeira de “assets held in trust”

(Barton, 2000, pp. 220, 233; Barton, 2004, pp. 435-438).

Esta análise do cumprimento por parte dos BPHAC, do primeiro critério de reconhecimento

dos ativos, mencionado pelo IASB (1989), que atende aos benefícios económicos futuros

entendidos enquanto rendimentos, poderá como vimos, induzir à conclusão de que realmente

estes bens não cumprem com este critério e com o conceito de ativo e que, portanto, não

podem ser classificados como ativos pelo facto de não produzirem, na sua maioria,

rendimentos para a entidade.

Contudo, se pensarmos no conceito de ativo público, no qual os benefícios económicos

futuros são entendidos enquanto potencial de serviços e já não apenas enquanto rendimentos

produzidos pelo elemento, chegamos a um primeiro critério de reconhecimento dos ativos

com um significado mais amplo do que aquele que foi definido no âmbito empresarial pelo

IASB (1989). Este facto está de acordo com Pallot (1990, p.81) quando refere que, atendendo

à definição de ativo dada por Mautz, no setor público, o tipo de benefícios económicos

futuros são frequentemente diferentes.

Por essa razão, a International Federation of Accountants (IFAC) (1993) acrescentou, ao

primeiro critério de reconhecimento dos ativos mencionado pelo IASB (1989), o potencial de

serviços resultante de um elemento, para que elementos como este tipo de bens de domínio

público, que acabamos de analisar, não deixem de ser reconhecidos como ativos pelo facto de

não gerarem rendimentos (ou benefícios económicos futuros no entendimento do IASB).

10

Este aspeto encontra-se também incluído no PGCP (2010) espanhol. Também a AECA (2001)

consagrou essa situação, ao considerar, no primeiro critério de reconhecimento dos ativos

públicos a necessidade de aplicação do elemento no alcance dos objetivos da entidade e na

prestação de serviços. Até porque, mesmo não gerando rendimentos, estes ativos permitem,

como refere Peacock (1998, p.1), satisfazer no presente um conjunto amplo de cidadãos.

Por outro lado, deveremos considerar que os benefícios6, que revertem para a comunidade em

geral, enquanto beneficiários dos serviços prestados, são benefícios para a entidade em causa

cuja missão é possibilitar a sua prestação (Pallot, 1997).

Por isso, o Study 2 da IFAC (1993), no §.077, refere que estes ativos satisfazem as

necessidades de serviços dos seus beneficiários e que devem ser classificados como tal,

porque permitem aos Governos alcançar os seus objetivos de fornecer serviços aos membros

da comunidade.

Assim, atendendo a esta diferente interpretação, no âmbito público, deste primeiro critério de

reconhecimento dos ativos, associado ao próprio conceito de ativo, os BPHAC podem ser

reconhecidos como ativos, desde que, preenchendo os restantes requisitos para o seu

reconhecimento, possuam potencial para prestar serviços e contribuam no alcance dos

objetivos da entidade, apesar de, na maioria das vezes, não produzirem fluxos de caixa

positivos para a entidade, mas antes tais fluxos sejam mesmo negativos. Este aspeto justifica,

a necessidade de interpretar, no âmbito público, os benefícios económicos futuros, não apenas

como rendimentos, mas também como potencial de serviços, ou mesmo de incluir esse

potencial de serviços na definição de ativo público e nos seus critérios de reconhecimento.

Pallot (1990, p.80), criticando a posição de Mautz que anteriormente referimos, reconhece

como ativos os BPHAC, bem como os bens de infraestrutura, mas atribui-lhes a classificação

de “ativos comunitários” (“community assets”), classificados por este autor como não

possuindo objetivos comerciais, e como sendo de propriedade comum ou pública, no sentido

de que cada cidadão não pode ser excluído de aceder ao bem e proceder à sua utilização,

sendo obrigação da entidade fazer com que o bem esteja acessível, ou disponível, ao público,

e mesmo que imponha alguma taxa de forma a racionalizar o seu uso, deve continuar a

proporcionar o bem ao público, nem que isso não lhe traga qualquer contrapartida. Portanto,

estes ativos comunitários incluiriam um conjunto de ativos especiais, que são de livre acesso

6 Benefícios em termos sociais e não em termos financeiros.

11

aos cidadãos, distintos da generalidade dos ativos ordinários usados pelas entidades públicas

para o alcance direto dos seus fins (Pallot, 1992).

As próprias normas classificam os BPHAC, e genericamente os bens de domínio público

como ativos. Por exemplo, a NICSP nº 17 do IPSASB (2006c), e também a Standard of

Generally Recognized Accounting Practice (GRAP) nº 17 do ASB-SA (2004), permitem o

reconhecimento destes bens como ativos; ou ainda, o Study 5 da IFAC (1995), ou o

Consulting Paper sobre heritage assets do IPSASB (2006a), definem estes bens como ativos,

reconhecendo-os como tal. Também na Austrália, várias normas e pesquisas da Australian

Accounting Research Foundation (AARF) defendem a inclusão dos BPHAC nas

demonstrações financeiras, classificando-os como ativos.

Note-se porém que, ainda existem países que não incluem estes elementos nas demonstrações

financeiras das entidades públicas, como é o caso, por exemplo, do Canadá (Hooper et al.,

2005, p.418; Brusca Alijarde & Benito López, 2002, p.9).

Contudo, como vimos, o reconhecimento dos BPHAC como ativos públicos não parece deixar

maiores problemas para as entidades (ou organismos) emissoras de normas de âmbito público,

nomeadamente para o IPSASB, uma vez que permitem a presença destes elementos nas

demonstrações financeiras das entidades responsáveis pelos mesmos, justificando esse facto

pelo potencial de serviços deles derivado.

Apesar de podermos reconhecer estes bens como ativos, Pallot (1990, pp.84, 85) defende

ainda que estes devem ser classificados separadamente dos restantes ativos (que designa de

inputs), nomeadamente dos ativos fixos tangíveis, o que pode ser útil na avaliação da posição

financeira e da solvência da entidade pública, uma vez que, como vimos, estes bens não são

igualmente vendíveis. Por outro lado, Rowles (1991) considera que as características que

estes ativos apresentam e que os distingue de outros ativos fixos, não servem para caracterizar

um grupo de ativos físicos não correntes conceptualmente diferente de outros ativos fixos.

Os diversos planos contabilísticos públicos atualmente em vigor em Portugal, como por

exemplo o POCAL (1999), que se baseiam numa ótica patrimonial, classificam os BPHAC

como bens de domínio público, e estes como imobilizados, mas numa conta em separado dos

restantes ativos imobilizados, e incluem-nos no balanço7.

7 Em Espanha, no PGCP (2010), tanto os bens de infraestrutura, como os bens do património histórico, também aparecem no balanço enquanto ativos, mas são classificados como fazendo parte do imobilizado material (corpóreo ou ativo fixo tangível) da entidade pública.

12

Algumas normas internacionais acerca dos ativos fixos tangíveis continuam a fazer menção a

alguns destes bens de domínio público. Contudo, já existem estudos, e também normas,

acerca dos mesmos, apresentados em separado das normas dos ativos fixos tangíveis.

Por exemplo, no que tange aos BPHAC, a NICSP nº 17 do IPSASB (2006c) menciona, no §9,

que uma entidade não é obrigada a reconhecer um BPHAC de acordo com o conceito e

critérios de reconhecimento dos ativos fixos tangíveis. Todavia, acrescenta que se uma

entidade reconhecer os BPHAC como ativos, deve aplicar os requisitos definidos nessa

norma, e pode também, mas não é obrigada a, aplicar os requisitos de valoração dessa norma.

Isto significa que, não existe obrigação nem proibição de reconhecer no ativo os BPHAC que

preencham os critérios de reconhecimento de um ativo fixo tangível, mas se as entidades

optarem por fazê-lo devem aplicar os requisitos dessa norma.

Apesar da NICSP nº 17 do IPSASB (2006c) fazer referência ao facto dos BPHAC poderem

ser contabilizados de acordo com os critérios de reconhecimento dos ativos fixos tangíveis,

isso não descurou que desenvolvessem estudos especificamente aplicáveis a esse tipo de

bens8, e não implica que os mesmos não possam ser reconhecidos numa conta separadamente

dos ativos fixos tangíveis, mas dentro da mesma classe dos imobilizados, tal como os

classificam os planos públicos portugueses.

Em suma, apesar das normas, com destaque para as de âmbito público, permitirem que os

BPHAC sejam reconhecidos como ativos, em termos doutrinais alguns autores continuam a

não admitir que tais bens sejam reconhecidos como tal, atribuindo-lhes designações distintas.

Contudo, somos da opinião que, uma vez preenchidos os critérios para o seu reconhecimento,

isto é, possuírem potencial de serviços e fiabilidade da sua valoração9, bem como cumprirem

o conceito de ativo, tais bens devem ser classificados como ativos, e mais especificamente

como ativos imobilizados. Mas, apesar dos critérios de reconhecimento serem os mesmos dos

ativos fixos tangíveis (IPSASB, 2006c), em virtude das suas especificidades, entendemos que

os BPHAC, e de uma forma genérica os bens de domínio público, devem ser classificados

numa conta separadamente daqueles, tal como o POCAL (1999) os apresenta.

Portanto, concluímos que, se compararmos o disposto no POCAL (1999) e na NICSP nº 17 do

IPSASB (2006c), quanto ao reconhecimento dos BPHAC, verificamos uma diferença notória

quanto à obrigatoriedade no POCAL (1999) de reconhecer este tipo de ativos numa conta

8 Por exemplo, o Consulting Paper sobre “heritage assets” do IPSASB (2006a). 9 Este critério será analisado na alínea b) deste subponto.

13

criada para esse efeito e integrada no imobilizado da entidade pública; enquanto que, na

NICSP nº 17 do IPSASB (2006c), esse reconhecimento não é exigido à entidade, mas se a

entidade optar por reconhecer este tipo de ativos terá de aplicar o disposto nessa norma.

Questionamos assim se, com uma nova reforma de contabilidade pública em Portugal, e

consequente adoção das NICSP do IPSASB, através de um novo sistema de normalização

contabilística pública, não se colocarão problemas quanto à arbitrariedade de opção das

entidades de reconhecer, ou não, este tipo de ativos, caso essa menção da NICSP nº 17 se

mantenha como na versão original anteriormente referida.

b) Fiabilidade na valoração

Ao se considerar que os BPHAC podem cumprir com o primeiro critério de reconhecimento,

não se descura que existam problemas quanto à sua valoração.

O ponto 4.1.7. do POCAL (1999) refere que os bens de domínio púbico, e no caso em análise

os BPHAC, devem ser valorados, “sempre que possível, ao custo de aquisição ou ao custo de

produção” (critérios gerais de valoração). No entanto, permite também a aplicação, a este tipo

de ativos, do valor resultante da avaliação ou do valor patrimonial; permitindo, em última

instância, que o ativo conste com o valor zero, no caso de não ser aplicável nenhum daqueles

critérios.

Relativamente à valoração dos ativos, a NICSP nº 17 apresenta dois momentos de valoração

(ou mensuração), não mencionados explicitamente no POCAL, a saber: o momento do

reconhecimento inicial e o momento posterior ao reconhecimento inicial.

No que tange à valoração no momento do reconhecimento inicial, a NICSP nº 17 (IPSASB,

2006c), para os ativos fixos tangíveis, menciona a aplicação do custo (custo histórico). Mas

permite exceções ao mesmo, nomeadamente, a aplicação do justo valor, enquanto valor de

mercado, que deve ser determinado por avaliação de um perito avaliador independente.

Os problemas na valoração dos BPHAC resultam, desde logo, do facto de que grande parte

desses bens não possui custos de aquisição ou de produção, em virtude, nomeadamente, dos

elevados anos da sua existência (Barton, 2000, p.227).

Na verdade, existem BPHAC que foram obtidos sem qualquer contrapartida monetária,

cedidos, trocados por outros ativos, ou então a sua aquisição já foi há tantos anos que se

desconhece a contrapartida monetária, ou não monetária, que foi entregue, o que resulta no

14

desconhecimento do seu custo de aquisição, impossibilitando a aplicação da regra geral, de

valoração inicial, definida pelo IPSASB para os ativos fixos tangíveis. Porter (2004, p.74)

refere que “a falta de um custo identificável e relevante indica que o custo histórico não é um

método útil para mensurar os bens do património, histórico, artístico e cultural”.

Por outro lado, os BPHAC são, na sua maioria, bens inalienáveis, ou porque não existe

mercado para os mesmos, ou porque tais alienações são proibidas por lei ou possuem severas

restrições, sendo difícil atribuir-lhes um valor de mercado que, quando seja determinável,

pode não refletir a importância cultural e histórica do elemento. Por isso é também difícil

aplicar-lhes a exceção ao custo enunciada pelo IPSASB.

Atendendo às dificuldades de valoração deste tipo de bens, muitas entidades apresentam-nos

com valor zero, tal como o próprio POCAL também o permite, distorcendo os valores

apresentados no balanço, podendo distorcer a verdadeira situação económica da entidade e

levar os utilizadores da informação a “obter uma imagem errada da entidade, que

provavelmente será de índole negativa ao esta ser titular de importantes ativos especiais”

(Buch Gómez & Cabaleiro Casal, 2007, p.6). Outras entidades há que nem mesmo procedem

à inventariação e reconhecimento de certos bens de domínio público, e mais especificamente

dos BPHAC, muitas vezes em virtude das dificuldades inerentes à sua valoração.

Portanto, para a valoração destes bens recorre-se muitas vezes ao uso de estimações que, se

não forem efetuadas de forma razoável, podem ferir a sua fiabilidade e implicar que o

elemento não possa ser reconhecido como ativo.

A NICSP nº 17 (IPSASB, 2006c) refere como alternativas à determinação do justo valor, na

inexistência de mercados para os bens em causa, a estimação do custo de reposição

depreciado do ativo, através do preço de compra de ativos semelhantes (método comparativo),

ou do custo de reprodução do ativo. Se dificilmente existem bens semelhantes aos BPHAC,

pois estes são na maioria das vezes únicos, o que dificulta a aplicação do método

comparativo, o mesmo não podemos dizer da aplicação do custo de reprodução do ativo.

No que respeita à valoração após o seu reconhecimento inicial, a NICSP nº 17 do IPSASB

(2006c) aponta o modelo do custo ou o modelo da revalorização (justo valor). A aplicação

destes modelos vai implicar os mesmos problemas já mencionados na valoração inicial, sendo

certo que, somos da opinião que, se inicialmente não foi possível aplicar o custo de aquisição,

aplicando-se o justo valor mesmo que estimado, após o reconhecimento inicial também

deverá aplicar-se este critério.

15

Quando, pela aplicação de métodos fiáveis, se consiga valorar este tipo de bens e cumprindo-

se também o primeiro critério de reconhecimento, isto é, se possuírem potencial de prestar

serviços, bem como o conceito de ativo, estes bens poderão ser reconhecidos como ativos

públicos e constar assim no balanço das entidades que economicamente os controlam.

3. O reconhecimento dos bens do património, histórico, artístico e cultural dos

municípios da sub-região Minho-Lima

3.1. Objetivo, amostra e metodologia

Este estudo tem por objetivo analisar a proporção de BPHAC reconhecidos pelos municípios

da sub-região Minho-Lima, face ao total do seu ativo, de forma a identificar se poderão existir

problemas inerentes ao seu reconhecimento, ultrapassáveis com a adoção das NICSP do

IPSASB em Portugal.

Este estudo tem por base a análise dos dados dos 10 municípios que constituem a sub-região

Minho-Lima (Portugal), nos anos 2011, 2012 e 2013. De forma a evitar citar o nome dos

diferentes municípios, estes foram numerados aleatoriamente de 1 a 10, atribuindo-lhes a

designação de M1 a M10.

Para a recolha da informação necessária à elaboração deste estudo procedeu-se à consulta

direta das contas (Balanço e algumas notas do anexo às demonstrações financeiras) dos

municípios que integram a referida sub-região, disponíveis nos sítios de internet de cada um

deles.

A informação recolhida foi compilada em bases de dados e tratada estatisticamente com a

ajuda de programas apropriados para esse fim, como por exemplo, o Excel.

3.2. Resultados

Com o objetivo de estudarmos os BPHAC reconhecidos pelos municípios da sub-região

Minho-Lima, analisamos em primeiro lugar, e de um ponto de vista descritivo, os valores

destes bens apresentados pelos referidos municípios, bem como os valores do total dos bens

de domínio público (BDP) e do total do ativo (A).

16

Quadro 1 – Valores totais dos BPHAC, BDP e do Ativo dos municípios

da sub-região Minho-Lima

(valores em euros, arredondados à unidade)

(nd: não disponível)

Fonte: Elaboração própria, com base nas contas dos municípios.

Relativamente ao valor do total do ativo da sub-região Minho-Lima, e com base no quadro 1,

constatamos que aumentou em 2012 e 2013, apresentando uma variação de 9,5% em 2012

face ao ano anterior, e apenas de 0,6% em 2013. Tal como o total do ativo, o total dos BDP

também aumentou nos anos em análise, se bem que no ano 2013 o aumento apenas atingiu

3,4%, contra 8,5% no ano 2012.

Este aumento, no ano 2012, do total do ativo e do total dos BDP, contraria a tendência, nesse

mesmo ano, do conjunto dos 308 municípios portugueses que apresentam, por exemplo no

caso do total do ativo, uma diminuição de 0,5%, e no caso dos BDP uma diminuição de 3,1%,

conforme dados recolhidos de Carvalho et al. (2013). Vemos assim que, apesar de no

conjunto dos municípios portugueses se constatar uma diminuição do investimento das

autarquias no ano 2012, no caso da sub-região Minho-Lima constata-se um aumento das

grandezas em análise.

No que respeita à variação dos BPHAC no total da sub-região, constatamos um aumento de

cerca de 47%, no ano 2013 face a 2012.

Município 2011 2012 2013

BPHAC BDP Ativo BPHAC BDP Ativo BPHAC BDP Ativo

M1 0 77.276.173 135.908.929 0 76.692.099 137.127.983 0 73.948.675 135.928.378

M2 20.360 23.916.635 59.795.818 20.110 26.398.232 62.586.386 19.859 27.164.420 65.436.522

M3 nd nd nd 1.495.697 28.457.867 63.216.308 1.486.471 28.311.923 63.968.594

M4 52.500 28.539.942 63.473.355 52.500 26.542.956 66.049.201 52.500 26.025.515 66.102.660

M5 83.848 42.612.138 80.718.855 83.226 42.985.390 83.426.790 3.871.262 61.694.851 79.024.645

M6 23.700 17.533.497 57.501.019 23.700 17.123.448 55.728.047 23.595 16.841.083 56.992.032

M7 2.282.802 60.326.092 196.551.987 2.267.189 57.879.447 197.935.005 2.251.577 54.489.316 193.887.659

M8 3.009.539 20.787.104 41.440.288 2.839.243 22.468.594 44.683.734 2.620.934 22.024.408 45.344.915

M9 810.483 43.640.969 193.742.783 810.483 43.449.945 200.280.382 810.483 43.509.708 206.805.052

M10 0 8.317.466 55.175.035 0 8.309.755 57.045.587 0 8.148.375 60.110.180

Total sub-

região 6.283.234 322.950.015 884.308.070 7.592.149 350.307.732 968.079.423 11.136.681 362.158.274 973.600.636

17

Se procedermos a uma análise por cada município que compõe esta sub-região, verificamos

que este aumento dos BPHAC no total da sub-região no ano 2013, se deve ao aumento deste

tipo de bens no Município M5, nesse mesmo ano.

Este aumento pode dever-se à aquisição de bens novos, a doações (que atualmente são, regra

geral, raras), ou então ao reconhecimento de bens já existentes mas que, por dificuldades no

seu reconhecimento ou valoração até então existentes, ainda não tinham sido reconhecidos.

Assim, analisamos a variação do imobilizado do município M5, no ano 2013,

comparativamente com os valores que apresenta nas aquisições de bens de capital

(agrupamento 07, das despesas de capital), e verificamos que este apresenta uma variação de

imobilizado superior às aquisições de bens de capital. Isto permite-nos concluir que a variação

do imobilizado, no ano 2013 é devida não apenas à aquisição de bens novos, mas também a

avaliações de bens já existentes mas ainda não reconhecidos. Portanto, no caso dos BPHAC,

podemos dizer que o aumento verificado em 2013 se pode dever, não apenas à aquisição de

bens novos, mas também ao reconhecimento de bens já existentes mas até então não

reconhecidos, em virtude de dificuldades no seu reconhecimento. Até porque nos anos

posteriores à implementação do POCAL, muitos municípios ainda se encontravam a

inventariar o seu património, possuindo ativos que ainda não tinham sido alvo de

reconhecimento, o que evidencia problemas no reconhecimento deste tipo de ativos.

Por exemplo, os municípios M3, M4 e M7, apesar de não apresentarem aumentos dos

BPHAC, nos anos analisados, referem nas notas às demonstrações financeiras que ainda

possuem bens que não se encontram avaliados, acrescentando mesmo um desses municípios,

que esses bens aparecem no balanço com valor zero, o que mais uma vez evidencia

dificuldades no reconhecimento e valoração deste tipo de ativos.

Na análise da variação de BPHAC por município, verificamos também que os municípios M1

e M10 não reconhecem BPHAC, provavelmente não porque não os possuem, mas porque têm

dificuldades no seu reconhecimento ou valoração.

Os municípios M4 e M9 apresentam iguais valores de BPHAC nos anos analisados, o que se

deve ao facto de não aumentarem os bens reconhecidos nesses anos e também de não

depreciarem os BPHAC, considerando que os BPHAC que possuem se enquadram no

mencionado na alínea a) do nº 1 do art.º 36 da Portaria 671/2000, de 17 de abril, que aprovou

o Cadastro e Inventário dos Bens do Estado (CIBE), e que por isso não estão sujeitos a

depreciação. Apesar destes municípios não depreciarem os BPHAC, registam depreciações de

18

outros BDP, como é o caso dos bens de infraestrutura. Também o município M6 não regista

depreciações dos BPHAC no ano 2012, passando a fazê-lo no ano 2013.

Todavia, os municípios M2, M7 e M8 apresentam diminuições dos BPHAC nos anos

analisados que se devem apenas ao reconhecimento das depreciações nesses mesmos anos e

não a um desreconhecimento desses ativos. Note-se que igual comportamento é apresentado

pelos municípios M5 em 2012 e M6 em 2013.

Em suma, vemos assim que ainda existem municípios que não reconhecem este tipo de bens e

outros que referem que estes bens não estão na totalidade refletidos no balanço ou se

encontram refletidos com valor zero, o que nos permite concluir que ainda existem

dificuldades no reconhecimento dos BPHAC.

Analisando agora o peso que os BPHAC representam face ao total dos BDP, e destes face ao

total do ativo, o quadro 2 apresenta os valores obtidos.

Quadro 2 – Proporções de BPHAC/BDP e de BDP/A dos municípios

da sub-região Minho-Lima

(valores em %)

Município 2011 2012 2013

BPHAC/BDP BDP/A BPHAC/BDP BDP/A BPHAC/BDP BDP/A

M1 0,00% 56,86% 0,00% 55,93% 0,00% 54,40%

M2 0,09% 40,00% 0,08% 42,18% 0,07% 41,51%

M3 nd nd 5,26% 45,02% 5,25% 44,26%

M4 0,18% 44,96% 0,20% 40,19% 0,20% 39,37%

M5 0,20% 52,79% 0,19% 51,52% 6,27% 78,07%

M6 0,14% 30,49% 0,14% 30,73% 0,14% 29,55%

M7 3,78% 30,69% 3,92% 29,24% 4,13% 28,10%

M8 14,48% 50,16% 12,64% 50,28% 11,90% 48,57%

M9 1,86% 22,53% 1,87% 21,69% 1,86% 21,04%

M10 0,00% 15,07% 0,00% 14,57% 0,00% 13,56%

Total sub-

região 1,95% 36,52% 2,17% 36,19% 3,08% 37,20%

(nd: não disponível)

Fonte: Elaboração própria.

19

Pelo quadro 2, e no que respeita ao total da sub-região Minho-Lima, os BPHAC representam

uma pequena parcela dos BDP desta sub-região, tendo no entanto aumentado a sua

importância nos anos analisados, sobretudo, como já tivemos oportunidade de referir, devido

ao reconhecimento de bens até então não reconhecidos (com destaque para o Município M5).

Todavia, os BDP representam pouco mais de um terço do total dos ativos desta sub-região

36,52% em 2011 e 37,2% em 2013), proporção que se aproxima da evidenciada para o total

dos municípios portugueses (34,9% no ano 2011, conforme Rua (2015)).

Estes valores evidenciam a importância que o imobilizado representa no ativo dos municípios

e mais especificamente a importância dos BDP, que representam uma importante fatia do

ativo dessas entidades.

No que respeita a uma análise por município, e quanto ao peso dos BPHAC face ao total de

BDP de cada município, verificamos que nos anos analisados o município M8 é o que

apresenta uma maior proporção de BPHAC face aos seus BDP, representando cerca de 14,5%

no ano 2011. Para além dos municípios que não reconhecem BPHAC, e que são os M1 e

M10, existem outros cuja proporção de BPHAC/BDP é muito reduzida, como é o caso dos

municípios M2, M4 e M6. Sendo que o município M4 admite mesmo nas notas às

demonstrações financeiras que possui BDP por avaliar.

Na verdade, para todos os municípios da sub-região em análise, verificamos que o tipo de

BDP com maior peso face ao total destes, são as outras construções e infraestruturas,

reconhecidas por todos os municípios da análise e com valores bastante elevados face ao total

de BDP.

Apesar do total de BDP da sub-região representar cerca de um terço do total dos ativos, o

mesmo acontecendo para o total dos municípios portugueses, verificamos pelo quadro 2, que

existem municípios desta sub-região nos quais os BDP representam mais de 50% do total dos

seus ativos, como é o caso dos municípios M1, M5 e M8. Destaca-se o município M5, no ano

2013, cujos BDP representam cerca de 78% do total do seu ativo, o que se pode dever, como

já tivemos oportunidade de analisar, não apenas a aquisições de bens novos mas também ao

reconhecimento de bens já existentes mas até então não reconhecidos.

Vemos assim que, apesar do POCAL ter sido aprovado no ano 1999, e em virtude deste plano

não mencionar os critérios de reconhecimento dos ativos, alguns municípios evidenciam

dificuldades no reconhecimento de certos ativos imobilizados, nomeadamente dos BDP, e por

isso o processo de inventariação do seu imobilizado ainda se encontra em curso.

20

Daí que seja imprescindível a definição de critérios de reconhecimento precisos a serem

seguidos consistentemente por todos os municípios, garantindo alguma comparabilidade dos

valores patrimoniais, e assim sejam ultrapassados alguns dos problemas inerentes ao

reconhecimento dos bens em análise.

4. Conclusão

Reconhecer um elemento numa demonstração financeira implica que este cumpra com o

conceito de ativo e com os critérios para o seu reconhecimento; requisitos definidos

explicitamente na NICSP nº 17 do IPSASB (2006c), mas que não se encontram definidos nos

normativos portugueses de âmbito público, nomeadamente no POCAL (1999).

No que respeita ao cumprimento destes requisitos por parte dos BPHAC, existem vários

autores que discordam do seu reconhecimento como ativos, uma vez que estes elementos

produzem fluxos de caixa negativos e, portanto, não geram quaisquer benefícios para a

entidade, entendendo estes benefícios enquanto rendimentos. Todavia, outros autores e

normas entendem que estes elementos devem ser reconhecidos como ativos, considerando que

esses elementos possuem potencial de serviços, e que podem contribuir para o alcance dos

objetivos da entidade.

O POCAL (1999) classifica estes elementos como ativos, integrando-os no seu plano de

contas, dentro do Imobilizado, numa conta designada para esse efeito. Também as normas

internacionais do IPSASB permitem o reconhecimento destes bens como ativos.

Assim, somos da opinião que, uma vez preenchidos os requisitos para o reconhecimento dos

ativos, os BPHAC devem ser reconhecidos como ativos, e mais especificamente enquanto

ativos imobilizados, numa conta em separado dos restantes imobilizados.

Pelo estudo efetuado, aos municípios da sub-região Minho-Lima, constatamos que ainda há

municípios que não reconhecem BPHAC, e outros que referem que tais bens não estão na

totalidade refletidos no balanço ou se encontram reconhecidos com valor zero. Tal facto

permite-nos concluir que estes bens não foram na totalidade reconhecidos no primeiro

balanço POCAL, e que os aumentos verificados entretanto não se devem apenas a aquisição

de bens novos, mas também ao reconhecimento de bens já existentes e até então não

reconhecidos em virtude de dificuldades no seu reconhecimento; e que, portanto, a

inventariação do património, para alguns municípios, ainda não se encontra concluída.

21

Por essa razão, e para grande parte dos municípios analisados, os BPHAC ainda representam

um peso reduzido no total dos BDP. Todavia, os BDP representam cerca de um terço do total

do ativo desses municípios, o que evidencia a importância que estes bens representam no

ativo dos municípios.

As dificuldades no reconhecimento destes elementos devem-se à inexistência de critérios

precisamente definidos na legislação em vigor, e à inexistência de uma estrutura conceptual

para a Contabilidade Pública em Portugal.

Perante o exposto entendemos que a adoção de um novo Sistema de Normalização

Contabilística aplicável à Administração Pública (SNC-AP), assente nas NICSP do IPSASB,

vai solucionar os problemas do reconhecimento dos ativos, e também da sua valoração, e

colmatar diversas lacunas concetuais existentes no atual normativo público português.

Porém, e apesar do SNC-AP facilitar a preparação do relato financeiro (Jorge, 2012, p. 42), e

mesmo do “relato financeiro consolidado” (Carvalho, 2015), implicará o envolvimento de

várias entidades e o estabelecimento de estratégias para que o processo de implementação seja

eficaz (Fernandes, 2014). Todavia, “os municípios serão as entidades públicas que mais

facilmente farão a transição do POCAL para o SNC-AP” (Carvalho, 2015).

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