24
Licenciada em Educação Física na Universidade Estadual de Ponta Grossa, professora da rede estadual de ensino do Estado do Paraná e da rede municipal de ensino da cidade de Ponta Grossa – PR, especialista em Políticas Públicas Para o Lazer e Para o Esporte. Orientada pelo professor Nei Alberto Salles Filho. As competições esportivas na escola como fator pedagógico de inclusão social. Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas que visam à inclusão de toda a comunidade escolar e integram o projeto político pedagógico da escola. Este trabalho foi desenvolvido na Escola Estadual Professora Halia Terezinha Gruba na cidade de Ponta Grossa no estado do Paraná no ano letivo de 2009, envolvendo alunos de 5ª a 8ª série, professores das diversas disciplinas, equipe pedagógica e funcionários, caracterizando-se em um estudo de caso. Inicialmente foi realizado um estudo bibliográfico para analisar o fenômeno Esporte como conteúdo da disciplina de Educação Física e a possibilidade de seu trato pedagógico, historicamente construído, dentro e fora das aulas desta disciplina. Estes estudos possibilitaram subsídios para a efetivação prática das competições na escola com novas perspectivas, proporcionando a inclusão social de toda a comunidade escolar. Essas novas perspectivas demonstraram que a participação de todos é possível, desde que não se exacerbe o caráter competitivo em detrimento ao caráter lúdico, de congraçamento entre os participantes. Palavras-chave: Competições esportivas. Inclusão social. Esporte. This article presents reflections and analysis about sports competitions aimed at teaching the inclusion of the whole school community and integrate the political pedagogical project of the school. This study was conducted at the State School Teacher Halia Terezinha Gruba the city of Ponta Grossa in Paraná state in school year 2009, involving students from 5th to 8th grade teachers from various disciplines, team teaching and staff, characterized in a study case. Initially we performed a bibliographic study to analyze the phenomenon of sports content such as Physical Education and the possibility of his dealings educational, historical construction, inside and outside of school discipline. These studies allowed subsidies for effective practice of competitions at school with new perspectives, providing the inclusion of the entire school community. These new perspectives have shown that the participation of all is possible, as long as it does not exacerbate the competitive nature rather than the playful character of reconciliation among the participants. Keywords: Sports competitions. Inclusion. Sport.

As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

  • Upload
    others

  • View
    2

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

Licenciada em Educação Física na Universidade Estadual de Ponta Grossa, professora da rede estadual de ensino do Estado do Paraná e da rede municipal de ensino da cidade de Ponta Grossa – PR, especialista em Políticas Públicas Para o Lazer e Para o Esporte. Orientada pelo professor Nei Alberto Salles Filho.

As competições esportivas na escola como fator peda gógico de inclusão social.

Simone Aparecida Schwab da Silva

Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas que visam à inclusão de toda a comunidade escolar e integram o projeto político pedagógico da escola. Este trabalho foi desenvolvido na Escola Estadual Professora Halia Terezinha Gruba na cidade de Ponta Grossa no estado do Paraná no ano letivo de 2009, envolvendo alunos de 5ª a 8ª série, professores das diversas disciplinas, equipe pedagógica e funcionários, caracterizando-se em um estudo de caso. Inicialmente foi realizado um estudo bibliográfico para analisar o fenômeno Esporte como conteúdo da disciplina de Educação Física e a possibilidade de seu trato pedagógico, historicamente construído, dentro e fora das aulas desta disciplina. Estes estudos possibilitaram subsídios para a efetivação prática das competições na escola com novas perspectivas, proporcionando a inclusão social de toda a comunidade escolar. Essas novas perspectivas demonstraram que a participação de todos é possível, desde que não se exacerbe o caráter competitivo em detrimento ao caráter lúdico, de congraçamento entre os participantes.

Palavras-chave: Competições esportivas. Inclusão social. Esporte.

This article presents reflections and analysis about sports competitions aimed at teaching the inclusion of the whole school community and integrate the political pedagogical project of the school. This study was conducted at the State School Teacher Halia Terezinha Gruba the city of Ponta Grossa in Paraná state in school year 2009, involving students from 5th to 8th grade teachers from various disciplines, team teaching and staff, characterized in a study case. Initially we performed a bibliographic study to analyze the phenomenon of sports content such as Physical Education and the possibility of his dealings educational, historical construction, inside and outside of school discipline. These studies allowed subsidies for effective practice of competitions at school with new perspectives, providing the inclusion of the entire school community. These new perspectives have shown that the participation of all is possible, as long as it does not exacerbate the competitive nature rather than the playful character of reconciliation among the participants.

Keywords: Sports competitions. Inclusion. Sport.

Page 2: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

2

Professores realmente preocupados com o

desenvolvimento das características humanas, ao

invés de tentar eliminar o caráter competitivo dos jogos

deveriam procurar compreendê-lo e utilizá-lo para

valorizar as relações. Creio ser mais educativo

reconhecer a importância do vencido e do vencedor do

que nunca competir.

(JOÃO BATISTA FREIRE)

1. Introdução

Este trabalho faz parte do Programa de Desenvolvimento Educacional

do Estado do Paraná (PDE) – no qual os professores da rede estadual de

ensino atuantes nas escolas realizam diversas atividades relacionadas a um

tema de estudo que deve estar relacionado às Diretrizes Curriculares Estaduais

(DCEs) e aos conteúdos da disciplina em que o professor atua.

Em todas as disciplinas curriculares existem conteúdos que são

considerados relevantes, importantes ou imprescindíveis. Dentre os diversos

conteúdos da disciplina de Educação Física, o conteúdo Esporte é,

inegavelmente, parte da história desta disciplina e se faz presente em todas as

instituições escolares, constituindo-se assim elemento fundamental da

disciplina e considerado por muitos profissionais como imprescindível.

Sendo um elemento fundamental da disciplina de Educação Física o

desafio para os profissionais da área é o tratamento de cunho pedagógico que

deve ser realizado dentro das instituições escolares para que não se torne um

elemento excludente, historicamente efetivado, e sim, que se configure como

uma importante ferramenta de inclusão social, construída coletivamente.

Importante salientar que o sentido de inclusão social a que nos referimos

não se restringe à inclusão de pessoas com necessidades especiais ou em

desvantagem social, e sim ao sentido de participação de todos os indivíduos de

forma ativa e consciente.

Vale salientar também que esta inclusão deve ser também do aluno

considerado menos habilidoso e daquele considerado mais habilidoso, pois

este último também pode ser excluído ao não serem proporcionadas atividades

Page 3: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

3

esportivas adequadas nas aulas de Educação Física ou fora delas, no contexto

escolar. Este não é o foco principal de nosso trabalho, porém exemplifica as

inúmeras exclusões que podem ser originadas pela ausência de práticas

esportivas pedagógicas no ambiente escolar.

A contribuição de Bracht (2006) reforça o sentido de inclusão social a

que nos referimos:

[...] inclusão social não pode significar apenas integrar no sentido de ampliar o acesso ao consumo ou mesmo à prática – numa perspectiva liberal de democratização. Inclusão precisa ser entendida como a participação ou a construção das condições de possibilidade para participar da construção cultural: cidadania cultural (não apenas consumir o que a indústria cultural produz). Nesse sentido, a escola e a educação física possuem uma responsabilidade intransferível. Incluir não pode significar integrar de forma subordinada, vale dizer, não na condição de mero consumidor, e sim de cidadão. (p. 127)

Essa inclusão social que pode ser ofertada através do Esporte, nem

sempre foi valorizada historicamente nas várias abordagens da Educação

Física que ora o valorizavam ora o negavam por não se reconhecer o seu

papel educativo na escola.

Algumas das concepções do Esporte permaneceram só na teoria,

distantes das práticas escolares, colaborando para diversos conflitos da área e

até mesmo uma crise de identidade da disciplina como componente curricular,

inclusive com questionamentos sobre a permanência do Esporte como

conteúdo de Educação Física.

Segundo Soares (1992)

[...] um componente curricular com seu conteúdo específico justifica-se na medida em que contribui, enquanto parte, para a apropriação, pelos alunos, de uma totalidade de conhecimentos que lhes possibilita a leitura crítica do mundo que os cerca. [...] Certamente o conteúdo veiculado pela Educação Física ao longo de sua história na instituição escolar constitui-se um elemento fundamental para sua afirmação ou negação. (p. 213 - 214)

As tendências atuais da Educação Física reconhecem o Esporte como

fenômeno cultural e não descaracterizam a prática esportiva como conteúdo da

disciplina e sim apontam a necessidade de novas abordagens para o tema,

com uma ressignificação de seus sentidos e significados.

Page 4: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

4

Segundo Kunz (2006)

Até mesmo no esporte escolar, aquele que se pratica sem o objetivo de participação em competições, já é possível perceber uma lógica diferente, quanto aos sentidos e significados a ele atribuídos. Assim é possível falar de um esporte no sentido amplo, que envolve toda cultura de movimento desportivizada e não apenas referente a modalidades tradicionalmente caracterizadas como esportivas. (KUNZ apud REZER, p. 13 - 14)

De um lado, verifica-se um problema que é de ordem metodológica, que

remete ao trato com o conhecimento do Esporte baseado em uma determinada

perspectiva em Educação Física; e de outro se apresenta um problema de

ordem teórica, no sentido de explicação e interpretação da realidade, que é a

própria caracterização do Esporte, a leitura que se faz do seu surgimento e

desenvolvimento.

Pretendemos neste artigo, caracterizar o Esporte nas abordagens de

Educação Física, demonstrar sua presença marcante nas instituições escolares

e apresentar uma experiência pedagógica onde o Esporte é o principal

elemento – As competições esportivas pedagógicas – realizadas na Escola

Estadual Professora Halia Terezinha Gruba - Ponta Grossa – Paraná.

2. As Diretrizes Curriculares do Paraná (DCEs) e o Currículo Básico do Estado

do Paraná

No estado do Paraná, a partir de 2004, iniciaram-se estudos e

discussões para a formulação das Diretrizes Curriculares Estaduais (DCEs) a

serem seguidas pelas escolas estaduais. Esses estudos e discussões geraram

um enorme “movimento” por parte dos profissionais das escolas e dos

professores de todas as disciplinas, levando a reflexões sobre quais conteúdos

possuem relevância, qual metodologia a ser empregada nos processos

pedagógicos, qual a maneira de se avaliar esses conteúdos, enfim – o quê,

como e por que ensinar.

Movimento semelhante a este ocorreu no final da década de 1980 e

início de 1990, quando se estabeleceram as discussões para a elaboração do

Currículo Básico do Estado do Paraná. Esse processo envolveu profissionais

comprometidos com a Educação Pública do Paraná, deu-se num contexto

Page 5: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

5

nacional de redemocratização do país e resultou em um documento que

pretendia responder a demandas sociais e históricas da educação brasileira.

Os embates educacionais oriundos desse período, posterior ao Regime

Militar, consolidaram, nos documentos oficiais em educação no Brasil, dentre

eles o próprio Currículo Básico do estado do Paraná, um viés critico, isto é, um

discurso preocupado com a formação de seres humanos capazes de

questionar e transformar a realidade social em que vivem. (DCES, 2008, p.12)

Tratando-se especificamente da disciplina de Educação Física, veio a

configurar uma nova abordagem da mesma, caracterizando-se como um marco

histórico. O Currículo Básico, para a Educação Física, fundamentava-se na

pedagogia histórico-crítica, identificando-se numa perspectiva progressista e

crítica sobre os pressupostos teóricos do materialismo histórico-dialético.

Segundo as DCEs (2008)

Esse documento caracterizou-se por ser uma proposta avançada em que o mero exercício físico deveria dar lugar a uma formação humana do aluno em amplas dimensões. O reflexo desse contexto para a Educação Física configurou um projeto escolar que possibilitasse a tomada de consciência dos educandos sobre seus próprios corpos, não no sentido biológico, mas especialmente em relação ao meio social em que vivem. (p.13)

No entanto, segundo vários críticos, o Currículo Básico apresentava uma

rígida listagem de conteúdos, denominados pressupostos do movimento

(condutas motoras de base ou formas básicas de movimento; condutas neuro-

motoras; esquema corporal; ritmo; aprendizagem objeto-motora), que

enfraquecia os pressupostos teórico-metodológicos da pedagogia crítica, pois o

enfoque permaneceu privilegiando abordagens como a desenvolvimentista, a

construtivista e a psicomotora.

A rigidez na escolha dos conteúdos, a insuficiente oferta de formação continuada para consolidar a proposta e, depois, as mudanças de políticas públicas em educação trazidas pelas novas gestões governamentais, a partir de meados dos anos de 1990, dificultaram a implementação dos fundamentos teóricos e políticos do Currículo Básico na prática pedagógica. Por isso, o ensino da Educação Física na escola se manteve, em muitos aspectos, em suas dimensões tradicionais, ou seja, com enfoque exclusivamente no desenvolvimento das aptidões físicas, de aspectos psicomotores e na prática esportiva. (DCES, 2008, p.14)

Page 6: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

6

Com a retomada das discussões na disciplina, oportunizadas pela

construção das DCEs, ressurgem vários temas polêmicos e um deles merece

destaque, em virtude da controvérsia de opiniões a seu respeito: o Esporte.

A polêmica sobre o Esporte e sua concepção trabalhada na escola não é

uma discussão atual; vários autores já discorreram sobre esse assunto e

muitos estudos ainda se fazem necessários sobre essa temática. No contexto

histórico da disciplina percebem-se práticas esportivas voltadas ao interesse

capitalista ou meramente uma reprodução vazia de práticas hegemônicas

realizadas nas escolas. Essa reprodução de práticas, muitas vezes, feita sem

contextualização ou sem qualquer tipo de reflexão por parte dos indivíduos

envolvidos, sejam professores ou alunos.

Outra constatação histórica foi a conseqüente exclusão, daqueles

considerados menos habilidosos, das atividades esportivas. Essa exclusão

acontecia de uma maneira considerada “natural”, seja pela constatação do

próprio indivíduo de sua incapacidade ou pela indicação dos colegas e

professores. Diante deste quadro a ênfase da disciplina de Educação Física foi

sempre sobre este Esporte elitizado, com a participação das minorias, com a

exacerbação da competição.

No contexto escolar, o Esporte sempre esteve atrelado a Educação

Física e só a ela dizia respeito, sem qualquer vinculação com outras atividades

escolares que fizessem parte do Projeto Político Pedagógico da escola.

Diante deste quadro histórico, como se encontra o Esporte atualmente

na disciplina de Educação Física? É possível utilizar o Esporte como uma

ferramenta pedagógica de inclusão? Qual o modelo de Esporte da Escola?

3. O Esporte e sua concepção nas tendências da Educação Física

No contexto histórico da Educação Física Escolar, o Esporte foi um dos

conteúdos mais discutidos e criticados no meio acadêmico, nos anos 80 e 90 e

muitas dessas discussões permeiam os atuais discursos.

Nesse tópico apontaremos as concepções do Esporte dentro das

tendências da Educação Física no Brasil de maneira bastante sucinta, com

ênfase nas abordagens após os anos 60, período significante para esse

Page 7: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

7

conteúdo curricular. As abordagens serão apresentadas segundo Darido

(2003).

Na concepção do Higienismo, dominante na década de 1920 –

preocupação central são os hábitos de higiene e saúde, valorizando o

desenvolvimento do físico e do moral a partir do exercício. Ênfase maior sobre

os exercícios ginásticos, verificando-se que nesse período não se encontram

prática voltadas ao Esporte especificamente.

No Militarismo, os objetivos da Educação Física na escola eram

vinculados à formação de uma geração capaz de suportar o combate, a luta,

para atuar na guerra, era importante selecionar os indivíduos perfeitos. Ênfase

aos exercícios calistênicos.

Na abordagem Escola Novista, a educação do movimento foi

preconizada como a única forma capaz de promover a Educação Integral,

atingiu seu auge no início da década de 1960.

Com a abordagem Esportivista, o governo militar a partir de1964 associa

a Educação Física e o Esporte como uma estratégia de governo, na tentativa

de torná-la um sustentáculo ideológico na medida em que ela participaria na

promoção do País através do êxito em competições de alto nível.

É nessa fase da história que o rendimento, as seleções dos mais

habilidosos, o fim justificando os meios, estão mais presentes dentro do

contexto da Educação Física na escola.

O desenvolvimento da aptidão física se dá por meio do Esporte, que

possibilita o exercício do alto rendimento, ou seja, o Esporte faz da Educação

Física partícipe, na sua especificidade, do modelo de sociedade, assentado na

produtividade.

Os procedimentos são extremamente diretivos, o papel do professor é

bastante centralizador e a prática, uma repetição mecânica dos movimentos

esportivos. Este modelo é também chamado de mecanicista, tradicional e

tecnicista sendo muito criticado pelos meios acadêmicos, principalmente a

partir da década de 1980. (DARIDO, 2003)

Na abordagem Recreacionista existe a crítica excessiva ao esporte de

rendimento, com isso os procedimentos voltaram-se para o outro extremo, os

alunos é que decidem o que vão fazer na aula, escolhendo o jogo e a forma

Page 8: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

8

como querem praticá-lo. Percebe-se uma ênfase maior sobre o jogo do que ao

Esporte.

A abordagem Psicomotricista surge a partir da década de 1970. Defende

uma ação educativa que deva ocorrer a partir dos movimentos espontâneos da

criança e das atitudes corporais, favorecendo a gênese da imagem do corpo,

núcleo central da personalidade. Busca desatrelar a atuação do professor dos

pressupostos da instituição esportiva, valorizando o processo de

aprendizagem, e não mais a execução de um gesto técnico isolado.

A ênfase, nesta abordagem, é em um modelo pedagógico fundamentado

na interdependência do desenvolvimento motor, cognitivo e afetivo dos

indivíduos. Não havendo muito espaço para atividades essencialmente

esportivas e/ou competitivas.

A abordagem Desenvolvimentista tenta caracterizar a progressão normal

do crescimento físico, do desenvolvimento fisiológico, motor, cognitivo e

afetivo-social na aprendizagem motora e, em função dessas características,

sugerir aspectos relevantes para a estruturação das aulas.

Os conteúdos devem ser desenvolvidos segundo uma ordem de

habilidades, do mais simples que são as habilidades básicas para as mais

complexas, as habilidades específicas. Originaram-se nessa época áreas

importantes do conhecimento: área de desenvolvimento motor e área de

aprendizagem motora.

Para a abordagem Desenvolvimentista, a Educação Física deve

proporcionar ao aluno condições para que seu comportamento motor seja

desenvolvido, oferecendo experiências de movimentos adequadas às faixas

etárias. O Esporte será abordado respeitando-se o desenvolvimento motor do

aluno, não sendo a principal prática motora nesta abordagem.

Já a abordagem Construtivista-interacionista considera o conhecimento

que o aluno previamente já possui, resgatando sua cultura de jogos e

brincadeiras. O jogo tem papel privilegiado nessa proposta, considerado seu

principal conteúdo, porque, enquanto joga ou brinca, a criança aprende em um

ambiente lúdico e prazeroso. (DARIDO, 2003)

Apresenta oposição a proposta mecanicista da Educação Física, que é

caracterizada pela busca do desempenho máximo, de padrões de

comportamento, sem considerar as diferenças individuais e as experiências

Page 9: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

9

vividas pelos alunos, com o objetivo de selecionar os mais habilidosos para

competições esportivas.

A abordagem Crítico-superadora consolida-se no início dos anos 1990.

Utiliza o discurso da justiça social como ponto de apoio. È necessário se

considerar a relevância social dos conteúdos, sua contemporaneidade e sua

adequação às características sociais e cognitivas dos alunos.

Essa abordagem levanta questões de poder, interesse, esforço e

contestação. Acredita que qualquer consideração sobre a pedagogia mais

apropriada deve versar não somente sobre questões de como ensinar, mas

também sobre como elaboram-se conhecimentos, valorizando a questão da

contextualização dos fatos e do resgate histórico. (DARIDO, 2003)

A Educação Física é entendida como uma disciplina que trata de um

tipo de conhecimento denominado de Cultura Corporal que tem como temas: o

jogo, a ginástica, a dança, o esporte e a Capoeira.

A abordagem Crítico- emancipatória valoriza a compreensão crítica do

mundo, da sociedade e de suas relações, sem a pretensão de transformar

esses elementos por meio escolar. Propõe-se a aumentar os graus de

liberdade do raciocínio crítico e autônomo dos alunos. Expressa-se na

contextualização dos temas compreendidos pela Cultura corporal: jogo,

esporte, ginástica, dança e capoeira.

Nesta abordagem há a defesa de que o ensino crítico auxilia os alunos

na compreensão da estrutura autoritária dos processos institucionalizados da

sociedade, os mesmos que formam falsas convicções, interesses e desejos. O

tratamento do Esporte dá-se nessa perspectiva crítica, diante das exclusões

que possa gerar.

A abordagem Saúde Renovada tem por paradigma a Aptidão Física

relacionada à Saúde e por objetivos: informar, mudar atitudes e promover a

política sistemática de exercícios. Embora seus pressupostos e finalidades

sejam semelhantes ao modelo biológico higienista, que promovia a saúde por

meio das atividades na aula de Educação Física, alguns aspectos distinguem

esta proposição mais recente, conferindo-lhe um caráter renovado.

O objetivo é o de favorecer a autonomia no gerenciamento da aptidão

física e que deve abranger todos os alunos, e não somente os mais

habilidosos. A abordagem considera que um programa de Educação Física

Page 10: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

10

escolar como um todo e não deve consistir apenas em modalidades esportivas

e jogos. (DARIDO, 2003)

As diversas abordagens se diferenciam pelo referencial de base e pela

experiência profissional e visão de mundo dos autores que as defendem. Cada

abordagem enfatiza mais algum aspecto considerado essencial seja ele físico,

biológico, social ou histórico, mas em todas elas o Esporte se faz presente,

com maior ou menor intensidade. 43

Para Valter Bracht (2006), embora a inserção do esporte na escola

tenha acontecido fundamentalmente a partir da idéia da Educação Física,

portanto subordinada ao papel atribuído a essa atividade ou disciplina no

contexto da escola, tivemos em determinado momento uma subordinação do

papel e do significado da Educação Física ao Esporte.

Para o autor, esta inversão foi construída ao longo do século XX,

culminando nas décadas de 60, 70 e 80 com a idéia da pirâmide esportiva, cuja

base seria composta pela Educação Física, com o papel de iniciar

esportivamente a população escolar. Essa ampla base seria o ponto de partida

de um processo (seletivo) que culminaria com a participação nas equipes

representativas do país (passando pelos municípios, estados e clubes), com a

meta de transformar o país numa grande potência esportiva.

No contexto das escolas, o evento norteador do trabalho do esporte

escolar eram os jogos escolares, nas suas versões municipais, regionais,

estaduais e nacional. Esse processo todo fez com que os códigos e os

princípios do esporte, pela sua importância social e política, se impusessem à

Educação Física Escolar, e conseqüentemente, à escola. Tais foram essa

imposição e subordinação que, no imaginário social e escolar, a Educação

Física escolar passou a ser sinônimo de Esporte, produzindo uma monocultura

do Esporte na escola.

Segundo Bracht (2006)

A partir dos anos 80, essa situação passa a ser fortemente criticada, a partir da idéia, entre outras, de que a monocultura do esporte não seria mais desejável em relação ao papel que a educação física poderia desempenhar na escola. A partir do conceito de cultura corporal de movimento buscou-se difundir a idéia de que o aluno deveria ter acesso, por meio da educação física na escola, ao amplo espectro das práticas corporais produzidas pelo homem a o longo da história. (p 125, 2006)

Page 11: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

11

O autor ainda considera que a partir dos anos 90 as análises críticas da

função social do Esporte, no âmbito da Educação Física levaram a proposição

de que o Esporte fosse, através da ação pedagógica, desmistificado, ou seja,

que o Esporte como conteúdo da Educação Física fosse apresentado aos

alunos e por eles discutido de maneira que pudessem compreender o

significado e as funções sociais que esta prática desempenha na nossa

sociedade: um esclarecimento crítico acerca do Esporte. Nestas perspectivas o

conhecimento a ser transmitido pela Educação Física Escolar não se restringe

ao saber fazer corporal, mas se amplia, abarcando o saber sobre o fazer

corporal.

Com essa rápida apresentação das tendências da Educação Física,

pretende-se evidenciar a presença do Esporte durante todo o contexto histórico

da disciplina, em alguns momentos com exacerbação, outras com sua total

negação e atualmente buscando-se um equilíbrio com os outros conteúdos da

disciplina – Jogos, Ginástica, Dança e Lutas.

Com o passar dos anos, a discussão sobre o papel do Esporte e a sua

influência na Educação Física brasileira não foi abandonada. De modo

intermitente ele volta à cena, seja por remakes, recalls ou revivals realizados

por gestores governamentais de plantão ou por grupos de investigadores

nacionais e estrangeiros interessados em prescrever hábitos sociais para a

população brasileira. (NETO et al, 2006).

É preciso ressaltar que a discussão e o surgimento das novas

abordagens não significou o abandono de práticas vinculadas ao modelo

esportivo, biológico ou ainda, ao recreacionista, que podem ser considerados

os mais freqüentes na prática do professor de Educação Física Escolar.

(DARIDO, 2001)

No mesmo sentido, as críticas relacionadas ao Esporte, como conteúdo

da disciplina de Educação Física e sua prática no ambiente escolar, renovam-

se com estudos acadêmicos que buscam dimensionar o seu status presente na

formação inicial e continuada do professor nos cursos de Educação Física

espalhados pelo Brasil.

Page 12: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

12

Segundo Assis (2005):

As críticas dirigidas ao esporte podem ser resumidas em duas dimensões, que não se excluem e que se articulam. A primeira dimensão diz respeito a essa relação de exclusividade (sem espaço para outros temas), primazia (prioridade quanto ao tempo e à organização do espaço) ou hierarquia (outros temas tratados em função dele) na organização das aulas de Educação Física. A segunda dimensão da crítica diz respeito à função do esporte na escola, sustentando-se, por um lado, na idéia de que o esporte que acontece na escola está a serviço da instituição esportiva, na revelação de atletas, constituindo-se na base da pirâmide esportiva e, por outro lado, na dimensão axiológica, nos valores que ele transmite, perpassa e constrói. A escola, por meio da educação física, estaria assumindo os códigos, sentidos e valores da instituição esportiva. (p.16)

O mesmo autor coloca que diante dessa crítica produziu-se nos debates

acerca do tema a configuração de uma contraposição entre o Esporte na

escola - a serviço da instituição esportiva, e o esporte da escola - a serviço da

instituição educacional, dos valores educativos.

4. Esporte na e da escola: existe diferença?

Valter Bracht (1992) foi um dos pioneiros na utilização dessa

contraposição entre o Esporte na escola e o Esporte da escola:

[...] a Educação Física assume os códigos de uma outra instituição [a instituição esporte], e de tal forma que temos então não o esporte da escola e sim o esporte na escola, o que indica a sua subordinação aos códigos/sentidos da instituição esportiva. O esporte na escola é um prolongamento da própria instituição esportiva. Os códigos da instituição esportiva podem ser resumidos em: princípio do rendimento atlético-desportivo, competição, comparação de rendimentos e recordes, regulamentação rígida, sucesso esportivo e sinônimo de vitória, racionalização de meios e técnicas. O que pode ser observado é a transplantação reflexa destes códigos do esporte para a Educação Física. Utilizando uma linguagem sistêmica, poder-se-ia dizer que a influência do meio ambiente (esporte) não foi/é selecionada (filtrada) por um código próprio da Educação Física, o que demonstra sua falta de autonomia na determinação do sentido das ações em seu interior.” (BRACHT, 1992, p.22 apud VAGO - grifos do autor)

Alguns autores consideram as afirmações de Bracht muito veementes e

que a realidade do Esporte da/na escola não seria uma mera reprodução do

capitalismo, sem, no entanto, desconsiderarem a importância da análise crítica

perante este fenômeno cultural.

Page 13: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

13

Vago (1996) em um artigo que dialoga com Bracht traz questionamentos

a respeito dessa contraposição do Esporte:

As questões que coloco para este diálogo são estas: a Educação Física, na escola, tem sido mesmo apenas e tão somente um veículo de transmissão/reprodução do esporte, com os códigos do esporte de rendimento citados por Bracht? Ela apenas está "servindo à indústria do esporte"? Ou, de outra forma: a escola não possui e nem sequer desenvolveu nenhum "grau de autonomia" para, por intermédio da Educação Física (mas também de outros tempos e espaços educativos), ensinar o esporte por seus próprios códigos, normas ou critérios? Ela se resume a realizar uma "transplantação reflexa" do esporte produzido "totalmente fora dela"? Ela não tem ou nem pode construir uma forma própria de cultivar e ensinar o esporte? (p.8)

O autor coloca ainda que o problema central da afirmação de Bracht

está no estabelecimento de uma negação radical da possibilidade de se ter o

“esporte da escola” com a presença do “esporte na escola”. Ou seja, a

existência deste impõe-se de tal forma na escola que inibe, inviabiliza, opõe-se,

enfim, nega a existência daquele. Então é a instituição esportiva mais forte que

determina as ações que a escola deve realizar por ser a instituição mais fraca.

Isso elimina a possibilidade de o esporte ser escolarizado, de a cultura escolar

ter o seu esporte. (VAGO, 1996 – grifos do autor).

Vago (1996) diz ainda

Assim, diferentemente de uma negação radical do "esporte da escola" pelo "esporte na escola", considero ser frutífero para a Educação Física avançar no sentido de construir uma relação de tensão permanente entre eles. Uma relação de tensão permanente que se estabeleça entre uma prática de esporte produzida e acumulada historicamente e uma prática escolar de esporte (a cultura escolar de esporte). [...] A questão central passa a ser, então, o tratamento, a relação da escola com essas práticas culturais no seu processo de ensino, tanto na Educação Física quanto em outros espaços e tempos educativos. (p. 9 - 12)

Essa cultura escolar do Esporte deve ser construída coletivamente na

escola devendo fazer parte do Projeto Político Pedagógico, onde deverá estar

claro o tratamento que deve ser dado nas aulas de Educação Física e nas

demais atividades esportivas a serem proporcionadas para a comunidade

escolar enfatizando-se seu cunho pedagógico.

Ainda segundo o autor, a escola pode problematizar o Esporte como

fenômeno sócio-cultural, construindo um ensino que se confronte com aqueles

valores e códigos que o tornaram excludente e seletivo, para dotá-lo de valores

e códigos que privilegiam a participação, o respeito à corporeidade, o coletivo e

Page 14: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

14

o lúdico. Agindo assim, ela produz uma outra forma de apropriação do esporte

e dessa maneira a escola vai tencionar com os códigos dominantes da

sociedade agregados ao esporte (principalmente com a exclusão da prática

cultural de esporte a que a ampla maioria dos alunos é submetida e com a

idéia de rendimento e performance que predominantemente orientam o seu

ensino na escola. (VAGO, 1996)

As conclusões de Vago (1996) são as seguintes

Não se trata, então, de agir apenas para que a escola tenha o "seu" esporte. Trata-se de problematizar a prática cultural do esporte da sociedade (que é, ao mesmo tempo, o esporte da e na escola), para reinventá-lo, recriá-lo, reconstruí-lo, e, ainda mais, produzi-lo a partir do específico da escola, para tencionar com aqueles já citados, que a sociedade incorporou a ele (e para superá-los). Não sendo mesmo possível à escola isolar-se da sociedade, já que a escola é, ela mesma, uma instituição da sociedade, uma de suas tarefas, então, é a de debater o esporte, de criticá-lo, de produzi-lo... e de praticá-lo! Ora, se se quer o confronto — a tensão permanente — com os códigos e valores agregados ao esporte pela forma capitalista de organização social para construirmos outros valores a partir da escola (a solidariedade esportiva, a participação, o respeito à diferença, o lúdico, por exemplo), é fundamental que o façamos para toda a sociedade. (p. 16)

O Esporte enquanto manifestação cultural da sociedade, que deve ser refletido e praticado na escola, não mais visto como mera repetição das normas capitalistas, como defendiam alguns autores e sim com possibilidades de trato pedagógico através da Educação Física com vistas a apropriação crítica por parte dos praticantes, foi revisto por Bracht( 2006)

O Esporte da escola precisaria estar voltado ou ser desenvolvido para a apropriação crítica desta manifestação cultural. A apropriação nos mais diferentes sentidos: aprender as técnicas esportivas, mas também, apreensão reflexiva dos conhecimentos que temos sobre essa manifestação cultural. O trato pedagógico dado pela educação física, pode promover uma apropriação mais crítica do esporte, vale dizer, uma relação do indivíduo com o esporte que o permita situar histórica e socialmente essa prática, como condição para o exercício da cidadania neste âmbito da vida, da cultura. (p 125 e 126)

Esse Esporte praticado de forma consciente, participativa, crítica,

autônoma é que se deve privilegiar no âmbito escolar, com inúmeras

possibilidades de inclusão social e um novo dimensionamento que deve ser

explícito no Projeto Político Pedagógico da escola, que deve ser construído

coletivamente por todos os envolvido no processo educativo do

estabelecimento de ensino.

Page 15: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

15

Para Assis (2005) existe a

Possibilidade de reinvenção do Esporte, pensar o Esporte da escola, a partir de uma visão crítica em relação aos códigos, valores e sentidos do Esporte moderno, que são códigos, valores e sentidos fundamentais da sociedade capitalista, implica reconhecer a necessidade e a possibilidade de pensá-lo à luz de um determinado projeto político-pedagógico, que aponta para a construção de uma sociedade baseada em outros códigos, valores e sentidos. (p 20 – grifos do autor)

Não basta pensar numa prática esportiva com valores educativos para

absolvê-la de qualquer crítica, é preciso reconhecer que o Esporte na escola

também educa. Um dos pontos principais é o como se efetiva esta prática

educativa ou de como ela deveria se efetivar.

5. Esporte e competição: é possível separar?

Como já discutido anteriormente, o Esporte no contexto histórico da

disciplina de Educação Física, nas abordagens apresentadas e no contexto

escolar já é por si só bastante controverso e polemizado. O que falar então da

competição, que é considerada por muitos seu elemento fundamental?

Ao se mencionar o Esporte, quase que imediatamente associa-se a idéia

de uma competição. Dentre os principais fatores que contribuíram para as

contradições das discussões acerca do tema, temos sua negação pela

Educação Física, quando se analisa o número de obras que discutem a

competição no espaço escolar.

Idêntico modo acontece com a Pedagogia do Esporte que, mesmo

reconhecendo o significativo avanço promovido pelas principais abordagens

atuais, ainda são poucos os autores e obras que se dedicam efetivamente ao

estudo da teoria e prática da competição escolar.(REVERDITO et al 2006, p. 1)

Ao se mencionar competição escolar imediatamente se remete à ideia

de inter-séries ou jogos escolares municipais, estaduais ou nacionais,

competições tradicionais realizadas em muitas escolas e municípios, onde

somente os atletas selecionados representam a sua série, sua escola, sua

cidade ou seu estado, buscando rendimento.

Não se encontravam equívocos, ou se formulavam críticas ao formato de

jogos escolares, pois eles eram fiéis às competições profissionais dessa forma,

Page 16: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

16

deveriam ser o espelho ideal a ser almejado pela educação física tradicional.

Mas com o passar dos anos e dos estudos, as inquietações pedagógicas

surgiram, permitindo que se verificasse que essas competições apresentam

inúmeras situações antipedagógicas, antiéticas, injustas, as quais privilegiam a

exclusão, constituindo-se então um local de reprodução de uma ideologia

seletiva e elitista com a qual não se pode mais compactuar, muito menos a

Educação Física na perspectiva de suas novas teorias. (SCAGLIA & GOMES

2005, p. 140)

As competições esportivas pedagógicas que defendemos contrapõem-

se a esse modelo de jogos de alto nível, buscando-se exclusivamente o

rendimento, excluindo totalmente os considerados menos habilidosos, a que

nos remetemos quando se fala em competição escolar.

Alguns autores colocam a necessidade de estudos mais aprofundados

não somente no que diz respeito a Pedagogia do Esporte mas também a

Pedagogia da Competição, uma vez que o Esporte e a Competição estão

atrelados

A pedagogia da competição deve entender o valor da humanização das relações inter-pessoais em detrimento da escravização do resultado; também busca equilibrar as relações entre prática e resultado, do valor sócio-cultural da (con)vivência da competição esportiva. Parece-nos um tanto arrogante afirmar que a lógica da competição esportiva é destruir as pessoas, colocá-las reféns do sistema de rendimento, onde o resultado final é o funil do alto-rendimento. Promover a pedagogia da competição propõe encaminhar nossos alunos à constantemente superar-se individual e coletivamente. (SCAGLIA, 2001, p. 4)

Diante das novas teorias, a competição exacerbada passou a ser um

dos focos polêmicos da disciplina, porém sem muitos argumentos sobre a

necessidade de se ensinar competição na escola. Não há como separar o

Esporte da competição, no entanto, como estamos falando de uma competição

escolar, não podemos perder o foco pedagógico desta atividade.

Segundo Reverdito et al (2006)

Quando a competição apenas acontece na escola, não existe um comprometimento intrínseco aos seus objetivos e função. Nesse caso, ela apenas reproduz um sistema espetacularizado. O compromisso é exterior aos objetivos e à função da escola, atendendo apenas aos anseios do sistema competitivo institucionalizado e suas transgressões, repelindo de si qualquer responsabilidade pedagógica e valorizando a escravidão pelos resultados. (grifos do autor - p.3)

Page 17: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

17

Os objetivos e funções da competição esportiva que defendemos devem

estar bem claros, devem ser pautados na participação de todos, possibilitando

momentos de cooperação, de vivências, de socialização, de enriquecimento

corporal. Essa atividade esportiva apresenta uma possibilidade de inclusão

social não somente dos alunos envolvidos diretamente na competição, mas

também para toda a equipe pedagógica da escola. A equipe diretiva e o corpo

docente têm papel fundamental nessa perspectiva de evento pedagógico da

escola e sua contribuição é fundamental para que essa proposta se efetive.

A partir do momento que o Esporte e a competição recebem um

tratamento pedagógico, mudam-se seus significados. O que falta ao Esporte

desenvolvido na escola é um tratamento pedagógico comprometido com a

educabilidade do sujeito e não somente visando competições externas, mas

sim desafios pessoais e coletivos a serem vencidos.

Segundo Bracht (2000, 2001)

Portanto, o esporte tratado e privilegiado na escola pode ser aquele que atribui um significado menos central ao rendimento máximo e à competição, e procura permitir aos educandos vivenciar também formas de prática esportiva que privilegiem antes o rendimento possível e a cooperação. (p.19)

O modelo de competição pedagógica que defendemos deverá ser em

torno de maximizar os aspectos positivos e minimizar os efeitos negativos,

buscando o resgate de valores essências à vida em sociedade que podem ser

trabalhados nessa perspectiva.

Assis (2005) faz a sua consideração sobre o Esporte e os valores que

estão implícitos na sua prática, valorizando esse momento vivido por todos, na

busca de satisfações pessoais em detrimento de resultados performáticos.

[...] Traz consigo possibilidades contraditórias, estabelecidas em sua própria dinâmica, de forma que é possível enfatizar situações que privilegiam a solidariedade sobre a rivalidade, o coletivo sobre o individual, a autonomia sobre a submissão, a cooperação sobre a disputa, a distribuição sobre a apropriação, a abundância sobre a escassez, a confiança mútua sobre a suspeita, a descontração sobre a tensão, a perseverança sobre a desistência e, além de tudo, a vontade de continuar jogando em contraposição à pressa para terminar o jogo e configurar resultados. (p.196)

Page 18: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

18

O Esporte trabalhado nas aulas de Educação Física e nas competições

escolares com esse cunho pedagógico pode ser um grande facilitador das mais

variadas aprendizagens e da inclusão social dos alunos e professores.

O ensino de Esporte antes, durante e depois das competições é um

desafio para os professores de Educação Física, já que nessa lógica o esporte

torna-se um meio de educação e não um fim de competição.

As competições podem marcar um sentido de congraçamento, de

relação social complexa entre as pessoas, porque elas não iniciam quando o

árbitro apita o jogo, e não se encerram no próprio jogo, mas desde a

preparação do evento, passando por uma série de manifestações, de relações

complexas, sociais e culturais, entre os estudantes, a partir de uma

participação ativa e motivante garantida na organização e desenvolvimento da

prática e do conhecimento do Esporte. (REVERDITO, SCAGLIA et al, 2005).

Para Scaglia (2005)

Faz-se necessário que a competição não seja vista sempre como um jogo de alguém contra alguém, mas sim no jogar com alguém e contra si próprio, como um marco de referência para uma auto-avaliação. O objetivo da competição deve estar voltado também para a auto-superação e busca de auto-estima (p.4)

A possibilidade real, concreta e de essência de o Esporte ser partícipe

de um projeto emancipatório está, sobretudo, na sua ampla oferta, na sua

prática como objeto de reflexão e na transformação de sua dinâmica,

essencialmente competitiva e aparentemente lúdica, para uma outra,

qualitativamente distinta, essencialmente lúdica e aparentemente competitiva.

(ASSIS, 2005)

A escola é um espaço privilegiado de encontro de pessoas onde as

manifestações humanas devem ser valorizadas, buscando-se uma verdadeira

inclusão social de toda a comunidade escolar, através dessa poderosa

máquina cultural: o Esporte.

Page 19: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

19

7. As competições esportivas pedagógicas: o cotidiano nas atividades de

Educação Física

A efetivação das competições esportivas pedagógicas deram-se na

Escola Estadual Professora HaliaTerezinha Gruba na cidade de Ponta Grossa

no Paraná.

As competições esportivas ocorrem na escola desde o ano de 1997, e

nessas 12 (doze) edições foram utilizadas várias estratégias de organização no

sistema de disputa dos jogos, nas divisões de equipes, no envolvimento dos

profissionais, nas arbitragens, entre outros.

Com este trabalho tivemos a oportunidade de um “mergulho” mais

aprofundado sobre a nossa realidade, configurando-se em um Estudo de Caso.

Inicialmente foi elaborado um Projeto de Intervenção Pedagógica no

primeiro semestre de 2008 a ser desenvolvido no primeiro semestre do ano

letivo de 2009. Além deste Projeto foi elaborado um material didático no

segundo semestre de 2008, configurado em um Objeto de Aprendizagem

Colaborativa – OAC, disponibilizado no Portal Educacional do Estado do

Paraná – www.diaadiaeducacao.pr.gov.br.

Esses dois trabalhos elaborados foram discutidos “online” via Educação

A Distância (EAD) por um grupo de trabalho em rede (GTR) composto por

professores da disciplina de Educação Física de várias cidades do Paraná. Os

professores participantes do GTR puderam analisar, avaliar, opinar, discutir,

sugerir, compartilhar experiências e acompanhar a implementação do Projeto.

Este artigo é o resultado desses trabalhos apresentando as principais

conclusões sobre os estudos e intervenções, que também estará

disponibilizado no Portal Educacional.

Na aplicação do Projeto foi analisado, entre outros aspectos, o processo

de organização e efetivação das competições, o enfoque pedagógico dado ao

Esporte, o grau de envolvimento de professores, funcionários e alunos, a

possibilidade de inclusão social de todos, o grau de aceitação das atividades

esportivas dos envolvidos, sob a luz das abordagens atuais da Educação

Física Escolar e dos autores referenciados.

Page 20: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

20

As competições foram realizadas no 1º Semestre do ano letivo de 2009

com a participação de todas as turmas da escola perfazendo um total

aproximado de 315 (trezentos e quinze alunos).

Os alunos estavam assim distribuídos:

Série Nº de turmas Período

5ª 3 T

6ª 2 T

7ª 2 M

8ª 2 M

O Projeto de Implementação foi apresentado em duas ocasiões na

escola no início do ano: na semana pedagógica (fevereiro), onde o quadro de

professores não estava completo, havendo a necessidade de uma nova

apresentação num segundo momento com o quadro completo (março).

No momento da apresentação do Projeto aos professores e equipe

pedagógica os professores das diversas disciplinas comprometeram-se com

sua participação e colocaram-no como parte integrante de seu planejamento –

fator essencial para o sucesso das competições.

O trabalho com os alunos iniciou-se na primeira semana de aula durante

as aulas de Educação Física, com a apresentação do Projeto. Foram

realizados estudos para se eleger o sistema de disputa, sistema de pontuação,

quadros de pontuação, súmulas, que mais se adequassem aos objetivos das

competições esportivas pedagógicas. Esta parte da organização das

competições ficou sob a responsabilidade das 7ª e 8ª séries.

Os conceitos de Esporte, competição, cooperação, congraçamento,

pedagógico, enfim dos termos que seriam utilizados durante a realização do

Projeto, foram trabalhados no período inicial das atividades relacionadas ao

Projeto para familiarização por parte dos alunos e esclarecimento dos objetivos

a que se propunha.

A escolha das modalidades foi feita através de votação pelo corpo

discente. As competições iniciaram no mês de Março com a modalidade de

Futsal por ser uma modalidade atrativa e coletiva, possibilitando a participação

em cada partida de um grande número de alunos.

Page 21: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

21

Como houve atraso para o início das competições em virtude do quadro

funcional não estar completo, foi realizada a competição de uma segunda

modalidade coletiva no mês de Março – o Voleibol. No mês de Abril foi

realizada a competição de uma modalidade individual - Tênis de Mesa, no mês

de Maio uma modalidade individual - Xadrez, no mês de Junho a modalidade

recreativa de Queimada.

A escolha das modalidades se propôs aos objetivos das competições

pedagógicas – participação de todos. Ofertando modalidades esportivas

coletivas e individuais e a modalidade recreativa, possibilitou-se aos alunos a

prática das diversas habilidades motoras que possuem. Todos os alunos

participaram de todas as competições, independentemente da modalidade.

O Sistema de Disputa escolhido foi o Rodízio Completo ou Todos Contra

Todos, por período (manhã e tarde) favorecendo também o intercâmbio entre

as turmas da instituição escolar.

As competições ocorreram mensalmente, utilizando-se a estratégia de

mudar o dia da semana para contemplar o maior número de professores e

disciplinas envolvidas. Todos os alunos e professores dirigiam-se aos locais

das competições. Os professores e funcionários auxiliaram na organização das

equipes, dentro e fora das quadras, na arbitragem e no registro das súmulas.

No presente artigo optamos em não detalhar a experiência, por

considerar a reflexão e análise teórica relevantes. As questões mais

relacionadas à Implementação do Projeto Foram bastante discutidas com os

professores participantes do GTR.

8. Conclusão

O Esporte é inegavelmente um conteúdo de destaque na disciplina de

Educação Física. O tratamento pedagógico dado a este conteúdo é que

merece reflexão por parte dos profissionais da área.

Com a perspectiva de contradizer o perfil histórico atrelado a esse

conteúdo por ser excludente, considerando apenas os resultados, é que se

propõem as competições esportivas pedagógicas, no sentido de enaltecer os

aspectos positivos que precisam ser trabalhados no contexto escolar acerca do

Esporte: congraçamento, união, respeito, alegria, cooperação, prazer.

Page 22: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

22

Buscando proporcionar a participação de todos, com a competição

voltada para a superação individual, o crescimento do coletivo e o envolvimento

da comunidade escolar.

Cabe a todos os profissionais da área utilizar o Esporte como uma

poderosa ferramenta de inclusão social dentro e fora das aulas de Educação

Física valendo-se de toda a contextualização histórica desse fenômeno e

trabalhando com a competição em sua essência, sem negá-la ou enfatizá-la.

As competições esportivas pedagógicas realizadas na Escola Estadual

Professora Halia Terezinha Gruba se constituem uma realidade, integrando o

seu Projeto Político Pedagógico, o que torna a necessidade de seu

aprimoramento a cada nova edição, apresentando-se como um referencial e

exemplo teórico-prático para novas intervenções.

Page 23: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

23

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSIS, S. Reinventando o esporte : possibilidades da prática pedagógica. 2. ed. Campinas, São Paulo: Autores Associados; CBCE, 2005. BRACHT, V. Esporte na escola e esporte de rendimento. Revista Movimento, Porto Alegre, ano VI, n. 12, p 14 – 19, 2000/2001. BRACHT, V. Os conteúdos da educação física escolar: influências, tendências, dificuldades e possibilidades. Perspectivas em Educação Física Escolar, Niterói, v. 2, n.1 (suplemento), 2001. DARIDO, S.; RANGEL, I. C. A. (coords) Educação Física na escola: implicações para a prática pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. p. 1 – 23. PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares Estaduais de Educação Física. Curitiba, SEED, 2008. FREIRE, J. B.; VENÂNCIO, S. (org) O jogo dentro e fora da escola. Campinas, São Paulo: Autores Associados, 2005. FREIRE, João Batista. Educação Física de corpo inteiro: teoria e prática da educação física. 2. ed. São Paulo: Spicione, 1991. GEBARA, A. et al. Educação física & esportes : perspectivas para o século XXI. Campinas, São Paulo: Papirus, 1992. REVERDITO, R. S. et al. Competições escolares: reflexão e ação em pedagogia do esporte para fazer a diferença na escola. Pensar a prática. v. 11, n. 1, 2008, disponível em http: revista.ufg.br/index.php/fef/article/view 1207, acessado em 27/04/08. REZER, R. (org) O Fenômeno Esportivo: ensaios crítico-reflexivos. Chapecó: Argos, 2006. SCAGLIA, A. J.;MONTAGNER, P. C.;SOUZA, A.J. Pedagogia da competição em esportes: da teoria à busca de uma proposta esco lar. 2001. SCAGLIA, A. J.; MEDEIROS, M.; SADI, R. S. Competições pedagógicas e festivais esportivos: questões pertinentes ao treinamento esportivo. Revista Virtual EF Artigos. Natal, Rio Grande do Norte, v. 3, n. 23, abril 2006, disponível em http:efartigos.atspace.org/esportes/artigo68.html, acessado em 27/04/08. TRIVIÑOS, A. N. S.; NETO, V. M. (org) A pesquisa qualitativa na educação física: alternativas metodológicas. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS/Sulina, 1999.

Page 24: As competições esportivas na escola como fator …...Simone Aparecida Schwab da Silva Este artigo apresenta reflexões e análises acerca de competições esportivas pedagógicas

24

VAGO, T. M. O “esporte na escola” e o “esporte da escola”: da negação radical para uma relação de tensão permanente – um diálogo com Valter Bracht. Revista Movimento , Porto Alegre, ano III, n. 5, p 4-17, 2 set 1996.