As desigualdades socioespaciais urbanas numa metrópole interiorana: uma análise da Região Metropolitana de Campinas (SP) a partir de indicadores de exclusão/inclusão social

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Esta tese apresenta uma análise da estruturação socioespacial urbana da Região Metropolitana de Campinas, no Estado de São Paulo, à luz do processo de exclusão/inclusão social. Parte-se do pressuposto de que o espaço urbano-metropolitano é configurado, em relação à sua organização interna e ao seu conteúdo social, em áreas sociais segregadas, as quais resultam de (e implicam em) graus diferenciados de inclusão ou exclusão social de sua população. Examina-se a evolução dos processos de urbanização e de expansão das áreas urbanizadas na região, e realiza-se uma caracterização dos espaços intraurbanos sob as perspectivas funcional e social. Elabora-se também, com base em variáveis censitárias intraurbanas, um sistema de indicadores sociais de exclusão/inclusão social, visando mensurar e representar espacialmente a dinâmica das desigualdades socioespaciais no espaço urbano-metropolitano entre 1991 e 2010, através de índices calculados em relação a quatro dimensões de análise do processo de exclusão/inclusão social: autonomia de renda, desenvolvimento humano, equidade e qualidade domiciliar. Os resultados da pesquisa caracterizam a estrutura socioespacial desigual urbana, a qual é marcada por grandes diferenciais de condições de vida (sobretudo na cidade de Campinas) e pela segregação das populações em arranjos espaciais setorizados, configurados em escalas regional e intraurbanas.

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    UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

    INSTITUTO DE GEOCINCIAS

    EDERSON NASCIMENTO

    AS DESIGUALDADES SOCIOESPACIAIS URBANAS NUMA METRPOLE INTERIORANA:

    UMA ANLISE DA REGIO METROPOLITANA DE CAMPINAS (SP) A PARTIR DE INDICADORES

    DE EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL

    CAMPINAS

    2013

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    UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

    INSTITUTO DE GEOCINCIAS

    EDERSON NASCIMENTO

    S DESIGUALDADES SOCIOESPACIAIS URBANAS NUMA METRPOLE INTERIORANA:

    UMA ANLISE DA REGIO METROPOLITANA DE CAMPINAS (SP) A PARTIR DE INDICADORES

    DE EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL

    Orientador: Prof. Dr. Lindon Fonseca Matias

    TESE DE DOUTORADO APRESENTADA AO INSTITUTO DE GEOCINCIAS DA UNICAMP NO

    PROGRAMA DE GEOGRAFIA, PARA OBTENO DO TTULO DE DOUTOR EM GEOGRAFIA NA

    REA DE CONCENTRAO ANLISE AMBIENTAL E DINMICA TERRITORIAL

    ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE VERSO FINAL DA TESE DEFENDIDA

    PELO ALUNO EDERSON NASCIMENTO E ORIENTADA PELO PROF. DR.

    LINDON FONSECA MATIAS.

    CAMPINAS

    2013

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    UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

    INSTITUTO DE GEOCINCIAS

    PS-GRADUAO EM GEOGRAFIA

    ANLISE AMBIENTAL E DINMICA TERRITORIAL

    AUTOR: Ederson Nascimento

    As desigualdades socioespaciais urbanas numa metrpole interiorana:

    uma anlise da Regio Metropolitana de Campinas (SP)

    a partir de indicadores de excluso/incluso social

    ORIENTADOR: Prof. Dr. Lindon Fonseca Matias

    Aprovada em: 08/08/2013

    EXAMINADORES:

    Prof. Dr. Lindon Fonseca Matias _____________________________- Presidente

    Profa. Dra. Claudete de Castro Silva Vitte _____________________________

    Prof. Dr. Gustavo de O. Coelho de Souza _____________________________

    Prof. Dr. Paulo Roberto Rodrigues Soares _____________________________

    Profa. Dra. Rosana Aparecida Baeninger _____________________________

    Campinas, 8 de agosto de 2013

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    minha famlia:

    incio, meio(s) e fim de tudo isso...

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    AGRADECIMENTOS

    sempre um risco listar pessoas e instituies para agradecimentos ao final de um

    trabalho de tal magnitude como o uma tese. So longos o tempo decorrido e o percurso

    trilhado, e numerosas as pessoas com quem convivemos e contamos, portanto, a possibilidade

    de esquecer-

    Aos meus pais, Jos e Janete, pelo amor e carinho a mim sempre dedicados, e por

    valorizarem e me mostrarem, desde a mais tenra idade, a importncia da educao e do

    conhecimento.

    Luana, a Luh, irm de sangue e corao, minha grande amiga que, perto ou longe,

    est comigo em todas as horas.

    Ao Prof. Dr. Lindon Fonseca Matias, pelo modo rigoroso, seguro e competente com

    que orientou a realizao desta pesquisa, bem como pela ateno e pacincia nos

    momentos mais difceis e, sobretudo, pelo grande aprendizado que me proporcionou

    em quase onze anos de trabalho conjunto.

    Aos professores Dr. Roberto Braga e Dra. Rosana Baeninger, pela participao na

    banca do exame de qualificao, momento em que realizaram importantes

    contribuies para o desenvolvimento desta pesquisa.

    Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo FAPESP, pela

    concesso de bolsa de pesquisa no perodo de dezembro de 2009 a janeiro de 2011,

    recursos estes que muito contriburam para a realizao deste estudo;

    Ao Ncleo de Estudos de Populao NEPO, da UNICAMP, pela cesso da malha

    digital de setores censitrios urbanos da RMC de 1991;

    EMPLASA, pela disponibilizao de dados georreferenciados sobre uso da terra

    urbana na RMC, de fundamental importncia para a pesquisa;

  • x

    Universidade Federal da Fronteira Sul UFFS, na figura da Pr-reitoria de

    Pesquisa e Ps-graduao (PROPEPG), pela contribuio por meio da institucionalizao

    da presente pesquisa e consequente atribuio de carga horria semanal especfica para

    a sua realizao.

    Aos companheiros da UNICAMP, em especial Marcelo, Danbia, Tati Geller, Joseane

    e Valderson, pelo intercmbio de ideias e conhecimentos, pelas contribuies

    fornecidas e pelos bons momentos compartilhados no perodo em que residi em

    Campinas.

    Aos amigos da UFFS, especialmente Andrey, Marlon, Ricardo, Camila e Irene, pela

    parceria na universidade e fora dela, em bons bares, cafeterias e demais lugares onde

    continuamente tecemos juntos as nossas geografias.

    Aos acadmicos do curso de graduao em Geografia da UFFS Eduardo, lida,

    Flvia Carla e Mayling, alunos e amigos com quem dialogo, compartilho ideias e que

    me ajudam, direta ou indiretamente, nas empreitadas da Geografia.

    s secretrias de ps-graduao do Instituto de Geocincias da UNICAMP, Gorete e

    Valdirene (Val) -graduandos do IG , pelo

    modo prestativo e atencioso com que sempre me atenderam.

    Aline, por compartilhar comigo a geografia da vida...

    E ainda, a todos aqueles que, direta ou indiretamente, sabendo ou no, construram

    comigo este trabalho, ou que simplesmente torceram por mim.

    Muito obrigado!

  • xi

    icar a realidade consiste em conhec-

    (Eduardo Galeano)

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    UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

    INSTITUTO DE GEOCINCIAS

    AS DESIGUALDADES SOCIOESPACIAIS URBANAS NUMA METRPOLE INTERIORANA:

    UMA ANLISE DA REGIO METROPOLITANA DE CAMPINAS (SP) A PARTIR DE INDICADORES

    DE EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL

    RESUMO

    Tese de Doutorado

    Ederson Nascimento

    Esta tese apresenta uma anlise da estruturao socioespacial urbana da Regio Metropolitana de

    Campinas, no Estado de So Paulo, luz do processo de excluso/incluso social. Parte-se do

    pressuposto de que o espao urbano-metropolitano configurado, em relao sua organizao interna

    e ao seu contedo social, em reas sociais segregadas, as quais resultam de (e implicam em) graus

    diferenciados de incluso ou excluso social de sua populao. Examina-se a evoluo dos processos

    de urbanizao e de expanso das reas urbanizadas na regio, e realiza-se uma caracterizao dos

    espaos intraurbanos sob as perspectivas funcional e social. Elabora-se tambm, com base em variveis

    censitrias intraurbanas, um sistema de indicadores sociais de excluso/incluso social, visando

    mensurar e representar espacialmente a dinmica das desigualdades socioespaciais no espao urbano-

    metropolitano entre 1991 e 2010, atravs de ndices calculados em relao a quatro dimenses de

    anlise do processo de excluso/incluso social: autonomia de renda, desenvolvimento humano,

    equidade e qualidade domiciliar. Os resultados da pesquisa caracterizam a estrutura socioespacial

    desigual urbana, a qual marcada por grandes diferenciais de condies de vida (sobretudo na cidade

    de Campinas) e pela segregao das populaes em arranjos espaciais setorizados, configurados em

    escalas regional e intraurbanas.

    Palavras-chave: desigualdade socioespacial urbana, excluso/incluso social, indicadores sociais.

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    UNIVERSITY OF CAMPINAS

    INSTITUTE OF GEOSCIENCE

    URBAN SOCIO-SPATIAL INEQUALITIES IN AN INLAND METROPOLIS:

    AN ANALYSIS OF THE METROPOLITAN REGION OF CAMPINAS, STATE OF SO PAULO,

    BRAZIL, BASED ON SOCIAL EXCLUSION/INCLUSION INDICATORS

    ABSTRACT

    PhD Thesis

    Ederson Nascimento

    This thesis presents an analysis of the socio-urban structuring of the Metropolitan Region of Campinas,

    State of So Paulo, Brazil, based on the social inclusion/exclusion process. It starts from the

    presupposition that the urban-metropolitan space is configured, in relation to its internal organization

    and its social content, in segregated social areas, which result from (and imply) different degrees of

    social inclusion or exclusion of its population. It analyzes the evolution of the processes of

    urbanization and expansion of urban areas in the region, as well as a characterization of the intra-urban

    spaces under the functional and social perspectives. It also elaborates, based on intra-urban census data,

    a system of social indicators of social exclusion/inclusion, aiming to measure and represent through the

    space the dynamics of socio-spatial inequalities in the urban-metropolitan space between 1991 and

    2010, using indexes calculated in relation to four dimensions of analysis of the social

    inclusion/exclusion process: income autonomy, human development, equity and home quality. The

    research results characterize urban unequal socio-spatial structure, which is marked by big differences

    of living conditions (especially in the city of Campinas) and segregation of populations in sectored

    spatial arrangements sectors, configured in regional and intra-urban scales.

    Keywords: urban socio-spatial inequality, social exclusion/inclusion, social indicators.

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    SUMRIO

    LISTA DE FIGURAS ................................................................................................................... xix

    LISTA DE FOTOS ...................................................................................................................... xxi

    LISTA DE MAPAS ................................................................................................................... xxiii

    LISTA DE TABELAS ................................................................................................................. xxv

    LISTA DE QUADROS .............................................................................................................. xxvii

    SIGLAS E ABREVIATURAS ...................................................................................................... xxix

    INTRODUO .............................................................................................................................. 1

    CAPTULO 1 O PROCESSO DE EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL: REFLEXES TERICO-

    CONCEITUAIS ............................................................................................................................ 11

    1.1 EXCLUSO SOCIAL: PRINCIPAIS CONDICIONANTES E PERSPECTIVAS DE ANLISE ................ 13

    1.1.1 A excluso social e suas abordagens: contextualizao histrico-geogrfica ................. 14

    1.1.2 O conceito de excluso social: perspectivas analticas .................................................... 18

    1.2 EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL: PARA UMA ABORDAGEM GEOGRFICA DAS DESIGUALDADES

    SOCIOESPACIAIS ......................................................................................................................... 25

    CAPTULO 2 O PROCESSO DE EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL E A (RE)PRODUO DO ESPAO

    URBANO .................................................................................................................................... 31

    2.1 A (RE)PRODUO DESIGUAL DO ESPAO URBANO .............................................................. 32

    2.2 SEGREGAO SOCIOESPACIAL: UMA DIMENSO FUNDAMENTAL DO PROCESSO DE

    EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL .................................................................................................... 36

    2.3 PADRES DE DESIGUALDADES SOCIOESPACIAIS URBANAS ................................................... 41

    CAPTULO 3 - OS PROCESSOS DE URBANIZAO E DE EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL:

    REFLEXES SOBRE OS CASOS BRASILEIRO E PAULISTA ......................................................... 51

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    CAPTULO 4 - REGIO METROPOLITANA DE CAMPINAS: A PRODUO DAS DESIGUALDADES

    SOCIOESPACIAIS URBANAS ...................................................................................................... 61

    4.1 A URBANIZAO NA REGIO DE CAMPINAS: BASES HISTRICO-GEOGRFICAS ................... 61

    4.2 EXPANSO URBANA E ESTRUTURA SOCIOESPACIAL DA RMC: A PRODUO DESIGUAL DO

    ESPAO URBANO-METROPOLITANO ........................................................................................... 75

    4.2.1 A expanso horizontal e a dinmica de ocupao do espao urbano-metropolitano....... 76

    4.2.2 A estrutura socioespacial urbana da RMC e a formao de reas de incluso e excluso

    social ......................................................................................................................................... 90

    CAPTULO 5 - INDICADORES SOCIAIS PARA MENSURAO DAS CONDIES DE VIDA:

    REFLEXES A PARTIR DA REGIO METROPOLITANA DE CAMPINAS .................................. 131

    CAPTULO 6 - MAPEANDO A DINMICA DE EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL NA REGIO

    METROPOLITANA DE CAMPINAS ........................................................................................... 145

    6.1 O MAPA DE EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL: INSTRUMENTOS E ETAPAS DE ELABORAO ... 146

    6.2 CARTOGRAFIAS DAS DESIGUALDADES: A DINMICA ESPACIAL DA EXCLUSO/INCLUSO

    SOCIAL NO ESPAO URBANO-METROPOLITANO DA RMC ........................................................ 161

    6.2.1 A excluso-incluso social na escala metropolitana: principais indicadores ................ 161

    6.2.2 A desigualdade socioespacial na autonomia de renda ................................................... 167

    6.2.3 A desigualdade socioespacial no desenvolvimento humano ......................................... 191

    6.2.4 A desigualdade socioespacial na equidade e na qualidade domiciliar .......................... 200

    6.2.5 A desigualdade socioespacial na sobreposio de vantagens e carncias: o mapa de

    excluso/incluso social ......................................................................................................... 208

    CONSIDERAES FINAIS ........................................................................................................ 229

    REFERNCIAS ......................................................................................................................... 233

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    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Modelo socioespacial de Kohl (simplificado) .......................................................... 42

    Figura 2: Modelo socioespacial de Burgess (simplificado)...................................................... 44

    Figura 3: Modelo socioespacial de Hoyt (simplificado) .......................................................... 45

    Figura 4: Distribuio percentual das famlias, segundo tipo de edificao da moradia Estado

    de So Paulo e RMC (2006) ................................................................................................... 115

    Figura 5: Regio Metropolitana de Campinas: ndices de desenvolvimento humano municipal

    (1991/2000) ............................................................................................................................ 138

    Figura 6: Componentes do IPVS, com respectivas variveis ................................................. 140

    Figura 7: Grupos de vulnerabilidade do IPVS ....................................................................... 141

    Figura 8: Frmulas utilizadas para o clculo dos ndices de excluso e incluso social ........ 156

    Figura 9: Exemplos de converso de dados percentuais para a escala de representao da

    excluso/incluso .................................................................................................................... 157

    Figura 10: Exemplos de clculo dos ndices compostos de excluso/incluso social ............ 157

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    LISTA DE FOTOS

    Foto 1 Grande, sudoeste de Campinas .................... 113

    Foto 2: Condomnio horizontal voltado a segmentos de alta renda, situado no bairro Alto

    Taquaral (poro norte do centro metropolitano), em Campinas .......................................... .118

    Foto 3: Condomnio horizontal voltado a segmentos de baixa renda, localizado na vila Padre

    Anchieta, poro oeste de Campinas ...................................................................................... 119

    Foto 4 vel

    socioeconmico superior ........................................................................................................ 124

    Foto 5: rea favelada localizada margem sul da rodovia Dom Pedro I (SP-065)............... 127

    Foto 6: Favela instalada na faixa de domnio da estrada de ferro, localizada em Hortolndia,

    prximo divisa com Campinas ............................................................................................ 128

    Foto 7: Vista de parte do centro principal de Pedreira e de um bairro residencial

    adjacente ................................................................................................................................. 182

    Foto 8: Vista de uma das principais vias de concentrao comercial de Engenheiro

    Coelho ..................................................................................................................................... 183

    Foto 9: Loteamento fechado em Paulnia (vista parcial da rea interna) ............................... 184

    Foto 10: Loteamentos fechados implantados em reas de chcaras na cidade de Vinhedo ... 216

    Foto 11: Loteamentos fechados recm-implantados em processo de ocupao, no distrito de

    Sousas, Campinas ................................................................................................................... 217

    Foto 12: Localidade com mdia-baixa excluso social (2010) situada em Sumar

    (distrito de Nova Veneza) ....................................................................................................... 225

    Foto 13: Localidade com mdia-baixa excluso social (2010), localizada na cidade de Monte

    Mor ......................................................................................................................................... 225

    Foto 14: Vista geral de favela localizada em Paulnia............................................................ 226

    Foto 15: Vista geral da favela Parque Oziel (Campinas) ....................................................... 227

  • xxii

  • xxiii

    LISTA DE MAPAS

    Mapa 1 Localizao da RMC no Estado de So Paulo ........................................................... 5

    Mapa 2 Carta-imagem da Regio Metropolitana de Campinas ............................................. 73

    Mapa 3 Regio Metropolitana de Campinas: evoluo das reas urbanizadas (1965-2010) 81

    Mapa 4 Regio Metropolitana de Campinas: reas urbanizadas e permetros urbanos

    municipais ................................................................................................................................. 87

    Mapa 5 Regio Metropolitana de Campinas: densidade demogrfica urbana em 1991 ....... 97

    Mapa 6 Regio Metropolitana de Campinas: densidade demogrfica urbana em 2000 ....... 99

    Mapa 7 Regio Metropolitana de Campinas: densidade demogrfica urbana em 2010 ..... 101

    Mapa 8 Regio Metropolitana de Campinas: localizao industrial ................................... 105

    Mapa 9 Regio Metropolitana de Campinas: reas de atividades comerciais e de prestao de

    servios no espao urbano-metropolitano .............................................................................. 109

    Mapa 10 Regio Metropolitana de Campinas: localizao das reas residenciais no espao

    urbano-metropolitano ............................................................................................................. 111

    Mapa 11 Regio Metropolitana de Campinas: localizao de condomnios e loteamentos

    residenciais fechados .............................................................................................................. 121

    Mapa 12 Ocupaes residenciais irregulares no espao urbano-metropolitano .................. 125

    Mapa 13 Regio Metropolitana de Campinas: ndice Paulista de Vulnerabilidade Social

    (2010) ..................................................................................................................................... 143

    Mapa 14 Regio Metropolitana de Campinas: mapa base .................................................. 149

    Mapa 15 Regio Metropolitana de Campinas: responsveis por domiclios rendimento

    mensal superior a dez salrios mnimos (1991)...................................................................... 169

    Mapa 16 Regio Metropolitana de Campinas: regio Metropolitana de Campinas:

    responsveis por domiclios rendimento mensal superior a dez salrios mnimos (2000) .. 171

    Mapa 17 Regio Metropolitana de Campinas: responsveis por domiclios rendimento

    mensal superior a dez salrios mnimos (2010)...................................................................... 173

    Mapa 18 Regio Metropolitana de Campinas: responsveis por domiclios rendimento

    mensal de at dois salrios mnimos (1991) ........................................................................... 175

    Mapa 19 Regio Metropolitana de Campinas: responsveis por domiclios rendimento

    mensal de at dois salrios mnimos (2000) ........................................................................... 177

  • xxiv

    Mapa 20 Regio Metropolitana de Campinas: responsveis por domiclios rendimento

    mensal de at dois salrios mnimos (2010) ........................................................................... 179

    Mapa 21 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/ incluso por autonomia de

    renda (1991) ............................................................................................................................ 185

    Mapa 22 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/ incluso por autonomia de

    renda (2000) ............................................................................................................................ 187

    Mapa 23 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/ incluso por autonomia de

    renda (2010) ............................................................................................................................ 189

    Mapa 24 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/ incluso por

    desenvolvimento humano (1991) ........................................................................................... 193

    Mapa 25 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/ incluso por

    desenvolvimento humano (2000) ........................................................................................... 195

    Mapa 26 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/ incluso por

    desenvolvimento humano (2010) ........................................................................................... 197

    Mapa 27 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso por equidade (1991) .... 201

    Mapa 28 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso por equidade (2000) .... 203

    Mapa 29 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso por equidade (2010) .... 205

    Mapa 30 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/ incluso por qualidade

    domiciliar (1991) .................................................................................................................... 209

    Mapa 31 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/ incluso por qualidade

    domiciliar (2000) .................................................................................................................... 211

    Mapa 32 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/ incluso por qualidade

    domiciliar (2010) .................................................................................................................... 213

    Mapa 33 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/incluso social

    (1991) ..................................................................................................................................... 219

    Mapa 34 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/incluso social

    (2000) .................................................................................................................................... 221

    Mapa 35 Regio Metropolitana de Campinas: ndice de excluso/incluso social

    (2010) ..................................................................................................................................... 223

  • xxv

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1: Variveis, indicadores compostos e ndices utilizados na elaborao do mapa de

    excluso/incluso social (1991) .............................................................................................. 153

    Quadro 2: Variveis, indicadores compostos e ndices utilizados na elaborao do mapa de

    excluso/incluso social (2000) .............................................................................................. 154

    Quadro 3: Variveis, indicadores compostos e ndices utilizados na elaborao do mapa de

    excluso/incluso social (2010) .............................................................................................. 155

    Quadro 4: Classificao dos nveis de excluso/incluso ...................................................... 162

  • xxvi

  • xxvii

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1: Criao dos municpios da RMC .............................................................................. 66

    Tabela 2: Taxas de crescimento demogrfico mdio anual (%) da populao absoluta

    (1970-2010) .............................................................................................................................. 69

    Tabela 3: Evoluo da populao urbana da RMC (1970-2010) ............................................. 71

    Tabela 4: reas urbanizadas nos municpios da RMC (1965-2010) ........................................ 79

    Tabela 5: Relao entre dficit habitacional e lotes urbanizados produzidos na RMC

    (2000-2007) ............................................................................................................................ 116

    Tabela 6: Condomnios e loteamentos fechados aprovados na RMC (2000-2007) ............... 117

    Tabela 7: ndices de Desenvolvimento Humano Municipal na RMC (1991-2000) ............... 137

    Tabela 8: Distribuio absoluta e percentual da populao urbana, por nveis de

    excluso/incluso Social ......................................................................................................... 163

    Tabela 9: Distribuio absoluta e percentual da populao urbana, por nveis de excluso

    Social, segundo municpios da RMC (1991, 2000 e 2010) .................................................... 165

  • xxviii

  • xxix

    SIGLAS E ABREVIATURAS

    ABRASCE: Associao Brasileira de Shoppings Centers

    AGEMCAMP: Agncia Metropolitana de Campinas

    CDHU: Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de So Paulo

    CDRMC: Conselho de Desenvolvimento da Regio Metropolitana de Campinas

    CEBRAP: Centro Brasileiro de Anlise e Planejamento

    CEM: Centro de Estudos da Metrpole

    CPqD: Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicaes

    DSG: Diretoria de Servio Geogrfico do Exrcito

    EMPLASA: Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano

    GLCF: Global Land Cover Facility University of Maryland (EUA)

    GRAPROHAB: Grupo de Anlise e Aprovao de Projetos Habitacionais do Estado de So

    Paulo

    IAC: Instituto Agronmico de Campinas

    IGC: Instituto Geogrfico e Cartogrfico do Estado de So Paulo

    IDH: ndice de Desenvolvimento Humano

    IDHM: ndice de Desenvolvimento Humano Municipal

    IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    IPARDES: Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econmico e Social

    IPEA: Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada

    IPVS: ndice Paulista de Vulnerabilidade Social

    INPE: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

    NEPO: Ncleo de Estudos de Populao

    NESUR: Ncleo de Economia Social, Urbana e Regional

    PEA: Populao Economicamente Ativa

    PIB: Produto Interno Bruto

    PIS: Padro de Incluso Social

    PNUD: Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento

    PUC-Campinas: Pontifcia Universidade Catlica de Campinas

    REPLAN: Refinaria de Petrleo do Planalto Paulista, ou Refinaria de Paulnia Petrobrs

  • xxx

    RMC: Regio Metropolitana de Campinas

    RMSP: Regio Metropolitana de So Paulo

    SEADE: Fundao Sistema Estadual de Anlise de Dados

    UNICAMP: Universidade Estadual de Campinas

  • 1

    INTRODUO

    O foco principal desta tese so as desigualdades socioespaciais: as disparidades na

    distribuio dos frutos da riqueza gerada no processo geral de produo da sociedade

    capitalista, que resultam em diferentes possibilidades de apropriao, organizao e uso do

    espao e dos bens e servios produzidos pelo trabalho social. Esta dessemelhana ocasiona um

    desequilbrio, por vezes bastante grave, entre as condies de vida dos indivduos em uma

    determinada localidade1, dando origem a segmentos sociais excludos do acesso s principais

    fontes de renda e de importantes meios de desenvolvimento das capacidades humanas, como a

    educao, bem como de condies bsicas de moradia e de vida, ao mesmo tempo em que

    outras parcelas da populao conseguem concentrar para si o usufruto de tais benefcios. Isso

    configura, portanto, um processo social de desigualdade no qual a excluso e a incluso

    sociais se fundem dialeticamente, de modo que o entendimento ampliado de uma das

    condies sociais implica em considerar, tambm de maneira aprofundada, a outra.

    O cenrio de desigualdade ao qual se est referindo tem na produo da cidade

    capitalista uma de suas expresses mais concretas. O processo de produo e reproduo do

    espao urbano envolve, antes de tudo, uma sociedade fragmentada e hierarquizada,

    estratificada em classes, produzindo de forma socializada para consumidores privados. Por

    isto, uma cidade um local onde diversas pessoas se organizam, interagem, constituem

    alianas e entram em conflito na defesa de interesses os mais diversos, que venham assegurar

    a apropriao e o controle do espao para dele fazer o uso mais adequado a seus propsitos,

    seja este destinado a viabilizar a reproduo do capital, ou para a constituio de suas

    condies gerais de vida.

    No Brasil, as desigualdades socioespaciais so um trao marcante na produo e

    estruturao social do espao urbano, sobretudo a partir de meados do sculo XX. O processo

    de urbanizao desencadeado no pas, impulsionado por um modelo de desenvolvimento

    econmico excludente, levou conformao de cidades e aglomeraes urbanas com

    acentuadas assimetrias sociais e espaciais. As enormes disparidades na distribuio de renda e

    1 No decorrer deste trabalho, o termo localidade ser empregado para se referir a qualquer parcela do

    espao urbano distinguvel das demais por suas caractersticas socioespaciais, podendo se referir a zonas ou

    grandes reas das cidades, bairros, conjuntos residenciais ou simplesmente a setores censitrios urbanos.

  • 2

    poder, especialmente nos centros urbanos de maior porte econmico e populacional, somadas

    estrutura fundiria permanentemente concentrada, tm cada vez mais diferenciado as

    possibilidades de apropriao, organizao e usufruto do espao pelos diversos segmentos da

    sociedade.

    Neste sentido, a desigualdade engendrada no processo de produo capitalista,

    decorrente do papel ocupado pelos indivduos na diviso social do trabalho, materializa-se no

    espao urbano atravs de reas que propiciam melhor ou pior qualidade de vida, ao mesmo

    tempo em que tendem a favorecer ou a restringir a busca por condies de vida mais

    satisfatrias. Assim, o espao urbano tende a ser estruturado de modo dspar em reas que

    renem diferentes condies e nveis de incluso ou de excluso social.

    Por outro lado, esta concretizao espacial das assimetrias sociais condiciona a

    continuidade do processo de produo do espao urbano e de reproduo dos grupos sociais,

    tanto por meio da substituio de usos da terra por outros mais adequados aos interesses dos

    detentores da propriedade fundiria e imobiliria, como atravs da incorporao de novas

    terras com usos rurais ou esterilizadas espera de valorizao s reas j urbanizadas,

    ampliando e, por vezes, dispersando a ocupao urbana do solo. Do ponto de vista social,

    tanto num como noutro caso, a evoluo dos usos urbanos da terra tem tendido a promover

    uma ampliao das desigualdades por meio da segregao espacial dos segmentos sociais.

    Nas aglomeraes urbanas de porte mais elevado, esta dinmica de segregao tem se

    materializado em escalas espaciais diferenciadas. De um lado, pode-se observar a aproximao

    ou, numa acepo mais ampla e de acordo

    com a perspectiva desenvolvida neste trabalho, entre grupos marcados por processos sociais

    includentes ou excludentes , desencadeada pelo surgimento de favelas e ncleos de sub-

    habitaes, resultando, por vezes, em verdadeiros enclaves

    valorizadas da cidade. De outro, observa-se a emergncia de novas e amplas reas residenciais

    voltadas a segmentos de mdio e alto status social, cujas localizaes, afastadas dos centros

    tradicionais das cidades e at mesmo do tecido urbano consolidado, eixos ou

    setores espaciais de concentrao de riqueza e bem estar, em detrimento das demais

    localidades do espao urbano.

  • 3

    Em tal contexto, a disposio das classes no espao sofre alteraes, tendendo para

    um padro setorial que reflete a segregao entre as mesmas e a diferenciao entre os nveis

    de incluso e de excluso social de cada segmento social. Em aglomeraes urbanas com

    ncleos integrados entre si, tal setorizao, no raro, extrapola os limites internos de uma

    cidade, ampliando a estruturao socioespacial para a escala regional.

    A Regio Metropolitana de Campinas (RMC) um importante centro demogrfico e

    econmico do Estado de So Paulo onde a referida dinmica de desigualdades est presente.

    Com uma populao de 2,799 milhes de habitantes e taxa de urbanizao de 97,4%2, esta

    regio, institucionalizada em 20003, constituda por Campinas e outros dezoito municpios

    de seu entorno: Americana, Artur Nogueira, Cosmpolis, Engenheiro Coelho, Holambra,

    Hortolndia, Indaiatuba, Itatiba, Jaguarina, Monte Mor, Nova Odessa, Paulnia, Pedreira,

    Nos

    referidos municpios, conforma-se um espao urbano disperso constitudo por ncleos urbanos

    mais antigos e densamente ocupados, ligados entre si por um amplo e moderno sistema de

    rodovias e avenidas, e, em parte, conurbados em padres de usos urbanos da terra com baixas

    densidades loteamentos abertos, reas empresariais e institucionais e reas residenciais

    fechadas, entremeados por vazios urbanos , alocados nas proximidades das referidas vias de

    trfego.

    Nesse conjunto das reas urbanizadas municipais, que ser chamado de espao

    urbano-metropolitano, nota-se, portanto, uma diversidade expressiva nos modos de ocupao

    do espao e em seu contedo social observveis, em vrios locais, atravs de uma simples

    observao da paisagem , diferenas estas que vo alm de um padro espacial metropolitano

    do tipo centro x -

    que resultam de (e provavelmente implicam em) nveis diferenciados de incluso e excluso

    social, sendo tais diferenciaes visveis na comparao entre as diferentes reas urbanas dos

    municpios que a constituem, como tambm internamente a cada uma delas.

    2 Conforme o censo demogrfico de 2010, do IBGE.

    3 Instituda pela Lei complementar estadual n 870, de 24/05/2000.

  • 4

    Assim, o principal esforo empreendido na presente pesquisa reside em analisar essas

    desigualdades socioespaciais articulando as escalas geogrficas regional e intraurbana4, pois

    quando o tamanho [do espao

    apreendido] muda, as coisas mudam, o que no pouco, pois to importante quanto saber que

    as coisas mudam com o tamanho, saber como elas mudam, qual o novo contedo das novas

    No caso da anlise socioespacial urbana, uma incurso da escala regional para o

    nvel intraurbano representa a possibilidade de uma anlise mais prxima das condies

    concretas que caracterizam a organizao espacial e o perfil socioeconmico das populaes,

    Por outro lado, essa anlise intraurbana no deve perder de vista o contexto socioespacial

    regional no qual as localizaes intraurbanas esto inscritas.

    Nesse sentido, a pesquisa teve como principal objetivo compreender o processo de

    estruturao socioespacial desigual do espao urbano na RMC nas escalas da regio e das

    diferentes cidades que a conformam, concebendo tais desigualdades a partir de localidades

    marcadas por nveis distintos de incluso e excluso social. Para tanto, so investigadas as

    principais condicionantes histrico-geogrficas que contribuem para o surgimento e

    consolidao, nos dezenove municpios que constituem a regio metropolitana, de espaos

    urbanos discrepantes no tocante ao contedo social e organizao espacial. Procura-se

    tambm elaborar um marco conceitual que fornea subsdios para o entendimento da estrutura

    socioespacial de uma regio metropolitana situada no interior paulista, cuja evoluo urbana

    relativamente nova (se comparada com a RMSP, por exemplo) e marcada, desde o seu

    princpio, pela lgica da ocupao dispersa.

    Finalmente, um ltimo objetivo perseguido pela pesquisa consistiu em elaborar um

    encaminhamento metodolgico que possibilitasse, concomitantemente, conceber

    conceitualmente a excluso social em sua relao dialtica com o seu contraponto a incluso

    social , entendendo ambos os processos como multidimensionais, inter-relacionados entre si

    4

    (1998), para quem o espao intraurbano (poder-se-ia dizer, o espao interno da cidade, em nossa acepo) surge

    da aglomerao estruturada a partir das condies de deslocamento dos indivduos, diferentemente do espao

    regional, em que a localizao dos meios de produo e a diviso territorial do trabalho so as principais

    condicionantes. Nesse sentido, para fins analticos e de identificao no texto, empregar-se- a expresso escala

    intraurbana para se referir escala do interior de uma cidade ou rea urbana municipal, embora se tenha

    conscincia de que em vrias das reas conurbadas da RMC, as condies de deslocamento e as centralidades de

    determinados objetos espaciais existentes extrapolam os limites municipais. J a expresso escala regional

    remeter a todo o espao urbanizado da RMC, isto , ao espao urbano-metropolitano.

  • 5

  • 6

  • 7

    e atuantes na estruturao do espao urbano, e, aferir empiricamente os diferenciais de

    incluso e excluso social, por meio de sua mensurao e representao espacial em escalas

    intraurbanas e regional.

    Sob essa demanda, construdo um sistema de indicadores de excluso/incluso

    social, a partir de variveis socioeconmicas provenientes dos censos demogrficos de 1991,

    2000 e 2010 agregadas por setores censitrios urbanos, e tendo como referncia uma

    metodologia semelhante, elaborada na dcada de 1990 para anlise da cidade de So Paulo

    (SPOSATI, 1996). Com tais indicadores, objetiva-se caracterizar e classificar as diferentes

    localidades do espao urbano-metropolitano, tendo como substrato terico quatro importantes

    dimenses do processo de excluso/incluso social, aferveis a partir dos dados: autonomia de

    renda, desenvolvimento humano, equidade e qualidade domiciliar. A metodologia utilizada na

    construo deste sistema de indicadores fundamenta-se na elaborao de uma escala de notas

    que, ao abranger todas as reas e setores populacionais do espao urbano, possibilita medir as

    condies de vida nos mesmos com base no afastamento em relao a uma condio tida

    como bsica para que haja incluso social e, ao mesmo tempo, hierarquiz-los no contexto

    geral dos espaos urbanos da RMC, permitindo, assim, visualizar o grau de discrepncia entre

    as condies de vida dos habitantes conforme a localizao em que se est na cidade e na

    regio.

    Longe de pretender abarcar toda a complexidade socioespacial de uma regio to

    vasta e com mltiplas espacialidades como a que est em anlise, visa-se, com tal sistema de

    indicadores, possibilitar uma viso geral das condies de vida na RMC no tocante ao perfil

    socioeconmico e aos padres de habitabilidade, examinando-as internamente a cada cidade e

    na comparao entre elas, buscando, a partir disso, compreender o espao urbano-

    metropolitano em suas diferenas e semelhanas internas.

    A tese esta estruturada em seis captulos, sendo que nos dois primeiros so

    apresentadas reflexes de natureza terico-conceitual, a fim de constituir um marco referencial

    para a anlise e compreenso das desigualdades socioespaciais urbanas a partir do processo de

    excluso/incluso social. No captulo inicial, intitulado O processo de excluso/incluso

    social: reflexes terico-conceituais, realiza-se uma anlise crtica do conceito de excluso

    social, apresentando as concepes tericas mais importantes e as principais crticas feitas ao

  • 8

    mesmo, seguida de reflexes acerca das vantagens e potencialidades do uso do referido

    conceito para a anlise geogrfica em especial, no estudo das desigualdades socioespaciais

    urbanas dentro da perspectiva terico-conceitual da excluso/incluso social. Em seguida, no

    captulo 2, O processo de excluso/incluso social e a (re)produo do espao urbano,

    complementa-se o arcabouo terico-conceitual da pesquisa, abordando primeiramente a

    (re)produo desigual do espao urbano a partir da constituio e apropriao desigual de

    localizaes intraurbanas. Na sequncia, analisa-se a segregao socioespacial resultante da

    produo de localizaes e sua relao com a dinmica de excluso/incluso social na cidade

    e, por fim, apresenta-se uma discusso sobre padres de desigualdades socioespaciais urbanos,

    realizada com o intuito de subsidiar as reflexes seguintes acerca da estruturao socioespacial

    urbana na atualidade, em escalas intraurbana e metropolitana.

    Os captulos 3 e 4 so dedicados anlise histrico-geogrfica e caracterizao da

    produo das desigualdades socioespaciais urbanas na RMC luz do processo de

    excluso/incluso social. No captulo 3, Os processos de urbanizao e de excluso/incluso

    social: reflexes sobre os casos brasileiro e paulista, examina-se as relaes entre os

    processos de urbanizao e de excluso/incluso social em escala nacional e como sua

    conjugao contribuiu para a conformao, no Estado de So Paulo, de aglomeraes urbanas

    desiguais e segregadas social e espacialmente. Em seguida, no captulo Regio

    Metropolitana de Campinas: a produo das desigualdades socioespaciais urbanas,

    analisa-se o processo de evoluo desigual do espao urbano-metropolitano na regio de

    Campinas, primeiramente apresentando as principais condicionantes e desdobramentos

    socioespaciais da urbanizao na regio e, posteriormente, caracterizando a sua estrutura

    socioespacial urbana.

    Na parte final do trabalho, debrua-se sobre o universo da anlise socioespacial

    intraurbana com o uso de indicadores sociais. No captulo 5, Indicadores sociais para

    mensurao das condies de vida: reflexes a partir da Regio Metropolitana de

    Campinas, discute-se a funcionalidade dos indicadores sociais para o diagnstico das

    condies de vida e de aspectos relativos organizao espacial numa dada localidade.

    Destaca-se a importncia da produo de indicadores com comparabilidade intraurbana, algo

    ainda demandante de muitos avanos no Brasil. Por sua vez, o ltimo captulo, Mapeando a

    dinmica de excluso/incluso social na Regio Metropolitana de Campinas, traz o

  • 9

    sistema de indicadores sociais de excluso/incluso social elaborado para representar e

    analisar os padres de desigualdades socioespaciais no espao urbano-metropolitano

    campineiro, apresentando, num primeiro momento, os fundamentos conceituais e o

    encaminhamento metodolgico empregados no clculo e na cartografao dos indicadores, e,

    em seo posterior, a anlise dos resultados obtidos.

    Encerrando a tese, as consideraes finais apresentam, em seguida, as impresses

    gerais sobre a dinmica de excluso/incluso social e as desigualdades socioespaciais urbanas

    na Regio Metropolitana de Campinas.

  • 10

  • 11

    CAPTULO 1

    O PROCESSO DE EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL:

    REFLEXES TERICO-CONCEITUAIS

    A desigualdade um aspecto inerente a toda e qualquer sociedade. Indivduos e

    famlias so, em si, desiguais quanto a aspectos fsicos, psicossociais e culturais, bem como

    constituem (e se organizam em) grupos que se diferenciam ao longo do tempo em relao

    cultura, valores, tcnicas e recursos diversos. Entretanto, as desigualdades entre indivduos,

    grupos e classes sociais tornam-se questo social de interesse investigao cientfica, em

    especial para as cincias humanas e sociais, e foco de ateno e interveno no mbito pblico

    (no somente pelo Estado, mas tambm por outras entidades e segmentos da sociedade)

    medida que estas, no modo de produo capitalista, no representam apenas diferenas mas

    trazem consigo relaes hierrquicas entre os diversos grupos e estratos sociais. Em outras

    palavras, quando tais desigualdades implicam em vantagens e desvantagens mltiplas que

    conferem meios e oportunidades distintos para uma boa qualidade de vida e para o pleno

    exerccio da cidadania. Tomadas nesse sentido, as desigualdades sociais refletem, portanto, o

    modo como se d a distribuio e apropriao diferencial das riquezas materiais e simblicas

    em um determinado contexto histrico-social, bem como os valores que orientam esta

    distribuio dentro da estrutura de classes da sociedade (ESCOREL, 1999).

    Para a Geografia, a anlise da desigualdade social relevante por ser o espao

    geogrfico produzido e reproduzido socialmente no mbito de tais relaes sociais dspares.

    [...] a expresso concreta de cada conjunto

    CASTELLS, 2000, p. 181), e se diferencia histrica

    e geograficamente sobretudo pelas densidades tcnicas e pelos contedos sociais presentes em

    cada lugar. Com efeito, o espao social refletir, em suas formas e nos modos de apropriao e

    uso, as assimetrias provenientes de uma sociedade desigual e hierarquizada em classes e,

    dialeticamente, a organizao espacial, estruturada socialmente de modo desigual,

    condicionar, tambm de modo desigual, a reproduo da sociedade ao oferecer aos

    segmentos sociais condies mais ou menos favorveis realizao das diversas atividades

    que viabilizam sua existncia (CORRA, 1998; SANTOS, 2002). Importa assim, para a abordagem das

  • 12

    desigualdades socioespaciais, analisar os processos envolvidos na produo das disparidades

    sociais e suas caractersticas.5

    Visando compreender a dinmica das desigualdades em suas faces, diversas matrizes

    conceituais foram tecidas ao longo do tempo, engendradas a partir de pontos de vistas

    oriundos dos mais variados ramos do conhecimento cientfico. O conceito de excluso social

    um dos que teve maior difuso dentro das cincias sociais e humanas, diante de preocupaes

    com o crescimento da pobreza e com a desestabilizao de vnculos coesivos do tecido social,

    desencadeados por processos de reestruturao econmica e pela supresso de polticas sociais

    de bem-estar, especialmente em pases de capitalismo avanado. Na Amrica Latina, e

    principalmente no Brasil, o uso do conceito cresce tambm em funo da [...] exacerbao

    dos problemas urbanos das metrpoles nos anos 1970 e com o aprofundamento da crise

    econmica dos anos 1980, que aumentou a desigualdade social e a pobreza (VIEIRA et al.,

    2010, p. 36). Todavia, o uso generalizado e, de certo modo, indiscriminado do conceito,

    utilizado com [...] vrios significados para reunir pessoas e grupos que so abandonados,

    desafiliados (Castel), deixados de lado, desqualificados (Paugam) quer do mercado de

    trabalho, (VRAS, 2006, p. 27), deu origem a controvrsias

    quanto sua utilizao, suscitando, inclusive, a rejeio do termo por diversos estudiosos, em

    razo das diferenas quanto sua interpretao e uso.

    Em vista disso, neste captulo realiza-se uma apreciao do controverso conceito de

    excluso social, apresentando, num primeiro momento, as concepes tericas mais

    importantes e as principais crticas feitas ao mesmo. Em seguida, so analisadas as vantagens e

    potencialidades do referido conceito para a anlise geogrfica em especial, na anlise das

    desigualdades socioespaciais urbanas segundo a perspectiva terico-conceitual utilizada

    nesta tese, a da excluso/incluso social.

    5 A mesma perspectiva apresentada sobre as desigualdades sociais pode ser aplicada em relao ao

    espao. A rigor, todos os espaos so diferentes entre si. Assim, as desigualdades espaciais tornam-se uma

    questo relevante para anlise medida que implicam em benefcios e malefcios distintos sociedade e

    contribuem para hierarquiza-la (MATOS, 2010).

  • 13

    1.1 EXCLUSO SOCIAL: PRINCIPAIS CONDICIONANTES E PERSPECTIVAS DE ANLISE

    Numa acepo geral, pode-se entender excluso social como uma dinmica que

    implica na impossibilidade, por parte dos elementos de uma sociedade, de poderem partilhar

    em nvel de igualdade econmica, social, poltica e cultural (SPOSATI, 1996). O termo remete

    ideia de um processo amplo, podendo envolver, de um lado, um conjunto de privaes e

    carncias materiais de origem econmica e poltica, como a insuficincia de renda e a

    dificuldade de acesso a bens e servios que possibilitam melhores condies de vida

    (educao, infraestrutura bsica, servios como transporte pblico e sade, condies

    adequadas de moradia, entre outros) e, de outro, desdobramentos nos campos tico e

    psicossocial, mais especificamente suas implicaes sobre a fragilizao ou mesmo o

    rompimento de liames sociais, expressos em termos de segregao, subalternidade e

    discriminao de segmentos da sociedade.

    Todavia, refletir sobre excluso social ainda remete ao exame de um conceito que,

    embora esteja amplamente difundido, tanto nos estudos das cincias sociais e humanas como

    em discursos polticos, ainda se encontra eivado de indefinies, carecendo de uma

    delimitao terica mais clara. De um lado, tais imprecises se devem prpria complexidade

    do processo que visa abarcar, cuja anlise permite diversas interpretaes de acordo com a

    filiao terica de cada pesquisador ou agente social. Por outro lado, resulta tambm do

    prprio carter instvel da dinmica social, mutvel no tempo e varivel conforme o espao

    em que ocorre. Assim, como bem afirma Wanderley (2006, p. 18), antes de tudo, qualquer

    estudo sobre a excluso social [...] deve ser contextualizado no espao e tempo ao qual o

    .

    Na prxima seo, so apresentados os principais eventos que motivaram o

    desenvolvimento de reflexes sobre o tema da excluso social. Em seguida, realiza-se uma

    apreciao crtica das concepes tericas mais relevantes em relao dinmica de excluso

    (e incluso) social.

  • 14

    1.1.1 A excluso social e suas abordagens: contextualizao histrico-geogrfica

    Tema presente em discursos polticos, planos e programas governamentais e na

    mdia, a noo de excluso social tornou-se familiar no cotidiano das mais variadas regies e

    pases ao redor do globo, inclusive em territrios core do capitalismo global, sinalizando para

    o destino incerto de segmentos cada vez mais numerosos da populao (WANDERLEY, 2006).

    A ideia de excluso social foi pensada como conceito na Frana em meados dos anos

    19706, no contexto da crise do regime fordista de acumulao, o qual, segundo Harvey (1992),

    permitira avanos importantes nas condies de vida de parte significativa da populao nos

    pases centrais, sobretudo devido a nveis de crescimento econmico elevados, ganhos

    salariais e ampliao de direitos trabalhistas, e aumento de investimentos estatais em

    infraestrutura e em polticas sociais.

    Naquele momento, elevavam-se as preocupaes com a precarizao de uma parcela

    crescente da populao na Frana e em outros pases do oeste europeu, em funo de

    transformaes em curso no mundo do trabalho, aliadas crise do chamado Estado de bem-

    estar social. Assim, a difuso do uso do conceito de excluso social ocorreu no mbito da

    progressiva piora das condies de vida observada em escala mundial nas dcadas seguintes,

    como resultado de iniciativas empreendidas com vistas a caracterizar melhor as causas e os

    desdobramentos do fenmeno.

    H, portanto, em termos gerais, dois grandes processos em certa medida, inter-

    relacionados no contexto atual de globalizao na origem das transformaes sociopolticas

    e territoriais relacionadas s discusses sobre excluso social: a reestruturao produtiva e as

    polticas de inspirao neoliberal (ou no-keynesiana).

    A reorganizao da produo capitalista no globo e a reestruturao do mercado de

    trabalho ocorridas na esteira da economia globalizada, fizeram com que os processos de

    excluso se alastrassem pelo mundo como um todo no final do sculo XX, [...] no poupando

    6 De acordo com Maringela Wanderley (2006), atribui-se a Ren Lenoir (1974) a proposio da noo

    assumido pelo termo posteriormente, ainda que com diferentes interpretaes. Ainda segundo esta autora, Lenoir

    menciona como principais causas do fenmeno da excluso social as disparidades de renda e no acesso a

    servios, a inadaptao e uniformizao do sistema escolar e o desenraizamento causado pela mobilidade

    profissional.

  • 15

    nem mesmo os pases centrais (HAESBAERT, 2004, p. 319).

    A paulatina diminuio na demanda por fora de trabalho verificada a partir da dcada de

    1970, motivada, entre outros fatores, pela incorporao de inovaes cientfico-tecnolgicas,

    aliada adoo de novos modelos de produo baseados na terceirizao de servios e na

    subcontratao de trabalhadores, contriburam, segundo Singer (2003, p. 29), para a ampliao

    [...] excluso de uma

    crescente massa de trabalhadores do gozo de seus direitos legais , como

    Para o referido autor, este ltimo tem

    tido ainda suas condies agravadas, j que o tempo mdio de desemprego tem se prolongado

    em vrios pases, minimizando a proporo de desempregados auxiliados pelo seguro-

    desemprego e aumentando a quantidade de pessoas atingidas pela excluso social, pois suas

    vidas pessoais entram em crise. A contrapartida disso atua no sentido de aprofundar a

    desigualdade social, por meio da concentrao da renda a favor dos diretores ou trabalhadores

    estveis do ncleo primrio das grandes empresas, dos investidores e especuladores.

    por esta razo que, na acepo de Dupas (2001, p. 16), de uma maneira mais geral,

    as alteraes ocorridas na produo capitalista

    [...] invadem tambm a esfera individual ao modificar valores e padres h muito

    sedimentados, estando a uma das principais razes do sentimento de insegurana que

    comea a se generalizar e que est subjacente preocupao com a excluso social,

    fortemente ligado s mudanas [...] no mercado de trabalho.

    As polticas neoliberais de ajuste contribuem para agravar ainda mais este quadro de

    excluso social no mbito da globalizao econmica. Adotadas em nome da estabilidade

    financeira e monetria, promovem [...] um afastamento ou menor interveno estatal na

    esfera social, com polticas sociais e de bem- (VIEIRA et

    al., 2010, p. 35). claro, pois, que os impactos sociais negativos da reorientao das polticas

    so mais profundos nos pases e territrios onde sua cobertura social socialmente mais

    abrangente.

    Em suma, a tomada de conscincia sobre o processo de excluso/incluso social e,

    por conseguinte, os debates sobre suas causas e consequncias, ganharam fora em

    decorrncia do alcance cada vez mais globalizado da dinmica das desigualdades e privaes

  • 16

    sociais, as quais desestabilizaram inclusive segmentos sociais com nveis de renda e

    qualificao profissional mais elevados, precarizando, assim, as condies de vida de uma

    parcela crescente da populao. Entretanto, alguns autores como, por exemplo, Lavinas

    (2002) chamam a ateno para o fato de que no se pode situar a origem da excluso social

    nas referidas transformaes do capitalismo do ltimo fim de sculo, pois em sociedades como

    as latino-americanas e mais particularmente a brasileira, os processos excludentes estiveram

    presentes em todas as fases do modelo de acumulao, e no apenas por fora da flexibilizao

    e globalizao dos mercados. Em funo disso, para Demo (2002), as discusses sobre uma

    das desigualdades sociais, mas expressam tambm [...] pavor [...] de

    a Europa tomar o caminho do Terceiro Mundo, medida que o empobrecimento da sociedade

    se instala agora tambm no centro (idem, p. 1). [...] esquece-se do Terceiro

    Mundo, onde sempre existiu pobreza extrema e degradante, bem como deixa-se de lado a

    histria da pobreza no mundo, que sempre alimentou, em especial no capitalismo, formas

    desqualificantes de pobreza (idem, p. 2). O autor sugere, assim, que o que se entende por

    ualquer que seja a sua perspectiva analtica, no se constitui em um

    fenmeno social plenamente novo, e sim em desdobramentos sociais e territoriais de uma nova

    fase do modo de produo capitalista.7

    Em vista disso, o estudo sobre a excluso social na periferia do capitalismo global, da

    qual seguramente o Brasil faz parte, fundamenta-se em elementos diferentes dos priorizados

    pela literatura nos pases centrais. Na Europa Ocidental e nos Estados Unidos, os enfoques

    sobre a excluso tendem a se debruar sobre aspectos vinculados a privaes e

    constrangimentos sofridos por indivduos e grupos no domnio dos vnculos sociais (excluso

    por rupturas profissionais, familiares e afetivas) e da alteridade (excluso por discriminao de

    segmentos especficos, como por razes de etnia, por exemplo), estes mais ou menos

    7 O autor complementa este ponto de vista examinando a promoo da justia dentro do modo de

    welfare state, em que pese sua extraordinria significao histrica e seu valor utpico,

    originou uma falsa expectativa sobre o capitalismo, imaginando que se tratasse de um sistema produtivo

    domesticvel e at mesmo compatvel com a justia social. Segundo nossa tese, o capitalismo civilizvel, no

    mximo. No o podemos domar, porque no vivel um capitalismo que no privilegie o capital ou a relao de

    mercado, mas o podemos civilizar, dependendo este efeito mais que tu DEMO, 2002, p. 5-6).

  • 17

    exacerbados pelo crescimento da pobreza8 e pela fragilizao das polticas de bem-estar

    (COSTA, 1998; DEMO, 2002; GUIMARES et al., 2002; WANDERLEY, 2006; KOWARICK, 2009).

    Por sua vez, a ateno se volta principalmente para o

    entendimento das dimenses objetivas da desigualdade e da pobreza em suas feies

    contemporneas (DUPAS, 2001; GUIMARES et al., 2002; LAVINAS, 2002; SINGER, 2003). Nestes territrios,

    a pobreza sempre ocupou posio central na definio da excluso social, pois a ampla maioria

    de suas populaes socialmente excludas constituda por gente privada das principais fontes

    de renda, tendo, assim, limitado o acesso de parte de seus habitantes aos bens e servios

    essenciais a uma boa qualidade de vida. E mais do que isso, nestes pases a pobreza pode

    ainda excluir suas vtimas de outras redes sociais, desencadeando e/ou aprofundando outros

    tipos de excluso:

    [...] a excluso social pode ser vista como uma soma de vrias excluses,

    habitualmente muito inter-relacionadas. Aqueles que foram expulsos do mercado de

    trabalho formal, ou do mercado da residncia formal (em contraste com o informal,

    formado por cortios e favelas), ou da escola, ficam em desvantagem na competio

    por novas oportunidades, tornando-se candidatos provveis a novas excluses

    (SINGER, 2003, p. 62).

    Em suma, com o conceito de excluso social, busca-se apreender as dimenses

    socioeconmico-poltica e psicossocial da desigualdade social, pois, como apontam

    Guimares et al. (2002, p. 4)9, o mesmo teria a propriedade de subsidiar o entendimento de

    [...] processos subjetivos que diferenciam social e individualmente grupos e segmentos que

    [...] perdem seu lugar e suas referncias enquanto atores/participantes de uma dada

    , e de outro e concomitantemente anlise [...] das novas feies

    .

    Porm, o pouco rigor no que acabou sendo

    empregado para se referir aos mais variados fenmenos e situaes que precarizam as

    8 Entende- situao relativa, que deve [...] ser relacionada com a medida

    absoluta de um mnimo. [...] Pobres so os desprovidos da satisfao daquilo que se considera suas necessidades

    bs SINGER

    utilizado nesta tese como uma situao social, algo que pode ser considerado transitrio, diferentemente de

    . 9 Para este texto, que est disponvel em arquivo digital e no apresenta paginao especfica, os

    nmeros de pginas mencionados correspondem paginao do prprio arquivo.

  • 18

    condies de vida de populaes em diferentes territrios dificulta o entendimento e a

    aceitao do referido conceito no meio cientfico, o qual passa a ser visto por outros estudiosos

    como demasiadamente impreciso e, portanto, desnecessrio. As principais vertentes analticas

    do conceito, bem como as crticas mais importantes a ele dirigidas, so objeto de anlise a

    seguir.

    1.1.2 O conceito de excluso social: perspectivas analticas

    De modo geral, as abordagens sobre excluso social podem ser classificadas em duas

    grandes matrizes tericas que fundamentam a anlise do fenmeno: de um lado, a perspectiva

    de base econmica, derivada da tradio anglo-saxnica, que confere maior peso

    insuficincia de recursos como condicionante central da excluso; de outro, a vertente

    psicossocial, de cariz francesa, cuja ateno volta-se especialmente para a precarizao das

    condies de vida de um indivduo ou de uma coletividade no mbito de suas relaes com a

    sociedade. Ressalta-se que estas duas perspectivas analticas no so totalmente excludentes

    entre si, admitindo-se, em grande parte das abordagens, a inter-relao entre fatores

    econmicos e psicossociais (perspectiva multidimensional do fenmeno), mesmo que com

    diferentes nveis de importncia atribudos a cada um.

    Um primeiro e importante aporte comparativo entre estas duas vertentes pode ser

    realizado examinando-se diferentes entendimentos sobre a abrangncia temtica da excluso

    social e suas relaes com a pobreza. De acordo com Room (1995), a tradio britnica

    prioriza os aspectos distributivos na anlise da situao dos indivduos e grupos menos

    favorecidos, o que, segundo Guimares et al. (2002), faz com que esta conceba o fenmeno da

    excluso social em uma acepo mais reducionista, isto , estreitamente vinculada noo de

    desigualdade na distribuio de recursos. Ainda que essas concepes de excluso social

    admitam a multidimensionalidade e a dinamicidade inerentes a tal processo, elas ainda o

    entendem como produto da pobreza.

    Diferentemente dessa perspectiva, na tradio francesa a qual acabou exercendo

    maior influncia sobre as concepes de excluso desenvolvidas no Brasil a excluso social

    vista como um fenmeno mais abrangente do que a pobreza, pois aquela envolveria

  • 19

    elementos tnicos e culturais como o preconceito e a estigmatizao de minorias, que vo

    alm de questes vinculadas a fatores de ordem estritamente econmica. A acepo de

    Xiberras (1996) ilustra bem este outro entendimento. Esta autora argumenta que a excluso

    social, alm de remeter submisso de um indivduo ou grupo social insuficincia de renda

    e oportunidades, tambm est associada ocorrncia de processos de diferenciao vinculados

    a valores e representaes sociais que definem o que considerado positivo ou negativo em

    uma dada sociedade. Assim, a ttulo de exemplo, cabe pensar no caso de certas populaes

    negras (ou afrodescendentes) que

    absolutamente um fator negativo, uma condio que deva ser superada para que haja incluso,

    e sim porque aquelas so vtimas de concepes e prticas sociais discriminatrias constitudas

    no transcorrer da histria.

    Outro expoente da produo sobre excluso social que pode ser situado dentro da

    vertente psicossocial e cuja abordagem teve grande divulgao, o socilogo Serge Paugam,

    busca vincular as dimenses econmica e psicossocial do fenmeno ao associar a precarizao

    da vida econmica de indivduos e famlias, atingidas pela reestruturao produtiva, ao

    agravamento de sua da perda de vnculos sociais. Prope o

    conceito de desqualificao social para abarcar a evoluo do processo de excluso social a

    partir das relaes entre insero laboral, liames sociais e proteo estatal no mundo

    desenvolvido.

    Para Paugam (2006, p. 68), com o [...] movimento de expulso gradativa, para fora

    avano do

    desemprego e a fragilizao de mecanismos estatais de assistncia social, h uma tendncia de

    enfraquecimento e ruptura de vnculos familiares e comunitrios devido aos estigmas sociais

    gerados com o empobrecimento e correspondente perca de status. esta situao de privao

    o autor

    que desencadeia o processo de excluso social:

    resto da sociedade, que gera uma angstia coletiva, j que um nmero crescente de

    -se excludos, pois as

    solidariedades familiares e as possibilidades de participao na economia informal,

    que permitem amortecer o efeito do desemprego nas regies menos desenvolvidas

  • 20

    [...] revelam-se mais fracas e mais desorganizadas. Nesse sentido, a dependncia em

    relao s instituies sociais muito mais evidente nas camadas mais numerosas da

    populao (idem, p. 71-72).

    A perspectiva de Paugam sugere, portanto, que a destruio de laos coesivos na

    sociedade apresenta-se como um dos mais importantes ncleos da excluso. A carncia de

    recursos materiais fundamental, mas esta situao, uma novidade para alguns segmentos

    populacionais dos pases centrais, seria complementada e at mesmo reforada pela perda

    do senso de pertena, de modo que tais populaes sentir-se-iam abandonadas por todos e

    incapacitadas de reagir contra a situao social desfavorvel, principalmente pelo declnio do

    Estado do bem estar social.

    Mais do que sintetizar as diferentes interpretaes do conceito de excluso social

    que apresentam outras diversas variaes dentro de cada uma das vertentes analticas

    apontadas , as concepes apresentadas at o momento indicam que h certo consenso de que

    o conceito busca, grosso modo, abarcar as condies objetivas e subjetivas das desigualdades.

    A multidimensionalidade seria, assim, uma das principais caractersticas da excluso social.

    Isto , o fenmeno da excluso pode estar associado a vrios tipos de privaes e carncias,

    mais ou menos relacionadas entre si. E se por um lado esta caracterstica confere certa

    impreciso ao conceito e identificao e delimitao das condicionantes do fenmeno que

    representa, por outro o aspecto que mais o diferencia de outros fenmenos sociais destinados

    a explicar a precariedade de condies de vida, caso do prprio conceito de pobreza.

    Ademais, a multidimensionalidade apontada por alguns autores como Alfredo

    Costa (1998), por exemplo como sendo o aspecto terico-metodolgico mais importante do

    conceito de excluso social, por possibilitar o exame de vrios aspectos que impactam

    negativamente sobre as condies de vida. Na acepo deste autor, isso se deve ao fato de que

    indivduos e grupos necessitam de um conjunto variado de elementos

    para terem boas condies de vida, bem como para

    o exerccio pleno da cidadania. Segundo esta abordagem, a excluso social se configura,

    portanto, a partir de restries no acesso a sistemas sociais bsicos, os quais podem ser

    agrupados em cinco domnios:

  • 21

    a) Social: que remete aos agrupamentos de pessoas (grupos e comunidades) e conjuntos

    de relaes (afetivas, profissionais etc.) nos quais o indivduo ou a famlia se

    encontram inseridos;

    b) Econmico: referente aos mecanismos geradores de recursos necessrios para a vida de

    pessoas e famlias (mercado de trabalho, sistema de assistncia e seguridade social,

    mercado de bens e servios e o sistema de poupanas);

    c) Institucional: abrange a oferta de servios pblicos como sade, educao, habitao

    popular, alm de instituies relacionadas aos direitos cvicos e polticos do cidado

    (acesso justia, instncias de participao poltica);

    d) Referncias simblicas: domnio diretamente relacionado dimenso subjetiva da

    excluso social, diz respeito, no dizer do autor, [...] perdas

    que o excludo sofre, e que se agravam com a permanncia na situao de excluso, no

    campo das referncias: perda de identidade social, de auto-estima, de auto-confiana,

    de perspectivas de futuro, de capacidade de iniciativa, de motivaes, do sentido de

    pertena so (idem, p. 17); e,

    e) Territorial: remete diretamente relao da excluso social com as caractersticas

    espaciais, ou seja, influncia da organizao espacial sobre a configurao e acesso

    social aos demais domnios.10

    Em nosso entendimento,

    Costa (1998), consiste em um enfoque integrador que traz elementos importantes para a

    compreenso das inter-relaes que compem o fenmeno, abrindo caminho para uma melhor

    delimitao do conceito sem perder de vista a perspectiva multidimensional que o mesmo

    encerra. O referido autor admite que as formas de excluso podem ser bastante diferentes entre

    bsicos. Uma pessoa ou famlia pode ser excluda de alguns daqueles sistemas sociais, embora

    idem, p. 18). Assim, em sua acepo, seria

    possvel e indicado falar-se em excluses sociais , no plural, para se referir aos variados

    modos possveis de privao e subalternidade.

    10

    As relaes entre espao e excluso social sero foco de anlise especfica no subcaptulo 1.2 e no

    captulo 2.

  • 22

    importante ressaltar ainda que a perspectiva multidimensional da excluso social

    apontada como um importante fundamento terico-metodolgico para a anlise geogrfica das

    desigualdades sociais. Como avalizam Vieira et al. (2010, p. 44),

    excludentes constituem-se a partir de uma srie de eventos, episdios e intencionalidades.

    possvel conhecer essas circunstncias excludentes em seus contextos. Faz-lo implica

    considerarmos a hibridez do espao geogrfico, distinguindo os [seus] vetores os

    agentes sociais, as aes e as intencionalidades envolvidos na produo das desigualdades

    socioespaciais e formas de excluso social.

    Conferimos, desse modo, um valor que muitos autores apresentam como

    caracterstica limitada do conceito de excluso social. A sua multidimensionalidade

    em si uma capacidade de transitar por diversas escalas e estabelecer correlaes a

    partir de dimenses at ento distantes (idem, ibidem).

    Em semelhante via de anlise, Guimares et al. (2002) ressaltam que o conceito de

    excluso social apresenta vantagens para a realizao de anlises de sociedades

    [...] tem

    a capacidade de jogar luz sobre as facetas mltiplas das situaes de desigualdade,

    vulnerabilidade e risco a dimenso econmica, a social, a poltica e a intersubjetiva ou

    simblica (p. 5). Para os autores, tal caracterstica favorece a

    anlise da dinmica das desigualdades de modo mais abrangente, concebendo-as a partir de

    diferentes dimenses.

    No obstante as vantagens, a multiplicidade de enfoques sobre a excluso social e a

    grande amplitude de temas e variveis que so associados ao conceito, fazem dele alvo de

    diversas crticas. Dentre as mais conhecidas esto as de Jos de Souza Martins (1997; 2002),

    ou [...] coisificao

    conceitual, [...] tr MARTINS,

    1997, p. 11). Este socilogo manifesta a preocupao com o risco de uma interpretao da ideia

    ocultar o carter dialtico das desigualdades

    sociais11

    , transformando-se os processos esquecendo-se de

    11

    O socilogo francs Robert Castel, outro renomado estudioso da questo social, realiza crtica

    CASTEL, 1997), apesar de ele prprio, em outro trabalho (CASTEL, 1999),

    utilizar o termo para designar uma fase de um processo maior a marginalizao onde os vnculos societais

  • 23

    que, a rigor, ningum est estritamente excludo na sociedade capitalista, e sim, de certo

    modo, includo, participando da reproduo social capitalista, por vezes de modo perverso e

    ela, ora lutando contra a mesma:

    [...] rigorosamente falando, no existe excluso: existe contradio, existem vtimas

    de processos sociais, polticos e econmicos excludentes; existe o conflito pelo qual

    a vtima dos processos excludentes proclama seu inconformismo [...] sua esperana,

    sua fora reivindicativa e sua reivindicao corrosiva. Essas reaes, porque no se

    trata estritamente de excluso, no se do fora dos sistemas econmicos e dos

    sistemas de poder. Elas [...] fazem parte deles ainda que os negando. As reaes no

    ocorrem de fora para dentro; elas ocorrem no interior da realidade problemtica,

    idem, p. 14).

    De um modo ou de outro, todo mundo est inserido no circuito reprodutivo das

    atividades econmicas engendradas pelo modo de produo hegemnico vigente, e essa

    insero, para a maioria da humanidade, se d por meio de insuficincias e de privaes que se

    desdobram para alm da dimenso econmica (SAWAIA, 2006

    a mesma sociedade que inclui e integra, que cria formas tambm desumanas de participao,

    MARTINS, 2002, p. 11).

    Este um princpio elementar que fundamenta as desigualdades sociais, sendo estas, por sua

    vez, condio para a sua prpria reproduo.

    Outra crtica de Martins, digna de nota, incide sobre o fatalismo presente em

    discursos sobre a excluso social, em que vtima por no usufruir

    dos padres de incluso preconizados pela prpria sociedade excludente, a sociedade do

    consumo. Na viso do autor, nesta condio:

    Excludo apenas um rtulo abstrato, que no responde a nenhum sujeito de

    destino: no h possibilidade histrica nem destino histrico nas pessoas e nos

    grupos sociais submetidos a essa rotulao. Excludo excluso so construes,

    projees de um modo de ver prprio de quem se sente e se julga participante dos

    benefcios da sociedade em que vive e que, por isso, julga que os diferentes no esto

    tendo acesso aos meios e recursos a que ele tem acesso. (idem, p. 31)

    Esta ltima crtica de Martins pe em foco outro debate, o da incluso: como vista e a

    partir de quais meios deve ser promovida. E neste contexto, Pedro Demo, outro crtico da

    mantidos pelos indivduos so rompidos ou duramente fragilizados por conta do que chama de desafiliao, isto

    , a conjugao entre a desproteo estatal e um longo perodo de no insero no mercado formal de trabalho.

  • 24

    noo de excluso, chama a ateno para a importncia permanente do mercado de trabalho e

    das fontes de renda para a promoo da incluso em bases capitalistas, ao lado da participao

    poltica da sociedade que, em nome da cidadania, deve exigi-la:

    [...] embora a excluso esteja estreitamente ligada solido e desagregao social,

    o emprego continua preponderante para definir a condio do indivduo [...] No

    capitalismo, a incluso pela via do mercado ainda a mais garantida e estrutural,

    ainda que este efeito no provenha do mercado, mas sobretudo da cidadania capaz de

    se impor ao mercado (DEMO, 2002, p. 20 e 36).

    Para concluir esta seo, cabe realizar uma definio-sntese do conceito de excluso

    social tendo em vista a perspectiva terica adotada nesta tese. O conceito se refere a um

    processo social, diferentemente de outros dois fenmenos ligados excluso, a pobreza e a

    desigualdade, que remetem a situaes, estados momentneos (mesmo que de longa durao).

    Tal processo em si complexo e multifacetado, configurado a partir da conjugao de

    dimenses materiais e subjetivas, envolvendo o indivduo e suas relaes com a sociedade.

    Traduz as contradies da sociedade capitalista de classes, de modo que, como bem afirma

    Sawaia (2006, p. 9),

    E

    finalmente, eminentemente dialtico, onde a excluso social s existe conjuntamente e em

    relao ao seu contraponto, a incluso social.

    Pode se afirmar que a anlise do processo de excluso social alcana maior

    concretude se ; ou seja, se

    a ateno se volta para os referenciais da excluso. Assim, com vistas a analisar a dinmica de

    desigualdades socioespaciais no espao urbano, utilizar-se- o termo excluso/incluso para

    designar o processo social amplo do qual a excluso parte produtor de desigualdades

    socioespaciais. Em outras palavras, para os objetivos desta tese, as desigualdades sociais e

    seus reflexos sobre o espao urbano so apreendidos na perspectiva de graus diferenciados de

    excluso e incluso social.12

    12

    Doravante, para fins de organizao do texto, sero utilizadas as expresses excluso social para

    remeter aos processos e situaes de privao e/ou carncia, e excluso/incluso social para se referir ao processo

    social produtor de desigualdades sociais, embora tal separao no exista na realidade.

  • 25

    No prximo item so apresentadas reflexes sobre a importncia do conceito de

    excluso social para a anlise geogrfica do espao urbano, dentro da perspectiva terica da

    excluso/incluso.

    1.2 EXCLUSO/INCLUSO SOCIAL: PARA UMA ABORDAGEM GEOGRFICA DAS DESIGUALDADES

    SOCIOESPACIAIS

    O conceito de excluso social, entendido numa perspectiva relacional (em associao

    incluso social), fornece importantes subsdios terico-metodolgicos para a anlise das

    desigualdades socioespaciais. Sendo o espao geogrfico uma instncia social, cuja produo

    , ao mesmo tempo, resultado e condicionante das relaes sociais13

    , as assimetrias inerentes a

    uma sociedade de classes tero implicaes importantes na configurao espacial, a qual ser

    no s desigual, como tambm hierarquizada em termos sociais, como aponta Bourdieu (1997,

    p. 160):

    No h espao, em uma sociedade hierarquizada, que no seja hierarquizado e que

    no exprima as hierarquias e as distncias sociais [...]. A posio de um agente no

    espao social se exprime no lugar do espao fsico em que est situado.

    Em convergncia com esta acepo, Melazzo e Guimares (2010, p. 25) salientam

    que os lugares, sendo relacionados hierarquicamente entre si, [...] reforam tambm as

    posies e situaes dos diferentes agentes sociais, na medida em que o uso contnuo desse

    A importncia geogrfica da anlise da excluso social reside, portanto, na

    organizao espacial14

    desigual enquanto elemento ativo na produo de assimetrias sociais e

    13

    Como definio de espao geogrfico, partir-se- da acepo de Milton Santos (2002) para quem o

    espao composto de sistemas de objetos espaciais e tambm de sistemas de aes sociais, sistemas estes que se

    entrelaam constituindo um conjunto solidrio, inseparvel e contraditrio. Os diferentes sistemas se influenciam

    mutuamente, condicionando, num movimento nico, a organizao espacial e a vida social. 14

    Utilizar-se-

    referir ao espao social produzido e estruturado, seguindo ainda a ideia de que todo espao social apresenta certa

    ordem, ainda que catica do ponto de vista de determinados segmentos sociais. Embora seja sabido que

    a diferentes correntes do pensamento geogrfico, no est no escopo do presente trabalho apresentar essa

  • 26

    situaes de precariedade.

    que so, em primeiro lugar, desigualdades territoriais, porque derivam do lugar onde cada qual

    O espao , assim, [...] fator dinmico no processo de excluso/incluso social

    na medida em que expressa a distribuio dos bens civilizatrios direcionados qualidade de

    (SPOSATI, 2003, p. 16).

    De acordo com Costa (1998), o reconhecimento da dimenso espacial no estudo da

    excluso social a qual denomina relativamente recente

    [...] e tem a ver com o facto de existirem certas situaes em que a excluso diz respeito no

    apenas s pessoas e famlias, mas a todo um territrio (p. 16). Tomada em escalas regional e

    nacional, a excluso social se traduz espacialmente em reas desprivilegiadas no

    desenvolvimento socioeconmico. Trata-se de pores do territrio nacional insuficientemente

    atendidas quanto a atividades econmicas geradoras de emprego e renda e de infraestrutura

    tcnica e social necessrias a uma boa qualidade de vida e manuteno da populao nestes

    espaos (COSTA, 1998; CAMPOS et al., 2003).

    Por sua vez, em escala intraurbana, so exemplos disso determinadas reas

    residenciais de periferias pobres, que apresentam grande precariedade quanto habitabilidade,

    so parcamente atendidas por servios pblicos e com localizaes distantes dos principais

    centros de trabalho e consumo. o caso tambm de favelas e loteamentos clandestinos, onde a

    precariedades como as relatadas, acrescenta-se o sentimento de insegurana que atinge a

    populao habitante, proveniente da situao jurdica irregular quanto propriedade da rea

    ocupada (GRAZIA; LEO JNIOR, 2002).

    Ademais, cabe ressaltar ainda que a organizao espacial desigual tambm possui

    uma dimenso simblica que incide sobre a esfera psicossocial, em que as situaes de

    pobreza e precariedade vigentes em determinados espaos residenciais contribuem para a

    fragilizao de vnculos de indivduos e famlias com a sociedade. o que ocorre com

    moradores de determinados bairros que, no imaginrio social, so vistos como sendo

    intrinsecamente negativos: locais

    a expresso organizao

    espacial possui, a nosso ver, vrios sinnimos: estrutura territorial, configurao espacial, formao espacial,

    arranjo espacial, espao geogrfico, espao social, espao socialmente produzido ou, simplesmente, espao. Dizer

    que cada uma delas corresponde a uma especfica viso de mundo e, ainda, que uma melhor que a outra

    constitui, a nosso ver, falsas assertivas, de natureza form idem, p. 55).

  • 27

    No raro, as populaes

    residentes nessas localizaes sofrem os estigmas que so atribudos aos espaos onde

    residem, o que interfere em outras esferas da sociedade, como, por exemplo, na busca por

    emprego e na integrao com outros segmentos sociais, tal como relatam, por exemplo,

    Giacomini, Hayashi e Pinheiro (1987) e Souza (2003).

    Em todos estes casos, segundo Costa (1998), legtimo falar em excluso social pela

    via territorial, pois

    [...] as condies de vida das famlias dificilmente podem melhorar se no se

    tomarem medidas que promovam o progresso de todo o espao, nos domnios da

    habitao, dos equipamentos sociais, das acessibilidades, e at de actividades

    econmicas. uma situao em que todo o territrio est excludo da cidade (no caso

    de um bairro) ou do pas (caso do concelho [ou da micro/mesorregio, no caso

    brasileiro]) a que pertence (p. 16).

    A anlise das desigualdades socioespaciais urbanas parte, portanto, da identificao

    dos processos de excluso social em sua relao com a organizao espacial. Segundo

    Melazzo e Guimares (2010), as imbricaes entre as excluses sociais e as dinmicas

    espaciais urbanas podem ser apreendidas por diferentes vias de anlise, desde as que focam na

    definio dos locais onde as condies de excluso se materializam, at aquelas que buscam,

    na prpria produo dos territrios urbanos, dimenses objetivas e subjetivas das trajetrias

    das excluses sociais. Elucidar essas imbricaes significa estes gegrafos,

    buscar os vnculos entre territrio e desigualdades ou, colocado de uma maneira mais direta,

    reconhecer que a produo territorial como produo social processo no desprezvel na

    diferenciao social (idem, p. 23). E neste contexto que a anlise geogrfica das

    desigualdades por meio do conceito ganha concretude a partir da compreenso do processo de

    excluso/incluso social, pois:

    [...] o territrio produzido e consumido a partir das relaes sociais s poder ser

    plenamente compreendido se, em sua elaborao, for includo o fundamento dos

    processos sociais: as relaes de excluso e incluso que permanentemente so

    repostas, reelaboradas e retrabalhadas como relaes de conflito e poder entre classes

    sociais antagnicas (idem, p. 31, grifo meu).

  • 28

    Proposto pela assistente social Aldaza Sposati (1996), o conceito de

    excluso/incluso, como foi comentado, parte da concepo de que ao se falar de excluso

    social enquanto processos de privao e precarizao das condies de vida, remete-se, ao

    mesmo tempo e necessariamente, incluso social, uma vez que essa precarizao ou privao

    ser sempre relativa, tendo uma determinada condio social mnima desejvel como

    referencial.15

    E nesse princpio reside outra importante vantagem do conceito para a anlise

    geogrfica, diretamente alvo de interesse nesta tese, que o fato de possibilitar uma

    vinculao mais simples entre duas dimenses da pesquisa sobre desigualdades socioespaciais.

    De um lado, o que ser chamado de universo terico-conceitual, isto , a compreenso, em

    bases tericas, das situaes de incluso e de excluso social como indissociveis entre si,

    componentes dialticos de um mesmo processo produtor de desigualdades sociais. De outro, o

    universo de representao, que correspondente s possibilidade