As Geografias Medievais

OSWALDO/GEOGRAFIAMEDIEVAIS.DOC

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PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE MINAS GERAIS Ps-graduao em Geografia - Tratamento da Informao Espacial

AS GEOGRAFIAS MEDIEVAIS*

Durante o quinto sculo depois de Cristo, o Mundo Romano, com seu sistema de administrao centralizada, desintegrou -se. Com os gregos, os horizontes geogrficos (os limites da rea que era conhecida ao menos pelos intelectuais e mercadores) tinham se estendido desde o rio Indus at o Atlntico e desde as estepes russas, ao norte do mar Negro, at Etipia. Com os romanos, os horizontes geogrficos incluram toda a vasta rea colocada sob a jurisdio do Imprio. Mas, ento, seus horizontes geogrficos se fecharam novamente at que muitos daqueles que viveram na Europa Crist aps o sculo quinto fossem realmente familiarizados apenas com seus arredores imediatos. Os mundos para alm desses arredores eram povoados de criaturas fantsticas, imaginaes no confirmadas pelos fatos. Apenas nos refgios dos mosteiros, as chamas bruxuleantes da vida intelectual eram preservadas. Mas esta no uma imagem completa do perodo medieval, que se estendeu do quinto ao dcimo quinto sculo d.C.. Na Europa Crist, embora o termo geografia tenha desaparecido do vocabulrio comum, o estudo e a redao de textos geogrficos no cessaram inteiramente (...). Pouco a pouco, a curiosidade concernente a outros mundos possveis, que poderiam estar alm do horizonte, levou algumas pessoas aventureiras a viajarem e a fazerem exploraes; e as Cruzadas, organizadas para tomar a Terra Santa aos muulmanos, levaram muitas pessoas para fora de suas localidades e, em seguida, trouxeram essas pessoas de volta para falar dos estranhos povos e paisagens que tinham visto. Do sculo XIII em diante, houve extensas viagens de missionrios e mercadores que fizeram todo o caminho at China. E, neste perodo, uma pergunta deve ser feita: quem estava descobrindo quem ? Embora os horizontes geogrficos tenham-se fechado em torno de muitas comunidades da Europa Crist, este foi um perodo de horizontes amplamente abertos para os muulmanos. No apenas contriburam para isso as conquistas islmicas, que comearam com as conquistas da Palestina e da Sria em 632, conduziram os seguidores do Isl para o leste (na direo das ilhas da sia do Sudeste), para o oeste (na direo da Europa e o Atlntico) e para o sul (atravs do Saara), mas, tambm, os missionrios e comerciantes, que viajavam para alm do territrio controlado pelos muulmanos. Alm disso, os pensadores muulmanos, nos grandes centros escolares, estavam fortemente engajados na traduo dos trabalhos dos gregos para a lngua rabe. Foi atravs do rabe que a cultura grega tornou-se conhecida no mundo latino dos cristos. __________________

(*) Traduzido e adaptado pelo Prof. Oswaldo Bueno Amorim Filho de: JAMES P.E. and MARTIN G.J.: All Possible Worlds A History of Geographical Ideas. New York, John Wiley & Sons, 1981, 508 p. (p. 40-62)


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Enquanto isso, no extremo norte da Europa, os noruegueses estavam navegando no proceloso Atlntico Norte, na direo da Islndia, Groenlndia e do continente da Amrica do Norte. Da maior importncia foram os feitos dos chineses. Na verdade, a Europa e a ndia foram descobertas pelos missionrios chineses bem antes dos missionrios cristos terem alcanado o Oriente. Segundo Joseph NEEDHAM (1963:117), no perodo entre os sculos II a.C. e XV d.C. , a cultura chinesa foi a mais eficiente do mundo na aplicao do conhecimento da natureza a finalidades utilitrias. O estudo da geografia na China, como parte de uma tradio escolar mais abrangente, estava bem avanada em relao a tudo que se conhecia na Europa crist da poca. A GEOGRAFIA NO MUNDO CRISTO Os pensadores que se reuniram nos mosteiros da Europa crist no estavam estudando a Terra enquanto observadores ou pesquisadores. Ao contrrio, eles eram compiladores de informaes provenientes de fontes documentais e de comentaristas, cujo esforo primordial era o de conciliar as idias geogrficas registradas em documentos com a autoridade das Escrituras, especialmente no Livro de Gnesis. No incio do perodo medieval, os pensadores europeus s podiam trabalhar com documentos em latim, e apenas na parte mais tardia desse perodo, alguns deles conseguiram dominar a lngua rabe. Os materiais gregos permaneciam inteiramente desconhecidos, com exceo daquele traduzidos (...) Gegrafos romanos, como Ponponius MELA e PLNIO o Velho, constituam fontes largamente usadas. Ambos (...) compilaram seus livros de fontes gregas e, atravs deles, os pensadores medievais tinham um acesso de segunda mo e muito incompleto aos conceitos gregos (KIMBLE, 1938). Dois pensadores medievais Martianus CAPELLA e Ambrosius Theodosius MACROBIUS forneceram tradues de PLATO desde o sculo V a.C.. Por meio dos escritos de CAPELLA e MACROBIUS, os pensadores medievais cristos tinham acesso ao conceito de uma Terra esfrica. Embora houvesse muitos que, como COSMAS, concebessem o mundo como um disco em vez de uma esfera, havia sempre alguns intelectuais que aceitavam a idia de uma Terra esfrica, como havia sido demonstrado acima de qualquer dvida. PTOLOMEU tornou-se a maior autoridade do mundo medieval cristo com relao a matrias pertinentes astrologia e astronomia. Seu trabalho que tratou do efeito dos corpos celestes sobre as questes humanas o Quadripartitum foi traduzido do rabe para o latim por PLATO DE TIVOLI em 1138, e seu Almagesto o grande trabalho sobre astronomia tornou-se disponvel em latim graas a GRARD DE CREMONA, em 1175 (KIMBLE, 1938: 75-76). Como resultado, o modelo de PTOLOMEU sobre o universo celeste geocntrico permaneceu como aceitvel por muitos sculos, e muitas das idias ainda hoje usadas pelos astrlogos tm sua origem em PTOLOMEU. As idias geogrficas de ARISTTELES tornaram-se disponveis na Europa crist por meio de uma traduo do rabe, no sculo XII. O primeiro escritor medieval a fazer uso de ARISTTELES foi ALBERTO MAGNO (TILLMAN, 1971), cujo livro sobre a natureza dos lugares combinava astrologia com determinismo ambiental. A teoria grega, que equacionava habitabilidade com a latitude, ficou fortemente implantada nos escritos medievais. ALBERTO chegou a ir mais longe que os


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prprios gregos: deles ele aceitou a idia de que as pessoas que viviam muito prximo do limite da Terra habitvel ficavam negras mas, ento, ALBERTO argumentou que se as pessoas de pele escura de mudassem para as latitudes temperadas, eles se tornariam gradualmente brancas (GLACKEN, 1967: 265-271). (...) Quando os pensadores medievais procuravam explicaes para eventos naturais, os tipos de eventos de que tratavam eram espetaculares, tais como os terremotos, as erupes vulcnicas, ou as enchentes. Nenhuma das hipteses dos gregos que foram apresentadas em latim, eram relacionadas com processos naturais mais lentos e menos bvios, tais como a eroso das montanhas ou a construo dos deltas e, na ausncia de uma teoria de fundo, tais processos mais lentos no eram percebidos. Outra caracterstica deste perodo na Europa crist foi a deteriorao do mapeamento. Os outrora acurados delineamentos das linhas costeiras melhor conhecidas foram perdidos e, em vez disso, os mapas se tornaram pura fantasia. Esse foi o tempo dos assim chamados mapas em T - O. Nesses mapas, o mundo habitado era representado por uma figura circular cercada pelo oceano. A figura era orientada para o leste (WRIGHT, 1925: 66-68). No meio da rea terrestre, estava um arranjo sob a forma de um T para representar os corpos aquticos. A haste do T representava o mediterrneo. Os braos do T representavam, de um lado, os mares Egeu e Negro e, de outro, o rio Nilo e o mar Vermelho. As trs divises Europa, sia e frica que apareciam, respectivamente, nos trs lados do grande T, eram aceitas como padres. O centro do T, era Jerusalm. No extremo leste, alm do limite do mundo habitado, estava o paraso. OS VIAJANTES CRISTOS MEDIEVAIS Para alm dos mosteiros, houve cristos que viajaram e fizeram observaes, mas que no tinham conhecimento da existncia de conceitos tericos sobre a natureza da Terra enquanto morada do homem. Em 326 d. C., HELENA, a me do Imperador CONSTANTINO, fez uma das primeiras peregrinaes de Roma Terra Santa. SLVIA DA AQUITNIA, uma senhora romana, foi uma das primeiras mulheres gegrafas. Ela viajou por terra at Jerusalm e, da, ao Egito, Arbia e Mesopotmia; por fim, ela escreveu um relato de suas viagens. Na medida que o nmero de peregrinos aumentava, os itinerrios eram descritos para gui-los nos caminhos para Jerusalm. Por volta do sculo XI, a passagem de peregrinos por terra, atravs do que hoje a Turquia e a Sria, tinha se tornado cada vez mais difcil e perigosa. Como resultado, os cristos da Europa organizaram uma srie de invases militares da Terra Santa. Entre 1096 e 1270, houve oito cruzadas, cada uma delas com o objetivo de recapturar o Santo Sepulcro e Jerusalm aos muulmanos. Algumas expedies foram por mar, outras por terra; uma cruzada chegou a ter sucesso na ocupao de Jerusalm por um curto perodo de tempo, at que os muulmanos expulsassem os invasores. Aps as oito cruzadas formais, houve outras invases dos territrios controlados pelos muulmanos, uma das quais saqueou Alexandria em 1365 e incendiou a famosa biblioteca, onde ERATSTENES e outros gegrafos gregos tinham trabalhado.


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As cruzadas tiveram um grande impacto no apenas na Europa crist mas, tambm, nos muulmanos. De quase todas as partes da Europa, homens foram recrutados para a guerra contra os infiis e fizeram a viagem para a Terra Santa. Quando retornaram Europa, eles trouxeram no somente novos tipos de equipamentos como os moinhos, posteriormente adotados pelos holandeses para bombear gua mas, tambm, estrias excitantes sobre povos e paisagens estranhos, localizados alm dos horizontes gegrafos dos europeus comuns. O resultado foi um grande estmulo ao interesse pela descrio de lugares no familiares, que so ainda preservados nas classificaes de nossas bibliotecas com o titulo descries geogrficas populares e viagens. Para pessoas que no conheciam nada da teoria geogrfica, a descrio popular de viagens tornou-se, na essncia, geografia. Enquanto isso, os muulmanos que, no inicio, eram notavelmente tolerantes com as pessoas de outras crenas, reagiam violncia dos cruzados, tornando-se agressivamente intolerantes em relao aos no-crentes. Um dos resultados disso foi o fechamento das rotas atravs da frica do Norte/sia do Sudoeste, por meio das quais os mercadores de Veneza e Gnova poderiam fazer contato com os comerciantes do Oriente. MARCO POLO Ainda assim, apesar do bloqueio das rotas martimas do leste, a Europa crist estabeleceu, de fato, contato com os centros da cultura chinesa seguindo, para isso, uma rota situada ao norte das principais fortalezas muulmanas. A rota era seguida tanto pelos missionrios enviados por Roma, quanto pelos mercadores. Os mais clebres desses viajantes foram os irmos POLO e o filho de um deles, Marco POLO. Em 1271, quando Marco POLO tinha 17 anos, ele, acompanhando seu pai e seu tio, comeou uma longa viagem que durou de 1260 a 1269; e o grande KHAN, o imperador mongol da China, os havia convidado a voltarem. A viagem de retorno China durou quatros anos. MARCO serviu ao KHAN como embaixador em varias partes da China e em vrias outras funes, o que lhe permitiu alcanar um conhecimento ntimo da cultura chinesa. Na verdade, os POLOS foram to teis ao KHAN, que ele relutou em deix-los partir. Finalmente, em 1292, o KHAN forneceu aos POLOS uma frota de quatorze navios grandes, alguns to grandes que necessitavam de uma tripulao de mais de cem marinheiros. Assim, ao lado dos POLOS, havia cerca de 600 passageiros. A frota partiu de um porto no sul da China, provavelmente o atual Lungchi, e gastou trs meses para alcanar Java e Sumatra, onde ficou retida por cinco meses. A expedio continuou, ento, para o sul da ndia e o Ceilo e, a partir da, ao longo da costa, alcanou o antigo porto de Hormuz, no Golfo Prsico. Marco POLO, enquanto foi prisioneiro em Gnova alguns anos mais tarde, ditou seu livro de viagens a um colega de priso. Suas descries da vida na China e dos perigos encontrados em suas viagens eram to vvidas que, muitas vezes, foram consideradas como produtos de uma imaginao exagerada. Alm das descries dos lugares que ele realmente visitou, ele incluiu relatrios sobre Cipango (Japo) e a ilha de Madagascar, a qual, dizia ele, situava-se prximo do limite sul da parte habitvel da Terra. importante observar, entretanto, que Marco POLO no tinha uma formao de gegrafo, desconhecendo talvez at mesmo a existncia de tal campo de conhecimento. (...) Por isso, ele no faz comentrios sobre idias e princpios geogrficos. Mas, atualmente, seu livro considerado como um dos grandes


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registros da explorao geogrfica de todos os tempos. (...) COLOMBO tinha uma copia desse livro, marcada com anotaes de seu prprio punho. NAVEGAO E CARTOGRAFIA (...) Durante este perodo, houve tambm vrios avanos importantes na arte da navegao e no conhecimento martimo. Algumas dessas novas habilidades foram desenvolvidas principalmente na Universidade de Palermo, na Siclia, onde o rei normando ROGER II e o gegrafo muulmano EDRISI comeavam a desenvolver as tcnicas de navegao distante das regies costeiras. A primeira meno ao instrumento chamado bssola, na Europa crist, apareceu nos escritos de Alexandre NECKAM, por volta de 1187. A referncia mais antiga bssola entre os rabes foi feita em 1230. (...) A bssola tinha, certamente, um uso generalizado no sculo XV e tinha se tornado indispensvel s viagens longas e distantes das regies costeiras. Nesse perodo, igualmente, foi desenvolvido o astrolbio, que entrou em uso como um auxilio navegao, ao tornar possvel uma fixao mais acurada da altitude da estrela polar (KIMBLE, 1938: 223-225). A parte final do sculo XIV testemunhou tambm um notvel desenvolvimento na arte de mapear. As cartas de Portulanos, cuja primeira tinha aparecido em torno de 1300, tornaram-se um equipamento standard para capites dos mares. O termo Portulano queria dizer fcil de manusear ou facilmente disponvel. Em vez de uma grade de latitudes e longitudes, as cartas de Portulanos eram cobertas por uma rede de linhas parcialmente superpostas, irradiando a partir de vrios centros em diferentes partes da carta. Essas linhas radiais correspondem as oito ou dezesseis direes principais da bssola, cada uma coincidindo com uma direo do vento (BAGROW and SKELTON, 1964:62-66). Os marinheiros traavam rotas baseadas na bssola, ao longo dessas linhas (TAYLOR, 1957: 112-114). Com essas linhas indicando as direes a partir de pontos-chave, as linhas costeiras, especialmente em torno do Mediterrneo, eram desenhadas com uma preciso considervel. Com o uso de uma bssola magntica, tornou-se usual desenhar mapas, com o norte na parte superior. Quando um mapa era colocado no cho, de modo que as direes do mapa correspondessem quelas da bssola, dizia-se que o mapa estava orientado. No ano de 800, CARLOS MAGNO, buscando eliminar a confuso sobre as direes nos mapas, decretou que, daquela poca em diante, s haveriam na Frana quatro direes cardinais: norte, leste, sul e oeste. O norte era indicado com a flor de Liz, como ainda hoje. O famoso Mapa Catalo do Mundo, desenhado em 1375, incorpora material de numerosas cartas de Portulano. Ele incluiu tambm a costa oeste da frica, at o sul do cabo Bojador (localizado no que atualmente o Saara Ocidental), que no havia sido ainda alcanada peles navegantes europeus. Ele mostra igualmente o leste e o sudeste da sia, com base nos relatos de MARCO POLO. Este foi o primeiro mapa a mostrar um contorno adequado do Ceilo e da pennsula da ndia (KIMBLE, 1938: 193). Mas os estudiosos nos mosteiros, que estavam ainda acumulando suas informaes de documentos escritos, tinham pouca conexo com os cartgrafos, cujas finalidades eram estritamente prticas e no tericas. Os cartgrafos trabalhavam para os mercadores e, talvez, no tivessem ainda conscincia das diferenas de opinio com relao a questes como a da habitabilidade da zona trrida ou mesmo a da prpria existncia de uma zona trrida.


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A GEOGRAFIA DO MUNDO ISLMICO Um dos eventos de primordial importncia no perodo medieval foi a expanso dos muulmanos. MAOM, o profeta que morreu em 632, foi o fundador da religio do Isl, cujos seguidores so conhecidos como muulmanos. Este povo de idioma rabe e que vivia na pennsula da Arbia dividia-se em tribos pequenas e isoladas, no possuindo nenhum sentimento de unidade. O ensinamento do profeta e o livro sagrado- o Coro-deram a essas tribos, seno uma completa unidade, pelo menos um objetivo comum. O Coro foi o primeiro livro escrito na lngua rabe. Ele ofereceu no apenas uma orientao religiosa, mas, passou tambm prescries detalhadas, relacionadas com todos os aspectos da vida como governar, como conduzir as transaes comerciais (inclusive uma proibio de pagamento de juros por emprstimos), como organizar a vida familiar, e muitos outros aspectos. O Coro descreve o mundo em detalhes, fornecendo explicaes para os fenmenos naturais, aceitas sem questionamentos por todos os verdadeiros crentes. Os seguidores do Isl envolveram-se em uma conquista do mundo alm da Arbia. Em 641, eles conquistaram a Prsia e, em 642, tomaram o controle do Egito. Os muulmanos avanaram velozmente atravs do Saara e, por volta de 732, todo o Grande Deserto estava sob o controle do Isl. Eles cruzaram a Pennsula Ibrica em direo Frana, foram derrotados na Batalha de Tours (732) e recuaram. Por cerca de nove sculos, os muulmanos governaram a maior parte da Espanha e Portugal. O domnio islmico estendeu-se para o leste, chegando ndia e, finalmente, a muitos arquiplagos da sia de Sudeste. Bagd Em 762, os muulmanos fundaram a nova cidade de Bagd, perto das runas de Babilnia e, por mais de um sculo, Bagd foi o centro do mundo intelectual. Com o patrocnio do califa HARUN AL-RACHID, iniciou-se um projeto de traduo dos trabalhos de filsofos e estudiosos gregos para a lngua rabe. O projeto continuou sob o califa AL-MAMUN (813-833), que empregou pessoas educadas e de vrias religies para fazer as tradues. (...) A partir de Bagd, portanto, uma grande quantidade de idias, das mais variadas fontes comearam a difundir-se atravs do mundo islmico. Eventualmente essas inovaes eram levadas Europa crist por meio de tradues do rabe para o latim. Entre elas estava o uso do sistema decimal em aritmtica, que tinha sido levado a Bagd pelos indianos que, por eu turno, tinham ido busca-lo entre os chineses. AL-MAMUM dirigiu os trabalhos de seus pesquisadores para recalcular a circunferncia da Terra. Para isso, eles fizeram uso do mesmo mtodo desenvolvido por ERATSTENES cerca de dez sculos atrs. Contribuio dos Muulmanos para a Climatologia e a Geomorologia Os escritos geogrficos dos rabes, no perodo de 800 a 1400, baseavam-se em uma variedade maior de fontes do aqueles dos pensadores cristos da mesma poca. Os muulmanos tinham acesso no somente s suas tradues dos gregos, mas, tambm, aos relatrios de seus prprios viajantes. Como resultado, eles tinham um conhecimento muito mais preciso do mundo do que o dos estudiosos cristos. Um dos primeiros entre os grandes viajantes rabes foi ibn HAUKAL, que gastou


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os ltimos trinta anos de sua vida de 943 a 973 visitando algumas das mais remotas partes da frica e da sia. Em sua viagem ao longo da costa leste da frica, at um ponto localizado cerca de vinte graus de latitude ao sul do equador, ele observou o fato de que pessoas em nmero considervel estavam vivendo nessas latitudes que os gregos pensavam serem inabitveis. Apesar disso, a teoria grega persistiu e continuou aparecendo sob formas diferentes, mesmo nos tempos modernos. Os pesquisadores rabes fizeram algumas observaes importantes sobre o clima. Em 921, al-BALKHI acumulou observaes sobre as caractersticas climticas, realizadas por viajantes rabes, e realizou o primeiro Atlas climtico do mundo o KITAB al-ASHKAL. Al-MASUDI, que morreu por volta de 956, tinha chegado, na direo sul, regio que hoje o Moambique, e fez uma descrio muito boa das monses. Ele descreveu a evaporao da umidade a partir das superfcies aquticas e a condensao desse vapor sob a forma de nuvens, e isto no sculo X. Em 985, al-MAQDISI ofereceu uma nova diviso do mundo em quatorze regies climticas. Ele tambm apresentou a idia de que o hemisfrio sul era composto, em sua maior parte, de oceanos abertos, enquanto que a maior proporo das terras mundiais estava no hemisfrio norte. Dois gegrafos rabes fizeram importantes observaes sobre os processos responsveis pela forma do relevo terrestre. Al-BIRUNI escreveu sua grande Geografia da ndia (Kitab al-Hind) em 103. Em seu livro, ele reconheceu o significado dos seixos rolados que ele encontrou nos depsitos aluviais ao sul dos Himalaias. Essas pedras tornam-se redondas, afirmava ele, na medida que elas eram roladas nos cursos dgua torrenciais de montanha. Alm disso, ele reconheceu que o material aluvial depositado prximo s montanhas era relativamente grosseiro em sua textura e que esse material apresentava uma textura bem mais fina quanto mais distante da montanha se encontrava. Por outro lado, ele seguia os indianos em sua crena de que as mars eram causadas pela lua. Por fim, ele inclua em suas observaes aquela segundo a qual, em direo ao Plo Sul, a noite cessaria de existir o que sugere que alguns exploradores teriam viajado ao extremo sul antes do sculo XI. O outro pensador que contribuiu para o conhecimento das formas do relevo foi AVICENNA, ou ibn-SINA, que aproveitou suas oportunidades de observar os cursos dgua de montanha no processo de aprofundamento de seus vales nas terras altas da sia central. Ele formulou a idia de que as montanhas eram constantemente rebaixadas por cursos dgua e de que os picos mais altos ocorriam onde as rochas eram especialmente resistentes eroso. Ele afirmava que as montanhas se soerguiam e eram imediatamente expostas a esse processo de rebaixamento, um processo que avanava lentamente, mas constantemente. Isto se deu oito sculos antes que James HUTTON apresentasse idias similares sobre o processo de eroso. HUTTON no tinha ouvido falar de AVICENNA e no lia a lngua rabe. AVICENNA tambm notou a presena de fsseis em rochas presentes nas altas montanhas, o que ele interpretou como exemplos do esforo da natureza para preservar plantas ou animais que no tinham sobrevivido.


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Edrisi e Palermo As mais extensas correes das idias errneas divulgadas por PTOLOMEU foram feitas pelo gegrafo muulmano EDRISI ou al-IDRISI. Educado na Universidade de Crdoba, na Espanha, EDRISI foi um dos intelectuais que ROGRIO II da Siclia levou para Palermo. O rei ROGRIO despachou observadores a muitas partes do mundo, onde EDRISI disse haver incertezas sobre a verdadeira distribuio das montanhas, rios ou linhas costeiras. Os observadores trouxeram de volta muitas informaes novas a Palermo. Em conseqncia, EDRISI foi capaz de escrever uma nova geografia, que era realmente nova. Em 1154, ele completou um livro com o ttulo Divertimento para aquele que deseja viajar em torno do mundo. Ele corrige a idia de um Oceano ndico sem sada e a idia do Mar Cspio como um golfo do Oceano mundial. Ele corrige, tambm, os cursos de numerosos rios, inclusive o Danbio e o Niger, e a posio de vrias cadeias montanhosas importantes. Como KIMBLE (1938: 59) assinala, estranho que um livro to importante s tenha sido traduzido para o latim em 1619, quando o tradutor sequer conhecia o nome de seu autor. Outras inovaes significativas foram feitas em Palermo. Progressos foram feitos nos mtodos de navegao, inclusive o uso generalizado de cartas costeiras que eram as precursoras das cartas de Portulanos do sculo XIV. Diz-se que os marinheiros de Gnova aprederam as artes da navegao com os sicilianos e que os genoveses passaram este conhecimento aos portugueses de Sagres, no sculo XV. Assim, os primeiros passos que conduziram Era da Explorao foram dados na Siclia, durante os sculos XI e XII (WRIGHT, 1925:81). Ibn-Batuta Um dos maiores viajantes de todos os tempos foi o muulmano ibn-BATUTA. Ele nasceu em Tanger, em 1304, em uma famlia cujos membros tinham tradicionalmente atuado como juzes. Em 1325, com a idade de vinte e um anos, ele partiu para fazer a peregrinao obrigatria a Meca, onde ele se propunha a completar seus estudos de Direito. Mas, em seu trajeto atravs da frica do Norte e do Egito, ele ficou mais fascinado pelas pessoas e terras que ele ia conhecendo, do que pelo Direito. Aps chegar a Meca, ele decide dedicar-se s viagens de estudo e, em suas idas e vindas atravs dos territrios muulmanos, ele evitou cuidadosamente seguir o mesmo caminho duas vezes. As viagens de BATUTA levaram-no a certas partes da Arbia onde ningum havia passado antes. Ele navegou pelo Mar Vermelho, visitou a Etipia e, ento, continuou em direo ao sul, ao longo da costa da frica do Leste at Kilwa, localidade situada aproximadamente 10 ao sul do equador (na costa da atual Tanznia). Em Kilwa, ele teve notcia do entreposto comercial rabe de Sofala em Moambique, ao sul do atual porto de Beira e mais de 20 ao sul do equador. Assim, ibn-BATUTA confirmou o que ibn-HAUKAL havia inferido isto , que a chamada zona trrida da frica oriental no era trrida e que era ocupada por uma numerosa populao nativa, o que justificava o estabelecimento, a, de entrepostos rabes. Aps retornar de Meca, ele viajou novamente, desta vez para Bagd, Prsia e as terras em torno do Mar Negro. Em seguida, ele viajou nas estepes russas e, da, mais distante ainda, at Bukhara e Samarcanda (sia Central). Ento, BATUTA cruzou as montanhas pelo Afeganisto, para chegar ndia. Ele serviu ao imperador mongol, em Delhi por vrios anos, viajando extensivamente pela ndia durante todo esse tempo. Como embaixador, visitou as Ilhas Maldivas, o Ceilo, Sumatra e, por


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ltimo, a China. Em 1350, ele retornou a Fez, capital do Marrocos. Suas viagens, porm, no cessaram. Ele realizou, ento, uma viagem Espanha e, posteriormente, cruzou o Saara, chegando a Tombuctu, no rio Niger (Mali atual) coletando informaes importantes sobre as tribos de muulmanos negros que vivem nesta parte do mundo. Em 1353, ele se fixou em Fez, onde, para atender uma ordem do sulto, ditou um longo relato de suas viagens, que cobriram, durante cerca de trinta anos, uma distncia linear de aproximadamente 75000 milhas, o que, no sculo XIV, era um record mundial. Lamentavelmente, seu livro escrito em rabe teve pequeno impacto no mundo cristo da poca. Mesmo atualmente, quando em nossas escolas se ensina s crianas sobre o intenso calor da zona trrida, seria interessante uma referncia a ibn-BATUTA que, seis sculos atrs, mostrou que o clima ao longo do equador era menos extremo que o da chamada zona temperada na frica do Norte. Ibn-Khaldun O ltimo dos estudiosos muulmanos a fazer uma contribuio relevante geografia foi o grande historiador rabe, ibn-KHALDUN. Como ibn-BATUTA, ele nasceu na costa mediterrnea do noroeste da frica. Ele viveu a maior parte de sua vida nas cidades do que hoje territrio da Arglia e da Tunsia e, tambm, durante algum tempo, viveu na parte muulmana da Espanha. Seus ltimos anos foram passados no Egito. Em 1377, quando tinha 45 anos, ele completou uma volumosa introduo sua Histria do Mundo, conhecida com Muqaddimah. Este trabalho comea com uma discusso sobre o meio ambiente fsico do homem e sua influncia, e com uma discusso sobre as caractersticas do homem que esto mais ligadas sua cultura ou seu modo de vida do que ao seu ambiente fsico. Ele discute vrios estgios da organizao social, identificando o do nmade do deserto como o mais primrio e puro, e ele sugere que o habitante sedentrio da cidade dependente de luxos e torna-se dbil moralmente. KHALDUN discute as formas de governo, descrevendo uma seqncia de estgios que marcaram o avano de uma dinastia em direo ao poder, seguido por seu declnio, graas corrupo, at chegar sua decadncia. Ibn-KHALDUN discute as cidades e sua localizao. Finalmente, ele discute as vrias maneiras de se ganhar a vida comrcio, ofcios, cincias todas elas caracterizadas tanto como condies, quanto como conseqncia da vida urbana. Muitas das idias que ele desenvolve em seu esforo no sentido de fornecer um modelo terico sobre o crescimento e o declnio nacionais eram idias que reapareceriam muito mais tarde, na Europa do sculo XIX. Todavia, apenas recentemente os escritos de ibn-KHALDUN apareceram em Ingls (1958). Embora ibn-KHALDUN, de acordo com KIMBLE (1938: 180), possa ser considerado como o descobridor como ele prprio reivindicava do verdadeiro escopo e da natureza da geografia, permanece o fato de que seu conhecimento da parte fsica da Terra baseava-se grandemente na teoria grega; alm disso, suas idias sobre as influncias ambientais no eram muito sofisticadas. Ele aceitava, por exemplo, a tradicional diviso em sete zonas climticas paralelamente ao equador. Estranhamente, para um intelectual rabe da poca, ele repete a idia sobre uma zona inabitvel ao longo do equador e uma zona inabitvel tambm na regio polar. Ele repete a velha idia segundo a qual as pessoas se tornam negras quando vivem em regies muito ensolaradas, tornando-se gradualmente brancas e tendo filhos brancos, quando se mudam para a zona temperada. Assim, o ambiente fsico imprimiria suas caractersticas nas pessoas de vrias maneiras. No obstante, nos


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trabalhos de ibn-KHALDUN, esse ambientalismo ingnuo , de algum modo, modificado pelo reconhecimento de diferentes tradies culturais. A GEOGRAFIA NO MUNDO ESCANDINAVO Os escandinavos nunca tinham ouvido falar de ARISTTELES, ou ESTRABO, ou PTOLOMEU, ou ISIDORO, ou ibn-KHALDUN. Eles no tinham nenhuma idia sobre se as terras que eles habitavam eram consideradas inabitveis. Entre os escandinavos, os suecos enviaram expedies de exploradores para o leste, na direo de uma regio que seria atualmente a parte central da Rssia. No sculo IX, OTHAR DE HELGOLAND, em uma embarcao viking, navegou em torno do extremo norte da Noruega e, ainda mais a leste, na direo do Mar Branco (na Rssia atual, N. do T). Porm, o maior feito dos escandinavos da Noruega os Vikings foi a travessia do Atlntico Norte, para atingir o continente americano. Em 874, os Vikings alcanaram a Islndia e estabeleceram l um povoamento, que cresceu e prosperou. Em 930, o primeiro parlamento do mundo foi organizado na Islndia. Entre as pessoas instaladas na colnia da Islndia, havia um certo ERIC O RUIVO, especialmente violento e perturbador. Em 982, ele, sua famlia e servos foram banidos da Islndia. Tendo ouvido falar da existncia de terra na direo oeste, ERIC navegou atravs do proceloso Atlntico Norte e chegou parte sul da Groenldia. (...) Apesar de suas difceis condies fsicas, a colnia de ERIC atraiu novos habitantes a partir da Islndia. Depois de algum tempo, viagens regulares de ida e volta foram estabelecidas entre Groenlndia, Islndia e Noruega. Em torno do ano 1000, o filho de ERIC, Leif ERICSON, retornando da Noruega para a Groenlndia, encontrou uma forte tempestade, que acabou por desvi-lo de sua rota. Quando os cus clarearam, ele se encontrou em uma estranha costa, que se estendia to distante quanto ele podia ver, para o norte e para o sul. Ele desembarcou e encontrou madeira de qualidade, assim como vinhedos, nos quais cresciam uvas selvagens. Retornando Groenlndia, ele descreveu esta nova terra para seus compatriotas, localizando-a bem para oeste. No ano 1003, um homem chamado KARLSEFNI organizou uma expedio para fazer uma nova explorao dessas terras de oeste. Ele partiu com uma tripulao de 160 pessoas homens e mulheres ,alm de gado e suprimentos. No h dvida de que alcanou a costa da Amrica do Norte. A extensa baa, com uma forte corrente fluvial, era provavelmente o esturio do So Loureno e, em algum porto de suas praias, o grupo desembarcou e passou o inverno. A a primeira criana de origem europia nasceu nas Amricas. No vero seguinte, o grupo navegou para o sul, certamente at a Nova Esccia, provavelmente at o Cabo Cod e, mesmo possivelmente, at a Bahia de Chesapeak. Eles gostaram da terra que descobriram, mas os ndios demonstraram ser muito belicosos. Seus ataques foram to danosos que os Vikings desistiram do esforo de ocupar essas estranhas costas e navegaram de volta para a Groenlndia. Essa histria foi passada de gerao a gerao com o nome de A Saga de Eric o Ruivo.


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A GEOGRAFIA NO MUNDO CHINS Durante todo o tempo em que o estudo da Terra como a morada do homem estava se desenvolvendo nas antigas Grcia e Roma e, mais tarde, na Europa crist, no Mundo Islmico e at entre os remotos Escandinavos, havia um outro importante centro de estudo geogrfico no mundo. Este centro era a China. Essencialmente, os mundos europeu e chins permaneceram isolados, cada um descobrindo o outro passo a passo. (...) importante para os estudiosos versados na histria ocidental terem em mente que, desde aproximadamente o segundo sculo a.C. at o sculo XV depois de Cristo, o povo da China gozou do mais alto nvel de vida da Terra (NEEDHAM, 1963: 117). Os matemticos chineses tinham descoberto o uso do zero e tinham desenvolvido o sistema decimal, que era bastante superior ao sistema da Mesopotnia e do Egito. O sistema decimal foi introduzido em Bagd aproximadamente no ano 800, originrio do rio Indus. Mas, acredita-se geralmente que a regio do Indus derivou seu sistema decimal dos chineses. Os filsofos chineses tinham uma atitude em relao ao mundo natural fundamentalmente diferente daquela dos gregos. Para os chineses,o indivduo no separado da natureza ele parte da natureza. No h uma divindade legisladora que tenha criado o universo para o uso do homem, de acordo com um plano pr-concebido. A morte, para os chineses, no seguida pela vida em um novo paraso ou pela punio no inferno; em vez disso, o individuo espera ser absorvido pelo universo, do qual ele uma parte inseparvel. O confucionismo desenvolveu um modo de vida que era altamente eficiente na minimizao dos atritos entre os indivduos, mas que permanecia relativamente indiferente ao desenvolvimento do conhecimento cientifico. (...) No obstante essa postura, o registro do trabalho geogrfico na China significativo, mas ele est muito mais voltado para as coisas observveis e seus processos do que para a formulao de teorias. O Trabalho Geogrfico O trabalho geogrfico chins se baseava no desenvolvimento de mtodos para elaborar observaes geogrficas mais precisas e para us-las na construo de levantamentos teis. Por exemplo, h, entre os chineses, registros de dados sobre o clima que datam do sculo XIII a.C.. Todavia, o mais antigo texto propriamente geogrfico um survey dos recursos e produtos das nove provncias em que se dividia a antiga China, no sculo V a.C.. Para cada uma dessas provncias, so descritos a natureza do solo, os tipos de produtos e as vias fluviais que so usadas como rotas de transporte (NEEDHAM e LING, 1959: 500). No sculo II a.C., engenheiros chineses fizeram mensuraes precisas das argilas transportadas pelos rios. No sculo II a.D., os chineses realizaram o primeiro recenseamento populacional do mundo. Do ponto de vista tcnico, os chineses foram responsveis pela criao do papel, pela impresso de livros, o uso de sistema de mensurao da precipitao da chuva e da neve, e o uso da bssola na navegao. Houve, tambm, muitos progressos no entendimento dos processos geogrficos. Aproximadamente no sculo IV a.C., os chineses j compreendiam o ciclo hidrolgico. Mais ou menos mesma poca em que, na Grcia, PLATO observava os efeitos do desmatamento da tica, o filsofo chins MENCIUS (MENGTZU, que


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viveu na poca correspondente a dois sculos depois de CONFCIO) observava que as florestas, uma vez eliminadas das encostas das montanhas, no conseguiam se reimplantar a enquanto as encostas serviam de pastagens para bovinos e caprinos. Os chineses tambm aprenderam muito sobre o trabalho realizado pela gua corrente no processo de rebaixamento das montanhas e na formao de plancies aluviais. Aproximadamente poca em que AVICENA estava expondo suas idias sobre a eroso das montanhas, o pesquisador chins SHEN KUA apresentava as mesmas idias (em 1070). (...) Os textos geogrficos dos chineses, de acordo com NEEDHAM, eram de oito tipos:

1 estudos das populaes, os quais poderiam ser classificados como de geografia humana;

2 descries das regies da China; 3 descries dos pases estrangeiros; 4 relatos de viagens; 5 textos sobre os rios chineses; 6 descries das costas chinesas, de especial valor para os capites de

navios; 7 topografias locais, incluindo descries especiais de reas dependentes ou

controladas por cidades muradas; essas descries cobriam tambm montanhas famosas, certas cidades e palcios;

8 enciclopdias geogrficas. Havia, finalmente, uma ateno considervel em relao s origens e modificaes dos topnimos chineses (NEEDHAM e LING, 1959: 508). As Exploraes dos Chineses A descoberta do resto do mundo pelos viajantes chineses um aspecto da histria da geografia negligenciado nos textos ocidentais. As viagens para alm dos distantes horizontes chineses eram empreendidas por ordens de um imperador ou por missionrios e comerciantes. O mais antigo registro de viagens dos chineses um livro de idade incerta, que foi provavelmente composto em uma poca entre o quinto e o terceiro sculo a.C.. (...) O livro, chamado As Viagens do Imperador MU, tal como a Odissia de HOMERO, uma histria de aventura, certamente tecida pela imaginao do autor, porm com detalhes que dificilmente teriam sido inventados pela fantasia de algum. (...) A descoberta das civilizaes do Mediterrneo creditada ao gegrafo CHANG CHIEN, em 128 a.C.. O livro que ele escreveu descreve a rota terrestre, que ele trilhou atravs da sia Central, para chegar cidade de Bukhara (no atual Uzbequisto, N. do T.) e, da, at Prsia e costa do Mediterrneo. Por esta rota, os mercadores passaram a viajar regularmente e provavelmente estabeleceram contatos com o Ocidente, bem antes da descoberta oficial deste.


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(...) Houve um bom nmero de outros viajantes chineses, cujos registros de viagens so completos o suficiente para garantir seu lugar na histria. Um dos mais distintos viajantes foi o monge budista, HSUAN-TSAN (Sykes, 1961: 24-30). No sculo VIII depois de CRISTO, ele foi capaz de atravessar os altssimos planaltos do Tibet e as mais elevadas montanhas do mundo, varridos por fortes ventos, para alcanar a ndia. Aps estudar por muitos anos em centros budistas, retornou China, transportando em lombos de animais uma grande coleo de manuscritos e relquias budistas. Ele foi o chins que descobriu a ndia (MIRSKY, 1964). No mesmo sculo, outro monge budista chegou ndia pelo mar, depois de fazer uma escala de oito meses na ilha de Sumatra. (...) Vrios sculos mais tarde, um outro viajante chins cruzou os desertos da sia interior, enfrentou infinitas dificuldades e, finalmente, fez contato com o lder mongol GENGIS KHAN, em Samarcanda (tambm no Uzbequisto atual). Isto ocorreu por volta de 1220. Houve, tambm, o caso do monge cristo nestoriano, Rabban BAR SAUMA que, em 1287 e 1288 fez uma peregrinao a Roma e, posteriormente, dirigiu-se a Gnova e, da, a Paris, chegando, inclusive, at Bordeaux, onde encontrou os reis da Frana e da Inglaterra. Pode-se imaginar o espanto dos franceses do sculo XIII, quando se viram sendo descobertos por um cristo da China. Em 1288, ele retornou a Roma e recebeu a beno do novo Papa para, imediatamente aps, viajar de volta a Pekin. Isto ocorreu vrias dcadas antes dos irmos POLO realizarem expedies similares China. (...) Outros exploradores chineses viajaram, tambm, por mar. (...) O mais importante trabalho de explorao pelo mar foi realizado por CHENG MO, um almirante chins, entre 1405 e 1433. Ele chefiou sete expedies distintas, cada uma utilizando uma frota de navios. Suas viagens abriram rotas comerciais regulares para Java, Sumatra, Malsia, Ceilo e a costa oeste da ndia. Ele tambm chegou ao Golfo Prsico, ao Mar Vermelho e costa oriental da frica, ao sul do equador. (...) Em sua ltima expedio, de 1431 a 1433, ele retornou China com embaixadores de mais de dez pases. possvel, inclusive, que este almirante tenha enviado seus navios at mesmo s costas da Austrlia (HSIEH, 1968). A Cartografia Os chineses foram, tambm nesse perodo da histria, experts na confeco de mapas. O engenheiro, CHANG HENG, no sculo II depois de CRISTO, foi, provavelmente, o primeiro a introduzir o sistema de grade de coordenadas na China, embora seus mapas no tenham sobrevivido. H, entretanto, uma referncia a ele, na qual ele foi identificado como aquele que desenhou uma rede de coordenadas sobre o cu e a terra, e fez clculos baseados nela (NEEDHAM e LING, 1959:538). O pai da cartografia chinesa foi PHEI HSIU, que foi nomeado Ministro dos Trabalhos Pblicos pelo imperador chins em 267 depois de CRISTO. Ele produziu um mapa da parte da China organizada politicamente, desenhado em oito rolos de seda. (...) Ele fez uso de uma grade de linhas leste-oeste e norte-sul, cortando-se em ngulos retos, para fornecer uma estrutura na qual podiam ser plotados os rios, a linha costeira, as cadeias de montanha, as cidades e outros aspectos. Teria ele, ou


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CHANG HENG, ou algum outro, bem mais cedo, conseguido a idia do uso da triangulao para localizar lugares e do uso de uma grade de linhas, a partir de contatos com os gregos ou, talvez, atravs deles, com os egpcios ? Isso no , de modo algum impossvel, porm essas conexes no chegaram a ser firmemente estabelecidas. Dois belos exemplos de mapas chineses foram esculpidos na rocha em 1137 depois de CRISTO, baseados em dados levantados antes de 1100. Um deles, que era intitulado Um Mapa da China e dos Pases Brbaros, representava um territrio que se estendia da Grande Muralha, ao norte de Pekin, em direo ao sul, at a ilha de Hainan e, em direo a oeste, at s montanhas da sia interior. O outro, intitulado O Mapa das Trilhas de YU o Grande, cobre essencialmente a mesma rea, mas ainda mais preciso quando mostra os cursos dos grandes rios e a linha costeira, desde o golfo de Chihli, ao norte da pennsula de Shantung, at a ilha de Hainan. Nenhum desses mapas mostra Taiwan. Ambos como outros mapas chineses foram desenhados com o norte para a parte superior. Os gegrafos que fizeram esses dois mapas no tiveram seus nomes conhecidos. O MUNDO MEDIEVAL EM RETROSPECTO O perodo que, vai do sculo V ao XV foi uma poca notvel. Em vrias partes do mundo, importantes dados novos estavam sendo coletados por observao direta, mas a ausncia de contatos mais fortes entre os diferentes povos (em grande parte como resultado da barreira da lngua) significava que o conhecimento geogrfico obtido por um grupo s era difundido muito lentamente entre os outros grupos. Assim, nenhum rumor das viagens dos Vikings alcanou a Europa Crist. Alm disso, a Europa crist possua uma variedade de documentos que, muitas vezes, eram contraditrios entre si. Aqueles que podiam ler a lngua rabe, estavam conscientes de que existia gente vivendo ao longo do equador e, alm dele, para o sul e que havia homens de pele branca visitando essas regies, sem tornar-se negros. (...) Em 1410, dois livros importantes apareceram. Um era o Imago Mundi, de Pierre DAILLY, que resumia muito do que havia sido escrito na Europa, durante o perodo medieval. O segundo foi a traduo latina da verso rabe da Geografia de PTOLOMEU, obra que apresentava um grande nmero de erros. Apesar disso, PTOLOMEU defendia uma idia importante: a de que os mapas deveriam basear-se na localizao precisa, em termos de latitude e longitude, de pontos especficos. O problema era que nenhum dos lugares que ele prprio mapeou estava localizado corretamente. Por outro lado, ele ofereceu o peso de sua autoridade para manter vrios erros importantes, inclusive aquele segundo o qual o Oceano ndico seria um mar fechado. Mas, durante a idade Mdia, grandes progressos geogrficos foram realizados, a comear com EDRISI na Siclia, o qual contribuiu fortemente para o desenvolvimento da arte de navegar, inclusive com a adoo da bssola magntica. Assim, o cenrio estava montado para a prxima etapa da descoberta do mundo. Os estudiosos j sabiam, ento, que a Terra era uma esfera e alguns deles insistiam na idia de que nenhum lugar do planeta poderia ser inalcanvel pelo homem.

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As Geografias Medievais