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‘SABEMOS DOS NOSSOS DIREITOS E VAMOS BATALHAR POR ELES’ DIREITOS INDÍGENAS NO BRASIL – OS GUARANI-KAIOWÁ

‘SABEMOS DOS NOSSOS DIREITOS E VAMOS BATALHAR POR ELES · 2014-07-25 · A luta dos Guarani-Kaiowá pela terra se defronta com a expansão da chamada fronteira agrícola do Mato

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‘SABEMOS DOSNOSSOS DIREITOS E VAMOS BATALHARPOR ELES’DIREITOS INDÍGENAS NO BRASIL – OS GUARANI-KAIOWÁ

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Para os Guarani-Kaiowá do Brasil, assimcomo para todos os povos indígenas, asterras tradicionais têm uma importânciavital para sua identidade e seu modo devida. Aproximadamente 30 mil Guarani-Kaiowá vivem no estado de Mato Grosso do Sul, no centro-oeste brasileiro. Há maisde um século, suas comunidades vêmsendo expulsas de suas terras pelaexpansão da agricultura de larga escala –um processo que continua até hoje. Para ascomunidades afetadas, as consequênciaspodem ser devastadoras.

Trinta e cinco famílias Guarani-Kaiowá dacomunidade de Laranjeira Ñanderu, entreas quais cerca de 85 crianças, estãovivendo em tendas improvisadas à beira da movimentada rodovia BR-163, no MatoGrosso do Sul. As condições em que se

encontram são deploráveis. Além de tudo, elas vêm enfrentando ameaças eintimidações de seguranças armadoscontratados por fazendeiros locais.

Em setembro de 2009, as famílias foramexpulsas de suas terras tradicionais. APolícia Federal, que supervisionou aexpulsão, informou ao proprietário que a comunidade retornaria ao local pararecolher os objetos que tiveram que deixarpara trás. Porém, o proprietário incendiou ascasas e todos os pertences dos moradores.

Agora, a comunidade está vivendo embarracas de lona preta, num lugar em queas temperaturas ultrapassam os 30o C. Aárea sofre constantes alagamentos e ficarepleta de insetos e de sanguessugas.Segundo o líder comunitário José Almeida,

Anistia Internacional - Novembro de 2010 Índice: AMR 19/001/2011

“Sofremos demais com tantaviolência em e contra nossascomunidades [...] Não fazemospedidos, exigimos direitos:demarcação de nossas terrascom urgência para que nossopovo volte a viver em paz, comfelicidade e dignidade.”Carta aberta dos Guarani-Kaiowá ao presidente Luiz InácioLula da Silva, agosto de 2010

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durante a noite, os fazendeiros locaiscostumam circular com seus carros em alta velocidade pela rodovia, direcionandoos faróis contra as barracas para intimidar a comunidade.

Os obstáculos que os povos indígenas aindatêm de enfrentar no Brasil para que seusdireitos sejam reconhecidos e cumpridossão enormes. Embora o governo federaltenha feito algumas promessas de grandeimportância para os povos indígenas, esse

mesmo governo tem atitudes bastantecontraditórias. Por um lado, oferece certaproteção aos seus direitos; por outro,impulsiona projetos de exploraçãoeconômica de grande escala na região, semo consentimento livre, prévio e informadodas comunidades indígenas afetadas.

O fato de as autoridades brasileiras nãoassegurarem o direito à terra dos povosindígenas do Mato Grosso do Sul só fazaumentar as dificuldades econômicas e o deslocamento social das comunidadesGuarani-Kaiowá. Os atrasos exagerados nos procedimentos legais para devolver asterras às comunidades, assim como ofracasso generalizado em punir indivíduosque atacam e que matam os índios, criamas condições para que a violência perdure.

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A comunidade Laranjeira Nhanderu foi expulsade suas terras ancestrais em setembro de2009. Após a expulsão, o proprietário da terra ateou fogo às casas e aos pertences dasfamílias. Agora, elas vivem em condiçõesprecárias à beira de uma rodovia.

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POVOS INDÍGENAS DO BRASIL

No Brasil, vivem hoje mais de 700 mil índios,inclusive a maioria das tribos do planeta queainda não foram contatadas. Existem, nopaís, mais de 200 grupos indígenas, quefalam mais de 180 línguas diferentes. Asterras tradicionais têm uma importânciacrucial para sua identidade e para seu bem-estar social, cultural e econômico – algo queo governo brasileiro reconheceu ao cunhar aexpressão "índio é terra”.

Capa: Índios da comunidade Guarani-Kaiowáde Passo Piraju, 2009. © Amnesty International

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PARAGUAYCoronel Sapucaia

Paranhos

Juti

Corumbá

BOLIVIA

Amambaí

Coxim

Campo Grande

Dourados

MATO GROSSO DO SUL

Ponta Porã

O DESENROLAR DE UMA TRAGÉDIANO MATO GROSSO DO SULA luta dos Guarani-Kaiowá pela terra sedefronta com a expansão da chamadafronteira agrícola do Mato Grosso do Sul.

Cerca de 50 mil índios, pertencentes adiversos grupos étnicos, habitam o estado.O maior desses grupos é o Guarani-Kaiowá.Suas terras tradicionais localizam-se naparte sul do estado, uma região de planíciesvastas e férteis. Recentemente, essa árease transformou na nova fronteira para aexpansão da indústria da cana-de-açúcar.Trata-se do mais novo desdobramento de uma longa história de incursõesagroindustriais nos territórios indígenas. No final do século XIX, foi a cultura da erva-mate que ocupou grandes áreas de terra. A partir da década de 1950, a pecuária e os

cultivos comerciais – principalmente a soja,mas também a cana-de-açúcar, o milho, o trigo e o feijão – foram, gradualmente,cobrindo toda aquela área.

No começo do século XX, os povosindígenas do Mato Grosso do Sul foramconfinados à vida nas reservas. Mesmoassim, muitas aldeias mantiveram suaexistência nas terras tradicionais, fora dosassentamentos oficiais. Essa situação,porém, foi alterada com os projetos decolonização do governo do estado, queincentivaram colonos de outras regiões do Brasil a mudarem-se para a área, etambém com o crescimento da atividadepecuária. As aldeias que restarampassaram a sofrer uma pressão intensa;seus habitantes acabaram sendo repelidosdaquela terra e empurrados para as

reservas. Atualmente, essas reservasencontram-se extremamentesuperpovoadas. Arruinadas pela pobreza e fragmentadas por divisões étnicas, ascomunidades indígenas subsistem,sobretudo, das cestas básicas fornecidaspelo governo. Segundo o promotor federalMarco Antônio Delfino de Almeida, "estacondição demográfica é comparável a umverdadeiro confinamento humano. Emespaços tão diminutos é impossível areprodução da vida social, econômica ecultural."

Em um relatório sobre o Brasil, publicadoem 2009, o relator especial da ONU sobre asituação dos direitos humanos e liberdadesfundamentais dos povos indígenas escreveuque o Mato Grosso do Sul "apresenta asmais altas taxas de mortalidade infantil

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Mato Grosso do Sul. É na região sul do estado(área riscada) que diferentes grupos Guarani-Kaiowá reivindiçam porções de terra:pequenas ilhas de território indígena cercadaspor fazendas.

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indígena devido às condições precárias desaúde, de acesso à água e à comida, asquais estão relacionadas à falta de terras."A desnutrição infantil, os altos índices de suicídio, a violência e o alcoolismoameaçam solapar a própria identidadedessas culturas complexas.

Foi por se verem diante de uma situaçãotão assustadora que algumas comunidadesdecidiram embarcar numa perigosajornada: para fora das reservas, rumo asuas terras ancestrais.

VIOLÊNCIA E INTIMIDAÇÃONa década de 1990, frente a um cenário de deterioração das reservas, os Guarani-Kaiowá adotaram uma estratégia conhecidacomo retomada (a reocupação pacífica de

pequenas porções de terra em seusterritórios tradicionais) a fim de tentaremacelerar o processo de devolução de suasterras. Essas ações foram respondidas comameaças, com violência e com expulsõespor parte de grupos armados contratadospor proprietários de terras. Várias liderançasindígenas foram assassinadas. O fracassodas autoridades em levar os responsáveispelas mortes à Justiça tem fomentado umclima de violência.

No dia 11 de janeiro de 2003, MarcosVerón, um cacique Guarani-Kaiowá de 72 anos, liderava um pequeno grupo que tentava reocupar pacificamente umareduzida área do território indígenaTakuara, no município de Juti, Mato Grossodo Sul. Os Takuara haviam sido expulsos de seu território em 1953, e aquela era sua

terceira tentativa, desde 1999, de reocuparsuas terras tradicionais.

Apesar das garantias iniciais da FundaçãoNacional do Índio (FUNAI) e da polícia, de que não haveria uma expulsão forçada e de que um acordo pacífico serianegociado com o proprietário das terras, os eventos logo se tornaram violentos. Nodia 12 de janeiro de 2003, um grupo que,segundo informações recebidas pela Anistia Internacional, era composto porfuncionários das fazendas locais e porpistoleiros de aluguel, reuniu-se nasproximidades da área ocupada e atiroucontra um caminhão que levava membrosda comunidade. Reginaldo Verón, de 14anos, sobrinho de Marcos Verón, foiatingido na perna. Na manhã seguinte, um grupo de aproximadamente 30 homens

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Esquerda: Ladio Ava Taperendy’i ao lado domemorial de seu pai, Marcos Verón, que foiespancado até a morte, em 2003, a mando defazendeiros, depois que ele liderou a ocupaçãode uma terra tradicional de sua comunidade. Acima: Marcos Verón em Porto Seguro para o500º aniversário da chegada dos portuguesesao Brasil, abril de 2000.

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atacou o acampamento. O filho de MarcosVerón, Ladio Ava Taperendy’i, severamenteespancado e ameaçado de morte durante oataque, descreve o que aconteceu:

“Todos soltavam rojões, atiravam de

revólver e soltavam bombas, com umas

armas na direção das nossas barracas.

Só se ouvia crianças e mulheres

chorando de desespero [...] Enquanto

isso, pegaram o cacique Marcos Verón

na outra barraca e começaram a

espancar e dar chutes nele até [ele] cair

no chão. Depois de caído no chão, ainda

cada um deles dava chutes no cacique.

Depois [que o] cacique estava

agonizando no chão pela boca, eu gritava

para eles deixarem de bater nele por que

ele é velho e aposentado [...] Enquanto

isso, vi o meu pai recebendo a última

coronhada na cabeça e no rosto. Até não

se mexer mais [...]”

Documento assinado por 71 índios Guarani-Kaiowá,

entregue à Anistia Internacional em maio de 2005

Quando terminaram, os agressoresdeixaram Marcos Verón e seu filho caídos à beira da estrada. O cacique, então, foilevado a um hospital, onde morreu emconsequência das lesões. A resposta rápida do Ministério Público Federal emDourados, assim como a investigação sobre o ataque, permitiram que diversosindivíduos fossem presos imediatamente, eque mandados de prisão fossem expedidospara outros suspeitos. Eles foram acusadosde uma série de crimes, entre os quaishomicídio, tentativa de homicídio, sequestroe tortura. O processo, contudo, tem sido

extremamente lento. Em abril de 2010, o caso, finalmente, chegou a um tribunal;porém, o processo foi suspenso porque a corte resolveu negar o auxílio de umtradutor para as testemunhas. Muitas delaseram índios com dificuldades para seexpressarem em português. A decisão,portanto, comprometeu seu direito à justiça.

O caso de Marcos Verón ilustra bem oquanto os Guarani-Kaiowá estão excluídosda Justiça. Apesar de toda a atençãointernacional que sua morte recebeu,passados sete anos, ninguém foi levado à Justiça.

Depois de o cacique ter sido morto, o usoda violência contra os povos indígenasprosseguiu com a força de sempre.Inúmeros ataques e assassinatos foram

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atribuídos a seguranças privados,contratados por proprietários de terras daregião para atuar como milícias armadasirregulares, aterrorizando as comunidadesindígenas. Diversos casos foram atribuídosà Gaspem Segurança, uma empresacontratada pelos fazendeiros que,atualmente, está sendo investigada peloMinistério Público Federal devido à grandequantidade de denúncias apresentadascontra seus funcionários. Quatro relatoresespeciais da ONU – sobre povos indígenas,sobre o direito à alimentação, sobre aviolência contra a mulher e sobre moradiaadequada – também manifestaram àsautoridades brasileiras suas preocupaçõescom essas denúncias.

Seguranças contratados pela empresaforam indiciados pela morte do líder

indígena Dorvalino Rocha, em dezembro de2005, e foram acusados, por promotorespúblicos federais, de terem matado a líderespiritual Xurete Lopes, em janeiro de2007. A empresa nega as acusações.

As denúncias contra a Gaspem Segurançaprosseguem. A comunidade Guarani-Kaiowá de Apyka´y, onde vivemaproximadamente 15 famílias, próximo aDourados, no Mato Grosso do Sul, tentoureocupar suas terras tradicionais pordiversas vezes, desde que, em 1990, foiforçada pelos fazendeiros a abandoná-las.Assim como a comunidade LaranjeiraÑanderu, esses Guarani-Kaiowá estãovivendo à beira de uma rodovia que cruzasuas terras tradicionais, desde abril de2009, quando o proprietário lhesconfrontou com uma ordem de despejo.

À uma hora da tarde do dia 18 de setembrode 2009, cerca de 10 indivíduos armadosatacaram a comunidade. Um homem de 62 anos levou um tiro na perna e umamulher foi espancada. Os agressoresincendiaram um barraco e ameaçaram com mais mortes caso a comunidade nãoabandonasse o acampamento. Promotoresfederais investigam a possibilidade de que oataque tenha sido executado por guardas aserviço da Gaspem Segurança.

Por todo o estado, reproduz-se esse mesmopadrão de ameaças e de discriminação. Em 29 de outubro de 2009, um grupo de aproximadamente 25 integrantes dacomunidade Guarani-Kaiowá Y’poíreocupou suas terras tradicionais próximasao município de Paranhos. No dia seguinte,foram surpreendidos pela chegada de

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Acima: Placa sinalizando que terras Jatayvaryforam identificadas próximo a Dourados.Esquerda: Barraco incinerado da comunidadeGuarani-Kaiowá Apyka´y. Em setembro de2009, dez homens armados atacaram seuacampamento à beira de uma estrada. Centro: Líder indígena Guarani-Kaiowá nareserva de Dourados, maio de 2008.

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dezenas de homens armados e tiveram quefugir para uma mata nas proximidades.Membros da comunidade relataram teremvisto o professor de alfabetização, GenivaldoVera, ser levado pelos pistoleiros, enquantoseu primo, Rolindo Vera, também professor,conseguia escapar mata adentro. No dia 7 de novembro, o corpo de Genivaldo Vera foi encontrado em um riacho nasredondezas. As fotografias disponibilizadaspela polícia mostram que sua cabeça havia sido raspada e que seu corpoapresentava inúmeras lesões. O paradeirode Rolindo Vera continua desconhecido. A comunidade teme que ele tenha sidosequestrado e levado para o Paraguai.

Em agosto de 2010, os Guarani-Kaiowá de Y’poí, mais uma vez, reocuparam suasterras. Em setembro, eles foram cercados

por homens armados contratados porfazendeiros locais. A comunidade foiameaçada e foram disparados tiros para oalto. Além disso, os índios foram proibidosde sair do acampamento. Durante esseperíodo, eles ficaram sem acesso à água, à comida, à educação e a cuidados desaúde. A Fundação Nacional de Saúde(FUNASA) interrompeu a prestação deserviços à comunidade, alegando não tercondições de garantir a segurança de seus funcionários.

A comunidade Guarani-Kaiowá Ita’yKa’aguyrusu enfrenta uma situaçãosemelhante. No dia 4 de setembro de2010, membros da comunidadereocuparam suas terras tradicionais. Desdeentão, já foram atacados quatro vezes pelosfazendeiros locais. Segundo o relato de

Efigênia, uma professora indígena dacomunidade, durante o último ataque, em 21 de setembro, vários homens dalocalidade chegaram ao acampamentocarregando pedaços de pau e ameaçandobater nas mulheres e nas crianças. Alémdisso, para assustar os índios, soltavamfoguetes e rojões. Em ocasiões anteriores,os fazendeiros atiraram contra os membrosda comunidade e tentaram atropelá-los.

A comunidade Guarani-Kaiowá KurusúAmbá, do município de Coronel Sapucaia,reocupou suas terras em novembro de2009. Atualmente, esses índios estãovivendo em condições extremamente

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Indígenas da comunidade Guarani-Kaiowá dePasso Piraju, 2009.

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Os primos Genivaldo (esq.) e Rolindo Vera eram professores de alfabetização dos Guarani-Kaiowá Y’poí. Em 2009, após uma violenta expulsão, Genivaldo Vera foi sequestrado porpistoleiros. Depois disso, seu corpo foi encontrado num riacho próximo. Rolindo Veraconseguiu escapar. Seu paradeiro continua desconhecido.

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precárias, sem alimentos adequados e comacesso à saúde severamente limitado. Emsetembro de 2010, um menino indígena detrês anos de idade morreu, aparentemente,de desnutrição. Após sua morte, aFUNASA, que não havia enviado seusfuncionários à comunidade por questões de segurança, emitiu um comunicado àimprensa afirmando que o conflito estavatão exacerbado que até mesmo a políciafederal e a militar tinham dificuldade parachegar ao local. A comunidade tem sidoconstantemente ameaçada por pistoleirosque se acredita estarem ligados aproprietários de terras locais.

PROMESSAS E ATRASOSO direito dos índios às “terrastradicionalmente ocupadas” por eles está

consagrado na Constituição Federal de1988, em seu artigo 231. Isso foi e continua sendo uma das maiores vitórias já conquistadas na luta pelos direitos dosíndios a sua terra e a sua identidade.

De acordo com a Constituição, o governofederal é responsável por proteger as terrasindígenas tradicionais e por devolvê-las aosíndios. Esse complexo procedimento detransferência é administrado pela FUNAI ese constitui de cinco etapas: identificação;delimitação de fronteiras; demarcaçãooficial; homologação (ratificação) peloPresidente; e registro. Conforme determinaa Constituição, todas essas terras deveriamter sido demarcadas até 1993.

Desde 1988, aconteceram algumasimportantes transferências de terras para

os índios, sobretudo no norte do país, onde foram demarcadas algumas grandesreservas, como Raposa / Serra do Sol, oParque do Xingu e os territórios Yanomami.Entretanto, mesmo nessas situações, astransferências se deram num contexto deviolenta oposição dos proprietários de terras locais. Além disso, as reservas sãoconstantemente ameaçadas por projetos deexploração econômica, entre os quais umasérie de hidrelétricas planejadas para seremconstruídas na região amazônica, sobre as quais os povos indígenas afetados nãoforam consultados previamente, de modolivre e informado.

Ademais, o processo de transferência deterras é extremamente lento. Para que umareivindicação seja resolvida, podem sepassar anos, senão décadas. Há diversos

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fatores que contribuem para esse atraso:entre eles, a histórica falta de recursos paraa FUNAI e a oposição dos proprietários deterras locais e dos governos estaduais. Oprocesso tem sido ainda mais retardado poruma barreira de recursos jurídicos erguidapelos fazendeiros em nível estadual efederal, e pela resistência de alguns juízesàs reivindicações dos povos indígenas.

Em uma tentativa de acelerar o processo,em novembro de 2007, o Ministério Público Federal no Mato Grosso do Sulfirmou um acordo extrajudicial denominadoTAC (Termo de Ajustamento de Conduta).Com o TAC, a FUNAI se comprometia aidentificar e delimitar 36 porções distintasde terras Guarani-Kaiowá até abril de 2010.A tentativa deparou-se com a oposição dogoverno do estado do Mato Grosso do Sul

e com o lobby dos fazendeiros, os quaisconseguiram frustrar o processo por meio deuma série de recursos judiciais. Promotoresfederais criticaram a FUNAI pela falta deprogresso nessa área, afirmando que talsituação “constitui grave e inconcebívelviolação a direitos fundamentais garantidosexpressamente no texto da Carta Política de1988”. Agora que o prazo se esgotou semque as identificações fossem concluídas, ospromotores federais passaram a multar aFUNAI pelo atraso. O dinheiro arrecadadoserá revertido para indenizar os povosindígenas afetados.

OS DESAFIOS DA INDÚSTRIA DOAGRONEGÓCIOEnquanto o processo de demarcaçãopermanece paralisado, uma nova onda de

empreendimentos agroindustriais estátomando o Mato Grosso do Sul. Plantaçõesde cana-de-açúcar, que pertencem ausinas poderosas ou que são arrendadaspor elas, estão se expandido sobre terrasque foram identificadas como indígenas,mas que ainda aguardam a conclusão dasetapas finais de reconhecimento. Em 1999,por exemplo, 8.000 hectares de terrasforam identificados como territóriotradicional da comunidade Jatayvary,próximo a Dourados. Desde então, oprocesso de demarcação vem sendoobstruído nos tribunais. Atualmente, aaldeia ocupa uma área de apenas 180hectares, e está cercada, por todos oslados, por lavouras de cana-de-açúcar.

Arlindo, um líder indígena, disse à AnistiaInternacional que ele não consegue

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entender porque o processo dedemarcação está paralisado enquanto queo plantio e a colheita da cana seguem emfrente. As plantações de cana avançam atéo limite da aldeia. Arlindo descreve comoos funcionários das fazendas tentamintimidar os moradores direcionandopotentes holofotes contra a comunidadedurante a noite. Ele conta que acomunidade não consegue mais pescar no rio da região porque suas águas estão poluídas, e que as plantações dosmoradores ficam infestadas com insetospor causa do uso de pesticidas naslavouras de cana. Ele relata que ascomunidades nunca foram consultadaspelo governo ou por representantes dasindústrias. Suas queixas sãoconstantemente ignoradas.

Os danos provocados às terras tradicionaisdos índios do Mato Grosso do Sul pelosempreendimentos agroindustriais são motivode grande preocupação. A redução daprodutividade futura da terra compromete a capacidade de os índios sustentarem seumodo de vida quando conseguirem retornara essa terra. A necessidade de preservar aintegridade e a viabilidade da terra é umaquestão crucial para os povos indígenas.Tanto os Estados quanto as empresas têm a obrigação de não realizarem atividadesdestrutivas nas terras indígenas tradicionaisantes de devolvê-las.

Em abril de 2010, o Ministério PúblicoFederal em Dourados firmou um Termo deAjustamento de Conduta (TAC) com umausina local para cancelar os contratos comfornecedores de cana localizados em terras

indígenas tradicionais que estivessem emprocesso de identificação, demarcação ouhomologação. Pelo acordo, as usinas nãomais utilizariam cana-de-açúcar produzidaem terras Jatayvary. O Ministério Público emDourados afirmou à Anistia Internacionalque, embora esse pareça ser apenas umpequeno passo, trata-se, na verdade, de um avanço bastante significativo, poisestabelece um precedente para outrosacordos similares, não apenas com aindústria da cana, mas também comcriadores de gado e com produtores de soja.

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Arlindo, um índio da comunidade Guarani-Kaiowá Jatayvary, olha para as lavouras de cana que se estendem desde os limites de seu vilarejo até as terras tradicionais de suacomunidade. Assim como acontece com outrosgrupos Guarani-Kaiowá, as reivindicações deterras dos Jatayvary permanecem obstruídasnos tribunais.

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FORÇADOS A CORTAR CANA

Sem poder ter acesso a suas terrastradicionais, não resta aos Guarani-Kaiowáoutra alternativa senão trabalhar noaglomerado de fazendas que cobre o MatoGrosso do Sul. Atualmente, mais da metadedos jovens Guarani-Kaiowá se vê obrigada a percorrer distâncias longínquas dentro do estado para trabalhar como cortadoresde cana nas plantações, geralmente emcondições severas e exploradoras.

José (nome fictício) é um jovem indígena quemora na aldeia Ñande Ru Marangatu. Eletrabalhou como cortador de cana e relatou à Anistia Internacional as situações quevivenciou. Apesar de as terras tradicionais de sua comunidade terem sido oficialmentehomologadas pelo Presidente Lula em marçode 2005, a devolução da terra à comunidadetem sido retardada por recursos impetradospelos proprietários da terra. Quando estedocumento foi redigido, o processopermanecia estagnado nos tribunais.Impedido de trabalhar nas fazendas locaisdevido às hostilidades que as reivindicaçõesda comunidade despertam na vizinhança,José teve que percorrer centenas dequilômetros em busca de trabalho. Eledescreveu a situação caótica que teve deenfrentar quando chegou às lavouras de cana-de-açúcar do município de Sidrolândia, depoisde uma viagem de ônibus de seis horas:

Assim como José, centenas de outroscortadores de cana indígenas passam pela

mesma experiência. Em dois casosemblemáticos, mais de mil trabalhadoresindígenas foram resgatados durante visitasde inspeção realizadas por promotoresfederais do trabalho que estiveram noestado em 2007. Na Destilaria Centro-Oeste Iguatemi (Dcoil) e na Usina Debrasa,em Brasilândia, os promotores encontraramcortadores de cana indígenas vivendo em alojamentos imundos e superlotados,recebendo comida estragada e sendotransportados para as lavouras de cana em ônibus sem freios. Os trabalhadorescontaram aos promotores do trabalho que,nas lavouras, não havia água potável,abrigos ou cuidados médicos. Elesdisseram que geralmente eram pagos comatraso e que os empregadores costumavamnão depositar os encargos previdenciáriosdos quais dependem seus benefíciosfuturos, tais como a aposentadoria. Depoisdisso, ambas as empresas foram colocadasna “lista suja”: uma relação oficial em quesão expostos os nomes das empresas cujostrabalhadores são descobertos trabalhandoem condições definidas pela legislaçãobrasileira como análogas à escravidão.

Para muitos trabalhadores indígenas, o elo mais crucial ocorre com os chamadoscabeçantes, também conhecidos comocapitães, que são os índios encarregados de organizar os grupos de trabalhadoresindígenas. A maioria dos índios tem umconhecimento muito limitado dos seusdireitos legais e não pertence a sindicatos.Ao caírem nas mãos dos cabeçantes, muitosdeles, como José, acabam sendo explorados.

A FUNAI é responsável por supervisionar as condições de trabalho e por reportarabusos contra os trabalhadores indígenas.Entretanto, a administradora regional daFUNAI em Dourados, Margarida Nicoletti,disse à Anistia Internacional que, embora a FUNAI devesse estar monitorando ascondições de trabalho e dando orientaçõesàs usinas sobre o emprego detrabalhadores indígenas, não existemrecursos para realizar esse trabalho.

Na medida em que a mecanização tomaconta do estado e que o processo dedemarcação de terras continua paralisado,a luta dos Guarani-Kaiowá por seus direitos torna-se mais urgente do quenunca. As autoridades precisam atuar emconsonância para impedir que os direitosdos Guarani-Kaiowá sejam ainda maisdeteriorados. Assegurar os direitos a suasterras tradicionais é um passo vital nosentido de habilitar os povos indígenas areconstruírem suas sociedades e suaseconomias, bem como de proteger seumodo de vida e sua herança cultural.

Índice: AMR 19/001/2011 Anistia Internacional - Novembro de 2010

“Você chega lá, você está no meiodo inferno [...] Não temos sabão,nada, que seja pra tomar banho,pra gente dormir, porque, sabe, lá tudo a gente paga, todas ascoisas, sabão, lençol, todas ascoisas. Eles te alugam o quarto, e esse daí sai do dinheiro dacarteira [deduzido do pagamento],porque dizem que pagam 450 –900 em dois meses – mas vocênão vê, tudo que você beber,comer, vai tudo nisso aí [...] Tinhapessoas que queriam se enforcar.Quando saímos, tinha trabalhadoresque não tinham sido pagos faziameses, que estavam chorando nomeio das lavouras de cana”.

Devido à discriminação, muitos índios veem-seforçados a aceitar trabalhos pesados e malpagos, geralmente como cortadores de cana.

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NORMAS INTERNACIONAISDe acordo com as normas internacionais,os povos indígenas desfrutam de certosdireitos específicos. Os dois principaisinstrumentos internacionais de direitoshumanos que tratam dos direitos dos povos indígenas são a Convenção Nº 169da Organização Internacional do Trabalho(OIT) e a Declaração da ONU sobre osDireitos dos Povos Indígenas. Juntas, aConvenção e a Declaração proporcionamum arcabouço normativo robusto queafirma o direito dos povos indígenas a suasterra tradicionais, assim como seu direito à consulta livre, prévia e informada comrelação aos acontecimentos que possamafetar suas terras.

A Convenção requer que os governosadotem uma estratégia coordenada para

lidar com as questões trabalhistas dosíndios, supervisionando de maneira eficazseu recrutamento e suas condições detrabalho, e assegurando que estejamprotegidos contra práticas discriminatórias.Isso pressupõe o compromisso de respeitara importância especial que as terrastradicionais têm para os índios e dereconhecer seus direitos de propriedade e de posse. A Convenção afirma ainda que os povos indígenas não devem serremovidos das terras que ocupam. AConvenção expressa o direito dos povosindígenas de participarem dos processosdecisórios que os afetam; de decidiremsuas próprias prioridades em termos dedesenvolvimento; e de exercerem controlesobre seu próprio desenvolvimentoeconômico, social e cultural.

O Brasil estava entre os primeirosparticipantes do grupo de trabalho da ONUque redigiu a minuta da Declaração e quevotou a seu favor na Assembléia Geral. Ao votar, o país saudou a Declaração eobservou que os povos indígenas do Brasil“eram cruciais ao desenvolvimento dasociedade em todos os níveis, inclusive ao desenvolvimento da vida espiritual ecultural de todos”

Anistia Internacional - Novembro de 2010 Índice: AMR 19/001/2011

Protesto realizado em Brasília, em maio de2009, durante o Acampamento Terra Livre – um evento anual em que os povos indígenasde todo o Brasil se unem para lutar por seus direitos.

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CONCLUSÃOO crescimento econômico sustentado que oBrasil vem apresentando na última décadatransformou o país numa das principaiseconomias mundiais. No entanto, as riquezasgeradas por esse crescimento não chegaram à maioria dos povos indígenas. Segundo oInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística,mais de 30 por cento dos indígenas brasileirosvivem em situação de pobreza extrema – maisque o dobro da percentagem verificada entre a população geral. E em nenhum outro lugaressa disparidade é tão evidente quanto noMato Grosso do Sul.

No momento em que o perfil do Brasil ganharelevo no plano internacional, o governo federaldeve tratar com seriedade os compromissosque assumiu com os direitos humanos.Sobretudo, o país deve resolver todas as

reivindicações por terras ainda pendentes eassegurar que o consentimento livre, prévio einformado dos índios seja um objetivo a serbuscado e conquistado com relação a todas asdecisões que afetem suas terras tradicionais.

“Já acabou nossa paciência.Passou de todos os limites eprazos. Queremos nossa terra,nossa liberdade.”

Líder indígena da comunidade de Passo Piraju, setembro de 2010

Índice: AMR 19/001/2011 Anistia Internacional - Novembro de 2010

Em 2006, a comunidade Guarani-Kaiowá dePasso Piraju retomou uma pequena porção desuas terras ancestrais. Entretanto, a comunidadecontinua cercada por plantações de cana-de-açucar, enfrentando ameaças dos pistoleiros.

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“A maioria dos indígenas doBrasil não está se beneficiandodo impressionante progressoeconômico do país e está sendosubmetida ao atraso provocadopela discriminação e pelaindiferença, sendo expulsa desuas terras e empurrada para o trabalho forçado.” Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Navi Pillay,em novembro de 2009, após uma visita oficial ao Brasil

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“Peça a eles que:

Cumpram com suas obrigações, assumidas

na Declaração sobre os Direitos dos Povos

Indígenas, na Convenção Nº 169 da OIT e na

Constituição brasileira, de resolver todas as

reivindicações ainda pendentes de terras

indígenas no Brasil de modo justo e imediato.

Investiguem profundamente todos os atos

de violência e de intimidação contra as

comunidades Guarani-Kaiowá; proporcionem às

comunidades ameaçadas proteção imediata e

acesso irrestrito a serviços básicos, como os de

saúde; e identifiquem, investiguem e levem à

Justiça os responsáveis por cometer abusos

contra as comunidades.

Apóiem os esforços dos promotores

federais para regularizar os empreendimentos

econômicos em terras que estejam em processo

de identificação e demarcação, a fim de garantir

que essas terras estejam em condições de prover

aos Guarani-Kaiowá o mínimo de seu padrão

adequado de vida, assim como a realização de

seus direitos econômicos, sociais e culturais.

Desenvolvam, junto com os povos indígenas,

um processo que garanta que eles sejam

consultados de modo livre, prévio e informado a

respeito de toda obra de infraestrutura que possa

ter algum impacto sobre suas terras tradicionais.

Assegurem que a FUNAI, trabalhando

juntamente com os promotores do trabalho,

supervisione o processo por meio do qual são

contratados os trabalhadores indígenas e

acompanhe todas as denúncias recebidas sobre

condições de trabalho degradantes, sobre

pagamentos irregulares e sobre práticas de

recrutamento discriminatórias.

Escreva para:

Ministro da Justiça

Exmo. Ministro Sr. José Eduardo Cardozo

Esplanada dos Ministérios,

Bloco “T”

70064-900 Brasília/DF, Brasil

Fax: +55 61 2025 7803

Saudação: Excelentíssimo Senhor Ministro

Secretária de Direitos Humanos

Exma. Secretária Sra. Maria do Rosário Nunes

Setor Comercial Sul,

Edifício Parque da Cidade Corporate

Quadra 9, Lote C, Torre A , 10º andar

70308-200 - Brasília/DF, Brasil

Fax: + 55 61 2025 9414

Saudação: Excelentíssima Senhora Secretária

A Anistia Internacional é um movimento global de 2,8 milhões deapoiadores, membros e ativistas, em mais de 150 países e territórios, querealiza campanhas para acabar com graves abusos dos direitos humanos.

Nossa visão é a de um mundo em que cada pessoa possa desfrutar de todosos direitos consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos e emoutras normas internacionais de direitos humanos.

A Anistia Internacional é independente de qualquer governo, ideologiapolítica, interesse econômico ou religião. Nosso trabalho é essencialmentefinanciado por contribuições dos nossos membros e por donativos do público.

TOME UMAATITUDE AGORA! ”

CARTA ABERTA DOS GUARANI-KAIOWÁ AO PRESIDENTE LULA, AGOSTO DE 2010

“Várias vezes ouvimos o senhor falar e nos prometer pessoalmente que iria resolver o

problema da demarcação de nossas terras Kaiowá Guarani. Não entendemos porque isso até

hoje não aconteceu [...] Agora, senhor presidente Lula, o senhor vem aqui na região do nosso

território Kaiowá Guarani, em Dourados, sem ter, em quase 8 anos de governo, praticamente

nada feito pelas nossas terras [...] Senhor Presidente, por favor, não prometa nada, mande

apenas demarcar nossas terras. O resto sabemos dos nossos direitos e vamos batalhar por

eles. Já esperamos demais e toda nossa enorme paciência acabou. Só esperamos não precisar

ir pelo mundo afora, na ONU e nos tribunais internacionais denunciar um governo em que tanto

esperamos [...] Não deixe nosso povo Kaiowá Guarani sofrendo tanto. Nosso povo continua

sendo morto que nem animal e muitos de nossos jovens se suicidam pela falta de esperança e

de terra. Sofremos demais com tanta violência em e contra nossas comunidades. Isso só vai

começar a mudar com a demarcação de nossas terras, juntamente com um plano de

recuperação ambiental e produção de alimentos.

Não fazemos pedidos, exigimos direitos. Demarcação de nossas terras com urgência para que

nosso povo volte a viver em paz, com felicidade e dignidade.”

Índice: AMR 19/001/2011PORTUGUESE: Fevereiro 2011 (Versão atualizada dodocumento AMR 19/014/2010)

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