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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO ASPECTOS JURÍDICOS DA CLONAGEM HUMANA NO BRASIL JULIANE ROGÉRIO ITAJAÍ-SC, JUNHO DE 2006

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPSCURSO DE DIREITO

ASPECTOS JURÍDICOS DA CLONAGEM HUMANA NO BRASIL

JULIANE ROGÉRIO

ITAJAÍ-SC, JUNHO DE 200 6

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPSCURSO DE DIREITO

ASPECTOS JURÍDICOS DA CLONAGEM HUMANA NO BRASIL

JULIANE ROGÉRIO

Monografia submetida à Universidadedo Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau deBacharel em Direito.

Orientador a: Professor a MSc Maria da Graça Melo Ferracioli

Itajaí-SC, junho de 2006

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AGRADECIMENTOS

Principalmente ao Senhor Deus, pois sem Ele aminha vida não teria sentido.

Aos meus pais, Wilibaldo e Rosane, pelaeducação e valores que me ensinaram desdecriança, e pelo apoio na realização deste sonho.

Ao meu namorado, Rodrigo, por todo o seucarinho e compreensão.

A todas as amizades que conquistei durante estes5 (cinco) anos de graduação, em especial Thiago,Grazziele, Daniel e André.

E a professora orientadora Maria da Graça MeloFerracioli, pelo seu vasto conhecimento,inteligência e paciência nos momentos deorientação.

Muito obrigada a todos!

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais, que são e sempre serão os meusguias e exemplos de vida, dedicação, honestidadee trabalho.

Ao meu namorado, por ser meu melhor amigo ecompanheiro.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a

Orientadora de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí-SC, junho de 2006

Juliane RogérioGraduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Juliane Rogério, sob o título

Direito e Clonagem Humana, foi submetida em 06 de junho de 2006 à banca

examinadora composta pelos seguintes professores: Professor MSc Antônio

Augusto Lapa, Professor MSc Emerson de Morais Granado e a Professora MSc

Maria da Graça Melo Ferracioli, e aprovada com a nota 10 (dez).

Itajaí-SC, junho de 2006

Professora M Sc Maria da Graça Melo FerracioliOrientadora e Presidente da Banca

Professor MSc Antônio Augusto LapaCoordenação da Monografia

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ART. Artigo

ATUAL. Atualizada

CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

CTNBIO Comissão Técnica Nacional de Biossegurança

ED. Edição

EUA Estados Unidos da América

OGM Organismos geneticamente modificados

ONU Organização das Nações Unidas

P. Página

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciênciae Cultura

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

BIODIREITO: estudo jurídico que, tomando por fontes imediatas a bioética e a

biogenética, teria a vida por objeto principal, salientando que a verdade científica

não poderá sobrepor-se à ética e ao direito, assim como o progresso científico

não poderá acobertar crimes contra a dignidade humana, nem traçar, sem limites

jurídicos, os destinos da humanidade. (In: DINIZ, Maria Helena. O estado atual do

biodireito. p. 08).

BIOÉTICA: O vocábulo bioética indica um conjunto de pesquisas e práticas

pluridisciplinares, objetivando elucidar e solucionar questões éticas provocadas

pelo avanço das tecnociências biomédicas. (...) Assim, seu estudo vai além da

área médica, abarcando psicologia, direito, biologia, antropologia, sociologia,

ecologia, teologia, filosofia, etc., observando as diversas culturas e valores. (In:

PEGORARO, Olinto A. Ética e Bioética – da subsistência à existência. p. 75).

CIÊNCIA: Conhecimento. Saber que se adquire pela leitura e meditação;

instrução, erudição, sabedoria. Conjunto organizado de conhecimentos relativos a

um determinado objeto, especialmente os obtidos mediante a observação, a

experiência dos fatos e um método próprio. Soma de conhecimentos práticos que

servem a um determinado fim. (In: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo

Dicionário Aurélio. p. 324).

CLONAGEM: a palavra clone deriva do grego klón, isto é, o broto da planta que,

quando quebrada, pode se desenvolver de forma semelhante à da planta-mãe.

Para os microbiólogos, o termo clone se aplica a uma população de

microorganismos geneticamente idênticos. Na biotecnologia da reprodução,

refere-se à produção de indivíduos idênticos em larga escala. Já em biologia

celular, refere-se à multiplicação de determinadas células em cultivo. (In: DINIZ,

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Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise e

perspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 67).

DIGNIDADE: é derivado do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em

regra se entende a qualidade moral, que, possuída por um pessoa, serve de base

ao próprio respeito em que é tida. (In: SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico.

p. 267).

DIREITO: derivado do latim directum, do verbo dirigere (dirigir, ordenar,

endireitar), quer o vocábulo, etimologicamente, significar o que é reto, o que não

se desvia, seguindo uma só direção, entendendo-se tudo aquilo que é conforme à

razão, à justiça e à eqüidade. Entende-se também como um complexo orgânico,

de que se derivam todas as normas e obrigações, para serem cumpridas pelos

homens, compondo o conjunto de deveres, aos quais não podem fugir, sem que

sintam a ação coercitiva da força social organizada. (In: SILVA, De Plácido e.

Vocabulário Jurídico. p. 268).

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SUMÁRIO

RESUMO............................................................................................ X

INTRODUÇÃO.................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ......................................... ............................................. 3

O DIREITO E A REVOLUÇÃO TECNOCIENTÍFICA............ .............. 31.1 DIREITO E CIÊNCIA ......................................................................................31.2 CLONAGEM: CONCEITOS E ASPECTOS HISTÓRICOS ....... .....................91.3 CLONAGEM VEGETAL E ANIMAL .................... .........................................13

CAPÍTULO 2 ......................................... ........................................... 18

BIOÉTICA E BIODIREITO.............................. .................................. 182.1 CONCEITOS...................................................................................................182.2 ASPECTOS HISTÓRICOS .............................................................................232.3 PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA E DO BIODIREITO......... ...................................302.4 BIOÉTICA E OS DIREITOS HUMANOS ................. .......................................35

CAPÍTULO 3 ......................................... ........................................... 41

NORMATIZAÇÃO DA CLONAGEM HUMANA.................... ............ 413.1 CLONAGEM HUMANA ................................ ..................................................413.2 CLONAGEM HUMANA REPRODUTIVA .................... ...................................453.3 CLONAGEM HUMANA TERAPÊUTICA E CÉLULAS-TRONCO ... ...............493.4 NORMATIZAÇÃO DA CLONAGEM HUMANA NO BRASIL ...... ...................53

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................... ............................... 64

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ...................... .................... 66

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RESUMO

Trata-se de uma monografia para a conclusão do curso de graduação em Direito,

abordando temas a respeito das implicações jurídicas da clonagem humana,

analisando aspectos da bioética, do biodireito e dos avanços tecnocientíficos,

envolvendo os seres humanos nos últimos anos. No primeiro capítulo, analisam-

se alguns aspectos do Direito e da Revolução Tecnocientífica, procurando-se

demonstrar a necessidade de uma estreita relação entre o primeiro e a Ciência,

para que juntos possam buscar uma melhor qualidade de vida, baseada em

princípios fundamentais, principalmente o da dignidade humana. No segundo

capítulo, procurou-se estabelecer alguns conceitos sobre a bioética e biodireito,

seus aspectos históricos e seus princípios, e a importância destes com outros

temas, como por exemplo, os Direitos Humanos, além da necessidade, urgente,

de interferência destes em pesquisas que envolvam seres humanos,

principalmente, a da clonagem humana. No último capítulo, aborda-se a clonagem

humana, além dos motivos que levam alguns estudiosos a defenderem-na, ou

criticarem-na. Foram apresentadas as suas formas, sejam estas reprodutivas ou

terapêuticas, além da possibilidade de utilização de células-tronco, e ainda os

fundamentos jurídicos que norteiam esta prática no Brasil.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como finalidade apresentar ao

leitor os conceitos e aspectos fundamentais da Clonagem Humana, em especial

os fundamentos jurídicos da mesma no Brasil.

O objeto institucional foi o de produzir a presente monografia

para a obtenção do título de bacharel em direito, pela UNIVALI.

Para tanto, principia–se no Capítulo 1, analisando o Direito e

a Revolução Tecnocientífica, o qual trata da necessidade de uma estreita relação

entre o Direito e a Ciência, para que juntos possam buscar uma melhor qualidade

de vida, baseada em princípios fundamentais, principalmente o da dignidade

humana. É apresentado, também, alguns conceitos e aspectos históricos da

clonagem, além da clonagem vegetal e animal.

O Capítulo 2, trata de estabelecer alguns conceitos sobre a

bioética e biodireito, seus aspectos históricos e seus princípios, além de buscar

demonstrar a íntima relação destes temas entre si e com outras áreas, como por

exemplo, os Direitos Humanos. Neste capítulo objetiva-se demonstrar a

necessidade, urgente, de interferência destes em pesquisas que envolvam seres

humanos, principalmente, a da clonagem humana, uma vez que não se tem como

calcular os riscos e prejuízos que tal técnica pode trazer para a sociedade

mundial.

No Capítulo 3, por ser o tema principal deste trabalho,

aborda-se a clonagem humana, as primeiras notícias sobre esta técnica, os

motivos que levam alguns estudiosos a defenderem-na. Destaca-se, também, a

diferença entre as formas de clonagem humana, a reprodutiva e a terapêutica, e a

possibilidade de utilização de células-tronco não apenas adultas, mas também

embrionárias, além, de apresentar-se os fundamentos jurídicos que norteiam esta

prática no Brasil.

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O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre o Direito e a Clonagem Humana.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

1. O avanço tecnológico possibilita que o homem possa ter acesso apráticas que propiciem uma melhor qualidade de vida, sendo que abioética e o biodireito atuam no sentido de norteá-lo, através daaproximação entre a Ciência e o Direito.

2. Pode-se clonar seres humanos para fins terapêuticos oureprodutivos.

3. Uma das vantagens da clonagem terapêutica, através das células-tronco embrionárias, por exemplo, é a cura de diversos problemaspatológicos, mas ao mesmo tempo, como uma das desvantagens, éque ainda, não se pode garantir com segurança, a eficácia de talmétodo.

4. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, atravésde seus princípios, busca nortear a prática da clonagem humana noBrasil.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fasede Investigação foi utilizado o Método Indutivo e o Relatório dos Resultadosexpresso na presente Monografia, é composto na base lógica Indutiva, e/ou outraque for a mais indicada1.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas asTécnicas do Referente, da Categoria, dos Conceitos Operacionais, da PesquisaBibliográfica e do Fichamento.

1 Sobre os métodos nas diversas fases da Pesquisa Científica, vide PASOLD, Cesar Luiz. Práticada Pesquisa Jurídica, cit. especialmente p. 99 a 107.

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CAPÍTULO 1

O DIREITO E A REVOLUÇÃO TECNOCIENTÍFICA

1.1 DIREITO E CIÊNCIA

Os recentes avanços tecnocientíficos, principalmente

aqueles relacionados com a vida humana, fizeram com que o Direito e a Ciência2,

esta demonstrada pela prática e aquele pela subjetividade3, se aproximassem

com um objetivo: fazer com que um completasse o outro.

A Ciência visa uma melhor qualidade de vida, esta

considerada por Dallari4 como um “valor jurídico”, entretanto, às vezes atropela

alguns princípios, valores, costumes e direitos dos cidadãos, devendo-se dar

ênfase para a dignidade humana5. A necessidade de que o Direito intervenha

nestes casos de abusos, é imprescindível.

2 Ciência : Conhecimento. Saber que se adquire pela leitura e meditação; instrução, erudição,sabedoria. Conjunto organizado de conhecimentos relativos a um determinado objeto,especialmente os obtidos mediante a observação, a experiência dos fatos e um método próprio.Soma de conhecimentos práticos que servem a um determinado fim. (In: FERREIRA, AurélioBuarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio. p. 324).3 Subjetividade : é o que está relacionado com o indivíduo. “Subjetivo. Do latim subjectivus(referente ao sujeito), como expressão jurídica não se afasta do sentido literal: é o que se refereao sujeito e a ele se destina. (In: SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. p. 774).4 DALLARI, Dalmo de Abreu. A vida humana como valor jurídico. Bioética e DireitosHumanos .Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/dalmodallari/dallari_bio.html.Acesso 21 set. 2005.5 Dignidade humana : é derivado do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em regra seentende a qualidade moral, que, possuída por um pessoa, serve de base ao próprio respeito emque é tida. (In: Vocabulário Jurídico. p. 267).

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Enfatizando-se esse princípio da dignidade humana, tem-se

o pensamento de Hooft6 no sentido de que a liberdade de investigação científica

não pode ser considerada como um direito absoluto, sendo que está limitada aos

direitos fundamentais, principalmente ao do “respeito à dignidade inalienável do

ser humano”, ao qual pode-se entender ser “um valor fundamental ou supremo de

todo o ordenamento jurídico nacional ou transnacional”, além de ser, juntamente

com o respeito aos direito humanos e as liberdades fundamentais, um princípio

fundamental da bioética.

A primeira advertência formal sobre os riscos que os

avanços científicos poderiam causar a dignidade humana foi feita através da

Convenção Americana de Direitos Humanos, em 1969, com base na Declaração

Universal dos Direitos Humanos de 1948, que em seu preâmbulo reivindica a

dignidade essencial do ser humano, invocando os direitos fundamentais,

adquirindo, assim, um caráter de princípio e valor fundamental, conforme relata

Dallari7.

Em 1975, a Organização das Nações Unidas – ONU,

elaborou a Declaração sobre a Utilização do Progresso Científico e Tecnológico

no Interesse da Paz e em Benefício da Humanidade. Este documento foi criado

com o objetivo de relacionar a busca por uma melhor qualidade de vida com os

direitos humanos, incluindo-se também, a dignidade humana, e liberdades

fundamentais, sejam estes sociais ou individuais. Diniz8 ao tratar deste assunto,

ressalta:

O respeito à vida humana digna , paradigma bioético, deve estar

presente na ética e no ordenamento jurídico de todas as

6 HOOFT, Pedro Frederico. A visão latino-americana. Mesa Redonda: A Justiça Frente àRevolução Científico-Tecnológica no Campo da Reprod ução Humana . R. CEJ, Brasília, n.º16, p. 65, jan./mar. 2002.7 DALLARI, Dalmo de Abreu. A vida humana como valor jurídico. Bioética e Direitos Humanos .8 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . 1. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2001, p.18-19.

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sociedades humanas. Isso foi acatado internacionalmente. ADeclaração sobre a Utilização do Progresso Científico eTecnológico no Interesse da Paz e em Benefício da Humanidade,(...), contém em seu art. 6º o seguinte: “Todos os Estadosadotarão medidas tendentes a estender a todos os estratos dapopulação os benefícios da ciência e da tecnologia e aprotegê-los , tanto nos aspectos sociais quanto materiais, das

possíveis conseqüências negativas do uso indevido do progressocientífico e tecnológico, inclusive sua utilização indevida parainfringir os direitos do indivíduo ou do grupo, em particularrelativamente ao respeito à vida privada e à proteção da pessoahumana e de sua integridade física e intelectual” (sem grifo nooriginal).

Na mesma linha de preocupações relacionadas com a vida

humana digna e o seu significado ético, tem-se o pensamento de Dallari9

informando que, no ano de 1993, ao ser criado, por iniciativa da Organização das

Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura - UNESCO, o Comitê

Internacional de Bioética, foi assinalado que “ele tinha sido criado em decorrência

das preocupações éticas suscitadas pelos progressos científicos e tecnológicos

relacionados com a vida, sobretudo no âmbito da genética”.

Ao se pronunciar sobre a dignidade humana, Souza10

ressalta os artigos 11 e 12, “a”, da Declaração Universal do Genoma Humano e

dos Direitos Humanos, de 1997:

E, como corolário, tem-se a regra do art. 11: Não serãopermitidas práticas contrárias à dignidade humana , tais como

a clonagem reprodutiva de seres humanos. Os Estados eorganizações internacionais são convidados a cooperar naidentificação de tais práticas e a determinar, nos níveis nacionalou internacional, as medidas apropriadas a serem tomadas paraassegurar o respeito pelos princípios expostos nesta Declaração.(...) Art. 12. a) os benefícios decorrentes dos avanços em biologia,

9 DALLARI, Dalmo de Abreu. A vida humana como valor jurídico. Bioética e Direitos Humanos .10 SOUZA, Carlos Fernando Mathias de. É possível clonar? Conseqüências jurídicas. MesaRedonda: Clonagem e vida humana – é possível avança r sem agredir? R.CEJ, Brasília, n.º16, p. 49-63, jan./mar. 2002.

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genética e medicina, relativos ao genoma humano, deverão sercolocados à disposição de todos, com a devida atenção para adignidade e os direitos humanos de cada indivíduo. (sem grifo no

original).

Diniz11 ao tratar da dignidade humana prevista na

Convenção sobre Direitos Humanos e Biomedicina, afirma que:

(...) foi adotada pelo Conselho da Europa em 19 de novembro de1996, após advertir no Preâmbulo que o mau uso da biologia e damedicina pode conduzir à prática de atos que colocam em risco adignidade humana , prescreve em seu art. 2º que “os interesses e

o bem-estar do ser humano devem prevalecer sobre o interesseisolado da sociedade ou da ciência”. (sem grifo no original)

Além da dignidade humana, deve-se ressaltar, também, o

“princípio da precaução” em relação ao Direito com a Ciência, conforme afirma

Dallari12, pois, os riscos das pesquisas científicas já haviam extrapolado a

individualidade, apresentando assim apenas o caráter coletivo. Juridicamente a

aplicação deste princípio significa exigência de um comportamento mais prudente,

para que se possa excluir a responsabilidade por culpa.

O princípio da precaução, intimamente ligado com o

princípio da dignidade humana e o da responsabilidade, faz com que, em casos

de dúvidas ou incertezas, por causa da necessidade de uma compensação dos

prejuízos que poderiam ser causados, os estudiosos tomassem mais cuidado com

as suas pesquisas. Assim sendo, a sociedade passaria a responsabilizar os

estudiosos que não tomavam as devidas precauções em relação as suas

pesquisas científicas.

11 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 19.12 DALLARI, Sueli Gandolfi. Direito e Ciência. Mesa Redonda: A Justiça frente à RevoluçãoCientífico-Tecnológica no campo da Reprodução Human a. Disponível em:http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/dalmodallari/dallari_bio.html. Acesso 21 set. 2005.

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Neste sentido, Dallari13 diz:

A sociedade passou a organizar, então, as formas de repartir osriscos considerados eminentemente sociais, reputando aresponsabilidade àquele que considerava justo que suportasse oprejuízo pecuniário, fosse ele o autor ou a vítima. Esse foi oclímax do seguro social, que, sem dúvida, também influiu para adiminuição na atenção dada ao comportamento individualimprudente. (...) Juridicamente a aplicação do princípio deprecaução nada mais é do que a exigência do comportamentoprudente, como condição para excluir a responsabilidade porculpa, o que exige a identificação do elemento voluntário nacaracterização do ato.

Acredita-se, portanto, que esse pensamento mais social faça

com que a Ciência seja capaz de controlar melhor os riscos que possam ser

causados, principalmente àqueles relacionados com a vida humana.

Leite14 em artigo que trata da clonagem humana sob o ponto

de vista jurídico, adverte sobre a “rapidez com que tem avançado a engenharia

genética”, e como a “legislação, não só no Brasil como nos outros países,

ressente-se de lineamentos mais precisos”.

Segundo pensamento de Marinho15 quando relata sobre a

relação entre as experiências científicas e o direito, tem-se que:

Na transição de uma para outra centúria, é natural que adiscussão se enriqueça de outros elementos, inclusive por maiordesenvolvimento da ciência e da pesquisa. (...) o revestimentojurídico e moral das teses contrapostas não permite desate fácil.

13 DALLARI, Sueli Gandolfi. Direito e Ciência. Mesa Redonda: A Justiça frente à RevoluçãoCientífico-Tecnológica no campo da Reprodução Human a.14 LEITE, Paulo Roberto Saraiva da Costa. Mesa Redonda: Clonagem Humana: questõesjurídicas . R. CEJ, Brasília, n.º 16, p. 7-12, jan./mar. 2002.15 MARINHO, Josaphat. O homem, as experiências científicas e o direito positivo. Mesa Redonda:Os Benefícios da Reprodução Humana . R. CEJ, Brasília, n.º 16, p. 13-28, jan./mar. 2002.

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Problemas que concernem à vida do ser humano e ameaçam suaidentidade, só ao correr do tempo e com a evolução da cultura,encontram solução razoável. Em domínio de tal natureza, não éaudácia, mas a reflexão que deve conduzir à decisão, sempregeradora de efeitos extensos. Perseverar na posição defendida,em tal caso, não significa defender o atraso, mas reivindicar oprogresso fundado na certeza científica .

Corroborando a idéia de que a Ciência avança muito mais

veloz do que o Direito, tem-se o pensamento de Farias16:

Nas últimas décadas, a comunidade internacional tomouconhecimento de espetaculares avanços no campo da biologiamolecular, centrados, substancialmente na engenharia genética.(...) Esses promissores avanços das ciências biológicas pegaramdesprevenidas as ciências do “dever ser”, a saber, a Ética e oDireito. Surge, com as inovações, uma série de indagações arespeito de novas formulações ao antigo dilema dos limites daatuação do ser humano na engenharia genética.

Conclui-se, portanto, que as pesquisas científicas são

inquietantes, velozes e muitas vezes incertas, principalmente àquelas

relacionadas com os seres humanos, visando uma melhor qualidade de vida.

Marinho17 acredita, ainda, que alguns cientistas buscam nessas pesquisas a

necessidade de extravasar sua “ânsia maior de descobrir, revelar, analisar um

fato, um fenômeno, um ângulo de algo desconhecido”. O Direito por sua vez,

prioriza a dignidade humana, visto esta como direito fundamental de cada

indivíduo, buscando uma solução razoável, motivo pelo qual acaba evoluindo de

forma mais lenta do que as pesquisas científicas.

Entre as possibilidades científicas resultante dos avanços

tecnológicos, encontra-se a clonagem, tema atual muito complexo, que pode

16 FARIAS, Paulo José Leite. A clonagem humana: enfoque ético e jurídico da violação dadignidade da pessoa humana. Biodireito e Bioética . 1.ed. Rio de Janeiro: Editora AméricaJurídica, 2005, p. 269.17 MARINHO, Josaphat. O homem, as experiências científicas e o direito positivo. Mesa Redonda:Os Benefícios da Reprodução Humana . p. 13-28.

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trazer inúmeros benefícios aos seres vivos. Entretanto, em alguns casos,

enormes prejuízos poderiam ser causados se não fossem observados as regras

jurídicas e princípios fundamentais pertinentes ao caso, os quais têm como

objetivo o bom desenvolvimento e relacionamento global.

1.2 CLONAGEM: CONCEITOS E ASPECTOS HISTÓRICOS

Antes de se iniciar o relato sobre a possibilidade de

clonagem e o seu conceito, é válido destacar dois grandes marcos da história, no

desenvolvimento desses tipos de pesquisas, conforme cita Ferraz18:

Na década de 1970, aconteceram duas grandes revoluçõescientíficas. Em primeiro lugar, desenvolveu-se o embrião fora doaparelho reprodutor feminino (...). Em segundo lugar, aconteceuoutra novidade: a da possibilidade – por enquanto ainda deimprevisível fim – de prolongamento extraordinário dessa vidamediante técnicas de congelamento. Em 1997, “caiu umverdadeiro meteorito na cabeça de todos nós” quando oscientistas criaram a ovelha Dolly19. Isso até então era meraespeculação científica ou literária, (...) e de repente se obtinhauma concretização: surgiu uma ovelha clonada.

Tepedino20 afirma que “a clonagem surge como um

momento culminante do desenvolvimento de técnicas de manipulação celular e

genética”, colhendo desprevenidos os intérpretes, pensadores e juristas, “gerando

18 FERRAZ, Sérgio. Aspectos Constitucionais na Clonagem Humana. Mesa Redonda: A JustiçaFrente à Revolução Científico-Tecnológica no Campo da Reprodução Humana . R. CEJ,Brasília, n.º 16, p. 64-84, jan./mar. 2002.19 Dolly : foi criada por Ian Wilmut e Keith Campbell, juntamente com os membros do InstitutoRoslin e da PPL, em 1996. “(...) clonamos Dolly a partir de uma célula que havia sido removida daglândula mamária de uma ovelha mais velha e então cultivada in vitro. Quando isto aconteceu, aovelha em questão já estava morta há muito tempo. Nós fundimos a célula obtida por cultura como óvulo de uma outra ovelha para ‘reconstruir’ um embrião que transferimos para o útero de umamãe ‘substituta’, onde se desenvolveu até o nascimento de uma ovelha. Esta foi a ovelha quechamamos de Dolly: não exatamente o primeiro mamífero a ser clonado, mas com certeza oprimeiro a ser clonado a partir de uma célula do corpo”. (In: WILMUT, Ian; CAMPBELL, Keith;TUDGE, Colin. Dolly, a segunda criação. p. 25).20 TEPEDINO, Gustavo José Mendes. Clonagem: pessoa e família nas relações do Direito Civil.Mesa Redonda: Clonagem e vida humana: é possível av ançar sem agredir? R. CEJ, Brasília,n.º 16, p. 49-63, jan./mar. 2002.

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perplexidades no que tange às conseqüências jurídicas possíveis das novas

técnicas de manipulação, de procriação e, finalmente, da própria clonagem”.

A palavra clone possui vários significados, dependendo

estes da área específica em que é tratado, conforme relata Diniz21:

A palavra clone deriva do grego klón, isto é, o broto da planta que,quando quebrada, pode se desenvolver de forma semelhante à daplanta-mãe. Para os microbiólogos, o termo clone se aplica a umapopulação de microorganismos geneticamente idênticos. Nabiotecnologia da reprodução, refere-se à produção de indivíduosidênticos em larga escala. Já em biologia celular, refere-se àmultiplicação de determinadas células em cultivo.

Hooft22, citando Juan Ramón Lacadena, define clone como

sendo “(...) um grupo de organismos de idêntica constituição genética que

procedem de um único indivíduo, mediante multiplicação assexual, sendo por sua

vez iguais entre si”.

Assim sendo, Vieira23 ressalta que a clonagem é uma

“reprodução idêntica de um sistema ou estrutura”, e ainda descreve sobre os

meios que a clonagem pode ocorrer:

A clonagem pode ocorrer por meio natural ou artificial, onde,aumentando-se a população de células ou organismos vivos,parte-se de um indivíduo único e sem que estejam implicadas ascaracterísticas da reprodução sexuada.

21 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. 1.ed. Curitiba: EditoraJuruá, 2003, p. 67.22 HOOFT, Pedro Frederico. A visão latino-americana. Mesa Redonda: A Justiça frente àRevolução Científico-Tecnológica no campo da Reprod ução Humana. p. 64-84.23 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . 2. ed. atual. São Paulo: Editora JurídicaBrasileira, 2003, p. 25.

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Com base na obra La Clonazione, de Roberto Colombo,

Diniz24 afirma ser a clonagem “uma forma de reprodução assexuada que tem por

base um único patrimônio genético e é feita artificialmente”.

Quanto à utilização da clonagem sob o ponto de vista

histórico, com base no pensamento de Vieira25, tudo se iniciou através da

clonagem de plantas utilizadas pela agronomia, sendo que a clonagem em seres

vivos teve início apenas na década de 60:

Relatam alguns que a experiência do irlandês Ian Wilmut não écompletamente nova. Métodos semelhantes já haviam sidousados por J.B. Gurdon no Reino Unido, em 1962, em experiênciacom um sapo sul-africano. O pesquisador destruiu o núcleo doóvulo de uma célula do intestino de um girino, obtendo girinosnormais. Na década de 80, a empresa americana GranadaBiosciences, (...), inseminou centenas de vacas com embriõesclonados. Interrompeu-se a pesquisa quando se descobriu que uma cada cinco bezerros nascia maior que o normal e um a cadavinte era gigante, chegando a pesar 95 quilos.

Vieira26 relata, também, sobre a divulgação feita pelo jornal

inglês The Sunday Times, o qual publicou que, antes dos pesquisadores

conseguirem chegar a clonagem de duas ovelhas idênticas, pelo menos seis

“monstros genéticos”, denominados assim pelas grandes deformidades, foram

criados, não conseguindo sobreviverem até o término do experimento.

Ainda tratando sobre a evolução da clonagem, Diniz27

apresenta, além das experiências acima expostas, a da primeira clonagem bem-

sucedida:

24 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 67.25 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 24.26 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 24.27 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 418.

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A primeira clonagem bem-sucedida de um mamífero ocorreu em1988, com um rato, por obra dos cientistas Kal Hillmensee e PeterHoppe, que extraíram o núcleo de uma célula embrionária de umarata cinzenta, introduzindo-o numa célula-ovo previamentedesnucleada de uma rata preta. Esse zigoto modificado foitransferido para o útero de uma rata branca, dando origem a trêsratinhos cinzentos, idênticos ao embrião que doou o núcleo. Essatécnica de Hillmensee e Hoppe seria mais um transplante denúcleo do que uma autêntica clonagem, pois esta deveriaconstituir na reprodução de um organismo completo a partir donúcleo de qualquer célula somática, e não de uma célulaembrionária indiferenciada. Em Beaverton, no ano de 1996, essamesma técnica foi utilizada pela cientista Don Wolf, que conseguiuclonar macacos, mas estes não eram geneticamente idênticos,pois foram criados a partir de células de embriões de primatasdiferentes.

Após a morte da ovelha Dolly, os cientistas que a clonaram,

Ian Wilmut e Keith Campbell, escreveram a experiência na obra Dolly, a segunda

criação. Nesta obra, Ian e Keith28, explicam qual é objetivo para eles da

clonagem:

Não tentamos simplesmente clonar animais – produzir fac-símilesde seres existentes. Não estamos interessados principalmente emmultiplicar uma elite de animais de criação pecuária e, menosainda, queremos clonar seres humanos. (...) A clonagem, paranós, é e sempre foi um exercício de ciência – descobrir comofuncionam as células – e uma tecnologia que possibilite atransformação genética de animais.

Com base nos estudos realizados até agora e seguindo o

pensamento de Zatz29, se pode questionar sobre a verdadeira necessidade de

clonar seres vivos, pois, estes clones podem, por exemplo, sofrer de doenças que

as suas matrizes estejam sofrendo por causa da idade, como artrite e

28 WILMUT, Ian; CAMPBELL, Keith; TUDGE, Colin. Dolly, a segunda criação . Tradução de AnaDeiró. 1. ed. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2000, p. 73.29 ZATZ, Mayana. Genética e ética. Mesa Redonda: Os benefícios da Reprodução Humana . R.CEJ, Brasília, n.º 16, p. 13-28, jan./mar. 2002.

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reumatismo, vindo a falecer muito novos por causa de tais doenças e de suas

células terem idade avançada, como ocorreu com a ovelha Dolly, ou até mesmo

nem sobreviverem porque nascem como monstros genéticos, como antes

mencionados.

Será que o avanço da tecnologia não permite outras formas

de se chegar aos resultados procurados? Quais são as conseqüências da

clonagem a longo prazo? O que será feito com os clones defeituosos,

principalmente nos casos de clonagem humana? Essas e outras perguntas são as

que a Bioética e o Biodireito procuram responder, ao mesmo tempo em que

buscam estabelecer critérios para que essas pesquisas não extrapolem a razão,

os costumes, os valores éticos, a dignidade humana, etc.

A clonagem pode ser vegetal, animal ou humana, sendo que

esta última será tratada no próximo capítulo com ênfase especial, já que se trata

de um dos temas principais deste trabalho de pesquisa. Cabe, portanto, destacar

antes da abordagem da clonagem humana, as suas outras formas, pois auxiliarão

na compreensão das implicações científicas, éticas e jurídicas de tal prática.

1.3 CLONAGEM VEGETAL E ANIMAL

Como já mencionado a clonagem de seres vivos teve seu

início por volta do século XIX. As primeiras tentativas se deram com as plantas,

pois, é o ser vivo menos complexo, sendo sua reprodução assexuada. A

clonagem pode ser realizada através da raiz, do caule, das folhas ou de apenas

uma única célula da planta.

Pereira30, ao relatar sobre a clonagem de plantas, explica

como se realiza a clonagem através de um pedaço da planta:

30 PEREIRA, Lygia da Veiga. Clonagem – fatos e mitos . 1. ed. São Paulo: Editora Moderna,2002. p. 20.

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(...), um pedaço do caule com folhas pode ser cortado de umaplanta e colocado em um meio adequado para aquela espécie.Esse meio por ser areia úmida, uma mistura de terra e fungos, oumesmo água. Depois que as raízes se desenvolvem a partir dopedaço de caule, esse clone é transferido para a terra onde sedesenvolverá normalmente como a planta matriz.

Há, também, uma prática bem conhecida entendida por

muitos como uma forma de clonagem, utilizada não apenas por cientistas e

pesquisadores, como também pessoas comuns, que se dedicam, por exemplo, a

cuidar das plantas do quintal de suas casas. É a prática do enxerto. Neste caso,

há uma mistura de características das plantas que foram enxertadas. Pereira31

descreve tal prática de uma forma bem simples:

(...) um pedaço do caule de uma planta é enxertado no caule comraízes de outra planta, criando assim uma planta híbrida. Por meiodeste método são cultivadas as frágeis rosas ornamentais,enxertadas no caule de rosas selvagens mais resistentes. Acimada terra, as plantas resultantes possuem as características dasroseiras ornamentais, com flores lindas e perfumadas, enquanto aabaixo da terra possuem raízes fortes e resistentes das roseirasselvagens.

Cabe ressaltar que a clonagem de plantas pode ser um meio

excelente para uma melhor produção, mas se, por exemplo, alguma praga atacar

uma plantação de plantas clonadas, esta pode ser destruída inteira, pois, se uma

delas é suscetível aquela determinada praga, todas serão, uma vez que são

geneticamente idênticas.

Quanto a clonagem de animais, esta é bem mais complexa,

requerendo uma técnica mais sofisticada do que a da clonagem de plantas. As

primeiras tentativas que obtiveram sucesso foram as realizadas, como visto, com

sapos, na década dos anos 50.

31 PEREIRA, Lygia da Veiga. Clonagem – fatos e mitos . p. 20.

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Espósito32 afirma serem duas as técnicas utilizadas para a

clonagem de animais: a da bipartição de zigotos ou fissão gemelar e a da

transferência de núcleo.

A primeira técnica é considerada a mais simples, pois

apenas se imita a natureza quando os produz gêmeos univitelinos. Ou seja, há

uma estimulação artificial de um zigoto para que este se divida em duas ou mais

vezes, sendo assim, cada um desses organismos gerados, uma cópia idêntica do

outro.

Cabe destacar que nessa técnica, os clones não são

idênticos a nenhum dos seus progenitores, mas são idênticos apenas entre si.

Pereira33 quanto descreve a técnica da bipartição, ressalta

que:

(...) com a bipartição de embriões passamos a poder produzir dedois a quatro animais geneticamente idênticos, ou clones, e issorepresenta um potencial econômico importante (...). Porém, comoestamos reproduzindo cópias de um embrião, não sabemos ascaracterísticas que o animal adulto desenvolverá. Ou seja, abipartição é uma clonagem “às cegas”, na qual não sabemos bemquem estamos clonando. E, como isso tudo começou com oobjetivo de gerar cópias de um ser vivo com característicasinteressantes, apesar de ter alguma aplicação na pecuária abipartição ainda não é o método de clonagem que estamosprocurando.

A técnica da transferência de núcleo é mais complexa do

que a anterior, mais foi através dela que foi realizada a clonagem mais famosa do

mundo: a da ovelha Dolly.

32 ESPÓSITO, Breno Pannia. DNA e engenharia genética . Ed. atual. São Paulo: Editora Atual,2005.33 PEREIRA, Lygia da Veiga. Clonagem – fatos e mitos . p. 25.

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Esta técnica se dá, basicamente, da remoção do núcleo de

um óvulo ou de um zigoto, introduzindo neste o núcleo de uma célula somática,

onde será estimulada a crescer até atingir a fase do desenvolvimento embrionário

onde possa ser introduzido em uma fêmea preparada para recebê-lo, conforme

explicação de Espósito34.

Ressalta ainda:

O que se faz, em suma, é fabricar um embrião em laboratório, sóque com a peculiaridade de não ter havido a contribuição de um“pai”: o tal embrião artificial produzirá um animal geneticamenteidêntico àquele que lhe doou o núcleo, ainda que infantil.

Na obra Dolly, a segunda criação, Wilmut e Campbell35

antes de explicarem todas as descobertas e problemas enfrentados enquanto

tentavam concluir a pesquisa da clonagem de uma ovelha, afirmam que a ovelha

Dolly “não é tão similar à sua mãe quanto gêmeos idênticos seriam. Ela é

simplesmente um clone genômico ou de DNA”. Afirmam ainda que “seres como

nós geralmente não se replicam através de clonagem, mas o desenvolvimento de

todos os seres multicelulares – inclusive nós – envolve clonagem”.

Espósito36 ao destacar a clonagem da ovelha Dolly, afirma

que:

Dolly foi clonada a partir das células das mamas de uma ovelhade 6 anos de idade. Em 1999, os cientistas que a acompanhavamfizeram testes genéticos na ovelha e verificaram, (...) que o DNAde Dolly era “mais velho” do que o seu corpo – o que é uma formade dizer que Dolly teria nascido com uma idade genéticasemelhante à do animal que lhe doou o núcleo celular: 6 anos.Somando-se aos 6 anos que tinha quando morreu, isso significa

34 ESPÓSITO, Breno Pannia. DNA e engenharia genética .35 WILMUT, Ian; CAMPBELL, Keith. Dolly, a segunda criação . p. 81.36 ESPÓSITO, Breno Pannia. DNA e engenharia genética .

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que seu corpo “morreu cedo”, mas geneticamente parou defuncionar no “momento certo”.

Com esta afirmação pode-se concluir que ainda é muito

cedo para se pensar em clonar seres humanos como muitos pesquisadores

querem fazer, pois, se já é complicado a clonagem de animais, sendo necessárias

mais pesquisas em torno deste assunto, imaginem a clonagem de seres

humanos, que é o ser mais completo e complexo. Cabe ressaltar ainda que para

se chegar a clonagem com sucesso da ovelha Dolly, foram necessárias mais de

250 tentativas frustradas. Como comparar este número, seja de tentativas de

clonagem animal ou humana, com a de gravidez normal? Será que o princípio da

dignidade humana estaria sendo preservado? E o da precaução das pesquisas

científicas?

Assim, por causa destas e outras dúvidas, faz-se necessário

um estudo aprofundado sobre os temas que norteiam a clonagem humana, antes

de se posicionar a favor ou contra ela. Entre estes temas, encontra-se a bioética e

o biodireito, os quais são os mais importantes pois, a primeira é a disciplina ética

que visa esclarecer os problemas relacionados com o avanço tecnocientífico, e o

segundo tem como objetivo normatizar as questões que envolvem além da

bioética, a vida em geral.

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CAPÍTULO 2

BIOÉTICA E BIODIREITO

2.1 CONCEITOS

A Bioética e o Biodireito são temas atuais muito complexos,

razão pelo qual, antes de se iniciar qualquer estudo a seu respeito, seja nas

relações que existem entre si, ou a outros temas, seus aspectos históricos, suas

evoluções e aplicações na sociedade atual, deve-se estabelecer seus conceitos.

É importante salientar que não existe um conceito

específico, imutável, seja para a bioética ou para o biodireito. A discussão é

grande, e às vezes até conflitante, entre estudiosos destas temáticas, pois, alguns

têm a visão mais voltada para a área médica, outros para a jurídica, e outros

ainda possuem uma visão puramente científica.

Neste sentido, tem-se o pensamento de Screccia37 quando

relata sobre o problema da definição de um conceito da bioética:

Há os que classificam a bioética como um movimento de idéiashistoricamente ou historicisticamente mutáveis; os que aconsideram antes uma metodologia de confronto interdisciplinarentre ciências biomédicas e ciências humanas; os que levam areflexão bioética a uma articulação da filosofia moral, e os quejulgam que hoje essa reflexão pode ser definida como umadisciplina autônoma, a qual tem um papel próprio não identificávelnem com a deontologia nem com a medicina legal ou com osdireitos do homem (...), e não pode ser considerada uma seção damais conhecida e antiga ética médica.

37 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética – fundamentos e ética biomédica. 1. ed. São Paulo:Editora Loyola, 1996, p. 42-43.

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Para Pegoraro38, a bioética é a disciplina ética que:

(...) se transformou em torno de pesquisas, práticas e teorias quevisam interpretar os problemas levantados pela biotecnociência epela biomedicina. (...) Ela se situa na confluência do sabertecnocientífico, especialmente biológico, com as ciênciashumanas, como a sociologia, a política, a ética e a teologia.

Os valores éticos e os conhecimentos biológico e

tecnocientífico são o alicerce da bioética. Esta, por sua vez, visa amenizar os

problemas gerados entre eles, pois, muitas vezes, a tecnologia buscando uma

melhor qualidade de vida, atropela os direitos fundamentais, os costumes e

valores éticos.

Reforçando tal pensamento, Vieira39 diz que:

O vocábulo bioética indica um conjunto de pesquisas e práticaspluridisciplinares, objetivando elucidar e solucionar questõeséticas provocadas pelo avanço das tecnociências biomédicas. (...)Assim, seu estudo vai além da área médica, abarcando psicologia,direito, biologia, antropologia, sociologia, ecologia, teologia,filosofia, etc., observando as diversas culturas e valores.

Esclarecendo o universo da bioética, Diniz40 traz a

Encyclopedia of Bioethics, que foi modificada em 1995, e que define a bioética

como o “estudo sistemático das dimensões morais da ciência da vida e do

cuidado da saúde, utilizando uma variedade de metodologias éticas num contexto

multidisciplinar”.

38 PEGORARO, Olinto A. Ética e Bioética – da subsistência à existência. 1. ed. Rio de Janeiro:Editora Vozes, 2002, p. 75.39 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 15-16.40 DINIZ, Maria Helena.. O estado atual do biodireito . p. 10.

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Para reforçar tal idéia, Vieira41 cita os dizeres de José

Alberto Matnetti:

(...) a bioética responde ao deslocamento dos pontos dereferência tradicionais da vida – as novas formas de nascer,procriar e morrer -, com o intuito de impedir uma tecnociênciademiúrgica sem conseqüência.

Assim, percebe-se que ainda não há um conceito definitivo

sobre a bioética. Há muitas divergências; alguns estudiosos crêem que a bioética

deva abranger outros campos além da medicina, como por exemplo o direito, a

psicologia, a teologia, a sociologia, a filosofia, etc. Outros, no entanto, são

categóricos em afirmar que a bioética está relacionada apenas com a área

médica.

Fernandes42, citando o conceito de bioética entendido por

Christian de Paul Barchifontaine, deixa bem claro o objetivo que deve ser

alcançado pela bioética:

O conceito de Bioética será entendido como um grito peloresgate da dignidade humana em face dos progressos técnico-científicos na área da saúde, bem como em face das condições devida socio-econômico-políticas, através de um diálogomultidisciplinar e pluralista. (sem grifo no original)

Para melhor definir o conceito de bioética, Diniz43 traz as

palavras de Volnei Ivo Carlin, que define a bioética como sendo:

41 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 16.42 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do bio direito –Aspectos do Direito de Família e do Direito das Sucessões. 1.ed. Florianópolis: Editora DiplomaLegal, 2000, p. 35.43 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 58-59.

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(...) uma maneira de regulamentação das novas práticasbiomedicinais, atingindo três categorias de normas: deontológicas,éticas e jurídicas, a exigirem comportamento ético nas relaçõesentre a biologia, medicina e direito. Corresponde a tudo que dizrespeito à vida (bio + ética), ou seja, é a ética da vida ou do vivo:bioética ou ética aplica à vida, no sentido etimológico.

Este seria o melhor conceito de bioética para os dias atuais.

Não pode haver um avanço tecnológico sem os devidos cuidados, sem normas

que o controle, que diga o que se pode ou o que não se pode fazer, onde se

aplicar, para que fins, etc. Principalmente quando este avanço tecnológico se

refere à vida humana.

Dentro deste enfoque, conforme o pensamento de Diniz44,

“não há como desvincular as ‘ciências da vida’ do direito”. Assim sendo, surge

uma nova disciplina, visando melhorar o relacionamento dos avanços tecno-

científicos com as normas jurídicas, qual seja o Biodireito.

Em relação a esta nova disciplina, Diniz45 relatando sobre os

avanços científicos, afirma que “o biodireito seria o estudo das questões

relacionadas a tal avanço sob o prisma legal e jurídico”.

Na verdade, este é um conceito muito generalizado. O

Biodireito é um ramo do Direito que visa tutelar todos os direitos relacionados à

vida, e não só apenas aqueles que têm relação com os avanços tecnocientíficos.

Neste sentido, Fernandes46 relata:

44 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 09.45 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 58.46 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do bio direito –Aspectos do Direito de Família e do Direito das Sucessões. p. 42.

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(...) o biodireito nada mais é do que a produção doutrinária,legislativa e judicial acerca das questões que envolvem a bioética.Vai desde o direito a um meio-ambiente sadio, passando pelastecnologias reprodutivas, envolvendo a autorização ou negaçãodas clonagens e transplantes, até questões mais corriqueiras eainda inquietantes como a dicotomia entre a garantiaconstitucional do direito à saúde, a falta de leitos hospitalares e aequânime distribuição de saúde à população (sem grifo nooriginal).

Ainda na idéia de Fernandes47:

Assim, pode-se afirmar que o biodireito tem como uma de suastarefas a regulamentação dos avanços da biotecnologia para quepossam ser utilizados para o bem do ser humano, mantendo suadignidade, e não para sua destruição ou reificação, qual seja, suaredução à condição de coisa (sem grifo no original).

Diniz48 ao relatar sobre a necessidade do Direito intervir nos

desafios lançados pela bioética, afirma que:

(...) surge uma nova disciplina, o biodireito, estudo jurídico que,tomando por fontes imediatas a bioética e a biogenética, teria avida por objeto principal, salientando que a verdade científica nãopoderá sobrepor-se à ética e ao direito, assim como o progressocientífico não poderá acobertar crimes contra a dignidadehumana, nem traçar, sem limites jurídicos, os destinos dahumanidade.

Após os conceitos apresentados sobre Bioética e Biodireito,

no próximo item serão abordados alguns aspectos históricos sobre o surgimento e

a evolução destes temas.

47 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do bio direito –Aspectos do Direito de Família e do Direito das Sucessões. p. 42.48 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 08.

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2.2 ASPECTOS HISTÓRICOS

A bioética, apesar de só ter tomado “corpo” na década de

70, com a publicação do livro do americano Van R. Potter, desde 1907 já havia

discussão sobre tal tema, conforme relata Diniz49:

Embora se indique que o termo bioética tenha sido criado em1971, no título do oncologista americano Van R. Potter, Bioethics,bridge to the future , já se discutia o assunto desde 1907, com o

movimento eugênico que culminou na criação de sociedades, como fim de discutir a questão, conforme sustenta Heloísa HelenaBarbosa.

Sobre o surgimento da bioética, Fernandes50 ressalta que

“apesar deste neologismo ter ocorrido apenas no início da década de 1970”, e

cita Warren T. Reich, que é categórico ao afirmar que “o ensino da moral e

questionamentos éticos quanto à saúde (...) tem existido (...) há séculos”.

Reforçando tal idéia, Vieira51 expõe que “o termo bioética

apareceu pela primeira vez em 1971 no título da obra de Van Rens Selaer Potter

(Bioethics: bridge to the future, Prenctice Hall, Englewood Clifs, New York)”.

No mesmo sentido, Oliveira52, ao falar sobre a bioética,

relata que:

O vocábulo popularizou-se a partir de janeiro de 1971, quando obiólogo e oncologista Rensselaer Potter, da Universidade deWisconsin, Madison, EUA, publicou o livro Bioética: a ponte para o

49 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 59.50 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do bio direito –Aspectos do Direito de Família e do Direito das Sucessões. p. 31.51 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 15.52 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma nova face da cidadania. Coleção Polêmica. 2. ed. SãoPaulo: Editora Moderna, 1997, p. 48.

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futuro. Disse Potter: “Escolho ‘bio’ para representar oconhecimento biológico dos sistemas viventes, e escolho ‘ética’para representar o conhecimento dos sistemas dos valoreshumanos”. Foi Andre Hellegers, obstreta, fisiologista fetal edemógrafo holandês, da Universidade de Georgetown, quem usouo termo para aplicá-lo à ética na medicina e nas ciênciasbiológicas, ao fundar, em julho de 1971, o Joseph and RoseKennedy Institute for the Study on Human Reproduction ofBioethics.

Vale destacar que Van R. S. Potter escreveu em sua obra,

não tem ligação com o objetivo da bioética atual. A sociedade se transformou

muito nestes últimos anos, fazendo com que o conceito de bioética fosse também

transformado, ou seja, antes se pensava em cuidar da evolução tecnológica; hoje

tem-se que tal evolução já aconteceu e que as normas, os costumes, os valores

humanos, continuam os mesmos, sem terem conseguido acompanhar a

velocidade da tecnologia e da ciência. Reforçando tal idéia, afirma Vieira53 que:

Na verdade o livro de Potter não tinha muita relação com o quehoje chamamos de bioética. Para ele, a finalidade da bioética éauxiliar a humanidade no sentido de participação racional, porémcautelosa no processo da evolução biológica e cultural.

Barreto54, numa visão mais filosófica, quando trata dos

aspectos históricos da bioética, afirma que:

A bioética é um ramo da ética filosófica, fruto de um tempo, deuma cultura e de uma civilização. Quando falamos em bioéticaestamos tratando de uma área de conhecimento, nascida hásomente cerca de meio século, ainda que alguns de seus temascentrais – a saúde, a vida e a morte – tenham a ver com asorigens da reflexão filosófica e da medicina na cultura do

53 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 15.54 BARRETO, Vicente de Paulo. Velhos temas, novas perplexidades. Bioética, Biodireito eDireitos Humanos , 25 abr. 2005. Disponível em:http://www.dhnet.org.br/direitos/direitosglobais/paradigmas_textos/v_barreto.html. Acesso 25 abr.2005.

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Ocidente. (...) A bioética nasce, assim, como uma resposta adesafios encontrados no corpo de uma cultura, de um paradigmado conhecimento humano e de uma civilização. Antes de tudo, é aexpressão teórica da consciência moral de um novo tipo dehomem no seio de uma nova cultura e civilização.

A bioética surge com o intuito de resolver os problemas

criados pela avanço tecnocientífico, conforme já citado. Indo além disso,

Pegoraro55 afirma que, historicamente, foi uma linha de pensamento sobre três

importantes temas que deu início a bioética, quais sejam:

O primeiro refere-se às descobertas tecnocientíficas. Estesavanços não significam necessariamente uma melhoria para avida humana, pois nem tudo o que é possível fazer cientificamenteé ipso facto bom para a vida. (...) O segundo tema, importante dabioética é a eco-ética, que se ocupa do ambiente onde nascem,vivem e morrem as formas de vida. (...) O terceiro tema dabioética é a revelação da tecnociência com as três formas de vida.A manipulação genética de plantas, de animais e do ser humanopode desequilibrar as espécies ou mesmo fazê-las desaparecer.

Com uma visão diferente, Elio Sgreccia, citado por Diniz56,

trata da origem da bioética a partir do processo de Nuremberg57:

Alguns colocam o nascimento da bioética, mesmo não tendoainda tal denominação, nos dias seguintes ao processo de

55 PEGORARO, Olinto A. Ética e Bioética – da subsistência à existência. p. 77.56 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 64.57 Nuremberg : Durante a Segunda Guerra Mundial alguns países como a Alemanha e o Japão,realizaram diversas experiências cruéis como por exemplo o grau de tolerância e de sobrevivênciaem grandes altitudes, os limites da vida humana submetida ao congelamento, vacinas e remédiospara doenças como a febre tifóide e a malária, a resistência humana a certos venenos, armasbacteriológicas, e ainda experiências ditas genéticas. Alegavam, ainda, que estavam “fazendociência”. Com isso, os países vencedores (EUA, ex-URSS e Inglaterra), em 1945, decidiraminvestigar e analisar essas suspeitas, montando o Tribunal de Nuremberg , onde foram colhidasinformações que indicavam ser necessário elaborar, urgente, novos princípios orientadores dasexperiências em seres humanos. Em 1947, com a confirmação desses atrocidades “científicas” daSegunda Guerra, surgiu o Código de Nuremberg , que “baseia-se na afirmativa de que nenhumaexperimentação poderá visar objetivos políticos, eugênicos ou bélicos”. (In: OLIVEIRA, Fátima.Bioética – uma face da cidadania. p. 52).

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Nuremberg em 1946. Depois de tal processo, do qual apareceramnumerosos crimes cumpridos pelos médicos nazistas sobreprisioneiros, utilizados como cobaias humanas em terrificantesexperimentações, surgiram duas linhas de reflexão: uma denatureza jurídica em campo internacional, que tinha como escopoa formulação dos “direitos do homem” (...); a outra de naturezafilosófica, que se delineava sempre mais na fundamentação éticae racional de tais direitos.

Importante ressaltar as palavras de Hubert Lepargneur,

citadas por Fernandes58, que acredita que:

(...) a bioética nasceu, nos Estados Unidos, de preocupaçõespráticas, visando a salvaguardar direitos humanos ameaçados.Não nasceu na teoria dos moralistas, emergiu de antinomias dapráxis, que exigiam decisões com certa urgência.

No pensamento de Oliveira59, a bioética é “uma demarcação

histórica do reencontro da biologia com a filosofia, agora no contexto da era da

informática e das manipulações genéticas”.

Quanto ao biodireito, há diversas discussões sobre se este

teria seu início como um ramo da bioética ou do Direito; outros acreditam ainda

que a bioética quando começou a discutir questões jurídicas acabou se

transformando em biodireito.

No sentido do biodireito ser um ramo do Direito, tem-se o

pensamento de Diniz60:

58 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do bio direito –Aspectos do Direito de Família e do Direito das Sucessões. p. 33.59 OLIVEIRA, Fátima. Engenharia Genética – o sétimo dia da criação. 1. ed. São Paulo: EditoraModerna, 1995, p. 116.60 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 59.

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O biodireito surge como um ramo do Direito – diferentemente dabioética, tida como um ramo da Filosofia –que abrange a análisejurídica das relações entre seres humanos face à evolução dabiologia, ciência, medicina e genética. No entanto, a relação entreambos é notória.

Continuando com o pensamento de Diniz61, ao citar Heloísa

Helena Barbosa, observa-se que:

(...) Biodireito é o ramo do Direito que trata da teoria, da legislaçãoe da jurisprudência relativas às normas reguladoras da condutahumana em face dos avanços da Biologia, da Biotecnologia e daMedicina. (...) O Direito é a regra que uma sociedade se dá. Asintervenções sobre o corpo humano, como as técnicas dereprodução assistida, as manipulações genéticas, asexperimentações em humanos, os transplantes e a clonagem,conduzem automaticamente a uma reificação do ser humano, semantidas determinadas categorias clássicas do Direito. Oestabelecimento de regras sobre esses fatos poderá manter esseentendimento ou definir novas categorias, ou adaptar asexistentes de modo a assegurar a permanência do primado dapessoa humana.

Fernandes62, mesmo não concordando com o pensamento

de Elida Sá quanto ao surgimento do biodireito, cita-o: “A bioética surgiu como a

dimensão moral da Medicina; posteriormente, quando começaram a surgir os

princípios e as regras jurídicas, se transformou em Biodireito”. Esta linha de

pensamento de que a bioética, ao cuidar de questões jurídicas, se transformou

em biodireito, não é muito aceita pelos estudiosos, pois, como já frisado no item

anterior deste capítulo, os conceitos de bioética e biodireito são distintos, apesar

da relação entre eles ser bem estreita. Não se admite, também, a idéia de que a

bioética tenha deixado de existir, se englobando ao biodireito.

61 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 60.62 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do bio direito –Aspectos do Direito de Família e do Direito das Sucessões. p. 42.

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Continuando com o pensamento de Fernandes63, há, ainda,

outra linha de pensamento, devendo destacar que não é a predominante, que

acredita num período chamado de posbioética, que ocorre quando a bioética

supera a fase inicial de fundamentação, passando para a fase de aplicação dos

fundamentos elaborados nesta primeira, se incorporando ao universo jurídico,

sendo apenas os reflexos jurídicos da bioética. Essa posbioética definida por

esses estudiosos seria nada mais do que o biodireito.

Partindo da idéia do biodireito ser um ramo do Direito que

visa regulamentar os avanços tecnocientíficos, tem-se o pensamento de Ommati64

que afirma:

(...) Biodireito, entendido como um leque de direitos depersonalidade que se relacionam intimamente com os novosavanços da tecnologia. Fariam parte desse biodireito, direitosdíspares, tais como o direito ao aborto, à eutanásia, à reproduçãoassistida, e questões mais controversas, tais como, a clonagemhumana.

A partir de todas as possibilidades e implicações dos

avanços tecnológicos, observa-se a necessidade da intervenção do biodireito, em

conjunto com a bioética, uma vez que as questões envolvidas nessa disciplina,

estão se tornando mais complexas e corriqueiras.

Neste sentido, tem-se a idéia de Diniz65, quando relata sobre

a necessidade do surgimento do biodireito:

(...) não se poderia admitir que o Estado, representado peloExecutivo, Legislativo e Judiciário, ficasse inerte diante do poderda ciência sobre o genótipo do cidadão, do mercado genético, do

63 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do bio direito –Aspectos do Direito de Família e do Direito das Sucessões. p. 40.64 OMMATI, José Emílio Medauar. Biodireito: um direito de Quarta geração? Biodireito eBioética . 1. ed. Rio de Janeiro: Editora América Jurídica, 2005, p. 131.65 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 08.

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desrespeito à dignidade humana, do abuso das experiênciascientíficas com seres humanos, do mau uso de seres humanospela biotecnologia, da possibilidade de um manejo incorreto doProjeto Genoma Humano, dos danos advindos da alta tecnologiana terapêutica, da possibilidade de patenteamento do ser humanoe das discriminações causadas pela diagnose genética e pelaAIDS na área securitária e trabalhista. Faz-se necessário uma“biologização” ou “medicalização” da lei (...).

Cabe destacar ainda, conforme pensamento de

Fernandes66, ao fazer pequenas citações de Regina Fiuza Sauwen e Severo

Hryniewicz que:

(...) o biodireito teria surgido para “realizar o ratio juris e dar contadas inovações que a revolução biotecnológica vem trazendo”,afirmando, ainda, que o mesmo “tem o compromisso primordialde, através de normatização adequada, manter real validade daprincipal divisão do Código Civil: Direito das Pessoas e Direito dasCoisas, isto é, as pessoas não devem ser tratadas comocoisas ” (sem grifo no original).

No mesmo sentido, tem-se o pensamento de Leite67, quando

relata sobre o surgimento do biodireito, como um ramo do direito:

É indispensável disciplinar tais intervenções humanas dentro dosconceitos de vida e de morte. As reiteradas intervenções sobre ocorpo humano, como as técnicas de reprodução assistida, asmanipulações genéticas, as experimentações em humanos, ostransplantes e a clonagem conduzem automaticamente a umareificação do humano. Sem dúvida, o Homem não é COISA!!!(sem grifo no original).

66 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do bio direito –Aspectos do Direito de Família e do Direito das Sucessões. p. 41.67 LEITE, Gisele. A necessidade imperiosa do biodireito e da bioética. Biodireito e Bioética . 1.ed.Rio de Janeiro: Editora América Jurídica, 2005, p. 151.

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Esse é um dos motivos que, com o passar dos anos, fizeram

com que surgisse a bioética e o biodireito: fazer com que o ser humano não se

transforme em objeto de uso para experiências científicas.

Quanto ao surgimento desses temas, acredita-se que será

difícil precisar suas origens, pois, não há datas ou fatos precisos, mas sim, uma

infinidade de acontecimentos, descobertas, pesquisas, durante toda a evolução

da sociedade e da tecnologia, referentes aos assuntos que norteiam os temas

que ora estão sendo pesquisados.

2.3 PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA E DO BIODIREITO

O surgimento de dúvidas pertinentes as novas pesquisas e

descobertas, principalmente as relativas aos seres humanos, vem crescendo tão

velozmente quanto o avanço tecnológico. As primeiras formulações sobre os

princípios que norteavam a bioética, criadas pelos próprios cientistas e

pesquisadores, conforme o pensamento de Barreto68, formavam “uma espécie de

código de ética profissional”, que procuravam “regular a pesquisa e a engenharia

genéticas”.

Mas, o contínuo e rápido avanço das tecnociências, e os

caminhos que estas estavam tomando, “trazendo consigo a lembrança dos

experimentos nazistas”, fez com que esses princípios buscassem regulamentar

mais as questões morais, devendo-se primeiramente tentar distinguir as

pesquisas clínicas das não clínicas. Iniciou-se, então, “uma proliferação de regras

bioéticas ou deontológicas de caráter geral”, que se fundamentavam nesses

princípios.

68 BARRETO, Vicente de Paulo. Os princípios da bioética. Bioética, Biodireito e DireitosHumanos .

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Foi assim que a bioética começou a ganhar força. Começou-

se a pensar em como regulamentar os problemas e dúvidas que surgiam a cada

dia por causa do avanço da tecnociência e da necessidade de novas pesquisas,

principalmente as que envolviam os seres humanos, buscando uma melhor

qualidade de vida. Mas, foi apenas na década de 70 que os princípios da bioética

foram solidificados, para que se pudesse estabelecer algumas regras nas

pesquisas biomédicas, sendo apresentados no relatório conhecido como

Belmont69, como afirma Diniz70:

O documento internacional que é marco na história da bioética é oRelatório Belmont, fruto dos estudos da Comissão nacional para aproteção dos Seres Humanos da Pesquisa Biomédica eComportamental (National Comission for the Protection of HumanSubjects of Biomedical and Behavioral Reasearch), que procurouelaborar princípios éticos norteadores da experimentaçãoenvolvendo seres humanos. (...), em 1978, a Comissão publicou oRelatório Belmont (...).

Os princípios estabelecidos por este relatório são 3 (três),

conforme afirma Vieira71:

O Belmont Report elaborou alguns princípios gerais que deveriamser aceitos pela maioria. O princípio da autonomia (do respeito àspessoas), segundo o qual o médico deve respeitar a vontade doseu paciente ou seu representante, bem como seus valoresmorais e crenças; o princípio da beneficência, que objetiva o bem-estar dos enfermos sem causar mal ou dano; e o princípio dajustiça, o qual demanda eqüidade na repartição de bens e

69 O Belmont Report é um relatório que visa identificar os princípios éticos básicos que “deveriamnortear a experimentação de seres humanos nas ciências do comportamento e na biomedicina.Tais princípios são racionalizações abstratas de valores que decorrem da interpretação danatureza humana e das necessidades individuais.” Foi criado em 1978 pela National Commissiondor the Protection of Human Subjects of Biomedical and Behavioral Research, que é umacomissão constituída pelo governo norte-americano. (In: DINIZ, Maria Helena. O estado atual dobiodireito, p. 14-15).70 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 64-65.71 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 19.

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benefícios no que tange ao exercício da medicina ou área dasaúde. Tais princípios são o sustentáculo da prática da bioética.

No mesmo sentido de serem três os princípios bioéticos

fundamentais, Pessini e Barchifontaine afirmam que:

O edifício da bioética contemporânea se assenta basicamentesobre três pilastras, três princípios (critérios) fundamentaischamados “a trindade bioética” que são: a beneficência, aautonomia e a justiça. Esses critérios são fruto de uma longaevolução e elaboração histórica e hoje estão no epicentro dadiscussão bioética.

Esclarecendo estes princípios, Diniz72 afirma que:

O princípio da autonomia deve ser entendido como respeito pelapessoa e, ao mesmo tempo, como a capacidade da pessoa departicipar das pesquisas médicas. O princípio da beneficênciaremonta às noções utilitaristas e importa em não causar dano quepode ser evitado e maximizar os benefícios minimizando os riscosao paciente. Na verdade não se trata de uma inovação;Hipócrates, em 430 a.C., no § 12 do primeiro livro de sua obraEpidemia , já previa o princípio da beneficência, o qual deveria ser

seguido pelos médicos, nos seguintes termos: “Pratique duascoisas ao lidar com as doenças; auxilie ou não prejudique opaciente”. O princípio da justiça significa imparcialidade nadistribuição dos riscos e dos benefícios.

Faz-se necessário esclarecer sobre a origem de cada um

desses princípios, pois como ressalta Barreto73, não tem-se como pensar num

futuro sistema normativo, através do biodireito, sem se conhecer o motivo, as

origens de tais princípios:

72 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 65.73 BARRETO, Vicente de Paulo. Os princípios da bioética. Bioética, Biodireito e DireitosHumanos .

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O princípio da beneficência tem suas origens na mais antigatradição da medicina ocidental, na qual o médico deve visar antesde tudo o bem do paciente – definido pelas luzes da ciência,sendo que o principal desses bens é a vida; (...). O princípio daautonomia, por sua vez, surge dentro da tradição liberal dopensamento político e jurídico, que por sua vez deita suas raízesno pensamento kantiano; o indivíduo, dentro da concepção liberal,é um sujeito de direitos, que garantem o exercício de suaautonomia, (...). O princípio da justiça recebe a sua primeiraformulação no bojo da crise do estado liberal clássico, quando oprocesso de democratização dessa forma de organização políticapassa a considerar a sociedade e o Estado como tendo aobrigação de garantir a todos os cidadãos o direito à saúde.

Deve-se destacar que esses princípios devem ser aplicados

juntamente. Um é complemento do outro; não pode-se aplicar apenas um ou dois

deles, pois, o direito de algum dos indivíduos envolvidos estaria sendo ferido,

deixado de lado. Neste sentido, afirma Barreto74:

Os três princípios somente adquirem sentido lógico se foremconsiderados como referentes a cada um dos agentes envolvidos:a autonomia, referida ao indivíduo, a beneficência ao médico e ajustiça à sociedade e ao Estado. A aplicação isolada de cada umdesses princípios, no entanto, terminará por consagrar assituações sociais injustas a que fizemos referência. Torna-se,então, necessário procurar um modelo que não permita ahegemonia de um princípio sobre os dois outros, mas queassegure a justificação, a integração e a interpretação dos trêsprincípios.

Há estudiosos que acreditam que exista a necessidade de

um quarto princípio, o da não-maleficência, conforme relata Diniz75 ao citar

Reinaldo Pereira e Silva:

74 BARRETO, Vicente de Paulo. Os princípios da bioética. Bioética, Biodireito e DireitosHumanos .75 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos – análise eperspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. p. 65.

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Em 1979, com o fim de ampliar o horizonte da tríade principialistado Relatório Belmont para o campo específico da prática clínica eassistencial, Tom Beauchamp e James Childress publicaram aobra Principles of biomedical etics , propondo ainda um quarto

princípio, de modo a distinguir a beneficência da não-maleficência.Segundo Hubert Lepargneur, “é supérfluo acrescentar aos trêsprincípios do Relatório um quarto princípio, que seria o de absterde prejudicar o paciente; além de já estar incluído na beneficência,o princípio da não-maleficência é tão óbvio quanto o dever defazer o bem e de evitar o mal.

Ainda tem-se a idéia de, conforme pensamento de Magno e

Guerra76, que “o Relatório de Belmont inclui a Não-Maleficência pari passu à

Beneficência”, e que o quarto princípio seria o do Primado do Direito à Vida,

mesmo este não estando escrito explicitamente no Relatório de Belmont:

(...) por razões óbvias, adiante apresentadas e por inteligívelcompreensão do assunto, percebe-se quão manifesta se faz asuperposição do bem jurídico “vida”, ante qualquer outro bemjurídico, constitucionalmente resguardado. (...) É óbvio que a vidatem prioridade sobre todo e qualquer bem jurídico tutelável. Porisso mesmo, o direito à vida, do mesmo modo, temsuperposicionamento ante aos demais existentes dentro de umacomunidade. No âmbito Bioético, mencionar o primado do direito àvida, significa tomar decisões e alicerçar argumentosconducentes, sempre, ao melhor aproveitamento da vida humana.

Vale ressaltar que esses princípios são os da bioética, mas

que acabam se englobando ao biodireito, pois, conforme afirma Fernandes77, “A

bioética será, sempre , o norte que deverá ser seguido pelo biodireito” (sem grifo

no original).

76 MAGNO, Arthur; GUERRA, Silva. Humanismo Constitucional no Brasil. Biodireito e Bioética .1.ed. Rio de Janeiro: Editora América Jurídica, 2005, p. 8.77 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do bio direito –Aspectos do Direito de Família e do Direito das Sucessões. p. 42-43.

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2.4 BIOÉTICA E OS DIREITOS HUMANOS

Antes de se demonstrar a necessidade da relação entre a

bioética e os direitos humanos, cabe destacar alguns aspectos destes.

Conforme relata Dallari78, a pessoa humana e a sua vida,

possuem um grande valor ético, seja “nas sociedades que se consideram mais

evoluídas e complexas quanto naquelas julgadas mais simples e rudimentares”, e

que este valor ético encontra-se intimamente relacionado com a Declaração

Universal dos Direitos Humanos e com os Pactos de Direitos Humanos:

(...), independentemente de crenças religiosas ou de convicçõesfilosóficas ou políticas, a vida é um valor ético. Na convivêncianecessária com outros seres humanos cada pessoa écondicionada por esse valor e pelo dever de respeitá-lo, tenha ounão, consciência do mesmo. A par disso, é oportuno lembrar quetanto a Declaração Universal dos Direitos Humanos, editada pelaONU em 1948, quanto os Pactos de Direitos Humanos que elaaprovou em 1966, proclamam a existência de uma dignidadeessencial e intrínseca, inerente à condição humana. Portanto, avida humana é mais do que a simples sobrevivência física, é avida com dignidade, sendo esse o alcance da exigência ética derespeito à vida (...).

Como os avanços tecnocientíficos vinham crescendo muito

rápidos, principalmente àqueles relacionados à pessoa humana e sua vida, foram

surgindo novos documentos com base nos direitos humanos e na bioética, sejam

alguns deles, a Declaração sobre a Utilização do Progresso Científico e

Tecnológico no Interesse da Paz e em Benefício da Humanidade, editado pela

ONU em 1975; e a Convenção sobre Direitos Humanos e Biomedicina, editada

pelo Conselho da Europa, em 1996. A UNESCO, em 1993, criou o Comitê

Internacional de Bioética, com o objetivo de cuidar dos avanços tecnocientíficos

que vinham crescendo, em relação à vida humana.

78 DALLARI, Dalmo de Abreu. A vida humana como valor ético. Bioética e Direitos Humanos .

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Outrossim, a bioética que por muito tempo foi classificada

como uma ética médica, baseada em princípios interpretados uniformemente por

várias correntes de pensamento, atualmente, conforme afirma Barreto79, tem

extrapolado a “área restrita dos hospitais e da própria profissão médica e tornou-

se tema a ser analisado no espaço público democrático”. Este autor, ao relatar

sobre os objetivos atuais da bioética, esclarece que:

Tratando de tema essencial para a sobrevivência da humanidade,e que envolve liberdades, direitos e deveres da pessoa, dasociedade e do Estado, a bioética transformou-se na maisrecente fonte de direitos humanos . Esse trânsito da bioéticapara o biodireito, a nível internacional, materializou-se através daDeclaração Universal do Genoma Humano e dos DireitoHumanos, elaborada pelo comitê de EspecialistasGovernamentais da UNESCO, tornada pública em 11 denovembro de 1997 (sem grifo no original).

Continuando esta linha de pensamento, observa-se que

essa declaração não tem caráter coercitivo; seu objetivo principal é o de

estabelecer princípios prevendo medidas que resguardem o patrimônio genético

humano, este considerado um direito fundamental de cada ser. Tais medidas

devem preservar a autonomia e a saúde de cada indivíduo. Assim, a declaração

acabou criando uma nova categoria dos direitos humanos, relacionados ao

patrimônio genético e às suas formas de manifestação.

Firmando ainda mais a idéia de que a Declaração não tem

força coercitiva, tem-se o pensamento de Marinho80:

Objetar-se-á que a Declaração não tem força coercitiva. Mas oconjunto de “princípios” nela consagrados vale como altosconselhos de prudência e de saber técnico, conciliando-se com a

79 BARRETO, Vicente de Paulo. Da bioética aos direitos humanos. Bioética, Biodireito e DireitosHumanos .80 MARINHO, Josaphat. O homem, as experiências científicas e o direito positivo. Mesa Redonda:Os Benefícios da Reprodução Humana . p. 15.

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sobriedade da Declaração Universal dos Direitos Humanos e coma nossa ordem legislativa nacional.

Ao tratar sobre a Declaração Universal dos Direitos

Humanos, afirma Baracho81 que:

O direito tem disposições que forçam certos tipos decomportamentos que são necessários para assegurar seusvalores. A Declaração Universal dos Direitos Humanos pode servista como instrumento adequado para assegurar os valoresbásicos. A norma jurídica pode ter mais força coativa do que aestrita normatividade moral.

Vieira82 discutindo esta temática, apresenta a Declaração da

UNESCO da seguinte forma:

Assim, a Declaração Universal do Genoma Humano, adotada emnovembro de 1997, observa a preocupação dos cientistas de todoo mundo em proteger o homem da exploração comercial. Essedocumento, elaborado por delegados de mais de oitenta países,determina diretrizes para as pesquisas genéticas com fundamentona noção de direitos e garantias individuais. Na genética, aindaexistem muitos aspectos sobre os quais não se refletiu até agora.

Vale ressaltar ainda neste item que, não é apenas a

tecnociência e a bioética que se transformam, que avançam; os direitos humanos

estão ampliando seu campo de abrangência cada vez mais, conforme destaca

Baracho83:

Com o desenvolvimento da sociedade tecnológica, os direitoshumanos passaram a ter diversas formas de indagações (...). Aolado das preocupações com o direito à vida, surgem osquestionamentos sobre os direitos dos deficientes, a

81 BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Bioética e Direitos Humanos. Biodireito e Bioética . 1.ed.Rio de Janeiro: Editora América Jurídica, 2005, p. 35.82 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 21.83 BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Bioética e Direitos Humanos. Biodireito e Bioética . p. 30.

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experimentação clínica e o direito ao consentimento, o transplantede órgãos, o auxílio aos moribundos, as preocupações sobre ohomem, o direito e a medicina. A experimentação no homem geraas preocupações com os direitos humanos e o respeito à pessoa,com destaque para o direito à saúde e a experimentação médica.

É neste ponto de transformação, de avanço tecnocientífico,

que nasce o vínculo da bioética com os direitos humanos, pois, ambos se

completam.

Ao tratar sobre este vínculo da bioética com os direitos

humanos, Dallari84 afirma ser esta uma “conjugação necessária”, e que ao

explicar a razão pelo qual isto se faz necessário, relata:

Qualquer intervenção sobre a pessoa humana, suascaracterísticas fundamentais, sua vida, integridade física e saúdemental deve subordinar-se a preceitos éticos . As práticas e os

avanços nas áreas das ciências biológicas e da medicina, quepodem proporcionar grandes benefícios à humanidade, têm riscospotenciais muito graves, o que exige permanente vigilância dospróprios agentes e de toda a sociedade para que se mantenhamdentro dos limites éticos impostos pelo respeito à pessoa humana,à sua vida e à sua dignidade. Na prática, a verificação desseslimites é facilitada quando se levam em conta os direitoshumanos, (...). O que se pode concluir disso tudo é que aDeclaração Universal dos Direitos Humanos marca o início de umnovo período na história da humanidade. E a bioética está inseridano amplo movimento de recuperação dos valores humanos queela desencadeou (sem grifo no original).

No mesmo sentido, Hooft85 relata que:

O respeito aos direitos humanos na bioética deve constituir a basemoral de todas as nossas ações tanto no campo da saúde pública

84 DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos humanos e Bioética: conjugação necessária. Bioética eDireitos Humanos .85 HOOFT, Pedro Frederico. A visão latino-americana. Mesa Redonda: A Justiça Frente àRevolução Científico-Tecnológica no Campo da Reprod ução Humana . p. 65.

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como no âmbito da genética e da sua aplicação ao ser humano.Nesse sentido, a bioética e os direitos humanos devem estarestreitamente ligados , para criar um vínculo ou ponte entre uma

concepção fundamentada prioritariamente no conceito deautonomia com perspectivas mais relacionadas, reconhecendo adimensão social da pessoa humana (sem grifo no original).

Cabe ressaltar as palavras de Diniz86 quando relata sobre a

necessidade deste vínculo da bioética com os direitos humanos, e afirma que o

biodireito também deve fazer parte desta conjugação:

Com o reconhecimento do respeito á dignidade humana, abioética e o biodireito passam a ter um sentido humanista,estabelecendo um vínculo com a justiça. Os direitos humanos,decorrente da condição humana e das necessidade fundamentaisde toda pessoa humana, referem-se à preservação da integridadee da dignidade dos seres humanos e à plena realização de suapersonalidade. A bioética e o biodireito andam necessariamentejuntos com os direitos humanos. (...) Se em algum lugar houverqualquer ato que não assegure a dignidade humana, ele deveráser repudiado por contrariar as exigências ético-jurídicas dosdireitos humanos. (...) As práticas das “ciências da vida”, quepodem trazer enormes benefícios à humanidade, contêm riscospotenciais muito perigosos e imprevisíveis, e, por tal razão, osprofissionais da saúde devem estar atentos para que nãotransponham os limites éticos impostos pelo respeito à pessoahumana e à sua vida, integridade e dignidade.

Há estudiosos como Barreto, que entendem que é a filosofia

dos direitos humanos a ponte que liga a bioética ao mundo jurídico, sendo que

esses direitos entendem que a dignidade humana seria o princípio fundador

destas disciplinas.

Destarte, é a ciência que evidencia às relações necessárias

da sociedade democrática e pluralista, entre os valores morais e o biodireito

(direitos humanos) e a bioética, conforme destaca Barreto87, ao esclarecer que:

86 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 19-20.

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O desafio da ética no campo das ciências e tecnologias biológicasrepresentou, em última análise, um momento privilegiado, onde ahipótese da complementaridade entre a ética e o direito pôde sertestada e provada, através da explicitação dos princípios bioéticossob a forma de direitos humanos.

Assim, entende-se que a bioética e os direitos humanos,

ambos com o objetivo de uma melhor qualidade de vida, seja esta física ou

psíquica, se complementam, pois, a primeira estipula os princípios, os valores,

que devem nortear as experiências que envolvam a vida em qualquer de suas

formas. A segunda, baseada em leis, decretos, normas, declarações, etc, visa

adequar as condutas ao respeito da dignidade humana.

Após estudar sobre o princípio da dignidade humana e o da

precaução, que devem nortear as pesquisas científicas, principalmente as que

envolvem seres humanos, analisar os conceitos, aspectos históricos e as formas

da clonagem, vegetal e animal, no primeiro capítulo, e neste segundo esclarecer a

diferença entre bioética e biodireito, seus conceitos, aspectos históricos e

princípios, além da ligação estreita com os direitos humanos, pode-se aprofundar

o estudo no próximo capítulo, sobre a clonagem humana, seja esta reprodutiva ou

terapêutica, além das células-tronco, dando-se ênfase, ao final, para as normas

que as regulamentam, haja vista ser este um dos objetivos deste trabalho.

87 BARRETO, Vicente de Paulo. Da bioética aos direitos humanos. Bioética, Biodireito e DireitosHumanos .

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CAPÍTULO 3

NORMATIZAÇÃO DA CLONAGEM HUMANA

3.1 CLONAGEM HUMANA

A clonagem humana foi noticiada pela primeira vez em 1993,

por Robert Stillmann e Jerry Hall, dos Estados Unidos, quando publicaram a

matéria Scientist clones human embryos and creates an ethical challeng. Neste

artigo explicavam que se chegou à clonagem de embriões humanos como

tentativa de aumentar as possibilidades de fertilização in vitro, conforme afirma

Pereira88. Como o impacto social desta experiência foi negativo, a bipartição de

embriões humanos foi temporariamente abandonada e o assunto de clonagem de

seres humanos ficou meio esquecida, até em 1997, quando foi noticiado o

nascimento do primeiro mamífero clonado, a ovelha Dolly, fazendo ressuscitar a

idéia de clonar seres humanos.

Diversos são os motivos apresentados pelos estudiosos que

defendem a clonagem humana, como ressaltam Wilmut e Campbell89. Um deles,

conforme pensamento de Richard Seed, formado em física, que lançou uma

campanha para clonar um ser humano, buscando, assim patrocinadores, é o de

“pura curiosidade”. Richard, a princípio, pretendia clonar a si mesmo, mas depois

“para não ser acusado de egoísmo, decidiu, em vez disso, clonar sua esposa”.

Neste caso é pertinente questionar se este tipo de curiosidade, vaidade, desejo

de poder pessoal ou um desejo indubitavelmente equivocado de imortalidade

realmente são motivos merecedores de se trazer ao mundo uma criança, clonada.

88 PEREIRA, Lygia da Veiga. Clonagem – fatos e mitos . p. 40.89 WILMUT, Ian; CAMPBELL, Keith; TUDGE, Colin. Dolly, a segunda criação . p. 332-338.

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Outro motivo é o do desejo de alguns pais cujos seus filhos

já são falecidos, de clonarem seres idênticos àqueles. Isto já foi demonstrado que

não é possível, pois, o clone possuiria apenas o patrimônio genético igual ao

outro, mas que teria seus próprios pensamentos, vontades, idéias, e inclusive,

alguns aspectos físicos diferentes daquele que o originou. Outro motivo é o

considerado social, ou seja, a vontade da sociedade de criar clones de seres

especiais, como por exemplo “Mozart, Einstein e Gandhi”. Há, também, a vontade

de criar, por ordem própria ou de seus seguidores, “ditadores ensandecidos”, ou

ainda indivíduos e raças em detrimento de outras.

Outro motivo ressaltado por Diniz90 é o da clonagem de

seres humanos para serem utilizados como doadores de órgãos e tecidos, em

caso de necessidade do doador, mas, acredita-se que o pensamento mais frisado

entre os estudiosos que defendem a clonagem humana é o do auxílio à

infertilidade, conforme afirmam Wilmut e Campbell91.

Garrafa92, ao se pronunciar sobre a clonagem humana,

afirma que:

Institutos de pesquisa de diversos países já vêm trabalhando hávários anos com a clonagem de espécies vegetais, sem grandesperturbações à ordem das coisas no seio da sociedade mundial.Já o nascimento de Dolly, assim como a intenção do médicoitaliano Severino Antinori de proceder à clonagem humana (...)causaram reações que variaram do fascínio de algumas pessoasà perplexidade e o medo da maioria. (...) É importante que seentenda que a clonagem é uma técnica. Sendo técnica, seu usotem indicações e contra-indicações. É necessário, assim, que sequebre o mito, o medo contra a palavra.

90 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 427.91 WILMUT, Ian; CAMPBELL, Keith; TUDGE, Colin. Dolly, a segunda criação . p. 338.92 GARRAFA, Volnei. Crítica Bioética a um Nascimento Anunciado. Mesa Redonda: Osbenefícios da Reprodução Humana. R. CEJ, Brasília, n.º 16, p. 13-28, jan./mar. 2002.

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Há estudiosos e doutrinadores do Direito, como por

exemplo, o Ministro do Supremo Tribunal Federal e Professor José Carlos Moreira

Alves93, que entendem que o uso da técnica da clonagem para os seres

humanos, principalmente com relação a reprodução, ainda não se demonstrou

necessária para tais fins, ou seja, não há porquê clonar um ser humano, sendo

que “a fertilização in vitro, a barriga de aluguel e uma série de outras técnicas

também artificiais parecem-me, até este momento do desenvolvimento da

ciências, mais viáveis que a clonagem reprodutiva”. Ainda ressalta que “para se

chegar clonagem da ovelha Dolly, foram realizadas 277 tentativas”.

Vieira94 ao tratar sobre os objetivos da clonagem humana

ressalta:

A clonagem humana com o intuito de montar banco de célulasutilizáveis na medicina vai contra o princípio ético da dignidadehumana, elaborado pelo filósofo alemão Emmanuel Kant.Segundo tal princípio, um indivíduo nunca deve ser pensado comoum meio, sempre como um fim, o que ocorreria quando se criassea vida humana apenas para armazenar material terapêutico.

Entre os estudiosos que defendem a clonagem humana,

seja esta para fins reprodutivos ou terapêuticos, encontra-se o professor de

genética médica da Unicamp, Walter Pinto Junior, que explica, em uma entrevista

para o Jornal Folha de São Paulo, o porquê da necessidade da clonagem

humana, conforme relata Vieira95:

Um caso de um casal que não pode mais reproduzir, e além disso,perdeu três filhos em um acidente, por exemplo. Assim, depois depassar por um comitê de ética, poderia ser feito um clone dohomem ou da mulher, e o casal teria a criança. Um outro exemplo

93 ALVES, José Carlos Moreira Alves. Clonagem, Vida Humana e Implicações Jurídico-Morais.Mesa Redonda: Clonagem e vida humana: é possível av ançar sem agredir? R. CEJ, Brasília,n.º 16, p. 49-63, jan./mar. 2002.94 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 31.95 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 32.

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são casos de pessoas que têm doenças degenerativas como aCoréia de Huntington. A doença faz com que essa pessoa percaos movimentos e tenha problemas neurológicos. Se a mulher éportadora dessa doença, então poderíamos fazer um clone deleusando o óvulo dela. Assim, a criança não teria a doença. Areprodução com clones poderia até eliminar a doença do mundo,já que a transmissão é genética. (...) Casais de lésbicas que nãoquerem dispor do sêmen de um homem poderiam fazer clones desi mesmas. Ou mulheres que não querem casar, mas querem terclones delas. Desde que haja uma avaliação psicológica dessaspessoas (...).

Diniz96 ao relatar sobre a clonagem de seres humanos,

afirma que:

Não se pode negar também que a clonagem não é um merocapricho de homens que querem imitar Deus. Vai muito alémdisso, se é que passa por isso: é um avanço científicoimportantíssimo para a humanidade. Na clonagem terapêutica,objetiva-se e vislumbra-se a possibilidade de cura para inúmerasdoenças. Cite-se, principalmente, o câncer e o mal de Parkinson.Quanto à clonagem reprodutiva, é a esperança real de que todasas pessoas, sem exceções, possam ter o direito de ter umfilho(...).

Ainda com o pensamento de Diniz97, pode-se concluir que a

clonagem humana, seja esta para fins terapêuticos ou reprodutivos, além de ser

um processo irreversível, será um anúncio de sucesso de um futuro não muito

distante, obrigando-se a encarar a clonagem humana como uma realidade,

devendo-se estudar as suas implicações em diversos segmentos.

De acordo com o pensamento de Harry Giaffin, citado por

Vieira98, a clonagem humana já ocorre naturalmente, pois “os gêmeos univitelinos

96 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem Reprodutiva de Seres Humanos . p. 69-70.97 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem Reprodutiva de Seres Humanos . p. 71.98 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 29.

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seriam clones, na verdade, uma vez que são formados exatamente a partir da

mesma célula, a qual dá origem a duas células embrionárias idênticas”.

Wilmut e Campbell99, os cientistas que clonaram a ovelha

Dolly, quando tratam da possibilidade, vantagens e desvantagens da clonagem

humana, afirmam que:

(...) tornou-se evidente para qualquer pessoa desde o início que,se ovelhas podem ser clonadas, então, em princípio, sereshumanos também podem. Nós dois consideramos a clonagem deseres humanos como uma temível manobra diversionária:supérflua, como procedimento médico e, de maneira geral,repugnante. Contudo, embora tenhamos patenteado certosaspectos da técnica, isto não nos dá o direito de dizer ao resto domundo como a tecnologia deverá ser desenvolvida e aplicada. Aclonagem humana está agora no espectro de possibilidadesfuturas – e nós, mais do que quaisquer outras pessoas,contribuímos para que lá fosse colocada. Gostaríamos que nãofosse assim, mas é e continuará sendo enquanto a civilizaçãoexistir.

Conclui-se, portanto, que a clonagem humana, com base no

que acima foi exposto, já é uma realidade no cotidiano mundial, sendo que não

adianta mais proibir-se as pesquisas relacionadas a esta técnica, mas sim, deve-

se buscar soluções para que os riscos sejam menores, sem ferir os princípios

fundamentais, seja na clonagem humana para fins reprodutivos, seja nos

terapêuticos, que serão os objetos de estudos e pesquisa nos itens seguintes.

3.2 CLONAGEM HUMANA REPRODUTIVA

Como já se sabe, a clonagem humana ressuscitou com a

clonagem da ovelha da Dolly em 1997. Em 2001, conforme Zatz100, anunciou-se

99 WILMUT, Ian; CAMPBELL, Keith; TUDGE, Colin. Dolly, a segunda criação . p. 317.

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que a clonagem humana ocorreria ainda naquele ano, com o intuito de auxiliar

casais estéreis, o que ocasionou inúmeras discussões sobre a necessidade de

utilizar esta técnica da clonagem para a reprodução de seres humanos.

Antes de se discutir a necessidade da clonagem humana

reprodutiva, cabe destacar as possíveis técnicas utilizadas para esta clonagem,

apresentadas por Diniz101:

As técnicas de clonagem reprodutiva poderão ser as seguintes: a)Bipartição de embriões ou fissão gemelar, que consiste naimitação de um processo natural de clonação espontâneo, que dáorigem aos irmãos gêmeos univitelinos, quando o embrião depoucas células se divide, surgindo dois zigotos, que gerarão duaspessoas geneticamente iguais. (...) b) Partenogênese induzida,consiste em colocar o núcleo de uma espermatogônia (célulaprecursora do espermatozóide), detentora de 46 cromossomos (oespermatozóide possui 23), num óvulo humano desnucleado.Essa técnica foi empregada por Schettes, em 1976, que cultivou oembrião in vitro, durante uma semana, destruindo-o em seguidapor receio do resultado final. (...) c) Transferência de núcleo,usando: uma célula-ovo ou zigoto, substituindo seu núcleo pelo deuma célula somática, tirada, em regra, de um embrião, gerandoum indivíduo com caracteres genotípicos daquele que doou onúcleo (...); ou um óvulo não fecundado, como se fez na criaçãode Dolly.

Entende-se que a clonagem humana reprodutiva realizada

através da técnica da transferência de núcleo, é uma grave violação ao princípio

de Kant anteriormente mencionado, qual seja o de que o homem deve ser

considerado como um fim em si mesmo, e não como um meio.

Garrafa102 afirma que a clonagem humana reprodutiva não

possui nenhum amparo ético ou moral para a sua realização e que ainda não

100 ZATZ, Mayana. Genética e Ética. Mesa-redonda: Os benefícios da Reprodução Humana .p. 14.101 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 422-424.

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acredita que “nenhum cientista ou empresa esteja hoje capacitado a dominar com

absoluta segurança todas as variáveis envolvidas na sua complexa execução”.

Afirma ainda que a clonagem reprodutiva acabaria com a diversidade humana, o

que considera “um dos nossos mais valiosos patrimônios naturais”.

Ao tratar sobre as vantagens e desvantagens da clonagem

humana reprodutiva, Holm103 ressalta alguns argumentos contra tal técnica:

(...) O primeiro argumento diz respeito a considerações sobre oclone. O problema é que a criança clonada viverá sempre àsombra da pessoa de que foi clonada, sem ter vida própria. (...) Osegundo argumento é a simples consideração de que a pesquisano campo da clonagem reprodutiva implicará a destruição demuitos embriões, e o mesmo acontecerá provavelmente com aprática desse procedimento. Mais de duzentas tentativas foramfeitas para produzir a ovelha Dolly, e não temos razões paraacreditar que, no caso dos seres humanos, a taxa de insucessoserá menor. Assim, a clonagem reprodutiva envolve, ainda naetapa da pesquisa, muitos embriões destruídos e também aexploração de mulheres, pois será preciso que mulheres doemseus óvulos, além de serem usadas como “mães substitutas” paraos embriões clonados.

Com relação aos argumentos a favor da clonagem humana

reprodutiva, Holm104 destaca:

(...), há pessoas que só podem reproduzir-se mediante oprocedimento da clonagem . Admitimos de modo geral que osseres humanos têm liberdade para se reproduzir, pelo menos seencontrarem em parceiro interessado, e poderíamos ampliar issopara a clonagem. (...) Poderíamos tentar aceitar o argumento deque a clonagem não é um processo natural, mas o mesmo se

102 GARRAFA, Volnei. Crítica bioética a um nascimento anunciado. Mesa-redonda: Osbenefícios reprodução humana . p. 15-16.103 HOLM, Soren. Os benefícios da reprodução humana. Os benefícios da reprodução humana .R. CEJ, Brasília, n. 16, p. 15-16, jan./mar. 2002.104 HOLM, Soren. Os benefícios da reprodução humana. Os benefícios da reprodução humana .p. 15-16.

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aplica naturalmente a muitos tipos de reprodução. (...) Por simesma a clonagem não afeta a diversidade genética. Se apróxima geração de seres humanos fossem clones da atual, adiversidade genética seria exatamente a mesma.

Cabe destacar Diniz105 quando afirma que a Organização

Mundial da Saúde – OMS, considera o uso da clonagem humana eticamente

inaceitável, por violar alguns princípios norteadores da reprodução assistida,

como o do respeito à dignidade humana, em termos de identidade genética.

A clonagem humana reprodutiva é, além de mais complexa,

diferente das outras técnicas de reprodução artificial, sejam estas inseminação

artificial, fertilização in vitro e a criogenização, conforme Wilmut e Campbell106

ressaltam:

Desse modo a clonagem é conceitualmente diferente de todas astecnologias anteriores. Na verdade, é também tecnicamente maiscomplexa do que a maioria das técnicas reprodutivas existentes –de fato, combina elementos de várias tecnologias padronizadasdiferentes -, mas a complexidade técnica não é a questãoprincipal. O que realmente importa é a intenção, que é passar aolargo da reprodução sexual normal, e o resultado, que é criar umnovo indivíduo que não é geneticamente único. Esta últimaquestão – o sacrifício da singularidade – é a que tem incomodadoa maioria dos críticos.

Portanto, cabe salientar o pensamento de Diniz107 quando

explica que as pesquisas envolvendo a genética humana não devem ser banidas,

mas sim orientadas para o bem geral da humanidade e voltada aos princípios da

dignidade humana e á identidade pessoal de cada indivíduo. Devem ser

analisados os riscos e os benefícios, procurando-se diminuir aqueles através não

105 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 424.106 WILMUT, Ian; CAMPBELL, Keith; TUDGE, Colin. Dolly, a segunda criação . p. 326.107 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 424.

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só da medicina, mas de outras áreas como o Direito, estabelecendo normas

regulamentadoras para essas pesquisas que envolvam seres humanos.

3.3 CLONAGEM HUMANA TERAPÊUTICA E CÉLULAS-TRONCO

Ao se falar sobre clonagem humana terapêutica e as

células-tronco108, deve-se ressaltar a diferença existente entre esta e a clonagem

humana reprodutiva, explicada anteriormente.

A clonagem humana reprodutiva, como já mencionado, nada

mais é do que a duplicação direta de representantes de uma mesma espécie. A

clonagem humana terapêutica, conforme Garrafa109, significa:

(...) a possibilidade de a ciência vir a construir, por exemplo, umnovo fígado imunologicamente compatível para um doentenecessitado de transplante a partir de uma célula-tronco(indiferenciada) dele próprio ou proveniente de placenta, cordãoumbilical ou mesmo de embriões. Da mesma forma, a esperançade controle para doenças como as síndromes de Parkinson ouAlzheimer, ou ainda o diabetes, repousa em grande parte naspossibilidades do desenvolvimento futuro da chamada “clonagemterapêutica”.

Conforme Holm110, há muitas doenças que são causadas

pela falta ou destruição de células específicas, as quais podem ser (re)produzidas

108 Células-tronco: são células que têm a capacidade de se transformar em células específicas dequalquer tecido ou órgão que compõe o corpo humano. O seu nome em português é umatradução de inglês “stem-cell”. “Stem” é caule, haste. O verbo “to stem”, por sua vez, significaoriginar. Células-tronco, assim, têm essa denominação por ser um tronco comum do qual seoriginam outras células. (BUCHALLA, Anna Paula; PASTORE, Karina. Células da esperança .Revista Veja, 24 mar. 2004). Zatz explica que células-tronco são aquelas que conseguem sediferenciar em todos os tipos de tecidos que formam o corpo humano. Podem ser encontradas naplacenta, no cordão umbilical, na medula óssea e nos embriões (fetos), principalmente nestesúltimos, nas primeiras fases da divisão (3 a 4 dias). (ZATZ, Mayana. O que é célula-tronco?Disponível em: www.anbio.org.br/noticias/celulatronco.html. Acesso: 20/09/2004).109 GARRAFA, Volnei. Crítica bioética a um nascimento anunciado. Mesa-redonda: Osbenefícios da reprodução humana . p. 15.110 HOLM, Soren. Os benefícios da reprodução humana. Mesa-redonda: Os benefícios dareprodução humana . p. 14.

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através das células-tronco humanas. Cada vez mais descobre-se células-tronco

“escondidas” em várias partes do organismo humano. Assim, a clonagem humana

terapêutica tem hoje muitas aplicações em potencial, sendo a grande esperança

para o futuro da medicina. Ressalta ainda:

(...) As células-tronco em condições ótimas de clonagemprocedem ou de um embrião clonado ou do corpo do própriopaciente. Há razões para acreditar que os embriões clonadospodem ser uma melhor fonte de células-tronco. (...) A clonagemterapêutica envolve a perda de muitos embriões humanos, mas osobjetivos são pelo menos comparáveis aos da prática do sexo emtermos da redução do sofrimento e da doença que essas técnicaspodem trazer.

A clonagem humana terapêutica possui dois lados: o bom e

o ruim, pois, ao mesmo tempo em que está se realizando uma pesquisa, salvando

uma vida, livrando pessoas do sofrimento de doenças como, por exemplo, a

Diabetes tipo 1, está, também, destruindo um embrião, ao qual poderia se tornar

uma criança maravilhosa, um adulto formidável como por exemplo Madre Tereza

de Calcutá, Gandhi, Airton Senna, entre tantos outros.

Diniz111, ao tratar sobre a clonagem humana terapêutica,

ressalta:

Na “Declaração sobre a produção e o uso científico e terapêuticodas células estaminais embrionárias humanas”, da PontifíciaAcademia para a Vida, (...) a clonagem terapêutica consiste naprodução de embriões geneticamente idênticos às células dopaciente, por transferência nuclear de um núcleo de uma de suascélulas a um óvulo maduro doado por uma mulher, do qual seextraiu o material genético previamente. Posteriormente, isto é,depois de uns dias de cultivo in vitro, dissecam-se os tecidos doembrião para se obter as chamadas células estaminais. Estasdevem ser cultivadas e diferenciadas em laboratório, até obter-se

111 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos . p. 75.

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o cultivo de células que, transplantes ao paciente, devem integrar-se com seus tecidos enfermos para reparar as lesões.

Quanto as células-tronco, estas podem ser embrionárias ou

adultas, conforme explicação de Neiva112:

As primeiras são retiradas de embriões por volta do quarto diasdepois da concepção, quando eles não passam de um amontoadode células indiferenciadas entre si. As adultas, por sua vez, sãoencontradas sobretudo no cordão umbilical e na medula óssea.Apesar de serem mais fáceis de obter, as células-tronco adultasapresentam algumas desvantagens. Elas estão disponíveis emmenor quantidade e sua capacidade de diferenciação emultiplicação é inferior. (...) Por questões de ordem prática eembates de caráter ético, as células-tronco adultas são as maisutilizadas.

Já existiam algumas pesquisas de células-tronco adultas no

Brasil, mas com a nova Lei de Biossegurança (tema a ser tratado no próximo

item), respeitados os limites legais, pode-se realizar pesquisas com células-tronco

embrionárias. Tais pesquisas estão sendo realizadas principalmente em relação

ao cérebro, medula espinhal, coração, mamas, sistema imunológico e olhos,

conforme cita Buchalla e Pastore113. Outras envolvendo as articulações, os ossos,

o pâncreas, o fígado, os espermatozóides e os óvulos, ainda estão na fase de

experimentação em animais.

Grande parte dos pesquisadores e estudiosos da

clonagem, defendem a idéia de se utilizar dos óvulos e semens que são

descartados das clínicas de fertilização in vitro e inseminação artificial, para a

criação de banco de células utilizáveis para transplantes, recuperação de células

destruídas, como por exemplo as células cardíacas em casos de infarte. Nos

Estado Unidos, um Comitê de Ética, chegou a propor ao Congresso que legisle

112 NEIVA, Paula. Células que salvam vidas . Revista Veja, 23 nov. 2005, p. 123.113 BUCHALLA, Anna Paula; PASTORE, Karina. Células da esperança . Revista Veja, 24 mar.2004, p. 85.

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em favor da clonagem, para finalidade científica, de embriões humanos, desde

que não sejam implantados no útero para se desenvolverem, o que caracterizaria

a clonagem humana reprodutiva.

Convém ressaltar, de acordo com Buchalla e Pastore114 que:

Apesar de existirem células-tronco no cordão umbilical de recém-nascidos e na medula óssea de adultos, as experiências com asembrionárias são de suma importância. Nenhum outro tipo decélula-tronco é tão versátil quanto elas. Acompanhar odesenvolvimento delas em laboratório e estudar o processo peloqual elas se especializam é primordial para que os cientistasconsigam definir quais os genes e as substâncias envolvidosnessa transformação.

Retornando à clonagem humana terapêutica, antes de se

posicionar contra ou a favor, deve-se levar em conta o momento em que inicia a

vida. Existem cinco visões sobre este assunto, conforme Muto e Narloch115: a

visão genética, que é aquela que acredita que a vida humana começa na

fertilização; a visão embriológica, que acredita que a vida começa na terceira

semana de gravidez, quando é estabelecida a individualidade humana; a visão

neurológica que afirma que deve ser utilizado o mesmo princípio da morte,

quando o feto apresentar atividade cerebral começa a vida, isto por volta da

oitava semana e há estudiosos que acreditam que seja apenas por volta da

vigésima semana; a visão ecológica que afirma que a vida começa quando o feto

tiver condições de se manter fora do útero, isto entre a vigésima e vigésima

quarta; e por fim, a visão metabólica que acredita que a discussão sobre o

começo da vida humana é irrelevante, pois óvulos e espermatozóides são tão

vivos quanto o feto.

114 BUCHALLA, Anna Paula; PASTORE, Karina. Células da esperança . p. 91.115 MUTO, Eliza; NARLOCH, Leandro. O primeiro instante . Revista Superinteressante, novembro2005. p. 59.

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Depois de analisar e se posicionar sobre uma dessas visões

é que se pode afirmar ser contra ou a favor da clonagem humana terapêutica.

Cabe, neste momento, destacar alguns dados brasileiros envolvendo esta técnica,

conforme Buchalla e Pastore116:

No Brasil, há 25 pesquisas em fase de testes com seres humanos,conforme levantamento da Comissão Nacional de ética emPesquisa. Vítimas de lesões medulares, insuficiência cardíaca,infarto, diabetes tipo 1, lúpus, esclerose múltipla e artriterematóide já foram tratadas com células-tronco. Em todos oscasos, utilizaram-se células extraídas da medula óssea dospróprios pacientes. (...) A maioria dos trinta pacientes que sesubmeteram à terapia recuperou um pouco da sensibilidade.

Muto e Narloch117 ressaltam, também, que há vinte mil

embriões congelados há mais de três anos, sendo que seria possível a utilização

destes para a clonagem humana terapêutica ao invés de serem descartados,

como normalmente ocorre. Mas a ciência teria o direito de transformá-los em

material de pesquisa? Mesmo que isto viesse a aliviar o sofrimento de alguém ou

até mesmo salvar uma pessoa da morte? Poderia ser considerado aborto a

utilização deste feto para estes fins? São essas é outras questões pertinentes que

o Direito deve procurar responder, sem deixar os princípios fundamentais

constitucionalmente estabelecidos, principalmente, o da dignidade humana.

3.4 NORMATIZAÇÃO DA CLONAGEM HUMANA NO BRASIL

Atualmente se busca um consenso sobre os valores

fundamentais de referência que possam pautar ética e juridicamente a atividade

científica, conforme afirma Vieira118, uma vez que em alguns países a clonagem

humana é vista como “uma afronta a natureza”.

116 BUCHALLA, Anna Paula; PASTORE, Karina. Células da esperança . p. 91.117 MUTO, Eliza; NARLOCH, Leandro. O primeiro instante . p. 64.118 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito . p. 34.

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Farias119 ao tratar sobre os aspectos jurídicos envolvendo a

clonagem humana, traz que:

A ordem jurídica nacional protege o ser humano, não só nointeresse do próprio indivíduo, mas também no interesse dasociedade que resguarda a dignidade humana. Assim, nessecontexto, deve-se indagar se a clonagem coaduna-se com valoresconstitucionais com elas relacionados.

Seguindo uma ordem cronológica, o primeiro documento que

tratou sobre a possibilidade de pesquisas com seres vivos foi a Constituição da

República Federativa do Brasil de 1988. Conforme Diniz120, referida

Constituição121 impôs ao Poder Público as responsabilidades estabelecidas no

artigo 225, § 1º, incisos I e V, que trazem:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamenteequilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadiaqualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade odever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futurasgerações.

§1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao PoderPúblico:

II – preservar a diversidade e a integridade do patrimôn iogenético do País e fiscalizar as entidades dedicadas àpesquisa e manipulação de material genético ;

V – controlar a produção, a comercialização e o emprego detécnicas, métodos e substâncias que comportem risco para avida, a qualidade de vida e o meio ambiente . (sem grifo no

original).

119 FARIAS, Paulo José Leite. A clonagem humana: enfoque ético e jurídico da violação dadignidade da pessoa humana. Biodireito e Bioética . p. 276.120 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 440.121 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 será identificada a partir de agora coma sigla CRFB/88.

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Ademais, é válido ressaltar que a CRFB/88 estabelece os

direitos individuais e coletivos, que entre esses seria o direito à vida, estabelecido

no artigo 5º, caput, a dignidade humana, prevista no artigo 1º, III, além de outros,

como por exemplo, a saúde, que encontra-se no artigo 196.

Marinho122, quando trata da legislação brasileira sobre a

clonagem humana, além de citar os artigos acima mencionados, apresenta, ainda,

o artigo 199, § 4º da CRFB/88, afirmando que:

No art. 199 ordena que a lei disporá sobre as condições e osrequisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos esubstâncias humanas para fins de transplante, pesquisa etratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão desangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo decomercialização.

Resguarda ainda a CRFB/88 o direito à imagem e, conforme

Diniz123, o DNA é uma “imagem científica da pessoa, e como tal deverá ser

preservado”. Ou seja, “se o DNA assegura a imagem científica do ser humano,

não poderá ser manipulado em laboratório para ser transferido a outrem por meio

da técnica da clonação de transferência de núcleo”.

Em 1995 foi criada a primeira Lei de Biossegurança, a Lei nº

8.974/95, a qual estabelecia normas para o uso das técnicas de engenharia

genética e para liberação no meio ambiente de organismos geneticamente

modificados. Brentani124 afirma que esta lei autorizava o Poder Executivo a criar

uma Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, e trazia em seu

artigo 8º:

122 MARINHO, Josaphat. O homem, as experiências científicas e o direito positivo. Mesa-redonda:Os benefícios da reprodução humana . p. 16.123 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 440.124 BRENTANI, Ricardo Renzo. Clonagem da Vida Humana e suas implicações biológicas futuras.Mesa-redonda: Clonagem e vida humana: é possível av ançar sem agredir? R. CEJ, Brasília,n.º 16, p.49-63, jan./mar. 2002.

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Art. 8º. É vedado, nas atividades relacionadas a OGM(Organismos Geneticamente Modificados):

I – Qualquer manipulação genética de organismos vivos ou omanejo in vitro de ADN/ARN natural ou recombinante, realizadosem desacordo com as normas previstas nesta Lei;

II – A manipulação genética de células germinais humanas;

III – A intervenção em material genético humano in vivo, excetopara o tratamento de defeitos genéticos, respeitando-se princípioséticos, tais como o princípio de autonomia e o princípio debeneficência, e com a aprovação prévia da CTNBio.

Diniz125, ao tecer comentários sobre a importância desta lei,

ressalta que a mesma obrigava a existência de um Comitê de Ética e de um

Comitê de Biossegurança, regulados pela, a Resolução 1 de 1998, do Conselho

Nacional de Saúde, que determinava que qualquer instituição de pesquisa na

área da clonagem teria que se submeter às instâncias superiores, que poderiam

bloquear o experimento se achassem conveniente. Afirma ainda que:

Quanto à normatização da clonagem, o Ministério da Ciência e daTecnologia, através da Comissão Técnica Nacional deBiossegurança (CTNBio), expediu a Instrução Normativa 08, em09 de julho de 1997, que proibiu a manipulação genética em sereshumanos. A Instrução Normativa 9, de 16 de outubro de 1997disciplina as normas sobre intervenção genética em sereshumanos. Assim, a Lei de Biossegurança proíbe a manipulaçãode células germinativas humanas e a intervenção em materialgenético humano in vivo, e a Instrução Normativa da ComissãoTécnica Nacional de Biossegurança proíbe a modificação deembriões e fetos humanos. Também foi expedida a ResoluçãoMC/CNS 196, de 10 de outubro de 1996, que dispõe sobrediretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendoseres humanos.

125 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos . p. 76.

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Em razão da incapacidade da Lei nº 8.974/95, de dar conta

de todos os impasses jurídicos que foram se apresentando na área da

biotecnologia, em especial os relacionados com produção e comercialização dos

transgênicos, bem como, a pressão da comunidade científica para a liberação das

experiências com células-tronco e a utilização de embriões nas pesquisas

científicas, foi colocado em discussão no Congresso Nacional Brasileiro o Projeto

de Lei 2401/03 que, após inúmeras discussões, foi aprovado e promulgado em

24 de março de 2005, criando assim a nova Lei da Biossegurança, a Lei nº

11.105/05.

Esta Lei, estabelece que:

Art. 1º. Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismosde fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, amanipulação, o transporte, a transferência, a importação, aexportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, oconsumo, a liberação no meio ambiente e o descarte deorganismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados,tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área debiossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúdehumana, animal e vegetal , e a observância do princípio da

precaução para a proteção do meio ambiente. (sem grifo nooriginal)

Em seu artigo 3º, incisos VIII, IX, X e XI, são apresentados

os conceitos, entre outros, da clonagem, esta para fins reprodutivos e

terapêuticos, e das células-tronco, quais sejam:

Art. 3º. Para os efeitos desta Lei, considera-se:

(...)

VIII - clonagem: processo de reprodução assexuada, produzidaartificialmente, baseada em um único patrimônio genético, com ousem utilização de técnica de engenharia genética;

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IX - clonagem para fins reprodutivos: clonagem com a finalidadede obtenção de um indivíduo;

X – clonagem terapêutica: clonagem com a finalidade de produçãode células-tronco embrionárias para utilização terapêutica;

XI – células-tronco embrionárias: células de embrião queapresentam a capacidade de se transformar em células dequalquer tecido de um organismo.

No que diz respeito as células-tronco a nova Lei é clara ao

afirmar, em seu artigo 5º, a possibilidade de sua utilização para fins de pesquisa e

terapia, desde que observadas as condições legais previstas em seus incisos,

sendo que a mesma institui a proibição da clonagem humana no artigo 6º,

conforme exposto:

Art. 5º. É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização decélulas-tronco embrionárias obtidas de embriões humanosproduzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo

procedimento, atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na datada publicação desta Lei, ou que, já congelados na data dapublicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos,contados a partir da data de congelamento.

Art. 6º. Fica proibido:

(...)

IV – clonagem humana.

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De acordo com Brentani126, “a lei estabelece o que não se

pode fazer em território nacional. Se há alguém fazendo escondido é crime”.

Assim sendo, não há como se clonar um ser humano, seja para fins reprodutivos

ou terapêuticos, dentro do amparo da lei. Quanto aos crimes e as penas

referentes aos assuntos mencionados neste trabalho, estão previstos nos artigos

24, 25 e 26 da Lei nº 11.105/05, que trazem:

Art. 24. Utilizar embrião humano em desacordo com o que dispõeo art. 5º desta Lei:

Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Art. 25. Praticar engenharia genética em célula germinal humana,zigoto humanos ou embrião humano:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Art. 26 Realizar clonagem humana:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

A par dessas normas e ressaltando a importância da

dignidade e da integridade da pessoa humana, o Código de Ética Médica, em seu

artigo 7º estabelece que:

O médico deve guardar absoluto respeito pela vida humana,atuando sempre em benefício do paciente. Jamais utilizará seusconhecimentos para gerar sofrimento físico ou moral, para oextermínio do ser humano ou para permitir ou acobertartentativa contra sua dignidade e integridade . (sem grifo no

original).

126 BRENTANI, Ricardo Renzo. Clonagem da Vida Humana e suas implicações biológicas futuras.Mesa-redonda: Clonagem e vida humana: é possível av ançar sem agredir? p.51.

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Ao tratar sobre a Lei de Patentes (Lei nº 9.279/96), cita

Diniz127, que os clones não são patenteáveis, pois, são matéria viva e “o direito de

patentes não pode atentar conta o princípio que exclui todo direito de apropriação

sobre o ser humano nem contrariar o da tutela da dignidade da pessoa humana”.

Cita ainda:

Patenteáveis são, portanto, os processos criados pelabiotecnologia utilizando genes ou organismos geneticamentemodificados (OGMs), desde que sejam essenciais à sadiaqualidade de vida, e não o material genético humano; com isso,tutelada estará a vida (CF, art. 5º) e protegida estará a dignidadehumana (CF, art. 1º, III). (...) O povo é o verdadeiro titular domaterial genético(...).

Vieira128 ao tratar sobre a legislação que envolve a clonagem

humana, afirma:

A UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação,Ciência e Cultura), por sua vez, com o intuito de estabelecernormas acerca de assuntos que estavam causando preocupaçãomundial, aprovou em 11 de novembro de 1997 a DeclaraçãoUniversal do Genoma Humano e dos Direitos do Homem. EstaCarta proíbe, textualmente, a clonagem humana, classificando-acomo contrária à dignidade humana.

No mesmo sentido, ressalta Souza129 os artigos 11, 12,

letras “a” e “b” e o artigo 13 desta Declaração:

Art. 11. Não serão permitidas práticas contrárias à dignidad ehumana tais como a clonagem reprodutiva em seres humanos.

Os Estados e organizações internacionais são convidados acooperar na identificação de tais práticas e a determinar, nosníveis nacional ou internacional, as medidas apropriadas a serem

127 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . p. 440-447.128 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e direito . p. 37-38.129 SOUZA, Carlos Fernando Mathias de. É possível clonar? Conseqüências jurídicas. Mesa-redonda: Clonagem e vida humana: é possível avançar sem agredir? p. 49-63.

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tomadas para assegurar o respeito pelos princípios expostosnesta Declaração . (...)

Art. 12. a) os benefícios decorrentes dos avanços em biologia,genética e medicina, relativos ao genoma humano, deverão sercolocados à disposição de todos, com a devida atenção para adignidade e os direitos humanos de cada indivíduo .

b) a liberdade de pesquisa, que é necessária para o progresso doconhecimento, faz parte da liberdade de pensamento. Asaplicações das pesquisas com o genoma humano, incluindoaquelas em biologia genética e medicina, buscarão aliviar osofrimento e melhorar a saúde dos indivíduos e dahumanidade como um todo .

Art. 13. As responsabilidades inerentes às atividades dospesquisadores, incluindo o cuidado, a cautela, a honestidadeintelectual e a integridade na realização de suas pe squisas etambém na apresentação e na utilização de suas desco bertas ,

devem ser objeto de atenção especial no quadro de pesquisascom o genoma humano, devido a suas implicações éticas esociais . Os responsáveis pelas políticas científicas, em âmbito

público e privado, também incorrem em responsabilidadesespeciais a esse respeito. (sem grifo no original).

É válido destacar neste ponto que, em 1998, conforme traz

Vieira130, dezenove países europeus assinaram, em Paris, um documento que

proíbe a clonagem humana em seus territórios, complementando a Convenção

Européia dos Direitos Humanos e Biomedicina, ratificando a Declaração dos

Direitos Humanos e do Genoma Humano, aprovada em novembro de 1997.

Tem-se, pois, que no Brasil há diretrizes normativas que

orientam as pesquisas tecnocientíficas relacionadas a clonagem humana,

lembrando, sempre que esta normatização se insere num contexto que envolve

tanto a Bioética quanto o Biodireito, bem como, todo um conjunto de dispositivos

130 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e direito . p. 38.

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de caráter internacional, que visam estabelecer regras suficientes e necessárias

para direcionar de forma efetiva referidas práticas.

Ressalta-se por final que, em razão de ser um assunto

muito recente, dependendo de um estudo aprofundado acerca das vantagens e

desvantagens da clonagem humana, seja para fins reprodutivos, ou para fins

terapêuticos, as conclusões acabam sendo provisórias e portanto, inconclusivas.

Conforme apresenta Brentani131, “a ciência não evoluiu o

suficiente para garantir o sucesso da clonagem humana. (...) Falta muita ciência

antes que precisemos nos reunir para discutir se ética ou moralmente vale a pena

ou não clonar seres humanos”. Entretanto, é obrigação da sociedade jurídica

estabelecer normas que auxiliem a Ciência no seu desenvolvimento, e não

esperar que esta crie, invente, descubra, para depois buscar sua regulamentação.

Direito e Ciência devem caminhar juntos no intuito de promover desenvolvimento

social e científico adequado ás demandas da sociedade, que reflitam em uma

melhor qualidade de vida para todos, preservando sempre e acima de tudo, os

princípios fundamentais, principalmente, o da dignidade da pessoa humana.

131 BRENTANI, Ricardo Renzo. Clonagem da Vida Humana e suas implicações biológicas futuras.Mesa-redonda: Clonagem e vida humana: é possível av ançar sem agredir? p.51.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com este trabalho, procurou-se evidenciar a necessidade de

uma estreita relação entre a Ciência e o Direito, principalmente quando aquela

envolve pesquisas com seres humanos. Princípios fundamentais, como o da

dignidade humana, devem sempre ser preservado, pois, a Ciência visa uma

melhor qualidade de vida. Entretanto, às vezes, atropelam alguns desses

princípios, demonstrando-se, assim, a necessidade imprescindível de que o

Direito intervenha nestes casos.

A bioética e o biodireito, conforme estudo realizado,

desempenham um importante papel nas pesquisas que envolvem seres humanos.

Eles são como uma ponte entre o mundo científico, baseado especialmente na

prática, e o mundo jurídico, apoiado em normas, princípios, valores e costumes.

Demonstrou-se, também, a estreita e íntima relação da bioética com os direitos

humanos, pois ambos visam, além de uma melhor qualidade de vida, a

adequação das condutas ao respeito à dignidade humana.

Evidenciou-se os motivos apresentados por alguns

estudiosos que são a favor da clonagem humana, destacando-se entre eles, o da

pura curiosidade, a tentativa de aumentar as possibilidades de fertilização in vitro

e a de montar-se, através da clonagem humana terapêutica, um banco de células-

tronco utilizáveis na medicina para cura de muitas doenças genéticas, como o Mal

de Parkinson, além de muitos outros. Foi apresentada a diferença entre a

clonagem humana para fins reprodutivos e para a de fins terapêuticos,

mostrando-se a necessidade de pesquisas com células-tronco, principalmente as

embrionárias.

E, no último item deste trabalho, apresentou-se as normas

que versam sobre a clonagem humana, dando-se ênfase para a nova Lei de

Biossegurança (Lei nº 11.105/05) que foi categórica em proibir a clonagem

humana no Brasil, e em permitir a utilização de células-tronco embrionárias, deste

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que obedecidos os requisitos expressos nesta lei. Também previu os crimes e as

penas nos casos de descumprimento das normas.

Quanto as hipóteses apresentadas na introdução deste,

restou-se confirmado que o avanço tecnológico visa uma melhoria na qualidade

de vida e que a clonagem terapêutica, através de células-tronco, pode ser a cura

para diversas doenças genéticas. Quanto as “amarras” legais, ficou demonstrado

a existência destas, sendo as mesmas necessárias para a preservação dos

direitos e da vida digna dos seres humanos. Já com referência a hipótese da

possibilidade de clonar seres humanos, no Brasil, de acordo com a legislação

vigente, em especial a Lei nº 11.105/05, é expressamente proibido tal prática, seja

esta para fins reprodutivos ou terapêuticos.

Como antes já mencionado, por ser a clonagem humana um

assunto muito recente, não se tendo, ainda, a certeza científica quanto aos

prejuízos que podem ser causados para a sociedade mundial, as opiniões

acabam sendo provisórias e, até, confusas. A Ciência, apesar de estar bem

evoluída, ainda não é o suficiente para garantir o sucesso da clonagem humana.

Para um bom desenvolvimento social, o Direito e a Ciência devem andar juntos,

lado a lado, para que um complete o outro, e tragam, assim, mais segurança e

dignidade para todos os extratos da população.

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Tradução de Ana Deiró. 1. ed. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2000.

Page 80: ASPECTOS JURÍDICOS DA CLONAGEM HUMANA NO BRASIL …siaibib01.univali.br/pdf/Juliane Rogerio.pdf · ecologia, teologia, filosofia, etc., observando as diversas culturas e valores

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