83
571 Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008 ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 20-01675/99-0 Data: 19.12.2008 DECISÃO DA 20ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE - MG Juíza Substituta: Drª RENATA BATISTA PINTO COELHO Aos 19 dias do mês de dezembro de 2008, às 16h30min, na sede da 20ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, realizou-se a audiência para julgamento dos pedidos formulados na ação civil pública com pedido de antecipação dos efeitos da tutela ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em desfavor do Clube Atlético Mineiro e Preto e Branco Ltda. Aberta a audiência, foram de ordem da MM. Juíza do Trabalho Drª Renata Batista Pinto Coelho apregoadas as partes. Ausentes. A seguir, foi proferida a seguinte SENTENÇA: I - RELATÓRIO Ministério Público do Trabalho ajuíza ação civil pública com pedido de antecipação dos efeitos da tutela em desfavor do Clube Atlético Mineiro e Preto e Branco Ltda., todos devidamente qualificados nos autos em epígrafe, pelos elementos fático-jurídicos constantes da inicial, alegando, em síntese, que: 1) recebeu da Delegacia Regional do Trabalho e Emprego expediente dando conta do não recolhimento do FGTS, descumprimento de prazos de pagamento de salários, parcelas rescisórias, férias e gratificações natalinas; 2) instaurou procedimento administrativo, não logrando bom termo; 3) trata-se de direitos coletivos dos trabalhadores, de ordem constitucional e requer a condenação dos réus a observarem o prazo de pagamento de salários, gratificações natalinas e verbas rescisórias, além de efetuar pontualmente o recolhimento do FGTS, implicando o descumprimento em multa, pleiteando, ademais, antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional. Atribuiu à causa o valor de R$30.000,00 (trinta mil reais). Colacionou documentos às f. 10/239. Decisão à f. 02, negando o requerimento de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional. Recusada a primeira tentativa conciliatória, defenderam-se as reclamadas, em peça conjunta, às f. 244/262, aduzindo, em síntese: 1 - inconstitucionalidade do inciso III do art. 83 da Lei Complementar n. 75/93, pois a Constituição da República determinou apenas a fixação de normas orgânicas, sendo inviável a criação de outras competências; 2 - carência de ação por incabível a ação civil pública, pois presente interesse subjetivo dos empregados, além da definição de interesse coletivo só se aplicar para efeitos do Código de Defesa do Consumidor, bem como falta de interesse por se tratar de direito individual personalizado e aduz que não é o caso de antecipação dos efeitos da tutela; 3 - que não provada a falta de recolhimento; 4 - que a lei já fixa o valor da multa e propugna pela improcedência. A defesa veio instruída com os documentos de f. 236/272 e 275/276. O Ministério Público do Trabalho impugnou a defesa às f. 278/284. Sentença às f. 289/290, julgando improcedentes os pedidos formulados na inicial.

ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 20-01675/99-0 · 2016-07-06 · ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 20-01675/99-0 Data: ... pedidos formulados na ação civil pública com pedido de antecipação

Embed Size (px)

Citation preview

571

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 20-01675/99-0Data: 19.12.2008DECISÃO DA 20ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE - MGJuíza Substituta: Drª RENATA BATISTA PINTO COELHO

Aos 19 dias do mês de dezembro de 2008, às 16h30min, na sede da 20ªVara do Trabalho de Belo Horizonte, realizou-se a audiência para julgamento dospedidos formulados na ação civil pública com pedido de antecipação dos efeitosda tutela ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em desfavor do ClubeAtlético Mineiro e Preto e Branco Ltda.

Aberta a audiência, foram de ordem da MM. Juíza do Trabalho Drª RenataBatista Pinto Coelho apregoadas as partes. Ausentes.

A seguir, foi proferida a seguinte SENTENÇA:

I - RELATÓRIO

Ministério Público do Trabalhoajuíza ação civil pública com pedido deantecipação dos efeitos da tutela emdesfavor do Clube Atlético Mineiro e Pretoe Branco Ltda., todos devidamentequalificados nos autos em epígrafe,pelos elementos fático-jurídicosconstantes da inicial, alegando, emsíntese, que: 1) recebeu da DelegaciaRegional do Trabalho e Empregoexpediente dando conta do nãorecolhimento do FGTS, descumprimentode prazos de pagamento de salários,parcelas rescisórias, férias egratificações natalinas; 2) instaurouprocedimento administrativo, nãologrando bom termo; 3) trata-se dedireitos coletivos dos trabalhadores, deordem constitucional e requer acondenação dos réus a observarem oprazo de pagamento de salários,gratificações natalinas e verbasrescisórias, além de efetuarpontualmente o recolhimento do FGTS,implicando o descumprimento em multa,pleiteando, ademais, antecipação dosefeitos da tutela jurisdicional.

Atribuiu à causa o valor deR$30.000,00 (trinta mil reais).

Colacionou documentos às f.10/239.

Decisão à f. 02, negando orequerimento de antecipação dosefeitos da tutela jurisdicional.

Recusada a primeira tentativaconciliatória, defenderam-se asreclamadas, em peça conjunta, às f.244/262, aduzindo, em síntese: 1 -inconstitucionalidade do inciso III do art.83 da Lei Complementar n. 75/93, poisa Constituição da Repúblicadeterminou apenas a fixação de normasorgânicas, sendo inviável a criação deoutras competências; 2 - carência deação por incabível a ação civil pública,pois presente interesse subjetivo dosempregados, além da definição deinteresse coletivo só se aplicar paraefeitos do Código de Defesa doConsumidor, bem como falta deinteresse por se tratar de direitoindividual personalizado e aduz que nãoé o caso de antecipação dos efeitosda tutela; 3 - que não provada a falta derecolhimento; 4 - que a lei já fixa o valorda multa e propugna pelaimprocedência. A defesa veio instruídacom os documentos de f. 236/272 e275/276.

O Ministério Público do Trabalhoimpugnou a defesa às f. 278/284.

Sentença às f. 289/290,julgando improcedentes os pedidosformulados na inicial.

572

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Recurso ordinário interpostopelo autor às f.291/296.

Os réus apresentaramcontrarrazões ao recurso ordinário àsf. 298/310.

Acórdão regional às f. 315/317,conhecendo do recurso e, no mérito, semdivergência, negando-lhe provimento.

Recurso de revista interpostopelo Ministério Público do Trabalho àsf. 320/338.

Decisão do E. TRT/MG à f. 339,recebendo o recurso de revista.

Contrarrazões dos réus aorecurso de revista interposto pelo autoràs f. 341/367.

Acórdão publicado no dia02.05.2008, em que a 7ª Turma do TSTreconheceu a legitimidade ad causam

do Ministério Público do Trabalho paraajuizar a presente ação civil pública,determinando o retorno dos autos àVara de origem, a fim de que prossigao julgamento do feito, como entenderde direito. (f. 381/391).

Conversão do feito emdiligência à f. 437 e à f. 448.

Sem outras provas, encerrou-sea instrução processual, com razõesfinais e conciliação final prejudicada.

Designada pauta parapublicação de sentença.

É O RELATÓRIO.

II - FUNDAMENTAÇÃO

- Da inconstitucionalidade

Os réus requerem a declaraçãode inconstitucionalidade do inciso III doart. 83 da Lei Complementar n. 75/93,sob o fundamento de ter extrapolado ocomando constitucional, porentenderem que a referida normasomente poderia dispor sobre aorganização, atribuições e estatuto decada Ministério Público.

Segundo o inciso III do artigo 83da Lei Complementar n. 75/93,compete ao Ministério Público doTrabalho

promover a ação civil pública noâmbito da Justiça do Trabalho, paradefesa de interesses coletivos,quando desrespeitados os direitossociais constitucionalmentegarantidos.

De acordo com o inciso III doart.129 da CF/88, dentre as funçõesinstitucionais do Ministério Públicoencontra-se a de

promover o inquérito civil e a açãocivil pública, para a proteção dopatrimônio público e social, do meioambiente e de outros interessesdifusos e coletivos.

Além disso, segundo o incisoIX do art. 129 da CF/88, compete aoMinistério Público

exercer outras funções que lheforem conferidas, desde quecompatíveis com sua finalidade [...].

E, a teor do caput do art. 127 daCF/88,

O Ministério Público é instituiçãopermanente, essencial à funçãojurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, doregime democrático e dos interessessociais e individuais indisponíveis.

Nesse passo, não há comoafastar a conclusão de que se inserena função jurisdicional do MinistérioPúblico a defesa dos direitos difusos,coletivos e individuais homogêneos denatureza indisponível. Não se pode

573

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

olvidar de que a própria ConstituiçãoFederal permite a ampliação, por lei,da competência do Ministério Público,ao estabelecer, em seu art. 129, IX, quetambém é atribuição desse órgão

exercer outras funções que lheforam conferidas, desde quecompatíveis com sua finalidade,sendo-lhe vedada a representaçãojudicial e a consultoria jurídica deentidades públicas.

Ora, indubitavelmente, a defesade interesses difusos, individuaishomogêneos de natureza indivisível ecoletivos, porque dizem respeito àproteção da ordem jurídica (art. 127 daCF), é de atribuição harmônica com afinalidade do Ministério Público.

Ademais, a questão encontra-setotalmente superada na presentedemanda haja vista que o acórdão doC. TST foi peremptório ao reconhecerque o Ministério Público do Trabalhopossui legitimidade ativa para ajuizaração civil pública para a defesa deinteresses individuais homogêneos ecoletivos, conhecendo do recursointerposto, por expressa violação doinciso III do artigo 83 da LeiComplementar n. 75/93 e dos artigos127 e 129, III, da Constituição Federal,cuja consequência lógica é que oreferido dispositivo é constitucional.

Afasto.

- Da preliminar de carência deação

Os réus suscitam a preliminarde carência de ação, aduzindo que éincabível ação civil pública que temcomo fundamento a violação de“direitos difusos e coletivos eindividuais indisponíveis”, nãocabendo ao Parquet expandir o seu

campo de atuação. Alegam que, nasviolações indicadas na inicial, não háafetação nas relações transindividuaisdo grupo, mas sim litígio individualplúrimo, não havendo nenhuminteresse coletivo em jogo, carecendoo autor de legitimidade ativa para o seumanejo. Aduzem que a lide posta emjuízo cogita de “direitos deempregados” que não se inserem noobjeto do Código de Defesa doConsumidor. Afirmam que o MinistérioPúblico do Trabalho não pode utilizar-seou manejar ação civil pública para adefesa de “interesses ou direitosdifusos”, porque toda a legislaçãotrabalhista encontra-se assentada no“contrato individual do trabalho”.Sustentam que o Ministério Público doTrabalho não detém interesse de agirpara as pretensões postuladas napeça vestibular por se tratar de direitoindividual personalizado. Asseveramque a regularidade dos depósitos doFGTS, assim como o pagamento dasverbas rescisórias, encontram, naspróprias leis regentes das matérias, osmeios de coerção para o retocumprimento da lei pelo empregador,existindo órgão competente para afiscalização e aplicação de sanção pelodescumprimento das normas daConsolidação das Leis do Trabalho e,tendo a ação civil pública idênticoobjeto, implica a falta de interesse deagir do Parquet.

A carência de ação ocorrequando não estão presentesquaisquer das condições da ação, asaber: possibil idade jurídica dopedido, interesse de agir e legitimidadedas partes.

As condições da ação devemser analisadas em abstrato, de acordocom a teoria da asserção, e in status

assertionis unicamente de acordo como postulado na inicial.

574

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

O acórdão do C. TST, comtrânsito em julgado (certidão à f. 393),reconheceu a legitimidade ativa ad

causam do Ministério Público doTrabalho para ajuizar a presente açãocivil pública, reconhecendoexpressamente que a presentedemanda versa sobre direitoscoletivos. A ementa do Recurso deRevista à f. 384 pontificou que:

no caso dos autos, ação propostadefende exclusivamente interessescoletivos, com natureza cominatória,ao pagamento de salários erecolhimentos do FGTS, razão pelaqual a legitimidade está asseguradapelo art. 129, III, da ConstituiçãoFederal. Assim, se mesmo quepostulasse interesses individuaishomogêneos, o Ministério Públicoestaria legitimado, quanto mais se ahipótese dos autos é de defesa deinteresses coletivos dos atletas doclube. (grifos nossos)

Dessa forma, a temáticaconcernente à legitimidade ativa doParquet para a propositura da presenteação civil pública, bem como a naturezacoletiva do direito tutelado nãodemandam maiores tergiversações,haja vista o acórdão do C. TST emrecurso de revista com trânsito emjulgado.

A possibil idade jurídica dopedido encontra-se presente nademanda, haja vista que todos ospedidos formulados pelo autorpossuem previsão expressa na ordemjurídica vigorante.

O interesse de agir, comocondição da ação, possui, para oMinistério Público, conotaçõesespeciais, em virtude da funçãoinstitucional de que ele está investido(art. 129 da Constituição Federal),

função esta assumida pelo MinistérioPúblico do Trabalho, por reverberaçãoda norma superior, e para eledelineada através da LeiComplementar n. 75/93, de modo a sepoder afirmar, sem distorções ouexagero, que o interesse processualdesse órgão, para promover a ação civilpública, nasce da mera constatação deque o caso envolve patrimônio públicoe social, o meio ambiente, interessesdifusos ou interesses coletivos, ouseja, que tal interesse decorre dedisposição constitucional e legal.

Ademais, a teoria do processoconstitucionalista exige apenas que aparte afirme lesão ou ameaça a direitopara a análise do interessemanifestado pela parte. O interesse deagir, como condição para a ação, noatual modelo processualconstitucional é um antecedente lógicode mérito que atinge o fato manifestadopela parte que pretendia ser o titularde um interesse manifestado pelanorma, é a necessidade e utilidade doacesso à Justiça porque a parte nãoteria conseguido, por meio de umanegociação direta, a preservação deseu interesse, é, assim, traduzido pelapossibilidade de obtenção de umaposição melhor do que aquela que atéentão a parte possuía. Em últimainstância, a lei processual, diante doimperativo constitucional dainafastabilidade do Poder Judiciário,não pode estabelecer condicionantesà ação, sendo a única condiçãoexistente para o acesso à Justiça,segundo o modelo constitucionalvigorante, a afirmação perante o PoderJudiciário da existência de lesão ouameaça de direito, sob pena denegativa da prestação jurisdicional. Oprocesso deve ser conduzido para asolução do problema e a sua conduçãoao exame do mérito. Assim, se a parte

575

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

manifesta um interesse em face de umbem jurídico e há conflito sobre essaafirmação de interesse, não se devenegar a apreciação dessa questãoposta pela parte ao Judiciário aofundamento de que não há interesse.Entender de forma diversa significa adenegação do acesso constitucional àJustiça. A partir do momento em queincumbe ao Estado-Juiz a solução dosconflitos e se as partes chegaram aoponto de demandarem optando portodos os riscos e custos que umprocesso pode trazer, deve o PoderJudiciário solucionar os conflitos deinteresses que as partes nãoconseguiram encontrar para si demodo amigável, sob pena de totalnegativa da prestação jurisdicional. Sea questão veio ao Judiciário com aafirmação de lesão ou ameaça adireito, há interesse da parte naapreciação dessa questão, que podeser ou não julgada procedente. Essa éa hipótese dos autos, já que da simplesleitura da inicial infere-se que o MPTalega a inobservância por parte dosréus de inúmeros direitos sociaiscomezinhos indisponíveis, dentre osquais pagamento de salários até oquinto dia útil do mês subsequente,recolher regularmente o FGTS e efetivaro pagamento das férias e das verbasrescisórias, nos prazos e na forma dalei, com a natureza cominatória, sendo,pois, a presente ação o meioadequado, necessário e útil para taldesiderato, já que as partes nãolograram bom êxito na tentativa defirmar compromisso de ajustamentode conduta ou qualquer forma deautocomposição.

A ação interposta visa adequaro comportamento dos réus aoordenamento jurídico, cuja efetividadeé de interesse público, ou seja, de todaa sociedade, porque, no Estado

Democrático de Direito, a leirepresenta interesse público, sendocerto, ainda, que as normaspretensamente infringidas pela parteré acarretam consequências para todaa sociedade, não apenas para ostrabalhadores envolvidos.

Impende repisar que ointeresse de agir para o MinistérioPúblico do Trabalho encontra-sepresente em razão da funçãoconstitucional em que o órgão estáinvestido (art. 129 da ConstituiçãoFederal).

Por tais fundamentos, afasto aspreliminares de carência de ação.

- Do mérito

Na inicial, alega o autor que aDelegacia Regional do Trabalho eEmprego lhe encaminhou o ofício den. 845/98, acompanhado de cópias derelatório de fiscalização e do livro deinspeção de trabalho, para asprovidências cabíveis, já que osreferidos documentos demonstravamque o Clube Atlético Mineiro e seusestabelecimentos, dentre os quais, oLabareda Clube e a Vila Olímpica, bemcomo a Loja Preto e Branco,pertencente ao clube, não vinhamrecolhendo o FGTS de seusempregados, desde março de 1994,bem como era contumaz nopagamento dos salários em atraso,constatando, ainda, o não pagamentodas verbas rescisórias dentro do prazolegal, o pagamento das férias fora doprazo legal e o não pagamento do 13ºsalário. Narra que as representaçõesforam convertidas em procedimentosinvestigatórios e que a denúncia giravaem torno de duas irregularidades:ausência de depósitos do FGTS eatraso no pagamento dos salários,inclusive de 13º e verbas rescisórias.

576

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Diz que o Clube Atlético Mineiro foiintimado para comparecer emaudiência datada de 09.12.98, ocasiãoem que o preposto confirmou asirregularidades, sendo-lhe concedidoo prazo até o dia 16.12.98 paraapresentar proposta para quitação dosdébitos. Aduz que, na segundaaudiência datada de 16.12.98, o ClubeAtlético Mineiro e a Preto e Brancoafirmaram que ainda não tinha sidopossível elaborar uma proposta paraliquidação dos débitos e regularizaçãoda conduta, sendo designada novaaudiência para o dia 19.12.99, quando,mais uma vez, os réus deixaram deapresentar qualquer proposta, sendodeferido novo prazo para tanto.Assevera que os réus nadaapresentaram no prazo concedido,solicitando a sua dilação, o que motivouo Ministério Público do Trabalho aapresentar uma minuta de termo decompromisso para apreciação dosréus que, regularmente notificados,silenciaram-se a respeito. Esclareceque, nesse intervalo, a DelegaciaRegional do Trabalho e Emprego - DRT/MG - encaminhou cópia do relatório daúltima inspeção realizada no Clube,confirmando a manutenção da condutairregular, apresentando, ainda, os autosde infração e NDFG lavrados naquelafiscalização. Explanam que ocorrerammais duas outras audiências, sendoque, na quinta audiência, datada de05.10.99, o preposto dos réus disseque

o Clube vem tentando equacionartodos os problemas, mas que nãohá possibilidade de firmar Termo deCompromisso; que as rescisõescontratuais já voltaram a ser feitasna DRTE/MG e que o FGTS dosempregados dispensados tem sidorecolhido no ato da dispensa; que

os salários de setembro /99 devemser pagos, provavelmente até opróximo dia 12; que cerca de 30empregados ainda não receberamos salários de agosto/99; que o 13ºsalário/98 de alguns jogadores aindanão foi pago; que até o momento oclube não conseguiu patrocinadorpara este ano; que o clube estáciente das possíveis sanções, masconsidera esgotada a possibilidadede firmar Termo de Compromisso.

Pretende, assim, umprovimento judicial cominatório nosentido de obrigar os réus a pagar ossalários, o 13º salário, o acertorescisório, bem como recolher o FGTSou comprovar o parcelamento do débitorespectivo junto à Caixa Econômica nosvalores, na forma e nos prazosestabelecidos na legislação.

Os réus não impugnam, emmomento algum, o alegadodescumprimento das obrigaçõesdeduzidas na exordial. A defesa demérito l imita-se a declarar que apretensão posta em juízo é de tutelade direitos subjetivos, que não seinserem no âmbito de defesa atravésde ação civil pública. Impugnam o valorescolhido pelo Parquet a título demulta.

A Constituição da Repúblicaestabelece um sistema de garantiasaos chamados direitos sociais,reservando ao Ministério Público doTrabalho, dentre outras atribuições, odever de ação na defesa de interessesdifusos e coletivos dos trabalhadoresbrasileiros, como garantia ao efetivoexercício dos direitos sociais. Dentretais direitos elencados no artigo 6º daConstituição da República, estão otrabalho e a previdência social. Otrabalho e a previdência social são,enquanto direitos sociais dos cidadãos

577

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

brasileiros, fundamento da República,à medida que o Estado Democráticode Direito instituído na Constituição temcomo fundamento o valor social dotrabalho e da livre iniciativa. Assim estáposto no art. 1º, inciso IV. O valor socialda livre iniciativa está diretamentevinculado à ideia da propriedadeprivada, a qual, nos termos do incisoXXIII do art. 5º da Constituição daRepública, deve ter sua função social.Com efeito, toda empresa éresponsável diretamente peloimplemento e efetividade dasprestações materiais sociaisindisponíveis de seus trabalhadores.

O descumprimento dessasprestações materiais sociaisindisponíveis é passível de proteção poração do Ministério Público, nos termosdo que dispõe o artigo 127, in fine, daConstituição da República, in verbis:

Art. 127. O Ministério Público éinstituição permanente, essencial àfunção jurisdicional do Estado,incumbindo-lhe a defesa da ordemjurídica, do regime democrático e dosinteresses sociais e individuaisindisponíveis.

Nesse contexto, emerge a açãocivil pública como garantiaconstitucional, com natureza de açãocominatória, ou seja, a imposição deobrigação de fazer ou não fazer, sobpena de pagamento de multa. Referidaação tem ainda natureza condenatóriagenérica, uma vez que visa àindenização para um fundo genérico dereparação dos interesses lesados,consoante se infere dos arts. 3º, 11 e13 da Lei n. 7.347/85. Na realidade, oobjetivo da ação civil pública ésolucionar o problema da lesão emrelação ao futuro, impedindo que seperpetue no tempo uma situação

contrária ao ordenamento jurídico.A propósito da compreensão do

conceito de interesses difusos ecoletivos, o Código de Defesa doConsumidor, em seu art. 81, dispõe:

A defesa dos interesses e direitosdos consumidores e das vítimaspoderá ser exercida em juízoindividualmente, ou a título coletivo.Parágrafo único. A defesa coletivaserá exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos,assim entendidos, para efeitos desteCódigo, os transindividuais, denatureza indivisível, de que sejamtitulares pessoas indeterminadas eligadas por circunstâncias de fato;II - interesses ou direitos coletivos,assim entendidos, para efeitos desteCódigo, os transindividuais, denatureza indivisível de que sejatitular grupo, categoria ou classe depessoas ligadas entre si ou com aparte contrária por uma relaçãojurídica base;III - interesses ou direitos individuaishomogêneos, assim entendidos osdecorrentes de origem comum.

Portanto, são consideradosdifusos os interesses transindividuais,de natureza indivisível, de que sejamtitulares pessoas indeterminadas eligadas por circunstâncias de fato;coletivos, os transindividuais, denatureza indivisível de que seja titulargrupo, categoria ou classe de pessoasligadas entre si ou com a partecontrária por uma relação jurídica base;e individuais homogêneos, osdecorrentes de origem comum.

Hugo Nigro Mazzilli, na obra A

defesa dos interesses difusos em juízo

(17. ed., São Paulo: Saraiva, 2004. p.50), acentua que:

578

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Os interesses difusoscompreendem grupos menosdeterminados de pessoas (melhordo que pessoas indeterminadas, sãoantes pessoas indetermináveis),entre as quais inexiste vínculojurídico ou fático preciso. São comoum feixe ou conjunto de interessesindividuais, de objeto indivisível,comparti lhados por pessoasindetermináveis, que se encontramunidas por circunstâncias de fatoconexas.

E, ainda:

Em sentido lato, ou seja, de maneiramais abrangente, a expressãointeresses coletivos refere-se ainteresses transindividuais, degrupos, classes ou categorias depessoas. Nessa acepção larga éque a Constituição se referiu adireitos coletivos em seu Título II, oua interesses coletivos, em seu art.129, III; ainda nesse sentido é que opróprio CDC disciplina a açãocoletiva, que se presta não só àdefesa de direitos coletivos stricto

sensu, mas também à defesa dedireitos e interesses difusos eindividuais homogêneos.[...]

E conclui:

Em outras palavras, é óbvio que nãoapenas os interesses coletivos, emsentido estrito, têm origem numarelação jurídica comum. Também nosinteresses difusos e individuaishomogêneos há uma relação jurídicasubjacente que une o respectivogrupo; contudo, enquanto nosinteresses coletivos, propriamenteditos, a lesão ao grupo provémdiretamente da própria relação

jurídica questionada no objeto daação coletiva, já nos interessesdifusos e individuais homogêneos,a relação jurídica é questionadaapenas como causa de pedir, comvista à reparação de um dano fáticoora indivisível (como no caso dosinteresses difusos) ora, até mesmo,divisível (como nos interessesindividuais homogêneos).

Ab initio, impende notar que anatureza jurídica dos bens deduzidosem juízo encontra-se totalmentesuperada, haja vista que o acórdão emsede de recurso de revista, com trânsitoem julgado, foi peremptório emreconhecer que a lide versa sobredireitos e interesses coletivos. Confira-se, a propósito, a ementa do aresto doC. TST à f. 384:

[...] no caso dos autos, a açãoproposta defende exclusivamenteinteresses coletivos, com naturezacominatória, ao pagamento desalários e recolhimentos do FGTS,razão pela qual a legitimidade estáassegurada pelo art. 129, III, daConstituição Federal. Assim, mesmoque postulasse interessesindividuais homogêneos, o MinistérioPúblico estaria legitimado, quantomais se a hipótese dos autos é dedefesa de interesses coletivos dosatletas do clube.

O acórdão do C. TST pontificou:

A postulação do Ministério Público,no presente caso, busca a defesade interesses coletivos de um grupode trabalhadores, como argumentao próprio recorrente à f. 323 de seurecurso de revista. Não se trata,portanto, de interesses privadosdisponíveis.

579

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Por outro lado, a defesa, em juízo,dos titulares dos direitos lesados -cujo pleito é decorrente de umarealidade fática comum - pode serfeita individual ou coletivamente.Por se tratar de ação civil públicaajuizada pelo Ministério Público doTrabalho, cuja pretensão material etutela jurisdicional objetivam ocumprimento da obrigação de fazercom relação ao futuro, são direitoscoletivos, de relevância social, emrealidade, não obstante a r. decisãorecorrida. E, regra geral, em razãoda semelhança dos direitos, adefesa é feita por meio da ação civilpública, a teor do disposto no artigo81, III, da Lei n. 8.078/90 (Código deDefesa do Consumidor).

Com efeito, a hipótese dosautos se ajusta ao conceito deinteresse coletivo, à medida que a açãoproposta visa à proteção de direitosfundamentais de um grupo, categoriaou classe de pessoas - ostrabalhadores do grupo formado pelasempresas rés - ligadas entre si ou coma parte contrária por uma relaçãojurídica base - os contratos de trabalhocom tais empresas - cuja lesão aogrupo adveio diretamente da própriarelação jurídica questionada no objetoda ação coletiva - o descumprimentoreiterado de direitos indisponíveis dosreferidos contratos de trabalho.

No caso sub judice, restaramprovadas documentalmente asinfrações ao ordenamento jurídicoperpetradas pelos réus quereiteradamente vêm descumprindodireitos justrabalhistas mínimos,cogentes, consistentes em atrasocontumaz de salários, não pagamentode 13º salário, não pagamento dasverbas rescisórias no prazo do art. 477da CLT e não recolhimento do FGTS.

Tal situação vem se arrastando desde1994. Verifica-se às f. 11/22 que aDelegacia Regional do Trabalhorealizou um relatório de fiscalizaçãojunto ao Clube Atlético Mineiro, atravésdo qual se constataram infraçõesconcernentes ao não pagamento dossalários dentro do prazo legal, bemcomo de não pagamento de gratificaçãonatalina (doc. à f. 16).

Os procedimentos investigatóriosn. 379/98, 385/98, 387/98 e 393/98,todos juntados com a inicial,constatam o pagamento dos saláriosem atraso, não recolhimento de FGTS,não pagamento de 13º salário e nãopagamento das verbas rescisórias noprazo prescrito no art. 477 da CLT.

Restou provadodocumentalmente que o MinistérioPúblico do Trabalho tentou promover aadequação da conduta dos réus,concedendo-lhes dilação de prazo paraajustar a conduta, o que não ocorreu. Éde se registrar que até a presente dataos réus não vêm cumprindo as suasobrigações trabalhistas, fato constatadopelo ofício da Caixa Econômica Federalà f. 450 que comprova as irregularidadesperpetradas pelos requeridos relativasao recolhimento/parcelamento do FGTSrelativos aos réus, denotando odescumprimento pelos demandadoscom relação ao termo de confissão dedívida celebrado junto à CaixaEconômica Federal.

Os documentos às f. 48/62consistem na cópia dos autos deinfração e das NDFGs (Notificação deDébito do FGTS) lavrados pelaDelegacia Regional do Trabalho, naocasião da fiscalização, comprovandoirregularidades perpetradas pelos réusno tocante à mora salarial, nãopagamento de 13º salário e nãorecolhimento dos depósitos fundiáriosna forma prescrita na legislação.

580

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Na ata de audiência referente àrepresentação 409/98 e PI 387/98,ocorrida em 09.12.1998 (f. 150), opreposto do réu assim se manifestou:

[...] que a situação financeira doclube é instável, pois depende doseventos esportivos de que participa;que já foi estudada a possibilidadede parcelamento do débito do FGTS,acerca de dois anos atrás, mas nãofoi possível a sua efetivação, umavez que a situação financeiranaquele momento não permitiacumprir o ajuste; que os salários,inclusive o 13º (décimo terceiro),verbas rescisórias e férias estãosendo pagos em atraso. (grifosnossos)

Na ocasião da audiênciarealizada em 09.08.1999 referente aosprocedimentos investigatórios 387/98e 393/98, os representantes dosinvestigados noticiaram ao MPT:

[...] que a nova diretoria estáempenhada em sanar o Clube, mastem tido dificuldades em virtude dasinúmeras penhoras sobre o seupatrimônio e principalmente sobre aarrecadação dos jogos; que, dentrodesta nova filosofia, o Clube temrealizado acordo em reclamaçõestrabalhistas de pequeno valor, alémde estar dispensando empregadose quitando as verbas rescisórias,inclusive FGTS, quando o valoratinge até R$2.000,00; que tambémestá sendo feito o pagamentoparcelado de débitos com a ReceitaFederal; que os salários não estãosendo pagos com longos períodosde atraso, sendo que atualmenteresta efetuar o pagamento de umaparte dos salários de junho e julho/99; que necessitam de prazo para

análise da proposta de termo decompromisso, para que possamavaliar o que é possível ser pago eem quais prazos. (grifos nossos)

Na audiência realizada em05.10.1999 referente aos procedimentosinvestigatórios 387, 379, 385 e 393 de1998, o preposto dos investigadosdeclarou à f. 74:

[...] que desde a última audiênciarealizada nesta Procuradoria, oClube vem tentando equacionartodos os problemas, mas que nãohá possibilidade de firmar termo decompromisso, uma vez queconsidera ter chegado ao limite doque é possível; que as rescisõescontratuais já voltaram a ser feitasna DRTE/MG e que o FGTS dosempregados dispensados tem sidorecolhido no ato da dispensa; quemensalmente vem recolhendo oFGTS de alguns jogadores; que oscréditos decorrentes de acordosjudiciais e sentenças tambémvoltaram a ser liquidados, conformea disponibilidade de recursos; queos salários de setembro/99 devemser pagos, provavelmente até opróximo dia 12; que cerca de 30empregados ainda não receberamos salários de agosto/99; que o 13ºsalário de alguns jogadores aindanão foi pago; que até o momento oclube não conseguiu patrocinadorpara este ano; que o clube estáciente das possíveis sanções, masconsidera esgotada a possibilidadede firmar termo de compromisso.(grifos nossos)

Da documentação adunadacom a inicial, verifica-se que os réussolicitaram, em reiteradas ocasiões,pedido de prorrogação de prazo, com

581

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

vistas a apresentar um cronogramapara viabilizar a celebração de um TAC,o que foi acatado em todos osmomentos pelo MPT. Entretanto, ainércia dos réus em apresentar oreferido cronograma fez com que aProcuradoria Regional do Trabalho da3ª Região elaborasse uma minuta determo de compromisso, sendo que aparte ré quedou-se silente a respeitodas tratativas propostas pelo MPT.

Consoante se verifica dosautos, o atraso no pagamento dossalários, gratif icação natalina einobservância do prazo insculpido noart. 477 da CLT para quitação dasverbas rescisórias, bem como o nãorecolhimento do FGTS por parte dosréus são problemas crônicos que vêmse arrastando desde longa data, sendofato notório nesta Especializada queaté a presente data os réus nãoconseguiram regularizar as suasobrigações trabalhistas, havendo,inclusive, criação por este E. TRT-MGde um Juízo Auxiliar de Execuções doClube Atlético Mineiro (Galo), o qualconcentra todos os processos do clubeem fase de execução, instituído pelaRA 06/2007, aprovada pelo TribunalPleno do TRT/MG.

As normas jurídicas sãoclassificadas pela doutrina emprincípios e regras. Os primeirosinformam todo o ordenamento jurídico,composto pelo conjunto de regras queos desdobram e concretizam. Nosprincípios, ganham as regras seufundamento e, ao se harmonizar comeles, harmonizam-se entre si,emprestando coerência ao própriosistema. Os princípios constitucionaisfundamentais - informadores de todo osistema de diretrizes básicas sobre asquais foi erigida a Lei Maior - possuemefeito vinculante, regras jurídicasefetivas. A violação de um princípio

implica a vulneração não apenas deuma específica regra, mas de todo oordenamento. Mais grave que infraçãoà lei é o desrespeito ao princípio, a maisnociva e profunda forma de ilegalidade,pois representa a rebelião contra todoo sistema de valores. Por serem aslinhas mestras da legislação, osprincípios não podem ser contrariados,sendo forçosa sua defesa e prestígioaté as últimas consequências, comocondição para a sobrevivência dosistema que neles se assenta.

Ao incluir no Título I, art. 1º, daConstituição Federal os princípios da“dignidade da pessoa humana” (incisoIII), seguido dos “valores sociais dotrabalho e da livre iniciativa” (inciso IV),nessa exata ordem, o constituinteindicou de forma clara e vinculante aorientação axiológica da Carta Política,de cumprimento inexcusável.

A ordem de relevância dosvalores erigidos em alicerces daRepública não deixa margem dedúvida de que a dignidade humana eos valores sociais do trabalho vêmantes e acima do valor da própria livreiniciativa, havendo esta de ceder lugaràqueles, quando os fatos, ascircunstâncias e a conduta dosagentes sociais levarem àcontraposição de interesses entreeles. Entre a dignidade da pessoahumana e o interesse da livre iniciativa,não há dúvida de que a Carta Magnaoptou pela dignidade. Entre o valorsocial do trabalho e o da livre iniciativa,o trabalho vem antes do capital, atéporque é o trabalho, como valor social,que contribui para a construção dadignidade humana, jamais o capital oua sua liberdade de iniciativa.

É a dignidade o primeirofundamento de todo o sistemaconstitucional posto e o últimoarcabouço da guarida dos direitos

582

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

individuais, funcionando comoprincípio maior e angular para ainterpretação de todos os direitos egarantias individuais e sociaisconferidos pelo Texto Constitucional. Ovalor social do trabalho, consagrado deforma harmônica e precedente ao dalivre iniciativa, a fim de que haja relaçãode cooperação entre capital e trabalho,fundamenta todo o rol de direitossociais, que se materializam emliberdades positivas, asseguradas nosarts. 6º, 7º, 8º e 193 a 230. A OrdemEconômica, aliás, ratif icando aprecedência do valor social do trabalho,fundamenta-se na valorização dotrabalho humano e na livre iniciativa, etem por escopo garantir a todosexistência digna, nos termos do art. 170constitucional. E conduz à conclusãode que qualquer atividade ou condutaeconômica que não garanta a seusagentes uma vida digna não tem abrigoconstitucional e, portanto, não podebuscar nem encontrar no ordenamentojurídico qualquer amparo à suacontinuidade ou existência. Ao mesmotempo, a Ordem Social busca noprimado do trabalho o seu fundamento,e no bem-estar e na justiça sociais oseu objetivo (art. 193), afastandoqualquer possibilidade de tolerância acondutas que rebaixem o trabalhadora segundo plano, pois que é cidadãodotado da dignidade da pessoahumana, a ele conferida pelo inciso IIIdo art. 1º da Carta.

Esse respeito à dignidade docidadão trabalhador exige que sejamrespeitados todos os direitos inerentesa essa categoria. Ao seu trabalho dignodeve corresponder uma remuneraçãoque lhe permita uma vida honrada.Deve também fazer com que odesempenho de sua atividade nãotraga gravames de nenhuma ordem,seja à sua integridade física e mental,

seja ao seu patrimônio jurídico ematerial, seja à estima e ao prestígioque desfruta no seu meio social eprofissional, seja à sua própria auto-estima. E deve ter a certeza inabalávelde que, cumprindo com seu dever, teráa correspondente contrapartidamaterial e moral. Toda e qualquerconduta privada ou estatal há de levarem conta, em primeiro lugar, apreservação da dignidade do cidadãotrabalhador. A só conjugação dosprincípios da dignidade da pessoahumana, do valor social do trabalho eda livre iniciativa, da função social dapropriedade e da justiça social comofundamentos da ordem social eobjetivos da econômica já conduz àconclusão de que intervenção estatal,por meio da tutela jurisdicional, nogrupo econômico, representa a únicaforma eficaz e jurídica de se buscar amanutenção dos empregos e acontinuidade da atividade econômica.Mas não só a Constituição ampara anecessidade de intervenção.Harmônica com essa postura, aConsolidação das Leis do Trabalho,em seu art. 8º, é taxativa ao impor que“nenhum interesse de classe ouparticular prevaleça sobre o interessepúblico”. O preceito se completa como art. 9º consolidado, que declara nulostodos os atos praticados para fraudaros preceitos legais trabalhistas, todosde ordem pública, e com o art. 166 doCódigo Civil, que declara nulo o atojurídico praticado com o objetivo defraudar a lei (inciso VI).

Por outro lado, não há dúvidade que, em relação às pretensõesdeduzidas na inicial de pagamentode salários, de gratificação natalinae de pagamento de verbasrescisórias, no prazo, na forma e nomodo previsto na lei , possuemnatureza alimentícia, constituindo

583

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

direitos coletivos dos trabalhadores,resguardados no rol dos direitossociais do art. 7º da CF/88, sendocerto que, dada a sua naturezaalimentícia, o salário é indisponívelao trabalhador, constituindo crime asua retenção dolosa (inciso X do art.7º da Norma Ápice).

Com relação aosrecolhimentos fundiários, a seu turno,o parágrafo único do artigo 1º da Lei n.7.347/85 - Lei da Ação Civil Pública, comalteração determinada pela MedidaProvisória n. 2180-35, de 24 de agostode 2001, ainda em vigor por força dodisposto no art. 2º da EmendaConstitucional n. 32, de 11.09.2001,estatui in verbis:

Parágrafo único. Não será cabívelação civil pública para veicularpretensões que envolvam tributos,contribuições previdenciárias, oFundo de Garantia do Tempo deServiço - FGTS ou outros fundos denatureza institucional cujosbeneficiários podem serindividualmente determinados.

O i.jurista Mauricio GodinhoDelgado bem obtempera que, naverdade, há, no mínimo, uma tríplicedimensão de estrutura e objetivos noFundo de Garantia apta a gerar relaçõesjurídicas próprias, distintas, emboraobviamente combinadas. Existe arelação empregatícia, vinculandoempregado e empregador, pela qualeste é obrigado a efetuar osrecolhimentos mensais e, às vezes,também obrigado com respeito aoacréscimo pecuniário na rescisão. Emcontrapartida, desponta nessarelação, como credor, o empregado.Há, por outro lado, o vínculo jurídicoentre empregador e Estado, em que oprimeiro tem o dever de realizar os

recolhimentos, ao passo que osegundo, o direito de os ver adimplidos,sob pena de, compulsoriamente,cobrá-los, com as apenações legais.Existe, ainda, a relação jurídica entre oEstado, como gestor e aplicador derecursos oriundos do fundo socialconstituído pela totalidade dosrecursos do FGTS, e a comunidade,que deve ser beneficiária dadestinação social do instituto, por meiodo financiamento às áreas dehabitação popular, saneamento básicoe infra-estrutura urbana. Nesse carátermultidimensional do instituto é que serevela sua precisa natureza jurídica.

Há que se notar aqui que oinciso I do art. 83 e o inciso II do art. 84da Lei Complementar n. 75/93conferem legitimidade ao Parquet

especializado para promover em juízoações para assegurar a observânciados direitos sociais dos trabalhadores,não havendo, pois, como excluir oFGTS desse rol, dada a sua inserçãono rol do art. 7º da Constituição Federal.É de manifesta inconstitucionalidadea Medida Provisória, uma vez que,atenta contra normas constitucionaise adentra matéria reservada à leicomplementar. Impende notar que, noque concerne ao FGTS, não só osempregados dos réus sãobeneficiados, mas, também, toda asociedade, uma vez que os recursosdo fundo são aplicados para atenderà política nacional de desenvolvimentourbano e setorial de habitação popular,saneamento básico e infra-estruturaurbana (inciso I do art. 5º da Lei n.8.036/90). Assim, o não recolhimentodo FGTS, direito constitucionalgarantido ao trabalhador (inciso III doart. 7º da CR/88), importa em lesão àordem jurídica e aos interessessociais daqueles que com seu trabalhocontribuem para a sociedade, dada a

584

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

natureza multidimensional do FGTSque tem como finalidade financiarprojetos de interesses sociais, comohabitação, obras de saneamentobásico, dentre outros direitosindisponíveis, reversíveis em prol dasociedade. Portanto, a exigibilidadepelo Ministério Público do Trabalho deregularidade dos depósitos do FGTS,como direito social previsto naConstituição, encaixa-se perfeitamenteno referido dispositivo da Lei queenumera suas atribuições. A violaçãodo artigo de lei complementarinviabiliza a tutela dos interesses quea Constituição encomenda aoMinistério Público. O conteúdo conferedensidade aos dispositivosconstitucionais, adicionando eespecificando os instrumentosnecessários para o cumprimento damissão constitucional.

Assim, os pedidos formuladospelo MPT de que sejam os réuscondenados a efetuar o pagamentodos salários, o mais tardar até o quintodia útil do mês subsequente aovencido; recolher o FGTS com aregularidade determinada pela Lei n.8.036/90, comunicando aos seusempregados as informações sobre assuas contas vinculadas e/ou comprovaro parcelamento do débito respectivojunto à Caixa Econômica Federal;efetuar o pagamento do 13º salário nosvalores e prazos determinados pelalegislação; efetuar o pagamento dasverbas rescisórias, na forma e nosprazos previstos no art. 477 da CLT,tudo, sob pena de multa cominatória,visam, exatamente, resguardar osdireitos sociais, mormente porquantoa ação civil pública representa,também, no âmbito da Justiça doTrabalho, um instrumento de proteçãodo ordenamento jurídico como umtodo, já que defende, nos termos da

lei, o interesse coletivo decorrente dosdireitos constitucionais asseguradosaos trabalhadores.

Ressalta-se que é inegável quea conduta perpetrada pelos réuscausou, e causa, lesão aos interessesdifusos de toda a coletividade detrabalhadores, tratados, em váriosaspectos, sem a dignidade quemerece o cidadão brasileiro queprocura, através do trabalho, osustento para si e para sua família,uma vez que propiciam a negação dosdireitos trabalhistas aos antigos, atuaise futuros trabalhadores. Há de se levarem conta, também, a afronta ao próprioordenamento jurídico que, erigido pelolegislador como caminho seguro parase atingir o bem comum,flagrantemente é aviltado pelos réusque, visando à obtenção do lucro fácil,deixam de observar os postuladosconstitucionais atinentes à proteção dotrabalhador e à atividade econômica.

O prejuízo em potencial já ésuficiente a justif icar a actio.

Exatamente porque o prejuízo empotencial já é suficiente a justificar apropositura da presente ação civilpública, sendo desnecessária a provade prejuízos aos empregados. É de serecordar que nosso ordenamento nãotutela apenas os casos de dano in

concreto, como também os casos deexposição ao dano, seja ele físico,patrimonial ou jurídico, como se inferedo Código Penal, do Código Civil, daCLT e de outros instrumentos jurídicos.

Tanto assim é que a CLT, emseu art. 9º, taxa de nulos os atospraticados com o objetivo de fraudar, oque impende reconhecer que a meratentativa de desvirtuar a lei trabalhistajá é punível. Por isso, através domanejo da ação civil pública, pretendeo autor impedir que os réus continuema transgredir impunemente a lei e a

585

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

inobservar os direitos justrabalhistasmínimos, cogentes e revestidos pelomanto de indisponibilidade absoluta.

Desse modo, comprovadadocumentalmente nos autos a lesãoaos interesses individuaisindisponíveis dos trabalhadores, pelasrazões explanadas, em virtude daviolação e inobservância ao art. 459, §1º, art. 477, ambos da CLT, inciso III doart. 7º da Constituição Federal de 1988,art. 15 da Lei n. 8.036/90, Lei n. 4.090/62, Lei n. 4.749/65 e Decreto n. 57.155/67, julgo procedente, em parte, apresente demanda, para condenar osréus a observarem, cumprirem efazerem cumprir as seguintesobrigações:

a) efetuar o pagamento dossalários, o mais tardar até o quinto diaútil do mês subsequente ao vencido(CLT, art. 459, § 1º);

b) recolher o Fundo de Garantiado Tempo de Serviço com aregularidade determinada pela Lei n.8.036/90, comunicando aosempregados as informações sobre assuas contas vinculadas e/ou comprovaro parcelamento do débito respectivojunto à Caixa Econômica Federal;

c) efetuar o pagamento daremuneração do 13º salário nos valorese prazos determinados pela legislação(Lei n. 4.090/62, Lei n. 4.749/65 e Decreton. 57.155/67);

d) efetuar o pagamento dasverbas rescisórias, na forma e nosprazos previstos no art. 477 da CLT.

O descumprimento dasobrigações acima estabelecidassujeitará o infrator à pena de multa, nãosubstitutiva da obrigação nãopecuniária, no valor equivalente a 5000(cinco mil) UFIRs, ou outro índice quea venha substituir, por obrigação

descumprida, a cada constatação,observado o interstício de 30 (trinta)dias entre uma e outra, reversível aoFAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador,ou pelo Ministério do Trabalho,mediante simples inspeção e simplesrelatório.

- Da antecipação dos efeitos datutela jurisdicional

No caso vertente o requisito daprova inequívoca das alegaçõesencontra-se preenchido, haja vista osautos de infração lavrados pelaDelegacia Regional do Trabalho deMinas Gerais, a notificação de débitodo FGTS, o descumprimento do termode confissão de dívida celebrado juntoà Caixa Econômica Federal, asirregularidades constatadas relativasao recolhimento/parcelamento doFGTS e, sobretudo, a confissão dosréus em não pagar de forma renitenteos salários em atraso, não pagar o 13ºsalário no prazo legal e não efetuar oacerto rescisório na forma estipuladano art. 477 da CLT.

Por seu turno, o fundado receiode dano irreparável ou de difícilreparação, ou seja, o periculum in

mora, consubstancia-se no fato de que,com a escusa injustificada e renitentedos réus em cumprir a sua obrigaçãotrabalhista, vários trabalhadores terãoos seus direitos vilipendiados, o quesomente poderá ser corrigido por meiode demandas judiciais, após asdelongas naturais do processo e,ainda, assim, apenas se conseguiremprovar as suas alegações, o que setorna injustificável e desarrazoado,notadamente se considerarmos queas obrigações determinadas nestadecisão são de índole alimentar erevestidas pelo manto daindisponibilidade absoluta.

586

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Assim, defiro a antecipação dosefeitos da tutela pretendida, comespeque no art. 273 do CPC paradeterminar aos réus, de formaimediata:

a) efetuar o pagamento dossalários, o mais tardar até o quinto diaútil do mês subsequente ao vencido(CLT, art. 459, § 1º);

b) recolher o Fundo de Garantiado Tempo de Serviço com aregularidade determinada pela Lei n.8.036/90, comunicando aosempregados as informações sobre assuas contas vinculadas e/ou comprovaro parcelamento do débito respectivojunto à Caixa Econômica Federal;

c) efetuar o pagamento daremuneração do 13º salário nos valorese prazos determinados pela legislação(Lei n. 4.090/62, Lei n. 4.749/65 e Decreton. 57.155/67);

d) efetuar o pagamento dasverbas rescisórias, na forma e nosprazos previstos no art. 477 da CLT.

O descumprimento dasobrigações acima estabelecidassujeitará o infrator à pena de multa, nãosubstitutiva da obrigação nãopecuniária, no valor equivalente a 5000(cinco mil) UFIRs, ou outro índice quea venha substituir, por obrigaçãodescumprida, a cada constatação,observado o interstício de 30 (trinta)dias entre uma e outra, reversível aoFAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador,ou pelo Ministério do Trabalho,mediante simples inspeção e simplesrelatório.

III - CONCLUSÃO

Ante o exposto, julgoPROCEDENTES, EM PARTE, ospedidos formulados na presente AÇÃO

CIVIL PÚBLICA, COM PEDIDO DEANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DATUTELA, movida pelo MINISTÉRIOPÚBLICO DO TRABALHO em face deCLUBE ATLÉTICO MINEIRO e PRETOE BRANCO LTDA., para condenar osréus a observarem, cumprirem efazerem cumprir as seguintesobrigações:

a) efetuar o pagamento dossalários, o mais tardar até o quinto diaútil do mês subsequente ao vencido(CLT, art. 459, § 1º);

b) recolher o Fundo de Garantiado Tempo de Serviço com aregularidade determinada pela Lei n.8.036/90, comunicando aosempregados as informações sobre assuas contas vinculadas e/ou comprovaro parcelamento do débito respectivojunto à Caixa Econômica Federal;

c) efetuar o pagamento daremuneração do 13º salário nos valorese prazos determinados pela legislação(Lei n. 4.090/62, Lei n. 4.749/65 e Decreton. 57.155/67);

d) efetuar o pagamento dasverbas rescisórias, na forma e nosprazos previstos no art. 477 da CLT.

O descumprimento dasobrigações acima estabelecidassujeitará o infrator à pena de multa, nãosubstitutiva da obrigação nãopecuniária, no valor equivalente a 5000(cinco mil) UFIRs, ou outro índice que avenha substituir, por obrigaçãodescumprida, a cada constatação,observado o interstício de 30 (trinta)dias entre uma e outra, reversível ao FAT- Fundo de Amparo ao Trabalhador, oupelo Ministério do Trabalho, mediantesimples inspeção e simples relatório.

Defiro a antecipação dos efeitosda tutela jurisdicional nos moldes doart. 273 do CPC.

587

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Tudo nos termos, forma elimites explicitados na fundamentação,que integra o presente dispositivo nopertinente à solução dos pedidos.

Recolhimentos previdenciáriose fiscais inexistentes em face danatureza da obrigação.

Os juros e a correção monetáriaserão contados a partir da data doajuizamento da ação (artigo 883 da CLT).Os juros serão calculados na base de1%, pro rata die, incidentes sobre o valorjá corrigido monetariamente (Súmula n.200 do TST). Para o cálculo da correçãomonetária deverá ser observado o índicedo mês subsequente ao da prestação

de serviços, conforme o disposto naSúmula n. 381 do TST e Súmula n. 01 doTRT da 3ª Região.

Custas pelos réus sobre o valorprovisoriamente arbitrado àcondenação no importe de R$20.000,00(vinte mil reais), no importe de R$400,00(quatrocentos reais).

INTIMEM-SE AS PARTES DAPRESENTE DECISÃO, devendo oMinistério Público do Trabalho serintimado de forma pessoal, na formado art. 18, inciso II, alínea “h”, da LeiComplementar n. 75/93.

Cumpra-se.Nada mais.

ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 01214-2008-060-03-00-6Data: 05.12.2008DECISÃO DA VARA DO TRABALHO DE ITABIRA - MGJuiz Titular: Dr. ALEXANDRE WAGNER DE MORAIS ALBUQUERQUE

Aos 5 dias do mês de dezembro de 2008, às 16h35min, na sede da Varado Trabalho de Itabira/MG, sendo Titular o MM. Juiz do Trabalho, Dr. AlexandreWagner de Morais Albuquerque, publicou-se a seguinte sentença na ação civilpública proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO em face de DALMIANTUNES DE ARAÚJO.

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO DOTRABALHO, por seu i lustreProcurador, o Dr. Adolfo Silva Jacob,propõe ação civil pública em face deDALMI ANTUNES DE ARAÚJO, dizendoque, a partir de ofício do Juízo destaVara do Trabalho, foi apurado que oréu estaria impondo a seusempregados a propositura de açõestrabalhistas para quitação de verbasrescisórias, com o intuito de obtervantagem ilícita. Afirma o autor que oréu compareceu à audiênciaextrajudicial, onde confessou os fatosdizendo que as dif iculdadesfinanceiras levaram-no a adotar

aquele posicionamento; foi propostotermo de ajustamento de conduta queo réu não aceitou, sendo necessárioo manejo deste remédio processual.O autor sustenta que o réu praticouato atentatório à dignidade da justiçae pretendeu frustrar direitos detrabalhadores, valendo-se deprocesso judicial para obter resultadoilícito. Sustenta que a simulação delide gera danos individuais, difusos ecoletivos que devem ser reparados,impondo-se ainda a interrupção daprática. Busca, portanto, a reparaçãodos danos e a tutela inibitória,evitando-se a repetição do ilícito.Sustenta, ainda, o cabimento da açãocivil pública e o cabimento de liminar.

588

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

O autor requer liminar para queo réu se abstenha de promover lidessimuladas e de praticar atos que levemseus empregados ou ex-empregadosa ajuizarem ações trabalhistas, tudosob pena de multa pecuniária.

Pelo que expõe, o autor pleiteia,em sede de tutela definitiva, que o réuse abstenha de promover lidessimuladas e de praticar atos que levemseus empregados ou ex-empregadosa ajuizarem ações trabalhistas, tudosob pena de multa pecuniária. Pede,também, a condenação do réu nareparação dos danos morais difusose coletivos no valor de R$30.000,00(trinta mil reais) a favor do Fundo deAmparo ao Trabalhador. O autor juntouos documentos de f. 14/96 e deu àcausa o valor de R$30.000,00.

Regularmente citado,compareceu o réu e apresentou defesaescrita, reconvenção e incidente defalsidade, sem documentos,procurações às f. 142/144.

Em defesa, alegou: inépcia dainicial; não preenchimento dospressupostos processuais; carênciade ação; o autor cometeu grave ilícitoao induzir o réu em erro, assinandoconfissão que não fez; não praticou atoilícito algum; não se util izou deexpediente fraudulento para lesar ostrabalhadores ou macular a ordempública ou a dignidade da justiça; nãohouve discussão quanto às cláusulasdo termo de ajustamento de conduta;foram os trabalhadores que optarampor ingressar em juízo para haver seuscréditos; a ação está sustentada eminverdades; nunca houve eventodanoso ou conluio para fraude;necessária a comprovação do ato ilícito,do dano e do nexo de causalidade; nãose demonstrou a ocorrência de dano;tem direito à gratuidade de justiça;clama pela improcedência.

Em reconvenção, sustentou: apretensão do reconvindo é absurda eamparada em confissão forjada; oautor agiu de forma insolente,excessiva e leviana e causou danomoral ao réu, que deve ser reparado.Pede a procedência da reconvençãopara anular a alegada confissão,condenando o MPT a pagar aoreconvinte indenização por danosmorais; clama pela justiça gratuita edá à reconvenção o valor deR$15.000,00.

Finalmente, opõe incidente defalsidade do termo de audiênciaextrajudicial em que teria confessadoo ilícito, clamando mais uma vez pelobenefício da justiça gratuita e dando àexceção o valor de R$100,00.

O autor se manifestou sobre adefesa, a reconvenção e a exceção àsf. 146/155.

Foi deferida a liminar, conformedecisão de f. 156/157, para determinarao réu que se abstenha de promoverlides simuladas e praticar atos quelevem empregados ou ex-empregadosa ajuizarem demandas para firmaracordos, sob pena de multa.

O réu apresentou embargos dedeclaração recebidos como simplespetição, sendo mantida a liminar,conforme decisão de f. 164.

Foi requerida pelo réu a oitivado Procurador do Trabalho, Dr. AdolfoSilva Jacob, e do próprio réu, sob osrespeitosos protestos.

Foram inquiridas oitotestemunhas indicadas pelo réu,sendo 7 (sete) delas ouvidas emconjunto, por sugestão do réu e semobjeção do autor.

Encerrou-se a instrução, comrazões finais orais.

Restaram infrutíferas astentativas de conciliação.

É o relatório, passa-se a decidir.

589

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

FUNDAMENTOS

1. Incompetência da Justiça doTrabalho

Ao contrário do alegado peloreconvindo, sendo da Justiça doTrabalho a competência para julgar aação principal, também é sua acompetência para examinar areconvenção, nos termos do art. 109do Código de Processo Civil, aplicadosubsidiariamente.

Rejeita-se a preliminar deincompetência da Justiça do Trabalhopara examinar a reconvenção.

2. Inépcia da inicial

Não existe inépcia no presentecaso, ao contrário do que alega o réu,já que preenchidos os requisitos do §1º do art. 840 da CLT.

Ademais, não se vislumbra napeça de ingresso qualquer dashipóteses do parágrafo único do art.295 do CPC, quais sejam: faltar pedidoou causa de pedir; da narração dosfatos não decorrer conclusão lógica; opedido ser juridicamente impossível;ou contiver pedidos incompatíveis.

Note-se que os termos da inicialpermitiram a ampla defesa do réu, quese valeu a contento de sua garantiaconstitucional.

Assim sendo, rejeita-se apreliminar de inépcia da inicial.

3. Pressupostos processuais -Ação civil pública

Ao contrário do que sustenta adefesa, os pressupostos de constituiçãoe desenvolvimento válido do processoforam observados na ação civil pública.

As partes são processualmentelegitimadas, cabendo ao Ministério

Público do Trabalho, em nome daUnião, defender os interesses difusos,coletivos e individuais homogêneos,na forma do inciso III do art. 129 daConstituição Federal e do art. 1º da Lein. 7.347/85.

O réu, por seu turno, tempersonalidade e capacidadepostulatória, comparecendoregularmente em juízo, após eficazcitação, e apresentando defesa emtodos os termos da ação.

Portanto, rejeita-se a preliminarde extinção da ação civil pública por nãorestarem preenchidos ospressupostos de constituição edesenvolvimento válido do processo.

4. Pressupostos processuais -Reconvenção

Observa-se, ao contrário do quefoi dito no item anterior, que não foramatendidos todos os pressupostosprocessuais na reconvenção.

Note-se que o Ministério Públicodo Trabalho não tem personalidadejurídica, não podendo ser condenadoa indenizar o reconvinte por danosmorais.

Os membros do Parquet agem,repita-se, em nome da União, sem queisso lhes atribua personalidade jurídicae capacidade processual para o fimalmejado pelo réu. Apenas a pessoajurídica de direito público pode serdemandada para ressarcir eventualdano moral decorrente de atos de seusagentes e não estes, pessoalmente ouatravés da instituição a que servem,como pretende o reconvinte.

O Ministério Público doTrabalho, insiste-se, não tempersonalidade jurídica ou legitimidadepara o processo ( legitimatio ad

processum), na condição de réu oureconvindo, no qual se pretende o

590

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

ressarcimento de danos moraisdecorrentes de ato praticado poragente da União.

Tanto assim que arepresentação judicial da União cabeà Advocacia-Geral da União, por seusmembros, na forma do art. 131 daConstituição Federal.

Se não bastasse, oprocedimento escolhido peloreconvinte também não é próprio, nosexatos termos do art. 315 do Códigode Processo Civil, conquanto oreconvindo está a defender interessede outrem.

Como se vê, a pretensão doautor desafia ação própria, em face daUnião, não sendo possível o manejoatravés de reconvenção, no âmbito deação civil pública.

Portanto, extingue-se semresolução de mérito a reconvençãooposta por DALMI ANTUNES DEARAÚJO em face do MINISTÉRIOPÚBLICO DO TRABALHO, no âmbitoda presente ação civil pública, nostermos do inciso IV do art. 267 do CPC.

Custas pelo reconvinte, naforma da lei.

5. Carência de ação

O réu argui a carência de ação,dizendo que as partes são ilegítimas,falta interesse processual e porilegitimidade das partes.

Não tem razão o réu. Note-seque a carência de ação será declaradaquando faltar uma das condições daação, quais sejam: legitimidade ad

causam e não ad processum; interessede agir; e possibilidade jurídica daação.

Deve-se ressaltar, por oportuno,que as condições da ação estãodiretamente relacionadas aoselementos da lide.

O Ministério Público doTrabalho é legít imo detentor daprerrogativa de defesa de interessesindividuais homogêneos, difusos ecoletivos, por força do inciso III do art.129 da Constituição Federal, da Lei n.7.347/85, da Lei n. 8.078/90 e da LeiComplementar n. 75/93, em especial,no art. 83, II I . Não se trata desubstituição processual, ao contráriodo que faz crer o réu.

Sendo o réu aquele que resisteà pretensão do autor, conclui-se que éparte legítima no polo passivo dapresente ação.

O interesse de agir existe pelosimples fato de haver a resistência àpretensão, solucionável, tão-somente,através da prestação jurisdicional.Note-se que foi instauradoprocedimento administrativo, no qualse buscou a composição extrajudicial,não tendo as partes chegado àcomposição, fato incontroverso.

Por fim, a ação do autor não éjuridicamente impossível, ou seja,vedada pelo ordenamento jurídicopátrio. Ao contrário, a ação civil públicaé expressamente prevista nalegislação constitucional e ordinária, jáacima referida. Ressalte-se que amatéria sub examine desafia aapreciação do mérito da presentedemanda, levando à procedência ouimprocedência das pretensões.

Pelo que se expôs, rejeita-se apreliminar de carência de ação, tendoem vista o preenchimento dascondições da ação.

6. Nulidades

As decisões impugnadas peloréu através de “protestos” não traduzemnulidade ou cerceamento de defesa.

Inicialmente, verifica-se que oautor da ação é o Ministério Público do

591

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Trabalho e não o Dr. Adolfo Silva Jacob.O Procurador do Trabalho em questãonão estava presente à audiência deinstrução e não é parte, pessoalmente,mas, sim, é membro de instituição daUnião. Não cabe, portanto, tomardepoimento pessoal do representantedo Ministério Público do Trabalho, autorda ação. Se não fosse o suficiente,verifica-se, ainda, a impropriedade dareconvenção no presente caso, comoexposto alhures, a que a prova sedestinava, como disse o próprio réu (f.167).

Em seguida, também não édado à parte requerer seu própriodepoimento pessoal. Na forma do art.343 do CPC, cabe à parte requerer odepoimento pessoal da outra. De maisa mais, por certo o réu disse tudo oque queria, através de seu ilustreadvogado, ao elaborar sua defesa.

As decisões são sustentadaspelos arts. 130 e 400, inciso I, do CPC,de aplicação subsidiária.

Destarte, rejeitam-se aspreliminares de nulidade.

7. Incidente de falsidade

Pretende o réu, ainda, verdeclarada a falsidade de conteúdo dedocumento extrajudicial tido comoconfissão.

Sem razão, mais uma vez.O documento de f. 94 (ATA DE

AUDIÊNCIA, p. 133/208) resumeaudiência extrajudicial, realizadaperante o Ministério Público doTrabalho, no procedimentopreparatório que deu sustentação àpresente ação.

Não se vislumbra em seu bojoconfissão do réu. Naquela assentada,pelo que da referida ata consta, foiproposta a assinatura de termo deajustamento de conduta pelo

Procurador do Trabalho, tendo o réufeito contraproposta.

Ademais, o documento tem fépública e foi assinado pelorepresentante do Ministério Público,pelo réu e pela servidora TaísaMassimo de Souza.

Note-se, mais, que o réu nãoproduziu qualquer prova de que oconteúdo daquele documento não é afiel expressão do que ocorreu naaudiência.

Portanto, rejeita-se o incidentede falsidade oposto pelo réu.

Tratando-se de ato incidental,nos próprios autos principais, não estásujeito a custas processuais.

8. Ato ilícito e danos moraiscoletivos

Pretende o autor ver o réucondenado a se abster da prática deatos que enumera, além de pagarindenização para reparação de danosmorais coletivos.

Tem-se, portanto, que é dupla apretensão: inibitória e preventiva sobum primeiro aspecto; e reparatória dosdanos morais coletivos.

O réu, por seu turno, nega terpraticado os atos declinados na inicial,com as intenções ali descritas.Sustenta que sempre respeitou osdireitos de seus empregados e jamaispretendeu atentar contra a dignidadeda justiça.

O deslinde da questãodemanda análise pormenorizada detodas as provas colacionadas.

Observa-se que a simulação delides trabalhistas restou amplamentecomprovada nos autos.

Os Srs. Raimundo DeusdethSilveira, Ezio Eduardo de Morais,Geraldo Ferreira de Oliveira, JoséAntônio dos Santos, José Divino

592

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Rodrigues, José Geraldo Nerci eNilson Paulo Batista reconheceram,expressamente, que tinham firmadoacordo com o réu, para ruptura de seuscontratos de trabalho por iniciativadeles, apesar de o empregadordispensá-los, e pagamento das verbasrescisórias mediante a propositura dereclamações trabalhistas (f. 168).

Não é demais notar que ostrabalhadores acima mencionadosnão estiveram assistidos poradvogado, sendo levados ao Setor deAtermação da Justiça do Trabalho peloSr. Márcio José Moreschi, encarregadodo réu (f. 168).

Também restou demonstradoque não foi a primeira vez querescisões de ex-empregados do réuforam pagas através daqueleexpediente, como disse o Sr. Raimundo(f. 168).

O que se conclui, portanto, é quenão existia lide. Os trabalhadores e oréu bateram às portas da Justiça doTrabalho com o intuito único de buscarchancela em acordo que já haviamfirmado. Não há dúvida, portanto, quese tratava de lides simuladas.

Não é demais lembrar quesomente há lide quando existe conflitode interesse ou uma pretensãoresistida, o que não se verificounaqueles feitos.

A testemunha Márcio JoséMoreschi afirmou:

[...] que o depoente foi procuradopor aqueles trabalhadores, nacondição de encarregado, para queintercedesse junto ao réu no sentidode fazerem um acordo, segundo oqual eles seriam dispensados efariam o acordo na Justiça doTrabalho; que os trabalhadorespretendiam fazer o acordo judicialpara que tivessem condição de

sacar o FGTS; que o depoente fezcontato com o réu e se dispôs afazer os acordos para pagamentoparcelado, dadas suas condiçõesfinanceiras; [...]. (f. 167/168)

A prova dos autos demonstra,portanto, que a simulação se fez poriniciativa dos trabalhadores. Nãoobstante, contou com a anuência eparticipação efetiva do réu,pessoalmente e através de seuencarregado.

8.1. Tutela inibitória

Constatado, como dito alhures,que o réu praticou simulação de lidejuntamente com os trabalhadores, oque não exclui a ilicitude de seu ato,mister se faz condená-lo a não maispraticar esses atos.

O fato de não ter sido dele ainiciativa da fraude não afasta ailegalidade de seu ato, já que ele, nomínimo, com ela anuiu e delaparticipou efetivamente.

Também deve ser destacadoque não foi a primeira vez que adotouesse procedimento, o que tornainduvidosa a assertiva dostrabalhadores quanto à iniciativa doirregular procedimento.

Portanto, são procedentes ospedidos, para, ratificando a liminardeferida, condenar o réu a se abster:de promover lides simuladas, visandoà homologação de transação ouconciliação judicial; e de praticar atostendentes a induzir, coagir ou exigir queseus empregados ou ex-empregadosajuízem ações judiciais trabalhistaspara firmar acordos judiciais, sob penade aplicação de multa de R$5.000,00(cinco mil reais) por ato, a ser revertidaa favor do Fundo de Amparo aoTrabalhador (FAT).

593

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

8.2. Danos morais

A análise em torno dasquestões fáticas postas nos autosestá amplamente esgotada nos itensanteriores.

Resta saber, portanto, se cabea pretensa indenização por dano moralou, como preferem alguns, dano denatureza não patrimonial.

Para deferimento da indenizaçãomister se faz ser comprovado o dano; aculpa lato sensu do réu; e a relação decausalidade entre o ato do réu e o dano.Tais considerações decorrem do fato dea indenização ter amparo nos arts. 186e 187 do Código Civil, combinados como art. 81 da Lei n. 8.078/90 (Código deDefesa do Consumidor), de aplicaçãosupletiva, e no art. 1º da Lei n. 7.347/85.

A ilicitude do ato do réu restaevidenciada, sob diversas nuances.

A primeira delas, por atentarcontra a dignidade da Justiça doTrabalho, ao fazer desta órgão dehomologação de rescisão contratual,à margem do disposto nos §§ 1º e 3ºdo art. 477 da Consolidação das Leisdo Trabalho.

Restou violado, também, odisposto no § 6º do art. 477 daConsolidação das Leis do Trabalho,quanto ao prazo para pagamento dasverbas rescisórias.

Em seguida, por atentar contrao Fundo de Garantia do Tempo deServiço, já que não houve dispensasem justa causa antes do malsinadoacordo ter sido entabulado, antesmesmo da propositura das demandas,afrontando-se as disposições do art.20 da Lei n. 8.036/90.

Atenta contra princípios geraisdo processo, já que os litigantes devemexpor os fatos em juízo conforme averdade, proceder com lealdade e boa-fé e não formular pretensões, nem

alegar defesa, cientes de que sãodestituídas de fundamento, nos moldesdo art. 14 do Código de Processo Civil,dispositivo que consagra o princípiogeral da lealdade processual.

Finalmente, afronta princípiosconstitucionais ao trazer às portas doPoder Judiciário l ides simuladas,retardando a prestação jurisdicionalàqueles que realmente dependiamdela, contribuindo sobremaneira,inclusive, para impedir a plenaaplicação do disposto no inciso LXXVIIIdo art. 5º da Lei Maior.

Evidentes, portanto, os danoscoletivos, difusos e metaindividuais,conquanto o ato ilícito atenta contrainteresses de toda a coletividade.

Por dano moral coletivo,entende-se:

...a injusta lesão a interessesmetaindividuais socialmenterelevantes para a coletividade (maiorou menor), e assim tuteladosjuridicamente, cuja ofensa atinge aesfera moral de determinado grupo,classe ou comunidade de pessoasou até mesmo de toda a sociedade,causando-lhes sentimento derepúdio, desagrado, insatisfação,vergonha, angústia ou outrosofrimento psicofísico. (TEIXEIRA,João Carlos. Dano moral coletivo,São Paulo: LTr, 2004, f. 140/141)

Não há dúvida, portanto, que oato do réu, em conjunto com um grupode empregados, agora ex-empregados, lesou a coletividade einteresses difusos ao movimentardesnecessariamente a máquinajudiciária, impondo atraso noandamento de processos daquelesque efetivamente necessitavam daprestação jurisdicional; ao se valer daJustiça do Trabalho como órgão

594

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

homologador de rescisão contratual;ao agir em conluio para sacar saldoem conta vinculada ao Fundo deGarantia do Tempo de Serviço,patrimônio de todos os trabalhadores;e ao faltar com a obrigação de lealdadedas partes em litígio judicial.

Por certo, o ato do réu causarepulsa e indignação à coletividade,aqui representada pelo Parquet.

O nexo causal entre o ato ilícitodo réu e os danos acima referidos éevidente, dispensando-se maisdelongas.

Presentes os requisitos legais,é pertinente a indenização.

O Tribunal Regional do Trabalhoda 3ª Região já se pronunciou sobre otema em outros feitos, como demonstrao seguinte aresto:

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA -VIOLAÇÃO A DIREITOSTRANSINDIVIDUAIS - DANO MORALCOLETIVO - CABIMENTO.Demonstrada a violação a direitoscoletivos, difusos e individuaishomogêneos, torna-se pertinente areparação do dano coletivo,porquanto configurada a lesão ainteresses transindividuais,independentemente de eventualressarcimento de danos morais emateriais a serem postuladosindividualmente pelos titulares dosdireitos violados. O ordenamentojurídico brasileiro admite aindenização por danos morais paraa reparação de lesãoextrapatrimonial causada não só àspessoas físicas, como também àspessoas jurídicas, assim como àcoletividade genericamenteconsiderada, mormente tendo-se emvista a massificação das relaçõesde trabalho e suas repercussões nasociedade. Se há desrespeito a

direitos fundamentais dostrabalhadores, com sua exposiçãoa situações indignas, sujeitos abaixos salários, péssimascondições de trabalho e riscos àintegridade física, deve haver areparação do dano causado, tantona esfera individual quanto nacoletiva, devendo o valor dessareparação, ainda, atender a umcaráter, ao mesmo tempo,pedagógico e compensatório.(Processo RO 01261-2006-013-03-00-0 DJMG de 09.09.2008 - SétimaTurma - Relator DesembargadorEmerson José Alves Lage)

Resta, portanto, estabelecer ovalor da indenização.

É certo que o dano moral éincomensurável, mas deve serreparado por força dos dispositivos,constitucionais e legais, supracitados.Se a indenização em dinheiro nãoretorna a situação ao status quo ante,serve para amenizar o dano moral ecoibir a repetição de atos como osverificados, seja pelo réu ou mesmopor outras partes.

Esse o entendimento doRegional doméstico, em ação civilpública que cuidava de questãoidêntica:

EMENTA: PRÁTICA DE LIDESIMULADA - AÇÃO CIVIL PÚBLICADIREITOS METAINDIVIDUAIS,DIFUSOS, COLETIVOS EINDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS - DANOMORAL COLETIVO -CARACTERIZAÇÃO. Se é verdadeque qualquer ação trabalhista podeterminar em conciliação, não menosverdadeiro é afirmar que as partessó podem se valer do PoderJudiciário para levar uma lide à suaapreciação. A prática da figura da

595

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

“reclamação simulada” é antijurídica.A competência constitucionalatribuída a esta Justiça Especial peloart. 114 da Carta Magna, aliada aopapel social e econômico querepresenta a solução dascontrovérsias decorrentes dasrelações de trabalho dentro dadinâmica de funcionamento eatuação do País, autoriza oconvencimento sobre a existênciade dano moral coletivo praticadopelos militantes da praxe da lidesimulada. A empresa, ao explorardeterminado ramo de atividadeeconômica de forma desenfreada,é responsável pelos atos por elapraticados, principalmente, aquelesque ensejam a sua responsabilidadecivil, em face do ilícito praticado.

A soc iedade modernaedificou-se sobre a liberdade,a produção, o consumo e o lucro.A pós-modernidade,exacerbadora desses valores,luta para inserir o homem nestequarteto, isto é, nestes quatrofios com os quais se teceu o véudo desenvolvimento econômicoglobal, uma vez que a exclusãosocial muito aguda poderácomprometer o sistema.Produção em massa, consumoem massa, trabalho em massa,lesão em massa, desafiando umtípico processo trabalhista paraa massa, concentrando o queestá pulverizado, e que, em últimaanálise, nada mais é do que umprocesso em que se procuratutelar direitos metaindividuais,também denominados decoletivos em sentido amplo,transindividuais, supra-individuais, globais, e tantosoutros epítetos, mas todos com

a marca indelével da lesão emmassa, que é o seu núcleo, asua alma, a sua essência, ou oseu diferencial. A evolução dodano moral no nosso sistemajurídico permite, atualmente, combase na Constituição e nalegislação ordinária, a reparaçãodos danos morais coletivos.Objetiva-se, com essaindenização, oferecer àcoletividade de trabalhadores,tendo como pano de fundo asociedade, uma compensaçãopelo dano sofrido, atenuando,em parte, as consequências dalesão, ao mesmo tempo em quevisa a aplicar uma sanção deíndole inibitória pelo ato ilícitopraticado pela empresa.(00611-2007-021-03-00-7 RO,publicação em 21.06.2008, 4ªTurma, Des. Relator Luiz OtávioLinhares Renault , gr i fosnossos)

(Processo RO 01134-2007-138-03-00-7 - DJMG de 24.09.2008 -Segunda Turma - Relatora JuízaConvocada Taísa Maria Macena deLima)

A fixação do valor da indenizaçãodecorre do arbítrio do juízo que não seconfunde com arbitrariedade, no passoque esta decorre da prática de atoscontrários à ordem legal. Nos dizeresde Wilson Melo da Silva:

Não dispomos de meios científicosque nos auxiliem a aquilatar da exataextensão dos nossos sentimentosmorais. Os testes, abundantes emPsicologia e Psiquiatria, são umcaminho para isso. Talvez algum diase possa, com precisão,determinar-se a enormidade da dor

596

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

de cada qual e, então, fácil será aojuiz estabelecer a compensação demaneira menos subjetiva.(apud Temas de direito e processo

do trabalho - coordenação daAMATRA III - Ed. Del Rey, 1996, p.194)

Enquanto não se alcançamcritérios científicos para apuração dodano moral, que no caso de danoscoletivos é ainda mais difícil, mister sefaz avaliar em cada caso o grau deofensa e as consequências desta.Lembre-se de que a indenização visaamenizar a dor e coibir ou impedir quese repita a prática do ato consideradoilícito.

Com amparo nos preceitos doCódigo Civil, em especial os arts. 944e seguintes, tem-se que três são oselementos a considerar: a gravidadeda lesão; a extensão do dano; e asituação econômica das partes.

As lesões decorreram de culpagrave, já que é de conhecimento pleno,público e notório a il icitude doprocedimento adotado pelo réu. Deve-seobservar, por outro lado, que ostrabalhadores também concorreramculposamente para o ocorrido, o quereduz a participação do réu.

As lesões foram extensas e sederam em diversas esferas, atingindoo Fundo de Garantia do Tempo deServiço, patrimônio de todos ostrabalhadores, os jurisdicionados quese viram preteridos em suasdemandas por lides simuladas e opróprio Poder Judiciário que foiacionado para solucionar l idesinexistentes e para cumprir função quenão lhe compete, a homologação derescisões.

Finalmente, restoudemonstrado que o réu atravessadificuldades financeiras.

Assim sendo, tem-se que aindenização razoável, repita-se, para osefeitos das lesões a interessesmetaindividuais, difusos e coletivos éde R$15.000,00 (quinze mil reais),levando-se em conta a situaçãofinanceira do réu.

Portanto, é procedente o pedido,para condenar o réu a pagar aindenização por danos moraiscoletivos fixada em R$15.000,00(quinze mil reais), a ser revertida aoFundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

9. Correção monetária e juros

O valor devido deve ser corrigidomonetariamente e acrescido de jurosna forma da lei, a partir desta data,aplicando-se as tabelas de correçãoda Justiça do Trabalho e juros de morade 1% (um por cento) ao mês, nãocapitalizados.

10. INSS

Não incidem contribuiçõesprevidenciárias em virtude da naturezada verba deferida.

11. Justiça gratuita

No âmbito do Processo doTrabalho o benefício da justiça gratuitaé extensivo apenas aos empregadose não aos empregadores, como é ocaso do réu.

Nesse sentido:

NÃO-CONHECIMENTO DORECURSO DO RECLAMADO -DESERÇÃO. Ao empregador nãoassiste o direito à assistênciajudiciária gratuita, de que trata a Lein. 5.584/70, que regula a matéria noâmbito da Justiça do Trabalho. Assim,não efetuado o recolhimento do

597

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

depósito recursal (art. 899, § 1º, daCLT) e das custas processuais (art.789, § 4º, da CLT), a que condenadoo reclamado na decisão de origem,impõe-se o não-conhecimento dorecurso, por deserção.(TRT 4ª R. - RO 00400-2007-281-04-00-9 - Rel. Juíza Tânia Maciel deSouza - J. 12.06.2008)

Ademais, não houve alegaçãoou prova de que o réu não possa arcarcom as custas sem prejuízo de seusustento ou de sua família. A simplesalegação de que a pessoa jurídica, daqual o réu é titular, passa pordificuldades financeiras não supreaquela declaração.

Portanto, indefere-se o pedidode justiça gratuita.

CONCLUSÃO

Por tudo que foi exposto,decide-se extinguir, sem resolução demérito, a reconvenção oposta porDALMI ANTUNES DE ARAÚJO em facedo MINISTÉRIO PÚBLICO DOTRABALHO, nos termos do inciso IV doart. 267 do CPC; rejeitar as demaispreliminares arguidas; e julgarPROCEDENTE EM PARTE a ação civilpública oposta pelo MINISTÉRIOPÚBLICO DO TRABALHO, para, nostermos da fundamentação que integraeste decisum, condenar DALMIANTUNES DE ARAÚJO: a se abster depromover lides simuladas visando àhomologação de transação ouconciliação judicial e a se abster depraticar atos tendentes a induzir, coagirou exigir que seus empregados ou ex-

empregados ajuízem ações judiciaistrabalhistas para firmar acordosjudiciais, sob pena de aplicação demulta de R$5.000,00 (cinco mil reais)por ato, a ser revertida a favor do Fundode Amparo ao Trabalhador (FAT); e apagar a indenização por danos moraiscoletivos fixada em R$15.000,00(quinze mil reais), a ser revertida aoFundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

Indefere-se o pedido de justiçagratuita formulado pelo réu.

São improcedentes os demaispedidos lançados na peça de ingresso.

Não incidem contribuiçõesprevidenciárias.

As parcelas da condenaçãoserão apuradas em liquidação porcálculos, incidindo juros de 1% aomês, não capitalizados, e correçãomonetária conforme tabela da Justiçado Trabalho, ambos a partir desta data.

Custas da ação civil públicapelo réu no importe de R$300,00,calculadas sobre R$15.000,00, valorarbitrado à condenação.

Custas da reconvenção peloreconvinte/réu no importe de R$300,00,calculadas sobre R$15.000,00, valordado àquela causa.

Não incidem custas sobre oincidente de falsidade.

Ficam as partes alertadas aobservarem as disposições dos arts.897-A da CLT e 535 do CPC, bem comoadvertidas sobre as penalidadesprevistas nos arts. 14 e 538, parágrafoúnico, do CPC.

Cientes as partes, na forma daSúmula n. 197 do Tribunal Superior doTrabalho.

Encerrou-se.

598

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 01341-2008-047-03-00-5Data: 05.11.2008DECISÃO DA VARA DO TRABALHO DE ARAGUARI - MGJuíza Titular: Drª ZAIDA JOSÉ DOS SANTOS

Reclamante: ABADIA APARECIDA GOMES COELHOReclamado: INDÚSTRIA DE SUBPRODUTOS DE ORIGEM ANIMALLOPESCO LTDA.Decisão proferida em: 05.11.08, às 16:00 horas.

Partes ausentes.Vistos, etc.A teor da Lei n. 9.957/00, que acrescenta dispositivos à Consolidação das

Leis do Trabalho, instituindo o procedimento sumaríssimo no processotrabalhista, fica dispensado o relatório no presente feito, de acordo com o artigo852-I da referida Norma.

DECIDO

Da responsabilidade solidária

Não há falar emresponsabilidade solidária entre“Tripan Ltda.” e “Indústria deSubprodutos de Origem AnimalLopesco Ltda.”, uma vez que asegunda empresa sucedeu a primeirae esse fato não foi contestado pelasegunda reclamada.

Da ilegitimidade passiva

Acolho. O documento de f. 73/76 comprova que a segunda reclamadasucedeu a primeira.

Determino que a Secretaria daVara proceda à retificação da autuaçãoe registros informatizados para constarno polo passivo somente a segundareclamada, INDÚSTRIA DESUBPRODUTOS DE ORIGEM ANIMALLOPESCO LTDA., excluindo-se aprimeira.

Rescisão indireta do contratode trabalho - Danos morais - Assédiomoral

A reclamante requer a rescisãoindireta de seu contrato de trabalho,alegando estar sentindo fortes doresnos braços, pernas e costas, emfunção da repetitividade de seusmovimentos, bem como pela pressãoda reclamada por tratamentoautoritário e arbitrário.

Antes de qualquer análise,sublinho que, ao invés de identificar oselementos caracterizadores doalegado assédio moral em sua causade pedir, a reclamante limitou-se acopiar a doutrina corrente, de formatotalmente desnecessária, uma vezque o juízo deve pelo menos deter omínimo de conhecimento necessáriosobre a matéria. Portanto, desperdiçoua causa de pedir, sem colocar osfundamentos de direito para o pedidode dano moral em virtude de assédiomoral, os quais amparam, ainda, seupedido de rescisão indireta.

Além disso, a reclamante nãoproduziu nenhuma prova nos autos daalegada doença, sequer indicou qualé a doença, não carreando aos autosdocumentos ou informações queindicassem quaisquer indícios dopropalado assédio moral. Não

599

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

bastasse isso, não há pedido derescisão indireta, mas tão-somente deindenização por danos moraisadvindos de assédio moral.

Diante do exposto, indefiro opedido de indenização por danosmorais oriundos de assédio moral porinepto, extinguindo-se o feito, semjulgamento do mérito, quanto a essepedido, nos termos do inciso I do art.267 do CPC.

Da forma de terminaçãocontratual - Verbas rescisórias

Na assentada de f. 265 constapreliminarmente que a reclamantecomunica que não mais compareceráao trabalho a partir desta data(28.10.08) e o faz independentementedo resultado da demanda. Naoportunidade a reclamante assim semanifestou:

que tomou a decisão de não maistrabalhar a partir de hoje porque estásentindo muita dor nos braços...

Como dito acima, a petiçãoinicial não contém pedido de rescisãoindireta, bem como não houve pedidode perícia médica. Dessa forma,embora haja relatos de trabalhorepetitivo e dores por parte da autora, acausa de pedir não apresenta, comovia de consequência, os pedidoscorrelatos.

Dessa forma, na apreciação daforma de resolução contratual, deveprevalecer a manifestação da litiganteem audiência, ou seja, que se demitiu.

Diante desse fato, são devidasas seguintes verbas: férias integrais,simples, + 1/3 e 13º salárioproporcional a 2008 (10/12).

Em face da forma de resiliçãocontratual são indevidas as

seguintes verbas: aviso prévio, multade 40% sobre o FGTS e guias doseguro-desemprego.

É indevida a multa do art. 477da CLT, uma vez que até a data dapublicação desta sentença não houveprazo hábil para pagamento darescisão contratual (pedido dedemissão em 28.10.08, f. 265).

Das horas extras de intervalopara refeição

Postula a reclamante comohoras extras o intervalo de 01 horadestinado à refeição, ao argumento deque

era impossível ir almoçar em seudomicílio, haja vista que tirar ouniforme, de uso obrigatório, sairdas dependências das reclamadas,alimentar-se e retornar ao ambientede trabalho, vestir o uniformenovamente no período de 01 hora étempo ínfimo...

Inicialmente, é inexplicável omotivo de se pedir como extra ointervalo intrajornada quando a própriareclamante admite a sua fruição: “...quecomeçava a trabalhar à 7h e somenteparava às 11h para almoço...”.

Na verdade, o que sedepreende da simples leitura da peçade ingresso é que a autora postula orecebimento do intervalo intrajornadacomo horas extras por não conseguirir almoçar em sua residência, o quenão é possível.

A pretensão da reclamante nãofoi deduzida de forma correta.

Assim sendo, indefiro o pedidode horas extras de intervalo por inepto,extinguindo-se o feito, sem julgamentodo mérito, quanto a esse pedido, nostermos do inciso I do art. 267 do CPC.

600

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Horas extras pela troca deuniforme

A reclamante requer como extras30 minutos diários despendidos natroca de uniforme, sendo 15 minutosna entrada e outros 15 minutos nasaída, razão pela qual deveria chegarmais cedo ao trabalho.

A testemunha CristinaAparecida, f. 266, afirmou que“...gastava 20 minutos para estacionara bicicleta, trocar de roupa, tomar cafée bater o cartão...”.

Embora a necessidade dechegar antecipadamente ao trabalhotenha sido contestada pela reclamada,a inspeção judicial realizada naempresa em 11.03.08 detectou que, defato, é despendido muito tempo desdea chegada à empresa até o registro deponto: quando da saída, às 14h40min,resolveu-se inspecionar os vestiários,os quais se encontram instalados emprédio separado, do outro lado da rua,logo em frente à sede principal, ondetambém funciona o refeitório. Verificou-seque os trabalhadores, após chegarem,vão direto para o vestiário, dentro doqual estão guardados os uniformes,procedem à troca de roupa, colocandocalça, camiseta, avental, bota e touca.Após a colocação dos uniformes, estesse dirigem ao setor de produção,atravessando um túnel subterrâneo.Para tanto, descem 3 lances de escadacom aproximadamente 10 degrauscada, seguidos de uma rampa compelo menos 05 plataformas que dãoacesso ao túnel. Nele se percorrecerca de 7/8 metros e, após, sobemuma escada com aproximadamente 10degraus, para, então, chegarem aolocal onde está instalado o relógio deponto.

Diante da descrição acimatorna-se evidente que são necessários

pelo menos 15 minutos para sepercorrer todo o percurso, vestindo-se,pelo que há bom senso na pretensãoobreira.

Assim sendo, julgo procedenteo pedido de horas extras, para troca deuniforme, cujos valores deverão sercalculados, observando-se osseguintes parâmetros: 30 minutos pordia; dias efetivamente trabalhados;adicional de 50%; divisor 220. A basede cálculo será a totalidade das verbasde natureza salarial pagas no decorrerdo contrato de trabalho, nos termos daSúmula n. 264 do TST.

Em face da habitualidade, ashoras extras refletem nos RSRs, nostermos da Súmula n. 172 do TST eestes (HE + RSR), por sua vez,compõem a base de cálculo para aapuração dos reflexos em férias + 1/3e 13º salários.

Das horas extras em funçãoda não concessão de intervalo de 10minutos a cada 50 trabalhados

As atividades executadas pelademandante não se enquadramnaquelas descritas na NR-17. Nessascondições, mister seria a realização deperícia técnica, que não restourealizada nem requerida, a fim de secomprovar a existência de trabalho nosmoldes previstos pela NR-17, razãopela qual também o pedido de horasextras por esse fundamento fica extinto,sem resolução do mérito.

Do adicional de insalubridade

A reclamante exerceu a funçãode ajudante de produção, consoantepeça exordial e comprovadapericialmente.

Durante a inspeção pericialrestou configurada a existência de três

601

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

fatores de risco potencial à saúde dareclamante: agentes químicos,biológicos e umidade.

Quanto aos agentes químicos,eram util izados no processo deamolecimento e branqueamento dastripas o hipoclorito de sódio, veromax(dióxido de cloro) e ácido acético.

Para as atividades em que osempregados ficam expostos a agentesquímicos, segundo a NR-15, acaracterização da insalubridade ocorrequando são ultrapassados os limitesde tolerância (absorção por viarespiratória), conforme Anexo doQuadro 1 da mesma norma.

Segundo informações do expert

nos autos de n. 1284/08, o ácidoacético e o cloro têm absorção somentepor via oral e seu índice de tolerânciaé, respectivamente, 8 e 0,8ppm. Assimsendo, impossível a contaminação poresses agentes em face dainviabilidade de absorção pela pele oupelas vias respiratórias.

Quanto ao hipoclorito de sódio,embora mencionado mas não estudadono laudo técnico, não consta do Quadro1 da NR-15, nem mesmo em sua formapura (sódio), donde se descarta apossibilidade de contaminação poresse agente químico.

Descartada, portanto, qualquerpossibilidade de contaminação poragentes químicos.

Relativamente aos agentesbiológicos, a NR-15 prevêinsalubridade para as atividades demanuseio de vísceras animais, nocaso dos autos, tripas, em face dapossibi l idade de contato comanimais portadores de doençasinfecto-contagiosas (carbunculose,brucelose, tuberculose).

Explica aquele perito que aparede da tripa é composta por 3camadas, sendo que as bactérias se

alojam nas camadas internas,compostas de músculos e mucosas.No matadouro pode haver mistura detripas de animais doentes e sadios,no entanto, no procedimento delimpeza das tripas são retiradas ascamadas internas, por consequência,eliminam-se as bactérias.

Esse procedimento de limpezadas tripas é realizado nos matadourose elimina qualquer possibilidade decontaminação posterior por bactérias.

Resta, pois, analisar apossibilidade de condições insalubresde trabalho em face da umidade.

Pois bem. Inicialmente, éoportuno esclarecer que a NR-15estabelece em seu Anexo 10 que Asatividades ou operações executadas emlocais alagados ou encharcados, comumidade excessiva, capazes de produzirdanos à saúde dos trabalhadores,serão consideradas insalubres emdecorrência de laudo de inspeçãorealizada no local de trabalho, ou seja, oreconhecimento da insalubridadedepende apenas e tão-somente daconfirmação de condições insalubrespor laudo pericial.

É interessante observar que areclamada juntou aos autos várioslaudos oficiais (f. 138/158) sobre amesma matéria apresentados emoutras ações que tramitam neste juízo,e todos eles, sem exceção, negam aexistência de insalubridade, nãoobstante tenham reconhecido que oambiente de trabalho é extremamenteúmido, o que, a princípio, parece umcontrassenso.

No entanto, o motivo daaparente contradição reside nosimples fato de todos os laudos jáconfeccionados terem estudado aquestão da umidade no seu aspectomenos relevante, ou seja, os efeitosdo contato direto da água sobre a pele.

602

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

O que nenhum perito sequerpercebeu é que os danos mais gravesà saúde dos trabalhadores não residenesse ponto, mas sim naquele quepassou despercebido - os efeitosindiretos da água, e que serão objetode análise profunda neste momento.

Antes de qualquer consideração,percebe-se que a reclamada insiste emperguntar em seus quesitos se oproduto químico “água” é insalubre, aoque todos os peritos responderam que“não” e esta magistrada respondefirmemente que “sim”.

É óbvio e inquestionável que aágua é imprescindível à vida, noentanto, quando em excesso, éprejudicial e insalubre para o serhumano, não somente em contatoexterno com a pele mas tambémquando ingerida em excesso. Explicoos dois casos:

Segundo artigo publicado naRevista SUB n. 11 - Junho/Julho de1995 e no Journal of Underwater

Education - Sources - NAUI - Fall 1996Vol. 8 Issue 4, e, ainda, informaçõesobtidas no canal educativo Discovery

Channel, programa “Sobrevivi”, obalanço hídrico ou quantidade de águacorporal é regulado através de doismecanismos: ingestão de água (oulíquidos) induzida pela sede e excreção(atividade dos rins que retém parte daágua ingerida e excreta a quantidadeque não necessita).

Quando se passa mais de 24horas na água, a exemplo do queacontece com os náufragos, ainfluência da pressão hidrostáticacausa um desvio da distribuição dofluxo sanguíneo para as veias centrais,de tal modo que no interior da caixatorácica passam a circular 0,2 a 0,4litros de sangue a mais, o que geraum aumento do volume cardíaco de770 para 920 ml.

Isso acontece também porquea temperatura corporal interna é maiordo que a temperatura da água naturale, com isso, ocorre umavasoconstricção periférica, umadiminuição da irrigação sanguínea nosmembros, porque o cérebro tentapreservar os órgãos mais vitais(localizados no tórax).

Lado outro, a maior quantidadede sangue no coração afetaespecialmente o vestíbulo esquerdo eimpede a liberação do hormônioantidiurético, que bloqueia a secreçãourinária. A consequência é uma diureseaumentada, chamada “reflexo deGauer–Henry”. Mas não é só o reflexoGauer-Henry que leva ao aumento dovolume de urina excretada, mastambém a contração dos tecidos devidoao frio (vasoconstricção periféricaacima explicada).

A consequência imediata é quetodo o excesso de água do organismo(o corpo tem reserva de água) seráeliminado nas primeiras 24 horas.

A vasoconstricção leva àhipotermia, diminuição da temperaturainterna do corpo causada por umaexposição excessiva ao ambienteaquático. Quanto menor a temperaturada água, menor o tempo desobrevivência, pois a perda calórica égradativa.

Aparecem os primeiros sinaise sintomas: tremores por todo corpo,lábios cianóticos (azulados), perda dasensibilidade nas extremidades e, porfim, confusão mental, quando, então,ocorre um colapso físico e mental que,se não socorrido a tempo, leva à morte.

O contato contínuo da pele coma água causa feridas e inchaços, e, emcaso de contato prolongado eininterrupto, a pele começa a se soltarliteralmente. Se a água for salgada, oprejuízo é mais rápido, pois ela retira a

603

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

umidade natural da pele, provocandoirritações e eczemas, auxiliando no seudesprendimento mais rápido.

A imersão dos pés em águacom temperatura baixa produzvermelhidão, bolhas e feridas, podendoresultar em gangrena, conforme otempo de exposição. E nem se digaque esse resultado seria causado pelabaixa temperatura e não pela água,pois a água é muito melhor condutorado frio do que o ar.

Provado o grande efeitodeletério que a água pode ocasionarquando em contato externo com a pele,passamos a descrever os efeitosdevastadores da ingestão exageradadesse elemento.

De acordo com recentes artigospublicados na WEB, dentre eles aquelede autoria de Luis Fernando Correia(“Saúde em foco”, 13.08.08. Globo.com)e do Gatorade Sports Science Institute,pesquisadores americanos estãorevendo o conceito firmado nas últimasdécadas de que as pessoas devemingerir água em abundância, chegandoa vários litros ao dia. Na verdade, oconsumo exagerado de água leva àdiminuição da quantidade de sódio noorganismo, principalmente pelo suor,e as reservas desse sal mineralficariam baixas e o consumo constantee exagerado de água levaria àreposição somente desse elemento,em detrimento ainda maior do sódio.O resultado é drástico, ocasionandodistúrbios gastrointestinaismoderados (concentração plasmáticade sódio entre 125/135mmol/l),cefaleia, vômitos, edema de mãos epés, inquietação, fadiga incomum,confusão e desorientação (paraconcentração plasmática de sódiomenor que 125mmol/l) e paradarespiratória, edema cerebral e coma,com danos cerebrais permanentes e

morte (para concentração plasmáticade sódio inferior a 120mmol/l). Estaúltima fase é a chamada encefalopatiahiponatrêmica dilucional (há mais águaque o normal para a quantidade desubstâncias dissolvidas no plasma).

Portanto, caiu por terra omodismo de incitar as pessoas abeberem o máximo de água quepuderem. O corpo humano tem umareserva de até dois litros de água paraser utilizada. A ingestão excessiva deágua gera desequilíbrio naconcentração de sódio, que pode atélevar à morte, devendo ser retomada amáxima de que a sede continua sendoo melhor parâmetro para nos guiar naquantidade de água a ser ingerida.

Diante de todo o exposto, aconclusão a que se chega é óbvia: nãoobstante seja essencial à criação davida e sua manutenção, a água podese tornar elemento insalubre quandoem excesso, seja externamente, emcontato prolongado com a pele, ouquando ingerida em excesso.

Lado outro, não podemosolvidar que, relativamente ao caso daautora, a água é o elemento deinsalubridade, não pelo contatoprolongado com a pele ou por ingestãoexcessiva, mas pela saturação do meioambiente de trabalho, o que passo aanalisar.

Há unanimidade nos autosquanto ao alagamento do ambiente detrabalho da reclamante. Até mesmo atestemunha trazida pela reclamada nosautos do Processo n. 1284/08, SrªMaura José da Silva, manifestou-senesse sentido:

...que o piso é molhado porque hojetem o encanamento que libera águapara o ralo; que existe esseencanamento há três ou quatromeses; que antes ficava mais

604

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

molhado porque antes abria o tanquee a água tinha que escorrer até oralo e atualmente a água vai diretopara o ralo; que, antes, secaminhasse em cima da águaespirrava; e ainda atualmente temum rapaz de nome Jéfersonexclusivamente para secar o chãocom um rodo; que o tanque eraaberto 01 ou 02 vezes no dia; queatualmente essa água é trocadaautomaticamente; que o Jéfersonsomente entra em ação quandoacontece algum incidente.

A perícia oficial detectou que

os tanques com água sãodescarregados no piso [...] o localde trabalho da reclamante é úmido ealagado...

Não bastasse isso, à exceçãodo laudo técnico elaborado por peritoassistente da empresa, TODOS osdemais laudos anexados aos autospela reclamada confirmam oalagamento:

No local em que a reclamantelaborou, ao retirar as tripas dotanque cheio d’água e colocá-lassobre a mesa, trabalho decalibração, a água escorre das tripase cai no piso, encharcando-o. (f.143)

No processo de beneficiamentode tripas é utilizada água em abundância,ficando o piso constantementemolhado. Considera-se o local detrabalho em termos de confortoambiental como ruim. (f. 148)

O ambiente de trabalho éextremamente úmido, pois as tripasestão condicionadas em tanques de

300 litros cheios de água e, aocolocá-las sobre a mesa, o excessode água escorre para o pisocerâmico, não escorregadio,encharcando-o. Sendo que a água,em abundância, escorre paracanaletas próprias para seuescoamento. (f. 153)

Não obstante a constatação dealagamento, todos os peritosacabaram por desviar o verdadeiro focode atenção (umidade do ar),transferindo o potencial deinsalubridade para a existência ou nãode roupas molhadas dos empregados,o que se constitui em verdadeirodisparate.

É claro que o uso frequente deroupas molhadas também implicacomplicações de saúde, conformereconhecido pelo laudo pericial,realizado pelo Perito Filadelfo DiasFerreira, nos autos do Processo n.1284/08: “no dia da perícia, asfuncionárias que realizavam asmesmas atividades da reclamanteutilizavam os EPIs [...] e não estavammolhadas, exceto as mãos eantebraços, no entanto, no dia 27.09.07às 15 horas este perito realizavaperícia nesta empresa e neste horáriohavia no almoxarifado cincofuncionárias solicitando roupas porqueestavam molhadas”, havendo risco dese contrair resfriados, gripe epneumonia.

É necessário tecer doiscomentários neste momento. Areclamada afirma que fornece os EPIspara a realização das tarefas, contudo,ainda assim é frequente ostrabalhadores se molharem a ponto desolicitarem outras vestimentas, o que,por si só, já é prejudicial à saúde eimplicaria o correspondente pagamentodo adicional de insalubridade. Contudo,

605

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

conforme acima narrado pelo perito, aoque parece, a reclamada providenciaverdadeira maquiagem no ambiente detrabalho quando da realização deperícias, já que estas são realizadascom dia e hora determinadospreviamente.

Nesse ponto, abre-se umparêntese para esclarecer que o peritoJosé Eduardo de Melo, nos autos doProcesso n. 1.709/07, confirmou essatese, pois textualmente declarou que,no dia da perícia, a situaçãoencontrada era diversa daquelaencontrada por esta Magistrada,quando resolveu fazer uma diligênciano local de trabalho daquelareclamante. Naquela ocasião, várioseram os trabalhadores que estavamliteralmente “molhados”, fatoconfirmado por fotografias.

Outro ponto crucial reside nofato de o chão do galpão de trabalhoencontrar-se habitual econstantemente encharcado.

O ar atmosférico contémquantidade variável de vapor de águaconforme a temperatura, região,estação, etc., resultante da evaporaçãodas águas dos mares, rios e lagos,sobretudo pela ação do calor solar. Otempo depende não apenas dosventos, mas também da umidade. Noverão é comum termos a sensação deque nossa pele está constantementemolhada, dando a impressão de que osuor tem dificuldade em evaporar-se.Isso acontece porque a umidaderelativa do ar está alta. A umidaderelativa do ar é o quanto um espaçocomporta de vapor d’água por metrocúbico. Quanto maior a quantidade devapor d’água maior é a umidade relativae quanto maior a umidade relativamaior é a sensação de calor.

A quantidade de vapor d’águanecessária para saturar um volume

aumenta com a temperatura.Geralmente, os valores da umidaderelativa encontrados próximo àsuperfície da terra estão em torno de60%; acima desse valor, há excessode umidade do ar.

Um fato interessante ligado àumidade relativa é que o homemsente-se melhor em um ambiente comumidade baixa - mesmo a despeitode forte calor - do que em lugares deumidade relativa elevada etemperaturas menores. Nestesúltimos, o suor custa mais a evaporar,razão pela qual a sudorese, ainda queabundante, não provoca resfriamentosensível. Uma sudorese muito menorem ambiente de ar seco permite, aocontrário, uma evaporação rápida dosuor e uma consequente diminuiçãode temperatura.

Se o indivíduo vive num lugar emque o ar é seco no verão, isto é, aumidade relativa é baixa, este sualivremente e pode suportartemperaturas superiores a 37 grausCelsius. Num lugar de muita umidadesente-se calor mesmo a 25 grausCelsius. Não é o calor, é a umidadeque faz o indivíduo sentir-se mal. O seuconforto térmico depende não só datemperatura do ar como também desua umidade relativa.

Pois bem. O laudo técnico deavaliações ambientais anexado ao feitode n. 1284/08 pela própria reclamada,revela que o piso é de cimentoindustrial, cobertura em telhasmetálicas, painéis em alvenaria eestruturas de sustentação metálicasem concreto.

Feitas essas considerações,podemos tecer o quadro ambiental realsuportado pelos empregados da ré: opiso de cimento industrial quandoaquecido mantém (e retém) atemperatura por muito tempo, o que

606

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

torna o ambiente abafado. Asestruturas de sustentação sãometálicas e de concreto, materiais que,quando aquecidos, também retêm ocalor, aumentando ainda mais o calorno ambiente. Não bastasse isso, acobertura do galpão é de telhasmetálicas, sendo despiciendo exporqualquer comentário sobre o grau dedesconforto térmico produzido poresse material.

Some-se a tudo isso oambiente alagado permanentemente,o que leva à evaporação constante,mantendo alta a umidade relativa doar.

Além disso, as temperaturasmédias em nossa região variam de 25ºa 42º, na maior parte do ano, de acordocom os termômetros instalados emnossas residências (à sombra) etambém nos automóveis, embora astemperaturas “oficiais” nem sempre semostrem tão elevadas. A figura doinverno praticamente desapareceu,havendo, tão-somente, alguns poucosdias de temperaturas mais amenas,as quais, no entanto, não podemcaracterizar a estação como “inverno”em seu verdadeiro sentido.

Resumindo e relembrando, areclamada tem um piso que esquentae demora a liberar o calor e um telhadometálico que aquece rapidamente eretém as altas temperaturas,promovendo uma sensação deaquecimento de cima para baixo (emrazão do tipo de telhado) e de baixopara cima (em função do tipo de piso).O ambiente permanentemente alagadoassociado ao calor provocado pelopiso e pelo telhado aceleram aevaporação da água do piso,aumentando a umidade do arambiental. Associem-se a esses fatosas altas temperaturas que assolam omunicípio quase a totalidade do ano e

tem-se uma sensação térmica aindamaior em função da alta umidade doar, ou seja, os empregados dareclamada estão sendo,verdadeiramente, cozidos no dia-a-dia.

É altamente recomendável quea empresa adote procedimentos comvistas a colocar em primeiro plano asaúde de seus empregados, retirandoo excesso de água do ar e do piso,mantendo a umidade relativa do ar empercentuais ideais (40% a 50%),através de procedimentos como ainstalação de higrômetro,desumidificadores (de serpentina, porresfriamento, desumidificaçãoquímica), umidostato, termohigrômetro(mede ao mesmo tempo a temperaturae a umidade), etc.

Um dos grandes avanços dosúltimos tempos é o controle total daumidade, bastando à reclamada maiorboa vontade para resolver o problemade forma efetiva, inclusive quanto aopiso constantemente molhado, pois denada resolveria corrigir os demaisproblemas que elevam a temperaturainterna e manter o piso molhado.

A alta umidade do ar pode trazerproblemas sérios como a proliferaçãode fungos e ácaros no ambiente,aumentando o número de casos dealergias e reumatismos, não sepodendo colocar em planos diferentestanto o controle da umidade como ocontrole da temperatura.

Hoje já se sabe que o confortotérmico garante o bem-estar e estáligado diretamente a um melhordesempenho e maior produtividade noambiente de trabalho.

Ademais todos os fatos aquiexpostos foram comprovados durantea inspeção judicial realizada naempresa em 11.03.08, da qualtranscrevo as seguintes passagenssobre o ambiente de trabalho:

607

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Em todo o ambiente o barulho éintenso e contínuo (dificultando acomunicação normal), com odorcaracterístico e desagradável e, aosentir do Juízo, com iluminaçãodeficiente e pouca ventilação,especialmente a natural. Todo o chãoé molhado, sendo em alguns lugaresencharcado, com formação depoças d’água e escorregadio.Existem canaletas, mas sãoinsuficientes para o escoamento detoda a água, seja porque o volume éacima do esperado, seja porque nelase contém sal, o que dificulta oescoamento espontâneo.

Além disso, a solução de água esal cai dos tanques continuamente,existindo, inclusive, uma torneira quejoga água diretamente no piso.

A inspeção também detectou quea maioria dos trabalhadores nãoutiliza as luvas ou qualquer outro tipode EPI em todos os setores deprodução. É comum que otrabalhador fique molhado porque épreciso mergulhar todo o braço nostanques com as tripas.

Constatou-se também que opróprio trabalho desempenhado porum funcionário ajuda a molhar ooutro, respingando água no chãodurante todo o expediente.

Os poucos trabalhadores que seutilizavam de luvas queixaram-seque elas não impedem o contatodireto com a água, permanecendomolhados praticamente durante todaa jornada de trabalho.

Ressalto que os cremesprotetores utilizados pela reclamadanecessitam ser renovados a cada04 horas, o que, em face do tipo detrabalho e por permaneceremconstantemente encharcados,presume-se que não era feito, atéporque o creme não poderia ser

passado no local de produção,necessitando da retirada dosfuncionários para os vestiáriossomente para se proceder a esseato.

Por todas as razões acimaexpostas, julgo procedente o pedido deadicional de insalubridade, em graumédio (20%), durante todo o contratode trabalho, devendo ser calculadosobre o valor do salário-mínimo. Sãodevidos, ainda, reflexos em 13ºsalários, férias + 1/3 e FGTS.

A existência do trabalho emcondições insalubres e o pagamentode adicional de 20% deverá constardas anotações da CTPS obreira,incorporando à sua remuneração,ficando desde já determinado que areclamada proceda às devidasanotações, no prazo de 05 dias após otrânsito em julgado desta sentença,nos termos do art. 29 da CLT, sob penade multa no valor de R$5.000,00 (cincomil reais) e anotação substitutiva pelaSecretaria desta Vara, além deexpedição de ofício ao Ministério doTrabalho e Emprego para aplicação deoutras sanções cabíveis.

Dos honorários periciais

Sucumbente na pretensãoobjeto da perícia, a reclamada deveráarcar com os honorários periciais, oraarbitrados em R$2.200,00, nos termosdo art. 790-B da CLT.

Da responsabilidade social -Dumping social

Diz a Lei n. 6.938/81, art. 3º,iniciso I, que

meio ambiente, o conjunto decondições, leis, influências e

608

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

interações de ordem física, químicae biológica, que permite, abriga erege a vida em todas as suasformas.

Como se vê, optou o legisladorpor uma definição ampla, a fim de criarum espaço positivo de incidência danorma legal ao caso concreto,podendo-se afirmar, como o fez CelsoAntônio Pacheco Fiorillo1, que

meio ambiente do trabalho é o localonde as pessoas desempenhamsuas atividades laborais, sejamremuneradas ou não, cujo equilíbrioestá baseado na salubridade do meioe na ausência de agentes quecomprometam a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores,independentemente da condição queostentem (homens ou mulheres,maiores ou menores de idade,celetistas, servidores públicos,autônomos, voluntários, etc).

Destarte, seguindo-se amesma linha de raciocínio, pode-seconcluir que o meio ambiente detrabalho adequado e seguro é um dosimportantes e fundamentais direitos docidadão, o qual, se desrespeitado,provoca agressão a toda sociedade,que, no final das contas, respondepelas mazelas decorrentes deacidentes do trabalho ou doençasprofissionais a eles equiparadas.

O Estado brasileiro vemadotando medidas legais paraprevenção dos acidentes do trabalho,em respeito à Constituição Federal queelevou esse direito à categoria dosdireitos fundamentais, consoante art.

7º, inciso XXII, dotando os Sindicatos,Ministério Público e demais entidadesautorizadas (CF, arts. 8º, III, 127 e 129e Lei n. 7.347/85) de competência pararepresentar o trabalhador, individual oucoletivamente, a buscar a necessáriasolução por meio do Poder Judiciário.

Para Raimundo Simão de Melo2,são causas de inadequação do meioambiente de trabalho e do alto índicede acidentes do trabalho (ou doençaprofissional, acrescenta-se)

a) a falta de investimento naprevenção de acidentes por partedas empresas; b) os problemasculturais que ainda influenciam apostura das classes patronal eprofissional no que diz respeito ànão priorização da prevenção dosacidentes (ou doenças) laborais; aineficácia dos Poderes Públicosquanto ao estabelecimento depolíticas preventivas e fiscalizaçãodos ambientes laborais, osmaquinários [...] inadequados demuitos fabricantes que não cumpremcorretamente as normas desegurança e orientações previstasem lei; e e) a precariedade dascondições de trabalho por conta depráticas equivocadas deflexibilização do Direito do Trabalho.

E continua o i. articulista:

A solução desses problemasdepende, antes de tudo, daconscientização (grifa-se) de todos:do Estado, da coletividade

1 FIORILLO, Antônio Pacheco. In Curso de

direito ambiental brasileiro, p. 21.

2 Raimundo Simão de Melo, no artigopublicado na Revista “No Mérito”, daAMATRA 1 (Associação dos Magistradosda Justiça do Trabalho da 1ª Região), Riode Janeiro, Ano XIII, n. 37, abril/2008.

609

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

(enfatizada a atuação dosrepresentantes dos trabalhadores,ou seja, sindicatos), das empresas,dos fabricantes, importadores efornecedores de máquinas eequipamentos, o que deve passarpor um processo educativo de todosos níveis (CF, art. 225, Inciso VI).

Realmente, analisando o art.225 da Carta Magna, vê-se que foiassegurado, pela primeira vez, que

Todos têm direito ao meio ambienteecologicamente equilibrado, bem deuso comum do povo e essencial àsadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividadeo dever de defendê-lo e preservá-lo para presentes e futurasgerações.

Mas, como atingir esse nível deconsciência? Conhecendo a realidadee buscando meios de transformá-la,ainda que seja com a adoção demedidas pedagógicas.

Pois bem. No primeirosemestre do ano de 2008 a Vara doTrabalho de Araguari recebeu 1070reclamações trabalhistas, sendo que39 foram ajuizadas em face dareclamada; destas, 33 foram compedido de rescisão indireta, em razãodas péssimas condições de trabalho(insalubridade) e 02 em razão dedoença profissional.

Quando o magistrado serecusava a homologar o acordo econseguia sensibil izar parte eadvogado a dar prosseguimento aofeito, com realização de prova pericialtécnica, o laudo era negativo. E quando,por fim, admitia-se a produção de provaoral para que o trabalhador tentassefazer contraprova, também o resultadoera negativo.

Diante desse quadro, estamagistrada resolveu por bem conhecero local de trabalho, constatando que asituação era exatamente aquela narradapelos trabalhadores. Curiosamente, noProcesso n. 1.709/07, que deu origemàquela diligência, já havia sido feita umaperícia com laudo negativo. O perito foidestituído. No entanto, a seurequerimento, deu-se a oportunidade aomesmo profissional de analisar asinformações e fotografias colhidasquando da diligência e o mesmodeclarou que, quando chegava à fábricapara realizar a perícia, diversa era asituação encontrada.

A propósito, assim semanifestou o perito naqueles autosnomeado, Sr. José Eduardo de Melo:

...Item 1. Na diligência realizada nodia 15.01.08, às 10h30min, o Peritodo Juízo, em cumprimento ao seudever, verificou todos os locais emque a reclamante laborou e, em facedas inspeções e condiçõesverificadas, não considerou comosendo insalubre suas atividades emrelação a ruído, umidade, agentesquímicos, conforme conclusão dolaudo de f. 408/409. Item 2.Respeitosamente o Perito do Juízovem diante de Vossa Excelênciaexpor que as condições verificadase devidamente registradas naInspeção Judicial diferem daquelasencontradas no dia 15/01/08. Aorecorrermos à f. 400, do LaudoTécnico Pericial, temos a foto “SETORDE AMOLECER TRIPAS: CANOS DEAR E ÁGUA”, tiradas pelo Perito doJuízo e aquelas tiradas na InspeçãoJudicial, f. 454, foto 20, onde se podeobservar que se trata do mesmofuncionário e na mesma função.Ocorre que, na diligência realizadapelo Perito do Juízo, o mesmo fazia

610

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

uso de luva, não tinha mãos, braçose antebraços molhados. Nainspeção judicial verificou-se que omesmo funcionário não fazia o usode luvas, que o volume de água eramaior e que as mãos, braços eantebraços estavam molhados...

A empresa-ré vem informando,desde então, que medidas de melhoria- apesar de continuar sustentando asua desnecessidade - foram tomadas,como fornecimento de creme protetore encanamento dos tanques. Nãoobstante, os embates continuam.

Mas, o que isso tem a ver comdumping social?

Com a palavra, o i. Magistrado da15ª Região, Dr. Jorge Luiz Souto Maior3:

Ora, a responsabilidade socialassumida pelas empresas implica,no mínimo, que não se neguem apagar os direitos trabalhistasdaqueles cujo trabalho lhes serviu,ainda que indiretamente. Por umafalta de visão realmente ética emesmo do alcance da noção jurídicada responsabilidade trabalhista, asgrandes empresas, muitas delas,impõem sacrifícios aostrabalhadores, empunhando tesesjurídicas que lhes excluem dequalquer responsabilidade. [...]Importa compreender que os direitossociais são o fruto do compromissofirmado pela humanidade para quese pudesse produzir,concretamente, justiça social dentrode uma sociedade capitalista. Essecompromisso em torno da eficáciados Direitos Sociais se

institucionalizou em diversosdocumentos internacionais nosperíodos pós-guerra, representandotambém, portanto, um pacto para apreservação da paz mundial. Semjustiça social não há paz, preconizao preâmbulo da OIT (OrganizaçãoInternacional do Trabalho). Quebraresse pacto significa, porconseguinte, um erro histórico, umatraição a nossos antepassados etambém assumir uma atitude dedescompromisso com relação àsgerações futuras.[...] O desrespeito aos direitostrabalhistas representa,consequentemente, um crime contraa ordem econômica, conformedefinido no art. 20, inciso I, da Lei n.8.884/94, punível na forma do art.23, inciso I, da mesma lei.

E continua:

Nos termos da lei em questão, “Serãosolidariamente responsáveis asempresas ou entidades integrantesde grupo econômico, de fato ou dedireito, que praticarem infração daordem econômica”.[...] O art.170 da Constituiçãobrasileira é claro ao estipular que “aordem econômica, fundada navalorização do trabalho humano ena livre iniciativa, tem por fimassegurar a todos existência digna,conforme os ditames da justiçasocial”, observados, dentre outros,os princípios da função social dapropriedade (inciso III) e da buscado pleno emprego (inciso VIII). Opróprio Código Civil não passou embranco a respeito, fixando a funçãosocial do contrato (art. 421 e § 1º doart. 1.228).[...] A eficácia das normas denatureza social depende,

3 SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de

direito do trabalho. V. II, São Paulo: LTr,março de 2008, p. 177/192.

611

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

certamente, dos profissionais dodireito (advogados, juízes,procuradores, professores, juristasem geral), mas também de um sentidoético desenvolvido em termosconcorrenciais, para quereprimendas sejam difundidaspublicamente aos agressores daordem jurídica social a fim de que asociedade tenha ciência dasituação, desenvolvendo-se umanecessária reação até mesmo emtermos de um consumo socialmenteresponsável, com favorecimento àsempresas que têm no efetivorespeito aos direitos sociais o seusentido ético.

No aspecto da reparação, onobre defensor dessa tese explica que

[...] o tema em questão atrai aaplicação do provimento jurisdicionaldenominado na experiênciaamericana de fluid recovery, ouressarcimento fluido ou global,quando o juiz condena o réu deforma que também o dano coletivoseja reparado, ainda que não sesaiba quantos e quais foram osprejudicados e mesmo tendo sido aação intentada por um único indivíduoque alegue o próprio prejuízo.[...] As agressões ao Direito doTrabalho acabam atingindo umagrande quantidade de pessoas,sendo que dessas agressões oempregador muitas vezes se valepara obter vantagem naconcorrência econômica comrelação a vários outrosempregadores. Isto implica, portanto,dano a outros empregadores nãoidentificados que, inadvertidamente,cumprem a legislação trabalhista, ouque, de certo modo, se veemforçados a agir da mesma forma.

Nesse ponto, abre-se umparêntese para informar que a mesmareclamada, atuando por empresa a elacoligada no Frigorífico Mataboi, nestacidade de Araguari, efetua o pagamentodo adicional de insalubridade a todosos empregados que por lá laboram nasmesmas condições e funções, sob oargumento de que o faz tão-somenteporque o local onde o trabalho édesenvolvido se refere a um frigorífico.

A propósito, nos autos doProcesso n. 1.219/08, o Sr. Manoel RosaJúnior declarou-se representante legalda empresa-reclamada e nos autos doProcesso n. 1.341/08, assim declarou:

...que a empresa Marco AntônioMikelaitis terceirizou os serviços dareclamada e trabalhavaespecialmente para a matriz que naépoca era a Lopesco; que a Tripanera uma empresa controlada pelaora segunda reclamada, LopescoLtda.; que, desde fevereiro/2008, asegunda reclamada Lopescoincorporou a primeira reclamadaTripan; [...] que, até 02 meses atrás,quem prestava serviços para ofrigorífico Mataboi era a empresaAna Maria Mikelaitis (esposa do Sr.Marco Antônio); que atualmente é aprópria Lopesco, diretamente, quempresta serviços no Mataboi; que noMataboi a reclamada pagainsalubridade porque seguem anorma do Frigorífico...

Resultado, como sustenta oautor em comento:

Precarização completa das relaçõessociais.Óbvio que esta prática traduz-secomo dumping social, que prejudicaa toda a sociedade, e óbvio,igualmente, que o aparato judiciário

612

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

não será nunca suficiente para darvazão às inúmeras demandas em quese busca, meramente, arecomposição da ordem jurídica naperspectiva individual, o querepresenta um desestímulo para oacesso à justiça e um incentivo aodescumprimento da ordem jurídica.Nunca é demais recordar quedescumprir, deliberada ereincidentemente, a legislaçãotrabalhista, ou mesmo pôr em riscosua efetividade, representa umdescomprometimento histórico com ahumanidade, haja vista que aformação do Direito do Trabalho estáligada diretamente com o advento dosdireitos humanos que foramconsagrados, fora do âmbito daperspectiva meramente liberal doséculo XIX, a partir do final da 2ªGuerra Mundial, pelo reconhecimentode que a concorrência desregradaentre as potências econômicasconduziu os países à conflagração.

Por fim o autor informa que

[...] Como critério objetivo paraapuração da repercussão social dasagressões ao Direito do Trabalho,pode-se valer da noção jurídica dareincidência, trazida, expressamente,no art. 59 da Lei n. 8.078/90 (Códigode Defesa do Consumidor) e que, noDireito Penal, constitui circunstânciaagravante da pena (art. 61, I, CP) eimpede a concessão de fiança (art.323, III, CP). Outro critério é o daavaliação quanto a ter uma atitudedeliberada e assumida de desrespeitoà ordem jurídica, como, por exemplo[...]a utilização de mecanismos parafraudar a aplicação da ordem jurídicatrabalhista, valendo lembrar que o atovoluntário e inescusável é,igualmente, um valor com

representação jurídica, haja vista odisposto no inciso LXVII do art. 5º daCF.[...] Portanto, nas reclamaçõestrabalhistas em que tais condutasforem constatadas (agressõesreincidentes ou ação deliberada,consciente e economicamenteinescusável de não respeitar aordem jurídica trabalhista), tais como[...] trabalho em condições insalubrese perigosas, sem eliminaçãoconcreta dos riscos à saúde etc.,deve-se proferir condenação quevise à reparação específicapertinente ao dano social perpetrado,fixada ex officio (destaque e grifosmeus) pelo Juiz da causa, pois aperspectiva não é a da meraproteção do patrimônio individual.

Citam-se, como fundamentos dareparação do dano social, de ofício, oart. 404, parágrafo (sic) único, do CódigoCivil e os arts. 832, § 1º, e 652, “d”, daCLT, todos inseridos, aliás, no âmbitodas contendas individuais e o art. 84 doCódigo de Defesa do Consumidor, quegarante ao juiz a possibilidade de proferirdecisão alheia ao pedido formulado,visando a assegurar o resultadoequivalente ao adimplemento.

Para o Prof. Dr. Jorge Luiz SoutoMaior,

[...] a possibilidade de o juiz agir deofício para preservar a autoridade doordenamento jurídico foi agasalhadapelo direito processual, e no que serefere ao respeito à regulamentaçãodo Direito do Trabalho constitui atémesmo um dever, pois o nãocumprimento convicto e inescusáveldos preceitos trabalhistas fere opróprio pacto que se estabeleceu naformação do nosso EstadoDemocrático de Direito Social, para

613

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

fins de desenvolvimento do modelocapitalista em bases sustentáveis ecom verdadeira responsabilidadesocial. A Consolidação das Leis doTrabalho (CLT) não foi alheia aofenômeno, atribuindo ao juiz amplospoderes instrutórios (art. 765) eliberdade para solução justa do casona perspectiva da equidade,conforme previsão dos arts. 8º e 766,não se esquecendo da perspectivados efeitos sociais, conforme regrado já citado art. 652, “d”. Diante detudo isso, o que se espera doJudiciário é que se faça valer todo oaparato jurídico para manter aautoridade do ordenamento jurídicono aspecto da eficácia das normasdo Direito Social, não fazendo vistasgrossas para a realidade, nãofingindo que desconhece a realidadeem que vive, e não permitindo que asfraudes à legislação trabalhistatenham êxito. Sobretudo, exige-se doJudiciário que reconheça ser sua aobrigação de tentar mudar a realidadequando em desacordo com o Direito.[...] O que se exige do juiz é que,diante de fato demonstrado, querepercute no interesse social penalizeo agressor para desestimulá-lo narepetição da prática e paracompensar o benefício econômicojá obtido. A medida corretiva, assim,vai desde a condenação aopagamento de uma indenizaçãoadicional (ou suplementar),destinada ao autor da açãoindividual, em virtude da facilidade eimplementação da medida, até adeterminação de obrigação de fazer,voltadas a práticas de atos embenefício da comunidade. [...] O quenão se pode, de jeito algum, é deixarque o dano social, reconhecidoperante um ou vários processosjudiciais, reste impune.

Nesse sentido, vide o Enunciadon. 4 da 1ª Jornada de Direito Material eProcessual da Justiça do Trabalho,organizada pela ANAMATRA e realizadanos dias 21 a 23 de novembro de 2007,no Tribunal Superior do Trabalho, emBrasília, com o seguinte teor:

DUMPING SOCIAL. DANO ÀSOCIEDADE. INDENIZAÇÃOSUPLEMENTAR. As agressõesreincidentes e inescusáveis aosdireitos trabalhistas geram um danoà sociedade, pois com tal práticadesconsidera-se, propositalmente,a estrutura do Estado social e dopróprio modelo capitalista com aobtenção de vantagem indevidaperante a concorrência. A prática,portanto, reflete o conhecido‘dumping social’, motivando anecessária reação do Judiciáriotrabalhista para corrigi-la. O dano àsociedade configura ato ilícito, porexercício abusivo do direito, já queextrapola limites econômicos esociais, nos exatos termos dos arts.186, 187 e 927 do Código Civil.Encontra-se no art. 404, parágrafoúnico, do Código Civil, o fundamentode ordem positiva para impingir aoagressor contumaz uma indenizaçãosuplementar, como, aliás, já previamos arts. 652, “d” e 832, § 1º, da CLT.

Observa-se que a tendênciamajoritária é no sentido de que o ilícitogere uma indenização suplementar aotrabalhador. Ouso discordar: tratando-se de responsabilidade social comprejuízo não só ao trabalhador mas àsociedade como um todo, reconheço,pelo que dos autos constam e comamparo na fundamentação supra, notópico “Da insalubridade”, a existênciade ilícito trabalhista, devendo areclamada arcar com uma indenização

614

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

a ser arbitrada em favor da Santa Casade Misericórdia de Araguari, cujosdados serão fornecidos na épocaprópria.

O valor da indenização a títulode responsabilidade social - dumping

social - será fixado tendo em vista osseguintes parâmetros já adotadospela doutrina e jurisprudência pátrias:extensão do dano; culpa do agente;potencial econômico do ofensor;observação do caráter pedagógico dasanção (punição com intuito de evitar-se a reincidência na prática lesiva esurgimento de novos casos, para queocorra a adequação do ofensor aocomportamento estabelecido noordenamento jurídico pátrio); uso daequidade; indenização com o objetivode servir de compensação àsociedade, sem que hajaenriquecimento sem causa desta,levando-se em consideração o casoem tela, a gravidade do dano e arepercussão pessoal e social.

Pelo acima exposto, fixo umasanção pecuniária, em favor da SantaCasa de Misericórdia de Araguari, a serpaga pela reclamada no importe deR$20.000,00 em parcela única,comespeque nos arts. 186, 187, parágrafoúnico dos arts. 404 e 927, todos doCódigo Civil; arts. 8º caput; 652, “d”, 769e 832, § 1º, todos da CLT.

Juros e correção monetária apartir da publicação desta sentença, nopertinente à reparação do dumping

social nos termos da Súmula n. 362do Col. STJ.

Da gratuidade de justiça

A simples declaração depobreza firmada por advogadoregularmente constituído na petiçãoinicial, por si só, é suficiente para quese configure o estado de

miserabilidade da autora. Adoto, nessesentido, o entendimento firmado na OJn. 304 e 331 da SBDI-I do C. TST paraconceder os benefícios da justiçagratuita à reclamante.

Dos juros e correçãomonetária

Os juros serão contados a partirda data do ajuizamento da ação (artigo883 da CLT), calculados na base de1%, pro rata die, incidentes sobre ovalor já corrigido monetariamente(Súmula n. 200 do TST). Para o cálculoda correção monetária deverá serobservado o índice do mêssubsequente ao da prestação deserviços, a partir do dia 1º, conforme odisposto na Súmula n. 381 do TST,inclusive para a atualização dosvalores devidos a título de FGTS (OJ n.302 da SDI-I do TST). Para o cômputode juros e correção monetária,observar-se-á o disposto na Súmulan. 15 do TRT da 3ª Região, excetoquanto à reparação do “dumping

social”, já disposto no item anterior.

Dos descontos fiscais eprevidenciários

Descontos fiscais eprevidenciários na forma do Provimenton. 03/2005 do TST, considerando-se,como de natureza salarial, para fins daregra prevista no artigo 832 da CLT, asseguintes verbas: 13º salário; horasextras e reflexos em RSR e 13º salários;adicional de insalubridade e reflexosem 13º salário.

A importância devida a título deIR deverá incidir sobre a totalidade dasverbas tributáveis, a teor do que prevêo Decreto n. 3.000/99. Autoriza-se,desde já, a retenção das parcelasdevidas pela reclamante.

615

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Os valores fiscais eprevidenciários deverão ser calculadosconforme entendimento firmado naSúmula n. 368 do TST, e recolhidos ecomprovados pela reclamada, no prazode 10 dias a contar da data do trânsitoem julgado desta decisão, sob penade execução das quantiasequivalentes.

Isso posto, nos termos dafundamentação supra - que passa afazer parte integrante deste dispositivo,DECLARO EXTINTOS, SEMRESOLUÇÃO DO MÉRITO, os pedidosde danos morais oriundos de assédiomoral e horas extras em razão deintervalo para refeição e intervalo pelanão concessão de 10 min. a cada 50min. trabalhados e julgoPROCEDENTES, em parte, os demaispedidos formulados para condenarINDÚSTRIA DE SUBPRODUTOS DEORIGEM ANIMAL LOPESCO LTDA. apagar a ABADIA APARECIDA GOMESCOELHO, com juros e correçãomonetária, conforme se apurar emliquidação de sentença, as seguintesparcelas:

a) férias integrais, simples, + 1/3;b) 13º salário proporcional a

2008 (10/12);

c) horas extras (30 minutosdiários), com reflexos em RSRs, férias+ 1/3 e 13º salários;

d) adicional de insalubridade,com reflexos em 13º salários, férias +1/3 e FGTS.

A reclamada deverá, ainda,pagar a importância de R$20.000,00,em parcela única, em favor da SantaCasa de Misericórdia de Araguari, atítulo de reparação de dumping social.

A reclamada deverá retificar aCTPS da obreira para constar o trabalhoem condições insalubre e o adicionalde 20%, nos termos, prazo e sob aspenas estabelecidas nafundamentação.

Honorários periciais, a cargo dareclamada, no importe de R$2.200,00.

Oficie-se ao Ministério Públicodo Trabalho, com cópia da presentedecisão e pedido de providênciascabíveis.

Descontos fiscais eprevidenciários, onde couberem.

Custas processuais, pelareclamada, no importe de R$500,00,calculadas sobre R$25.000,00, valorestimado à condenação.

Intimem-se as partes e o Sr.Perito.

Nada mais.

ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 26/01353/08Data: 10.11.2008DECISÃO DA 26ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE - MGJuíza Titular: Drª MARIA CECÍLIA ALVES PINTO

Em 10 de novembro de 2008, às 16h, a juíza Maria Cecília Alves Pintoproferiu o julgamento da reclamação trabalhista ajuizada por FERNANDOANTÔNIO CALDEIRA DE RESENDE em face de BANCO DO BRASIL S/A, relativaà reintegração no cargo de advogado, danos morais, etc.

Aberta a audiência, foram, de ordem da MM. Juíza, apregoadas as partes,ausentes.

Em seguida, foi proferida a seguinte decisão:

616

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

RELATÓRIO

FERNANDO ANTÔNIOCALDEIRA DE RESENDE apresentareclamatória trabalhista em face deBANCO DO BRASIL S/A, alegando emsíntese que: foi admitido em 24.11.85,sendo comissionado a partir de02.01.89; foi nomeado advogadosubstituto em 29.01.99, depoisadvogado júnior e, desde 31.01.01,advogado pleno, em função hojedenominada analista jurídico B; noticiaatuação como professor em diversasfaculdades de direito, bem comocursos realizados, inclusive compatrocínio do Banco; em 04.06.07, aDiretoria Jurídica solicitou informaçãosobre reclamatórias movidas contra oBanco por advogados-empregados ouaposentados; em abril/08, foi realizadareunião envolvendo advogados deMinas Gerais, Espírito Santo e SantaCatarina, quando o Diretor Jurídicoconcitou todos os presentes arenunciarem aos direitos postuladosem demandas, nas quais estivessemposicionados como substituídosprocessuais, sob pena dedescomissionamento; váriosadvogados se submeteram à coação,mas o reclamante se recusou aatender ao comando empresarial e, poressa razão, perdeu o cargo deadvogado, sendo-lhe retirada acomissão, ao arrepio da norma contidano item 52 do normativo empresárioLIC 505-11.01.300, o que não pode servalidado; o obreiro teve a imagem e ahonra violados, por meio da prática deato discriminatório pelo Banco, que nãoexplicitou as razões da destituição docargo de advogado, dando ensejo aespeculações acerca da prática de atocondenável por parte do obreiro; oassédio moral teve início em agosto/07, quando o reclamante foi convidado

a ocupar vaga de assessor jurídico doBanco em Brasília, o que não ocorreu,em decorrência de haver se recusadoa renunciar a direitos postuladosjudicialmente pelo sindicato; o assédiomoral culminou com o seudescomissionamento, gerando danospsicológicos ao obreiro, surgindo parao Banco o dever de indenizá-lo pelosdanos sofridos, inclusive de ordemmaterial, na forma relatada na inicial;pede o deferimento de tutelaantecipada, nos termos do art. 273 doCPC; fundamenta o pedido sucessivode manutenção da estabilidadefinanceira, nos moldes da Súmula n.372 do TST; devidos honoráriosadvocatícios; formula os pedidosenumerados nas f. 15/18.

Com a inicial, os documentosde f. 19/100, sendo apresentados emaudiência os documentos de f. 114/153, feitos com vista ao reclamado (f.112).

Notificado, o reclamado sedefendeu (f. 154/200), nos seguintestermos: transcreve a norma do art. 52da LIC, afirmando que oenquadramento da hipótese dos autosé na letra “c” do dispositivo, tendo oobreiro sido descomissionado porapresentar conduta incompatível como cargo, o que não demanda apuraçãode irregularidades ou falha em serviço,constituindo mero ato de gestãoempresária; o parágrafo único do art.468 da CLT não considera alteraçãolesiva do contrato a determinaçãopatronal de reversão do empregado aocargo efetivo, sendo que o art. 499 daCLT dispõe inexistir estabilidade noexercício de cargos de diretoria eoutros de confiança; o empregadopúblico pode ser dispensado, semnecessidade de fundamentação, nostermos do item I da OJ n. 247 da SDI-Ido TST; como nem mesmo a dispensa

617

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

precisa ser motivada, com mais razãoo descomissionamento não precisa dequalquer motivação; também o item IIda Súmula n. 390 do TST dispõe nãohaver estabilidade para o empregadode empresa pública ou sociedade deeconomia mista; a tutela antecipadadeve ser indeferida, eis que ausente orequisito do fumus boni iuris ou averossimilhança das alegações;transcreve trecho da decisão do C. TSTque cassou a liminar proferida emprocesso citado pelo obreiro na inicial(f. 161/162); no que tange ao períodode recebimento da comissão, tem-seque o reclamante não recebeupagamento a tal título por 10 anosininterruptos, o que ocorreu tão-somente por 7 anos e 11 meses, nãohavendo cogitar de aplicação daSúmula n. 372 do TST; cita inúmerosarestos favoráveis; afirma não terhavido qualquer coação sobre oreclamante, sendo que a solicitação dorol de advogados que demandaramem face do Banco visou tão-somente àprovisão de numerário e atualizaçãodos registros para subsidiar ações daDiretoria; impugna as alegaçõesrelativas à reunião de abril/08 quanto àfala do Diretor Jurídico, tanto que oreclamante continuou na função, nãotendo sido transferido para a agênciapara vender OUROCAP; um dosprocessos em que o autor é parte estáem curso desde 1989, sendo que elejá recebeu valores incontroversos, nãosendo crível que só agora o reclamadotenha se insurgido contra o obreiro;tece outras considerações sobre o fato,negando ter havido qualquer assédiomoral e consequentemente o danomoral invocado; cita trechos dosnormativos internos do banco edoutrina aplicável; afirma que o quadrode stress e depressão relatado peloobreiro pode ser efeito do seu

descomissionamento, sendo que háexagero por parte dele quanto àdinâmica dos fatos; o comunicado dedispensa de comissão foi feito de formarespeitosa, serena e em caráterconfidencial; os danos psíquicosdevem ser provados pelo obreiro; citaarestos favoráveis; tece comentáriossobre a designação do obreiro paratrabalhar na secretaria da AJURE; nãoveio aos autos qualquer comprovantede despesas com medicamentos, nãoprosperando o pedido deressarcimento por danos de ordemmaterial, sendo que o recibo de f. 81decorreu de liberalidade do obreiro, eisque se acha assistido pela CASSI;indevidos honorários advocatícios; nãohouve acidente do trabalho, requerendoa designação de perícia médica paraapuração do fato; impugna um a umos documentos apresentados peloautor, bem como o pedido de justiçagratuita; invoca a litigância de má-fépor parte do obreiro, requerendo aimprocedência dos pedidos.

Com a defesa, os documentosde f. 201/320.

Concil iação proposta erecusada; manifestação doreclamado sobre os documentosapresentados pelo autor na primeiraaudiência (f. 322/325, apresentandoos documentos de f. 326/346); oreclamante apresentou em audiênciasua manifestação sobre osdocumentos apresentados peloreclamado (f. 353/356), juntando odocumento de f. 357, feito com vistaao reclamado em audiência;depoimento pessoal do reclamado;oitiva de testemunhas; encerrada ainstrução; razões finais escritas porambas as partes, complementadasoralmente em audiência; rejeitada asegunda proposta conciliatória.

É o relatório.

618

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

FUNDAMENTAÇÃO

Erro material na ata deaudiência (f. 198)

A despeito de haver sidodesignado o julgamento da demandapara o dia 10.11.08, a digitadora deaudiências, por equívoco, fez registraro dia 17.11.08, o que ora fica retificado.

Para evitar arguição de nulidadee prejuízo para as partes, deverão serelas intimadas da presente decisão,prolatada no dia 10.11.08, ficando semefeito a ciência automática nos termosda Súmula n. 197 do TST, consignadana ata de audiência.

Nulidade processual

Indeferimento da períciamédica e expedição de ofício ao INSS

Não há qualquer nulidadeprocessual decorrente do indeferimentode perícia médica, requerida peloreclamado com o objetivo de afastar onexo causal do licenciamento pelo INSS,obtido pelo autor, com o trabalho, eisque os pedidos formulados na inicialnão trazem como causa de pedir referidoafastamento.

Os pedidos são fundados natese de descomissionamento emdesrespeito ao regulamentoempresário, em clara discriminaçãocontra o reclamante, por estarposicionado como substituídoprocessual em reclamatórias ajuizadasem face do Banco pelo sindicatoprofissional, tendo sido pressionado adesistir das demandas, configurandoa conduta do Banco verdadeiroassédio moral.

Assim, revela-se totalmentedesnecessária a perícia médicasolicitada, que em nada contribuirá

para o deslinde da demanda, sendoobrigação do juízo indeferir diligênciasinúteis ou meramente protelatórias,nos termos do art. 130 do CPC.

Igualmente, mostrou-seirrelevante o requerimento do reclamantequanto à expedição de ofício ao INSS,para denunciar a desconfiança do Bancoquanto à caracterização do nexo causalentre o afastamento do autor e o trabalho,eis que tal não traduz qualquerilegalidade que demande qualquercomunicação ao referido órgão.

Rejeito a preliminar.

Contradita da testemunhaCarlos Alberto Jordão

Inquirida, a testemunha revelouque, a despeito de ocupar cargo deconfiança no Banco, não detém acondição de mandatário do mesmo,salvo como advogado, não orepresentando perante terceiros, alémde não ter qualquer ingerência noplanejamento orçamentário, sequertendo poderes para admitir oudispensar empregados ou mesmopara o seu comissionamento oudescomissionamento.

Nesse sentido, concluí que atestemunha não representa alter ego

empresarial e não se enquadra emnenhuma das hipóteses legais quegeram a suspeição, nos termos do §3º do art. 405 do CPC, aplicávelsubsidiariamente ao processotrabalhista, por força do art. 769 da CLT.

De qualquer forma, todas asrespostas da testemunha aosquestionamentos formulados peloobreiro estão registradas na ata deaudiência, viabilizando nova apreciaçãodo tema por parte do Tribunal, nahipótese de recurso, inexistindo prejuízoprocessual para qualquer das partes.

Rejeito a preliminar.

619

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

MÉRITO

Dispensa do cargo de advogado- Reintegração - Tutela antecipada

A hipótese dos autos,consistente em determinação patronalde reversão do empregado ao cargoefetivo, com destituição do cargo deanalista jurídico, assume contornosespecíficos, tendo em vista a existênciade regulamento empresário,consistente no Livro de InstruçõesCodificadas, que, pelos seus artigos50 e seguintes, disciplina odescomissionamento, constando doartigo 52 do documento apresentadopelo reclamado (f. 209/210) que:

A dispensa da comissão ocorrequando o funcionário:a) está lotado em dependência quesofre redução no quadro decomissionados ou que é desativada;b) apresenta desempenhoinsatisfatório, desde que registrado emGDP com ciclo avaliatório concluído;c) apresenta conduta incompatívelcom o cargo;d) sofre as seguintes penalidades:

I - repreensão;II - advertência;III - censura;IV - suspensão:

e) utiliza:I - licença-saúde ou licença-saúde por acidente de trabalho,observado o LIC 505,17.14.202;II - licença-interesse: a partir dautilização dos saldos de férias,licença-prêmio, folgas e abonos;III - licença para acompanharcônjuge, a partir de 91 diascontínuos;IV - licença para assistir pessoaenferma da família, a partir de181 dias contínuos;

f) está em movimentação transitóriano interesse próprio, a partir de 91dias contínuos;g) solicita por meio de requerimento.

Verifica-se, assim, que oregulamento empresário disciplinouexaustivamente todas as hipóteses emque o reclamado, por meio dos seusprepostos, poderia excluir a comissãode seus empregados, com reversão aocargo efetivo.

Nesse sentido, tem-se que oregulamento empresário adere aocontrato de trabalho de todos osempregados admitidos durante suavigência e não pode sofrer alteração,salvo em benefício dos mesmos, comose vê do caput do art. 468 da CLT.

Estando disciplinadas pelonormativo do Banco as hipóteses dedescomissionamento, têm-se porinaplicáveis à hipótese o parágrafoúnico do art. 468 da CLT bem como o §1º do art. 499 da CLT, que autorizam,de forma geral, a reversão ao cargoefetivo, o que sequer é consideradoalteração contratual lesiva. No contratode trabalho do obreiro, tais dispositivoslegais são inaplicáveis, por estar eleprotegido pelo art. 52 da LIC, o qual sóautoriza o descomissionamento nasestritas hipóteses nele previstas, nãohavendo cogitar da possibilidade deexclusão do comissionamento pormero ato de gestão ou de formadesmotivada.

Tampouco são aplicáveis aocaso o item I da OJ n. 247 da SDI-I doTST e o item II da Súmula n. 390 doTST que dizem respeito à possibilidadede dispensa imotivada por não ser oempregado público de sociedade deeconomia mista, ainda quandoadmitido por concurso, titular deestabilidade, eis que disciplinamquestão diversa, l igada à ruptura

620

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

contratual, que não ocorreu no caso.Essa hipótese não se comunica coma do presente feito, eis que apossibil idade dedescomissionamento está regida noregulamento interno do Banco (LIC), sópodendo ocorrer dentro das previsõesali inseridas.

Assim, no caso do Banco doBrasil, em face do que consta do art.52 da LIC, acima transcrito, odescomissionamento deve sermotivado e só pode ocorrer em umadas hipóteses ali arroladas, o que deveser comunicado ao empregado ecabalmente demonstrado, sob pena dedescumprimento da norma, surgindopara o empregado o direito à retomadado cargo comissionado, tal comopostulado na inicial.

A defesa do Banco do Brasilapresentou, como razão dodescomissionamento do reclamante,a letra “c” do art. 52 da LIC, como se vêdo último parágrafo de f. 155. Assim,asseverou que a reversão ao cargoefetivo decorreu de condutaincompatível com o cargo, acreditandoser tal termo bastante claro, a ponto denão prescindir de qualquercomplemento para ser entendido (item9 de f. 157). Nesse sentido, afirmou queo descomissionamento constituiumero ato de gestão.

Em depoimento pessoal, opreposto deixou patenteado que nãohouve comunicação ao reclamante dequal teria sido a conduta que o Bancoentendeu ter sido por ele praticada eque seria incompatível com o cargo deadvogado, sendo certo que nem elepróprio soube dizer qual seria a condutarechaçada. Afirmou que

não houve qualquer descrição porparte do banco de qual seria aconduta incompatível, uma vez que

o descomissionamento foi um ato degestão, partindo do suposto de quequem tem competência paraconceder a comissão tem, também,a competência para retirá-la;... -

confira f. 349.

Ora, o art. 52 da LIC não permiteo descomissionamento por mero atode gestão, sendo necessário que oempregado incida em uma dascondutas ali descritas, sob pena denulidade do ato, gerando para oempregado direito à reintegração aocargo comissionado.

E a questão dos autos sereveste de peculiaridades ainda maisgraves, que demonstram aarbitrariedade patronal e completodesrespeito às normas constantes doregulamento empresário e também daConstituição Federal, como será vistoa seguir, ferindo a dignidade dotrabalhador, bem como direitosfundamentais ligados ao livre acessoao Judiciário.

Pelo documento de f. 45, oBanco, a partir de setembro/06,determinou o levantamento de todasas ações propostas por advogados eex-advogados da casa, até mesmocomo substituídos processuais, sendoa listagem remetida (f. 46/47), comregistro do nome do reclamante naúltima linha da f. 46. O prazo máximopara a remessa da informação à DIJUR/CONTE era 29.09.06 (f. 45). Oreclamante também é substituídoprocessual em demanda que corre najurisdição da Vara do Trabalho de PonteNova, como se vê dos documentos def. 87/89, estando o nome do autorlistado no verso da f. 87.

Apesar de o reclamadosustentar que a declaração tinha porobjetivo apenas fazer provisão derecursos, tendo sido o levantamento

621

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

solicitado também quanto aos demaisempregados, o que foi ratificado pelatestemunha ouvida a rogo do réu, Sr.Carlos Alberto Jordão (f. 351/352),entendo que não foi nesse sentido aprova produzida nos autos.

Com efeito, a testemunha LuizCarlos P. Rocha, indicada peloobreiro (f. 349/350) e que prestoudepoimento f i rme e convincente,revela que, em setembro de 2007, oreclamante foi convidado para atuarcomo assessor jurídico em Brasília,onde permaneceu por cerca de 30dias, sendo que, no seu retorno, anotícia que correu pela AJURE é deque o reclamante seria nomeado deforma def ini t iva para o cargo.Continuou a atuar como analistajurídico enquanto aguardava anomeação, que não chegou a ocorrer,sendo que o comentário local foi nosentido de que o reclamante não foicomissionado por ter ação trabalhistacontra o Banco, na condição desubstituído processual.

Não fosse isso suficiente, naprimeira quinzena de abril/08, houveuma reunião do jurídico no OthonPalace, em Belo Horizonte, comadvogados de Minas Gerais, EspíritoSanto e Santa Catarina, sob acondução do diretor jurídico do Banco,Dr. Joaquim Portes Cerqueira César,quando ele afirmou para os advogadospresentes que

deveriam renunciar às ações em queeram substituídos processuais pelosindicato dos bancários, sob penade perda do cargo de advogado dobanco, reversão ao cargo deescriturário e posicionamento nasagências do Banco onde seriamobrigados a vender OUROCAP;... -confira f. 349, no depoimento datestemunha Luiz Carlos.

Não impressiona o contextodescrito pela testemunha CarlosAlberto Jordão (f. 351/352), indicadapelo Banco, no sentido de que a falaseria direcionada a advogados ligadosao Rio de Janeiro, Amazonas e CampoMourão no Paraná, onde teria havidoperda de prazos, gerando prejuízovultoso para o reclamado. Teria odiretor jurídico afirmado que não seriatolerada a participação de advogadosem tais demandas, o que levaria à suadestituição da ação.

O testemunho anterior, prestadopelo Sr. Luiz Carlos, apresenta-semuito mais convincente, poiscompatível com o restante da provacarreada aos autos. Por exemplo, vê-se que os advogados listados nas f.96 e 147, não ligados a quaisquer doslocais citados, como expressamenteafirmado pela testemunha CarlosAlberto Jordão, ao fim do depoimentode f. 352, apresentaram renúncia aodireito sobre o qual se fundava ademanda, o que não foi homologadopelo C. TST, diante da discordânciasindical, sendo a decisão prolatada em17.10.08.

Os documentos de f. 67/71 e 70/72, com realce para este último,demonstram que, em Natal (RN), oBanco dispensou empregadosadvogados, constando do relatoelaborado pelo juiz que a causa de pedirera no sentido de que a dispensadecorreu do fato de figurarem comosubstituídos processuais em açãopromovida pelo sindicato, configurandoato discriminatório (vide últimoparágrafo de f. 70). Naquele feito, foideterminada a reintegração imediatados autores no cargo de advogado, comconcessão de tutela antecipada.

Também no documento de f. 82,consistente em informe publicado nosite do Sindicato dos Bancários de Belo

622

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Horizonte e Região, consta notícia nosentido de que, no processoenvolvendo pagamento de anuêniossuspensos pelo Banco, 12 advogadosjá renunciaram à ação e apenas 4continuam no processo, comosubstituídos, um deles o reclamante.Os documentos de f. 83/86demonstram a atuação do sindicato,que denuncia a existência de assédiomoral do Banco em face do reclamante.

Assim, não tenho dúvidas emafirmar, com base nas provascarreadas aos autos, acimaanalisadas, que, pelo menos a partirde setembro de 2006, o Banco doBrasil iniciou processo de identificaçãodos advogados que tinham demandascontra ele, inclusive na condição desubstituídos processuais, passando aassediar moralmente referidosadvogados com o objetivo de forçá-losa renunciar aos direitos sobre os quaisse funda a demanda, sob pena dedescomissionamento e até rescisãocontratual, como ocorreu com osadvogados de Natal.

No caso do obreiro, atestemunha Hélida Faria Lopes,estagiária que com ele trabalhou naAJURE de Belo Horizonte, informou tersido informada pela analista jurídicaBethsaida que o reclamante tinha sidonomeado para o cargo de assessorjurídico em Brasília. Presencioutambém um telefonema da analistapara o autor, quando o parabenizoupela nomeação. A Bethsaida chegou acomentar que, para o reclamanteassumir o cargo,teria que renunciar àação contra o Banco. Confira f. 350.

A testemunha Denise, quetrabalhou na AJURE, durante certotempo na Secretaria e depois comoadvogada, afirmou que o reclamanteperdeu o cargo de advogado porconduta incompatível com o cargo,

sendo que as especulações giravamem torno do fato de ter o reclamanteação contra o Banco, na condição desubstituído processual em Ponte Nova- vide f. 351.

Note-se que o reclamante foipara Brasília em setembro de 2007,com indicação formulada pelaConsultora Jurídica Adjunta, HortênciaM. de M. e Silva, para preencher a vagade assessor jurídico pleno-NRF 6,existente naquele momento (vide f. 40),vaga esta que até hoje não foi ocupada,como se vê do depoimento datestemunha Carlos Alberto (últimoparágrafo da f. 351).

Diante da análise dos fatos eprovas carreadas aos autos, concluoque o reclamante foi efetivamentepressionado a renunciar ao direitosobre o qual se fundam as açõesajuizadas pelo sindicato dos bancáriosem face do Banco do Brasil, ostentandoo autor a condição de substituídoprocessual, o que é de todoinadmissível. Ora, se nem mesmo oinciso XXXV do art. 5º da Constituiçãoda República permite que a lei excluada apreciação do Poder Judiciáriolesão ou ameaça a direito, tem-se quenão pode ser tolerada a atitude doBanco do Brasil, que, como empresaintegrante da Administração indireta doGoverno Federal, deveria promover ointegral cumprimento do ordenamentojurídico, ao contrário de se tornar umviolador das normas legais, em claroprejuízo para seus empregados. Oacesso ao Judiciário constitui direito egarantia fundamental, consagrados naConstituição da República, sendoinaceitável que qualquer empregadorpressione seus empregados a desistirde demandas contra ele propostas e,sobretudo, a renunciar ao direito sobreo qual se fundam, o que é ainda maisperverso.

623

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

E tal ocorreu com o reclamante,pelo menos a partir de setembro/07,quando foi indicado para o cargo deassessor jurídico do Banco, nomeaçãofrustrada pela sua recusa em renunciaraos direitos postulados em demandaspropostas pelo sindicato profissional,sendo novamente pressionadojuntamente com os demais colegas nareunião de abril/08, realizada no OthonPalace, e finalmente sendo-lhe retiradaa comissão, com seu posicionamentona Secretaria da AJURE, comoescriturário, o que viola o inciso XXXVdo art. 5º da Constituição Federal,sendo vítima de discriminaçãoinaceitável, restando malferido o incisoIV do art. 3º da Constituição Federal etambém o disposto no art. 52 da LIC,uma vez que o fato de ter ação contra oreclamado, na condição de substituídoprocessual, ou mesmo qualquer outrademanda diretamente por ele ajuizada,não caracteriza, em nenhumahipótese, conduta incompatível com ocargo, sobretudo porque se trata demero exercício de direito fundamental,constitucionalmente assegurado.

Nesse sentido, tendo em vistaa ilegalidade e irregularidade daconduta empresária, consistente nadispensa do reclamante do cargo deadvogado (analista jurídico), defiro aoobreiro a reintegração no referidocargo, inclusive com antecipação detutela, nos termos do art. 273 do CPC,uma vez constatada a verossimilhançadas alegações, havendo fundadoreceio de dano irreparável ou de difícilreparação, sobretudo considerando agrande perda remuneratória, quepreserva a sobrevivência do autor, bemcomo no que diz respeito ao exercícioda função, não sendo razoável quepermaneça atuando como escrituráriona Secretaria da AJURE enquantoaguarda o trânsito em julgado da

decisão ora proferida, o que levaria àsua completa desatualização, trabalhocom pequeno aproveitamento de seugrande preparo intelectual e jurídico,com consequente perda deautoestima, diante do stress decorrenteda subutil ização de seu enormepotencial profissional.

Deverá ser imediatamenteexpedido mandado de reintegração nafunção de advogado (analista jurídico), oque deverá ocorrer independentementedo trânsito em julgado desta decisão,sob pena de multa diária deR$2.000,00, revertida para o autor, compagamento das comissões vencidase vincendas, inclusive rateio dehonorários advocatícios (pedidos deletras “a” e “c”). Deixo de cominar multaquanto a tais pagamentos, que deverãoser implementados pelo Banco, tãologo haja o retorno à função, sendo asparcelas vencidas apuradas emliquidação de sentença.

Tendo em vista o assédio moralque vem sofrendo o obreiro desdesetembro/07, o que poderá seintensificar a partir da presente demandae decisão, determino que o reclamadose abstenha de praticar contra oreclamante qualquer ato dediscriminação, retaliação, coação,violação ao Estatuto da OAB ou àsgarantias contratuais, legais econstitucionais, sob pena de multa diáriade R$2.000,00, revertida para o autor.

Os demais itens listados na letra“b” de f. 16, consistentes emautoritarismo e assédio moral, estãoinseridos nas condutas acima coibidas.

Diante da reintegração ao cargode analista jurídico, o réu deveráretificar a ficha funcional do obreiro, tãologo seja cumprido o mandado,comprovando o fato nos autos, sobpena de multa diária de R$2.000,00,revertida para o autor.

624

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Assédio moral - Danos moral ematerial

No item anterior, a análise dasalegações das partes e da provacarreada aos autos demonstra que oBanco adotou política, pela qual vemexigindo dos advogados a renúncia adireitos sobre os quais se fundamreclamatórias movidas por elespróprios ou por sindicatos, nas quaisostentem a condição de substituídosprocessuais.

Por tal razão, o reclamante, quetinha a expectativa de assumir o cargode assessor jurídico em Brasília,chegando a ser parabenizado porcolegas pela promoção auferida, emdecorrência de seus méritos, não sóteve obstaculizada a promoção, como,em momento posterior, foi destituídosumariamente da função de analistajurídico, sendo revertido ao cargoefetivo de escriturário e, ato contínuo,lotado na Secretaria da AJURE, semqualquer explicação plausível.

O só fato de o obreiro ter voltadoa colaborar com o Banco, indo uma vezmais a Brasília no início do ano de2008, para atuar como assessorjurídico em frentes de trabalho, nãogera a desconexão pretendida peloBanco entre o descomissionamento ea exigência de que renunciasse adireitos. A questão foi amplamentefundamentada no item anterior,tornando-se desnecessária novaanálise, pois decisões em empresa doporte do Banco do Brasil têmprocessamento mais lento, sendorazoável supor que o reclamante foiinstado em momentos diversos àrenúncia de direitos, e, uma vezpercebido que não cederia àspressões, foi então submetido aoconstrangedor descomissionamentosumário. Em outras regiões, houve

advogados que tiveram o contratorescindido pela mesma razão.

A justificativa vazia de condutaincompatível com o cargo, por ato degestão, não pode ser aceita, por violaro regulamento empresário, bem comopor violar preceitos constitucionais,malferindo a dignidade do trabalhador,que tem o direito de conhecer qual teriasido a conduta inviabilizadora da suacontinuidade no cargo de advogado.

O assédio moral nem sempreé de fácil identificação, mas no casodos autos restou demonstrado pelosdepoimentos testemunhais, bemcomo por documentos, os quaisrevelam que inúmeros advogadosforam obrigados a renunciar a direitosjá postulados judicialmente pelosindicato, sendo alguns deles atémesmo dispensados do emprego.Houve caso em que o TST se recusoua homologar as renúncias, diante dadiscordância do sindicato.

O obreiro foi penalizado em pelomenos duas oportunidades, sendo aprimeira quando perdeu o direito àpromoção para o cargo de assessorjurídico, que era considerada certa naAJURE de Belo Horizonte, sendo asegunda penalização decorrente dodescomissionamento da função deanalista jurídico. Também a reunião deabril/08, realizada no Othon Palace, éum dos elementos reveladores doassédio moral, sempre tendente a fazercom que os advogados, dentre osquais o reclamante, renunciassem aosdireitos judicialmente postulados pelosindicato profissional.

Muito embora seja difícil para oempregado demonstrar a existência deassédio moral, entendo que, nestefeito, as provas documental e oralmostram-se contundentes quanto àsua configuração, com efeitosperversos para o reclamante, que, em

625

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

face da pressão patronal sobre eleexercida, com punições indevidas einaceitáveis diante da sua recusa emceder ao ilegal comando de seussuperiores quanto à renúncia a direitos,geraram efeito devastador,desestabilizando-o por completo.

Está patenteado nos autos queo reclamante se encontra totalmentedesestruturado do ponto de vistaemocional, tendo chorado de formacompulsiva ao longo das duasaudiências realizadas, apresentando-setrêmulo e visivelmente inseguro emface da situação criada pelo Banco, oque não pode ser tolerado, devendo aconduta empresária ser coibida demodo exemplar, para evitar que sejareproduzida em face de outrosadvogados ou empregados da mesmainstituição.

O atestado médico de f. 73noticia que o obreiro foi vítima dereação aguda a estresse, que podeperdurar, em face de ter sido vítima desituação desagradável no trabalho,com descomissionamento sumário,passando a necessitar deacompanhamento psiquiátrico, comuso de medicação específica eacompanhamento psicológico.

O diagnóstico acima foireproduzido nos documentos de f. 74/80, demonstrando que a ação ilegalperpetrada pelo Banco, condutareveladora de assédio moral, trouxedanos de ordem moral para oreclamante, que deve ser indenizado.

Nos termos dos artigos 186 e927 do CCb, somente quandopresentes o dano, a culpa do agente eo nexo causal entre a referida condutae o dano gerado, surge a obrigação derepará-lo.

Elevada a âmbitoconstitucional, a reparação dos danosmoral e material está prevista no inciso

X do art. 5º da CF/88 e, especificamente,pelo acidente do trabalho, no incisoXXVIII do art. 7º da CF.

Para que se configurem ospressupostos necessários àreparação aos danos moral e material,é necessária, portanto, a ocorrência detrês elementos, como ensina CaioMário da Silva Pereira in Instituições de

direito civil, 12. ed., vol. II, Ed. Forense,1993, p. 236/237:

a) existência de erro de condutado agente;

b) ofensa a um bem jurídicoc) antijuridicidade e o dano

causado.

No caso que se apresenta,entendo que restaram demonstradosos requisitos acima mencionados, deforma a autorizar a responsabilizaçãodo reclamado pelos danos de ordemmoral e material gerados ao obreiro.

O imenso sofrimento pessoal eadoecimento em face da ilegal ação doempregador impõem seja a indenizaçãopor danos morais fixada emR$480.000,00, valor correspondente a100 remunerações mensais do obreiro,que percebia valores da ordem deR$4.794,20 (f. 146) antes dodescomissionamento, o que ainda eraacrescido do rateio de honoráriosadvocatícios. A fixação do referido valorvisa tão-somente minimizar o dano deordem moral que lhe foi imposto,levando-se em conta o porte do Banco-réu. Também foi considerado onecessário efeito pedagógico, para queo Banco não incida novamente namesma conduta, sendo que estaJustiça trabalhista deve repelirfirmemente todas as tentativas de coibiro acesso do cidadão ao Judiciário, porse referir a direito fundamental,consagrado na Constituição Federal. No

626

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

caso, os efeitos devastadores geradospara o reclamante justificam o montantearbitrado, que se apresenta até mesmomodesto em face das peculiaridadesda presente reclamatória.

Os danos materiais postuladospelo reclamante efetivamenteocorreram (causa de pedir no item Xde f. 13), consistentes na reduçãosalarial, devendo o reclamadoindenizar-lhe referidos danos em valorequivalente à diferença salarial a serapurada entre o montante que lhe foipago a partir de outubro até a efetivareintegração no cargo de analistajurídico, englobando o rateio dehonorários advocatícios procedidospela ASABB, sem prejuízo dopagamento dos mesmos valores(parcelas vencidas e vincendas) emface da sua reintegração no cargo. Aqui,está-se falando de indenização pordanos materiais e não do pagamentode salários decorrentes dareintegração, tendo fundamentodiverso.

Deverá indenizar também asdespesas representadas pelo recibode f. 81 e aquelas futuras oriundas doadoecimento do obreiro em face doquadro clínico atualmente instalado,em decorrência da situação deestresse profundo, causado pela ilegalconduta empresária, englobandotambém os medicamentos que sefizerem necessários.

Pouco importa no caso seja oreclamante associado da CASSI,sendo que na hipótese tem ele o direitode valer-se de profissionais médicosde sua confiança, sejam ou nãocredenciados daquela instituição,sendo os custos suportados peloBanco.

Os honorários advocatíciosserão analisados em item próprio.

Procedem os pedidos.

Obrigação de fazerconsistente em declaração emitidapelo reclamado (f. 17)

Indefiro os pedidos formuladosnos itens “c”, “d”, “e” e “f” de f. 17, porfalta de amparo legal, inclusive no quetange à multa cominatória.

A declaração a que o reclamantefaz menção naquele item é substituídapor esta decisão, em que estáconsignada a ilegalidade da condutaempresária, com sua condenação nareintegração do obreiro no cargo deanalista e vedação de condutasdiscriminatórias daqui para a frente.

Como a OAB de Belo Horizontee também o Sindicato dos Bancáriosde Belo Horizonte atuaram comoassistentes do obreiro, deverão seroficiados com cópia da presentedecisão, para as providências queentenderem pertinentes.

Não há razão para que sedetermine que o reclamado promova apublicação nos Jornais Estado deMinas, nas edições de domingo equinta-feira, e da OAB, por duas ediçõesseguidas, nota explicativa sobre oocorrido, eis que, ao que constou doprocessado, em momento algum oBanco fez publicar matéria em taisveículos de comunicação dandopublicidade para a dispensa do obreiro.Assim, não vislumbro amparo jurídicopara o deferimento da obrigação de fazerlistada na letra “f” de f. 17.

Pedido sucessivo -Manutenção do direito à percepção dacomissão e honorários advocatícios- Estabilidade financeira - Item I daSúmula n. 372 do TST

Acolhido o primeiro pedido doreclamante, pertinente à suareintegração no cargo de analista

627

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

jurídico, inclusive com deferimento daantecipação de tutela, restaprejudicada a análise do pedidosucessivo, quanto à manutenção dodireito à percepção da comissão ehonorários advocatícios, por força doitem I da Súmula n. 372 do TST.

Honorários advocatícios

Tendo em vista que o reclamantenão está assistido pelo seu sindicato,não atendidos os requisitos ditados pelaSúmula n. 219 do TST, não há espaçopara o deferimento de honoráriosadvocatícios, nem mesmo na condiçãode indenização por danos materiais, jáque a matéria tem regramento própriono âmbito do Direito do Trabalho.

E a presente demanda versasobre litígio entre empregado eempregador, não envolvendo demandasoriundas de novas competênciasatribuídas ao Judiciário trabalhista, emcujas hipóteses o TST vem reconhecendoo direito a honorários advocatícios nostermos do art. 20 do CPC.

Nada a deferir.

Litigância de má-fé

Arguida pelo reclamado emdefesa, não vislumbrei nos autosqualquer das condutas listadas no art.17 do CPC por parte do obreiro, que sevaleu da presente reclamatória nosestritos limites necessários para adefesa de direitos trabalhistas lesadospelo reclamado, obtendo êxito na maiorparte dos pedidos formulados.

Não há, assim, espaço para apenalização do autor, f icando aarguição de lit igância de má-férejeitada.

Juros e correção monetária -Descontos fiscais e previdenciários

Incidem juros de 1% ao mês,não capitalizados, pro rata die, na formada Lei n. 8.177/91, e correçãomonetária com base no índice do mêssubsequente ao trabalhado (Súmula n.381 do TST).

Autorizam-se os descontosfiscais e previdenciários (Súmula n. 368do TST), não incidindo descontos sobreas parcelas de natureza indenizatória,consistente na indenização por danosmoral e material.

Justiça gratuita

Tendo em conta o requerimentoda assistência judiciária gratuita, comdeclaração de pobreza (f. 18), é de sedeferir ao reclamante o pedidoformulado.

CONCLUSÃO

Por tais fundamentos, rejeito aspreliminares de nulidade processual e,no mérito, julgo PARCIALMENTEPROCEDENTES os pedidos, paracondenar o reclamado BANCO DOBRASIL S/A a promover a reintegraçãodo reclamante, FERNANDO ANTÔNIOCALDEIRA DE RESENDE, no cargo deanalista jurídico, por ele anteriormenteocupado, inclusive com antecipação detutela, nos termos do art. 273 do CPC,devendo ser imediatamente expedidomandado de reintegração na função, oque deverá ocorrer independentementedo trânsito em julgado desta decisão,sob pena de multa diária de R$2.000,00,revertida para o autor, com pagamentodas comissões vencidas e vincendas,inclusive rateio de honoráriosadvocatícios (pedidos de letras “a” e “c”);indenização por danos morais fixada emR$480.000,00; indenização por danosmateriais, em valor equivalente àdiferença salarial a ser apurada entre o

628

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

montante que lhe foi pago a partir deoutubro até a efetiva reintegração nocargo de analista jurídico, englobandoo rateio de honorários advocatíciosprocedidos pela ASABB, sem prejuízodo pagamento dos mesmos valores(parcelas vencidas e vincendas) emface da sua reintegração no cargo, bemcomo as despesas médicasrepresentadas pelo recibo de f. 81 eaquelas futuras oriundas doadoecimento do obreiro em face doquadro clínico atualmente instalado emdecorrência da situação de estresseprofundo, causado pela ilegal condutaempresária, englobando também osmedicamentos que se fizeremnecessários.

Tendo em vista o assédio moralque vem sofrendo o obreiro desdesetembro/07, o que poderá seintensificar a partir da presente demandae decisão, determino que o reclamadose abstenha de praticar contra oreclamante qualquer ato dediscriminação, retaliação, coação,violação ao Estatuto da OAB ou àsgarantias contratuais, legais econstitucionais, sob pena de multa diáriade R$2.000,00, revertida para o autor.

Diante da reintegração doobreiro ao cargo de analista jurídico, oréu deverá retificar a ficha funcional doobreiro, tão logo seja cumprido omandado, comprovando o fato nosautos, sob pena de multa diária deR$2.000,00, revertida para o autor.

Incidem juros de 1% ao mês,não capitalizados, pro rata die, na formada Lei n. 8.177/91, contados doajuizamento da ação, e correçãomonetária com base no índice do mêssubsequente ao trabalhado (Súmula n.381 do TST), sendo certo que acorreção monetária incidente sobre aindenização por dano moral será

contada a partir da data de publicaçãoda presente decisão, já que representavalor atual quando do seu arbitramento.

Descontos previdenciários e deimposto de renda incidentes sobre asverbas objeto de condenação, na formada legislação aplicável, devendo oreclamado comprovar seurecolhimento junto aos órgãos próprios,sob pena de execução. Para efeitos daLei n. 10.035, de 25 de outubro de 2000,as contribuições previdenciárias nãodevem incidir sobre as seguintesverbas: indenização por dano moral ematerial e multas por descumprimentode obrigação de fazer, que têm perfilindenizatório. Os juros e correçãomonetária somente incidirão sobre ascontribuições previdenciárias a partir do2º dia do mês subsequente ao dopagamento das verbas objeto decondenação, nos termos do art. 276 doDecreto n. 3.048/99.

O reclamado deverá reter oimposto de renda devido pelo obreiro,recolhendo-o aos cofres da ReceitaFederal, sob pena de execução.

O reclamante é beneficiário dajustiça gratuita.

Expeçam-se ofícios para a OAB/MG e Sindicato dos Bancários de BeloHorizonte, que atuaram comoassistentes no presente feito,encaminhando-lhes cópia da presentedecisão, devendo ser expedido ofíciotambém para o Ministério Público doTrabalho, para que adote asprovidências que entender pertinentes,em face das graves violações a direitosfundamentais do reclamante.

Custas no importe deR$10.000,00, calculadas sobreR$500.000,00, valor arbitrado àcondenação, pelo reclamado.

Intimem-se as partes e o INSS.Nada mais.

629

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 00854-2008-037-03-00-1Data: 31.07.2008DECISÃO DA 3ª VARA DO TRABALHO DE JUIZ DE FORA - MGJuíza Titular: Drª MARTHA HALFELD FURTADO DE MENDONÇA SCHMIDT

Aos 31 dias do mês de julho do ano de 2008, às 12h45min, na sede da 3ªVARA DO TRABALHO DE JUIZ DE FORA/MG, na presença da MM. Juíza MarthaHalfeld Furtado de Mendonça Schmidt, realizou-se audiência de Julgamento dareclamação trabalhista do rito sumaríssimo - VERBAL - ajuizada por GiselleAlmeida de Oliveira em face de Carrefour Comércio e Indústria Ltda.

Dispensado o relatório, porque se trata de causa sujeita ao ritosumaríssimo.

ENQUADRAMENTO SINDICAL -FARMACÊUTICA OU COMERCIÁRIA?

A interpretação literal dosdispositivos legais que cuidam doenquadramento sindical, no Direitobrasileiro, levaria ao indeferimento dapretensão exposta na inicial. É que oBrasil não adota, integralmente, osprincípios da liberdade sindical e oenquadramento é disciplinado por lei.Essa não é a melhor solução para asrelações profissionais, inclusiveporque vinculada a momento históricoultrapassado (regime unitário doEstado Novo). Melhor seria que o paísincorporasse as modernas lições doDireito Internacional do Trabalho,segundo as quais a fi l iação e oenquadramento sindicais são livres,isto é, de livre escolha do trabalhador.

Por outro lado, enquanto aliberdade sindical brasileira é relativa,o enquadramento sindical ocorresegundo a atividade preponderante daempresa, com exceção das categoriasditas diferenciadas. Em outraspalavras: a categoria econômica(identificada pela atividadepreponderante da empresa)condiciona a categoria profissional.

O caso dos autos é exemploparadigmático da injustiça dessecritério rígido e ultrapassado. A

reclamante - farmacêutica profissionalinscrita no CRF - trabalhou nessaqualidade para a drogaria que seencontra dentro do estabelecimento doreclamado - uma rede de super ehipermercados. Pleiteia, em juízo,exercitando o jus postulandi, oenquadramento como farmacêutica,vinculada à CCT celebrada entre osfarmacêuticos, enquanto o reclamadoa considera simples comerciária,vinculada à CCT dos comerciários... Oreclamado argumenta, de certa forma,com o princípio da legalidade e ele lheé, sem dúvida, favorável.

Mas o Direito do Trabalho nãose contenta com a estrita legalidadeou com a literalidade da lei. Seu carátertuitivo vai além, sobretudo em setratando de grandes desigualdades,como a apresentada nesse caso, emque uma jovem farmacêuticadesempregada e recém-formada traza juízo uma grande rede multinacionalde hipermercados, que mantém emseus quadros vários profissionaisliberais (médicos, engenheiros,farmacêuticos, enfermeiros,veterinários, talvez até mesmoadvogados, etc.), necessários aoexercício de suas diversas eexpansivas atividades - isso em várioslugares do planeta. A contrataçãodesses profissionais de nível superior

630

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

como simples comerciários afronta oslongos anos de dedicação a estudos,necessários para a graduação de 3ºgrau.

De outro ângulo, observa o juízoque a qualificação da reclamante comofarmacêutica foi condição para acontratação pelo reclamado, porquerespondeu a autora, nessa qualidade,pela drogaria do réu, no seu horário detrabalho, enquanto por ele contratada.Foi por essa razão que houveretif icação do cargo na CTPS dareclamante (termo de audiência, f. 38),segundo reconheceu o reclamado.

Ora, respondendo pelafarmácia, na condição de farmacêutica(e não de simples gerente doestabelecimento), inclusive perante oConselho Regional de Farmácia, areclamante se vinculou ao reclamadonão só perante a estrutura internaadministrativa do réu, mas tambémdiante de entidades que regem aprofissão de farmacêutica, atraindopara a relação de trabalho vínculoresultante de sua qualif icaçãoprofissional.

Beneficiou-se, assim, oreclamado desse vínculo. Por outrolado, observou a reclamante todas ascondições para a sua contrataçãocomo farmacêutica; e o reclamado,todas as normas administrativasrelacionadas à regular instalação evenda de medicamentos. Seguiu aautora as diretrizes fixadas para oexercício da profissão de farmacêutico;seguiu o reclamado as diretrizesfixadas para viabilizar a atividade devenda de drogas e medicamentos.Nada mais lógico que também osalário da autora esteja tambémvinculado à profissão exercida.

Raciocínio diverso poderiaresultar em dotar o reclamado decondição privilegiada diante do

mercado, já que ele teria menor custo(com menores salários deempregados) para manter oestabelecimento (drogaria) do queoutras empresas congêneres. A rigor,essa situação poderia ser consideradaconcorrência desleal..., em um mundocada vez mais competitivo.

Nesse passo, observa o juízoque, se o reclamado resolvesse“setorizar” suas atividades em váriasempresas (de farmácia, panificação,móveis e eletrodomésticos), cada umadelas teria um objetivo social diverso euma atividade preponderante distintadas outras. Se agisse assim, o réu, deacordo com a letra da lei, não poderiaargumentar - como o faz - com aunicidade de “setores” diversos dentrodo mesmo hiper ou supermercado,resumindo todas as atividades dosempregados sob o rótulo de“comerciais”.

Ainda sob esse ângulo, não seargumente com a inviabilidade oudificuldade do empreendimentoreclamado (porque seriam várias asnormas trabalhistas a que estariavinculado, sendo várias as CCTs aserem observadas), primeiro porque,de certa forma, isso já existe (por ex.,em se tratando de categoriadiferenciada); segundo, porque não sedefende a aplicabilidade de cada umdaqueles instrumentos coletivosdiferenciados, mas apenas daquelesque regem profissões liberais, cujoconhecimento técnico-científico é“diferenciado”.

De certa forma, essanormatização poderia estimular o réua conceder melhores condições detrabalho aos seus empregados,elevando o status de seus empregadosmais qualif icados, de modo aremunerá-los em níveis pelo menosequivalentes aos mínimos indicados

631

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

para aquela determinada categoriaprofissional “diferenciada”.

Mais se robustece esseraciocínio quando constatado oseguinte paradoxo: o prático defarmácia e os propagandistas deprodutos farmacêuticos(propagandistas-vendedores evendedores de produtosfarmacêuticos) são consideradoscategorias diferenciadas - e, pois,teriam direito ao salário diversodaquele praticado para oscomerciários, pactuados em CCT dacategoria, se contratados peloreclamado (e ele tivesse participado danegociação - Súmula n. 374 do TST).Todavia, a reclamante, farmacêutica,não teria esse direito... Por outro lado,é de se reconhecer que a profissão deprático de farmácia está em desuso,substituída, em época de concorrênciaentre as drogarias, cada vez mais pelade farmacêutico.

Assim, em interpretaçãoevolutiva do ordenamento jurídicobrasileiro e inspirada no contido nosarts. 1º, IV, 5º, XIII e XXXII, daConstituição da República, e no ponto2 da Declaração da OIT sobre osPrincípios e Direitos Fundamentais noTrabalho de 1998, defiro os direitospleiteados na inicial de f. 4, nos valoresali mencionados.

JUSTIÇA GRATUITA

Concedo à reclamante osbenefícios da justiça gratuita, sendo obastante, para tanto, a simplesdeclaração de ser pobre no sentido dalei, firmada pela própria parte, comoocorreu no presente caso, no própriotermo de reclamação. Inteligência dalei (artigo 4º da Lei n. 1.060/50, artigo1º da Lei n. 7.115/83, artigo 38 do CPCe § 3º do artigo 790 da CLT), da

jurisprudência (OJs n. 304 e 331,ambas da SDI-I do TST) e dosprincípios pertinentes (simplicidade,informalidade, além da garantia deamplo acesso ao Judiciário,principalmente para os que detêmparcos recursos financeiros - CF/88,artigo 5º, incisos XXXV e LXXIV).

CRITÉRIOS DE CÁLCULO

Sobre o principal devido, incidiráatualização monetária, cujo índice seráaquele após o primeiro (1º) dia útil domês seguinte ao trabalhado, conformeentendimento consubstanciado naSúmula n. 381 do TST, observada aTabela Única para Atualização eConversão de Débitos Trabalhistas doConselho Superior da Justiça doTrabalho (Resolução n. 8/2005 doSSJT).

Atualizados os valores, incidirãojuros de mora (Súmula n. 200 do TST)contados do ajuizamento da ação (art.883 da CLT), à taxa de 1% ao mês, pro

rata die, (Lei n. 8.177/91), de formasimples, não capitalizados.

A atualização monetária e osjuros são devidos até o efetivopagamento ao credor, não cessandocom eventual depósito em dinheiropara garantia da execução (Súmula n.15 do TRT).

Autorizo o desconto dascontribuições previdenciárias a cargoda reclamante, aplicando-se odisposto no Provimento n. 1/96 do TST,devendo o reclamado comprovar osrecolhimentos previdenciáriosdevidos, juntando cópia da respectivaGPS aos autos ou outro documentoque venha a substituí-la, no prazo de05 dias, a contar do término do prazodefinido pelo art. 276 do Decreto n.3.048/99, sob pena de execução destespor esta Justiça Especializada, nos

632

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

termos do parágrafo único do artigo876 da CLT.

Para os efeitos do § 3º do artigo832 da CLT, declaro que têm naturezasalarial as diferenças salariais e seusreflexos no 13º salário.

Autorizo o desconto do impostode renda a ser retido do crédito dareclamante, se for o caso, devendo orecolhimento ser comprovado nosautos no prazo de 15 dias após aretenção, na forma do artigo 28 da Lein. 10.833/2003.

OFICIAMENTO

Ao trânsito em julgado dasentença, expeçam-se ofícios ao INSS,Caixa Econômica Federal e àDelegacia Regional do Ministério doTrabalho para as apurações queentenderem pertinentes.

Por tais fundamentos,

JULGO PROCEDENTE opedido, para condenar o reclamadoCARREFOUR COMÉRCIO EINDÚSTRIA LTDA. a pagar àreclamante GISELLE ALMEIDA DEOLIVEIRA, observada afundamentação, parte integrante destedecisum, no prazo legal:

a) diferenças salariais de abril/2007 a fevereiro/2008, com reflexos no13º salário de 2007 e FGTS + 40%(R$187,33);

b) diferenças salariais de marçoa maio/2008 com reflexos no FGTS emulta de 40% (R$474,31);

c) diferenças das verbasrescisórias (saldo de salário, avisoprévio indenizado, férias vencidas eproporcionais + 1/3; 6/12 de 13º salário/2008) e reflexo no FGTS com a multade 40% (R$493,64).

O reclamado já anotou na CTPSda autora sua real função defarmacêutica. Anotará, em virtude dodecidido, o salário devido (observadoo estabelecido para a categoria,descrito na proemial: R$2.302,46 atéfevereiro/2008 e R$2.429,09 a partirdaí), no prazo de dez dias, contados dotrânsito em julgado, sob pena deoficiamento à DRT, sem prejuízo deoutras penalidades.

Transitada esta em julgado,expeçam-se ofícios ao INSS, MTE eCEF.

Custas de R$24,00 peloreclamado, incidentes sobreR$1.200,00, valor arbitrado àcondenação.

Apesar de antecipado ojulgamento, fica dispensada aintimação das partes, que já estãocientes para o primeiro dia útilsubsequente (amanhã), para os finsda Súmula n. 197 do TST.

Cópia deste termo de audiênciaserá disponibil izada no site

www.trt3.jus.br.Nada mais.

633

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 01609-2006-039-03-00-2Data: 04.08.2008DECISÃO DA VARA DO TRABALHO DE SETE LAGOAS - MGJuiz Substituto: Dr. GERALDO MAGELA MELO

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHOASSISTENTE: SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDÚSTRIASMETALÚRGICAS, MECÂNICAS E DE MATERIAL ELÉTRICO DE SETE LAGOASRÉUS: COFERGUSA INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE FERRO GUSA UNIÃOLTDA., ANTÔNIO RESENDE PENIDO, IVANA MARIA PONTES DA SILVAPENIDO LTDA., MASSA FALIDA DE IRONBRÁS INDÚSTRIA E COMÉRCIOLTDA. E PAULO DE ABOIM.

Ministério Público do Trabalho,autor, qualificado à f. 03, ajuizou açãocivil pública em face de COFERGUSAIndústria e Comércio de Ferro GusaUnião Ltda., Antônio Resende Penido,Ivana Maria Pontes da Silva PenidoLtda., massa falida de IRONBRÁSIndústria e Comércio Ltda. e Paulo deAboim, réus, igualmente qualificados,aduzindo que a empresa IRONBRÁSencontra-se em processo falimentar,no qual foi, inicialmente, autorizado oarrendamento do parque industrial àempresa COFERGUSA, pela qual oempreendimento vinha sendo tocado;porém, o arrendamento foi revogadopelo TJMG, que determinou o retorno àmassa falida da posse do parqueindustrial, não autorizando acontinuidade dos negócios pelo falido,por isso, todos os funcionários foramretirados do parque industrial; que, apartir de 09/06, todos os trabalhadoresnão mais puderam acessar seuspostos de trabalho; que ostrabalhadores não foram pagos, nemindenizados, em não observância dacondição imposta na decisão judicialde continuidade dos contratos de todosos trabalhadores; que as empresasenvolvidas não recolheram FGTS e nãocumpriram diversos direitos dosempregados; que pretende aindisponibil idade dos bens da

COFERGUSA e de seus sócios paragarantia de pagamento dos salários edos títulos rescisórios; que a massafalida seja compelida a cumprir adecisão do TJMG de manutenção doempreendimento, com manutençãodos empregos e ordem contra o falidopara que não realize ato de gestão oude administração junto a empresaIRONBRÁS e, por fim, a condenaçãoem responsabilidade solidária dos 1º,2º e 3º réus pelos débitos trabalhistasrelativos ao período do arrendamento(f. 03/25).

Liminar indeferida às f. 286/288.Audiência em 19.12.2006,

conciliação impossibilitada; o sindicatoingressou no feito como assistente,não tendo sido observado o quinquídiolegal, por isso a audiência foi adiada.

Emenda à inicial, às f. 334/366,informando que foi impossívelconciliação amigável com as rés e quea COFERGUSA não recolheu o FGTS enem o INSS do período contratual; quehá fato novo, qual seja, a continuaçãodo negócio pela falida - IRONBRÁS,caracterizando a sucessão trabalhista,desistindo do processo em relação àmassa falida, acrescendo o pedido dedano moral coletivo e inclusão da falidano polo passivo.

Audiência em 29.01.07,homologada a desistência em relação

634

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

à massa e adiada a audiência paraciência de documentos.

Novo indeferimento da liminaràs f. 416/417.

Audiência em 01.03.07, arguidaa irregularidade de representação daspessoas físicas, defesas apresentadas.

A COFERGUSA eriça preliminarde carência da ação e aduz que a falidafoi imitida na posse em 25.09.06, quea COFERGUSA ficou abalada pelasperdas financeiras, não tendocondições de promover acerto com osempregados, tendo efetivado opagamento das verbas salariais dostrabalhadores; que houve sucessão eque quem deve responder é a falida.

A ré Ivana apresentou defesa emque aduz que era casada com o réuAntônio; que, por isso, era sócia daempresa COFERGUSA, porém,quando de sua separação,convencionou que transferiria suascotas para o mencionado réu, o que foiimplementado em maio/06, não tendonenhuma responsabilidade pelosdébitos trabalhistas.

A IRONBRÁS argui preliminar deinépcia, carência de ação,lit ispendência e que não hápossibilidade de responsabilização dadefendente, em razão de que oscréditos se referem ao período doarrendamento pela COFERGUSA.

Paulo de Aboim guerreia aoargumento de que é incabível a emendaà inicial; carência de ação e que nãopossui responsabilidade pelos danos;que não impediu que os trabalhadorescontinuassem a trabalhar quando daimissão na posse pela COFERGUSA;que quem determinou o abafamento doalto-forno foi o administrador judicial;pugnando pela improcedência dosdemais pleitos.

Novo indeferimento da liminarà f. 652.

Audiência à f. 694, em que o juiztitular deu-se por suspeito.

Novo adiamento à f. 715, comacordo parcial.

Audiência de encerramento dainstrução à f. 753.

Despacho convertendo ojulgamento em diligência às f. 756/761.

Sentença às f. 773/784entendendo pela ilegitimidade do MPT.

Recurso ordinário às f. 793/853.Acórdão prolatado às f. 933/942,

entendendo pela legitimidade ativa doMPT para defesa de interessesindividuais homogêneos, determinandoo retorno dos autos para julgamento dospleitos.

Nova audiência em 17.07.08;houve esclarecimentos das partesacerca da situação atual doempreendimento, sendo encerrada ainstrução com razões finais orais.

Petição do MPT às f. 1004/1005,apenas reiterando os pleitos.

Memorial pela ré Ivana às f.1006/1011, reiterando sua ausência deresponsabilidade.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

Das questões iniciais

Quanto às preliminares deinépcia da inicial, imutabilidade dacausa de pedir, litispendência ou coisajulgada, bem como em relação àextinção do processo parcialmente emrazão do acordo parcial cumprido, todosesses temas foram apreciados pelasentença de f. 773/784, não tendo sidoreformados nesse tocante pelo EgrégioTRT. Por isso, mantenho osindeferimentos das preliminares e aextinção ali verificada, por seus própriosfundamentos, como se aqui estivessemtranscritos em sua integralidade.

635

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

No pertinente à legitimidade doMPT, tal matéria foi apreciada peloEgrégio TRT, sendo despicienda suareapreciação nesse momento.

Em relação à arguição do MPT,em sede de razões finais, de que ainstrução processual havia seencerrado em 07.08.07, tal levante nãomerece relevo, haja vista que ao juizcabe a condução do processo, comespeque no art. 765 da CLT; porconseguinte, válida a nova inclusão empauta e os esclarecimentosapresentados na audiência de f. 980/982, principalmente porque a situaçãoatual é outra da vivenciada quando doajuizamento desta demanda e asituação fática é bastante estanque davivenciada quando do aforamento dofeito.

No que tange à exclusão damassa falida, tal fato já se encontrasedimentado, não tendo razão de sera sua manutenção no processo, namedida em que não constam pedidosem face da massa e, principalmente,porque todo o seu patrimônio encontra-searrecadado pelo juízo falimentar, e,ainda, pelos mesmos fundamentos,rejeito também a inclusão doadministrador judicial nesta demanda.

Da ilegitimidade passiva adcausam

A legitimidade passiva se revelana pertinência subjetiva da ação, valedizer, quando a parte indicada comodevedora na relação jurídicaprocessual pode estar, abstratamente,vinculada à relação jurídica de direitomaterial. No caso dos autos, como oprovimento vindicado, se porventuraacolhido, produzirá efeitos na órbitajurídica dos reclamados, estes são,inegavelmente, partes legítimas parafigurarem no polo passivo da lide.

Ademais, a discussão queavança dessa fronteira, sobre aexistência ou não de vínculo deemprego ou de responsabilidade,prende-se ao mérito da causa, peloque com este será decidida.

REJEITO a preliminar.

Do mérito

Da análise do caso, verifica-seque, quando do ajuizamento dademanda, a situação fática era de fimdo arrendamento do parque industrialpela COFERGUSA e continuação donegócio pelo falido.

Nesse sentido, a empresafalida IRONBRÁS retomou asatividades, porém, posteriormente, osíndico foi destituído, estando oprocesso judicial da falênciasuspenso, aguardando oprocessamento de uma exceção desuspeição, conforme comprova odocumento de f. 984, tendo ocorrido aparalisação total do parque industrial.

Vejamos alguns trechos daderradeira audiência:

As partes esclarecem queatualmente o parque industrial nãoestá em atividade, sendo que estásendo mantida apenas a segurançado local, não havendo mais labor,inclusive o réu Paulo de Aboim requera juntada do inteiro teor da decisãoprolatada pelo Tribunal de Justiça noAgravo de Instrumento, na qual foidestituído o síndico, ressalta aindaque já houve inclusive decisão do TJordenando retirada de peça do ex-síndico da massa, ao argumento deesse não mais responder pela massafalida. Com a palavra a advogada damassa disse que: “a decisão quedestituiu o síndico ainda não transitou

636

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

em julgado, ressaltando-se ainda queo processo de falência encontra-sesuspenso, aguardando julgamentode exceção de suspeição arguidacontra juízo da falência, ressaltandoque a massa falida foi excluída dalide, decisão essa devidamentehomologada”. Que em setembro de2007 houve a paralisação definitivada produção do parque industrial, oqual, naquele período, vinha sendogerido pelo falido, informação dadapelo representante da massa. Com apalavra o advogado da COFERGUSA:“ressalta que encerrou as atividadesem setembro de 2006, com todos ossalários do período pagos”. Com apalavra o advogado assistente dosindicato: “que os créditostrabalhistas não foram quitados naintegralidade nem pela massa, nempela COFERGUSA, pois apenas forampagos os salários até outubro de2007, faltando as verbas rescisórias,ressalta ainda que há débitossalariais relativos a novembro,dezembro e parte de janeiro de 2008;esclarece ainda que têm ocorridodecisões nesta comarca entendendopela sucessão e pelaresponsabilidade da massa”. Com apalavra o réu Paulo de Aboim:“esclarece que a COFERGUSAdeixou passivo trabalhista,principalmente de FGTS,relativamente ao seu período deatuação, ressaltando que, quando ofalido assumiu novamente asatividades, recolheu pontualmente atributação devida em relação aossalários pagos do seu período, tendoassumido o parque industrial em17.07.06, saindo cerca de um mêsapós, retornando em 26.09.06 eencerrando novamente as atividadesem 06.09.07”. As partes declaramque não têm mais provas a produzir.

Pelo juízo foi dito que, tendo em vistaa decisão de f. 407, na qual a massafalida foi excluída desta demanda,mantenho a exclusão da massa,devendo a Secretaria registrar areferida exclusão. Fica concedido aoMPT o prazo de 10 dias pararelacionar o endereço dos cartóriosem que estão registrados os bens,conforme pedido da inicial e de seuaditamento. Encerrou-se a instrução.Razões finais orais pelo MinistérioPúblico: “considerando que, naaudiência ocorrida no dia 07.08.07,procedeu-se ao encerramento dainstrução processual, o MinistérioPúblico do Trabalho ora impugnatodas as informações ora prestadasrelativas a fatos e circunstânciasanteriores a esta data, propugnandopela aplicação, quanto a esses fatos,das regras legais de distribuição doônus da prova”. Pela COFERGUSA:“Por entender que a exclusão damassa falida, conforme deferidoneste ato, trará complicações emdificuldade na solução dos problemastratados nestes autos, protesta peloentendimento do juízo nesseparticular. Além disso, como bemficou demonstrado na presenteaudiência, a quase totalidade dosprocessos que envolvem osempregados e as rés que figuramnesses autos tiveram julgamento nosentido de inclusão da massa falidapara que a mesma responda pelosdébitos, como sucessora daempresa falida, bem como daCOFERGUSA. Nada mais”. Pela réIvana Maria: “em relação à alegaçãodo Ilustre representante do MP quantoao encerramento da instrução emagosto de 2007, saliento que algunsdos esclarecimentos prestadosnesta assentada referem-se a fatosposteriores que poderiam ser

637

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

suscitados até mesmo em sederecursal, devendo nesse particularser observados taisesclarecimentos. Nada mais”. Peloréu Paulo de Aboim: “tendo em vistaque a IRONBRÁS Indústria eComércio na sucessão pela empresaCOFERGUSA voltou ao parqueindustrial através de uma decisão doTJMG na qual foi nomeado oadministrador judicial José AlfredoLopes de Albuquerque, ausentenesta assentada, impugnaimprescindivelmente pela inclusão dareferida pessoa na presente lide.Nada mais”.

Da análise das provas juntadasaos autos, por exemplo, f. 749, emcontraponto com a defesa daCOFERGUSA, que roga que quitou todosos débitos salariais de seu período,nada mencionando sobre o FGTS econtribuições previdenciáriasrespectivas, e, ainda, atentando-se parao fato de que a referida reclamada nãose desvencilhou de seu ônus probatório,a teor do disposto no inciso II do art. 333do CPC e art. 818 da CLT, pois não trouxeaos autos a comprovação de quitaçãodas mencionadas contribuiçõesfundiárias e previdenciárias de seuperíodo, considero, por conseguinte, quehá débitos da COFERGUSA em relaçãoao seu período de gestão do parqueindustrial.

Nesse sentido, entendo inválidaa argumentação da COFERGUSA deque, diante da sucessão havida, coma continuação do negócio pelo falido,não teria mais responsabilidade portais débitos, por entender que aCOFERGUSA agiu com má-gestão emseu período à frente do parqueindustrial, não cumprindo com suasobrigações legais laborais, o queacarreta a sua responsabilização

solidária em relação ao período de suagestão, com fulcro no art. 942 doCódigo Civil, verbis:

Art. 942. Os bens do responsávelpela ofensa ou violação do direito deoutrem ficam sujeitos à reparação dodano causado; e, se a ofensa tivermais de um autor, todos responderãosolidariamente pela reparação.Parágrafo único. São solidariamenteresponsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadasno art. 932.

Frente à norma supra, infere-seque a COFERGUSA, como autora daofensa aos direitos dos trabalhadores,qual seja, não recolhimento do FGTS edas contribuições previdenciárias noseu período de gestão, respondesolidariamente com os sucessores,pois os arts. 10 e 448 da CLT nãoexcluem a responsabilidade dasucedida e devem ser interpretadosconjuntamente com o art. 942 do nCC,em razão do princípio da máximaefetividade dos direitos constitucionais,mormente a busca do pleno emprego;vale dizer, a sucessão não é uma cartabranca ao vil ipêndio de direitostrabalhistas, mas sim garantia de maiorefetividade do crédito.

Insta frisar que o próprio TRTdesta Região vem entendendo pelasolidariedade da COFERGUSA,conforme prolatado no ACÓRDÃO/TRT/RO/01508-2006-039-03-00-1.

Nesse sentido é a nota de rodapédo artigo “Direito do trabalho, terceirizaçãoe contratos de fornecimento industrial.Notas sobre a Responsabilidade Jurídicade Clientes Fornecedores” - GuilhermeGuimarães Feliciano, disponível no site

h t t p : / / w w w . f i s c o s o f t . c o m . b r /main_index.php?home=home_artigos&m=_&nx_=&viewid=150699, vejamos:

638

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

No caso da locação ou cessão deestabelecimento, todavia, pode-se -e deve-se - discutir aresponsabilidade da empresalocadora/cedente em contextos desucessão empresarial (§ 2º do artigo2º da CLT). Entendo, e tenho decidido,que “a responsabilidade do sucessornão exclui a responsabilidade dosucedido. Com efeito, não se dá, coma sucessão, a exoneração dosucedido. Firma-se, antes, asolidariedade passiva entre sucedidoe sucessor, quanto a todos oscréditos trabalhistas havidos em facedo primeiro. Outro entendimentoimportaria em exegese in pejus denorma legal tuitiva, contra a melhorhermenêutica (“odiosa restringenda,favorabilia amplianda”). Não por outrarazão, mutatis mutandis (comrelação à Rede Ferroviária FederalS/A), o Pleno do C.TST pacificou quea sucedida (RFFSA) respondesubsidiariamente pelos direitostrabalhistas referentes a contratosrescindidos após o contrato deconcessão, além de responderintegralmente pelos contratos detrabalho rescindidos antes daentrada em vigor da concessão (eapesar dela) [OJ n. 225 da SDI-1 doTST, na redação de 18.04.2002,anterior à atual, de 20.04.2005]. Nãocabe dizer, aqui, que a solidariedade“decorre da lei ou da vontade daspartes”, porque o enfoque há de seroutro: não há, na legislaçãotrabalhista, qualquer cláusula deexoneração do devedor originário(sucedido) ¾ logo, suaresponsabilidade (principal)remanesce incólume, convivendocom outra responsabilidade principal,dada pela lei (artigos 10 e 448 daCLT). Concomitantes duasresponsabilidades principais

concentradas em dois sujeitosdistintos (Schuld comum, Haftungdesdobrado), não há outro institutose não a solidariedade passiva”(excerto da sentença prolatada, em30.09.2003, nos autos do processon. 943/2002-4 da 3ª Vara do Trabalhode Campinas; negritos no original).Em sentido semelhante, confira-se,ainda, o magistério de EDILTONMEIRELLES: “A sucessão trabalhistanão isenta a empresa sucedida pelosdébitos constituídos até a data dotrespasse se o empregado nãoconcorda com a cessão do débito[...] O sucedido continuariaresponsável pela satisfação de seusdébitos, constituídos até a data dasucessão, já que a cessão de seudébito não surte efeito em relação aoempregado, enquanto que a empresasucessora, com o trespasse,assumiria também a posição dedevedora [...] Nestes casos [...]surgiria a responsabilidade solidáriapor parte da empresa sucessora nahipótese desta assumir a dívidaatravés da negociação mantida como sucedido” (MEIRELES, Edilton.Sucessão trabalhista e assunção dedívida: da solidariedade empresarial,in Revista LTr, São Paulo, v. 60, n. 5,p. 621, 05/1996 - g.n.). (grifosacrescidos)

De outro giro, cabe afastar aargumentação de que a IRONBRÁSnão teria responsabilidade pelosdébitos do período de atuação daCOFERGUSA, haja vista que aquelareassumiu o empreendimentopraticamente em seguida a esta,permanecendo com váriosempregados, conforme demonstra arelação juntada aos autos pela própriaIRONBRÁS, f. 764/770, no mesmoparque industrial, com a mesma

639

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

atividade econômica; hipótese nítidade aplicação da disciplina aventadapelos arts. 10 e 448 da CLT.

Dessa feita, acolho os pedidosde letras “g” e “h”, no tocante às résCOFERGUSA e IRONBRÁS,declarando-as responsáveis solidáriaspelas verbas pecuniárias devidas aostrabalhadores no período de atuaçãoda COFERGUSA, em razão doarrendamento; ressaltando que aIRONBRÁS responde também peloperíodo após o fim do arrendamentopela COFERGUSA.

Da responsabilidade dossócios

A condição de sócios deempresas que negligenciaram direitoslaborais e que são responsáveis porpassivos trabalhistas atrai aresponsabilidade dos membros doquadro societário. Cabe esclarecerque a teoria geral e os princípios doCDC aplicam-se ao microssistematrabalhista, diante da nítida identidadede escopo, qual seja, a proteção dohipossuficiente econômico(Precedente: TST - 3ª T. - AIRR/02044-2001-013-08-00 - DJ 28.10.2004).

Tal aplicação se dá em carátersubsidiário, sendo que dispõe o CDC,art. 28, § 5º, que: “Também poderá serdesconsiderada a pessoa jurídicasempre que a sua personalidade for,de alguma forma, obstáculo aoressarcimento de prejuízos causadosaos consumidores”, dispositivoplenamente aplicável ao Processo doTrabalho, até porque imprime amáxima efetividade ao processolaboral, sendo a sua compatibilidadeevidente.

É a adoção da teoria finalísticada desconsideração da pessoajurídica, pela qual o credor trabalhista

não necessita provar a fraude ou oabuso de direito, uma vez que essesrestam presumidos em face dasimples hipótese da autonomiapatrimonial da pessoa jurídica ser umobstáculo à percepção dos créditostrabalhistas.

Ademais, diante do fato de quea COFERGUSA, como é de sabençageral nesta Comarca, vem seesquivando do comparecimento nosprocessos judiciais dos trabalhadoresem trâmite, não mais conseguindo sercitada pelas vias normais, o que atraia ilação de intenção de não quitaçãodas verbas de sua responsabilidade;e, quanto à IRONBRÁS, em razão desua falência e arrecadação dos benspela massa, também atrai sérioobstáculo ao ressarcimento dosdireitos dos trabalhadores; acolho ospedidos de letras “g” e “h”,parcialmente, para declarar aresponsabilidade subsidiária dossócios Antônio Resende Penido, IvanaMaria Pontes da Silva Penido e Paulode Aboim, em caso de inadimplementopor suas respectivas sociedadesempresárias, em relação aos créditostrabalhistas, sendo que o Sr. PauloAboim responde, ainda, pelo períodoapós o fim do arrendamento pelaCOFERGUSA.

Vale mencionar que oinstrumento de alteração contratual, noqual ficou sedimentada a saída dasociedade COFERGUSA da sóciaIvana Maria Pontes da Silva, apenas foiaverbado em maio/06, o que implica asua responsabilidade por até doisanos após a averbação, nos moldesdo nCC. Colacionamos:

Art. 1.003. A cessão total ou parcialde quota, sem a correspondentemodificação do contrato social como consentimento dos demais sócios,

640

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

não terá eficácia quanto a estes e àsociedade.Parágrafo único. Até dois anosdepois de averbada a modificaçãodo contrato, responde o cedentesolidariamente com o cessionário,perante a sociedade e terceiros,pelas obrigações que tinha comosócio.

Destarte, cabe aresponsabilização subsidiária dareferida sócia pelo passivo trabalhistada COFERGUSA no período emquestão.

Afasta-se a responsabilidadesolidária, haja vista que o art. 990 donCC está incluído no capítulo dasociedade em comum, ou seja,irregular, o que não é o caso dos autos,pois as empresas possuempersonalidade jurídica própria.

Da indisponibilidade dos bens

Tendo em vista que aCOFERGUSA não vem respondendoaos processos judiciais em trâmiteneste foro, por exemplo, RT 483/08,574/08, 385/08, dentre outras; o queatrai a ilação de que essa possuiintenção de se eximir daresponsabilidade pelos créditostrabalhistas ainda pendentesrelativamente ao seu período;considerando a disciplina prevista no§ 5º do art. 461 do CPC, o qualdetermina que o magistrado tome asmedidas necessárias para a obtençãodo resultado prático da decisãoprolatada; verificando a possibilidadeconcreta de que a COFERGUSA dissipeseu patrimônio, em prejuízo doscréditos trabalhistas de seus ex-empregados, especialmente ascontribuições ao FGTS; bem comodiante da necessidade de que se tenha

um rol de bens já acessíveis parapenhora nos processos trabalhistasque já estão em fase de execução,implementando ainda maiorceleridade aos feitos; determino aindisponibilidade de todos os bensimóveis e veículos (automóveis,utilitários e caminhões) pertencentesà ré COFERGUSA - Indústria eComércio de Ferro Gusa União Ltda.,bem como de seus sócios AntônioResende Penido e Ivana Maria Pontesda Silva.

Atentando-se para o fato de quefoi concedido prazo ao MPT parainformar os endereços dos várioscartórios arrolados na inicial e naemenda, inclusive de outras comarcase outros estados, f. 981, sendo queesse não cumpriu tal determinação,apenas reiterando os pedidos, f .1004/1005, e, ainda, considerando ovolume de serviços desta Vara, a qualinclusive tem mais processosanualmente do que as Varas da capital,e com exiguidade de servidores e deespaço; determino que o MinistérioPúblico do Trabalho oficie a todos oscartórios de registro de imóveisarrolados em sua inicial, bem comoaos Departamentos de Trânsito (f.361), comunicando esta decisão, comcópia da presente sentença, para queos destinatários procedam àaverbação da indisponibilidade aquideterminada e, posteriormente,comuniquem este juízo acerca documprimento desta decisão.

Indefiro o pedido deindisponibilidade dos ativos florestais,créditos contra devedores, ativosfinanceiros em bancos e consórcios,do estoque de carvão e ferro gusa,mercadorias e demais insumos ematérias-primas, haja vista que talmedida, na prática, implicaria adecretação da paralisação das

641

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

atividades econômicas da empresaCOFERGUSA, uma vez que essa ficariaimpossibilitada de gerir sua atividadeeconômica, ou na insolvência civil deseus sócios, o que só viria a colocarem maior risco os créditos dostrabalhadores.

Da determinação à IRONBRÁSpara manutenção do empreendimento

A massa é a gestora de todo oparque industrial, sendo que toda equalquer medida em face doempreendimento apenas pode serdecretada pelo juízo universal dafalência, ainda mais no presente caso,em que o MPT afirma que houvecompromisso firmado pelo falido juntoao TJMG; por conseguinte, quem podedeterminar qualquer responsabilizaçãonesse tocante é aquele EgrégioTribunal e não esta Especializada.

Ademais, o processo da falênciaencontra-se suspenso e o parqueindustrial sem atividade econômica.

Indefiro.

Determinação de bloqueio emface da IRONBRÁS e de seu sócioPaulo de Aboim

Pelas mesmas razões, ouseja, por atualmente a falida nãoestar operando o parque industrial,ser ia infrut í fera qualquerdeterminação para bloqueio de bensda IRONBRÁS, até mesmo porquequalquer valor nesse sentido deve serrepassado à massa, no juízouniversal da falência, e não para estaEspecializada.

Indefiro.

Da determinação de obrigaçãode não efetivar atos de gestão ao Sr.Paulo de Aboim

Novamente, a falida não estámais operando, o que implica oafastamento do referido sócio.Ademais, quem deve punir por gestãonão autorizada é o juízo da falência, oqual possui a condução do patrimôniomaterial e imaterial.

Indefiro.

Do dano moral coletivo

A injusta lesão a interessesmetaindividuais socialmente relevantespara a coletividade, e assim tuteladosjuridicamente, cuja ofensa atinge aesfera moral de determinado grupo,classe ou comunidade de pessoas ouaté mesmo toda a sociedade,caracteriza o dano moral coletivo.

O dano moral coletivo nadamais é do que a ofensa aos valores dasociedade, entre eles está,indubitavelmente, o respeito aocidadão/trabalhador.

Nessa esteira, os requeridos, aoinfringirem os direitos trabalhistas, nãoos cumprindo em sua integralidade,principalmente o FGTS, e ainda aoefetivarem uma sucessão deempresas, sem que os trabalhadoresfossem participados dos atos queestavam ocorrendo, deixando-os seminformação de sua condição deempregado ou desempregado eainda realizando o cumprimento dasobrigações de fazer de baixar asCTPSs e fornecer as guias doseguro-desemprego, apenas com aimplementação da presente ação,impingindo aos trabalhadores oajuizamento de um volume exacerbadode demandas judiciais na busca daimplementação dos direitosrescisórios, feriram valoresconstitucionais e sociais, tais como abusca pelo pleno emprego, valor socialdo trabalho, dignidade da pessoa

642

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

humana, boa-fé contratual e respeitopara com seus trabalhadores,remanescendo, ainda, aspectos deintranquilidade e insegurança, o quenão pode ficar impune.

Ressalte-se que aresponsabilidade civil em matéria dedano moral, em que a reparação temcaráter preventivo-pedagógico epunitivo, é devida pelo simples fato daefetiva violação de interessesmetaindividuais socialmenterelevantes e juridicamente protegidos.

Tal como o dano moralindividual, também deve ser reparadoo dano moral coletivo, emconformidade com a previsãoconstitucional do art. 5º, incisos V e X,bem como pela disposição do art. 1ºda Lei n. 7.347/85. A diferença na formade reparação do dano consiste em que,no caso individual, o destinatário daindenização é a vítima ou seussucessores; já no dano moral coletivo,o valor da indenização é encaminhadoa um fundo, consoante previsão do art.13 da citada Lei da Ação Civil Pública,e terá por finalidade a reconstituiçãodos bens lesados.

Sendo assim, nos moldes dosarts. 186, 927, 942 e 944 do nCC, bemcomo inciso VI do art. 114 da CR/88,cabível a condenação solidária dasempresas rés e subsidiária de seussócios constantes do polo passivo emindenização por danos sociais, valedizer, moral coletivo, no importe deR$400.000,00, a ser revertido ao Fundode Amparo ao Trabalhador - FAT, emvirtude das graves ofensasperpetradas pelas rés, e ainda,levando-se em conta o intuito educativosancionador que merece estarpresente no caso, como forma dereparar o mal causado à sociedade,bem como inibir que a ordem jurídicavenha a ser novamente objeto de lesão.

Dos requerimentos finais

Quanto aos requerimentosfinais, o acordo parcial já ossolucionou, bem como a atuação dosindicato assistente vemcorroborando para implementaçãodas obrigações de fazer finais doscontratos de trabalho. Nada a deferirno particular.

Da tutela antecipada

No presente caso, conformetoda a fundamentação acimaexpendida, denota-se o perigo dademora na possibil idade dedissipação dos bens pelaCOFERGUSA e de seus sócios e afumaça do bom direito naresponsabilidade da COFERGUSA ede seus sócios pelo passivotrabalhista, especialmente o FGTS.

Entrementes, defiro a tutelaantecipada para determinar aindisponibilidade de todos os bensimóveis e veículos (automóveis,utilitários e caminhões) pertencentesà ré COFERGUSA - Indústria eComércio de Ferro Gusa União Ltda.,bem como de seus sócios AntônioResende Penido e Ivana Maria Pontesda Silva.

Para tanto, determino que oMinistério Público do Trabalho oficie atodos os cartórios de registro deimóveis arrolados em sua inicial, bemcomo aos Departamentos de Trânsito(f. 361), comunicando esta decisão,com cópia da presente sentença, paraque os destinatários procedam àaverbação imediata daindisponibilidade aqui determinada e,posteriormente, comuniquem estejuízo acerca do cumprimento destadecisão.

643

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Dispositivo

Ante o exposto, rejeito aspreliminares suscitadas e julgoparcialmente procedentes os pedidos,nos termos da fundamentação supra,que passa a integrar este dispositivo,como se aqui literalmente transcrita,para condenar os réus, nos seguintestermos:

1 - acolho os pedidos de letras“g” e “h”, no tocante às rés COFERGUSAe IRONBRÁS, declarando-asresponsáveis solidárias pelas verbaspecuniárias devidas aos trabalhadoresno período de atuação da COFERGUSA,em razão do arrendamento, ressaltandoque a IRONBRÁS responde tambémpelo período após o fim doarrendamento pela COFERGUSA;

2 - acolho os pedidos de letras“g” e “h”, parcialmente, para declarar aresponsabilidade subsidiária dossócios Antônio Resende Penido, IvanaMaria Pontes da Silva e Paulo deAboim, em caso de inadimplementopor suas respectivas sociedadesempresárias, em relação aos créditostrabalhistas, sendo que o Sr. Paulo deAboim responde ainda também peloperíodo após o fim do arrendamentopela COFERGUSA;

3 - determino aindisponibilidade de todos os bensimóveis e veículos (automóveis,utilitários e caminhões) pertencentesà ré COFERGUSA - Indústria eComércio de Ferro Gusa União Ltda.,bem como de seus sócios AntônioResende Penido e Ivana Maria Pontesda Silva, devendo o Ministério Públicodo Trabalho oficiar a todos os cartóriosde registro de imóveis arrolados em

sua inicial, bem como aosDepartamentos de Trânsito (f. 361),comunicando esta decisão, com cópiada presente sentença, para que osdestinatários procedam à averbação daindisponibilidade aqui determinada e,posteriormente, comuniquem estejuízo acerca do cumprimento destadecisão;

4 - defiro a tutela antecipadapara determinar a imediataindisponibilidade de todos os bensimóveis e veículos (automóveis,utilitários e caminhões) pertencentesà ré COFERGUSA - Indústria eComércio de Ferro Gusa União Ltda.,bem como de seus sócios AntônioResende Penido e Ivana Maria Pontesda Silva. Para tanto, determino que oMinistério Público do Trabalho oficie atodos os cartórios de registro deimóveis arrolados em sua inicial, bemcomo aos Departamentos de Trânsito(f. 361), comunicando esta decisão,com cópia da presente sentença, paraque os destinatários procedam àaverbação imediata daindisponibilidade aqui determinada e,posteriormente, comuniquem estejuízo acerca do cumprimento destadecisão.

5 - defiro a condenaçãosolidária das empresas rés esubsidiária de seus sócios constantesdo polo passivo em indenização pordanos sociais, vale dizer, moralcoletivo, no importe de R$400.000,00,a ser revertido ao FAT.

Custas pelos réus, no importede R$8.000,00, calculadas sobre valorarbitrado à condenação deR$400.000,00.

Intimem-se.Cumpra-se.

644

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

ATA DE AUDIÊNCIA - PROCESSO N. 00894-2008-403-00-0Data: 19.09.2008DECISÃO DA VARA DO TRABALHO DE PARACATU - MGJuiz Substituto: Dr. FÁBIO AUGUSTO BRANDA

Na sexta-feira, dia 19 de setembro de 2008, às 16h, na sala de audiênciasda Vara do Trabalho de Paracatu, presente o MM. Juiz, Dr. FÁBIO AUGUSTOBRANDA, foram, por ordem do MM. Juiz, apregoados os litigantes: Marcos JoséBotelho Ulhoa, reclamante, e Banco do Brasil S/A, reclamado.

Ausentes as partes. Submetido o processo a julgamento, foi proferida aseguinte

SENTENÇA

O autor, representado por suacuradora, afirma ter sido admitido em24.08.1967 e exonerado em 1975,quando estava acometido de doençamental grave, que, inclusive, ensejousua interdição em 1980. Refere que,durante o contrato de trabalho, foiinternado diversas vezes paratratamento psiquiátrico e que, mesmoconhecendo sua doença, o banco réuaceitou o pedido de exoneração feito.Requer antecipação dos efeitos dasentença e, no mérito, a nulidade do atojurídico de exoneração, ante o vício deconsentimento, para que sejareintegrado ao quadro funcional doreclamado e aposentado por invalidez,bem como sejam adimplidas verbassalariais desde a data da exoneraçãonula. Pede, ainda, a condenação emdanos morais e em custas e honorários.Deu à causa o valor de R$6.000.000,00.

Em defesa escrita, o banco réuargui, preliminarmente, prescrição edecadência. No mérito, refere que nãodispõe mais da documentaçãoreferente ao reclamante por contar maisde 30 anos da extinção do vínculoempregatício e que, à época darescisão, não era obrigatória arealização de exame demissional.Afirma que o autor era plenamente capazpara requerer a exoneração e que o ato,

portanto, é válido, pois a interdição sóopera seus efeitos a partir da prolaçãoda sentença. Quanto aos danos moraispleiteados, aduz que não houvecomprovação de sua existência, razãopara indeferir o pedido. Impugna opedido de salário do período deafastamento (desde 1975, no patamarde R$5.000,00), ao argumento de quenão houve prestação laboral porrompimento do vínculo e de que o valordeclinado não corresponde àquele queperceberia se estivesse na ativa.Insurge-se quanto à antecipação detutela pleiteada, por não estarempresentes os requisitos legais, e requera improcedência da ação (f. 81/95).

O banco réu impugnou o valordado à causa, pleiteando seja reduzidopara R$1.000,00, para efeitos fiscais(f. 96/97), o que foi contestado peloautor (f. 142/143).

Impugnação à defesa (f. 136/141).

Provas documentais (f.21/64;99/133).

Encerrada a instrução, comrazões finais orais e sem êxito aspropostas conciliatórias (f. 144).

Decido:

1. Prescrição e decadência

A análise dos efeitos do temposobre a pretensão ou o próprio direito

645

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

postulado passa, necessariamente,pela modulação dos efeitos dasentença da interdição. Veja-se que setrata de ação bastante peculiar. O autorfoi admitido pelo Banco do Brasil,mediante concurso público, em 1967e exonerado, a pedido, em 1975,porém alega que o fez acometido degrave doença mental que oincapacitava para o ato.

Não se está diante decorriqueira ação trabalhista em que acontagem do prazo prescricionalremete ao término do contrato detrabalho, mas da possibilidade de nãose ter contado o prazo prescricionaldiante da incapacidade absoluta doautor, nos termos do inciso I do art. 169do CC/19161, vigente à época do fato.Portanto, a matéria será tratada emconjunto com os efeitos da declaraçãoda incapacidade.

2. Incapacidade - Efeitos

A teoria geral dos atos jurídicoselegeu como elementos de existênciae validade do ato jurídico a licitude doobjeto, forma prescrita ou não defesaem lei e agente capaz.

Mas é nessa teoria, ainda, queencontramos a orientação de todo osistema jurídico quanto à prevalênciado conteúdo sobre a forma. Comoexemplo, cito a disposição queevidencia a intenção dos agentes emdetrimento da declaração de vontadeefetivamente emitida (CC/1916, art.852), ou a outorga de validade do ato

praticado pelo relativamente capaz queocultou a idade ou mentiu (CC/1916,art. 1553).

O ordenamento sinaliza paraduas conclusões: privilegia-se aintenção das partes sobre a forma doato e a boa-fé dos contratantes. Tudopara assegurar um dos principaisvalores de qualquer sistema jurídico:a segurança.

E ainda sob o binômio - boa-fée intenção das partes -, é que deve sercompreendido o regime dasincapacidades. Idealizado para conferirproteção a quem não pode expressarvalidamente sua vontade, sem prejuízopróprio, o sistema jurídico impôslimitações e exigência derepresentação adequada pararestabelecer o equilíbrio entre aspartes contratantes.

A propósito, a lição de CaioMário da Silva Pereira:

O instituto das incapacidades foiimaginado e construído sobre umarazão moralmente elevada, que é aproteção dos que são portadores deuma deficiência juridicamenteapreciável. [...] A lei não instituiu oregime das incapacidades com opropósito de prejudicar aquelaspessoas que delas padecem, masao contrário, com o intuito de lhesoferecer proteção, atendendo a queuma falta de discernimento, de quesejam portadores, aconselhatratamento especial, por cujointermédio o ordenamento jurídico

1 Art. 169. Também não ocorre aprescrição: I - contra os incapazes de quetrata o art. 5º

2 Art. 85. Nas declarações de vontade seatenderá mais à sua intenção que aosentido literal da linguagem.

3 Art. 155. O menor, entre 16 (dezesseis) e21 (vinte e um) anos, não pode, para seeximir de uma obrigação, invocar a suaidade, se dolosamente a ocultou, inquiridopela outra parte, ou se, no ato de se obrigar,espontaneamente se declarou maior.

646

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

procura restabelecer um equilíbriopsíquico, rompido em consequênciadas condições peculiares dosmentalmente deficitários.(In Instituições de direito civil -

Introdução ao direito civil - Teoria

geral de direito civil. 20ª ed., 2004,Ed. Forense, p. 272)

As incapacidades, por sua vez,dividem-se em relativas e absolutas,sendo estas referentes à idade,enfermidade ou deficiência mental e àimpossibil idade, ainda quetemporária, de discernimento,conforme critérios definidos pela lei. E,segundo o grau de incapacidade, aregularidade dos negócios com essaspessoas depende da intervenção deterceiros que integrem a capacidadeou representem o titular do direito.

Na hipótese de enfermidademental, a incapacidade é absoluta e,portanto, as pessoas acometidasdesse mal possuem apenas acapacidade de direito (aquisição dedireitos), e a capacidade da fruição(exercício do direito) é relegada a umcurador. Os incapazes não participamdireta e pessoalmente de qualquernegócio jurídico.

A integração ou regularização dacapacidade dos absolutamenteincapazes é matéria de tamanharelevância que desafia procedimentojudicial próprio, com necessáriaintervenção do Ministério Público, eposterior averbação da sentença noregistro de pessoas naturais (artigos1.177 a 1.186 do CPC).

E, tais preocupações justificam-se em nome, reitero, da segurançajurídica, corolário da boa-fé, pois coma averbação se torna público o ato,resguardando terceiros que pretendamcontratar com incapazes. A ciência, deantemão, que o negócio só pode ser

realizado com o curador é fator deconfiabilidade no sistema.

Veja-se que a exigência deregistro de atos judiciais é questão tãocara à segurança e boa-fé que, emrecente reforma do CPC, diante dasinúmeras controvérsias geradas porterceiros adquirentes de boa-fé debens apreendidos judicialmente apósdeclaração de fraude à execução, a Lein. 11.382/2006 passou a exigir aaverbação do ajuizamento da ação deexecução em registro de imóveis,veículos ou outros bens sujeitos àpenhora ou arresto, para, só então,considerar ineficaz a alienação (art.615-A do CPC4).

4 Art. 615-A. O exequente poderá, no atoda distribuição, obter certidãocomprobatória do ajuizamento daexecução, com identificação das partese valor da causa, para fins de averbaçãono registro de imóveis, registro de veículosou registro de outros bens sujeitos àpenhora ou arresto. (Artigo acrescentadopela Lei n. 11.382, de 06.12.2006 - DOU07.12.2006)§ 1º O exequente deverá comunicar aojuízo as averbações efetivadas, no prazode 10 (dez) dias de sua concretização.§ 2º Formalizada penhora sobre benssuficientes para cobrir o valor da dívida,será determinado o cancelamento dasaverbações de que trata este artigorelativas àqueles que não tenham sidopenhorados.§ 3º Presume-se em fraude à execução aalienação ou oneração de bens efetuadaapós a averbação (art. 593).§ 4º O exequente que promoveraverbação manifestamente indevidaindenizará a parte contrária, nos termosdo § 2º do art. 18 desta Lei, processando-se o incidente em autos apartados.§ 5º Os tribunais poderão expedirinstruções sobre o cumprimento desteartigo.

647

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Mas a interpretação literal doartigo 1184 do CPC leva à conclusãoque a sentença que declara a interdiçãoproduz efeitos ex nunc, ou seja, desdeentão: “A sentença de interdição produzefeito desde logo...”. E, no caso dosautos, o autor só foi declarado incapaze, consequentemente, nomeadocurador em 07.05.1980 (f. 106).

Porém, a interpretaçãosimplesmente gramatical da regra,dissociada do contexto em que seinsere, levaria ao seguinte paradoxo: omesmo ordenamento que se pautapela boa-fé e tenta conferir segurançajurídica, com a proteção dos incapazes,é aquele que, em tese, permitiria arealização de negócios por incapazes,sem a intervenção do curador, por umcapricho hermenêutico.

Explico-me. Não teria sentidoaceitar a natureza declaratória dasentença de interdição, com efeitos ex

nunc, validando atos praticados porincapazes em detrimento de si próprio,mesmo que se constatasse na práticaa ausência de capacidade de fato, aomesmo tempo em que se quer nulo oato realizado pelo absolutamenteincapaz.

A aparência ou situação fáticasão aptas a gerar direitos eobrigações. Veja-se que, mesmo sema averbação no registro de imóveis, ocomprador pode opor embargos deterceiro para manutenção da posse,conforme jurisprudência consagrada:

É admissível a oposição deembargos de terceiro fundados emalegação de posse advinda docompromisso de compra e venda deimóvel, ainda que desprovido doregistro. (Súmula n. 84 do STJ)

Então, apesar de não haver aformalização do ato, o Direito aceita a

realidade fática, assegurando a posseao comprador.

Assim, valho-me, novamente,da lição de Caio Mário da Silva Pereira:

Mas, como no direito brasileiro asentença proferida no processo deinterdição tem efeito declaratório, enão constitutivo, não é o decreto deinterdição que cria a incapacidade,e sim a alienação mental. Daípositivar-se que, enquanto nãoapurada a demência pela via legal, aenfermidade é uma circunstância defato a ser apreciada em cada caso,e, verificada a participação doalienado em um negócio jurídico,poderá ser este declarado inválido.Existe, contudo, diferença detratamento: pronunciada a interdição,ocorre a pré-constituição da provada insanidade, dispensando-sequalquer outra para fundamentar ainvalidade; não pronunciada, cumpreao interessado demonstrar aenfermidade, sua extensão ecoincidência com o ato incriminado.(In Instituições de direito civil -

Introdução ao direito civil - Teoria

geral de direito civil. 20ª ed., 2004,Ed. Forense, p. 278)

A jurisprudência, sob a vigênciado Código Civil de 1916, assim semanifestou:

NULIDADE DE ATO JURÍDICO.AGENTE INCAPAZ. CÓDIGO CIVIL,ART. 82. Aresto que reconhece aexistência de laudo pericial queatesta a incapacidade do agente àépoca do ato cuja nulidade se afirma(pedido de exclusão da PolíciaMilitar), mas nega a validade de tallaudo, no que se refere à épocapretérita, apesar da interdiçãodecretada judicialmente - que tem

648

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

efeitos ex tunc - e com base emcircunstâncias sem força probante.Negativa de vigência do art. 82 doCódigo Civil. Recurso extraordinárioconhecido e provido.(RE n. 115.435-7; Rel. Min. FranciscoRezek; DJ: 12.05.1989)

No voto do relator, lê-se aseguinte passagem:

Ora, essa Excelsa Corte tem opacífico entendimento de que asentença de interdição tem efeitosex tunc, porque alcança épocaanterior à sua prolação, desde quereconhecida a contemporâneaincapacidade:“Atos Jurídicos. Nulidade.Incapacidade absoluta do vendedor.Alienação Mental. Embora realizadosos negócios jurídicos antes dasentença de interdição do vendedor,os atos jurídicos são nulos, e assimpodem ser declarados, se, à épocade sua celebração, era, inequívocae notória a incapacidade absolutade uma das partes, conhecida,inclusive, da outra contratante.”(RE 100.093-7 - PR, Rel. Min. Néri daSilveira, in DJ de 08.11.84, p. 18.770)

Há, ainda, julgados do STJ,sobre o tema:

Direito e Processo Civil. Interdição.Atos anteriores à sentença.Nulidade. Imprescindibilidade deprova convincente e idônea.Cerceamento. Inocorrência.Honorários na execução. Recursonão conhecido. I - Para resguardoda boa-fé de terceiros e segurançado comércio jurídico, oreconhecimento da nulidade dos atospraticados anteriormente à sentençade interdição reclama prova

inequívoca, robusta e convincenteda incapacidade do contratante [...].(REsp. n. 9.077-RS; Rel. Min. SálvioFigueiredo Teixeira; DJ: 30.03.1992)

CIVIL. NEGÓCIO JURÍDICO.INCAPACIDADE MENTAL DOVENDEDOR. NULIDADE. Nulidade decompra e venda em face dainsanidade mental de uma das partes(CC, art. 5º, II), ainda que o fato sejadesconhecido da outra. Hipótese,todavia, em que o status quo ante

só será restabelecido, quando osherdeiros do incapaz restituírem omontante do preço recebido,corrigido monetariamente, bemassim indenizarem as benfeitoriasúteis, sob pena de enriquecimentosem causa. Recurso especialconhecido e provido.(REsp n. 38.353 - RJ; Rel. Min. AriParglender; DJ: 23.04.2001)

Nulidade de ato jurídico praticado porincapaz antes da sentença deinterdição. Reconhecimento daincapacidade e da ausência denotoriedade. Proteção do adquirentede boa-fé. Precedentes da Corte. 1.A decretação da nulidade do atojurídico praticado pelo incapaz nãodepende da sentença de interdição.Reconhecida pelas instânciasordinárias a existência daincapacidade, impõe-se a decretaçãoda nulidade, protegendo-se oadquirente de boa-fé com a retençãodo imóvel até a devolução do preçopago, devidamente corrigido, e aindenização das benfeitorias, naforma de precedente da Corte. 2.Recurso especial conhecido eprovido.(REsp. n. 296.895 - PR; Rel. Min.Carlos Alberto Menezes Direito; DJ.21.06.2004)

649

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

No voto do relator, lêem-se asseguintes passagens:

No precedente desta TerceiraTurma, também o Ministro Pargendlertrouxe indicação sobre esteparticular aspecto do conhecimentoda incapacidade, mostrando que oacórdão recorrido balanceou aproteção do incapaz com a docontraente de boa-fé, optando pelaúltima proteção. Mas a reformaacolhida pela Terceira Turma levouem conta que deve prevalecer atutela do incapaz.

E eu permaneço nessa mesmaposição, porque, na verdade, o quea lei civil comanda é a nulidadeexatamente para proteger oincapaz contra o esgotamento deseu patr imônio e, emconsequência, fonte desubsistência, não para privilegiaro adquirente de boa-fé. Ora, estepoderá ser protegido de outraforma, como aquela que a Corteadotou naquele caso, assim, como direito de retenção enquanto nãodevolvido o montante do preço,com a devida correção monetária,e indenizadas as benfei tor iasúteis. [...]

Portanto, a solução adotada pelasentença está, exatamente na linhade nosso precedente,reconhecendo a nulidade do atopraticado pelo incapaz, assimreconhecido nas instânciasordinárias, e ao mesmo temporesguardando os direitos dosadquirentes de boa-fé com o direitode retenção para o recebimento dopreço devidamente corrigido e daindenização pelas benfeitorias.

No caso dos autos, o autor foiafastado ou internado por diversas

vezes com a ciência do réu dosperíodos e motivos. Entre 28.10.1970a 18.12.1970 e 09.04.1975 a30.04.1975, o autor foi internado naCasa de Saúde Santa Clara (f. 27).

Já, entre 25.02.1973 a01.03.1973, a internação ocorreu noHospital Felício Rocho (f. 25), comdeclaração expressa do banco acercada internação e situação funcional doautor (f. 32/33) e posteriorressarcimento de despesas (f. 46).

Há, ainda, informações deafastamentos previdenciários a partirde 09.11.1972 (f. 48) e 16.10.1973 (f.49/50), com discriminação do saláriode contribuição do autor feita pelo réu(f. 51/54).

Mas a certeza de que o autornão dispunha de capacidade mentalpara assinar o ato de exoneraçãoadvém das declarações do promotorde justiça que se recusou a homologara rescisão contratual, nos seguintestermos:

DECLARO, para os devidos fins,que o Sr. MARCOS JOSÉ BOTELHOULHOA teve indeferido por estePromotor um seu (SIC) requerimentoem que solicitava da autoridade umvisto no seu pedido de exoneraçãodo cargo de funcionário do Bancodo Brasil S/A, por entender odeclarante que lhe faleciacompetência legal para tanto.

Ademais, segundo consta, e sedepreende dos atos e atitudes doSr. Marcos José Botelho Ulhoa, omesmo é pessoa portadora dedoença mental. Paracatu, outubro,1975. (pus os grifos, f. 21)

Segue a certeza da ausência decapacidade mental do autor, com aseguinte declaração do Juiz de Direitoda Comarca:

650

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

Declaro, para fins deapresentação junto ao Banco doBrasil S.A., que o Sr. Marcos JoséBotelho Ulhoa, [...], teve o visto desteJuízo recusado em seu pedido deexoneração desse Banco, emvirtude de ter conhecimento de omesmo sofrer distúrbios mentaisocasionais ou permanentes, o quesomente apreciável (SIC) por períciamédica não apresentada naquelaoportunidade, não comprovando,pois, a sua sanidade mental.Paracatu, 08 de outubro de 1975. (f.22)

Não havia mera suspeita de queo autor não tinha aptidões mentais, masdeclarações de duas autoridades quese recusaram a homologar o pedido deexoneração do autor ante a manifestaausência de sanidade mental.

Ganham relevo, ainda, no quese refere à higidez mental do autor, osseguintes trechos da sentença deinterdição:

Ao que se provou nestes autos,é o Interditando portador deESQUIZOFRENIA PARANÓIDE. Istoestá dito pela Prova Técnica coletadano bojo destes autos, reforçada pelaprova testemunhal, hoje aquiproduzida. Sabe-se que o portadordeste designo mental é, em regra,incapaz de gerir sua pessoa e seusbens. Também se sabe que dentreas formas clínicas da Esquizofrenia,se situam as formas paranóides, deaparecimento mais tardio,caracterizando-se sobretudo pelasideias delirantes de perseguição degrandeza. Revelam os doentesmarcados egocentrismos, altoneiose ególatras, de tendênciasmessiânicas [...] Veja-se que oInterditando destes Autos, menino

normal, jovem normal, professor deMatemática e Física, primeirocolocado em três concursos doBanco do Brasil, é o protódico (SIC)do tipo delineado pelo Grande HélioGomes. As provas técnicas, a provatestemunhal, a atuação destacadaem (SIC) do Digno Dr. Promotor deJustiça, tudo isso leva aodeferimento da inicial, sem maioresindagações. (f. 103/104)

Tudo a demonstrar que o réu,banco de notória capacidade financeirae sofisticada estrutura administrativa,a ponto de ter realizado concursopúblico antes mesmo de ser umaexigência constitucional (Constituiçãode 1967), tinha condições e indíciosbastantes que o autor não desfrutavade higidez mental bastante pararequerer a exoneração.

Então, torna-se indiferente ainexistência de obrigatoriedade deexame demissional, exigênciainstaurada pela Portaria n. 3.214/1978que instituiu a NR-07, pois airregularidade do ato remonta à teoriageral das nulidades: incapacidade doagente (CC/1916, art. 145, I).

Portanto, afasto a alegação deprescrição, pois contra incapaz nãocorre prescrição (inciso I do artigo 169do CC/1916 c/c inciso I do art. 198 doCC/2002) e de decadência, pois se tratade pretensão a crédito, e não a direitopotestativo.

Defiro, pois, a reintegraçãojurídica do autor aos quadrosfuncionais do réu no mesmo cargo(caixa executivo, f. 47), assegurando opagamento do salário equivalente aocargo, considerando o adicional dotempo de serviço desde a admissão(24.08.1967, f. 48).

Passo a regular os efeitoscondenatórios.

651

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

3. Verbas do contrato

O autor foi exonerado em08.10.1975, data fixada conformedeclaração da f. 22, à falta de outroelemento de convicção e, portanto, sãodevidos todos os salários, abonosconcedidos espontaneamente ou porforça de norma coletiva ou lei, adicionalpor tempo de serviço, 13º salários,férias acrescidas do terço e FGTS (8%- depósito em conta) de todo o período,como se em atividade estivesse.

4. Dano moral

Muito se tem discutido umadefinição satisfatória de danos morais.A omissão legislativa carreou àdoutrina a missão de fixar parâmetrose definições dessa nova dimensão dedireitos.

A propósito a indagação deSérgio Cavalieri Filho:

Nesse particular, há conceito paratodos os gostos. Há os que partemde um conceito negativo, porexclusão, que, na realidade, nadadiz. Dano moral seria aquele que nãotem caráter patrimonial, ou seja, tododano não-material. SegundoSavatier, dano moral é qualquersofrimento que não é causado poruma perda pecuniária. Para os quepreferem o conceito positivo, danomoral é dor, vexame, sofrimento,desconforto, humilhação - enfim, dorda alma.(In Programa de responsabilidade

civil. 7ª Edição, Ed. Jurídica Atlas,2007, p. 76)

Superada a definição negativa,a segunda definição gera insegurançajurídica. Isso porque relega àssuscetibil idades individuais a

quantificação de uma lesão que,obrigatoriamente, deve-se pautar porfatos objetivos. Veja-se que, a se adotaresse entendimento, um mesmo fatopoderia gerar indenizações diversas,conforme idade, classe social, grau deinstrução, sexo, raça e outrasindividualidades de difícil, senãoimpossível, quantificação.

Os fatos aptos a gerar o danomoral devem repercutir objetivamentena esfera individual, a ponto de ferir obom nome, sentimento de autoestima.Servindo como parâmetros asdefinições doutrinárias do DireitoPenal, especialmente, acerca de honrasubjetiva e objetiva. Aquela diz respeitoao sentimento de autoestima econcepção que o indivíduo tem de simesmo; esta, ligada à concepção queos demais membros da sociedade,familiares, ou colegas de trabalho têmda vítima.

Nesse sentido, a lição de SérgioCavalieri Filho:

Nessa linha de princípio, só deveser reputado como dano moral ador, vexame, sofr imento,humilhação que, fugindo ànormalidade, interfira intensamenteno comportamento psicológico doindivíduo, causando-lhe aflições,angústia e desequilíbrio de seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento,mágoa, irritação ou sensibilidadeexacerbada estão fora da órbita dodano moral, porquanto, além defazerem parte da normalidade donosso dia-a-dia, no trabalho, notrânsito, entre os amigos e até noambiente familiar, tais situações nãosão intensas e duradouras, a pontode romper o equilíbrio psicológico doindivíduo. Se assim não se entender,acabaremos por banalizar o danomoral, ensejando ações judiciais em

652

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

busca de indenizações pelos maistriviais aborrecimentos.(In Programa de responsabilidade

civil. 7ª Edição, Ed. Jurídica Atlas,2007, p. 80)

A exoneração do autor foiconsiderada nula, mas não importouuma conduta ilícita do réu. Não severificou um exercício abusivo dedireito, nem culpa sob quaisquer desuas modalidades: imprudência,imperícia ou negligência (artigos 186e 187, ambos do CC/2002).

A controvérsia razoável sobre aregularidade do ato afasta a ilicitudeapta a gerar o dano moral. Não sedesconsidera o sofrimento do autorcujas causas não podem seratribuídas ao réu.

A infelicidade de ser portador deenfermidade mental não guardourelação de causalidade com o trabalhoou a aceitação da exoneração. Aalegação de que se recebesse saláriomaior poderia ter permitido a cura (item22, f. 12) vai de encontro a todas asprovas dos autos, notadamente asentença de interdição e o tempodecorrido, mais de 30 anos detratamentos psiquiátricos.

Por tudo, reputo inexistir danosimateriais passíveis de serematribuídos ao réu.

5. Critérios de liquidação

Os cálculos observarão:evolução salarial conforme planilhasa serem apresentadas com o planode cargos e salários de um caixaexecutivo desde 08.10.1975; adicionalpor tempo de serviço considerando aadmissão em 24.08.1967 (f. 48); jurosde 1% ao mês, pro rata die (art. 39 daLei n. 8.177/91), a contar dadistribuição da ação (CLT, art. 883),

nos termos da Súmula n. 200 do TST.Não há valores a se compensar, poisa condenação se refere a verbas nãopagas durante o contrato. Ficaautorizada, ainda, a juntada dedocumentos na fase de liquidação deforma a permitir a exata compreensãoda evolução salarial do cargo, bemcomo benefícios da categoriadeferidos em normas coletivas.

6. Correção monetária

A correção monetária incidirásobre o débito a partir do vencimentoda obrigação, que para os salários é odia seguinte ao mês trabalhado(Súmula n. 381 do TST). Os índices sãoos previstos no artigo 39 da Lei n.8.177/91.

7. INSS e IR

Autorizo os descontosprevidenciários e fiscais. Àqueles,apurados mês-a-mês, observado o tetode contribuição e alíquotas respectivas,à exceção das seguintes parcelas:FGTS (8%) e férias acrescidas do terço.

A tributação respeitará o regimede caixa e será calculada ao final, sobreo montante da condenação, nos exatostermos da Súmula n. 368 do C. TST.

8. Honorários advocatícios

Na Justiça do Trabalho, alémdos benefícios da justiça gratuita, oshonorários por decaimento dependemda assistência sindical (Súmula n. 219do C. TST). O autor não implementounenhuma das duas condições. Rejeito.

9. Tutela antecipada

O autor requer a antecipaçãodos efeitos da tutela para que seja

653

Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.48, n.78, p.571-653, jul./dez.2008

iniciado o pagamento de saláriomensal de R$5.000,00, valor a queteria direito se estivesse aposentadopor invalidez.

Porém, não há um elementosequer que comprove, medianteatualização monetária e progressãofuncional, que esse seria o patamarremuneratório do autor.

Defiro, outrossim, a reintegraçãojurídica imediata. O réu terá 10 dias,após a publicação da sentença,independentemente do trânsito emjulgado, para proceder à reintegraçãodo autor aos seus quadros funcionais,na função de caixa executivo com salárioe adicional por tempo de serviçocompatível como se em atividadeestivesse desde 24.08.1967.

Deverá, ainda, incluí-lo na folhade pagamento no mesmo prazo,assegurando o salário do cargo que, àfalta de outra referência, será nomínimo o inicial do cargo de caixaexecutivo, conforme plano de cargos esalários.

Fixo em R$1.000,00 a multadiária por atraso nas obrigações defazer (reintegração e pagamento desalários a partir de então).

10. Valor da causa

O tempo da condenação e nívelsalarial típico do réu torna compatívelo valor de R$6.000.000,00 (seismilhões) atribuído à causa. Mantenho.

Dispositivo

Pelo exposto, julgoPROCEDENTES EM PARTE ospedidos para condenar o réu a:

I) reintegrar juridicamente oautor no mesmo cargo ocupado (caixa

executivo), com salário compatível coma evolução salarial desde a admissão(24.08.1967), além do adicional portempo de serviço;

II) condenar o réu a pagar aoautor, com juros e correção monetária,o que se fizer apurado, respeitada afundamentação, a título de:

a) salários, abonos concedidosespontaneamente ou por força denorma coletiva ou lei, adicional portempo de serviço, 13º salários, fériasacrescidas do terço e FGTS (8% -depósito em conta) de todo o período,como se em atividade estivesse, desde08.10.1975.

Custas pelo réu sobre o valorda condenação de R$2.000.000,00, noimporte de R$40.000,00.

Autorizo os descontos fiscais eprevidenciários a cargo do réu, em 10dias, nos termos da Súmula n. 368 doC. TST.

O réu terá 10 dias após apublicação da sentença,independentemente do trânsito emjulgado, para proceder à reintegraçãodo autor aos seus quadros funcionais,na função de caixa executivo comsalário e adicional por tempo deserviço compatível como se ematividade estivesse desde 24.08.1967.

Deverá, ainda, incluí-lo na folhade pagamento no mesmo prazo,assegurando o salário do cargo que, àfalta de outra referência, será nomínimo o inicial do cargo de caixaexecutivo, conforme plano de cargos esalários.

Fixo em R$1.000,00 a multadiária por atraso nas obrigações defazer (reintegração e pagamento desalários a partir de então).

Publicada em audiência. Datasupra. Cumpra-se.