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Ministério da Saúde Fundação Oswaldo Cruz FIOCRUZ Curso Impactos da Violência na Saúde Atividade Capítulo IX Estudante: Diego Mendonça Viana Turma T4/14-SPVA 05 Tutora: Cecy Dunshee de Abranches Abril de 2015

Atividade Capitulo 9 Ead Fiocruz - Diego Viana

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atividade sobre violências curso Fiocruz

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  • Ministrio da Sade

    Fundao Oswaldo Cruz FIOCRUZ

    Curso Impactos da Violncia na Sade

    Atividade Captulo IX

    Estudante:

    Diego Mendona Viana

    Turma T4/14-SPVA 05

    Tutora:

    Cecy Dunshee de Abranches

    Abril de 2015

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    Famlias que se Comunicam Atravs da Violncia.

    Consideraes Iniciais

    Di, um tapinha no di, um tapinha...1

    Em primeira instncia, importante destacar, tal como j foi discutido em

    trabalhos anteriores, que os fenmenos relativos s diversas formas de violncia so

    multifacetados e multicausais. Dito isto, alm de considerar os fatores histricos e

    sociais envolvidos em tais fenmenos, de fundamental importncia perceber que, em

    muitas famlias, as violncias esto enraizadas e naturalizadas de tal forma no cotidiano

    que no so percebidas.

    Em certa medida, este o cenrio apresentado no filme curta metragem No

    fcil, no. Prevenindo a violncia de homens e mulheres. No filme, so abordadas

    situaes que evoluem de conflituosas a episdios de agresso ou quase agresso entre o

    casal, bem como entre a famlia. A seguir, sero abordados alguns aspectos destas

    formas de violncia trazidas pelo captulo desta unidade e pelo filme utilizado como

    disparador de questionamentos.

    Desemprego, lcool e Machismo: uma combinao perigosa e com suposto nexo

    causal.

    Um dos primeiros aspectos abordados no filme acima citado consiste em retratar

    um homem em situao de desemprego e, ao mesmo tempo, uma mulher (sua esposa)

    em situao de emprego e melhor remunerada. Esta situao cria certo desconforto para

    o homem que se sente diminudo diante de uma situao em que, supostamente, ele

    deveria ser o provedor da casa.

    Nas restam dvidas de que esta uma situao bastante comum em diversas

    famlias brasileiras. Quando me refiro a situao comum, afirmo isto em virtude do

    1 Msica Um Tapinha no Di do Funk carioca, de autoria do MC Naldinho e do Dennis DJ para e

    componente do CD Furaco 2000. Esta controversa msica fez muito sucesso na primeira dcada dos anos 2000 e at hoje desperta paixes e dios de diversos movimentos sociais que discutem violncia no cotidiano familiar.

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    perfil majoritrio da formao familiar nacional ainda ser fortemente permeada por

    valores patriarcais e machistas, ainda herana dos pilares de nossa formao colonial.

    Darcy Ribeiro, em sua obra O Povo Brasileiro (1995), bem como Gilberto Freyre em

    sua obra Casa-Grande & Senzala (2003) fornecem elementos importantes para elucidar

    estes traos da formao da sociedade brasileira. A leitura de Freyre e Ribeiro deve ser

    feita guardadas as devidas propores de tempo e de conjuntura, mas essencial no

    sentido de estabelecer uma compreenso sobre a origem deste patriarca, macho alfa;

    figura social ao qual a personagem do marido do filme se cobra para ser.

    Associado ao machismo patriarcal existe a conjuntura do desemprego vivenciada

    pela personagem, associado a alguns episdios de alcoolemia e funo das condies

    duras cotidianas. No trato com a famlia, ao marido sente-se no direito de no contribuir

    com os afazeres domsticos, bem como se sente no direito de bater na esposa que o

    cobra por uma srie de questes. A apario de um garoto (espcie de aluso

    conscincia) no filme muda a trajetria do marido e o faz refletir sobre suas aes.

    Interessante notar que a sada das mulheres para o mundo do trabalho, em

    especial ps-revoluo industrial (em funo das necessidades estruturais das famlias),

    foi um golpe duro no machismo existente at os dias atuais. Outro golpe duro nesta

    mesma lgica consiste em uma mulher ser mais bem remunerada do que um homem.

    Embora os estudos realizados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID),

    data base 2009, mostrem que as mulheres ganhem 30% menos do que os homens,

    mesmo com escolaridade igual e para as mesmas funes, existem um imaginrio

    consolidado na sociedade brasileira machista (por diversas razes) de que o homem

    deve ganhar mais do que a mulher. O aumento de renda do trabalhador, contribui

    historicamente para favorecimento de processos emancipatrios ou para a reduo da

    dependncia. Em casos nos quais h conflito de gnero, este fator acima determinante

    para o aparecimento de diversas violncias, em especial se o casal ou a famlia se

    organizar nos processos de vida, sob uma lgica machista.

    Neste caldo de tenses, o alcoolismo, na maioria das situaes o fator usado

    como justificativa para as agresses e diversas violncias. Importante deixar claro que

    existem casos em que o alcoolismo um fator adoecedor no contexto da famlia e deve

    ser tratado com o devido cuidado. O que chamo ateno para o fato de no legitimar

    discursos da seguinte ordem: bati na minha mulher porque estava fora de mim, porque

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    estava embriagado. Homens e mulheres so violentos sbrios e embriagados. As

    substncias no podem e no devem virar o bode expiatrio dos processos de violncia.

    Violncia Familiar: a mais difcil tipificao de violncia existente nos territrios.

    Correlacionando os elementos acima citados com o meu cotidiano de trabalho,

    posso afirmar tranquilamente que a violncia de base familiar a mais difcil de tipificar

    e de discutir com a populao. Esta afirmao est sustentada em alguns argumentos. O

    primeiro deles consiste no fato de que existe uma multiplicidade de tipos de famlias

    nos territrios em que atuo, contudo existe uma cobrana cultural para que estas

    mesmas famlias diversas se comportem e se estruturem na lgica tradicional e nuclear

    de famlias. Reside aqui um contexto formador de convivncia comunitria violenta e

    de convivncia intrafamiliar tambm violenta na mesma proporo.

    O segundo fator consiste em boa parte das famlias dos territrios em que

    acompanho ser organizada por meio de prticas de relacionamento bastante violentas no

    trato verbal e do ponto de vista simblico. O mais assustador que, de certa maneira, as

    pessoas se acostumaram agresses no cotidiano de trabalho, na comunidade e em

    outros espaos de convivncia de tal forma que a violncia familiar uma detalhe no

    final do dia.

    O terceiro fator na tratativa da violncia familiar consiste na relao conflituosa

    de afetos vivenciados pelos integrantes. Ao analisar os dados da pesquisa Violncia

    Domstica e Familiar Contra a Mulher, vinculada secretaria da transparncia do

    Senado Federal, data base de 2013, o agressor membro do ncleo central dos

    processos de agresso. O grfico abaixo ilustrativo neste sentido:

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    Mais especificamente no territrio em que atuo, os casos mais frequentes de

    violao de direitos e de violncia expressa ocorrem contra mulheres (que possuem uma

    condio de titulares da renda da casa recebem o Bolsa Famlia) e contra as crianas e

    adolescentes. Basicamente, os conflitos de ordem conjugal giram em torno na crise

    vivenciada por boa parte dos homens em terem perdido o posto de provedor financeiro

    da famlia e no terem mais uma aceitao tcita das mulheres com as violncias antes

    praticadas. Embora haja o cenrio, ainda minoritrio, das mulheres que resistem

    violncia domstica, o cenrio predominante ainda de famlias, em especial as

    mulheres, que sofrem em silncio.

    Existe um conflito presente nos caso de violncia familiar que pode ser resumido

    na seguinte pergunta: como vou denunciar uma pessoa que amo? Este dilema (que

    tem sua importncia para o contexto de cada famlia) constitui-se um impasse para as

    polticas pblicas territoriais de sade, de assistncia social e o sistema de garantia de

    direitos.

    As sadas que temos encontrado no cotidiano tem sido no sentido de respeitar o

    tempo de cada pessoa vtima de violncia para que ela, com apoio dos servios, possa se

    fortalecer e procurar sair do contexto de violao dos seus direitos. importante

    salientar que, no acompanhamento dos casos desta natureza, embora a notificao seja

    compulsria, h que se ter cuidado com o fato de que uma denncia pode se transformar

    em um ato de violncia maior ainda para a realidade daquela famlia. As denncias

    devem ser feitas e esto sendo feitas, contudo assim deve-se proceder de forma

    inteligente e estratgica visando ao menor prejuzo da vtima.

    As aes coletivas tambm tm contribudo com a ampliao de conhecimentos

    sobre o assunto, bem como tem servido de porta de entrada dos casos nos servios. As

    aes coletivas tambm tm contribudo na formao de uma agenda positiva de

    articulao de parceiros nos territrios no sentido de melhorar a busca ativa de casos e

    melhorar a abordagem familiar.

    Consideraes Finais

    A violncia familiar, apesar de suas sutilezas, deve ser combatida

    cotidianamente. Este imperativo deve-se ao compromisso para os Direitos Humanos que

    o estado brasileiro assumiu ao assinar todos os acordos de combate s diversas formas

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    de. Alm do mais, os processos de violncia familiar contribuem para a cronificao de

    processos de adoecimento individual e coletivo.

    Apesar da dificuldade existente na identificao e no combate s diversas formas

    de violncia, necessrio no desistir de enfrentar este complexo problema. As sadas

    complexas exigem esforo e articulao de equipe para lograr xito junto populao

    atendida. No existe nada mais libertador do que perceber que, aos poucos, os processos

    cotidianos de solidariedade esto predominando sobre os de violncia com o pblico

    que acompanhamos e este um fator motivador crucial.

    Referncias

    BANCO INDERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO (BID). Pesquisa sculo

    novo: antigas disparidades. 2009. Disponvel em :

    http://idbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?docnum=2208929 Acesso em abril de

    2015.

    BRASIL. Senado Federal. Pesquisa violncia domstica e familiar contra a mulher.

    2013. Disponvel em:

    http://www.senado.gov.br/senado/datasenado/pdf/datasenado/DataSenado-Pesquisa-

    Violencia_Domestica_contra_a_Mulher_2013.pdf Acesso em abril de 2015.

    FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala: formao da famlia brasileira sob o

    regime da economia patriarcal. 48 Ed. So Paulo: Global, 2003

    RIBEIRO, Darcy. O Povo Brasileiro: A formao e o sentido de Brasil. 2 ed. So

    Paulo: Companhia das Letras, 1995.