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RSP 7 Revista do Serviço Público Brasília 64 (1): 7-29 jan/mar 2013 Igor Ferraz Fonseca, Raimer Rodrigues Rezende, Marília Silva de Oliveira e Ana Karine Pereira Audiências públicas: fatores que influenciam seu potencial de efetividade no âmbito do Poder Executivo federal Igor Ferraz Fonseca, Raimer Rodrigues Rezende, Marília Silva de Oliveira e Ana Karine Pereira Introdução Este artigo apresenta as principais conclusões de pesquisa realizada no âmbito do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que buscou responder à seguinte pergunta: “no âmbito do Poder Executivo federal, quais são os principais fatores que influenciam o potencial de efetividade das audiências públicas como mecanismo de participação social no processo de gestão das políticas públicas?”. O estudo se estrutura a partir do conceito de pesquisa aplicada, tendo como foco a melhoria do processo de organização e gestão de audiências públicas (AP). A pesquisa teve a duração de um ano e contou com análise bibliográfica, entrevistas com gestores públicos e profissionais atuantes em organizações não governamentais, além de quatro estudos de caso de audiências públicas realizadas por órgãos do governo federal: a elaboração do Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS); a discussão sobre as minutas do Edital de Licitação e Contrato de Permissão dos Serviços de Transporte Rodoviário Interestadual de Passageiros

Audiências públicas: fatores que influenciam seu potencial ... · PDF fileO estudo se estrutura a partir do conceito de pesquisa aplicada, ... (AP). A seção Metodologia da Pesquisa

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7Revista do Serviço Público Brasília 64 (1): 7-29 jan/mar 2013

Igor Ferraz Fonseca, Raimer Rodrigues Rezende, Marília Silva de Oliveira e Ana Karine Pereira

Audiências públicas: fatoresque influenciam seu potencial de

efetividade no âmbito do PoderExecutivo federal

Igor Ferraz Fonseca, Raimer Rodrigues Rezende,Marília Silva de Oliveira e Ana Karine Pereira

Introdução

Este artigo apresenta as principais conclusões de pesquisa realizada no âmbito

do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que buscou responder à

seguinte pergunta: “no âmbito do Poder Executivo federal, quais são os principais

fatores que influenciam o potencial de efetividade das audiências públicas como

mecanismo de participação social no processo de gestão das políticas públicas?”.

O estudo se estrutura a partir do conceito de pesquisa aplicada, tendo como

foco a melhoria do processo de organização e gestão de audiências públicas

(AP). A pesquisa teve a duração de um ano e contou com análise bibliográfica,

entrevistas com gestores públicos e profissionais atuantes em organizações não

governamentais, além de quatro estudos de caso de audiências públicas realizadas

por órgãos do governo federal: a elaboração do Plano Nacional de Resíduos

Sólidos (PNRS); a discussão sobre as minutas do Edital de Licitação e Contrato

de Permissão dos Serviços de Transporte Rodoviário Interestadual de Passageiros

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e o licenciamento ambiental de doisgrandes projetos de hidrelétricas – SantoAntônio e Jirau, em Rondônia, e BeloMonte, no Pará. Este artigo está divididoconforme as seguintes seções:

A seção Qualidade da participaçãoapresenta um referencial teórico relacio-nado à avaliação de processos participa-tivos. Embora seja um tema bastante atualna literatura especializada, não háconsenso sobre como realizar uma ava-liação objetiva sobre a efetividade de pro-cessos participativos, entre eles as audiên-cias públicas. No entanto, a literaturaconverge quando aponta que focar namelhoria do desenho institucional dasaudiências públicas e na busca pela efi-ciência e democratização dos mecanismosinternos de coordenação e de participaçãosão iniciativas fundamentais para ampliara efetividade desses espaços.

Uma das dificuldades encontradas napresente pesquisa esteve relacionada àescassez de estudos sobre audiênciaspúblicas. Diferentemente de outros instru-mentos participativos (tais como conselhose conferências de políticas públicas), abibliografia sobre audiências públicas érarefeita, carecendo de uma sistematizaçãode seus atributos básicos. Assim, na tenta-tiva de suprir essa lacuna e também defornecer a base para as demais etapasdessas pesquisas, realizamos um esforçofocado na definição dos atributos básicosdeste mecanismo de participação social.Esse esforço é apresentado na seção Defi-nição de audiência pública (AP).

A seção Metodologia da Pesquisaapresenta a metodologia empregada napesquisa, que foca em metodologia depesquisa qualitativa. A seção Estudo de caso,por sua vez, apresenta breve contextuali-zação dos quatro estudos de caso. Por fim,a seção Resultados e Discussão apresenta os

principais resultados e conclusões dapesquisa. Tais resultados são apresentadose discutidos a partir dos elementosempíricos observados na análise dosestudos de caso.

Qualidade da participação

Após um processo de grande expansãoe diversificação ancorada nas inovaçõesinstitucionais promovidas pela Consti-tuição Federal de 1988, o Brasil conta comum leque de processos participativos – quepromovem a interface entre Estado e socie-dade – institucionalizados no âmbito dogoverno federal, compreendendo mais de90% dos programas e políticas públicasnacionais (PIRES & VAZ, 2010).

Com relação a essas instituiçõesparticipativas, há diversos estudos sobreconselhos e conferências nacionais (ver,p. ex., FONSECA et al., 2012; ALENCAR et al.,2012; SOUZA, 2012; AVRITZER, 2012;POGREBINSCHI, 2012). Já as audiênciaspúblicas continuam sendo pouco estu-dadas, apesar de sua alta frequência empolíticas de infraestrutura e de regulaçãodo setor privado, a exemplo dolicenciamento ambiental e de processoscoordenados por agências reguladoras.

A ampliação desses estudos tem cadavez mais priorizado a questão da efetividade(IPEA, 2011; AVRITZER, 2010). O diagnósti-co é que há dúvidas se os processosparticipativos estão de fato ampliando osprocessos democráticos (CLEAVER, 2001,2005; KOTHARI, 2001; SAYAGO, 2007;MANOR, 2004; FUKS & PERISSINOTTO, 2006)e contribuindo para o aperfeiçoamento depolíticas públicas. No entanto, averiguar emensurar a efetividade de espaçosparticipativos é tarefa complexa e nãoencontra consenso na literatura especializada(PIRES et al., 2011).

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Diante disso, autores como Pires et al.(2011) apontam que os estudos que anali-sam a qualidade de processos participativospodem identificar fatores fortemente rela-cionados com a efetividade. A qualidadede processos participativos está relacionadacom o desenho institucional dos meca-nismos de participação social; com asregras e normas que condicionam seufuncionamento; com a atuação e recursosmobilizados por governo e sociedade; pelamanifestação de relações de poder; entreoutros.

A premissa é que, mesmo sem um con-senso sobre como mensurar a efetividadede instituições participativas, ações con-cretas visando a aperfeiçoar o desenho, asregras e o processo democrático no interiordesses mecanismos participativos contri-buem tanto para ampliar sua efetividade –no que se refere ao aperfeiçoamento depolíticas públicas – quanto para ampliar alegitimidade desses espaços de interaçãoentre Estado e sociedade, implicando umanova forma de processo decisório naspolíticas públicas (PIRES et al., 2011).

Dessa forma, esta pesquisa pretendecontribuir para o alcance de políticaspúblicas mais legítimas e efetivas, por meioda identificação de fatores que contribuempara a ampliação da qualidade do processoparticipativo em audiências públicas.

Definição de audiência pública (AP)

Não há consenso em relação a umadefinição de audiência pública na literaturasobre participação social e tampouco naspolíticas e ações realizadas pelo PoderExecutivo federal.

As fontes utilizadas nesta pesquisa paradefinir audiência pública, delimitando, assim,o objeto de estudo, incluem sistematizaçãoda literatura disponível sobre o assunto,

entrevistas com burocratas do governofederal e representantes da sociedade civilcom grande experiência em AP, além deanálise dos dados sobre audiências públicascontidos no Sistema de InformaçõesGerenciais de Planejamento do GovernoFederal (SIGPlan), do Ministério do Plane-jamento, Orçamento e Gestão1.

Entre os resultados, identificou-se queas audiências públicas têm caráter consul-tivo e não deliberativo (SOARES, 2002;

VASCONCELOS, 2000). Nas AP, o governofederal tem maior discricionariedade doque em outros fóruns participativos, taiscomo em conselhos deliberativos. Assim,além de gerar transparência sobre os atosgovernamentais, uma AP visa também acolher opiniões e propostas da população.Cabe, entretanto, à administração acatar ounão as propostas.

“... em muitos

casos, a

legislação está

ultrapassada ou

é omissa ou

insuficiente

em relação à

realização

de audiências

públicas.”

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Além disso, as AP têm caráter pontual.Diversas instituições participativas, como osconselhos gestores, são perenes, com atri-buições permanentes relacionadas a uma áreade política pública. A existência de um conse-lho não está vinculada a uma ação governa-mental específica, pois promove a articulaçãopermanente entre Estado e sociedade civil.Ao contrário, as AP são invariavelmentevinculadas a um processo decisório especí-fico, seja ele a elaboração de um plano, aelaboração de normas regulatórias, a avaliaçãode uma ação governamental ou mesmo a cor-reção de rumos nas políticas públicas. Outracaracterística é o caráter presencial das AP,que não podem ser realizadas pela internet oupor intercâmbio documental (SOARES, 2002;MATTOS, 2004; GRAU, 2011). O caráterpresencial da audiência pública está relacio-nado à possibilidade de manifestação oral dosparticipantes, não excluindo, entretanto, apossibilidade de manifestação por escrito(SOARES, 2002; GRAU, 2010). Além disso, oideal é que se propicie o debate entre os atoresinteressados (SOARES, 2002; GRAU, 2010;BARROS & RAVENA, 2011; SERAFIM, 2007).Esse último ponto aproxima as AP de outrosfóruns participativos, tais como os conselhosgestores, o orçamento participativo e asconferências de políticas. Ao mesmo tempo,essa característica distancia as AP de outrasformas “individualizadas” de interface entreEstado e sociedade civil, tais como as con-sultas públicas e as ouvidorias. Ressalta-seque, embora seja possível a participação deatores individuais, a audiência pública temcaráter coletivo e não pode excluir atores nãoorganizados do processo participativo. Assim,uma AP é aberta a todos os interessados. Apossibilidade de manifestação de interessese opiniões de cidadãos não organizados é umadiferença clara entre a AP e espaços de parti-cipação com caráter formalmente represen-tativo – como os conselhos e as conferências.

Além disso, as AP possuem regrasespecíficas para o seu funcionamento,como procedimentos formais e orientaçõesmetodológicas, tais como data e hora defi-nidas, pauta, atas de reunião, determinaçãode gravação em vídeo e/ou de voz dos de-bates (SOARES, 2002; MATTOS, 2004). Hátambém regras relacionadas à condução dodebate, tais como a determinação de quaisatores têm a palavra, quanto tempo de falatem cada participante, se haverá réplicas,tréplicas, entre outras. Por fim, há regrasque visam a orientar a sistematização daopinião dos atores e a incorporação de suasdemandas na política ou na ação com aqual a AP está relacionada.

A partir do exposto acima, estapesquisa adotou uma definição deaudiência pública composta das caracte-rísticas elencadas no Quadro 1.

Metodologia da pesquisa

Esta pesquisa ocorreu entre dezembrode 2011 e dezembro de 2012, utilizando asseguintes fontes de dados: levantamentobibliográfico sobre participação social e sobreaudiências públicas; sistematização das princi-pais leis e demais atos normativos que tratamde audiências públicas; análise dos registrosde realização de audiências públicas noâmbito dos programas do governo federal,disponíveis em banco de dados do SIGPlan;e realização de quatro estudos de caso. Foifeito o acompanhamento das AP que ocor-reram durante o período da pesquisa2. Nocaso das AP que já haviam ocorrido3, foi feitauma análise das gravações de áudio e/ouvídeo. Todos os casos contaram com análisedocumental, bem como entrevistas comparticipantes e organizadores. Para a seleçãodos casos, além dos critérios relacionados àsua relevância e à viabilidade, optou-se poruma estratégia dupla. Por um lado, foram

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escolhidos casos que representassem a maiordiversidade possível, por outro lado, foramescolhidos dois casos relativamente seme-lhantes, ambos de licenciamento ambientalde grandes empreendimentos, que corres-pondem ao padrão mais frequente de utili-zação de audiências públicas pelo governofederal (ver IPEA, 2012).

A metodologia utilizada nos estudosde caso foi baseada em dois conjuntos dedimensões de análise (ver Quadro 2). Asdimensões que caracterizam o processo serelacionam à análise da qualidade do pro-cesso de planejamento e condução dasaudiências públicas, buscando identificaros principais fatores que influenciam seupotencial de efetividade e, portanto, ascausas de sucessos e insucessos. As dimen-sões para a análise do resultado levam emconta os objetivos desse mecanismo departicipação social e têm por funçãoorientar a avaliação da efetividade de deter-minada audiência pública, ou seja, seuimpacto na sociedade.

Por meio da lista de dimensões,objetivou-se também criar uma referênciapara gestores ou pesquisadores interessadosem analisar outros processos, tendo em vistaa possibilidade de adaptá-la de acordo com

os objetivos e possibilidades de cada pesquisa.Por essa razão, foram incluídas tambémdimensões que não teriam como ser anali-sadas com profundidade nos estudos de casoda presente pesquisa, devido a seus objetivose limites de escopo e tempo.

Estudos de caso4

Elaboração do Plano Nacional de

Resíduos Sólidos (PNRS)

A Política Nacional de ResíduosSólidos, criada pela Lei no 12.305/2010,estabeleceu o Plano Nacional de ResíduosSólidos (PNRS) como um de seus principaisinstrumentos de gestão. Essa lei,regulamentada pelo Decreto no 7.404/2010,instituiu o Comitê Interministerial (CI), com-posto por 12 ministérios, responsável pelaelaboração, coordenação e implementaçãodo PNRS, com a coordenação do Minis-tério do Meio Ambiente (MMA). Umaprimeira versão do PNRS foi elaborada apartir do diagnóstico da situação dos resí-duos sólidos, cenários, metas, diretrizes eestratégias para o cumprimento das metas5

(BRASIL , 2011). Essa versão, comoestabelecida em lei, foi submetida ao debatecom a sociedade civil por meio de cinco

Quadro 1: Definição de audiência pública

Características básicas das

audiências públicas

Possui caráter consultivo.

Possui caráter pontual.

Possui caráter presencial.

Possui caráter coletivo.

Pressupõe manifestação oral dos participantes.

Implica debate entre os atores envolvidos.

É aberta a todos os interessados.

Contém regras específicas para o seu funcionamento.

Fonte: Elaboração própria.

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audiências públicas regionais e uma nacio-nal, nas quais os participantes puderamfazer emendas e sugestões ao texto. Essasaudiências ocorreram entre setembro edezembro de 2011.

O MMA coordenou o processo deinterlocução com estados e sociedade paraa realização das AP, com a colaboraçãode representantes de outros ministériosque compõem o Comitê Interministerial.Foi utilizada uma metodologia comum emtodas as AP, de forma que pudessempadronizar o trabalho e as formas decontribuição. Os pesquisadores do Ipeaacompanharam todas as seis audiênciasrealizadas pelo MMA, bem como proce-deram à análise documental e realizaçãode entrevistas com organizadores e parti-cipantes.

Licitação e Contrato de Permissão

dos Serviços de Transporte Rodoviário

Interestadual de Passageiros

Foram estudados dois processos deaudiência pública: 1) a audiência públicano 120/2011, que colocou em discussão oplano de outorga6 sobre os serviços detransporte rodoviário interestadual depassageiros, operados por ônibus do tiporodoviário; 2) a audiência pública no 121/2011, que teve como objetivo coletarcontribuições sobre as Minutas do Editalde Licitação e Contrato de Permissão dosServiços de Transporte Rodoviário Inte-restadual de Passageiros, da Agência Nacio-nal de Transportes Terrestres (ANTT).

Esses dois processos de audiênciaspúblicas se desdobraram em sessõespúblicas em diferentes cidades, as quais

Quadro 2: Dimensões de análise

Dimensões que caracterizam o processo

• Atos normativos e seus impactos no processo

• Mapeamento dos principais atores

• Características relevantes do responsável pelas AP

• Desenho e processo de realização das AP

• Momento da participação e timing do processo

• Escopo e amplitude do debate

• Mobilização e representatividade dos participantes

• Recursos (inclusive humanos) e infraestrutura disponibilizados, e organização do evento

• Processo preparatório para as AP

• Condução da AP, metodologia e efetividade das regras procedimentais

• Sistematização das propostas e devolutiva

• Transparência

Dimensões de resultado

• Impacto na tomada de decisão e em compromissos políticos

• Mediação: diminuição de conflitos e aumento da cooperação

• Construção de capacidades (capacity building)

• Divulgação das ações governamentais

Fonte: Elaboração própria.

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seguiram rigorosamente as mesmas regrase não houve diferença entre as audiências,a não ser o lugar onde foram realizadas.

Pesquisadores do Ipea acompanharampresencialmente as sessões públicas queestavam em andamento, vinculadas à AP121/2011, realizadas entre janeiro e marçode 2012. Além disso, foram analisadas asatas das sessões públicas vinculadas àAP 120/2011, que aconteceram entreagosto e outubro de 2011. Foram realiza-das entrevistas com organizadores eparticipantes.

Licenciamento das hidrelétricas de

Santo Antônio e Jirau, em Rondônia

Este estudo de caso analisou asaudiências públicas realizadas, em 2006,no âmbito do licenciamento ambiental dasusinas hidrelétricas de Santo Antônio eJirau, no Estado de Rondônia, iniciado em2003. Este estudo de caso utilizou,em primeiro lugar, informações coletadasem 2009, por ocasião de uma pesquisa demestrado sobre o processo de licencia-mento em questão (REZENDE, 2009). Paraa presente pesquisa, foi feito novo estudobibliográfico e trabalho de campo emPorto Velho (RO) e em Brasília (DF), comentrevistas, análise das gravações de áudioe vídeo das AP e nova análise dos autosdo processo de licenciamento. Ao todo,foram entrevistadas 51 pessoas dogoverno, da sociedade civil e do setorprivado. Além da análise dos autos doprocesso, foram analisados tambémdiversos outros documentos (relatórios doMinistério Público, da Fundação Nacio-nal do Índio –Funai – etc.).

As barragens de Santo Antônio e Jirauformam, juntas, um dos maiores projetosde geração de energia elétrica na Amazô-nia e teriam uma potência instalada de6.450 MW (3.150 MW em Santo Antônio

e 3.300 MW em Jirau). Ambas as usinasestavam sendo construídas no momentodesta pesquisa, no Rio Madeira, no Muni-cípio de Porto Velho, capital do Estado deRondônia. O Rio Madeira é o segundomaior rio da Bacia Amazônica e o princi-pal tributário do Rio Amazonas. Sua baciainclui também territórios da Bolívia e doPeru e é uma das áreas mais ricas embiodiversidade do mundo (ORTIZ, 2007).Além disso, a construção das usinas de

Santo Antônio e Jirau foi considerada umaprioridade estratégica para o governo fe-deral e, por isso, foi incluída no Programade Aceleração do Crescimento (PAC) comoum dos seus principais projetos.

Após um longo processo marcado porprotestos da sociedade civil e processosjudiciais visando a suspender o processo delicenciamento ambiental (que contempla a

“Um elemento

que pode ampliar

o potencial de

efetividade de

uma audiência

pública é a

existência, no

órgão público

responsável, de

uma estrutura

interna voltada à

participação

social.”

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realização de audiências públicas), as APaconteceram em novembro de 2006, nosmunicípios de Jacy-Paraná, Porto Velho,Abunã e Mutum-Paraná, com, respecti-vamente, 800, 1100, 404 e 669 participantes.

Licenciamento da hidrelétrica de

Belo Monte, no Pará

A usina de Belo Monte está sendoconstruída no Estado do Pará, no RioXingu, um dos principais afluentes do RioAmazonas, próximo à cidade de Altamirae à rodovia federal Transamazônica (BR-230), numa região caracterizada pela exis-tência de grande quantidade de florestanativa, pecuária e agricultura (SOUZA &REID, 2010). A responsável pela construçãoda usina é a Norte Energia S.A, compostapor empresas estatais e privadas do setorelétrico.

Apesar de ser um projeto antigo emultifacetado, este estudo se limitou àanálise do processo de participação socialcoordenado pelo Ibama como parte dolicenciamento ambiental, iniciado em20067.

As primeiras audiências relacionadasao licenciamento do empreendimento deBelo Monte datam de agosto de 2007, reali-zadas com o objetivo principal de obterinformações para o termo de referência doEstudo de Impacto Ambiental (EIA) a serfeito. No entanto, essas audiências sãoconsideradas pelo Ibama como informais,porque não têm caráter obrigatório, já quea resolução no 9/87 do Conama somenteprevê AP após a conclusão do EIA, parasua avaliação.

Além dessas AP informais, o processoparticipativo que antecedeu as audiênciaspúblicas obrigatórias incluiu, em 2009,reuniões em 12 comunidades indígenas,coordenadas pela Funai e com a colabo-ração do Ibama.

Por fim, em novembro de 2009,ocorreram quatro audiências públicas nosmunicípios de Brasil Novo, Vitória doXingu, Altamira e Belém. Essas audiênciasconstituíram o foco desta pesquisa porserem, ao contrário dos eventos que asantecederam, consideradas audiênciasformais e obrigatórias, de acordo com aResolução no 9/87 do Conama.

A metodologia utilizada neste estudode caso incluiu múltiplas fontes. Foi feitauma revisão bibliográfica com o objetivode obter informações sobre o histórico doprocesso, os atores e interesses envolvidose as alterações no projeto inicial da usina.Em seguida, foram estudados os autos doprocesso de licenciamento ambiental.Foram realizadas entrevistas qualitativas,em Altamira, com atores que estiveram pre-sentes nas audiências e que têm tido umaatuação ativa no processo decisório de BeloMonte; em Brasília, com funcionários doIbama envolvidos no licenciamento da obrae que estiveram presentes nas audiências.Além disso, foram assistidas as gravaçõesdas quatro audiências formais.

Resultados e discussão

Nesta seção, são apresentados osprincipais resultados e conclusões destapesquisa. O formato de apresentação segueas dimensões de análise que orientaram apesquisa8 e foca em como determinadosfatores e características podem influenciar– positivamente ou negativamente – opotencial de efetividade de uma audiênciapública. Tais análises foram baseadas nosestudos de caso realizados nesta pesquisae se utilizam de ilustrações retiradas deles.Apesar de não serem passíveis de genera-lização, tais resultados são úteis paragestores públicos envolvidos na organi-zação de processos participativos e para

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estudiosos interessados em aprofundar oconhecimento de um campo de pesquisaainda pouco explorado.

Atos normativos

Previsões em atos normativos arespeito da realização de AP podem, porum lado, garantir as condições mínimasnecessárias para a efetividade da partici-pação, mas podem também, por outrolado, engessar o processo, limitando a açãodos gestores.

O mapeamento que realizamos da utili-zação de audiências públicas no âmbito dogoverno federal evidenciou que grande partedelas ocorre em observância a atosnormativos. Como consequência, em umgrande número de casos, previsões em leis,decretos, resoluções, instruções normativase/ou portarias determinam, mesmo que emparte, como as audiências devem ser reali-zadas, tendo impactos diversos no seupotencial de efetividade. Nesse sentido, asprevisões normativas podem contribuir paraaumentar a transparência do processoparticipativo, ao garantir o acesso aosdocumentos relevantes e demais infor-mações importantes e ao apresentar deforma clara prazos e regras para a manifes-tação. Tais atos normativos também podemaumentar o potencial de efetividade daaudiência, ao estipular uma metodologia aser utilizada, que contribua para uma maiorparticipação, ao mesmo tempo em quepermita a sistematização das contribuiçõese exija uma devolutiva do órgão gover-namental para a sociedade que explicitequais contribuições foram aceitas, quais nãoe por quê.

Concluímos que, em muitos casos, alegislação está ultrapassada ou é omissa ouinsuficiente em relação à realização de au-diências públicas. Nos casos estudados delicenciamento ambiental, observou-se que

a legislação vigente está ultrapassada e teveimpacto negativo na efetividade da parti-cipação. As tentativas do Ibama de fazermais do que a legislação exige – porexemplo, realizando reuniões públicas paradiscutir o termo de referência do Estudode Impacto Ambiental – evidenciam essadeficiência normativa. As resoluções doConselho Nacional de Meio Ambiente(Conama) somente preveem a obrigatorie-dade de realização de audiências públicaspara licenciamento ambiental no momentode avaliação do Estudo de ImpactoAmbiental. Em relação a comunidadesindígenas e povos tradicionais, no caso deempreendimentos que tenham impacto emseus territórios ou modo de vida, valeressaltar que o Brasil ratificou a Convenção169 da Organização Internacional doTrabalho, a qual prevê a consulta préviaaos povos indígenas e tribais. No entanto,até o momento desta pesquisa, o meca-nismo de consulta prévia ainda não haviasido devidamente regulamentado9. Osestudos de caso de hidrelétricas apontamque audiências públicas anteriores à reali-zação do EIA podem ser úteis para que asociedade possa contribuir na definição dequais temas são importantes de seremestudados. Além disso, audiências públicasno momento de planejamento dosempreendimentos, bem como audiênciascom foco em públicos específicos – comoindígenas, quilombolas e ribeirinhos –podem ser necessárias para ampliar ainclusão social e garantir a expressão detodas as opiniões e interesses envolvidosna questão.

Um exemplo positivo é o das audiên-cias realizadas pela Agência Nacional deTransportes Terrestres (ANTT), as quaisseguem regras procedimentais expressasem documentos públicos que disciplinamo processo de participação e o controle

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social. Para os servidores da agência, háainda um manual interno que orienta suasações sobre o processo participativo. Aatenção a essas normas amplia o potencialde efetividade ao aumentar a transparênciado processo e indicar as etapas a seremseguidas. É importante ressaltar, contudo,que os atos normativos devem permitircerta flexibilidade para que seja possívelcorrigir problemas identificados naaudiência pública, permitindo o aprendi-zado e aperfeiçoamento.

Por último, é importante que o prazopara a realização das audiências, contidonos atos normativos, seja compatível coma complexidade da temática e com o graude organização e peculiaridades do público-alvo. Essas características podem serilustradas pelo caso das audiências deelaboração do Plano Nacional de ResíduosSólidos. O Decreto no 7.404/2010 deter-minava o prazo de 180 dias para a elabo-ração do referido plano. Dentro desses 180dias, deveriam ser realizados todos osestudos técnicos necessários; a organizaçãoe mobilização para, no mínimo, cincoaudiências públicas regionais e umaaudiência pública nacional; consultapública via internet; e a sistematização dascontribuições da sociedade e o prazo paraa elaboração e publicação da versãopreliminar do plano. A necessidade de cele-ridade dificultou as atividades de mobili-zação, divulgação prévia de documentos esistematização das contribuições sociais.

Momento de realização das audiên-

cias públicas

É fundamental atentar para o momen-to do ciclo de política pública em que asaudiências públicas ocorrem, tendo em vistaque a AP foca em um processo decisórioespecífico, tendo caráter pontual e nãopermanente. Por um lado, o processo

participativo deve ocorrer em um momentono qual ainda seja possível incorporardemandas e valores dos atores envolvidosna temática. Isso pode envolver eventospreparatórios ao processo de audiênciapública, no sentido de incluir atores antesexcluídos do processo decisório e nivelarconhecimento entre os participantes. Poroutro lado, se a AP é realizada em ummomento muito inicial do ciclo de política,pode ser que informações necessárias parauma participação informada ainda nãoestejam disponíveis ou que não haja temposuficiente para a devida mobilização daspartes interessadas e difusão de conheci-mento sobre o assunto. Uma solução porvezes sugerida seria a realização de diversasAP em momentos estratégicos do ciclo depolítica.

Nos estudos de caso de licenciamentoambiental, foi patente a insatisfação derepresentantes da sociedade civil quantoao momento de realização das audiências.Nesses casos, as audiências públicasformais (de caráter obrigatório) ocorreramseguindo as resoluções do Conama,somente após a publicação do EIA e seurespectivo Relatório de Impacto do MeioAmbiente (EIA-Rima). Nesse momento,decisões importantes já haviam sidotomadas, tais como a definição dos temasa serem analisados no EIA. Além disso,deficiência na participação social emmomentos anteriores ao licenciamento trazpara os debates do licenciamento temasfora do seu escopo, que deveriam ter sidoamplamente discutidos anteriormente,como a escolha do local para o empreen-dimento e a definição das principais carac-terísticas do projeto.

Em ambos os casos de licenciamentoestudados, houve processos preparatóriospara as AP que visaram a incluir popula-ções ribeirinhas e/ou indígenas. Entretanto,

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eles foram muito criticados pela sociedadecivil. No caso de Santo Antônio e Jirau, oprocesso prévio foi criticado por incluirsomente comunidades ribeirinhas, excluin-do outras populações tradicionais, e por tertido um início muito tardio. Tanto no casode Santo Antônio/Jirau quanto no caso deBelo Monte, faltou uma conexão clara entreessas reuniões com populações tradicionaise as audiências públicas formais. No pri-meiro caso, houve uma sistematização dasdemandas, mas que, no entanto, não foidiscutida nas AP e a qual foi criticada porparecer uma lista de desejos (wish list). Nosegundo caso, não houve sistematização.Apesar das falhas, esses processos contri-buíram, mesmo que de maneira limitada,para a inclusão, no debate, das populaçõesafetadas, evidenciando a necessidade de suaocorrência. Nesse sentido, ficou claro quea regulamentação da participação social emum momento anterior às AP atualmenteprevistas como obrigatórias pode ter umimpacto positivo.

No caso do processo de elaboração doPNRS, por sua vez, há razões para crer queas audiências foram realizadas em momentoideal. Se, por um lado, já havia um substratolegal que determinava a elaboração do plano,bem como um texto preliminar para a con-sulta da sociedade civil, por outro, a parti-cipação ocorreu em um momento deplanejamento da política, em que foramdiscutidas diretrizes, ações e metas que iriamcompor a política pública. Essa abertura porparte do governo para permitir o acesso adecisões-chave da política aumentou aschances de cooperação entre governo esociedade civil, potencializando a efetividadedas audiências.

O caso da ANTT ilustra outra facetada temporalidade na realização dasaudiências. A audiência pública no 121/201110, cujo objetivo era complementar ao

da AP 120/201111, ocorreu em um momen-to em que o relatório final de sistematizaçãodas contribuições da audiência públicaanterior ainda não havia sido publicado. AANTT realizou a audiência no 121/2011 emum momento em que havia questõespendentes do processo anterior. Isso preju-dicou a percepção dos participantes emrelação à legitimidade da segunda audiência,minorando seu potencial de efetividade.

É importante lembrar que audiênciaspúblicas são eventos pontuais e seu obje-tivo deve ser compatível com essa carac-terística. Portanto, diversas políticaspúblicas demandam outros instrumentosparticipativos em vez de audiênciaspúblicas e, em determinados casos, outrosmecanismos de participação podemser utilizados em complementação às

“Apesar de

ser um elemento-

chave para a

efetividade,

a interface com

a sociedade

no momento

posterior à

audiência pública

é, em diversos

casos, relegada

a segundo plano ...”

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audiências. Existe uma relação dinâmica en-tre os diversos instrumentos, variando, decaso a caso, o mecanismo mais adequadoou a melhor combinação deles. A dependerda temática e da fase do ciclo de políticapública, outros instrumentos, tais como con-ferências setoriais, conselhos e/ou consultaspúblicas, podem ser utilizados.

Escopo das audiências públicas

Por escopo de uma audiência, enten-demos o recorte do objeto e a temática queserá discutida e que definirá seu perfil. Oescopo de uma audiência pública deve serdefinido com cuidado para que os interes-sados tenham a possibilidade de opinar emrelação aos temas que consideram impor-tantes, mas também para que o(a) gestor(a)possa sistematizar as contribuições dosparticipantes de forma compatível com oobjeto da audiência.

Por um lado, foi observado que aexcessiva limitação do escopo pode levar auma menor valoração do processoparticipativo pelas partes interessadas e,consequentemente, a uma menor percep-ção da legitimidade da política em questão.Por outro lado, quanto mais amplo oescopo da participação, mais difícil tendea ser a coordenação do debate e a sistema-tização das propostas de uma maneiratrabalhável, para que sejam analisadas pelosgestores públicos e, eventualmente, incor-poradas na política.

Os casos das hidrelétricas estudadasrefletem bem essa questão. Essesprocessos foram negativamente impac-tados pela falta de participação popularem momentos prévios de planejamentoda política e definição de diretrizes e pelafalta de definição clara do escopo das AP.Assim, no momento de realização dasaudiências, questões como, por exemplo,a insatisfação com o modelo energético

nacional e com os modelos de desenvol-vimento regionais estiveram muito presen-tes no debate. No entanto, tais temas nãopertencem ao escopo de uma audiênciade licenciamento ambiental, que foca nospotenciais impactos específicos de umaobra de infraestrutura e sua viabilidadesocioambiental.

Ao mesmo tempo em que a limitaçãodo escopo do debate pode reduzir apercepção de legitimidade da audiênciaperante a sociedade, a qual pode ficarinsatisfeita por não perceber eco por partedos gestores governamentais aos seusanseios, um escopo demasiado amplo podefazer com que as contribuições da socie-dade sejam dispersas, fragmentadas e comgrau de abrangência que vai além do que épossível ser alterado naquela fase da polí-tica. Torna-se difícil sistematizar as contri-buições recebidas e menores são as chancesde que a política em questão seja reformu-lada conforme as contribuições.

É fundamental, portanto, que o escopode uma audiência seja definido a partir desua temporalidade e adequação à política eque esse esteja claro desde o início tantopara os gestores quanto para as partesinteressadas.

Infraestrutura adequada

Prover infraestrutura adequada aonúmero de participantes e ao tipo deaudiência é fator essencial para que oevento tenha uma participação socialefetiva. Na comparação entre os casosestudados, esse fator esteve associado auma maior percepção de abertura, serie-dade e comprometimento, por parte dopúblico presente, em relação ao governo.

Recursos e infraestrutura disponibili-zados – lugar de fácil acesso, espaço comcapacidade para acolher os participantes,com equipe técnica capacitada e adequada

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para conduzir os trabalhos – são elementosque contribuem para a efetividade da parti-cipação.

Os casos das AP de licenciamentoambiental mostram que, por vezes, foramutilizados auditórios com tamanho avaliadopelo público presente como insuficientepara acomodar o grande número depessoas, motivando comentários por parteda sociedade civil de que o governo nãoqueria a presença de todos; em outro caso,os participantes afirmaram que o localescolhido tinha uma acústica ruim e que obarulho excessivo prejudicou a concen-tração e interação entre os participantes.Há relatos, no caso de Belo Monte, de queo transporte fornecido para garantir apresença de comunidades isoladas noevento foi deficitário. Nesses e em outroscasos, a maior dificuldade relatada pelosgestores foi a de prever a quantidade departicipantes, já que não havia inscriçãoprévia. A participação nos dois casos delicenciamento estudados foi significativa,algumas vezes chegando a mais de milpessoas por audiência.

Já a infraestrutura das audiências doPNRS variou muito conforme a região,sendo em geral bastante satisfatória. Noentanto, um caso merece destaque, pordemonstrar outro elemento importante eque vai além da simples adequação físicadas instalações destinadas a abrigar o evento.Em São Paulo, o local escolhido para arealização da audiência foi a sede da Fede-ração das Indústrias do Estado de SãoPaulo (Fiesp). Embora esse local fosse idealpara realizar as audiências em termosfísicos, não o era em termos simbólicos. AFiesp é uma tradicional representante deum dos principais grupos de interesseenvolvidos na questão dos resíduos sólidos:a indústria. Esse fato gerou um sentimento,por parte dos catadores de materiais

recicláveis (outro dos principais grupos deinteresse na temática, cuja posição tinhapontos importantes de divergência com osinteresses da indústria), de que eles nãoeram bem-vindos na audiência. Assim,concluiu-se que é importante identificarnão somente obstáculos relativos à estru-tura física, mas também sensibilidadespolíticas na escolha do local de realizaçãodo evento.

Capacidade institucional do órgão

público responsável

Um elemento que pode ampliar opotencial de efetividade de uma audiênciapública é a existência, no órgão públicoresponsável, de uma estrutura internavoltada à participação social. Isso implicacontar com documentos de referência,instalações e servidores capacitadosresponsáveis pela realização das AP.

Um exemplo vem dos casos delicenciamento ambiental. A falta de pessoalespecializado em participação social, desta-cado para as audiências públicas no Ibama,pode ter prejudicado a efetividade daparticipação, já que os próprios servidoresresponsáveis pelas análises técnicas doEIA, entre outras funções, eram incum-bidos de lidar também com a interface coma sociedade. Por exemplo, eles tiveramdificuldade em analisar os muitos docu-mentos protocolados por organizações dasociedade civil. Além disso, segundopesquisa do Banco Mundial (WORLD BANK,2008), no Ibama são raros os profissionaiscom formação em ciências humanas ousociais, o que pode indicar, no geral, umbaixo preparo de seu corpo de servidorespara lidar com demandas da sociedade.Deve-se admitir que o órgão investe nacapacitação de seus servidores em relaçãoà participação social, à mediação deconflitos etc. Mas a efetividade da

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capacitação eventual de funcionários jásobrecarregados com outras tarefas tendea ser inferior à de uma equipe de especia-listas destacada para as funções relacio-nadas à participação.

É importante que as pessoas respon-sáveis pela participação social tenhambom conhecimento dos regulamentos edos procedimentos internos relacionadosao tema, mas também que tenham capaci-dade de lidar com as contribuições dasociedade. Além disso, perícias relacio-nadas à mediação de conflitos e ao diálogosocial são fundamentais para que o pro-cesso participativo promova o diálogo –e não a polarização – entre governo esociedade.

Em casos em que há falta de pessoale demais elementos de estrutura internapara a participação social, uma estratégiapara compensar essa deficiência édescentralizar e compartilhar o processode organização das audiências. O caso doPNRS mostra, por exemplo, que houveganhos de qualidade no processo porqueo Ministério do Meio Ambiente realizouas audiências em parceria com governosestaduais. Assim, o processo de divulgaçãoe mobilização, bem como o provimentode infraestrutura (auditórios, equipa-mentos de áudio e vídeo, etc.), foi compar-tilhado entre diversos atores, compensandoa falta de recursos do MMA e, ao mesmotempo, garantindo um comprometimentopolítico dos demais atores envolvidos.Quanto à questão da falta de pessoal tecni-camente capacitado, o MMA contratouconsultores especialistas na temática deresíduos sólidos, para auxiliar no esclare-cimento de dúvidas dos participantes. Issocontribuiu para que a pesada linguagemtécnica da temática fosse, em parte,traduzida pelos especialistas, facilitandoa participação.

Neutralidade e postura pró-debate

do(a) mediador(a)

Um ponto-chave na busca por efeti-vidade passa pelo papel do(a) mediador(a)/facilitador(a) do debate. É ele ou ela queirá dar o tom e coordenar o debate. Suaatuação tem reflexos na capacidade dopúblico presente de participar efetivamentee na sua percepção quanto à neutralidade,à seriedade e à legitimidade do processo.

Na escolha do(a) mediador(a), é im-portante combinar três características:

A) capacitação em metodologiasparticipativas;

B) neutralidade com relação à temática; eC) reconhecimento do(a) mediador(a)

como neutro(a) pelo público presente.É importante ressaltar que B e C,

apesar de inter-relacionadas, são caracte-rísticas distintas. No caso das hidrelétricasdo Rio Madeira, até onde pudemosobservar pelas gravações de vídeo, apostura do mediador foi neutra na con-dução do debate. No entanto, ele – que erao diretor de licenciamento ambiental doIbama e dividia a mesa da AP com o propo-nente do projeto – não era visto comoneutro por todos os interessados noprocesso e a avaliação de sua atuação porparte do público presente foi prejudicada,o que levou a críticas, aparentementeindevidas, em relação à sua atuação.

O caso da ANTT mostra um problemaquanto à característica A. O caráter eminen-temente técnico da agência reflete-se nascapacidades de sua equipe. Dessa forma,o perfil mais técnico que político do ser-vidor designado para atuar como mediadorfez com que as audiências – apesar decontarem com boa infraestrutura e transpa-rência – não promovessem o debate demaneira satisfatória, mantendo, do pontode vista de alguns participantes, um focodemasiado no caráter técnico das decisões

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a serem tomadas, em detrimento do caráterpolítico.

O caso do PNRS também ilustra umafalha na dimensão A, mas sob prisma dife-rente. Enquanto muitos mediadores seesforçavam para fomentar o debate eampliar a participação, a falta de capaci-tação em metodologia participativa porvezes levou à falta de dimensionamento dotempo e de objetividade na condução dotrabalho.

Metodologias do processo partici-

pativo

Nos casos estudados, metodologiasadequadas e claras, seguidas com coerên-cia, tenderam a aumentar a percepção delegitimidade e de seriedade da AP porparte do público presente e potenciali-zaram a capacidade dos gestores de siste-matizar as propostas.

A metodologia utilizada na audiênciadeve ser adequada à especificidade dosparticipantes; à complexidade e abrangênciado tema a ser debatido; aos objetivos da APe ao tempo e recursos disponíveis para arealização do evento.

A questão da especificidade dos partici-pantes é retratada nos casos de licenciamentoambiental. Comunidades indígenas e ribei-rinhas necessitam de audiências que con-templem suas especificidades culturais etipos de organização; que traduzam o pesa-do aparato técnico da política pública paraa realidade local; e que levem em contadistâncias territoriais e dificuldades de acessoao local das audiências12. Em alguns casosem que o tema é abrangente, como naformulação de políticas nacionais, é impor-tante que as audiências abordem dimensõesregionais e/ou setoriais.

Nos contextos citados, pode ser neces-sário que a audiência seja desmembradaem etapas focadas na participação de

públicos específicos, tais como audiênciaslocais, estaduais e regionais, e audiênciascom foco temático reduzido, que contem-plem a complexidade do tema. Em diversoscasos, é importante ampliar o tempo derealização do processo de audiência, o quepode demandar recursos extras. Apesar dea questão dos recursos ser frequentementeapontada como obstáculo à ação gover-namental, observamos que a restriçãodemasiada de tempo e a não atenção àcomplexidade da temática em questãopodem reduzir a efetividade do processoparticipativo.

O desenho da audiência é parte impor-tante da metodologia. Mas também éfundamental ter atenção à metodologiaempregada por mediadores e coordena-dores durante o evento. Tal metodologiadireciona a participação e indica como seráfeita a sistematização das contribuições dasociedade. Uma das principais críticas comrelação às audiências de Belo Monte e deSanto Antônio e Jirau foi que elas nãocontaram com uma metodologia quepermitisse a sistematização das contribui-ções de forma trabalhável pelos(as)gestores(as).

As audiências do PNRS, por sua vez,contaram com um documento de referência,e a metodologia utilizada para o debatefocava nas contribuições relativas ao docu-mento, fazendo com que as manifestaçõesfossem mais objetivas. Além disso, a meto-dologia incluía a priorização de propostas,o que permitiu identificar quais itens dapolítica atendiam à maior parte dos pre-sentes. Tal metodologia facilitou o trabalhodos responsáveis pela sistematização dascontribuições e, consequentemente, possibi-litou uma melhor consideração das contri-buições pelos responsáveis pela redação daversão final do plano. Nesse caso, o nívelde incorporação das contribuições e de

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satisfação dos participantes foi significa-tivamente alto.

Ressalta-se, contudo, que, embora con-tasse com inovações bem-sucedidas, ametodologia utilizada no PNRS teve suasfalhas. A primeira delas refere-se à falta declareza, em certos momentos, quanto àsregras procedimentais. Tais regras nãoforam suficientemente disponibilizadas aosparticipantes com antecedência e os pró-prios mediadores por vezes tinham dúvidasem relação à sua aplicação. Além disso, ainterpretação e aplicação das regras pelosmediadores não foi totalmente coerente nasvárias etapas da audiência. Isso gerou, emalguns momentos, um sentimento de con-fusão e incerteza por parte dos partici-pantes, influenciando de forma negativa asua percepção sobre a efetividade do pro-cesso. Além disso, alguns elementos dametodologia tinham um caráter delibe-rativo, dissonando do caráter consultivo daAP, tais como a votação para eleger umaúnica proposta a ser encaminhada. Issolevou a uma percepção errada sobre oobjetivo do processo. Audiências públicassão, por definição, consultivas e asaudiências do PNRS não fugiram a essaregra. Mas se observou que a utilização deelementos metodológicos típicos de pro-cessos deliberativos tem o potencial degerar insatisfação entre os participantes,que esperam que aquilo que foi votadoconste no documento final.

Devolutiva à sociedade

Apesar de ser um elemento-chave paraa efetividade, a interface com a sociedadeno momento posterior à audiência públicaé, em diversos casos, relegada a segundoplano pelos(as) gestores(as) de políticapública. Esse momento deve incluir umadevolutiva clara à sociedade, indicando aincorporação ou não das contribuições,

com justificativa, o que pode aumentar apercepção de legitimidade da audiênciapública.

Para que seja possível promover umadevolutiva formal, é preciso que tenhahavido um processo adequado de sistema-tização das propostas. Isso implica, comoapontado anteriormente, que a audiênciatenha empregado uma metodologiaadequada para esse fim e, também, que oórgão responsável pela AP tenha capaci-dade institucional para analisar as contri-buições recebidas.

Entre os estudos de caso incluídosnesta pesquisa, os de licenciamentoambiental são exemplos em que a falta dedevolutiva formal gerou insatisfação nasociedade, que viu nesse fato um indíciode que as audiências públicas haviam tidoefeitos limitados na política em questão.Nesses casos, não houve uma sistemati-zação dos resultados das audiências e,como consequência, não houve umadevolutiva para a sociedade.

Já os casos do PNRS e da ANTTincluíram devolutivas para a sociedade. Nocaso do PNRS, a primeira devolutivaocorreu na audiência nacional em Brasília/DF, quando houve a disponibilização deuma nova versão do documento de refe-rência, incorporando as contribuiçõesoriundas das audiências regionais, quehaviam ocorrido anteriormente. Essainiciativa (e o conteúdo do documento)ampliou a percepção de seriedade eefetividade da participação entre os presen-tes, que reconheceram que o documentocontemplava parte significativa das contri-buições oriundas das audiências regionais.

A ANTT promoveu a devolutiva daAP no 120/2011 em um relatório de con-teúdo claro e detalhado, inclusive com aanálise e justificativa para o acatamento ounão de cada contribuição. O problema em

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relação a esse caso foi o prazo em que adevolutiva ocorreu, em momento posteriorao início do processo da audiência no 121/2011, que era vista pelos participantescomo audiência complementar à de no 120/2011. Consequentemente, para os partici-pantes, a continuidade da participação naAP no 121/2011 foi prejudicada, uma vezque não conheciam o resultado da outrafase do processo.

Transparência

É necessário que todo o processo deaudiência pública seja pautado pela trans-parência. A publicidade de informaçõesdeve acompanhar todas as fases do pro-cesso: seja na divulgação e na mobilizaçãodos atores relevantes; na disponibilizaçãoe acessibilidade de documentos de refe-rência; sobre a clareza dos objetivos daaudiência e da metodologia utilizada; esobre o que será feito com as contribuiçõesda sociedade.

Nesse aspecto, o procedimento daANTT foi exemplar. Informações sobreprazos, metodologia, contribuições, docu-mentos de referência, atas, entre outros ele-mentos importantes foram disponibi-lizados no site da agência. Isso foi essencialpara que os interessados tivessem umaparticipação mais informada e fosse geradoum sentimento de confiança da sociedadepara com o órgão governamental. No casodo PNRS, houve reclamações quanto àdivulgação deficitária do evento; ao redu-zido prazo entre a disponibilização dosdocumentos de referência e a audiênciapública13 ; e com relação à falta de clarezasobre a metodologia. Mas é importanteressaltar que não há nenhuma evidência deque os problemas das audiências do PNRStenham resultado de uma postura ativados(as) gestores(as) no sentido de reduzira transparência, mas, sim, de falhas de

organização por parte dos órgãos respon-sáveis pelo evento e do curto tempodisponível devido a prazos legais.

Nos casos de Belo Monte e SantoAntônio e Jirau, por sua vez, as principaisreclamações quanto à transparência, ouseja, quanto ao acesso a informaçõesconfiáveis e de qualidade, se concentramno EIA-Rima, que é o principal documentoa ser debatido na audiência. Uma primeiracrítica se refere a dúvidas quanto à inde-pendência da empresa de consultoriaresponsável por realizar o estudo, já quequem escolhe e paga a consultora é aempresa proponente do projeto. Dessaforma, há dúvidas quanto à liberdade dostécnicos contratados de criticar os planose ações da empresa contratante.

Além disso, em ambos os casos, apesarde o EIA, o Rima e vários outros docu-mentos estarem disponíveis em formadigital no site do Ibama, foram identificadasreclamações por parte da sociedade quantoao acesso on-line a outros documentosrelevantes. Até então, os autos dos pro-cessos não eram digitalizados e disponibi-lizados no site, dificultando o acesso dosinteressados, que tinham que se deslocaraté Brasília ou requerer uma cópia, arcandocom custos relativamente altos. Recente-mente, o Ibama começou a digitalizar osautos em sua integralidade e disponibili-zá-los on-line, aumentando de maneirasignificativa a transparência e facilitando aparticipação, além de reduzir custos para opróprio governo federal. Esse é um bomexemplo que deveria ser seguido por todaa administração pública.

Houve insatisfação também quanto àlinguagem utilizada nos relatórios, conside-rada muito técnica e prejudicial à com-preensão por parte de muitos atoresinteressados, tais como comunidadesindígenas e ribeirinhas. Dessa forma, seria

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interessante que fossem disponibilizadasdiversas versões dos relatórios sobre oempreendimento, os benefícios e os impac-tos esperados, com diferentes linguagens eníveis de complexidade técnica.

Considerações finais

As conclusões aqui expostas são prove-nientes de uma pesquisa que teve a duraçãode um ano e contou com quatro estudosde caso. A partir da análise da bibliografia,de análise documental e de entrevistas comparticipantes e organizadores das AP,foram identificados fatores que influenciamo potencial de efetividade da participaçãosocial em audiências públicas. Procurou-se compreender como variações nessesfatores podem interferir na referida efetivi-dade, de modo a aperfeiçoar o uso dasaudiências públicas como instrumento departicipação.

No entanto, tendo em vista a limitaçãoa quatro casos, as conclusões desta pesquisanão são passíveis de generalização. Não hácomo afirmar que a adoção de medidasidentificadas nos casos como elemento desucesso (ou o esforço em evitar elementosque contribuíram para minorar o poten-cial de efetividade) será bem-sucedida emqualquer caso, tendo em vista a limitação

de escopo desta pesquisa e porque ele-mentos contextuais são fundamentais paraa efetividade de processos participativos.Destaca-se, contudo, que os diversosestudos apontados no referencial teóricopermitem afirmar que a participação socialamplia a capacidade de governo e aefetivação do processo de gestão daspolíticas públicas.

As conclusões aqui apresentadasapontam boas práticas e gargalos na organi-zação de audiências públicas. Essas con-clusões, empiricamente fundamentadas,certamente serão úteis tanto para gestorespúblicos responsáveis pela organização egestão desses espaços participativos quantopara estudiosos que pretendem desbravarum campo de estudos ainda pouco explo-rado. Além de responder à pergunta depesquisa, as análises apresentadas nesteartigo têm o potencial de servir como cata-lisador do debate contínuo sobre o tema,agregando a teoria e a experiência práticade gestores envolvidos com a realizaçãode audiências públicas. Espera-se, assim,que as informações compiladas tomemvida própria e se desenvolvam com oacúmulo de novas ideias, teorias eexperiências.

(Artigo recebido em janeiro de 2013. Versãofinal em março de 2013).

Notas

1 Para mais informações e análises relacionadas ao SIGPlan, consultar o relatório preliminarde pesquisa (Ipea, 2012), disponível em www.ipea.gov.br/participacao .

2 Elaboração do Plano Nacional de Resíduos Sólidos e Licitação e Contrato de Permissãodos Serviços de Transporte Rodoviário Interestadual de Passageiros (da ANTT).

3 Licenciamento das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, em Rondônia, e de Belo Monte,no Pará.

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4 Para uma análise detalhada e completa sobre cada um dos quatro casos estudados, consul-tar o relatório final de pesquisa, disponível em: www.ipea.gov.br/participacao.

5 O diagnóstico foi elaborado pela equipe da Diretoria de Estudos e Políticas Regionais,Urbanas e Ambientais (Dirur), do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

6 O plano de outorga traz os aspectos técnicos necessários para a prestação do serviçopúblico.

7 Esse projeto foi objeto de inúmeras audiências em outros momentos e espaços, como asrealizadas pelo Ministério Público e pelo Poder Legislativo. Devido ao escopo limitado do pre-sente estudo, o foco foi somente no processo de licenciamento ambiental, não tendo sido pos-sível analisar os demais fóruns de discussão.

8 Ver Quadro 2.9 No momento da pesquisa, o governo federal estava realizando um amplo processo de

consulta, no intuito de regulamentar o mecanismo de consulta prévia previsto na Convenção169 da OIT.

10 O objetivo da audiência pública nº 121/2011 foi coletar contribuições sobre as Minutasdo Edital de Licitação e Contrato de Permissão dos Serviços de Transporte Rodoviário Interes-tadual de Passageiros, operados por ônibus do tipo rodoviário.

11 O objetivo da audiência pública nº 120/2011 foi a discussão do plano de outorga sobre osserviços de transporte rodoviário interestadual de passageiros, operados por ônibus do tiporodoviário.

12 A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Bra-sil, prevê a realização de consulta prévia a povos indígenas e tribais, no caso de empreendimen-tos e políticas públicas que tenham impacto nessas comunidades.

13 Esse fato foi observado também no caso de Belo Monte, no qual houve reclamações dasociedade civil sobre o fato de os últimos volumes do EIA somente terem sido disponibilizadospoucos dias antes da primeira AP.

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27Revista do Serviço Público Brasília 64 (1): 7-29 jan/mar 2013

Igor Ferraz Fonseca, Raimer Rodrigues Rezende, Marília Silva de Oliveira e Ana Karine Pereira

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28 Revista do Serviço Público Brasília 64 (1): 7-29 jan/mar 2013

Audiências públicas: fatores que influenciam seu potencial de efetividade no âmbito do Poder Executivo federal

Resumo – Resumen – Absctract

Audiências públicas: fatores que influenciam seu potencial de efetividade no âmbi-

to do Poder Executivo federal

Igor Ferraz Fonseca, Raimer Rodrigues Rezende, Marília Silva de Oliveira e Ana Karine Pereira

Este artigo apresenta os principais resultados e as principais conclusões de uma pesquisaaplicada que visou a responder a seguinte pergunta: “No âmbito do Poder Executivo federal, quaissão os principais fatores que influenciam o potencial de efetividade das audiências públicas comomecanismo de participação social no processo de gestão das políticas públicas?”. Para tanto, e apartir de metodologia qualitativa, o estudo contou com quatro estudos de caso de audiênciasrealizadas por órgãos do governo federal: a elaboração do Plano Nacional de Resíduos Sólidos; adiscussão das minutas do Edital de Licitação e Contrato de Permissão dos Serviços de TransporteRodoviário Interestadual de Passageiros; e o licenciamento ambiental de dois grandes projetos deusinas hidrelétricas – Santo Antônio/Jirau e Belo Monte. Os resultados da análise empírica apon-tam fatores importantes que têm impacto na efetividade das audiências. Essa análise teve porobjetivo fornecer subsídios para gestores públicos responsáveis pela organização e realização des-ses processos participativos, bem como para estudiosos envolvidos com o tema.

Palavras-chave: audiências públicas; participação social; resíduos sólidos; transporte rodo-viário; licenciamento ambiental

Audiencias públicas: factores que influyen en su potencial de efectividad en el ámbito

del Poder Ejecutivo federal

Igor Ferraz Fonseca, Raimer Rodrigues Rezende, Marília Silva de Oliveira y Ana Karine Pereira

En este artículo se presentan los principales resultados y las principales conclusiones de unainvestigación aplicada cuyo objetivo era responder a la siguiente pregunta: “Dentro del PoderEjecutivo federal, ¿cuáles son los principales factores que influyen en el potencial de efectividadde las audiencias públicas como mecanismo de participación social en el proceso de gestión delas políticas públicas?”. Para ello, y mediante el uso de una metodología cualitativa, el estudio sebasó en cuatro estudios de caso de audiencias realizadas por agencias del Gobierno federal: lapreparación del Plan Nacional de Manejo de los Desechos Sólidos; la discusión sobre el proyectodel documento de licitación y sobre el contrato de autorización para explotar servicios de autobusesinterestatales; y licencias ambientales para dos grandes proyectos hidroeléctricos - Santo Antô-nio/Jirau y Belo Monte. Los resultados del análisis empírico indican factores importantes queafectan a la eficacia de las audiencias. Este análisis tuvo como objetivo proveer subsidios paralos gestores públicos responsables de la organización y realización de estos procesos participativos,así como académicos interesados en el tema.

Palabras clave: audiencias públicas; participación social; desechos sólidos; transporte enautobuses; licencias ambientales

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29Revista do Serviço Público Brasília 64 (1): 7-29 jan/mar 2013

Igor Ferraz Fonseca, Raimer Rodrigues Rezende, Marília Silva de Oliveira e Ana Karine Pereira

Public hearings: the factors that impact the potential of their effectiveness in the

management process of public policy

Igor Ferraz Fonseca, Raimer Rodrigues Rezende, Marília Silva de Oliveira and Ana Karine Pereira

This article presents the main results and the main conclusions of an applied research thataimed to answer the following question: “within the Federal Executive Branch, what are themain factors that impact the potential of effectiveness of public hearings as a mechanism ofsocial participation in the management process of public policy?”. For this purpose, and throughthe use of qualitative methodology, the research relied on four case studies of hearings held byFederal Government agencies: the preparation of the National Solid Waste Management Plan;the debate on the drafts of the bidding terms and conditions, and regarding the contract ofpermission to exploit Interstate Bus Services; and the environmental licensing of two majorhydroelectric projects - Santo Antônio/Jirau and Belo Monte. The results of the empiricalanalysis point out important factors that impact the effectiveness of the hearings. This analysisaimed to provide subsidies for public managers responsible for organizing and conducting theseparticipatory processes, as well as for scholars concerned with the issue.

Keywords: public hearings; social participation; solid waste; road transport; environmentallicensing

Igor Ferraz Fonseca

Sociólogo e mestre em Política e Gestão Ambiental pela Universidade de Brasília. Técnico de Planejamento e Pesquisa, daDiretoria de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia (Diest) do Instituto de Pesquisa EconômicaAplicada (Ipea). Contato: [email protected]

Raimer Rodrigues Rezende

Antropólogo pela Universidade de Amsterdam e mestre em Desenvolvimento Sustentável e Política Ambiental pela Uni-versidade de Utrecht. Pesquisador do Programa de Pesquisa para o Desenvolvimento Nacional (PNPD), na Diretoria deEstudos e Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia (Diest) do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada(Ipea). Contato: [email protected]

Marília Silva de Oliveira

Cientista Política, mestre em Ciências Sociais e doutoranda em Ciência Política pela Universidade de Brasília.Ex-pesquisadora do Programa de Pesquisa para o Desenvolvimento Nacional (PNPD), na Diretoria de Estudose Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia (Diest) do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).Contato: [email protected]

Ana Karine Pereira

Cientista Política, mestre e doutoranda em Ciência Política pela Universidade de Brasília. Pesquisadora do Programa dePesquisa para o Desenvolvimento Nacional (PNPD), na Diretoria de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e daDemocracia (Diest) do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Contato: [email protected]