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Disciplina: Direitos Humanos Professor: Eduardo Cabral Moraes Monteiro Aula 02: Os Direitos Fundamentais e sua evolução – Fontes e antecedentes dos Direitos Fundamentais PLANO DE AULA 1) A doutrina dos direitos do Homem - A doutrina dos direitos do Homem não nasceu no século XVIII. Ela é uma versão da doutrina do direito natural que já desponta na antiguidade; - Breve resumo das fontes e dos antecedentes das declarações. A) FONTES FILOSÓFICO-DOUTRINÁRIAS 2) Antecedentes - Na antiguidade, há um remoto ancestral da doutrina dos direitos fundamentais, que é uma referência a um Direito Superior, não estabelecido pelos homens mas dado a estes pelos Deuses. Segundo Cícero: “A lei é a razão suprema, gravada em nossa natureza, que prescreve o que se deve fazer e proíbe o que não se deve fazer”; - No século XIII, Tomás de Aquino, na Suma Teológica, estabelece uma hierarquia: suprema é a lei eterna (que só Deus conhece na plenitude), abaixo da qual estão a lei divina (parte da lei eterna revelada por Deus ou declarada pela Igreja) e a lei natural (gravada na natureza humana que o homem descobre por

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Disciplina: Direitos Humanos

Professor: Eduardo Cabral Moraes Monteiro

Aula 02: Os Direitos Fundamentais e sua evolução – Fontes e antecedentes dos Direitos

Fundamentais

PLANO DE AULA

1) A doutrina dos direitos do Homem

- A doutrina dos direitos do Homem não nasceu no século XVIII. Ela é uma versão da

doutrina do direito natural que já desponta na antiguidade;

- Breve resumo das fontes e dos antecedentes das declarações.

A) FONTES FILOSÓFICO-DOUTRINÁRIAS

2) Antecedentes

- Na antiguidade, há um remoto ancestral da doutrina dos direitos fundamentais, que é uma

referência a um Direito Superior, não estabelecido pelos homens mas dado a estes pelos

Deuses. Segundo Cícero: “A lei é a razão suprema, gravada em nossa natureza, que

prescreve o que se deve fazer e proíbe o que não se deve fazer”;

- No século XIII, Tomás de Aquino, na Suma Teológica, estabelece uma hierarquia:

suprema é a lei eterna (que só Deus conhece na plenitude), abaixo da qual estão a lei

divina (parte da lei eterna revelada por Deus ou declarada pela Igreja) e a lei natural

(gravada na natureza humana que o homem descobre por meio da razão), e, mais abaixo, a

lei humana (a lei positiva editada pelo legislador);

- Esta concepção de um Direito independente da vontade humana perdurou por toda a

Idade Média. E ainda prevalecia no final do século XVIII (Absolutismo x Iluminismo);

- Hobbes, com o Leviatã no século XVII, dela dissentia, sustentando que a lei deriva da

vontade, não da razão. Contudo, na Inglaterra, na mesma época, o famoso juiz Coke

sustentava a superioridade do Direito, especificamente da Common Law sobre os atos do

legislador.

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3) A escola do Direito Natural e das Gentes

- Foi ela que formulou a doutrina adotada no pensamento iluminista e expressa nas

Declarações;

- Segundo Grócio, que laicizou o direito natural, decorrem da natureza humana

determinados direitos, que não são criados, muito menos outorgados pelo legislador. Eles

são identificados pela “reta razão” que a eles chega, avaliando a “conveniência ou a

inconveniência” dos mesmos em face da natureza razoável e sociável do ser humano;

- Essa escola também difundiu as teses de estado de natureza e de contrato social, que têm

grande repercussão no constitucionalismo.

B) PRECEDENTES HISTÓRICOS

4) Forais e cartas de franquia

- O registro de direitos num documento escrito é prática que se difundiu a partir da segunda

metade da Idade Média;

- Em toda Europa encontram-se exemplos de registros de direitos de comunidades locais,

ou de corporações, por meio de forais ou cartas de franquia;

- Nestes, que os senhores feudais, mormente os reis, outorgavam, inscreviam-se direitos

próprios e peculiares aos membros do grupo – direitos fundamentais, sem dúvida – para

que, por todo o sempre, fossem conhecidos e respeitados.

5) A Magna Carta

- Destaque especial merece a Magna Carta, de 21 de junho de 1215, outorgada pelo Rei

João Sem Terra aos barões;

- Esta é peça básica da Constituição Inglesa, portanto, de todo o constitucionalismo;

- Apesar de se limitar aos direitos dos ingleses (law of the land), e não com os direitos do

Homem num sentido geral, essa Carta consiste na enumeração de prerrogativas garantidas

a todos os súditos da monarquia.;

- Tal reconhecimento de direitos importa numa clara limitação do poder, inclusive

com a definição de garantias específicas em caso de violação dos mesmos;

- Ela aponta a judicialidade como um dos princípios do Estado de Direito, exigindo o crivo

do juiz relativamente à prisão do homem livre. Está em seu item 39: “sem julgamento leal

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dos seus pares, de conformidade com a lei da terra (law of the land), nenhum homem livre

será detido ou preso, ou despojado de seus bens, exilado ou prejudicado de qualquer

maneira que seja”;

- Nela igualmente está a garantia de outros direitos fundamentais: a liberdade de ir e vir (n.

41), a propriedade privada (n. 31), a graduação da pena à importância do delito (n. 20 e

21), a regra no taxation without representation (n. 12 e 14);

- Isso provocou mais tarde a institucionalização do Parlamento, como lhe serviu de

arma para assumir papel de legislador e de controlador da atividade governamental;

- Mais tarde, várias vezes depois, foi ela reconfirmada por monarcas, e, em diversos

documentos outros, foram esses direitos fundamentais dos ingleses objeto de reivindicação

pelo Parlamento e de reconfirmação pelos reis. Exemplos:

- Petition of Rights, de 7 de junho de 1628, que reclama o respeito ao princípio do

consentimento na tributação, no do julgamento pelos pares para a privação da

liberdade, ou da propriedade, na proibição de detenções arbitrárias etc.;

- Bill of Rights, de 13 de fevereiro de 1689, o qual particularmente se preocupa com

a independência do Parlamento, dando o passo decisivo para o estabelecimento da

separação dos poderes.

6) O rule of law

- Com esses documentos e a jurisprudência de seus tribunais, a Inglaterra chegou ao rule of

law. Este consiste exatamente na sujeição de todos, inclusive e especialmente das

autoridades, ao império do Direito. Equivale ao Estado de Direito como limitação do

poder, num sistema de Direito não escrito;

- Segundo Dicey, o rule of law se caracteriza em três pontos: 1) ausência de poder

arbitrário por parte do Governo; 2) a igualdade perante a lei; 3) serem as regras da

constituição a consequência e não a fonte dos direitos individuais;

- Os princípios gerais da constituição são o resultado de decisões judiciais que

determinam os direitos dos particulares, em casos trazidos perante as cortes;

- “A constituição é o resultado da lei comum” (“ordinary law of the land”);

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- O rule of law é expressão da Common Law, que inclui o Direito judiciário inglês;

- Ele se desenvolveu a partir do século XII, quando cortes reais passaram a

consolidar o Direito consuetudinário – law of the land – que até então variava de região

para região. Mas essa consolidação do Direito se fez por meio de uma seleção, a que

procediam os juízes, legistas formados no Direito Romano. Tal seleção se cristalizou em

razão do stare decisis, pelo qual os juízes inferiores têm de se conformar com o

entendimento dos tribunais mais altos;

- Por outro lado, esses tribunais souberam aproveitar a flexibilidade de fórmulas, como due

process of law, para fazer evoluir o Direito num sentido de racionalidade e de preservação

da liberdade;

- Common law, rule of law, due process of law, equal protection of the laws, essas

expressões e as ideias que exprimem passaram com os ingleses para a América do Norte.

Essa herança não foi esquecida, ao contrário. Os tribunais americanos, e em primeiro lugar

a Suprema Corte, souberam usar dessas fórmulas que flexibilizam as decisões, dando uma

importante contribuição para o desenvolvimento da doutrina dos direitos fundamentais, nos

séculos XIX e XX.

C) OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

7) A versão clássica

- A doutrina dos Direitos do Homem já estava conformada no século XVII. Entretanto, ela

se expandiu no século seguinte, quando se tornou elemento básico de reformulação das

instituições políticas;

- Foi incorporada pelo liberalismo (político), do século das luzes em diante;

- Tinha ela no passado, e tem hoje mais ainda, uma grande força sobre os espíritos.

Basta ver a importância que documentos internacionais e constituições, organizações

internacionais e instituições nacionais lhe dão no dia a dia;

- No diálogo político, não mais se fala em “Direitos do Homem”, embora textos

constitucionais ainda empreguem a expressão. O feminismo conseguiu o repúdio da

mesma, acusando-a de “machista”. Logrou impor, em substituição, a politicamente correta

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terminologia de “Direitos Humanos”, “Direitos Humanos Fundamentais”, de que “Direitos

Fundamentais” são uma abreviação;

- A doutrina dos direitos fundamentais revelou uma grande capacidade de incorporar

desafios;

- Sua primeira geração enfrentou o problema do arbítrio governamental, com as

liberdades públicas;

- A segunda, o dos extremos desníveis sociais, com os direitos econômicos e

sociais;

- A terceira, hoje, luta contra a deterioração da qualidade da vida humana e outras

mazelas, com os direitos de solidariedade.

- Essa doutrina se universalizou, transportada pela civilização cristã-ocidental;

- Outras culturas, como a chinesa, a hindu e etc., não valorizam direitos mas

obrigações, virtudes e etc. Assim, não possuíam, antes da influência europeia, concepção

equivalente à de direitos fundamentais.