25
Aula de hoje: tipos de Estado e estrutura jurídico-política capitalista na abordagem “estrutural-marxista” 1

Aula-Teoria do Estado Estrutural Marxista

  • Upload
    ssbraga

  • View
    804

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Aula de hoje: tipos de Estado e estrutura jurídico-política capitalista na abordagem

“estrutural-marxista”

1

Sumário da aula:

(1) Considerações introdutórias;

(2) A problemática teórica do “marxismo estruturalista” (Althusser; Poulantzas; Décio Saes) => estruturas jurídico-políticas X estruturas econômicas;

(3) O conceito de Estado Capitalista: “efeito de isolamento” e “efeito de representação da unidade”/ O direito capitalista e o burocratismo burguês;

(4) Formas de Estado e Regimes Políticos capitalistas: burocracismo e representação/consulta popular

2

Introdução: linhas de conceituação genérica do Estado.

TEMA AULA: REVISANDO AS CONCEITUAÇÕES “GENÉRICAS” DE ESTADO(WEBER, MATERIALISMO HISTÓRICO, CONSTITUCIONALISTAS”). TIPOSDE ESTADO E FORMAS DE ESTADO. INTRODUÇÃO AO CONCEITO DEESTRUTURA JURÍDICO-POLÍTICA CAPITALISTA E ESTADO BURGUÊS.

Linhas de conceituação genérica do Estado: Linha marxiana: Estado como uma instituição ou conjunto de instituições que

tem uma função específica e invariante;

Linha weberiana: Estado é um grupo de dominação que reivindica com sucesso,num determinado espaço territorial, o monopólio legítimo da força física;

Linha “constitucionalista”: vê o Estado como um ente de Direito, que aplica umconjunto de normas de forma eqüitativa, e pode servir a diversos fins edesempenhar diferentes propósitos ao longo da história.

3

Introdução: limites da abordagem marxista clássica

Obs.: Além dessas conceituações genéricas de Estado, vale lembrar que algumas dessas correntes irão procurar definir tipos específicos de Estado (Escravista, Feudal, Capitalista; Feudal; Estamental; Racional-Moderno etc.)

Texto do Lênin: parte de uma definição genérica de Estado proposta por Engels, para demonstrar que, ao longo da evolução histórica entre os diferentes tipos de Estado (Escravista, Feudal, Capitalista), e de suas formas de Estado e de governo (Monarquia, República, Aristocracia e Democracia), a essência do Estado permaneceu inalterada.

Estado = grupo ou categoria especializada de homens (um “poder especial de repressão”) cuja função invariante é defender os interesses gerais dos proprietários dos meios de produção [para usar a terminologia dele].

Obs.: Nem o Lênin nem os clássicos do marxismo parte para um trabalho sistemático de definição dos tipos específicos de Estado. Eles estão preocupados principalmente em acentuar ser caráter de classe.

4

Introdução: Autor-chave => Nicos Poulantzas.

Dois autores que mais avançaram na tentativa de conceituar o Estado Moderno, embora dentro de problemáticas teóricas distintas: Max Weber (In: Economia e Sociedade, 1922) e Nicos Poulantzas (In: Poder Político e Classes Sociais, 1968).

Obs.: Esse texto do Décio Saes se inspira tanto no Weber (menos) como no Poulantzas.

Nicos Poulantzas:

Influência do “estrutural-marxismo” de Louis Althusser e Etienne Balibar de meados dos anos 60.

Autor muito influente até o final dos anos 80.

Ponto de partida: conceito “ampliado” de “Modo de Produção” como uma interação entre estruturas (política, econômica e ideológica) “determinadas em última instância” pelo “econômico”.

Dentro dessa problemática teórica (“anti-economicista”) procura construir uma teoria específica do Estado Capitalista ou Burguês Moderno.

5

Introdução: conceitos básicos Estrutura = sistema de ações/práticas fortemente prescritivo responsável pela

reprodução de uma dada esfera de atividade social [= conceito semelhante ao conceito kelseniano de “norma fundamental”]

Reprodução: reinteração no tempo histórico de um sistema de relações sociais;

Limites/Práticas = as ações são limitadas dentro de um campo de possibilidades;

Modo de (Re) Produção = combinação ou articulação de várias estruturas ou subestruturas;

Formação Social = Espaço histórico de existência e combinação dos vários modos de produção.

→ Obs.: Dentro dessa problemática, um dos problemas fundamentais desse autor é responder à questão: ¿ Existe um padrão invariante de reprodução das várias esferas do Modo de Produção capitalista?

6

Introdução: tentativas de formular conceitos de Estado Capitalista

Duas respostas a essa pergunta: Nicos Poulantzas, Poder Político e Classes Sociais (1968) => Sim. O Estado

Capitalista [EKª] tem uma estrutura particular e exerce de uma maneira específica a função geral de “moderar os conflitos de classe”. E é possível a operação analítica de se definir um EKª por esse padrão.

Ralph Miliband, O Estado na Sociedade Capitalista (1969) et. al.: não se preocupa em detectar um estrutura específica ou efeitos específicos dessa estrutura. Ele quer demonstrar que o Estado age em favor da classe capitalista privada, por ter seus quadros predominantemente recrutados nesse grupo social (recorre à teoria das elites p/fundamentar os argumentos).

Obs.(1): Esse verdadeiro ponto de divergência entres os autores, por motivos de natureza variada, nem sempre é enfatizado.

Obs.(2): Em outras obras o Poulantzas abandonou a problemática anterior. O autor que opera hoje de maneira mais consistente com o conceito de estrutura jurídico-política capitalista é o Décio Saes, que nós veremos no curso.

7

1) A problemática teórica “estrutural-marxista”:

Corrente de grande influência no final dos anos 1960 e década de 1970;

Principais representantes: o filósofo Louis Althusser; Nicos Poulantzas; Etienne Balibar; Charles Bettelheim.

Autores que produziram várias obras importantes procurando renovar o marxismo a partir de um diálogo com o “mainstream” da ciência social acadêmica européia de então (especialmente o estruturalismo);

9

Estrutura lógica da argumentação:

(1) Caracterização da natureza da correspondência entre EKª e “RPs” capitalistas:

A) Caracterização da estrutura econômica capitalista

B) Efeitos da estrutura jurídico-política nos agentes econômicos capitalistas que viabilizam a reiteração no tempo histórico dessa relação [Efeito de isolamento e “efeito de representação da unidade”]

(2) Caracterização da estrutura jurídico-política capitalista:

A) O direito capitalista ou burguês (Pachukanis)

B) As normas/valores que compõe o burocratismo burguês.

10

(2) O conceito de Estado Capitalista ou “burguês”:

Obra-chave: Poder político e classes sociais (1968);

Proposta: a partir das idéias de Marx/Engels/Lênin sobre os tipos de Estado e das contribuições de Max Weber e outros autores, definir a estrutura jurídico-política correspondente ao Modo de Produção Capitalista;

Extrair uma série de implicações teóricas desse procedimento.

11

2.1) Problemática teórica: a dos tipos de Estado em correspondência com tipos diversos de RP/relações de produção

Base de tal “problemática” => conceito de Estado em geral + tese da correspondência entre tipos de Estado e RPs (Marx, Engels, Lênin).

Os diferentes tipo de Estado organizam de um modo específico a dominação de um estrato que se apropria do trabalho e outro e corresponde a uma determinada estrutura de relações sociais.

Conceito “althusseriano” de MP/Modo de Produção como uma “articulação de estruturas” “determinadas em últimas instância” pelo econômico.

Obs.: Estrutura = um padrão valorativo e normativo invariante a “latente” de reprodução das relações sociais.

12

Caracterização das RPs capitalistas:

A) Relação de propriedade em sentido estrito = relação que se estabelece entre o controlados dos meios de produção/equipamentos e os detentores da força de trabalho.

No capitalismo a apropriação do sobretrabalho ou do valor agregado assume a forma de uma “troca de equivalentes” regulamentada por um acordo ou um “contrato” de trabalho;

Essa “ilusão mercantil” (p. 26) da troca de equivalentes é produzida e legitimada por sua vez pela estrutura jurídico-política capitalista, e não pela própria esfera econômica;

13

Caracterização das RPs capitalistas:

B) A relação do trabalhador com as condições materiais de produção oucom a tecnologia (27):

“Tais condições são as da grande indústria moderna”. Como se dá oprocesso de trabalho no capitalismo e nas grandes organizaçõescapitalistas modernas [um dos temas sociológicos mais complexos]?

O processo de trabalho no capitalismo é altamente socializado einterdependente, por um lado;

Por outro lado, como eles não participam da organização do processo detrabalho, este apresenta um caráter independente ou “atomizado” doponto de vista de cada trabalhador individual;

[cf. consideração superficial sobretendência à ação coletiva na p. 29]

14

2.2) Funções desempenhadas pelo Estado Capitalista:

A) Individualizar os agentes/atores sociais mediante a sua conversão em “sujeitos de direitos” [= membros de vontade subjetiva capazes de efetuar contratos e de praticar atos jurídicos] Efeito de isolamento

B) Desorganizar/impedir a tendência à “ação coletiva” sem o controle e à margem do aparelho de Estado Efeito de representação da unidade.

Cada elemento da EJPK desempenha uma parte desse papel.

15

3) O conceito de Estado Capitalista: direito capitalista e burocratismo capitalista.

O direito capitalista para estes autores caracteriza-se por universalizar o “tratamento igual aos desiguais” transformando todos os atores sociais juridicamente responsáveis em “sujeitos de direito” “potencialmente iguais”;

=> “O direito burguês constitui-se numa ruptura radical na medida em que define igualmente os capitalistas e os trabalhadores como seres genericamente dotados de vontade subjetiva e, portanto, capazes de praticar os mesmos atos” (37)

Contrato = ato de troca resultante de manifestação de vontade de dois sujeitos (p. 38) 16

O conceito de Estado capitalista: o burocratismo burguês.

Burocratismo => modo específico de organização do aparelho e das instituições políticas estatais capitalistas;

Dois princípios fundamentais do burocratismo, segundo o autor:

(i) Não-monopolização das tarefas do Estado pela classe/extrato social que controla o aparelho econômico não proibição formal do acesso às tarefas pelos membros da “classe explorada”;

(ii) hierarquização das tarefas do aparelho de Estado segundo critérios formais de competência técnica ou meritocráticos. [cf. Weber para a descrição destes princípios]

17

O conceito de Estado capitalista: detalhamento do burocratismo burguês

Diferença entre Poulantzas e Weber; Diferença entre burocracia e burocratismo; A “unidade de ação” da burocracia; O “interesse político particular” da

burocracia; A “dominância do burocratismo sobre a

burocracia” (p. 46);

18

O conceito de Estado capitalistas: diferença entre as abordagens weberiana e poulantizana da burocracia [cf. Eric Olin Wright]

A) Poulantzas: Define a permissão do

acesso às tarefas do Estado aos membros da “classe explorada fundamental” como a característica principal do Estado Capitalista;

B) Weber: Define a separação

entre os recursos materiais do Estado e os recursos dos meios de produção como o elemento fundamental do Estado burocrático-moderno;

19

(4) Representação popular e formas de Estado

Existência de mecanismos de consulta à vontade popular.

Representação burocrática ≠ representação popular Representação popular e formas de Estado Questão das formas do Estado burguês ou formas

da representação popular Formas ditatorial, democrática, corporativa;

plebiscitária ou combinação dessas formas (49)

20

21

AS FORMAS DO ESTADO BURGUÊS: BUROCRATISMO E REPRESENTAÇÃO DA UNIDADE

Obs.: Em função da evolução das diferentes sociedades surgem outras formas de “representação” além da representação burocrática. A existência ou não destas outras formas institucionais de consulta à população geralmente são utilizadas como critérios, ao lado de outros, para se definir as diferentes formas de governo/formas de Estado/regime político.

1) Forma ditatorial: - representação puramente burocrática, ausência de representação política → um corpo autonomeado assume as funções governativas;

2) Forma democrática-parlamentar:

- existe um parlamento eleito por sufrágio universal ou censitário funcionando ao lado do corpo governativo-administrativo não-eleito;

3) Forma fascista ou corporativa:

- a burocracia reparte suas prerrogativas governativas e decisórias com uma corporação (=órgão representativo eleito por seus pares e não por sufrágio universal];

4) Forma plebiscitária ou “delegativa”:

- o governante eleito nomeia o gabinete, mas inexiste parlamentos ou corporações, ou as prerrogativas desses órgãos são bastante esvaziadas e meramente formais

Obs.: Há um mundo de problemas relacionado à operacionalização empírica desses conceitos de forma de Estado/regime política. Nas outras unidades, nos concentraremos na questão da forma de Estado democrática. Mas há uma ampla literatura abordando cada uma desses problemas [cf. Duverger e Bobbio]

Outros aspectos:

Mudança da problemática da obra de Poulantzas; Divergências de Décio Saes em relação a Poulantzas:

(i) conceito de Modo de Produção; (ii) autonomia relativa; (iii) conceito de forças produtivas;

Questão da relação entre Modo de Produção e Formação Social;

Competência: aparência ou realidade substantiva? Diferença entre Weber e os Marxistas

22

Finalizando: vários enfoques sobre as instituições politicas

Enfoque “centrado no Estado”: Weber, Marxistas, Kelsen => O Estado é um sistema de instituições singular e diferente das demais, existentes no sistema política;

Enfoques pluralistas e sistêmicos (David Easton; Robert Dahl etc.) => o conceito de sistema político subsume o de Estado;

Diferentes versões do neoinstitucionalismo (histórico, escolha racional e sociológico);

23

Referências bibliográficas:

ALTHUSSER, L. (1978). Sobre o trabalho teórico; dificuldades e recursos. Lisboa: Presença.

BENDIX, R. (1996). Construção Nacional e Cidadania. São Paulo: Edusp. BENDIX, M. (1982). Max Weber: um retrato intelectual. Brasília: UnB. BETTELHEIM, C. (1983). A luta de classes na União Soviética: segundo período, 1923-

1930. Rio de Janeiro: Paz e Terra. (Coleção Pensamento Crítico, v. 51.) BETTELHEIM, C. (1979). A luta de classes na União Soviética: primeiro período (1917-

1923). 2 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 480 p. (Pensamento crítico, v. 6.) GRUPPI. L. (1979). O pensamento de Lênin. Rio de Janeiro: Graal. HILL, C. (1967). Lênin e a Revolução Russa. 2 ed. Rio de Janeiro: Zahar. HOBSBAWN, E. J. (1990). Nações e nacionalismo desde 1870; programa, mito e

realidade. Rio de Janeiro: Paz e Terra. POULANTZAS, N. (1986). Poder político e classes sociais no Estado Capitalista. 2 ed. São

Paulo: Martins Fontes. PRZEWORSKI, A. (1995). Estado e Economia no Capitalismo. Rio de Janeiro: Relume-

Dumará. SAES, D. (1998). Estado e democracia: ensaios teóricos. 2 ed. Campinas: UNICAMP,

Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. (Coleção Trajetória.) v. 1. 24

QUADRO: O CONCEITO/MODELO DE ESTADO BURGUÊS (ESQUEMA LÓGICO)

1) Conceitos básicos:

1) Estrutura: - Padrão invariante e de longo prazo [IMP! O parâmetro é uma vida humana = 80 anos] que assegura a reprodutibilidade de um certo modelo de relações sociais; - valores e normas que enquadra um sistema de ações/práticas fortemente prescritivo responsável pela reprodução de uma dada esfera de atividade social; representações coletivas; “habitus”

2) Práticas: - São as ações humanas, que corporificam determinados padrões estruturais. As estruturas são modelos teóricos para apreender um padrão latente de reprodução das práticas sociais. As práticas podem ser: (i) “estruturais” [são efeitos direitos dos valores e normas adotados pelos agentes/atores envolvidos na relação social]; (ii) “semi-estruturais” [estão dentro dos limites das estruturas mas não são efeitos direitos dela]; (iii) anti-estruturais estratégicas [visam a “acumulação de forças” para modificar as estruturas]; (iv) anti-estruturais efetivas [práticas que visam a transformação de uma dada totalidade social];

3) Modo de (re) Produção: - O conceito de MP operado por Décio Saes é uma reinterpretação crítica do conceito de MP formulado pela corrente althusseriana, como uma interação entre três instâncias: Jurídico-Política; Ideológica; Econômica.

4) Formação Social - Espaço histórico-concreto de existência e combinação dos vários modos de produção

5) Estrutura jurídico-política: - valores e normas fundamentais e invariantes através da quais se organizam as instituições políticas de uma dada totalidade social;

6) Estrutura econômica: - valores e normas fundamentais através dos quais se organizam as instituições econômicas de uma dada totalidade social;

ELEMENTOS BÁSICOS DA TOTALIDADE SOCIAL CAPITALISTA:

1) Estrutura econômica capitalista:

- sistema de normas ou princípios gerais que organizam as instituições econômicas capitalistas: (i) individualização do trabalhador e contratualização das relações de trabalho; (ii) parcelamento e distribuição “autoritária” das tarefas;

2) Estrutura jurídico-política capitalista:

- sistemas de normas ou princípios gerais que organizam as instituições político-jurídicas capitalistas: (i) direito burguês individualizados e fragmentador do trabalhador; (ii) ordenamento normativa baseado num identidade imaginária entre indivíduos-iguais perante a lei (“Estado Nação”, via de regra);

25