Aulas teóricas História das Relações Internacionais (1)

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    FACULDADE DE DIREITO

    Aulas Tericas de Histria das RelaesInternacionais

    Hugo H. Arajo

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Aula terica de Histria das Relaes Internacionais

    Aula n 1

    Lisboa, 23 de Setembro de 2009

    Vamos falar dos conceitos de: Estado; Soberania; Razo de Estado; Equilbrio de

    poderes; etc.

    Vamos comear pelo sculo XVI, isto porqu, porque na verdade ns em regra

    iniciamos a Histria das relaes internacionais moderna pelo que se chama a Paz de

    Vesteflia (com a guerra dos 30 anos).

    Entende-se que, com a Paz de Vesteflia em 1648 que inicia-se verdadeiramente a

    historia das relaes internacionais moderna, porque nesta altura nos temos a

    proliferao de vrios estados decorrentes das guerras de religio e nesta altura, nos

    finais do sculo XVII, e aqui que surge a conceptologia do Estado, quer a nvel interno

    quer a nvel externo, claro que um conceito que se conhece da prpria cincia poltica

    e direito constitucional.

    Nos podemos definir Estado como uma associao poltica de indivduos, de homenslivres que se renem sobre a mesma autoridade e obedecem mesma lei.

    Ora temos como principais elementos de um Estado:

    Uma comunidade de homens, um conjunto de homens; Tem uma existncia independente, a independncia, o Estado superior na

    ordem interna, independente na ordem externa, ou seja o Estado no tem

    superior interno, nem externo e portanto dois dos grandes elementos do Estado

    comungam desta realidade da importncia interna e externa

    Capacidade de dirigir a sociedade (Governo prprio).Estes trs grandes elementos que compe o Estado, a comunidade humana, a sua

    independncia e a direco, o Estado como entidade capaz de dirigir para um

    determinado fim, portanto quando nos falamos no sculo XVI, quando estudamos este

    sculo, diz-se que o fim do Estado a bem aventurana eterna, porque o Estado tinhaum fim metafsico. Quando chegamos ao sculo XVII j no falamos em aventurana

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    eterna, e comeamos a falar em bem comum, e comeamos a dizer que o fim do Estado

    o bem comum.

    O bem comum tem a ver com o prprio destino do homem. O prprio aparecimento do

    Estado faz com que a finalidade, o fim do Estado se laicize. Enquanto at Idade Mdia(sc. XV) tnhamos unidades territoriais com finalidade meramente religiosa passamos a

    ter a partir do sculo XVII, passamos a ter como finalidade do Estado meramente

    humana, o bem comum do homem a utilidade de todos, o Estado tem de tentar

    alcanar a felicidade terrena do homem e da vem a prpria riqueza, da o Adam Smith

    no sc. XVIII escrever a Riqueza das Naes, a necessidade de crescer

    patrimonialmente de forma a sustentar todas as pessoas da entidade estadual.

    S que no mbito do Estado, uma ideias que para ns hoje inata que a da

    personalizao do Estado. O que isto?

    a concepo do Estado como pessoa jurdica, como pessoa colectiva, influenciada

    quer pelos titulares dos rgos num determinado momento quer da prpria comunidade,

    ou seja essencial para a compreenso da realidade Estado que ns tenhamos uma

    diferenciao entre os titulares dos rgos, os rgos e o prprio Estado.

    O rgo mantm-se, faz parte do Estado, o titular do mesmo, eleito nomeado,

    efmero.

    Dai houve uma necessidade de fazer essa distino e essa distino vai levar

    concepo da personalidade do Estado.

    Ora quem que fez a teorizao do Estado, no sculo XIX, e apenas neste sculo foi

    Jellinek, contudo preciso lembrar que no sculo XVI e XVII distingue-se bem entre

    Estado e os seus titulares, mas apenas Jellinek que vai teorizar a despersonalizao doEstado, fazendo o contraponto com a Idade Mdia.

    importante fazer-se a distino entre o Estado moderno e a Idade Mdia porque na

    Idade Mdia tinha uma:

    Concepo patrimonial do poder poltico, o territrio era coisa prpria do rei;

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    Concepo orgnica da sociedade, uma estruturao da sociedade como se deum corpo se tratasse, com cabea, tronco e membros, sendo a cabea o rei que

    dirige todo o resto da sociedade, depois uma estratificao.

    Por outro lado, havia uma concepo paternalista do poder poltico, o rei era o pai do rei

    dos sbditos tinha um funo da o objectivo da sociedade ser metafsico era o rei que

    simbolizava a imagem de um pastor que tinha de levar a sua comunidade para a

    salvao. E esta concepo religiosa de Estado que se altera no sculo XVII com o

    Estado Moderno, isto deixa de existir. E com esta realidade vai fazer com que tenhamos

    que distinguir duas situaes o poder politico e o poltico legislativo e de facto a ideias

    da despersonalizao do Estado como pessoa colectiva diversa dos seus titulares.

    E isto de facto que nos leva despersonificao, o rei do poder poltico servente,

    servidor do Estado e como servidor, tal como todos ns, ele tem de obedecer s leis do

    prprio Estado.

    Este um avano tremendo do mbito da concepo poltica do sculo XVI.

    Haver aqui uma distino a fazer.

    Por exemplo o rei constitucional obedece s prprias leis que so elaboradas pelas

    Cortes ou pelo governo e no sculo XVI tambm h uma distino entre poder poltico e

    Estado, o sculo XVIII tambm tem uma personalizao do Estado, mas ter o sculo

    XVIII uma total independncia ou uma total submisso do monarca ao prprio Estado?

    Aqui j no totalmente, temos na teoria, mas j no temos na prtica e de facto

    importante ter isto presente, porque isto acaba por se transpor para as prprias relaes

    internacionais.

    Ora muito bem, quando ns olhamos para o sculo XVIII, para o poder absoluto, para o

    absolutismo o que que ns temos:

    Quem que elabora as leis? O rei Quem que manda aplicar as leis? O rei Quem que nomeia os juzes? O rei

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    Tudo esta a ser tratado em torno do rei ento pergunta-se e o rei deve obedecer s

    prprias leis que elabora?

    Se ele que elabora a lei, se ele que manda aplicar a lei, ter ou no que se sujeitar

    prpria lei?

    Na teoria a resposta tambm bvia, sim em conscincia, mas no h ningum que o

    obrigue. E isto uma realidade para o direito internacional que , o Estado participa ou

    na construo de uma comunidade internacional sim ou no?

    Sim! O Estado quer criar regras comuns para todos e se algum deles no cumprir, o que

    que se faz?

    Ou se entra em guerra ou simplesmente no se faz nada. Simplesmente esta concepo

    setecentista acaba por estar muito presente ainda no pensamento internacional quer do

    sculo XVIII, quer do sculo XIX e mesmo no sculo XX, porque isso que se deu a

    sociedade das naes, a organizao das naes unidas foi a incapacidade dos Estados

    em criar condies de autolimitarem-se a sua prpria conduta e de facto temos aqui uma

    herana normal para o mundo moderno, porque o Estado foi construdo e a prpria

    organizao internacional imagem da sua organizao interna e portanto as

    deficincias que encontramos a nvel interno tambm encontramos a nvel internacional.

    Mas para alm da figura do Estado, e constituindo a essncia do Estado nos temos a

    figura da Soberania.

    A soberania aquilo que permite reconhecer que um Estado no tem superior nem na

    ordem interna nem na ordem externa.

    A soberania o poder de reconhecer que um Estado no tem superior nem na ordem

    interna nem na ordem externa, ou seja, que independente prpria ideia de soberania

    est a total independncia da comunidade poltica e portanto um Estado que soberano

    um Estado que a nvel interno pode fazer:

    Pode legislar;

    Escolher o seu sistema de governo, inerente sua ordem interna, independnciainterna;

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    Fazer a guerra/ celebrar a paz, reduto de soberania; Cunhar moeda, que essencial; Nomear representantes noutros Estados, o direito de representao, nomear e

    receber;

    Fazer a justia; Direito de clemncia, o direito de graa.

    Estes vrios requisitos, caractersticas da soberania foram teorizadas por Jean Bodin,

    nos seus seis livros da Repblica, vem dizer onde esta a soberania interna, isto no sculo

    XVI.

    Se nos passarmos do sculo XVI e andarmos at ao sculo XVIII, encontramos

    Montesquieu, e todas estas caractersticas que caracterizam a soberania interna que eram

    vertidas em trs grandes reas:

    Poder legislativo Poder executivo Poder judicial

    isto que marca a soberania interna, o Estado, poder, lei, criar condies para as

    aplicar e aplic-las coactivamente.

    E na ordem internacional a soberania caracterizada pela ideia da independncia

    territorial, o Estado soberano aquele que igual na ordem internacional,

    independentemente do seu prprio tamanho, tanto faz que o Estado tenha 10 ou 100 mil

    habitantes tenham 500 mil km quadrados tenha 300 mil km quadrados totalmente

    indiferente.

    Desde que ele se comporte igual na ordem interna, no depende de ningum para

    organizar enquanto Estado para atingir os seus fins, ento estamos perante um Estadosoberano na soberania internacional.

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    E de facto a caracterstica da independncia externa do Estado conhece 3 reas:

    Ius tractatum (celebrar tratados); Ius legationes (enviar/receber embaixadores); Ius belli (fazer a guerra e declarar a paz), o reduto de soberania.

    importante notar que se o Estado abdica destas realidades deixa de ser independente

    na ordem politica externa.

    Um exemplo de Estados, que o so mas que, no tm estas prerrogativas internacionais.

    No ano de 1992/1994 quando houve o conflito em Timor, Portugal teve um grande

    desenvolvimento com a tomada de posio na Organizao das Naes Unidas com o

    objectivo de se ver o reconhecimento internacional de Timor, e tal objectivo criou-nos

    grande oposio, da Indonsia com o seu ministro dos negcios estrangeiros que se

    opunha a perder uma parte do seu territrio.

    Por outro lado tivemos a situao da Austrlia, que queria manter Timor na Indonsia,

    assim, a Austrlia aproveitou a redefinio e retirou o seu embaixador de Portugal,

    tendo ficado Portugal dependente do seu embaixador em Paris, porque entenderam que

    no haviam condies para manter presena diplomtica em Portugal. Isto demonstra o

    impacto do prprio reduto do Estado fazer isto, no houve declarao de guerra, porque

    na realidade fizeram um tratado com o embaixador de Paris, mas a representao

    diplomtica deixamos de a ter de um momento para o outro.

    Mas temos Estados que tm uma independncia interna ou uma autonomia interna que

    so os Estados federados, os EUA so compostos por 52 Estados, eles tm ou, no tm

    poderes internos, eles aplicam os seus prprios impostos, mas h uma coisa que j no

    podem fazer definir a poltica internacional, pois esto dependentes das decises do

    Estado Federal, ou seja os vrios Estados federados tm independncia na ordem

    interna, j no tm independncia na ordem internacional, ou seja eles no tm acapacidade de celebrar tratados, de enviar misses diplomticas e declarar a guerra.

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    Questo que levou a muitas dvidas quer no sculo XVII, quer no sculo XVIII: ser

    que celebrado internacional, um tratado com outro Estado fico limitado

    soberania interna no meu poder soberano?

    A resposta no, porque o tratado depende da vontade soberana do Estado. O tratado a manifestao do poder soberano, do poder poltico do Estado, como tal o Estado pode

    contratar com outrem.

    Diz Vicente Ferrr: se os homens se organizarem em sociedade civil para se

    desenvolverem e crescerem, ento esta caracterstica aplica-se s Naes. E portanto, as

    naes entre elas tambm se unem com objectivo de encontrar solues para os

    problemas dos povos que possa por em causa a manuteno da paz.

    A grande tendncia na construo do direito das relaes internacionais, que a lei

    natural se aplicava sociedade civil, tambm se aplicaria s sociedades dos Estados,

    isto para dizer que as, relaes internacionais, o direito internacional pblico so

    construdos imagem e semelhana dos direitos nacionais do direito internacional,

    nomeadamente o direito comum, que o direito romano, que vai construir o direito das

    relaes internacionais.

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Aula terica de Histria das Relaes Internacionais

    Aula n 2

    Lisboa, 28 de Setembro de 2009

    Ainda no mbito do Estado falaremos da questo relativa ao territrio e a questo sobre

    os mares.

    Em relao ao territrio ele o elemento fsico do Estado. tambm no territrio que o

    Estado exerce de forma plena e exclusiva os seus direitos de soberania.

    Essencial para a existncia do Estado o territrio: h Estado sem territrio.

    Exemplo: ordem de malta

    Como h Naes que so maiores que o seu prprio Estado. Como por exemplo a

    Nao Judaica, que uma nao que tem uma comunho de objectivos de religio

    comuns.

    Mas em regra um Estado deve coincidir com um determinado territrio, at porque

    nesse territrio que o Estado vai exercer toda a jurisdio: poder executivo, legislativo ejudicial.

    Isto significa tambm que necessrio no mbito das relaes internacionais, definir ou

    delimitar as fronteiras do Estado.

    E de facto as fronteiras do Estado podem ser delimitadas de duas formas:

    Modo natural aproveitar todos os acidentes naturais para fazer a delimitaoterritorial (montanhas, rios, precipcios).

    Forma convencional fronteiras dos Estados podem ser definidas atravs detratados internacionais entre os Estados limtrofes.

    Foi devido s fronteiras, na necessidade de delimitar fronteiras que muitos dos conflitos

    internacionais surgiram.

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    Sendo Portugal considerado um Estado que tem fronteiras com Espanha desde o

    Tratado internacional de delimitao de fronteiras no reinado de D. Dinis, o tratado de

    Alcanices, e com este se vai definir as fronteiras portuguesas at aos finais do sculo

    XVIII. No sculo XIX vai surgir problemas com Olivena devido s invases

    napolenicas.

    A delimitao de fronteiras essencial: para delimitar o territrio para exercer a

    jurisdio.

    Mas no apenas na crosta terrestre que o Estado vai exercer a jurisdio, exerce

    tambm sobre os rios e sobre o mar.

    O mar um dos grandes problemas em termos de delimitao de fronteiras.

    Em termos terrestre e martimos, o Estado na actualidade exerce jurisdio total e

    exclusiva no chamado mar territorial e tambm na chamada zona econmica exclusiva

    (+/- 100 milhas da costa).

    Enquanto no mar territorial o Estado exerce jurisdio total e exclusiva como em terra,

    na zona econmica e exclusiva, nos temos capacidade de proteco das faunas e floras

    marinhas bem como bvio poder retirar proveitos econmicos que advenham dessas

    plataformas continentais.

    Por isso que Portugal tem, com os arquiplagos da Madeira e dos Aores uma das

    maiores zonas econmicas exclusivas da Unio Europeia, que a rea da Madeira e dos

    Aores e do prprio continente quase que cobre o tamanho da Rssia mas no sculo

    XVI, nada do que estamos a falar existia.

    E de facto sabia-se que havia uma rea onde o Estado exercia funes de total

    jurisdio, por dois motivos, por um lado proteco, era necessrio ter uma distncia

    entre a costa e um determinado ponto que permitisse ao Estado defender-se de ataques

    externos, como tambm era necessrio essa mesma zona para fazer a recolha dos bensque o prprio mar d, a pesca.

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    O problema que se coloca aqui saber qual a distncia, at onde que isto vai, e aqui

    os autores do sculo XVI, XVII, XVIII, apesar de haver uma linha comum de

    pensamento, essa linha comum dizer que vai at 3 milhas da costa, portanto desde a

    costa e uma distncia de 3 milhas o Estado detm total jurisdio sobre aquelas guas,

    em que se entendia que 3 milhas era a distncia de um tiro de canho, ai estava a

    medio o tiro de canho, como distncia de proteco. At onde o tiro de canho vai

    aqui o limite da minha jurisdio total do mar, porque a partir da eu j no consigo de

    terra defend-lo.

    Mas depois disto havia uma outra faixa martima de 100 milhas onde o Estado no

    exercendo jurisdio exercia proteco, nessas milhas ele tinha capacidade de proteger,

    proteger nomeadamente delineando rotas martimas, poder proibir navios de navegaremnessa faixa.

    Houve um autor francs do sculo XVIII, Rayreval defende que a delimitao deve ser

    feita at ao ponto de vista humano da costa, quanto que isto , impossvel de saber,

    quanto mais andamos maior o horizonte como bvio, sendo esta posio minoritria,

    apenas s dele prprio, por ser difcil de demonstrar qual a verdadeira distncia.

    Bom antes de vermos ainda os mares, uma palavra sobre os rios.

    Os rios, at ao Congresso de Viena, em 1815 no eram regulados. E portanto se o rio

    nasce e tem a foz no prprio Estado no h problema nenhum.

    O problema como bvio so os rios internacionais, rios que atravessam vrios Estados

    e s a partir de 1815 com o Congresso de Viena, o congresso que pe fim organizao

    napolenica, tendo sido necessrio restabelecer a organizao poltica na Europa, para

    isso que serviu o Congresso de Viena, vai-se definir as regras que devem vigorar nos

    rios que atravessam vrios Estados. Esses rios na altura eram o Danbio e Escala.

    Posteriormente essas regras vo ser aproveitadas para o Reno e tambm sero utilizadas

    na Amrica do Sul, para os rios que atravessavam vrios Estados e as colnias

    espanholas.

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    Estas regras foram necessrias e estabeleceu-se quem que manda em qu, dentro de

    um Estado a jurisdio desse Estado, contudo rios que atravessassem vrios Estados

    eram necessrio criar regras de navegao nesses rios nos troos navegveis entre a foz

    e at ao limite onde j no era possvel navegar mais.

    E para isso como em muitos casos se atravessavam muitos Estados criaram-se

    comisses internacionais, compostas por todos os representantes dos Estados por onde

    esse rio atravessava para criar as regras de gesto das partes do rio e de facto isto

    demonstra, que tendo nos vindo a falar da soberania interna em que o Estado exerce a

    jurisdio quer terrestre quer fluvial a criao das comisses internacionais do sculo

    XIX vem ser uma limitao voluntria ao prprio direito soberano do prprio Estado.

    O Estado admite autolimitar-se para que os leitos navegveis dos rios sejam utilizados

    por todos os Estados banhados por esse rio.

    Estas regras criadas para os rios europeus, depois transpostas para os rios americanos,

    foram tambm utilizadas em frica para o rio Zaire.

    Relativamente aos mares, nomeadamente ao mar territorial (de 3 milhas e s outras de

    dimenso de 100 milhas), esta questo da navegabilidade do mar criou problemas a

    Portugal no sculo XVII, porqu, so as chamadas teses do:

    Mar clausum Mare liberum

    O mar clausum(mar fechado), era defendido pelos portugueses e pelos espanhis, onde

    o mar que unia a metrpole aos territrios descobertos era um mar restrito navegao

    do pas descobridor ou de quem ele autorizasse.

    Isto porque diziam os portugueses e espanhis que eles tinham iniciado os

    descobrimentos, que eles tinham descoberto novos percursos martimos para chegar a

    territrios desconhecidos, ou territrios que se conheciam por terra mas no por mar,

    como o caso da ndia, ento eles tinham:

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    Prioridade da descoberta, sendo prioridade no s do territrio mas tambm do caminho

    para l chegarem e privilgio de navegar;

    Tinham ocupado esses territrios;

    Autorizao papal para colonizarem territrios e navegarem at l.

    A tese do mar clausum defendida por Selden (quis defender os mares que

    circundavam a Gr-Bretanha e nomeadamente o Canal da Mancha, considerado como

    territrio ingls e no como francs) e pelo Frei Serafim de Freitas (portugus).

    Tese contrria, do Mare liberum foi defendida por Grcio. Grcio vai basear-se nos

    princpios do Direito Romano e vai dizer, nem pensar, o mar no aproprivel, o mar

    uma coisa pertencente a todos (res communis omnium), no passvel de ser

    apropriado por ningum, quer por mar, quer pelo ar (martimo e areo).

    Diz Grcio, ateno que esta tese eram defendida pelos prprios romanos em relao ao

    mar mediterrneo, que banhava a totalidade do imprio romano, entendiam os romanos

    que as costas, as praias e a prpria gua do mar no era aproprivel, pertenciam a todos,

    e portanto baseando-se neste princpio Grcio vai dizer, Portugueses e Espanhis no

    podem reivindicar o mar dos territrios descobertos, porque o mar inaproprivel, salvo

    questes de proteco/segurana. E aqui Grcio destacando as razes de segurana

    defendia o mar territorial, referindo-se s 3 milhas, s quais como vimos o Estado tem

    jurisdio total. A partir das 3 milhas o alto mar pertence a todos e ao pertencer a todos

    s em situaes de extrema justificao, nomeadamente a guerra que poderiam levar a

    que se aceitasse que algum Estado controlasse o mar.

    Esta tese doMar liberumtem por objectivo contestar a proibio que os portugueses e

    espanhis deram aos navios holandeses de navegarem nos mares da ndia.

    Aqui surge um problema, seno vejamos: em bom rigor quem mandava eram os

    espanhis. Porque a tese do Mar clausum, foi uma tese defendida enquanto Portugal

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    teve em unio dinstica com Espanha, ou seja uma tese defendida ps 1580. De facto

    quem criou este problema foram os espanhis que fazem guerra com os holandeses.

    Para quem no sabe cabe distinguir no sculo XVI: rei espanhol, rei dos pases baixos e

    imperador do Sacro Imprio Romano-Germnico.

    Quando morre Carlos V h um problema de diviso do Imprio pelos vrios filhos de

    Carlos V e entendia-se que Espanha, reinado de Filipe II, e este queria tambm reinar os

    Pases Baixos, a Holanda, mas os holandeses revoltaram-se contra Filipe II, tentando

    uma emancipao, uma independncia do rei espanhol, e nesta sequencia e aps a unio

    dinstica entre Filipe II e Portugal com a morte de D. Sebastio os espanhis vo

    estender a sua poltica contra a Holanda e vo proibir que os holandeses naveguem nos

    mares dos portugueses e espanhis, nomeadamente os holandeses tinham-se instalado

    na regio onde hoje a Indonsia, nas ilhas que compem o arquiplago da Indonsia,

    que para chegarem l tinham de passar pelo mar da ndia, e os espanhis diziam que o

    mar da ndia era dos portugueses e portanto estava fechado e ao estar fechado eles

    proibiam que eles navegassem e nesta sequncia Grcio vai dizer nem pensar que o mar

    est aberto porque ele coisa prpria da humanidade, no propriedade de ningum.

    Relativamente a esta questo fundamental, os contraditores de Grcio vm dizer est

    bem, temos as descobertas, temos a posse e temos uma outra coisa as bulas pontifcias,

    o Papa concedeu direitos de colonizar e desenvolver as regies descobertas pelos

    portugueses e espanhis para isso, os mares tm de estar preparados para a navegao

    dos espanhis e dos portugueses, para alm disso acresce que os prprios portugueses e

    espanhis fizeram a diviso do mundo no Tratado de Tordesilhas, em que uma parte era

    portuguesa outra era espanhola e o Papa veio ratificar este tratado. Portanto se o Papa

    ratificou este tratado porque ele concorda com ele, logo a autoridade mxima e se o

    Papa a autoridade mxima logo os restantes povos no podem navegar sem a

    autorizao dos espanhis nem portugueses.

    Esta tese era muito bonita se nos ainda estivssemos na Respublica Christiana, mas na

    realidade no sculo XVII a seguir Reforma Protestante o Papa perdeu o seu poder, ao

    perder todo o poder, e ainda por cima a Holanda tinha ficado pelo protestantismo, tinha

    emancipado do ponto de vista religioso o papado, vai dizer uma coisa muito simples

    pela voz de Grcio: se o Papa ratificou o tratado entre Portugal e Espanha, o tratado notem eficcia erga omnes (perante terceiros para os outros Estados, at porque os outros

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Estados j no so subservientes a Roma e portanto a tese de que as Bulas pontifcias

    fechavam os mares uma tese errnea, porque ns holandeses j no estamos regidos

    pela entidade Papal.

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Aula terica de Histria das Relaes Internacionais

    Aula n 3

    Lisboa, 30 de Setembro de 2009

    Na ltima aula vimos a relao das teorias do mar liberume do mar clausum, tudo isto

    relativo liberdade do mar, que importante nas relaes internacionais,

    nomeadamente na forma convencional da celebrao de tratados de delimitao de

    fronteiras.

    Para se terminar a matria do captulo Estado, falemos umas breves palavras sobre a

    Razo de Estado.

    A partir do sculo XVII, com a teoria do equilbrio do poder, ou seja com a necessidade

    de que os Estados podiam equilibrar a sua poltica equidistante e ao mesmo tempo

    equilibrada nas relaes entre eles, ou seja s podamos ter Estados soberanos ou

    potncias mdias ou pequenas para evitar a guerra e a rivalidade.

    A partir do momento em que ns temos o conceito de Estado temos a teorizao da

    Razo de Estado pela primeira vez com Giovani Botero (sc. XVII), defendendo a

    Razo de Estado como sendo: os meios disposio do Estado para fundar, conservar e

    para engrandecer (para aumentar o seu poder territorial e econmico) o prprio Estado.

    E baseando-se nestas ideias que homens como o Cardeal Masarini em Frana, o prprio

    Cardeal Richelieu tambm em Frana, primeiro com Lus XIII, depois Lus XIV, o

    celebre rei sol vo desenvolver uma ideia poltica de crescimento estadual. Isto da

    Razo de Estado desenvolvida no s do ponto de vista da poltica, da diplomacia e,

    como do ponto de vista econmico.

    Esta tripla vertente:

    1. Poltica;2. Diplomacia.3. Economia;

    So factores vitais para a Razo de Estado.

    Hugo H. Arajo 16

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    1. PolticaDo ponto de vista poltico interessa criar as condies e manter o Estado. E isto faz-se

    com base na preservao e desenvolvimento das Leis Fundamentais. importante ao

    Estado terem leis fundamentais, ao que hoje chamaramos uma Constituio. Leifundamental essa que vai permitir a sua estruturao poltica.

    Para alm disso importante criar o funcionalismo do Estado. Pela primeira vez

    passamos a ter a figura do Secretrio de Estado (figura da Razo de Estado, aparece no

    sculo XVII), algum que est ao servio do Estado na gesto da coisa pblica. J no

    o rei directamente com os seus conselheiros, mas o rei delega competncias em homens

    que esto preparados e o rei s tem uma misso que governar o reino e da termos o

    secretrio de Estado do reino, secretrio de Estado para a guerra ou para os negcios

    externos, para as relaes diplomticas.

    Estas duas figuras so essenciais, mas para alm dos secretrios de Estado que tm o

    sentido de oficias temos depois toda a construo do Estado administrativo, que passa

    pela criao de cargos pblicos em favor do Estado (reino), para administrar o Estado

    (reino), na funo jurisdicional, os juzes com a justia.

    Com a Razo de Estado criamos a concepo elptica de poder, tudo comea com o

    Estado e termina com ele.

    Relativamente figura da Lei Fundamental, o terico da Razo de Estado diz que a

    histria do Pas a histria passa a ser um instrumento essencial na defesa do Estado

    porque a preservao da tradio e aqui que surge a figura da Lei Fundamental.

    A Lei Fundamental que aparece no sculo XVII em todos os Estados europeus no era

    mais do que a lei que deveria prescrever os direitos do rei, direitos e deveres dos

    sbditos e regras sucessrias.

    No podemos esquecer que estamos a falar de Estados monrquicos, e o essencial para a

    defesa do regime monrquico a definio das regras de sucesso ao trono, para que

    no haja vacatura.

    Hugo H. Arajo 17

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Se h vacatura, pode criar-se instabilidade poltica, podendo dar origem guerra e

    revolta, da ser fundamental que a Lei Fundamental definam as regras de sucesso ao

    trono.

    E estas Leis fundamentais vo ser criadas em quase todos os reinos europeus: emFrana com a Lei Slica, em Portugal com as Cortes de Lamego, as Leis Fundamentais

    que vo exprimir a construo da Razo de Estado so as Cortes de Lamego

    As Cortes de Lamego:

    Nunca existiram, um diploma apcrifo, mas vigorou durante 300 anos. Em 1640

    temos a restaurao da independncia aps 60 anos de unio dinstica com Espanha,

    com uma guerra civil, os portugueses aclamam rei D. Joo IV, que para o legitimar era

    necessrio dizer que D. Joo IV era rei legtimo e que os Filipes eram ilegtimos, que

    tinham usurpado o poder.

    Descobre-se que D. Afonso Henriques, nas Cortes de Lamego tinha acordado com as

    classes sociais (povo, clero e nobreza) e nessas actas acordaram as regras de sucesso ao

    trono, concluindo que os Filipes eram usurpadores.

    Quem descobriu essas actas foi o Frei Antnio Brando, mas este s tinha visto uma

    cpia e no sabia onde.

    Contudo, estudos de Alexandre Herculano, provaram a falsidade e a inexistncia das

    Cortes de Lamego, nem mesmo D. Afonso Henriques esteve em Lamego.

    Durante muitos anos pensou-se que tinham sido os espanhis que tivessem roubado as

    actas.

    As ltimas Cortes Portuguesas em 1625, deliberam uma alterao, um aditamento s

    Actas das Cortes de Lamego, apesar de terem carcter consultivo as Cortes em matrias

    fundamentais tinham carcter deliberativo.

    Aqui estamos perante um diploma fundamental, funda e justifica a Razo de Estado.

    Mas a Razo de Estado acaba por ser incorporada por outros elementos e estes

    elementos so a prpria poltica externa e nesta a teoria da Razo de Estado vai basear-se sempre em dois grandes princpios:

    Hugo H. Arajo 18

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Independncia; Igualdade.

    Estes princpios fundam a Razo de Estado. Porqu?

    O prncipe soberano na ordem interna (porque no tem superior a no ser Deus) e

    independente na ordem externa isso a definio da Razo de Estado. E essa

    independncia na ordem externa vai fazer com que os princpios da Razo de Estado

    possam declinar ou recusar a assinatura de um tratado internacional sempre que esse

    tratado possa colocar em causa a grandeza do Estado.

    A independncia vista a um ponto tal, que sempre que se entenda que pode estar sob

    pena de um tratado por em causa a independncia ou a grandeza do Estado o prncipe da

    Razo de Estado no assina esses tratados internacionais, est liberto.

    Para justificar e para fundar essa mesma independncia que um outro elemento

    coadjuvante ao desenvolvimento da razo de Estado a diplomacia.

    A diplomacia essencial porque vai ser necessrio criar um corpo de profissionais,habilitados, competentes, preparados para servirem noutro pas os interesses do seu

    Estado.

    Lendo alguns livros de diplomacia, descobriremos as construes ardilosas das relaes

    diplomticas nos sculos XVII e XVIII.

    O embaixador contrariamente ao sculo XIX, em que o embaixador um oficial do

    Estado, a partir do sculo XIX, a partir de 1836, o embaixador como hoje um

    funcionrio do Estado, so especialistas tm uma carreira prpria, a carreira

    diplomtica, mas integra os oficiais do Estado.

    Nos sculos XVII e XVIII, o embaixador no era uma carreira. O embaixador era

    escolhido por trs caractersticas:

    Tradio familiar; Mrito;

    Hugo H. Arajo 19

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    Prudncia, o embaixador devia ter a capacidade de discernir o que era til enefasto para a poltica do seu pas.

    No sculo XVII temos muitos tratados de prudncia no s com embaixador como para

    o prprio prncipe.

    Os Espelhos dos Prncipes so a cartelizao da ideia da Razo de Estado, no ensino de

    como deve ser um prncipe e a base do ensino centrava-se em dois conceitos:

    Prudncia (ideia medieval, a capacidade de discernir o verdadeiro do falso); Justia (prncipe devia ter uma conduta recta, baseada na justia).

    O papel do embaixador crucial no sculo XVII e XVIII, tendo trs funes

    fundamentais:

    Negociador de casamentos rgios (tratados), competia-lhes avaliarem queprincesas existiam na Europa e qual o interesse estratgico-poltico em celebrar

    o casamento dessas princesas com o rei de Portugal. um dos assuntos mais

    importantes, porque teria que haver o cuidado de com a poltica de casamentos

    com Espanha, que era uma tendncia de se correr novamente o risco de uma

    unio dinstica entre Portugal e Espanha. Olhando para a historia, apesar de D.

    Joo IV ser casado com uma espanhola, com D. Lusa de Gusmo que ter dito

    Antes rainha um dia, que duquesa a vida inteira, isto explica a fora poltica

    que em determinado momento, e ela vai ser a defensora da insistncia do no

    casamento dos seus filhos com princesas espanholas e so os embaixadores quevo ter esse papel de procurarem e negociarem e de facto o que vai acontecer,

    que a ns, pas pequeno e em 1640, quando h necessidade de casar os prncipes,

    visto que at a apenas se procurou, perguntaram embaixadores quais so os

    reinos que estrategicamente nos podem ajudar a defender a nossa independncia

    e por isso vo casar a filha com o rei de Inglaterra, D. Catarina vai casar com

    Carlos II de Inglaterra, para se sedimentarem relaes portuguesas e inglesas, e

    portanto no caso de haver invaso espanhola, Portugal ter o apoio dos ingleses, evai-se casar o prncipe herdeiro com uma francesa, para se manter a

    Hugo H. Arajo 20

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    equidistncia de foras no continente e na parte insular. Se Espanha invadisse

    Portugal nos teramos como ajuda os ingleses e os franceses, porque uma

    princesa francesa era casada com o rei portugus e porque a rainha inglesa era

    portuguesa. Isto til Razo de Estado

    Mediadores de delimitao de fronteiras Declarao de guerra e declarao de paz, era atravs do embaixador que a

    guerra era declarada, e de facto a guerra era iniciada de uma forma simblica, o

    embaixador era chamado para o seu pas, portanto a retirada, a sada

    intempestiva de um determinado pas era sinal de que iria ser declarada uma

    guerra.

    Econmico

    Razo de Estado tambm tem caractersticas especficas, e estas tm um objectivo que

    o engrandecimento econmico, da riqueza da nao. o caso da obra de Adam Smith

    A Riqueza das Naes do sculo XVIII. Conceito que ter importncia no sculo

    XVIII e XIX, o conceito de utilidade.

    til, tudo aquilo que for conveniente para o aumento da riqueza da Nao.

    Com base neste conceito de utilidade que se desenvolvem as razoes econmicas nos

    vrios Estados no sculo XVII e XVIII, e passa por onde:

    Incremento agricultura; Incremento da indstria; Incremento do comrcio criao das companhias privilegiadas ou majestticas,

    sendo exemplo em Portugal a companhia de Pernambuco, na Holanda a

    companhias das ndias.

    Nestas companhias mantinham-se relaes com outras companhias.

    Preocupao Social

    Hugo H. Arajo 21

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Necessidade de ser dada a todo o povo (todos os grupos sociais) aquilo que eles no

    tinham capacidade de aceder por nascimento e portanto a preocupao social

    nomeadamente no desenvolvimento da pera, das touradas, do teatro.

    aquela ideia tpica de Jlio Csar: Vamos-lhes dar po que o desenvolvimentoeconmico, vamos-lhes dar circo que a manifestao cultural.

    No campo ainda da poltica surge-nos uma questo de saber se o Rei ou no obrigado

    a cumprir a sua lei?

    Os Tratados da prudncia dizem que sim, por uma questo de exemplo para seu prprio

    povo, mas ele pode ou no cumprir sem penalizao.

    Aqui h limitao, pode o Rei no cumprir sem penalizao, as leis que elabora, mas j

    no pode deixar de cumprir as Leis Fundamentais, e caso no cumpra pode colocar em

    causa a prpria existncia do reino, tambm obrigado a cumprir o direito natural e o

    direito divino.

    Os tericos da Razo de Estado colocam aqui uma delimitao ao incumprimento do

    rei, numa trplice obrigacional:

    Leis fundamentais;

    Direito natural;

    Direito divino.

    Por uma razo muito simples, porque o prprio direito natural a fonte do prprio

    poder do rei. Se o rei no cumpre o direito natural, ele no est a cumprir o prprio

    direito que o permite manter-se frente do reino, pois o direito natural que o permite.

    Estas ideias da Razo de Estado no so especficas de Portugal. Em todos os reinos

    (sculos XVII e XVIII), seguem o mesmo pensamento poltico e econmico, fazendo

    assim o equilbrio dos Estados, evitando assim as guerras.

    Hugo H. Arajo 22

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Aula terica de Histria das Relaes Internacionais

    Aula n 4

    Lisboa, 07 de Outubro de 2009

    Abordemos o tema da Guerra, um tema forte das Relaes Internacionais.

    Um Estado soberano tem capacidade de fazer a guerra e celebrar a paz, sendo este o fim

    da sociedade.

    A guerra do ponto do ponto de vista patolgico deve ser entendida como o ltimo

    recurso para atingir a paz.

    A paz na ideia de justia, como na Idade Mdia e no seguimento de S. Antnio, a paz

    como uma virtude. Como j dissemos, a paz o fim da sociedade.

    A guerra legtima s se tiver justa causa.

    Guerra justa se invadirem o nosso territrio, se esgotarmos os meios diplomticos.

    Contra o infiel da religio Guerra Peninsular contra os rabes.

    Na Republica Cristiana o Papa e o Imperador diziam se era a guerra justa ou injusta.

    Contudo no basta esgotar os meios diplomticos, necessrio esgotar meios

    internacionais (Papa e Imperador), segundo a escola dos Glosadores e dos

    Comentadores.

    Nos sculos XVI e XVII, a guerra no do ponto de vista ideolgico, vista como

    forma de conduo do Estado. No por questes religiosas, mas para a sobrevivncia do

    Estado, para a independncia do Estado.

    A guerra era olhada para manter a paz internacional. Assim a guerra deve ser justa

    quanto aos fins e aos meios que utiliza.

    A guerra justa pode no ser guerra humanizada, era o vale tudo, porque a guerra j

    estava legitimada.

    Hugo H. Arajo 23

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Da era necessrio criar regras para as guerras, limites para a guerra. A guerra como

    engrandecimento da Razo de Estado.

    Para os economistas do sculo XVIII e XIX, mais propriamente Adam Smith e

    Montesquieu, a guerra um obstculo economia, circulao de bens pelos Estados,pe em causa o crescimento do Estado.

    A guerra o limite que tem de se evitar.

    Mas como evitar a guerra (meios de resoluo pacifica, composio)

    Bons ofcios Mediao Arbitragem

    Bons ofcios so o uso que um Governo faz da sua autoridade, influncia e amizade

    para reaproximar Estados desavindos, aconselhando e propondo meios de resoluo.

    de livre disponibilidade do terceiro Estado, que se oferece para aconselhar, afim de

    evitar a guerra.

    No so obrigatrios, e mesmo a deciso no obrigatria, um simples

    aconselhamento.

    Mediao Estado presta o seu auxlio para resolver questes internacionais pendentes

    entre 2 ou mais Estados.

    Vai mais longe, os Estados desavindos convidam Estados mediadores. Este, de forma

    imparcial tem de resolver o conflito internacional.

    Os Estados em conflito podem no seguir a posio do Estado mediador, da se conclui

    que no obrigatria. uma tentativa de resoluo.

    Hugo H. Arajo 24

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Arbitragem obrigatria. o recurso por um/ mais Estados a uma terceira entidade

    que vai resolver de forma definitiva o conflito entre eles, ou seja, entre os desavindos.

    Na arbitragem, fica disposio dos Estados em conflitos o arbtrio que pode ser outro

    Estado, um jurista internacional, ou qualquer instituio que os Estados acordem queseja capaz de resolver o conflito. Conceito nasce no sculo XVIII, e cresce no sculo

    XIX.

    Esta uma forma substitutiva de recorrer a Tribunais tendo o mesmo valor que deciso

    judicial.

    Vantagem a de poder escolher o Direito aplicado, parte os Estados podem recorrer

    por exemplo, equidade, recorrendo o arbtrio equidade para resoluo do conflito.

    Na deciso judicial isso no pode acontecer.

    Contudo aps a escolha do Direito tudo se resolve como se de um Tribunal se tratasse.

    A deciso irrecorrvel, sendo a deciso do rbitro a soluo para o conflito.

    Solues pacficas (soluo medieval):

    Recurso figura das represlias

    Represlias - possibilidade que um individuo de um determinado Estado que se sinta

    lesado pela prtica de determinado acto por outro Estado ou um individuo do Estado,

    fazer justia sobre uma pessoa do Estado que cometeu o delito.

    Exemplo: um portugus cumpre a parte do contrato com um espanhol para entrega de

    azeite.

    O portugus cumpre a parte do contrato, mas o espanhol no lhe paga porque o azeite

    no da qualidade que tinha pedido.

    A recorremos ao tribunal espanhol para obrigar a cumprir o contrato.

    O tribunal espanhol conivente com o seu patriota no decide, ou decide no aplicar a

    justia.

    Hugo H. Arajo 25

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    A o portugus sente-se lesado e na Idade Mdia podia recorrer ao rei, pedindo a este

    que fizesse justia, obrigando um espanhol em territrio portugus a fazer o pagamento

    do azeite.

    Quando posso ter represlias:

    Requerendo a autorizao do Prncipe (rei); Justa causa negao de justia como o exemplo acima; Inteno concreta que justifique a represlia.

    As represlias eram aceites na Idade Mdia, no campo da justia, pois esta uma forma

    de reconstruir a paz, no entrando em guerra.

    Na concepo orgnica da sociedade, se um visa o outro, consideram-se todos visados.

    No caso do exemplo, se um portugus foi lesado, considera-se que todos os portugueses

    foram lesados.

    Antes de haver represlias, devem recorrer para a justia papal para que o Papa resolva

    o conflito.

    Contudo nem todas as pessoas podiam ter represlias:

    Mulheres; Cleros; Estudantes; Peregrinos; Testemunhos de processos; Mercadores; Barcos; Marinheiros;

    Hugo H. Arajo 26

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Enviados diplomticos; Embaixadores.

    A obteno da paz no foi apenas objectivo da Razo de Estado para engrandecimento

    do Estado.

    A paz a longo da filosofia foi idealizada a Paz Perptua, ou seja, criar condies para

    evitar a guerra.

    No sculo XX, com a ONU tenta-se criar uma instncia internacional que tentasse

    resolver conflitos entre vrios Estados, tentando evitar a guerra entre os Estados.

    Hugo H. Arajo 27

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Aula terica de Histria das Relaes Internacionais

    Aula n 5

    Lisboa, 12 de Outubro de 2009

    Kant foi um dos grandes pensadores dos finais do sculo XVIII, teve influncia no

    pensamento europeu no sculo XIX.

    Kant apresenta uma proposta para a construo do sistema da paz perptua, baseado na

    ideia da Racionalidade do Estado, ou seja prope Kant a criao de uma Federao de

    Estados iguais, ligados por um contrato, e isto pensando que estamos no mbito da tese

    contratualista, e Kant um contratualista, ou seja baseia-se na ideia de um contrato, emque nesta Federao no h supremacia de um Estado perante outros, e portanto a

    federao de Estados com igual poder, teria a funo de manter a paz na Europa.

    Kant vai mais longe e diz que a nica forma da Federao ser bem sucedida era atravs

    da transformao de todos os Estados existentes na Europa em Repblica. Portanto, ele

    ab-rogava que o sistema poltico ideal para a Federao de Estados era a Repblica. E

    s havendo Repblicas que era possvel constituir uma Federao com rgo de

    superviso para manter a paz na Europa.

    Outra proposta de manuteno da paz perptua ou de criao de paz perptua, foi

    defendida por Bentham. E Bentham escreve um pequeno ensaio, intitulado: Ensaio

    filosfico acerca da paz perptua (1795).

    E Bentham tambm prope a criao de uma estrutura supranacional para manter a paz

    no continente europeu. E essa estrutura uma Confederao de Estados, com poder:

    legislativo, executivo e judicial. Ou seja, Bentham olhando para o modelo estadual vai

    propor uma estrutura supranacional, semelhante quela que conhecia do Estado.

    Para melhor se sedimentar a carta das naes prope Bentham que sistema judicial no

    deva funcionar apenas como tribunal mas tambm como sistema de arbitragem e

    portanto ele entendia que sempre que fosse necessrio dirimir conflitos entre Estados

    confederados, estes no deviam entrar em guerra mas sim recorrer entidade judicial

    Hugo H. Arajo 28

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    que teria funes recprocas no mbito da Confederao, funes essencialmente de

    arbitro nos conflitos entre os vrios Estados.

    Posto isto, vamos ver a questo, no mbito da guerra, a questo relativa guerra justa.

    Porqu?

    Fala-se em guerra, falamos em luta armada, falamos em conflitos entre Estados

    soberanos.

    Para que haja guerra necessrio saber se ela lcita ou ilcita. E mesmo dentro da

    guerra lcita necessrio saber se ela justa ou injusta. A guerra pode ser lcita, pode

    no ir contra os ditames do Direito internacional, mas podemos estar a falar de guerras

    no justas.

    E a guerra era justa quando, dizia-nos a Idade Mdia, a guerra assentava na clemncia e

    misericrdia, isto porque a preocupao medieval era assente na divinizao da

    sociedade. Estamos perante uma organizao csmica da sociedade e da o ser

    importante basear os princpios da guerra nos princpios da teologia crist.

    E tendo trabalhado estas duas virtudes teolgicas o Cardeal Hostiense vem delimitar as

    trs situaes em que a guerra justa:

    Quando autorizada pelo poder judicial (guerra judicial); Quando aprovada por uma autoridade com competncia para o fazer (guerra

    autorizada pelo prncipe nica entidade que na Idade Mdia podia autorizar a

    guerra), isto significa uma tentativa por parte dos reis de proibirem que outros

    senhores, que no eles, pudessem ditar o incio ou o termo de uma guerra. Aguerra s justa quando autorizada pelo rei. S nestes casos que a guerra

    lcita;

    Guerra necessria guerra feita contra os infiis para proteco contra o prprioEstado, e portanto estamos aqui a falar de uma guerra de proteco estadual. O

    Estado entra em guerra para se proteger, ao faz-lo uma guerra necessria.

    Hugo H. Arajo 29

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    So Toms de Aquino vem tambm ele trabalhar a ideia da guerra justa, e vem

    considerar que ns podemos ter guerra justa, em trs situaes e usamos trs vocbulos.

    A guerra justa se:

    Autorizada; Prosseguir a justia; Honesta.

    Isto quer dizer que a guerra justa se:

    Se autorizada pela entidade competente para a fazer (o rei); Se for adequada, havendo aqui uma ideia de proporcionalidade, eu no consigo

    ter o fim que pretendo, a no ser atravs da declarao de guerra. Dito de outra

    maneira, a nica forma que eu tenho de me impor perante terceiros a guerra,

    porque j esgotei os outros meios minha disposio, neste caso a guerra

    justa;

    Se for honesta, ou seja, aqui a honestidade no a forma como eu fao a guerra,aqui a honestidade para S. Toms de Aquino aquilo que me leva a declarar a

    guerra. No pode ser um motivo ftil, tem de ser um motivo justificativo,

    porque se no houver um motivo justificativo, eu no tenho uma guerra honesta.

    Vejamos, portanto que na ideia medieval a justia, a honestidade a proporcionalidade,

    so essenciais para a justia da guerra. Tal como eram para a prpria lei. A lei justa se

    for equitativa, a lei justa se for proporcional, a lei justa se for necessria, portanto, os

    requisitos que usamos para a figura da lei, so tambm utilizados para a figura da

    guerra. E aqui essencial uma adequao dos meios necessrios, aos fins.

    Falamos em guerra justa, falamos em guerra injusta.

    A guerra injusta aquela que:

    Hugo H. Arajo 30

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    No foi declarada pela autoridade adequada, com competncia para o efeito; Se desonesta; Se no forem usados outros meios para evitar a guerra.

    Ns falamos muito na ideia da guerra e normalmente vem-nos cabea, as guerras

    internacionais entre Estados e as guerras civis.

    S uma nota: em Histria das Relaes Internacionais, ns trabalhamos o conceito de

    guerra entre Estados, no trabalhamos o conceito de guerra civil. A guerra civil no

    tratada pelos internacionalistas, que uma guerra intra-fronteiras, diz respeito ao Estadoenquanto tal e s pessoas desse Estado, no tem a ver com a posio do Estado para com

    outras entidades. E portanto os conceitos que estamos a dar no so adequados para a

    guerra civil. Os internacionalistas no trabalharam a guerra civil.

    Passando da Idade Mdia para a poca do racionalismo e do iluminismo, vamos ver que

    a conceptologia relativa guerra justa desaparece, outra. E outra porque para ohomem do iluminismo, para o homem da razo de Estado, a guerra justa:

    Quando se atinge o bem do Estado, ou quando serve o bem do Estado; Quando se preocupa com o bem comum dos cidados.

    Vejam como as coisas mudam. A concepo jus-filosfica da Idade Mdia, para a poca

    racionalista, uma concepo diversa. Ns perdemos o substrato cogens, ns perdemos

    o substrato teolgico ou teocntrico. J no so as virtudes telogas: a clemncia e amisericrdia, que j no so o substrato da guerra justa.

    Agora o bem comum, a felicidade dos povos, a riqueza das naes, isto que dita a

    guerra, ser justa ou injusta. Bem como saber os motivos que podem ou no levar

    guerra: a necessidade de manter unido o Estado, e a necessidade tambm de atingir a

    riqueza dos povos.

    Um dos autores portugueses, que se debruou sobre a guerra e sobre a guerra justa foiDomingo Antunes Portugal, autor dos finais do sculo XVII, XVIII. E Domingos

    Hugo H. Arajo 31

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Antunes Portugal, vai pegar na tnica de S. Toms de Aquino do termo autoridade, e

    vai dizer: a guerra justa quando autorizada pelo Prncipe.

    Portanto, apesar dos conceitos do pensamento tomista e telogal, tendo sido

    abandonados, no significa o desenvolvimento que esse pensamento teve, tenha sidoposto de lado, ou seja, o conceito e a tnica de S. Toms de Aquino colocou, na ideia de

    que a guerra s justa se for autorizada, vai manter-se ao longo dos sculos, at

    actualidade.

    No h guerras que no sejam autorizadas. Porqu? Porque depois coloca-se uma outra

    questo, se a guerra no autorizada temos que perguntar: lcito sbditos daquele rei

    participar nela? Ou no lcito, e estamos perante uma guerra ilcita?

    A questo coloca-se. Se eu autorizo a guerra evidente que eu estou a legitimar a

    participao de todos nela. Se eu no autorizo a guerra, mas ela se faz, pode haver ou

    no resistncia guerra?

    Uma guerra no autorizada uma guerra no querida, logo se uma guerra no querida,

    eu no sou obrigado a faz-la. O mesmo se coloca se a guerra ilcita, se os meios

    utilizados pelo prncipe no so os meios adequados para atingir o fim, ou se o prncipe

    no faz uma guerra para atingir o bem comum do reino, mas faz uma guerra para atingir

    os seus bens prprios, eu posso ou no resistir? H ou no direito de resistncia quanto

    guerra injusta? O mesmo vimos relativamente lei. Sendo uma lei injusta podemos ou

    no resistir a ela? Podemos ou no podemos recusar ao seu cumprimento? Se o prncipe

    for um tirano, ou seja no tiver em ateno o bem comum, o interesse de todos, mas o

    interesse prprio, eu posso ou no posso oferecer direito de resistncia contra ele? At

    onde vai esse direito de resistncia?

    As questes que se colocam para o Direito civil, e que se colocam perante a lei, e que

    so situaes muito complexas. Na nossa prpria Constituio vemos regulados tais

    factos. Logicamente que eu no posso resistir contra o poder, mas eu posso ou no

    posso exercer direitos que me permitam a no aplicao da lei? Por exemplo o caso da

    objeco de conscincia pode ou no pode exercer-se? Objeces de conscincia em

    matrias morais uma forma de resistncia lei. Ora isto que se passa hoje, quando

    temos direito de petio Assembleia da Republica, enquanto cidados, para nos

    Hugo H. Arajo 32

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    opormos aprovao de leis, estamos a fazer aquilo que a Idade Mdia nos ensinou.

    Estamos a fazer aquilo que a prpria poca do racionalismo nos ensinou.

    E por isso a importncia da guerra ser injusta, porque se ela no justa eu posso exercer

    o meu direito de resistncia participao na mesma.

    E como que eu ultrapassava isto? Era muito simples ela tinha de ser autorizada. Se o

    rei no autorizasse era sinnimo que os prprios sbditos no eram obrigados a

    participar na guerra. Estvamos perante a injustia da guerra.

    Ora a guerra ao ser autorizada pelo rei como diz Domingos Antunes Portugal, vai

    obrigar em trs grandes reas os sbditos:

    Por um lado a guerra est declarada, e ao estar declarada todos tm de participar; Guerra autorizada, uma guerra onde se pode obrigar os sbditos a participar na

    mesma. Eu posso obrigar os nacionais a servirem-na. Ns s temos direito de

    resistncia quando a guerra injusta. Ora eu legitimo a guerra pela autorizao.

    Ao autorizar eu corto o vnculo da ilegitimidade;

    Direito de impor tributos. Se eu autorizo a guerra eu posso aumentar impostospara sustentar a mquina de guerra. E aqui a grande surpresa da Idade Mdia

    para a actualidade. que na Idade Mdia, quem que suportava a guerra? Os

    senhores, a nobreza, porque numa concepo orgnica de sociedade, a nobreza e

    o clero, no lhes impunha iseno tributria, no pagavam impostos. Quem

    pagava impostos era o povo. No existe injustia, antes pelo contrrio assim

    que se prossegue a justia, porque eles no pagavam impostos directos, mas a

    nobreza tinha que sustentar a mquina de guerra. No competia ao rei faz-lo.

    Era a contrapartida da nobreza no ter impostos. O clero, no pagava porque tem

    de administrar a educao e prover da sade, ou seja, as escolas foram criadas

    pelo clero e suportadas pelo clero, o rei no facultava um tosto. Os primeiros

    hospitais que aparecem so do clero. Tinham obrigao de acudir a todos sem

    lhes pagar. a contrapartida de uma sociedade orgnica. De uma sociedade tida

    como um corpo que trabalha em comum. Dos direitos tm de ter uma faculdade

    recproca com os deveres. Ora quando passamos de uma sociedade orgnica para

    Hugo H. Arajo 33

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    uma sociedade estratificada, em que o rei a cabea e o rei centraliza todos os

    poderes do reino, o rei acaba logo com a ideia da nobreza de fazer a guerra, ou

    seja se ela pode fazer contra os inimigos tambm pode fazer contra mim. Se ela

    tem capacidade para armar exrcitos contra o Estado vizinho, tambm tem

    capacidade para organizar guerra contra a minha prpria pessoa e isso eu no

    posso admitir, tenho que acabar com os exrcitos privados e criar um exrcito

    nacional. Ora esse exrcito nacional vai ter que ser sustentado atravs dos

    impostos e daqui o sculo XVII teorizar que preciso ter uma guerra autorizada

    para ter impostos.

    Para termos uma guerra necessrio declar-la. Como que eu declaro a guerra?

    Bom, em regra, a guerra era declarada, atravs de uma acto solene, normalmente uma

    carta, um comunicado, no caso de guerra internacional, o rei mandava um imediato seu,

    com estatuto de diplomata, ao reino vizinho a informar da declarao de guerra.

    E este imediato, tinha um estatuto de inviolabilidade tal que no podia ser preso nem

    ficar retido no reino a quem se declarava a guerra. De facto importante, o nncio, que

    ia declarar a guerra tinha um tratamento semelhante ao de embaixador.

    A nvel nacional era necessrio declarar a guerra, informar os sbditos que a guerra

    tinha sido declarada.

    E assim ns temos trs tipos de editais atravs do qual se declarava a guerra:

    Edital inibitrio aquele que probe quaisquer relaes dum nacional do Estadocom o Estado inimigo ou seus sbditos;

    Edital avocatrio aquele atravs do qual se chama os indivduos a prestarservio militar, nomeadamente, se chama aqueles que estavam a prestar servios

    a exrcitos terceiros;

    Edital exortatrio aquele a que se interdita qual relao comercial com oEstado inimigo.

    Hugo H. Arajo 34

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    Lus Molina, foi um dos autores do sculo XVI, espanhol que vai debruar-se sobre a

    conduta a ter na guerra, o tal comportamento que devemos ter na guerra.

    De facto este um dos aspectos importantes, porque ns vamos precisar de chegar ao

    sculo XIX para que a verdadeira corrente da humanizao da guerra, se venha a impor.O sculo XIX, o sculo dos pacifismos e esses pacifismos vo ter especial nfase, na

    disciplina da guerra. No significa que at ao sculo XIX tivesse valido a politica do

    vale tudo. No de facto essa orientao. E a partir do sculo XVI, os telogos, sim,

    porque a humanizao da guerra saiu sempre da Igreja, tentaram criar condies para

    que a guerra fosse o menos brutal possvel.

    E Lus Molina vai enunciar algumas das situaes de bom comportamento na guerra:

    A guerra justa e lcita quando se fizer aquilo que estritamente necessrio parasegurana do rei e para atingir o seu bem comum. Claro que o conceito de

    necessidade um conceito amplo, onde cabe muita coisa. Pode ser necessrio,

    tomar como refns soldados inimigos, mas j no privados. E aqui Molina j

    vem fazer uma distino. Uma coisa aprisionar militares, prisioneiros de

    guerra, outra coisa aprisionar particulares, isso proibido; pode ser necessrio

    e lcito, por exemplo, tomar cidades, fortalezas, castelos que no devem serdestrudos e restitudos ao inimigo aps o fim da guerra; pode ser lcito

    apropriar bens inimigos, fazer pilhagens, apenas em casos de fome. Quando est

    em causa a fome tudo se legitima, contudo nada impede que aps o tratado de

    paz no possa haver indemnizaes por pilhagens, mas durante a guerra, a

    pilhagem admitida se for justificada pela fome. Os prisioneiros de guerra,

    devem ser alimentados, tratados e mantidos vivos. No admitida numa guerra

    justa a morte dos prisioneiros de guerra. Portanto o conceito de prisioneiro de

    guerra deve ser morto termina, deve ser bem tratado para ser restitudo ao

    inimigo aps o termo da guerra.

    Conexo com o conceito de guerra temos o conceito de neutralidade. A Idade Mdia no

    admitia o conceito de neutralidade, porque vem dizer: ser neutro no estar em parte

    nenhuma.

    Hugo H. Arajo 35

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    E se a guerra justa, significa que uma parte est dentro da razo e a outra no est.

    Portanto, os Estados no podem ser neutros, a justia s est de um lado, no est nos

    dois, e o Estado neutro devia estar do lado da justia.

    de facto uma concepo muito telogal, da ideia de guerra, que a ideia de que aguerra justo somente de um lado, s lcita de um lado, s prossegue os ideais do

    Direito Natural de um lado e desse lado que devem estar todos os Estados, seno

    estaro do lado do mal.

    Claro que a partir do sculo XVII e XVIII, a figura da neutralidade comeou a ser

    tratada pelos internacionalistas. E a neutralidade vem dizer uma coisa muito simples:

    que o Estado neutro aquele que mantm relaes comerciais de amizade com os

    beligerantes. No toma partido, no por ser neutro que vai vender armas a um e armas

    a outro, para ter mais riqueza. Portugal fez isso na II Guerra Mundial com o Volfrmio,

    vendemos ao Eixo e vendemos aos Aliados, ramos neutros, mas era uma concepo de

    neutralidade do deixa-me ver onde que eu posso tirar maior partido. Contudo no

    isto o conceito de neutralidade. O neutro no tem relaes com o beligerante, ou se tem,

    tem do ponto de vista humanitrio. Ele mantm-se equidistante. Mais o neutro deve ter

    a funo de ser o mediador entre os Estados desavindos, de tentar exercer os bons

    ofcios, para tentar apaziguar os inimigos. Esta uma grande funo dos neutros.

    Bem como o Estado neutro deve salvaguardar, no campo nomeadamente do comrcio

    martimo, as embarcaes e proteg-las dos Estados beligerantes, que transportando

    material de no de guerra atravessem as suas guas. E isto muito importante.

    No caso portugus isto deu-nos um grande problema, que levou a uma arbitragem, que

    felizmente ganhamos contra os EUA, porque o Estado neutro, um Estado que concede

    a sua neutralidade aos seus portos, s suas guas. O mar que banhar um Estado neutro, neutro, a quem? A todos. No se pode fazer guerra nesse espao, nem como se deve

    autorizar que navios de ambas as partes transportem mercadoria no de guerra, possa

    atravessar as guas.

    Mas se o Estado neutro desconfia que as embarcaes que atravessam os seus mares,

    levam munies de guerra, ou vo servir alimentos para sustentar uma mquina de

    guerra, o Estado neutro pode apreender durante a guerra as embarcaes. Porqu?

    Porque nas suas guas no podem passar.

    Hugo H. Arajo 36

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    H aqui de facto, direitos e obrigaes, que so muito importantes, porque a

    neutralidade dos portos, do Estado neutro, deve ser respeitada pelo prprio Estado como

    pelas partes beligerantes. Elas no podem criar nenhuma circunstncia que ponha em

    causa a neutralidade do pas que atravessam, ou mesmo que possam pr em situao

    desagradvel, o Estado que neutro.

    Um exemplo que aconteceu em Portugal, em 1814, havia uma guerra entre a Inglaterra e

    os Estados Unidos, e Portugal era neutro, tnhamos declarado a neutralidade. E no porto

    do Faial, estavam ancorados, um navio ingls e um navio norte-americano. O navio

    ingls bombardeia o norte-americano, e o norte-americano responde, mas o navio ingls

    leva a melhor, tendo sido completamente destrudo o navio norte-americano.

    O que que os EUA vieram pedir? Veio pedir a Portugal uma indemnizao pela

    destruio do navio, americano. Isto demorou cerca de 40 anos a ser resolvido, porque

    durante este tempo sucedia-se correspondncia diplomtica entre Portugal e os EUA.

    Decide-se levar isto a arbitragem internacional, na qual Portugal ganha pois foi violado

    o espao neutro. Sendo um Estado neutro os Estados beligerantes tm de respeitar e no

    podem exercer nenhum acto de guerra, no territrio neutro.

    E portanto os EUA, vai ser obrigado a indemnizar os ingleses, e no Portugal a

    indemnizar os EUA, foi violado um esprito de paz.

    E de facto a ideia de neutralidade uma ideia sagrada. Isto leva-nos a pensar na paz das

    feiras. Isto era, nas feiras, mercados, desde o dia anterior ao inicio da feira, at ao dia

    posterior ao inicio da feira, ao fim da feira, era estipulado, ao rei o perodo de paz de

    feira, e a paz de feira dizia que todo e qualquer mendigo que comete-se um crime,

    nomeadamente um roubo, homicdio, durante o perodo em que vigorava a paz da feira,

    era condenado forca automaticamente, pois era equiparado ao crime leja majestade,porque o rei tinha imposto um perodo de paz para se desenvolverem os mercados, para

    desenvolver o comrcio, e portanto, quem no cumprisse a paz da feira estava a violar

    uma regra do rei, portanto a pena era automtica, sem julgamento. A neutralidade a

    mesma no se pode violar a paz que vem do Estado neutro. Quem viola deve ser

    punido.

    Um Estado neutro, um Estado que no entra nas guerras. E a neutralidade pode ser de

    dois tipos:

    Hugo H. Arajo 37

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    Neutralidade momentnea neutralidade que tomada pelo Estado para umconflito armado especfico.

    Neutralidade perptua em todos os conflitos armados o Estado declara-seneutro. Por exemplo, o caso da Sua. E tivemos durante todo o sculo XIX o

    caso da Blgica.

    Hugo H. Arajo 38

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Aula terica de Histria das Relaes Internacionais

    Aula n 6

    Lisboa, 14 de Outubro de 2009

    Vamos abordar os conceitos de Nao e de Nacionalismo.

    O sculo XIX ficou conhecido para a histria como o sculo dos movimentos nacionais,

    o sculo do nacionalismo. E a ideia de nao bem como a ideia de movimento

    nacional, marcou a evoluo tendencial, bem como a caracterizao que ns possamos

    fazer, da histria das relaes internacionais.

    Os movimentos nacionalistas nascem, ou desenvolvem-se com a Revoluo Francesa.Segundo o Mestre Pedro Caridade de Freitas, no podemos dizer que os movimentos

    nacionalistas nascem com a Revoluo Francesa, isso seria uma injustia para o prprio

    continente americano, e para a independncia dos Estados que compunham e compe os

    Estados Unidos da Amrica. Porque se repararmos, a independncia americana d-se no

    perodo anterior Revoluo Francesa. E so tambm movimentos nacionais, com uma

    determinada expectativa de uma determinada comunidade humana de se tornar

    autnoma, que caracteriza a independncia dos Estados Unidos da Amrica. Lado alado, como bvio prpria poltica, alfandegaria, aduaneira, que a Inglaterra tinha

    sobre os Estados Unidos, de facto fez com que movimentos nacionalistas se

    desenvolvessem de forma mais clara e que levasse independncia dos Estados Unidos.

    O foco principal de desenvolvimento ou de proliferao das teses nacionalistas no

    continente europeu foi a Revoluo Francesa, com a ideia de que todos os povos de

    alcanar a independncia.

    E com a tese nacionalista, desenvolve-se uma tese muito importante que a tese daautodeterminao dos povos, o princpio da autodeterminao dos povos um princpio

    que um princpio de Direito Internacional, que emerge essencialmente, no sculo XIX

    e que vai perdurar at actualidade.

    Foi um princpio muito decorrente da Revoluo Francesa e da Revoluo Americana e

    foi tido como importante para o desenvolvimento das relaes internacionais.

    Reparem que diz-se, pois vem da Idade Mdia que o Direito Natural, o Direito dasGentes era constitudo por dois tipos de princpios:

    Hugo H. Arajo 39

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Princpios primrios aqueles que eram comuns e evidentes a todos os homens,ensina-nos S. Toms de Aquino;

    Princpios secundrios aqueles que no eram comuns, nem evidentes a todosos homens.

    Francisco Surez no sculo XVI, pegando nos ensinamentos de S. Toms de Aquino,

    vai dizer que os primrios so os que no decorrem da sociabilidade humana, os que

    decorrem da prpria natureza das coisas, por serem comuns a todos os homens; os

    secundrios so os que decorrem da sociabilidade humana, ou seja necessrio que o

    homem interaja com outros homens, necessrio que a sociedade assuma que estamos

    perante um princpio que comum quela sociedade.

    Como exemplo disto temos a bigamia. A bigamia no um princpio de direito natural,

    mas um princpio de comportamento social de determinada sociedade, no na

    sociedade ocidental mas noutras sociedades e no por isso que deixa de ser menos

    importante para essa sociedade. No o facto de ser querido na Europa que no deve ou

    que no constitui um princpio organizador da sociedade no mundo islmico ou em

    algumas tribos. Ora estamos perante um princpio, um princpio secundrio, temos a

    ideia de que ele normal, decorre da vivencia societria de uma determinada sociedadee no decorre para outra. Temos a distino de princpios que so secundrios, e que so

    princpios de uma determinada comunidade e que no so de outra.

    O mesmo no se passa com o princpio da autodeterminao dos povos. O princpio da

    autodeterminao dos povos nasce como princpio secundrio, o Direito das Gentes.

    Porqu? Porque no era comum a todas as naes a todos os Estados, a todos os povos,

    o princpio de que todos eles tinham direito autodeterminao ou tinham direito

    independncia. No se entendia assim. Entendia-se que haviam povos que almejavam aindependncia enquanto outros, no. Porqu? Porque estavam em situao evolucional

    diversa, e o sculo XIX, nomeadamente o fim do sculo XIX, com as teorias

    Darwinistas, que no s olhava para a evoluo do homem, mas tambm para a

    evoluo da sociedade, marcaram muito a concepo do princpio da autodeterminao.

    Haviam povos que tinham avanado tanto, ao ponto de poderem desejarem a

    independncia. Haviam outros que estavam num grau civilizacional anterior que tinham

    de ser guiados e orientados.

    Hugo H. Arajo 40

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    Portanto, o princpio da autodeterminao dos povos um princpio secundrio, era

    comum a determinadas sociedades, no era comum a outras sociedades.

    Hoje est assente na comunidade internacional, que o princpio da autodeterminao dos

    povos um princpio geral do Direito Internacional Pblico. Todos os povos tm direito sua autodeterminao, desde que tenha condies para isso. E de facto as ltimas das

    resolues das Naes Unidas, quer no caso de Timor, quer no caso da Bsnia, quer no

    caso do Kosovo, demonstra a importncia do princpio da autodeterminao tem hoje, e

    ele nasce no sculo XIX, desenvolve-se no sculo XIX.

    E desenvolve-se por fora da corrente do nacionalismo. corrente do nacionalismo vai

    opor-se a corrente do bem comum. A legitimidade que vai ser defendida pela Santa

    Aliana, enquanto organizao que sai do Congresso de Viena, e composta pela ustria,

    Rssia e Prssia, vai defender que os reinos devem manter a sua organizao interna,

    quer poltica quer territorial. O princpio da legitimidade no mais do que um

    princpio que j existia, que do ponto de vista poltico e portanto a restaurao dos

    tronos das casas legitimistas, quer a reposio das fronteiras territoriais da Europa e

    noutros locais onde tenha sido usurpada. O princpio da legitimidade, combate a

    soberania, desagrega os Estados territoriais no sculo XIX, nomeadamente a ustria

    com o Imprio Austro-hngaro e a Rssia, so os grandes Estados territoriais que em si

    tm uma pluralidade de funes. E portanto um foco perfeito para o desenvolvimento

    das teses das correntes nacionalistas.

    A clebre imperatriz Elisabete da ustria, foi assassinada em Sarajevo, por um

    nacionalista Srvio, que queria a independncia da Srvia, do Imprio Austro-hngaro,

    e como sinal de revolta esse nacionalista apunha-la a imperatriz Elisabete. Isto

    demonstra muito bem o que um movimento nacionalista e o que a importncia

    destes movimentos no seio da Europa do sculo XIX.

    Para se perceber o que so os movimentos nacionalistas compete saber o que isto da

    Nao.

    Nao pode ser definida como um conjunto de pessoas, com uma relao de

    nascimento, origem, numa comunho de raa, lngua, costumes independentemente de

    viverem ou no no mesmo territrio nacional, ou no mesmo territrio soberano. Porqu?

    Porque ns sabemos que h naes eu extravasam as fronteiras do prprio Estado.

    Hugo H. Arajo 41

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Como exemplo paradigmtico os Judeus, estes so uma nao. O povo judaico uma

    nao. Tem por acaso um Estado que o Estado de Israel, mas a nao judaica est em

    todos os stios onde se encontrem judeus. Se calhar o mesmo tnhamos com os ciganos,

    so uma etnia um se calhar uma nao, pois com o expansionismo no sculo XVI, acaba

    por se desenvolver tradies especficas, mas so tambm eles uma nao ou vrias

    naes integradas em vrios Estados soberanos.

    A ideia de nao, apresenta caractersticas muito especficas, nomeadamente para

    termos uma nao devemos essencialmente ter:

    Lao de sangue entre os membros da comunidade Uma concepo ampla de terra a terra equivale ptria, e a ptria pode no se

    subsumir num conceito de Estado.

    De facto estas duas ideias so essenciais: o sangue, a ptria e a lngua. So os trs

    grandes conceitos, que acompanham aquilo que se entende pelo conceito de nao ao

    longo dos sculos.

    O sangue os laos comunitrios; a terra a identidade do solo, mas a terra sendo num

    sentido ficcionado, no o pelo facto de dar o Estado onde exerce a sua soberania, no mais do que isso para a nao a terra equivale ideia da ptria, mesmo que a ideia da

    ptria seja uma ideia utpica.

    E de facto aqui os judeus do-nos um ensinamento extraordinrio. A paz evolutiva em

    Israel Jerusalm, nos seus limites territoriais, no. Onde quer que eles se mantenham,

    porque h uma identidade to grande lingustica, cultural, histrica, literria, religiosa,

    que a ptria o stio onde cada um deles se encontra. E de facto a ideia de nao

    extravasa a ideia de fronteira territorial soberana do Estado. E depois temos a lngua, acomunho da lngua de facto essencial para que haja uma identidade, cultural.

    O sculo XIX vai olhar para o conceito de Nao, pegando nas lies de Ccero.

    Ccero vem considerar no conceito de nao algumas ideias e so elas:

    A nao tem um corpo polticoHugo H. Arajo 42

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    uma sociedade de homens que esto unidos para assegurarem a sua seguranae vantagens mtuas em funo da combinao de foras.

    Desta noo temos vrias ideias a primeira delas, um conjunto de homens unidos (a

    unio faz-se pela lngua, pela historia, pela raa, a ideia de necessidade) para assegurar

    a segurana e obter vantagens mtuas.

    Portanto no conceito de nao so includas as ideias de utilidade e de necessidade que

    caracterizam o pensamento do sculo XIX. Aquilo que era necessrio e aquilo que era

    til sociedade.

    A ideia de nacionalismo marcou de facto os autores do sculo XIX, nomeadamente os

    autores alemes e italianos. em Itlia e na Alemanha que vamos ter maior fervor e

    maior desenvolvimento dos princpios nacionalistas. Tambm porque a que h uma

    proliferao de naes e onde se vai acentuar a necessidade de congregao dessas

    naes nuns Estados Unidos.

    Para alm da Alemanha e da Itlia tivemos tambm desenvolvimento dos ideais

    nacionais, a partir dos anos 70/80 do sculo XIX, na regio leste da Europa, na regio

    Eslava, na regio dos Balcs, e a esta corrente o elogio do Estado nacional eslavo

    chama-se Pan-eslavismo.

    Pensando ainda na primeira parte do sculo XIX, na Itlia e na Alemanha, e pegando

    nas palavras do Prof. Martim de Albuquerque, nacionalismo o acordo comum num

    solo, ou a qualquer, o desejo de independncia, um principio de que a nao um

    fim em si mesmo, a que um individuo se deve dotar exclusivamente, a ideia de nao

    como nao superior.

    H aqui de facto ideias nestas frases chave do Prof. Martim de Albuquerque que so

    interessantes o amor ao solo, o amor ptria, a independncia, e a ideia de que a

    nao um princpio, ou seja preciso servir a nao para que ela se fortalea.

    Hugo H. Arajo 43

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    Histria das Relaes Internacionais 2009/2010

    Portugal, no viveu este movimento nacionalista com fervor como os alemes e os

    italianos.

    Somos um estado-nao desde a Idade Mdia, de facto estas questes acabam por se

    diluir nos problemas da Europa do sculo XIX. No entanto parece que podemos isolartrs momentos do sculo XIX, em Portugal os movimentos nacionais que tiveram

    alguma fora e alguma evoluo, no no sentido de criar um Estado.

    Esses trs momentos so:

    Independncia do Brasil; Tentativa de unio ibrica; Ultimato ingls (1890).

    Independncia do Brasil a primeira machadada na coeso nacional. H um sentimento

    nacional de perda. H gritos de oposio por parte dos portugueses que chegam a pensar

    vamo-nos armar e vamos para o Brasil e tentar recuperar aquilo que perdemos. Claro

    que no era possvel, Portugal estava empobrecido as guerras napolenicas tinham-nosretirado o poder, e mesmo a sada da corte para o Brasil com o tesouro nacional.

    Unio ibrica, era uma espada na cabea de Portugal. Ou seja desde a independncia ou

    da restaurao da independncia em 1640, Portugal tinha um pavor da unio ibrica. E

    sempre que se falava em unio ibrica levantavam-se os movimentos nacionais. E

    quando se coloca a questo nos anos 50 e 60 do sculo XIX e coloca-se no pelo lado de

    Portugal mas de Espanha, Espanha estava no perodo da vacatura do trono com a

    deposio da rainha Isabel II e o problema de saber qual a soluo e a soluo podiapassar pela unio ibrica. Quando se fala nisto a intelectualidade portuguesa actua e h

    um elogio da nao, ou seja ns no nos podemos unir a Espanha porque ns somos um

    povo diferente, e este povo no se compagina com outro povo que Espanha.

    O terceiro momento um momento complicado, um momento triste na histria

    portuguesa recente, que o Ultimato de 1890. O Ultimato no mais do que uma

    medida soberana de Inglaterra contra Portugal, a dizer ou sais do territrio africano que

    nosso ou ns invadimos e bombardeamos Lisboa e o resto das cidades do territrio

    Hugo H. Arajo 44

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    ultramarino. a ameaa, eles no dizem directamente que bombardeiam mas se este

    acordo no for cumprido nas prximas horas h uma base de guerra em Vigo, e essa

    base de guerra vai para Lisboa. E tambm estava uma base de guerra na entrada do mar

    mediterrneo que facilmente iria para Cabo Verde. Cabo Verde era um dos ex-lbrisdas

    colnias portuguesas e portanto invadir e conquistar Cabo Verde, era um rude golpe

    para Portugal. E Portugal sente-se ameaado, ameaado porque ele acha que tem razo

    do ponto de vista poltico, ele acha que tem direito aos territrios africanos, mas do

    ponto de vista poltico-militar sabe que no pode comparar-se nem responder a

    Inglaterra. E portanto tem de fazer uma coisa muito simples, aceitar as condies. E este

    aceitar das condies originou a queda do governo, mas mais importante foi o grande

    momento do nacionalismo, o grande momento em que Portugal se uniu, se esqueceram

    as rivalidades polticas, as diferenas entre progressistas e regeneradores, entre

    monarcas e republicanos, e formam um movimento nacional uno. E pela primeira vez

    no sculo XIX que se v coisas to formidveis quanto:

    Manifestaes na rua em defesa dos nacionalistas; Cria-se A Portuguesa, o hino nacional adoptado pela Repblica, no mais do

    que o hino contra a Inglaterra por isso que se diz que ele utpico, no h

    nenhum hino real que seja contra os canhes marchar, utopia pura, mas tem

    uma razo era contra a Inglaterra o poema em si de tentativa de chamar a

    ateno do povo contra os ingleses e depois vai ser adoptado para hino nacional,

    porque era o hino do nacionalismo, tinha sido o hino criado pelo movimento

    nacionalista. Como tambm, por exemplo, D. Carlos, tinha sido empossado na

    Ordem da Jarreteira(em ingls Order of the Garter), a mais importante Ordem

    Inglesa e recusou-a. Todos aqueles que tinham sido condecorados com a Ordem

    de Inglaterra entregaram as medalhas na embaixada inglesa que foi devidamenteapedrejada;

    Faz-se uma subveno nacional para comprar barcos de guerra, para sedesenvolver as foras armadas e ir contra os ingleses, eles no nos podem fazer

    o que nos esto a fazer.

    Ora isto um movimento nacional, cortam-se relaes, as famlias inglesas da regio do

    Porto viram os seus mercados diminurem, nomeadamente na exportao do vinho do

    Hugo H. Arajo 45

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    Porto, ningum queria relaes com os ingleses, cortaram-se as importaes inglesas,

    etc., etc.

    Voltando ao cerne da questo o nacionalismo. No so estes trs momentos que

    permitem dizer que Portugal teve um movimento nacionalista, de maneira nenhuma. Os

    movimentos nacionalistas so cirurgicamente encontrados e tm motivos que apenas

    conduzem a questes poltico-sociais.

    O mesmo no se passa nos restantes pases. A Alemanha e a Itlia so dois dos pases

    que maior contributo deram para a teorizao do nacionalismo. E a Alemanha, na

    pessoa do prprio Bismark vai defender que o nacionalismo caracterizado porprincpios e tradies histricas. Para Bismark eu tenho uma nao quando as tradies

    histricas e tnicas so comuns, no mais do que pensarmos que a etnia germnica e

    as tradies histricas aquelas que eram comuns a todos os pequenos Estados alemes.

    E portanto a unificao alem vai fazer-se com base nestas duas ideias: na ideia da

    tradio histrica e na ideia da etnia comum. Vamos unir todos os germnicos num s

    Estado mas aqueles que aqueles que tm a mesma tradio histrica. Se, eu Bismark

    defendesse apenas os elementos tnicos eu tinha que considerar a ustria, dentro dos

    povos germnicos. No podemos introduzir a ustria na unificao alem, porque a

    ustria no tem a mesma tradio histrica, e portanto ns inclumos uma outra

    variante para permitir a unificao alem excluindo a ideia dos povos germnicos.

    Para alm disso temos vrios autores que foram estudando as ideias do nacionalismo e

    que foram apresentando vrias caractersticas para os nacionalistas.

    Reneu, que um publicista francs vai considerar que a nao se caracteriza pela

    comunho de lngua literria, no apenas a lngua pois essa j Bismark dizia. Reneu

    vai dizer que para alm da histria da lngua tambm necessria uma comunho de

    lngua literria.

    Jlio de Viena vai dizer que no, o que caracteriza a nao a raa. A raa comum

    caracteriza ou individualiza as naes umas das outras. Este autor diz isso numa obra

    intitulada: As raas histricas na Pennsula e a sua influncia no direito portugus.

    Hugo H. Arajo 46

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    Claro que a raa em si um elemento fraco, porque eu posso ter numa nao com

    identidade lingustica e cultural com uma pluralidade de raas, sem que seja a prpria

    ideia de raa que individualize a nao. Mas tenhamos ideia de uma coisa que a ideia

    da raa uma ideia muito tpica do sculo XIX, o desenvolvimento da evoluo da

    espcie, Darwin vai individualizar as raas mais avanadas das menos avanadas e as

    mais avana