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Dr. Ernesto Sarmento | AULAS | CONTACTOLOGIA 1 | 2005-2006 1 CONTACTOLOGIA BÁSICA OBJECTIVOS: 1. Conhecer as directrizes do estudo prévio (pré-adaptação) e as técnicas fundamentais utilizadas na adaptação de LC e no seguimento periódico posterior do utilizador. 2. Compreender as implicações anatómicas e fisiológicas 1 relacionadas com o processo de adaptação e utilização de LC. 3. Aprender a teoria fundamental da adaptação das LC rígidas esféricas. 4. Aprender a teoria fundamental da adaptação das LC hidrófilas esféricas. 5. Aprender a teoria fundamental da adaptação das LC rígidas tóricas. 6. Aprender a teoria fundamental da adaptação das LC hidrófilas tóricas. 1 Para adaptarmos umas LC devemos dominar os conhecimentos indispensáveis, particularmente saber quais as estruturas do sistema visual implicadas e como as LC podem interferir com a saúde ocular do sujeito. Neste sentido, justifica-se lembrar a matéria essencial que estudaram na disciplina de Anatomia e Fisiologia Oculares.

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CONTACTOLOGIA BÁSICA

OBJECTIVOS:

1. Conhecer as directrizes do estudo prévio (pré-adaptação) e as técnicas

fundamentais utilizadas na adaptação de LC e no seguimento periódico

posterior do utilizador.

2. Compreender as implicações anatómicas e fisiológicas1 relacionadas

com o processo de adaptação e utilização de LC.

3. Aprender a teoria fundamental da adaptação das LC rígidas esféricas.

4. Aprender a teoria fundamental da adaptação das LC hidrófilas

esféricas.

5. Aprender a teoria fundamental da adaptação das LC rígidas tóricas.

6. Aprender a teoria fundamental da adaptação das LC hidrófilas tóricas.

1 Para adaptarmos umas LC devemos dominar os conhecimentos indispensáveis, particularmente saber quais as estruturas do sistema visual implicadas e como as LC podem interferir com a saúde ocular do

sujeito. Neste sentido, justifica-se lembrar a matéria essencial que estudaram na disciplina de Anatomia e

Fisiologia Oculares.

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TEMA 1

ESTUDO PRÉVIO

Todo o processo de adaptação de LC demanda um estudo prévio do

candidato. Este exame visa conhecer o paciente, sua motivação,

características anatómicas e fisiológicas, tipo de ametropia, etc. A

informação obtida permitirá decidir se está ou não indicado adaptar LC,

qual o tipo de lente a adaptar, o regime de uso, o sistema de higiene, ...

1. – Selecção do paciente

Inicialmente, uma entrevista breve com o paciente possibilitará

perscrutar as suas expectativas. Aproveitaremos a ocasião para dar uma

explicação sucinta acerca do que é uma LC, suas características e fases do

processo de adaptação. Avaliaremos o comportamento do sujeito, se é

nervoso, reservado, tranquilo, apreensivo, ... e o aspecto externo (asseado,

características dos dedos das mãos, unhas, pálpebras, ...). Deste modo

agrupamos detalhes indispensáveis, que fundamentarão a nossa decisão.

1.1. – Motivação

O sujeito manifesta o desejo de usar LC? Qual o motivo? A razão pode ser

estética, óptica, profissional, desportiva ou outra. Alguém recomendou

que usasse LC? Quem? Conhece o argumento clínico dessa recomendação?

Controlo da miopia, aumento de percepção (retiniana e campo visual), por

patologia (queratocone, anisometropia, aniridia, albinismo, afaquia,

astigmatismo irregular, ...), porque pratica desporto, etc. Ou foi

aconselhado por familiares ou amigos? Neste caso, provavelmente não

saberá a razão clínica.

Em todo o processo de adaptação é fundamental que o paciente esteja

motivado, que receba todas as explicações necessárias sobre as vantagens

e o comprometimento envolvido no uso das LC.

1.2. – Anamnesis (história do caso)

Existem distintos aspectos que são particularmente importantes. A

anamnesis contemplará informação geral e informação específica.

Comentário [ES1]: Todo o processo de adaptação de LC confronta o especialista com as seguintes questões básicas: QUE LC é mais

adequada (material, geometria, desenho)?

COMO se deve utilizar (regime de uso)? QUANTO tempo dura a LC (frequência de

substituição)? QUANTAS horas por dia se deve

usar?

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1.2.1. – Informação geral

Elaboração da ficha do candidato, onde anotaremos os dados pessoais

(nome, morada, telefone, data de nascimento, profissão, ...). A profissão

permite-nos conhecer o ambiente de trabalho (ar condicionado, pó,

produtos químicos, ...).

O cliente já usa LC? Ou já usou? Há quanto tempo as usa? Como as usa?

Se usou e presentemente não, porque abandonou? Quer dizer,

procuraremos obter o máximo de informação precisa e detalhada, de

temas gerais. Por exemplo, observaremos se existem anomalias físicas,

assimetrias faciais ou desvios oculares que podem influir na adaptação.

1.2.2. – Informação específica

Existem algumas áreas básicas que devem orientar a anamnesis, cuja

finalidade é avaliar possíveis contra-indicações ou limitações para usar

LC. Obtém-se informação sobre saúde geral e saúde ocular, tratamentos e

medicação.

1.2.2.1. – Saúde geral

Devemos procurar saber se o paciente sofre de alguma doença sistémica.

Normalmente existem alterações sistémicas que influenciam a

sensibilidade, curvatura corneal e sistema visual. Assim, na anemia,

ocorrem debilidade geral e ocular, bem como fragilidade epitelial; nas

constipações, observa-se irritação ocular e maior sensibilidade; nos

regimes de emagrecimento, pode surgir debilidade geral e baixa da

acuidade visual; a toma de diuréticos ocasiona a eliminação geral e ocular

de líquidos (a utilização de laxantes também provoca a eliminação geral e

ocular de líquidos); nos transtornos hormonais, podem advir alterações

palpebrais, edema destas e da conjuntiva, modificar-se a qualidade e a

quantidade do filme lacrimal; no diabetes, observa-se flutuações do estado

refractivo, maior sensibilidade e fragilidade corneal; nas alergias, produz-

se fotofobia, lacrimejamento, sensação de areias (com picor e ardor);

enfim, nas doenças infecciosas há risco de contágio.

1.2.2.2. – Medicamentos

Deve-se anotar toda a medicação que o paciente esteja tomando ou haja

ingerido no último ano, para poder avaliar os seus efeitos. Por exemplo, os

Comentário [ES2]: Na anamnese deve-se ter o cuidado de saber que tipo de medicamentos

o paciente está ingerindo. Estes podem interferir com o processo de adaptação de LC quer por

diminuição da secreção lacrimal como pela

alteração de sua qualidade. De um modo geral, interferem o ácido acetil salicílico, os

antihistamínicos, os corticóides e os

antidepressivos...

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anticonceptivos orais produzem modificação da sensibilidade corneal e

um edema dos tecidos (alterando-se o seu conteúdo aquoso), o que pode

comprometer a tolerância das LC; os antibióticos e corticoides por via oral

afectam a flora conjuntival, favorecendo a aparição de fungos; os

ansiolíticos podem originar diminuição e flutuações da acuidade visual

(que desaparecem uma vez terminado o tratamento); enfim, os

antihistamínicos e descongestionantes orais podem ocasionar zonas de

secura sobre a superfície corneal anterior.

1.2.2.3. – Antecedentes oculares

Quais as alterações patológicas oculares que teve o paciente? Em caso

afirmativo, há que identificar, saber se são repetitivas e qual sua

periodicidade. Alguns exemplos prováveis: blefarite, orzuelos, calázio,

dacrocistite, conjuntivite, meibomite, inflamações da úvea, ectrópio,

entrópio, anomalias corneais, cataratas, e outras. Actualmente ou

recentemente teve alguma doença ocular? Qual?

1.2.2.4. – Tratamentos oculares

Anotar a medicação ocular utilizada actualmente ou recentemente.

Lembrar que a LCH absorve o medicamento, o que modifica a sua cor e

pode comprometer a eficácia do medicamento (libertação retardada). Todo

o paciente que use medicação ocular deve terminar o seu tratamento

antes de adaptar-se as LC.

1.2.2.5. – Outros

Se o sujeito é uma mulher, dependendo da idade, advertir sobre a

possibilidade de gravidez e que, nessas circunstâncias, só é desejável

adaptar LC após 6 meses depois do parto, pois ocorrem mudanças em seu

organismo (retenção de líquidos, edema geral dos tecidos, aumento da

sensibilidade, fragilidade epitelial, etc.) durante esse período que podem

causar intolerância às LC.

Nas mulheres maiores de 42 anos, procuraremos saber se entrou no

período da menopausa, pois, as alterações hormonais provocam secura

ocular, estando recomendado, em caso de adaptação da LC, usar lágrimas

artificiais, humectantes ou outras recomendações nutricionistas.

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TEMA 2

BIOMICROSCOPIA

Examina-se o olho em vivo, particularmente suas estruturas anteriores:

pálpebras, conjuntiva, lágrima, córnea, íris, cristalino e parte anterior do

vítreo.

A utilização da lâmpada de fenda é indispensável em todo o processo de

adaptação de LC. Por processo adaptativo entende-se o exame inicial, a

adaptação em si mesmo e as revisões pós-adaptação.

O propósito desta técnica é advertir patologia ignorada ou condições

anatómica e fisiológica que constituam uma contra-indicação ou limitação

(mais selectiva) da adaptação. A biomicroscopia faculta conhecer o estado

ocular preliminar que nos servirá de referência.

A observação depende do ângulo de incidência da luz com os tecidos, da

qualidade reflectante das superfícies observadas, da diferença de índices

de refracção dos meios observados e da intensidade da lâmpada. Os tipos

de iluminação possibilitam uma análise variada.

1.1. – Biomicroscópio

Os componentes habituais a todos os biomicroscópios podem resumir-se a

dois sistemas, o de iluminação (ou lâmpada de fenda) e o de observação

(ou microscópio binocular). Há ainda os que permitem controlar a posição

do biomicroscópio.

1.1.1. – Lâmpada de fenda

O suporte de iluminação contém todo o sistema de iluminação, que

consiste de uma fenda sobre a qual se projecta a imagem da lâmpada. O

ângulo do braço pode variar.

O braço de iluminação tem um controlo da fenda e filtros. Existem dois

controlos de tamanhos: 1) largura da fenda; 2) altura da fenda; (alguns

biomicroscópios permitem variar a orientação do feixe luminoso). Os

filtros utilizam-se para variar a aparência do feixe de luz. Quando

interpostos no trajecto dos feixes de luz permitem variegadas condições

de iluminação e de observação. Existem filtros verde (anerita ou livre de

vermelho) próprio para a observação do fundo do olho; cinza, que reduz a

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intensidade da luz; cobalto, para observações de quadros fluoroscópicos;

opaco, para luz difusa; polarizante, que permite eliminar reflexos

perturbadores ou para observar superfícies maleáveis, como o filme

lacrimal.

1.1.2. – Microscópio binocular

O braço do microscópio contém o sistema de observação, que está

constituído pelas lentes da objectiva e da ocular. O ângulo do braço do

sistema de observação pode variar (normalmente mantém-se na posição

frontal).

O braço do microscópio tem duas oculares e o controlo dos aumentos. As

oculares são ajustáveis para compensar a ametropia do observador e a

distância (entre as oculares) segundo a sua DP, de modo a obter uma

visão binocular e estereoscópica. O controlo dos aumentos é um sistema

de zoom.

1.1.3. – Comando de elevação/direcção

Normalmente é único, mas pode haver dois comandos separados. Situa-se

na base do instrumento. A regulação de direcção controla o movimento

para a frente e para trás (focagem do biomicroscópio) e da direita para

esquerda e vice versa (alinhamento horizontal). O comando de elevação

permite o alinhamento vertical do microscópio.

1.2. – Tipos de iluminação

(Fig.1: Tipos de iluminação. Modificado de A.L. Alemany et al).

A iluminação aparente do campo observado é inversamente proporcional

ao número de aumentos que se utiliza, quer dizer, a menor aumento, com

iluminação constante, maior o campo observado.

Existem dois tipos básicos de iluminação: directa e indirecta.

1.2.1. – Iluminação directa

A luz foca sobre a zona a observar, seguindo uma das seguintes técnicas

de iluminação: difusa, focal directa, reflexão especular e tagencial.

Comentário [ES3]: Utilizar uma mão para alinhar e focar e a outra para manejar os mandos

da fenda, variar o ângulo entre a lâmpada de

fenda e o microscópio e manipular as pálpebras do paciente.

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1.2.1.1. – Difusa

Esta modalidade possibilita observar zonas amplas, como sejam as

pálpebras, bordos palpebrais, orifícios lacrimais, saco conjuntival, ... ou

seja, uma análise de conjunto do segmento anterior do olho e seus anexos.

No contexto da Contactologia permite avaliar o comportamento da LC

adaptada, particularmente sua mobilidade e centragem.

O procedimento é o seguinte:

• O braço de iluminação e o microscópio binocular fazem um ângulo entre

30 a 50º entre si.

• Usamos baixa intensidade.

• Aumentos mínimos.

• A fenda aberta ao máximo.

• Aproximando ou afastando o microscópio binocular foca-se segundo a

estrutura que se pretende observar.

Fig.1

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1.2.1.2. – Focal directa

Usando a fenda observamos uma zona limitada. Esta técnica possibilita

uma análise minuciosa. Existem três formas de focagem directa:

paralelepípedo de Vogt, secção óptica e feixe cónico.

1.2.1.2.1 – Paralelepípedo de Vogt

(Fig.2: Paralelepípedo corneal de Vogt (A.L. Alemany et al).

• Ângulo de iluminação inicialmente de 50º.

• Aumento mínimo.

• Fenda aberta aproximadamente 3mm. No

curso do exame, o paralelepípedo pode

aumentar de largura abrindo o feixe

luminoso.

• Olhando fora do microscópio, aproximando ou afastando a lâmpada de

fenda da córnea, observamos a definição da cesura cinzenta.

• Através do microscópio observamos o paralelepípedo corneal e

aproximando ou afastando o microscópio definimos a sua nitidez.

• A exploração de toda a córnea faz-se deslocando o biomicroscópio desde

o lado temporal para o nasal, variando o ângulo de iluminação, evitando a

distorção.

Permite-nos observar as superfícies anterior e posterior da córnea e

possíveis irregularidades, nervos da córnea, edema corneal, presença de

vasos sanguíneos que invadem a córnea, membrana de Descemet,

cicatrizes, faces anterior e posterior do cristalino, podendo recorrer a

aumentos maiores para ver certos detalhes.

1.2.1.2.2. – Secção óptica

(Fig.3: Secção óptica corneal (A.L. Alemany et al).

A técnica é igual à que se utiliza para

obter o paralelepípedo de Vogt, mas,

obtendo-se a nitidez do paralelepípedo

corneal, estreitamos o feixe de luz (ou

reduzimos a largura do paralelepípedo ao

mínimo) até que se apague. Depois

abrimos paulatinamente a fenda, formando-se um corte (secção corneal).

Utiliza-se para avaliar a estrutura corneal, filme lacrimal, cristalino e

Fig.2

Fig.3

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ângulo iridocorneal, permitindo inclusive apreciar a profundidade dos

defeitos.

1.2.1.2.3. – Feixe cónico

Usamos o diafragma circular, quer dizer, se ademais de reduzir a largura,

também reduzimos a abertura do feixe de luz, obtém-se um feixe circular

muito pequeno (cónico). Para esta técnica é preferível um ângulo de 40º

entre os sistemas de iluminação e de observação. Permite-nos explorar o

humor aquoso (células e/ou proteínas, fenómeno de Tyndall).

1.2.1.3. – Reflexão especular

A luz reflectida pelas distintas superfícies de descontinuidade óptica

possibilita avaliar o tipo de lágrima, a estrutura lágrima/epitélio e o

endotélio, faces anterior e posterior do cristalino e as superfícies anterior

e posterior da LC.

O procedimento é o seguinte:

• Ajusta-se a fenda a um paralelepípedo de Vogt de largura média.

• Inicialmente usamos um aumento baixo ou médio.

• Os sistemas de iluminação e observação formam um ângulo de

aproximadamente 30º entre si.

• Ajustar a posição do microscópio (e/ou modificar o ângulo de

iluminação) de modo a que a fenda esteja sobre o reflexo do filamento da

luz na córnea (ponto onde o ângulo de reflexão é igual ao ângulo de

incidência). Na posição correcta observamos uma área na superfície

frontal do paralelepípedo com um reflexo muito brilhante. Só se observa

através de uma ocular.

• Incrementamos o aumento o mais possível.

• Focar novamente o biomicroscópio sobre o endotélio da córnea e

observar o mosaico das células endoteliais na superfície posterior do

paralelepípedo.

• Para observas estas áreas do endotélio é necessário deslocar todo o

conjunto (biomicroscópio e lâmpada de fenda).

1.2.1.4. – Tangencial

Os sistemas fazem entre si um ângulo de 90º. Com o biomicroscópio em

posição frontal e utilizando um feixe amplo, observamos a íris. Com o

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biomicroscópio na posição tangente à córnea e utilizando um feixe

estreito, analisamos o perfil corneal e do cristalino.

1.2.2. – Iluminação indirecta

A técnica é semelhante, mas neste caso ilumina-se uma zona e observa-se

ao lado (área próxima).

1.2.2.1. – Focal indirecta

Um feixe de aproximadamente 3mm incide numa determinada área,

enquanto focamos nitidamente com o microscópio binocular outra área

próxima.

1.2.2.2. – Retroiluminação

Reflexão da luz incidente sobre a íris ou a face anterior do cristalino,

observando o humor aquoso e a córnea. Podemos observar pequenos

detalhes anormais, como microquistos, vacuolas, estrias, pregas. A

membrana de Descemet observa-se sobre sombra, ao lado do feixe

reflectido.

1.2.2.3. – Dispersão escleral

Fazendo incidir um feixe de luz no limbo esclero-corneal, devido aos

diferentes índices de refracção, a luz penetra na córnea sofrendo uma

série de reflexões internas. Nestas condições é possível avaliar alterações

da transparência normal da córnea, como por exemplo, edema corneal (se

não há alteração só se vê o limbo esclero-corneal iluminado, designado de

anel de difusão escleral).

O procedimento é o seguinte:

• Ajustamos a fenda a um paralelepípedo estreito (largura do feixe da

fenda aproximadamente de 3 a 4mm).

• Deslocar o microscópio a um lado observando frontalmente (na linha de

olhar do paciente) a córnea sem usar o microscópio (também se pode

usar).

• Ângulo entre os sistemas de observação e de iluminação de

aproximadamente 50º.

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• Focar o paralelepípedo no limbo esclero-corneal temporal do olho que

vamos examinar. A observação realiza-se quando aparece o halo

alaranjado ao seu redor.

• Observamos a córnea sobre o fundo escuro da pupila buscando áreas

enevoadas ou opacas que denunciem qualquer alteração de sua

transparência normal. O aspecto de um edema corneal localizado é o de

uma névoa central circular.

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TEMA 3

QUERATOMETRIA

Esta técnica permite avaliar a curvatura, a forma e regularidade da

córnea. Em Contactologia utilizamo-la para medir os raios da superfície

anterior da córnea, em dois meridianos principais, avaliando o

astigmatismo corneal correspondente a uma área central entre 2 e 4 mm2.

A medida expressa-se em dioptrias e em milímetros. Com estes dados

podemos seleccionar os parâmetros da LC de ensaio.

Quando a superfície corneal é normal, a imagem (das miras do

queratómetro) formada por reflexão sobre a superfície anterior da córnea

(que se comporta como um espelho convexo) observa-se brilhante, regular

e contorno preciso. Quando a córnea é irregular, perde o seu brilho e o

contorno não é regular.

Temos dois grupos de queratómetros: tipo Javal-Schiotz e tipo Helmholtz.

2.1. – Tipo Javal-Schiotz

(Fig.4: Queratómetro Javal-Schiotz).

O queratómetro de javal-Schiotz

está composto por duas miras (Fig.5:

miras Javal-Schiotz), uma é um

rectângulo vermelho dividido por

uma linha central (a que chamamos

linha de fé ou linha crítica) e a outra

é uma dupla escada de cor verde

igualmente separada por uma linha crítica. Estas cores quando

sobrepostas formam uma parte esbranquiçada facilitando assim o

enfoque de ambas as miras tagencialmente, quer dizer, não devem estar

sobrepostas nem separadas mas

dispostas de maneira tagencial

entre si. Primeiro realiza-se a

medição num meridiano e

posteriormente é necessário rodar 90º o instrumento em busca do outro

meridiano principal. A posição das miras nesta e outra direcção indicam

ou que não existe astigmatismo (miras continuam dispostas de modo

Fig.4

Fig.5

Comentário [ES4]: Para medir aproximadamente a topografia corneal podemos

tomar quatro medidas mais, além da central, que

correspondem aos raios de curvatura corneal superior, inferior, temporal e nasal. Para aplicar

este método, pedimos ao paciente que fixe

diferentes pontos (sempre contrário à zona que se quer medir). Deve-se realizar várias medições

e determinar a média.

Comentário [ES5]: A transição de curvatura

entre a córnea e a esclerótica define um determinado perfil, que devemos ter presente

quando adaptamos LC. Isto significa que há

outros factores a levar em conta, além dos dados queratométricos.

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tagencial), que o astigmatismo é inverso (as miras estão agora

separadas), ou bem astigmatismo directo (as miras encontram-se

sobrepostas).

2.2. – Tipo Helmholtz

(Fig.6: Queratómetro Helmholtz)..

O queratómetro tipo Helmholtz é

menos exigente na manipulação,

bastando focar a imagem

reflectida, movendo o aparato

adiante ou atrás, de modo a

visualizarmos três círculos nítidos. A

sobreposição dos sinais positivos dá-

nos a leitura do meridiano

horizontal e a dos negativos a

medida do meridiano vertical. (Fig.7:

Miras Helmholtz).

2.3. – Anotação de valores e sua interpretação refractiva

A anotação de valores pode ser como segue:

OD: º10000.43//º1050.44

OE: º9525.44//º575.44

O valor da potência do astigmatismo da córnea é a diferença que existe

entre os dois meridianos. O eixo do astigmatismo calculado é o que

corresponde à leitura de menor potência. Assim, no exemplo acima, o olho

direito apresenta o astigmatismo de º10050.1 , quer dizer,

astigmatismo inverso uma vez que o meridiano de maior potência é o

horizontal. Igualmente, o olho esquerdo, cujo astigmatismo contra a regra

é de º9550.0 .

A experiência diz-nos que os valores da potência da face anterior da

córnea situam-se entre as 48.00 D e as 39.75 D. Os seus raios estão

compreendidos entre 7.00 mm e 8.50 mm. Cada 0.05 mm de diferença

entre meridianos principais representa 0.25 D de astigmatismo.

Fig.6

Fig.7

Comentário [ES6]: O astigmatismo total pode calcular-se aproximadamente aplicando a

regra de Javal. Javal disse que o astigmatismo total (AR) deduz-se a partir do astigmatismo

corneal (AC), aumentado em ¼ do seu valor

menos o astigmatismo do cristalino (- 0,50 x 90º) se a potência do meridiano vertical é maior

que a do horizontal (astigmatismo directo ou a

favor da regra); e , mais esse astigmatismo (- 0,50 x 90º) se é contra a regra. Expressando

matematicamente:

Astigmatismo directo AR = 1,25 x AC – (- 0,50) 90º

Astigmatismo inverso

AR = 1,25 x AC + (- 0,50) 90º Javal elaborou uma tabela de conversão (cf.

Anexos).

Ultimamente (1988) Grosvenor reflectindo sobre o assunto definiu uma nova regra que

denominou simplificação da regra de Javal:

Astigmatismo directo AR = 1 x AC – (- 0,50) 90º

Astigmatismo inverso

AR = 1 x AC + (- 0,50) 90º A experiência clínica diz-nos que a fiabilidade

de ambas as regras é baixa para astigmatismos

corneais < 1,00 D. Entre 1,00 e 2,00 D é mais fiável a regra de Grosvenor. Nos astigmatismos

corneais > 2,00 D são confiáveis uma e outra

regra.

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TEMA 4

VIDEOQUERATOSCOPIA

A curvatura corneal sofre aplanação do ápice para o limbo esclero-

corneal, originando uma curva asférica, que não é igual em todos os

sujeitos.

A melhor forma de obter uma topografia corneal é mediante

videoqueratoscopia, a qual permite medir toda a córnea e obter uma

representação gráfica analítica. As potências estão codificadas numa série

de cores. O modo de representação da informação varia de instrumento

para instrumento, mas habitualmente há quatro mapas opcionais que

apresentam os resultados: mapa axial (ou de curvaturas sagitais), mapa

de curvaturas tangenciais, mapa de elevação, mapa refractivo.

3.1 – Mapa axial

Permite uma primeira aproximação e é a opção preferível no processo de

selecção da LC de ensaio, pois, considera-se a superfície corneal como

uma superfície esférica de raios de curvatura coaxiais, de modo

semelhante ao desenho de muitas LC disponíveis.

Fig.8a: Padrão normal de uma córnea sem astigmatismo (redondo).

Fig.8b: Padrão de uma córnea com astigmatismo segundo a regra (laço

em posição vertical).

3.2 – Mapa tagencial

Representação semelhante à do mapa axial, variando em que o cálculo do

raio é mais exacto, pois assume a córnea como uma superfície asférica.

Este mapa permite-nos avaliar câmbios mínimos na curvatura corneal

anterior. É particularmente útil em ortoqueratologia acelerada.

Fig.9a: Padrão normal de uma córnea sem astigmatismo (redondo).

Fig.9b: Padrão tipo de uma córnea com astigmatismo segundo a regra

(laço em posição vertical).

3.3 – Mapa de elevação

O software determina a esfera que se adapta melhor à córnea analisada.

Calcula as elevações (ou depressões) da superfície real relativamente a

Comentário [ES7]: Outras formas de apresentação de dados, são os mapas queratométricos, de perfil, numéricos, fusão de

dados, etc. As opções para adaptação de LC, em

que o software conjuga os dados topográficos com outros parâmetros (refracção, diâmetro

pupilar, ...) auxiliam a eleição da LC de ensaio.

A opção mapas de cores possibilita classificar qualitativamente a topografia corneal anterior

analisada, sendo fácil reconhecer as zonas de

igual curvatura, identificando-se as seguintes tipologias: redonda, oval, laço simétrico, laço

assimétrico e irregular (segundo a classificação

de Bogan [esquematizada abaixo]).

Comentário [ES8]: Se está em posição horizontal, o astigmatismo é inverso. Os oblíquos apresentam o laço inclinado 90º do

eixo do astigmatismo

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uma superfície de referência, expressando as diferenças de altura sagital

em micras. É o melhor método para obter a descrição da superfície

corneal. A sua utilidade em Contactologia é praticamente nula. revela-se

interessante no âmbito do diagnóstico diferencial de certas patologias (por

exemplo: queratocone).

Fig.10a: Padrão normal de uma córnea sem astigmatismo (cores

avermelhadas nos 360º da periferia).

Fig.10b: Padrão tipo de uma córnea com astigmatismo (cores azuis no

meridiano mais curvo).

3.4 – Mapa refractivo

De aspecto parecido com os mapas axial e tagencial. Não representa

curvaturas, mas a potência refractiva de cada ponto considerado (segundo

a Lei de Snell). Permite avaliar a qualidade óptica e visual do olho

humano analisado e utiliza-se para aferir o resultado refractivo pós

processos de cirurgia refractiva ou de ortoqueratologia.

Fig.11a: Padrão normal de uma córnea sem astigmatismo (a aplanação

dos raios do centro para a periferia é insuficiente, havendo maior grau

refractivo na periferia e consequentemente aberração esférica positiva).

Fig.11b: Padrão tipo de uma córnea com astigmatismo (o laço topográfico

está invertido relativamente aos mapas de curvatura [axial e tangencial]).

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TEMA 5

MEDIÇÃO DOS DIÂMETROS CORNEAL

E PUPILAR

A medição dos diâmetros corneal e pupilar são referências necessárias

para determinar algumas características das LC. Utiliza-se um régua

milimétrica.

4.1. – Diâmetro corneal

Medimos a longitude horizontal da íris visível (Fig.12: DHIV; as flechas

assinalam os limites do diâmetro horizontal da íris visível; A.L. Alemany

et al).

As córneas podem classificar-se como grandes, médias e pequenas, em

função do diâmetro corneal. Assim,

valores maiores de 12,50 mm

correspondem a córneas grandes;

entre 11.00 e 12.50 mm situam-se as

córneas médias; menores de 11.00

mm, córneas pequenas.

O valor médio do diâmetro corneal indicado na literatura é de 12 mm no

diâmetro vertical e de 13.60 mm no meridiano horizontal.

O diâmetro horizontal da face anterior da córnea costuma estar

relacionado directamente com o raio de curvatura médio no meridiano

horizontal.

4.2. – Diâmetro pupilar

Utilizando baixa iluminação, que permita observar o bordo pupilar,

pedimos ao sujeito que olhe ao longe (evitando assim o estímulo

acomodativo), medindo o diâmetro pupilar com uma régua milimétrica.

(Fig.13: Medida dos diâmetros corneal e pupilar usando uma régua

milimétrica; modificado de A.L. Alemany et al).

Fig.12

Fig.13

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17

TEMA 6

A LÁGRIMA2

Entendemos por lágrima o líquido que banha a superfície anterior do

globo ocular, presente como filme lacrimal e assim distribuído: 4 l no

fórnix, 3l no menisco lacrimal do bordo palpebral e 1l na superfície

ocular não encoberta pelas pálpebras.

O aparelho lacrimal está formado por estruturas e ductos que produzem e

transportam a lágrima.

O espaço existente entre o globo

ocular e as pálpebras é o

receptáculo sólido que contém

uma fase fluida, o mar lacrimal,

na qual deve flutuar a lente de

contacto (Fig.14a: 1, lágrima

freática; 2, cisterna lacrimal; 3, menisco lacrimal; 4, filme lacrimal; 5,

lago lacrimal) (Fig.14b: menisco lacrimal).

1. – Sistema secretor

Glândula lacrimal principal e glândulas

acessórias de Krause e de Wolfring, que

produzem a parte aquosa.

Glândulas de Meibomio e Zeiss, que

produzem a parte lipídica.

Glândulas caliciformes da conjuntiva,

glândulas de Manz e criptas de Henle que

produzem a parte mucínica.

2. – Sistema de distribuição

Pálpebras.

3. – Sistema excretor

Depende de um palpebrado integro e está constituído pelos pontos

lacrimais, ducto lacrimal, saco lacrimal e o ducto naso-lacrimal.

2 Objectivos: O aluno deve compreender a importância do filme lacrimal em Contactologia. Aprender a

avaliar qualitativa e quantitativamente o filme lacrimal. Ponderar a relação lente lágrima em todo o

processo de adaptação de LC.

Fig.14a

Fig.14b

Comentário [ES9]: As alterações lacrimais

na superfície ocular podem derivar da insuficiência funcional dos mecanismos de

produção, distribuição ou eliminação (ou de

uma descompensação entre eles).

Comentário [ES10]: As glândulas de

Meibomio, Zeiss e Moll segregam (suas secreções) no bordo livre. A avaliação da

funcionalidade destas glândulas faz-se

pressionando o bordo livre, observando com a lâmpada de fenda.

Comentário [ES11]: As pálpebras desempenham funções de defesa, limpeza da

superfície ocular, formação e estabilização do

filme lacrimal. Qualquer alteração anatómica ou funcional compromete estas funções.

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Aproximadamente 10 a 20% da lágrima sofre evaporação e esta é tanto

mais significativa em atmosfera seca. A evaporação3 também é mais

notável nos olhos proeminentes e na insuficiência do palpebrado. Os

restantes 80% é transportado através do ducto naso-lacrimal. (Fig.15: a)

filme lacrimal estável; b) adelgaçamento local; c) formação de uma

mancha seca)

4. – Funções da lágrima

As principais funções da lágrima são: óptica, nutricional (córnea),

transporte de produtos metabólicos, asséptica e antimicrobiana,

protecção, lubrificação.

5. – Propriedades físicas

Caudal de 1,2 l/minuto ou um

pouco menos4. Volume de 8 l.

Com os olhos abertos tem um PH

= 7,45. Ao fechar os olhos, o

dióxido de carbono e o ácido láctico

(derivados do metabolismo da

glicose) baixam o PH.

6. – Composição química

A lágrima é constituída por diferentes camadas (modelo clássico), que são

da mais externa para a menos, a camada lipídica, a camada aquosa e a

camada mucínica.

6.1. – Camada lipídica

A camada lipídica está constituída por lípidos não polarizados, tais como

o ácido palmítico, oleico, linoleico e o colesterol; e por lípidos polarizados:

lecitina.

6.1.1. – Tipologias segundo o aspecto da camada lipídica

A observação da camada lipídica pode realizar-se mediante lâmpada de

fenda ou com o Tearscope, avaliando a espessura da camada através da

análise dos diferentes padrões de interferência que a luz provoca nas

3 A evaporação torna as lágrimas hipertónicas, provocando a desturgência corneana e a nitidez óptica,

bem como a desidratação das LC hidrófilas. 4 Com a idade diminui.

Fig.15

Comentário [ES12]: A mucina diminui a tensão superficial do filme lacrimal, elevando-se

a energia superficial do epitélio. Os lípidos

favorecem a estabilidade da estrutura trilaminar do filme lacrimal, prolongando-a. Uma e outra

são fundamentais para a humectabilidade da

superfície ocular. Se a energia superficial de uma superfície for inferior à tensão superficial

da lágrima, o espalhamento e a estrutura do

filme lacrimal estão comprometidos, sobretudo nas lentes com silicone.

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interfaces ar|lípidos e lípidos|água. Segundo o aspecto da camada

lipídica definem-se os seguintes padrões: marmóreo de malha aberta,

marmóreo de malha fechada, ondulado, amorfo, colorido de 1ª ordem,

colorido de 2ª ordem e contaminado (ou globular). A observação não se

limita à aparência cromática mas também à forma e ao movimento

dinâmico do padrão de interferência. Na tabela 1 apresentamos o cânon

definido por Guillon. Maior estabilidade do filme lacrimal corresponde ao

padrão amorfo (espessura 100 microns). Os padrões referência de uma

camada lipídica anormal são o colorido e o globular. Uma camada lipídica

excessivamente grossa contribui para uma maior ocorrência de depósitos

de natureza lipídica na superfície da LC. Se a camada lacrimal é muito

fina perde-se a estabilidade laminar do filme lacrimal. (Fig.16: 1,

marmóreo malha aberta; 2, marmóreo malha fechada; 3, ondulado; 4,

amorfo; 5, colorido 1ª ordem; 6, colorido de 2ª ordem; ).

6.2. – Camada aquosa

Constituída por 98% de água, por electrólitos (cálcio, fosfatos, bicarbonato

– este regula o PH lacrimal), glicose (0,65 g/l, mas nos diabéticos está

elevada), proteínas (5 g/l; equilibra a tensão superficial – esta é

importante para a repartição do filme lacrimal), albuminas (60%; sua

principal função é transportar substâncias), globulinas (20%; sistema

Tabela 1

Fig.16

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imunológico) e lisozima (20%, bacteriostáctica, antiinflamatória,

antihistamínica, hemostática, analgésica e cicatrizante5).

6.3. – Camada mucínica

Está formada por mucopolissacários e glucoproteínas. Armam uma

superfície apta para que a lágrima se distribuía uniformemente sobre a

superfície hidrofóbica da córnea (senão esta repeliria a água).

7. – Génese da secreção lacrimal

A secreção lacrimal origina-se por um mecanismo básico ou secreção

lacrimal normal e por um mecanismo reflexo que responde a estímulos

sensoriais, luminosos e psicogénicos. O mecanismo básico realiza as

funções fisiológicas principais.

Lembre que, ao aplicarmos uma LC estimulamos a resposta reflexa e que

esta provoca uma diminuição transitória dos electrólitos e proteínas e a

osmolaridade da lágrima, conduzindo a córnea para uma condição de

hipertonia relativamente à lágrima, pelo que a córnea capta água e

observa-se um edema nos primeiros dias da adaptação de LC, que não

tem significado clínico.

8. – Métodos6 de análise da lágrima utilizados em contactologia

8.1. – Shirmer I

Teste quantitativo. Avalia o tipo de

secreção total ( basal mais reflexa

conjuntival). Utiliza-se uma tira

5mm x 34 mm de papel Whatman 41

(Fig.17). Dispomos a tira no saco

conjuntival, mais propriamente no

terço temporal do fórnix inferior

durante 5 minutos, mantendo a

iluminação do gabinete normal, sem

correntes de ar. tenha-se em conta

5 A lisozima diminui com a idade, com corticóides e glucose. 6 Alguns métodos aqui descritos não são da competência do técnico em Contactologia.

Fig.17

Comentário [ES13]: Antecipadamente a todo o processo de adaptação de LC devemos

analisar a lágrima. Particularmente, tratando-se de LCRPG avaliaremos, ao adaptar a lente, a

relação desta com a córnea. No período pós-

adaptação apreciaremos a integridade da superfície ocular e possíveis alterações na

secreção e distribuição da lágrima.

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que, se a temperatura ambiente é alta existe menos secreção. Humidade

baixa, menos secreção. A norma contempla três medidas:

- normal (15 a 30 mm/5 minutos)

- hipersecreção (> 30 mm/5 minutos)

- hiposecreção (< 10 mm/5 minutos)

Este método permite aferir o componente aquoso do filme lacrimal.

8.2. – Shirmer II

Teste quantitativo. Avalia o tipo de secreção basal (inibe a reflexa). Exige

a aplicação de anestesia tópica em ambos os olhos. Após a sua instilação

esperamos 2 minutos. Depois secamos com algodão o fórnix e acto seguido

colocamos a tira de Whatman 41. Os resultados são avaliados segundo a

seguinte norma:

- normal (10 a 15 mm: 5 minutos)

- hiposecreção (< 10 mm: 5 minutos)

8.3. – Rosa de Bengala

A finalidade é conseguir colorar as células degeneradas ou mortas do

epitélio conjuntival anormal. É útil no diagnóstico da queratoconjuntivite

seca. Utilizando uma tira embebida de corante e humedecida com solução

salina tocamos a esclerótica, lavamos e observamos com lâmpada de

fenda procurando zonas que apareçam tingidas de vermelho. Mede

indirectamente a secreção lacrimal.

8.4. – B.U.T. (break up time)

Tempo de ruptura do filme lacrimal. Mediante esta técnica avaliamos a

qualidade do filme lacrimal. Observamos o tempo que tarda em romper-

se, pois, o filme lacrimal não é perfeitamente estável (a camada lipídica

tende à coalescência, com a consequente evaporação rápida do conteúdo

aquoso) (Fig.15; coalescência lacrimal). Utilizando uma tira de

fluoresceína7 impregnada de solução salina tocamos a esclera e pedimos

ao paciente que palpebreie por instantes e pare. Depois observamos,

usando uma lâmpada de Wood, como aparecem uns pontos negros.

Repetiremos e notaremos se a ruptura surge sempre na mesma zona. A

7 Sem o recurso da fluoresceína (B.U.T. não invasivo) podemos realizar a observação da ruptura com o

disco de Plácido ou com as miras do queratómetro. Dá-nos um tempo de ruptura mais real.

Comentário [ES14]: Verificando-se insuficiência (défice) ou falta de lágrima, observa-se uma acumulação dos detritos na

superfície ocular, diminuição da visão,

desconforto, debilitação dos epitélios da córnea e da conjuntiva, havendo maior risco de

infecção. Adaptada a LC, é necessário que

exista lágrima pré-lente para garantir uma boa visão, lágrima pós-lente para minimizar o atrito

e melhorar o conforto, lágrima à volta da lente

para garantir a centragem e estabilidade. Nas LCH é importante que exista lágrima no interior

da lente para manter os seus parâmetros e não

desidratar a superfície ocular.

Comentário [ES15]: Os corantes vitais (fluoresceína, Rosa de Bengala, verde de

lisamina, ...) são um recurso válido no diagnóstico da secura ocular, mas deve-se

ponderar que aproximadamente 35% dos

sujeitos que não têm problemas de olho seco apresentam resultados positivos nalguns destes

testes.

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norma considera 10” a 30”. Um valor inferior de 10” indica instabilidade.

Um valor superior a 30” pode denunciar aumento de lípidos.

A estabilidade do filme lacrimal é óptima quanto maior for o seu

adelgaçamento sem que se apresente a ruptura. Entenda-se: que é estável

no período compreendido entre dois palpebrados.

Um B.U.T. baixo pode indicar diferentes situações, tais como

queratoconjuntivite seca, insuficiência de produção de mucínas (xerose),

patologia de Dellen, pterigium, pinguécula, aumento de lípidos polares.

Num usuário de LCH, um B.U.T. baixo, requer a substituição frequente

das lentes. Se o cliente usa LCRPG, estas ficam engorduradas e

necessitam de limpeza frequente. Considere-se ainda que num usuário de

LCRPG o B.U.T. altera-se mais que naquele que usa LCH.

8.6. – Altura do menisco lacrimal

Avaliam-se a altura, a regularidade, a

curvatura e o perfil. Utiliza-se o

biomicroscópio, realizando uma secção

óptica. Observa-se a pálpebra inferior,

onde a quantidade lacrimal, por acção

da gravidade, é maior. O valor normal

é de 0,7 a 1 mm. (Fig.18: altura do menisco lacrimal).

8.7. – Teste de Norm

Instila-se uma mistura de rosa de Benguela e fluoresceína, observando a

coloração avermelhada imediata da lágrima. Medimos o tempo que

transcorre até surgir a coloração amarelada (devido à diluição da mescla

pela lágrima). O valor normal é de 5 minutos. Se é superior, existe uma

secreção insuficiente. Se é inferior, há excesso de secreção lacrimal.

8.8. – Análise por termografia

É uma técnica não invasiva, rápida e objectiva que permite uma

avaliação clínica através da análise de padrões de temperatura. No

âmbito ocular os olhos mais frios são os menos sensíveis. A temperatura

ocular é mais baixa que no corpo e aumenta durante as inflamações e se

há olho seco. São imensas as possibilidades da termografia clínica, não

sendo oportuno entrar aqui em maiores detalhes, dada a especialização

Fig.18

Comentário [ES16]: Questionário de

McMonnies para detectar olho seco: 1. Tem frequentemente sensação de ardor

ocular?

2. Tem constantemente a sensação de areias em seus olhos?

3. Tem os olhos vermelhos amiúde?

4. Tem secreções abundantes ao levantar-se de manhã?

5. Tem infecções oculares repetidamente?

6. Usa lágrimas artificiais? 7. Sente-se incomodada em ambientes secos ou

contaminados?

8. Nota os seus olhos secos? 9. Tem dificuldade para mastigar sem beber

água?

Nota: As perguntas devem fazer-se nesta ordem.

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do assunto8. As imagens termográficas9 a continuação mostram diferentes

situações:

Acima (esquerda) imagem termográfica do olho de um paciente antes de

instilar lágrimas artificiais. Acima (direita) após instilar lágrimas

artificiais. Note a temperatura fria do fluido lacrimal. Ao centro

(esquerda) minutos depois de ter instilado as lágrimas artificiais. Note a

temperatura fria do olho (compare com a imagem acima à esquerda).

Entretanto adaptou-se uma LCRPG. Ao centro (direita) antes de

8 O autor é Técnico de Termografia Clínica e membro da APTDC (Associação Portuguesa de Termografia

e Diagnósticos Complementares). Os interessados podem visitar www.termografia.pt.vu. 9 As imagens foram captadas com uma NEC Thermal Imaging Câmara.

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pestanejar. Abaixo (esquerda) depois de pestanejar. Abaixo (direita)

fotografia da câmara de termografia utilizada.

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TEMA 7

PÁLPEBRAS10

As pálpebras, dada sua função, seu movimento, forma e disposição

influenciam quer as características das LC como o tipo de adaptação que

faremos.

A configuração da pálpebra inferior, particularmente, condiciona a

adaptação de lentes truncadas, bifocais de visão alternante ...

1. – Repasso anatómico

As pálpebras têm uma função de protecção e lubrificação do globo ocular.

A sua disposição conforma a fenda palpebral. Estão formadas por uma

porção externa (músculo cutânea) e outra interna (tarso conjuntival).

1.1. – Músculos das pálpebras

Orbicular, inervado pelo VII par. este músculo tem como função fechar as

pálpebras voluntária e involuntariamente. O seu antagonista, o elevador

palpebral (pálpebra superior) é inervado pelo III par.

O músculo de Müller é inervado pelo simpático e sua acção é coadjuvar a

elevação da pálpebra superior e manter o seu tono.

1.2. – Estrutura

Tegumento com glândulas sudoríparas e sebáceas. Tecido celular

subcutâneo. O orbicular. Lâmina tarsal com o septum orbital. Conjuntiva

palpebral.

As sobrancelhas e as pestanas são anexos das pálpebras.

1.3. – Funções das pálpebras

Protegem o globo ocular. Espalham a lágrima, lubrificam a superfície

anterior do globo ocular e favorecem o metabolismo.

Actuam como pára-brisas e como fenda estenopeica.

Activam a circulação do olho.

Intervêm na mímica.

10 Objectivos: Avaliar a importância do ritmo e amplitude palpebral, tono das pálpebras, posição, fenda

palpebral, margens palpebrais e como estas medidas oculares interferem no processo de adaptação de LC.

Comentário [ES17]: Os parâmetros palpebrais que particularmente condicionam a adaptação de LC são a posição e a abertura

palpebrais e a frequência e amplitude do

palpebrado.

Comentário [ES18]: As pálpebras desempenham funções de defesa, limpeza da

superfície ocular, formação e estabilização do filme lacrimal. Qualquer alteração anatómica ou

funcional compromete estas funções.

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2. – Importância do palpebrado

Dá-se o nome de palpebrado à função motora das pálpebras que consiste

na oclusão da fenda palpebral pela acção da contracção do músculo

orbicular.

No usuário de LC esta acção é particularmente necessária, pois, ao

palpebrar gera-se uma força que comprime a LC contra o globo ocular,

favorecendo a renovação lacrimal pós-lente, favorecendo a oxigenação e

nutrição da córnea, bem como a eliminação de impurezas metabólicas

acumuladas.

A LC move-se. Intercambia-se, em cada pestanejo, aproximadamente 20%

de lágrima em LCRPG e um 5% em LCH (estas são de maior diâmetro e

seu movimento é mais lento).

2.1. – Tipos de palpebrado

O palpebrado espontâneo é automático, bilateral e sincrónico. Afectam-no

factores psíquicos, físicos, luz, calor, vento.

Se o ritmo palpebral é lento ocorre vascularização conjuntival e a

evacuação lacrimal torna-se difícil.

O palpebrado de defesa é de natureza reflexa e de origem sensitivo ou

sensorial. Ao adaptar uma LC pela primeira vez desencadeia-se um

pestanejo de defesa motivado pela LC, a qual é inicialmente um corpo

estranho.

O palpebrado voluntário é variado e forma parte da mímica do indivíduo.

O fenómeno, dito de Bell, enquadra-se aqui e, como se estudou,

caracteriza-se por um giro rápido do globo ocular para cima, em sentido

temporal (em direcção às glândulas lacrimais) para depois retomar a sua

posição normal. Ao tomar consciencialização deste fenómeno, o paciente

beneficia o metabolismo da superfície anterior do globo ocular,

optimizando inclusive o efeito “bomba”, sempre que o provoque. Modo de

explicar a técnica de Bell ao paciente: fechar as pálpebras com rapidez,

forçar algo o movimento e de um modo completo; deixar as pálpebras

cerradas por alguns instantes e consciencializar o movimento; reabrir

totalmente as pálpebras.

Pode existir um pestanejo deficiente na seguintes condições: posição

anormal das pálpebras; diminuição da frequência; pestanejo incompleto.

Todo o palpebrado incompleto origina má humificação e pontos secos. Um

Comentário [ES19]: Um ciclo de pestanejo, desencadeia-se (valor médio) cada 4 segundos,

espontaneamente, durando aproximadamente 0,3 segundos, ficando as pálpebras

completamente fechadas cerca de 0,05

segundos. Quando o tempo entre dois ciclos de pestanejo for superior ao tempo de estabilidade

do filme lacrimal (ou se o movimento é

incompleto), a superfície ocular sofre desidratação. O mecanismo de pestanejo deve

avaliar-se particularmente no caso de queratite

superficial localizada.

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pestanejo inadequado pode ser a causa de uma adaptação de LC

problemática (apesar da adaptação estar óptima!). As queixas e sinais que

denunciam um palpebrado incompleto ou inadequado11 são:

engorduramento das LC; desidratação das LC; maior acumulação de

depósitos; diminuição da AV; sensação de corpo estranho; edema

corneano; marcas 3-9 horas (as células do epitélio secam, suas

membranas rompem-se); LC mal adaptadas que interferem com o

palpebrado normal.

2.2. – Modalidades de palpebrado

O palpebrado pode caracterizar-se nas seguintes modalidades: normal (a

pálpebra superior toca a inferior, a LC desloca-se, a lágrima estende-se e

a superfície anterior é lubrificada); parcial (palpebrado incompleto, pois

as pálpebras não chegam a tocar-se); palpebrado nervoso (alguns autores

designam esta modalidade pela palavra pestanejo – é um tique!). (Fig.19:

Tipos de palpebrado).

2.3. – Causas frequentes de alterações das pálpebras

Alterações de posição e de movimento: ptose. Esta pode ser congénita ou

adquirida. Neste caso adapta-se uma LC especial. Pseudoptose. Entropio

(senil, cicatrizes, espamódico). Pode estar indicada LC terapêutica.

11 Podemos ensinar o paciente a pestanejar. Alguns exercícios simples permitem reeducar o ritmo e a

amplitude do palpebrado. Consciencializar o fenómeno de Bell é um bom exercício.

Fig.19

Comentário [ES20]: Uma vez que a falta de pestanejo, um palpebrado excessivo, um

palpebrado lento, um palpebrado incompleto, uma posição anormal das pálpebras, margens

irregulares das pálpebras ... provocam uma

distribuição insuficiente e deficiente do filme lacrimal, constituem motivo de contra-indicação

para a adaptação de LC.

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Ectrópio. Epífora. Nestes casos (aliás relacionados!) está contra-indicado

adaptar LC.

Alterações dos bordos palpebrais: blefarite (escamosa, ulcerativa,

seborreica, rosácea, parasitária. ptiriase). Calázio, orzuelo. Adaptação

contra-indicada ou muito ponderada.

Alterações das pestanas: madarose ou ptilose, triquiase, distiquiase.

adaptação prudente.

Alterações do epicanto: xantelasma. Contra-indicada.

3. – Tonicidade palpebral

As pálpebras exercem uma pressão radial e tangencial sobre a córnea e o

globo ocular. Esta pressão varia segundo o sujeito, aceitando-se uma

classificação em três tipos: normotónicos, hipertónicos e hipotónicos.

Para avaliar a tonicidade palpebral invertemos o bordo da pálpebra

superior e, esticando com o dedo índice e polegar, largamos, observando o

reviramento. Este será rápido se é rígido. Também analisando o aspecto

do bordo palpebral superior. Ainda, verificando a tensão ao colocar a LC.

A tonicidade das pálpebras interfere na centragem das LC,

comprometendo o seu movimento e o do filme lacrimal. Os pacientes

míopes costumam ter pálpebras tensas e grossas que exercem uma

pressão forte sobre a LC (tal pode entalar a LC, imobilizando-a, alterando

o intercâmbio lacrimal, desencadeando lesões corneanas e dificultando a

tarefa de retirar a LC). Nos hipermétropes normalmente as pálpebras

são flácidas e os olhos afundados (tal perturba a posição de equilíbrio da

LC).

Regra geral, se a pálpebra é tensa adapta-se diâmetro menor e se é

flácida diâmetro maior.

4. – Fenda palpebral

A fenda palpebral está delimitada pelo bordo livre das pálpebras. A sua

largura é de uns 25 a 30 mm e sua altura de 14 a 15 mm. Tem forma oval

e a pálpebra superior cobre a córnea aproximadamente 1 a 2 mm. O bordo

inferior é tangente ao limbo esclero-corneano.

O tamanho da fenda é importante pois detrmina o diâmetro da LC a

daptar e inclusive a técnica de adaptação (interpalpebral e extrapalpebral

ou subpalpebral).

Comentário [ES21]: A posição normal da pálpebra superior é entre as 2 e as 10 horas,

enquanto que a pálpebra inferior é tangente ao

limbo esclero-corneal.

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Tenha-se presente que a fenda palpebral varia com a idade, estado

psíquico e a fadiga.

Tomando como referência a córnea, a fenda palpebral expressa-se em mm

da seguinte maneira: se a

pálpebra é tangente à córnea

anota-se valor zero; se fica

abaixo damos sinal negativo; se

está sobre a córnea usamos o

sinal positivo. (Fig.20: Posição

das pálpebras relativamente aos

limites da córnea).

5. – Exame das pálpebras

Devemos considerar diferentes momentos de avaliação: inicial e de

seguimento. O método exige a

inversão das pálpebras (Fig.21).

Devemos procurar folículos e

papilas, inspeccionar a pele da

face, acne rosáceo, blefarite

recorrente, secreção anormal,

alterações do filme lacrimal12,

dificuldade para usar LC

(rígidas ou hidrófilas).

Examinaremos13 as margens

palpebrais para identificar

irregularidades, falta de

pestanas, edema das margens

palpebrais, obstrução dos orifícios das glândulas de Meibomio, secreção

alterada, atrofia das glândulas, quistos, blefarite ...

12 Estados inflamatórios ou infecções agudas ou crónicas das glândulas lipídicas implicam a formação de lípidos anormais e provocam uma ruptura do filme lacrimal rápida. 13 O técnico em Contactologia não faz o diagnóstico mas a sua observação preliminar facilita a tarefa do

especialista.

Fig.20

Fig.21

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TEMA 8

CONJUNTIVA, ESCLERÓTICA

E LIMBO ESCLERO-CORNEAL

1. – Conjuntiva

Membrana mucóide que recobre a parte interna das pálpebras e a porção

anterior do olho sobre a esclerótica. A conjuntiva une as pálpebras com o

globo ocular.

A conjuntiva está formada por epitélio conjuntival (células não

queratinizadas estratificadas e por células caliciformes) e o estroma (que

contém vasos e nervos).

A conjuntiva divide-se em bulbar, tarsal (superior e inferior) e fórnix

(superior e inferior). Na região do fórnix diversos ductos das glândulas

segregam produtos que formam a lágrima.

As conjuntivites podem ser de natureza alérgica, infecciosa, vírica ou

provir de irritação por pó, vento, raios UVA, vapores químicos, LC.

A queratoconjuntivite límbica superior pode ter como causa o uso de LC

(substâncias químicas da desinfecção, depósitos de proteínas, hipoxia,

adaptação fechada). Esta patologia manifesta-se por vermelhidão,

secreções, edema, dor, picor ... segundo as modalidades aguda, subaguda

e crónica. Pode provocar leucomas, neovasos, vasos fantasma, distorção

corneal, folículos (proliferação de tecido linfático debaixo do epitélio

conjuntival em resposta a uma irritação crónica, alérgica ou mecânica).

A conjuntivite papilar gigante caracteriza-se pela formação de papilas de

1 mm ou maiores, picor, secreção mucosa, aspecto turvo, pseudoptose ...

Pode estar relacionada com depósitos de proteínas nas LC (mais

frequente nos usuários de LCH). Utilizando fluoresceína pode-se observar

as papilas. È um tipo de sensibilidade retardada e relaciona-se também

com alergia.

O pterígio é uma prega membranosa triangular, cuja etiologia se acredita

ser a irritação pelo pó ou o vento. Pode ocupar a fenda interpalpebral

desde qualquer zona da conjuntiva até à córnea. Nalguns casos

desenvolve-se depois da pingécula. A LC não deve tocar o pterígio nem

enclausurá-lo (é o que sucederia se adaptássemos uma LCH). É preferível

adaptar LCRPG.

Comentário [ES22]: A sensibilidade (que condiciona o conforto) e a vascularização (que

condiciona a hiperemia) da conjuntiva, são critérios fundamentais da tolerância da

superfície ocular às LC. A actividade

imunológica anormal constitui uma contra-indicação de adaptação de LC. As papilas, regra

geral, localizam-se na conjuntiva tarsal superior,

têm morfologia poligonal, são de tamanho maior e apresentam uma maior densidade

vascular em seu centro, diferenciando-se dos

folículos, que são piramidais e frequentemente menos elevados, manifestando-se habitualmente

na pálpebra inferior.

Comentário [ES23]: A análise da

conjuntiva divide a conjuntiva bulbar em zonas nasal, temporal, superior e inferior; e a

conjuntiva tarsal superior em 3 zonas centrais e

2 laterais. Cf. Anexos: CCLRU grading scales.

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A pingécula é uma mancha amarelada que se situada próximo da córnea

formada por engrossamento da conjuntiva. A LC nunca deve ficar a tocar

a pingécula ou a envolver metade, mas cobri-la totalmente.

2. – Esclerótica

A esclerótica é uma túnica opaca e fibrosa, cuja função primordial é a de

sustentação e protecção. Sobre ela inserem-se os músculos extrínsecos do

globo ocular.

A esclerótica, na perspectiva da Contactologia, é relevante porque alguns

modelos de LC apoiam-se sobre ela: LCE-C (lentes esclero-corneanas) e

as LCH.

O raio (R) da esclerótica é de 12 mm a 12,5 mm. O raio (R) da córnea é de

7,80 mm.

A esclerótica está formada por tecido conjuntivo parecido ao da córnea,

fibras de colagénio, fibras elásticas e muito poucas fibras pigmentares.

Na esclerite os vasos dilatam-se e incham. Ao inspeccionar a esclerótica

devemos procurar nódulos, áreas de pigmentação ...

3. – Limbo esclero-corneano

Anel pericorneano onde se sobrepõem o tecido corneal, o escleral e o

conjuntivo. É uma referência para medir o diâmetro da córnea. É uma

região rica em vasos sanguíneos que nutrem a córnea. Por este motivo a

LC não deve comprimir o limbo esclero-corneano.

Comentário [ES24]: O limbo esclero-

corneal indica-nos o estado da superfície ocular, evidenciando os efeitos de hipoxia relacionados

com o uso de LC, através de hiperemia e

neovascularização.

Comentário [ES25]: Acima à esquerda (hiperemia corneal normal); ao centro (hipoxia);

à direita (conjuntivite por exposição). Em baixo

à esquerda (conjuntivite bulbar); ao centro (conjuntivite límbica superior); à direita

(vascularização focal – insuficiência límbica).

(Adaptado de R. M. Herranz)

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32

TEMA 9

CÓRNEA14

A córnea tem uma forma quase circular, é transparente e a sua função

principal é de natureza óptica15. Apresenta um raio de sua superfície

anterior de 7 mm a 8,5 mm, aceitando-se o valor médio de 7,80 mm. A

córnea pode ser esférica, astigmática e irregular. Apresenta um índice de

refracção de 1,376. Tem uma espessura média de 0,56 mm. O seu poder

refractivo cifra-se em 43 D. Tem a forma de um menisco negativo.

1. – Topografia corneal

Uma zona central (por simplificação, costuma-se dizer que corresponde

com o centro pupilar, óptico, visual e geométrico). Uma zona intermédia.

Uma zona periférica ou marginal.

A zona apical corresponde à área central. Rara vez corresponde com o

centro visual e com o centro geométrico da córnea, mas a maioria dos

14 Objectivo: Compreender que a adaptação de uma LC implica não alterar a estrutura e metabolismo da córnea. Salientar a importância de conhecer valores tais como dimensões, potência, raio, espessura, forma

... 15 Outras funções: protecção e metabólica.

Fig.22

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instrumentos que medem o contorno da córnea assumem-no. A fig.22

resume o assunto. Hoje, considera-se que a zona periférica da córnea

estende-se desde a margem da zona apical até ao limbo esclero-corneal

(não considerando a zona

intermédia do modelo

clássico) (Fig.23: Disposição

dos componentes da

superfície corneal. MZA,

margem da zona apical; ZA,

zona apical; ZP, zona

periférica; CA, centro

anatómico da zona apical;

CV, centro visual; CG, centro geométrico).

2. – Medida do diâmetro da córnea

Normalmente a córnea tem um diâmetro de 11 a 12,5 mm. Referimo-nos

ao diâmetro óptico e anatómico. Esta medida é importante porque

permite seleccionar o tamanho da LC. Utiliza-se uma régua milimétrica e

devemos medir ao mesmo tempo o diâmetro pupilar, cuja medida

determina o diâmetro da zona óptica posterior da LC. Considerar o arco

senil.

O seu diâmetro (ut supra) ronda os 12 mm. Se este é menor de 10 mm

denuncia microcórnea. Se o diâmetro é maior que 13 mm revela

megalocórnea.

3. – Curvatura da córnea

A curvatura da córnea varia ao longo do dia, com a idade, com o uso de

LC, segundo o sexo, pressão intra-ocular, osmolaridade da lágrima,

temperatura ambiente, gravidez, tumores palpebrais, edema palpebral e

estados patológicos corneanos. As alterações da curvatura corneal pode

classificar-se em fisiológicas (segundo o momento do dia, temperatura,

ovulação, emoções), patológicas (queratocone, astigmatismo irregular) e

provocadas (pálpebra superior).

A córnea, sendo um tecido muito maleável (elástico) é susceptível, baixo

certas condições, de modificar a sua curvatura (fundamento da

Ortoqueratologia).

Fig.23

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O raio de curvatura médio da superfície anterior da córnea, na região

apical, é de uns 7,80 mm (7,20 a 8,50 mm). Quando o raio decresce abaixo

de 7,00 mm pode denunciar queratocone.

A fig.24 resume as dimensões da córnea.

4. – Estrutura da córnea16

Epitélio. Mitose. Possui microvilosidades, nas quais se acomoda o filme

lacrimal. Verifica-se uma redução destes microvilli nos usuários de LC

(maioritariamente com LCRPG). Também pode haver uma redução

temporal nas blefarites e meibomites.

Membrana Basal. A integridade desta membrana garante o intercâmbio

metabólico entre o epitélio e o estroma.

Membrana de Bowman. Barreira. É destruída facilmente.

Estroma. Colagénio. O paralelismo das fibras e o nível de hidratação

conferem à córnea sua qualidade óptica.

Endotélio. Polimegatismo e pleomorfismo.

5. – Contemplações sobre o efeito das LC no metabolismo

corneano

A córnea frui energia para manter sua transparência e estado de

desidratação. Bomba metabólica activa de Na, K. Metabolismo. A direcção

do fluido depende da tonicidade da lágrima. Se a lágrima é hipotónica a

16 Lembramos que o aluno deve reler a matéria estudada na disciplina de Anatomia e Fisiologia Ocular.

Aqui apenas resumimos.

Fig.24

Comentário [ES26]: As LC podem deteriorar a superfície das células mais externas

do epitélio corneal, comprometendo seriamente

a adesão da lágrimas à superfície anterior da córnea, pois, toda a LC actua como inibidor do

ciclo normal de renovação celular do epitélio da

córnea.

Comentário [ES27]: Nos usuários de LC verifica-se um adelgaçamento uniforme da

camada epitelial da córnea. Nos usuários de LC

em regime de uso prolongado há uma inibição indiscutivelmente mais vincada da renovação

epitelial normal. Este efeito é reversível,

observando-se uma recuperação total da espessura normal ao cabo de um mês, após

deixar de utilizar a LC. Os estudos confirmaram-no tão-só para a região central. O

adelgaçamento do estroma corneal (durante o

uso de LC), o qual, entre outros factores de tipo mecânico, atribui-se à hipoxia crónica, não se

altera uniformemente e não recupera os valores

originais, pelo menos a curto prazo. Depreende-se que qualquer medição da espessura corneal

em utilizadores de LC a longo prazo poderá

disfarçar o edema pelos efeitos simultâneos de adelgaçamento epitelial e estromal, sendo

recomendável determinar o edema real após um

período de não utilização das LC, mínimo, de 7 dias e desejável, de 30 dias.

Comentário [ES28]: A transparência da córnea resulta da distância uniforme entre as

fibras de colagénio. O estroma corneano, considerando sua composição bioquímica, tem

elevada afinidade pela água (pressões de

embebimento fundamentalmente originadas por proteoglicanos do estroma). Os factores de

manutenção do equilíbrio da hidratação

estromal são a pressão de embebimento, a pressão intraocular, a evaporação e a bomba

endotelial. O endotélio corneal é o principal

regulador da hidratação da córnea. O endotélio não se regenera, verificando-se uma perda

progressiva de sua funcionalidade, com a idade

e o uso de LC.

Comentário [ES29]: Sem LC adaptada, a superfície ocular recebe o impacto de uma

pressão parcial de O2 de 159mmHg. Com LC

adaptada, a disponibilidade de O2 diminui para 1/3, aumentando significativamente a

concentração de CO2, baixando o pH (e a

salinidade da lágrima) e elevando-se a temperatura. Todo este conjunto de mudanças

compromete o equilíbrio homeostático da

superfície ocular.

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córnea aumenta de espessura, sofre edema epitelial, dá-se a separação

entre as células e a córnea é mais vulnerável. Isto sucede quando

adaptamos uma LC pela primeira vez e nesta conjuntura é

momentâneo17. Se a córnea é hipertónica, passa água da córnea. Há

equilíbrio quando o meio é isotónico.

O edema epitelial manifesta-se através de visão blur, miopia creep,

diminuição dos raios de curvatura, microquistos, vacuolas e bolhas. Os

microquistos (10 a 15 de diâmetro) crescem nas camadas profundas do

epitélio e chegam à superfície, não afectando a visão, causando um leve

desconforto. Como seu índice de refracção é maior, comportam-se como

lentes convergentes e apresentam inversão de campo (ao contrário das

vacuolas). Ao examinar o paciente e confirmando-se existirem

microquistos, devemos quantificar o seu número. Se existem em número

superior a 30, conceder um período de 7 dias de descanso e readaptar LC

com maior DK/L. Não confundir os microquistos com debris (dejectos em

suspensão na lágrima). Os microquistos são uma desorganização celular

por necrose do tecido.

O edema do estroma manifesta-se por embaciamento, sendo característica

observar, nos usuários de LCPMMA, uma nuvem central na córnea. Os

signos próprios são as estrias (5% de edema) que têm a figura de linhas

brancas verticais, parecendo penas e, que não devem confundir-se com os

nervos; as pregas (10% de edema), que denunciam a separação das fibras

de colagénio; e a perda da transparência no edema patológico (maior de

15%).

O edema do endotélio revela-se na existência de ampolas endoteliais.

Para solucionar o edema conceder um septenário de repouso e readaptar18

aumentando o DK, diminuindo a espessura da LC, mudando para LCH,

levantando o bordo da LC.

A presença de vasos sanguíneos na córnea denuncia alterações de sua

nutrição. Ao examinarmos a córnea deve-se levantar sempre a pálpebra

superior. Identificar possível pannus. Em não usuários de LC considera-

se normal uma neovascularização de 0,2 mm. Nos usuários de LCRPG

estima-se normal uma neovascularização 0,4 mm. Nos usuários de LCH

de uso diário assume-se como habitual um valor de 0,6 mm. Nos usuários

17 O edema da córnea é uma complicação latente em todo o usuário de LC. Por isso deve vigiar-se

periodicamente o estado da córnea. Problemas: edema do estroma, hipoxia, microvascularização. 18 Esta decisão será assumida dialogando com o especialista que supervisiona o técnico.

Comentário [ES30]: Para não intrometer alterações significativas na espessura corneal (induzir edema), uma LC deve possuir uma

transmissibilidade de 35barrer/cm para poder

usar-se em regime diário e de 125barrer/cm para regime de uso prolongado.

Comentário [ES31]: O edema fisiológico (ou nocturno) é inferior a 5% e após acordar

desaparece. O edema tem significado clínico

quando a espessura ultrapassa os 5%, manifestando-se as primeiras alterações

histológicas em forma de estrias no estroma

e/ou pregas na membrana de Descemet (maior de 8%). O edema superior a 10% pode

comprometer a transparência da córnea. Acima dos 15% é distintamente patológico (haze ou

central corneal clouding).

Comentário [ES32]: Num usuário de LC, as estrias no estroma corneal denunciam edema superior a 5%, enquanto que as pregas na

membrana de Descemet indicam edema maior

que 8%.

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de LCH de uso prolongado é comum 1,4 mm. Valores superiores a estas

normas requerem tratamento: aumentar DK/L, reduzir o tempo de uso,

controlar o paciente.

A insuficiência de fluxo de oxigénio da atmosfera para a córnea relaciona-

se com alguns signos: sensação de visão enevoada (com quebra da AV),

dor persistente, sensação insistente de queimadura, halos de luzes,

lacrimejo excessivo, visão turva ao retirar as LC e congestão conjuntival.

Levar em consideração as seguintes reflexões:

Na adaptação de LCRPG os factores que interferem no intercâmbio do

oxigénio são o alinhamento da LC com a córnea, o diâmetro da LC, o raio

de curvatura, a frequência e amplitude do palpebrado.

Na adaptação de LCH, a hidrofilia do material é que torna as lentes

permeáveis ao oxigénio e influi particularmente a espessura da LC.

Os requisitos gerais da metodologia de adaptação de LC, resumindo, são:

paralelismo do raio base K, técnicas abertas (córneas esféricas), técnicas

fechadas (córneas astigmáticas, paralelo a K ou menor que K), raios das

bandas apropriados, largura das bandas suficientes, bordo das LC não

agressivos, espessura central adequada.

O conceito de ságita (ou flecha) é uma noção básica em todo o processo de

adaptação. Entende-se por ságita ao distância entre a base e o ápice ao

colocar a LC sobre uma superfície plana. A diferença de flecha entre a

superfície corneana e a LC induz certo desalinhamento desta

relativamente àquela. Para diminuir a ságita de uma LC devemos

diminuir o diâmetro de dita LC ou aumentar o raio de curvatura

(tornando a lente mais plana). (Fig.25).

Fig.25

Comentário [ES33]: Muito do que aqui se realça alerta para o facto iniludível de que

durante o uso de LC ocorrem alterações

histológicas das distintas camadas que constituem a córnea e, de um modo geral, de

toda a superfície ocular, sendo de primeiríssima

importância avaliar o seu significado clínico, reconhecendo-as em seu estado precoce. Isto

reclama exames periódicos exaustivos de

apreciação pós-adaptação, que lamentavelmente não se realizam dada a propensão selvagem de

comercialização das LC.

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6. – Sensibilidade da córnea

A córnea conforma um tecido que é o mais sensível do organismo humano.

A inervação19 da córnea é o esqueleto da integridade do tecido corneano,

verificando-se uma heterogeneidade na sua densidade, variando de um

máximo (no ápice) a um mínimo (na periferia). O meridiano horizontal é

mais sensível que o vertical e a zona lateral mais que a medial.

Consideram-se diferentes sensibilidades: táctil (determinada com o

estesiómetro), térmica, dolorosa, objectiva, subjectiva (fisiológica,

farmacológica, patológica).

A estesiómetria fundamenta-se na determinação do umbral de sensação

táctil da córnea. Esta técnica foi desenvolvida (1960) por Cochet e Bonnet.

Nos últimos anos surgiu a estesiometria de não contacto. Avalia as

variações de pressão que transmite longitudinalmente um fio de nylon de

diâmetro constante (0,12 mm) e de comprimento variável (5 a 60 mm). A

pressão transmitida é de 12 a 200 mg. Estimula-se 100 terminações

nervosas quando tocamos a córnea com a ponta do fio de nylon.

Normalmente o estesiómetro incorpora-se à lâmpada de fenda.

Uma boa estesia indica boa tolerância. Ao diminuir a sensibilidade

também baixam os mecanismos de defesa, pois, a dor é um sinal de

alarme e obviamente também diminuído20.

As normas da estesiómetria são: anestesia (0 cm de fio), hipoestesia (1-2

cm) normal (3-5 cm), hiperestesia (6 cm ou > 6 cm). A adaptação de LC

apenas estaria indicada nos casos ditos normais (3-5 cm).

6.1. – Efeito das LC na sensibilidade corneana

As LCR (PMMA e RGP) provocam uma diminuição considerável. Nas

LCH a variação é menor, dependendo da natureza do material e da

renovação das LC.

A hipoxia é a causa primária de diminuição da sensibilidade da córnea. A

variação é igual segundo o sexo e aumenta da manhã à tarde. Deve-se

avaliar e vigiar a hpoestesia corneana nos usuários, por muitos anos, de

LC.

19 Nervos ciliares com ramos da divisão oftálmica do trigémeo. Os nervos perdem a mielina. 20 A LC não se retirará, comprometendo a saúde da córnea . A sensibilidade varia com a idade, cor da íris, pressão intra-ocular, variação diurna, fecho das pálpebras, factores ambientais, queratotomia

fotorrefractiva, diabetes, albinismo, afaquia, neuralgia pós-herpética.

Comentário [ES34]: A diminuição de acetilcolina (ACh) em condições de hipoxia,

parece ser um dos factores principais

responsáveis pela diminuição da sensibilidade corneal durante o uso de LC.

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7. – Fragilidade do epitélio da córnea

Por fragilidade entende-se a capacidade de resistência do epitélio da

córnea às agressões mecânicas.

Avalia-se a fragilidade através do uso de LC, mediante estesiometria e

através do teste com o algodão (instilar fluoresceína e ver se há erosão).

As causas frequentes de fragilidade do epitélio da córnea são diabetes,

tratamentos prolongados com corticóides e antibióticos, desnutrição, curas

de emagrecimento, infecções otorrinolaringológicas, gravidez.

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TEMA 10

ADAPTAÇÃO DE LC RÍGIDAS ESFÉRICAS

Hoje, a adaptação de LCR implicará adaptar LCRPG pelas vantagens

destas relativamente às PMMA. Estas ainda se adaptam naqueles casos

em que o paciente as usa com êxito.

Analisaremos as vantagens e desvantagens da s LC rígidas esféricas, bem

como a teoria fundamental para a adaptação das mesmas.

1. – Vantagens das LC rígidas esféricas

Este tipo de lentes possibilita corrigir astigmatismos maiores de 1,50 D

obtendo uma acuidade visual muito superior aquela que se obteria com

LCH (esféricas).

A visão é estável e muito boa. Por este motivo também estão indicadas no

queratocone e noutros tipos de irregularidades da superfície corneal.

Os materiais com que são fabricadas as LC rígidas conferem-lhes maior

durabilidade (quanto maior a proporção de PMMA na composição do

copolímero da lente, maior durabilidade).

A composição das LC rígidas torna-as mais resistentes aos depósitos.

As LC rígidas, por não requererem hidratação, são preferíveis em todos os

casos em que o paciente apresente problemas na quantidade e qualidade

do filme lacrimal.

A elevada transmissibilidade ao oxigénio das LCRPG garantem a sua

biocompatibilidade.

As LC rígidas admitem modificar os seus parâmetros, como o diâmetro e

a potência, em valores de 0,50 D, bem como o polimento de sua superfície

para eliminar depósitos.

A manipulação das LC rígidas é menos exigente do que as LCH, pelo que

podem preferir-se nos casos em que há dificuldade para manipular as LC.

Igualmente, a higiene, assepsia e manutenção das LC rígidas é menos

problemática que a das LCH.

O seu custo é menor, considerando a durabilidade e a simplicidade dos

sistemas de manutenção.

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2. – Desvantagens das LC rígidas esféricas

As LC rígidas são menos confortáveis no início de sua adaptação,

predominando a sensação de corpo estranho, com excesso de lacrimejo.

Numa adaptação correcta, esta sensação de incomodidade desaparece ao

cabo de alguns minutos. O período de adaptação é mais rigoroso e

exigente do que com LCH. por este motivo não é possível o uso

intermitente das LC rígidas.

A adaptação de LC rígidas esféricas também requer maior destreza,

conhecimentos e experiência profissional do técnico, que as LCH.

A interposição de partículas estranhas no espaço pós-lente de uma LC

rígida é mais irritante do que no espaço pós-lente de uma LCH. Por esta

razão não se recomenda adaptar LC rígidas em sujeitos que trabalhem

em ambientes com muita poeira.

As LC rígidas não estão indicadas na prática desportiva. Contrariamente

às LCH as LC rígidas podem saltar do olho. O movimento de uma LC

rígida é mais pronunciado do que o de uma LCH. Nas LCR (de PMMA),

por seu menor diâmetro (para compensar a sua falta de Dk/L) este

movimento pode provocar flutuações na visão.

Pálpebras tensas interferem na dinâmica e estática da LC rígidas.

3. – Processo de adaptação

3.1. – Aspectos gerais

O processo de selecção da LC rígida esférica exige do adaptador conhecer

os diferentes materiais com que este tipo de LC se fabricam, considerar o

seu Dk/L, humectabilidade, flexibilidade, durabilidade e levar em conta o

uso. Regra geral, opta-se por uma LC de maior Dk/L possível e que não

modifique outras características da lente.

3.1.1. – LCR (PMMA)

As LCR (PMMA) devido à sua impermeabilidade ao O2, adaptam-se com

diâmetros menores que as LCRPG, minimizando assim a área afectada. A

curva base deve ser mais fechada que K para garantir a centragem da

lente. Pode ser preferível optar por um diâmetro algo maior e adaptar

segundo uma curva base mais plana (ou aberta).

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Neste tipo de lentes, a oxigenação corneal ocorre através da lágrima pós-

lente, renovando-se com cada palpebrado.

3.1.2. – LCRPG

Este tipo de LC rígidas são permeáveis aos gases. Esta característica

permite obter diâmetros maiores. O fluxo de O2 faz-se por duas vias:

através da periferia da lente com cada palpebrado e através da lente. A

adaptação preferindo diâmetros maiores permite optimizar a

estabilidade, a acuidade visual (ao ser maior a zona óptica) e o conforto.

O desenho do bordo deve favorecer o conforto e a dinâmica lacrimal pós-

lente.

A sua estrutura química implica que sejam mais ou menos rígidas, e

portanto mais ou menos flexíveis. As LCRPG compostas por copolímeros

de flúor, de maior Dk, são mais flexíveis que as lentes de acrilato de

silicone, de menor Dk. Quanto maior seja o Dk, maior o diâmetro e a

adaptação é mais plana. Para menor Dk, menor diâmetro e adaptação

mais fechada.

3.2. – Selecção da LC rígida inicial

3.2.1. – Raio de curvatura base

O raio de curvatura base da zona óptica posterior da LC baseia-se nos

dados queratométricos e no diâmetro da LC.

É regra geral, que para maior Dk, maior diâmetro da lente. Um diâmetro

maior significa uma relação com zonas da córnea mais periféricas, onde o

raio de curvatura é maior e sua profundidade sagital (para igual raio de

curvatura) daria um comportamento mais fechado. Assim sendo,

seleccionam-se raios de curva base mais planos (ou abertos).

Existem monogramas quer orientam o adaptador. Os fabricantes

informam o adaptador como realizar os cálculos de selecção da LC a

adaptar. Fundamentando-nos nos princípios gerais e levando em conta o

tipo de LC rígida, damos a seguir instrução para determinar o raio de

curvatura base da LC inicial, para três tipos de lentes.

3.2.1.1. – LCR (PMMA)

1. Astigmatismo corneal menor ou igual a 1,50 D

Adaptação igual a K

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2. Astigmatismo corneal 1,50 - 3,00 D

Adaptação acrescentando a K (em dioptrias), 33% da diferença

entre os dois meridianos principais da córnea.

3. Astigmatismo corneal maior de 3,00 D

Pode ser necessário uma LC com curva base tórica

Exemplo:

Queratometria: 44,00 46,00 (0º)

Astigmatismo corneal igual a 2,00 D

44.00 + 0,66 = 44,66 D

O raio de curvatura que corresponde a 44,66 D é 7,56 mm.

3.2.1.1. – LCRPG de acrilato de silicone

1. Astigmatismo corneal menor ou igual a 0,75 D

Adaptação igual a K

2. Astigmatismo corneal 1,00 - 2,00 D

Adaptação acrescentando a K (em dioptrias) 25% da diferença

entre os dois meridianos principais da córnea.

3. Astigmatismo corneal maior de 2,00 D

Adaptação acrescentando a K (em dioptrias) 33% da diferença

entre os dois meridianos principais da córnea.

Exemplo:

Queratometria: 44,00 46,00 (0º)

Astigmatismo corneal igual a 2,00 D

44.00 + 0,50 = 44,50 D

O raio de curvatura que corresponde a 44,50 D é 7,58 mm.

3.2.1.1. – LCRPG de fluorosilicone

1. Astigmatismo corneal menor ou igual a 0,75 D

Restar 0,75 D a K

2. Astigmatismo corneal 1,00 - 1,75 D

Restar 0,25 D a K

3. Astigmatismo corneal igual ou maior de 2,00 D

Acrescentar 0,25 D a K

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Exemplo:

Queratometria: 44,00 46,00 (0º)

Astigmatismo corneal igual a 2,00 D

44.00 + 0,25 = 44,25 D

O raio de curvatura que corresponde a 44,25 D é 7,99 mm (8.00 mm).

3.2.2. – Diâmetro corneal, pupilar e fenda palpebral

Estes parâmetros influem no diâmetro da LC.

Para um maior diâmetro corneal, regra geral correspondem raios de

curvatura da córnea mais planos. Para um menor diâmetro da córnea,

correspondem raios de curvatura da córnea mais fechados.

Para diâmetros pupilares grandes, maior diâmetro da LC (para evitar

reflexos e visão enevoada por descentramento da lente).

ara fendas palpebrais grandes, preferem-se adaptações mais centradas,

em vez de adaptações em posição superior.

3.2.3. – Diâmetro da zona óptica

Se o diâmetro da zona óptica é pequeno, manifestam-se visão enevoada e

halos luminosos, piorando em pupilas grandes em domínio escotópico.

O diâmetro da zona óptica varia com o diâmetro total da LC: maior

diâmetro da LC, zona óptica maior.

Para determinar o valor da zona óptica, convertemos o valor (potência) da

curvatura base em milímetros (raio): para uma LC de curva base 45 D

corresponde um raio de 7,50 mm e consequentemente uma zona óptica de

7,50 mm de diâmetro.

3.2.4. – Curvas periféricas

As curvas periféricas são mais planas que a curva base, adaptando-se à

periferia corneal (que é mais plana).

Quanto maior for o diâmetro total da LC, mais planas serão as curvas

periféricas.

A largura das bandas periféricas varia em função do seu número e do

diâmetro total da LC. Quanto maior for o diâmetro total da LC, mais

largas serão as bandas. Quanto mais bandas, menor a sua largura.

Normalmente oscilam entre 0,2 e 1,8 mm.

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3.2.5. – Diâmetro total

O diâmetro total de uma LC rígida deve ser aproximadamente 2 mm

menor que o diâmetro corneal (DIV), de forma a permitir um movimento

da lente entre 1 a 1,5 mm sobre a córnea (sem sobrepor-se no limbo

esclero-corneal).

3.2.6. – Fusão de curvas

A fusão dos limites da curva base e das curvas periféricas, e a fusão entre

estas, originam curvas intermédias de raio de curvatura médio (entre as

curvas a unir). É realizável fazer retoques (em unidades de retoque) para

melhorar o conforto e/ou a dinâmica da lente. Hoje é mais prático

reenviar a lente ao fabricante, dando as instruções para que este proceda

ao melhoramento da LC, conforme o caso.

3.2.7. – Bordo

O desenho do bordo pode favorecer o comportamento da LC quando

adaptada. Se queremos que a pálpebra eleve a lente é preferível um bordo

da lente mais grosso. Se o que se pretende é uma interacção mínima entre

a lente e as pálpebras, o bordo deve ser mais fino.

3.2.8. – Espessura central

A espessura ao centro condiciona a transmissibilidade do O2, a resistência

à flexão, a adaptação (força da gravidade) e a comodidade. A espessura

varia com o tipo de material e a potência da LC. Quanto mais elevada for

a permeabilidade ao O2, maior a flexibilidade da LC, o que condiciona a

espessura (não pode ser tão fina como outras lentes de Dk inferior e

menor flexibilidade).

Se a córnea em que se adaptará a LC é astigmática, a possibilidade da

lente flexionar-se é maior que sobre uma córnea esférica. Se a LC é

flexível deve desenhar-se mais espessa para contrariar dita flexão.

3.2.9. – Potência

A potência da LC depende da ametropia. Para determinar a potência da

LC começaremos por expressar a potência cilíndrica como negativa,

tomando então apenas a potência esférica.

Comentário [ES35]: Nas LCRPG (e nas de PMMA) uma alteração de 0,05mm no raio de

curvatura base da LC modifica em 0,25

dioptrias a potência da lágrima pós-lente.

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Exemplo:

Graduação da lente oftálmica: –4,50 + 1,00 90º

Transposição: – 3,50 – 1,00 0º

A potência da LC de ensaio deverá ser de – 3,50 D.

Para potência maiores que 4,00 D há que calcular a potência equivalente

em função da distância de vértices.

Adaptar a LC seleccionada. Determinar o estado refractivo utilizando

luneta de ensaio, afinando a potência final da LC. Deste modo

corrigiremos também qualquer potência induzida pela lente lacrimal

(Fig.26: Potência do menisco

lacrimal; modificado de A.L.

Alemany et al). Se a LC está

adaptada sobre K, a potência

do menisco lacrimal é nula.

Se a curva base da LC é

maior que K, a potência do menisco lacrimal é negativa. Se a curva base

da LC é menor que K, a potência do menisco lacrimal é positiva. Por cada

0,25 D ou 0,05 mm de raio de curvatura aberto ou fechado, temos de fazer

a correcção da potência da LC. Assim, se K é de 43,00 D e a curva base da

LC de 42,00 D, a lente lacrimal tem 1,00 D negativas, pelo que

adicionaremos 1,00 D positivas à LC; se a curva base da LC for de 44,00

D, a potência do menisco lacrimal é de 1,00 D positivas, pelo que

adicionaremos 1,00 D negativas à LC.

3.3. – Paradigmas de adaptação

As LC rígidas podem adaptar-se em posição alta (superior), central ou

baixa (inferior).

3.3.1. – Posição alta

(Fig.27).

O paradigma de adaptação de LCRPG é em

posição alta, ficando o bordo por baixo da

pálpebra superior, o que diminui a sensação de

toque ao pestanejar, melhora a humificação da

lente e sua estabilidade. Esta técnica requer que

a pálpebra superior cubra o limbo superior a nível das 10 e 2 horas. A LC

Fig.26

Fig.27

Comentário [ES36]: Para calcular a potência da LC usamos a seguinte fórmula:

d

DP

DLC

1

1

Comentário [ES37]: A potência do menisco lacrimal determina-se usando a fórmula:

postanttotal

onde,

rant

1336,1 ;

rpost

336,11

Exemplo: Refracção: -2,00 Esf – 2,00 Cil 0º

Queratometria: 7,65 (44,00) x 7,35 (46,00) @ 0º

LCRGP: 7,65 / - 2,00 / 9,60

Dtotal 00,0)º0(

º075,1)º90(

Ciltotal

Assim, o menisco lacrimal corresponde a uma lente: 0,00 Esf – 1,75 Cil 0º.

Comentário [ES38]: Conceito de LC

equivalente. Designam-se lentes equivalentes a duas lentes RGP de parâmetros diferentes que

adaptadas mostram idêntico comportamento.

Exemplo: 8,10 / - 2,50 / 9,60 (8,20)

A lente equivalente em diâmetro 9,20 mm seria

8,00 /-3,00 / 9,20 (7,80). A lente equivalente com raio 8,15 mm seria:

8,15 / - 2,25 / 9,80 (8,40).

Comentário [ES39]: Não é desejável pedir ao laboratório uma LC definitiva, baseando-nos

apenas nos cálculos necessários de seus

parâmetros, sem ter avaliado o comportamento de uma LC de características semelhantes.

Adaptar LC não é pura questão matemática. O

método mais seguro é dispor de uma caixa de provas, normalmente da mesma potência e

diâmetro e diferentes raios de curvatura base.

Em alguns casos a caixa de prova pode variar inclusive o diâmetro e a potência. Quando a LC

de ensaio difere mais de 3,00 D da LC final é previsível que o comportamento altere.

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deve ter um diâmetro apropriado, de modo que a zona óptica cubra a

pupila. A curva base da LC normalmente é mais plana que K e a imagem

fluoresceínica mostra uma acumulação mínima de fluoresceína baixo da

lente.

3.3.2. – Posição central

(Fig.28).

A adaptação em posição central corresponde à

adaptação entre os bordos palpebrais superior e

inferior. A curva base da LC é mais fechada que

K para minimizar o seu movimento. O diâmetro

é menor do que a adaptação em posição superior.

As pálpebras tocam o bordo da LC em cada pestanejo (por este motivo

preferem-se lentes mais finas e de bordos delgados para optimizar o

conforto).

3.3.3. – Posição inferior

(Fig.29).

Esta posição de adaptação não é desejável. o

diâmetro também seria maior, como na

adaptação superior (para cobrir a pupila). O raio

de curvatura base deveria ser mais fechado que

K. O bordo deveria ser o adequado.

Fotografias de adaptação em posição alta (esquerda)

e inter-palpebral (direita) (A.L. Alemany et al)

Fig.28

Fig.29

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3.4. – Avaliação clínica da LC adaptada

3.4.1. – Posição e movimento da LC

(Fig.30: Avaliação do movimento e centragem de uma LCRPG em

diferentes posições do olhar. A. Inferior; B. Superior: C, Nasal; D.

Temporal. Note que em todas as posições a LC permanece centrada

apoiando-se sobre a córnea sem ultrapassar o limbo esclero-corneal; R. M.

Herranz).

Centragem e movimento proporcionados. O movimento deve ser de 1 a 2

mm vertical ou horizontal, de modo que o bordo da LC não toque a área

do limbo esclero-corneal.

Uma LC de potência negativa tem tendência a situar-se superiormente e

uma LC positiva descai.

Um movimento excessivo indica-nos que a adaptação é plana.

Um movimento diminuto significa que a adaptação é curva.

Fig.30

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3.4.2. – Imagens de fluoresceína

A relação entre as superfícies posterior da LC e anterior da córnea

aprecia-se instilando fluoresceína na lágrima. O paciente deve pestanejar

várias vezes para que a lágrima se

espalhe. Utilizando luz de cobalto,

observa-se a cor amarelo-

esverdeada da mistura. Quanto

mais intensa a cor amarelo-

esverdeada, maior é a espessura

da lágrima pós-lente, sendo

possível identificar quais as zonas

de toque e de separação da LC relativamente à córnea.

Quando a adaptação é correcta, o alinhamento da curva base da LC com a

superfície anterior da córnea é

apropriada, sendo visível uma

acumulação ligeira de fluoresceína

na periferia da lente (onde as

curvas são mais planas) (Fig.31:

Imagem fluoroscópica de

adaptação correcta; modificado de

A.L. Alemany et al).

Se a adaptação é fechada, observa-se uma acumulação de fluoresceína na

zona central (Fig.32: Imagem fluoroscópica de adaptação fechada;

modificado de A.L. Alemany et al).

Se a adaptação é aberta, observa-

se uma acumulação de

fluoresceína na zona periférica da

lente(Fig.33: Imagem fluoroscópica

de adaptação aberta; modificado

de A.L. Alemany et al).

Quando a córnea não é esférica

existe astigmatismo, a imagem fluoresceínica varia segundo o meridiano

considerado havendo uma acumulação menor de fluoresceína no

meridiano de raio de curvatura semelhante ao da curvatura base da LC e

uma acumulação maior no meridiano de maior diferença (Fig.34: Imagens

Fig.31

Fig.32

Fig.33

Comentário [ES40]: A renovação da lágrima pós-lente é indispensável à saúde

ocular. Esta renovação é percentualmente maior com LCRPG (20%). Para LCH é inferior a 2%.

Depende da relação entre as curvaturas posterior

da LC e anterior da córnea.

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fluoroscópicas de adaptação de LCR esféricas em córneas tóricas;

modificado de A.L. Alemany

et al).

3.4.3. – Qualidade da visão

Feita a adaptação de LC

mediremos a acuidade visual.

A visão deve ser estável

durante o ciclo de pestanejo.

Se a acuidade visual é insuficiente optimizamo-la de modo a que seja

igual ou maior à que obtém com óculos.

3.4.4. – Comodidade de uso

Passadas 2 a 3 semanas, as LC devem ser confortáveis. Se persiste algum

desconforto há que descobrir a causa, normalmente, um desenho

inadequado dos bordos ou um movimento excessivo.

3.4.5. – Biocompatibilidade

A adaptação não deve alterar o metabolismo local.

O exame biomicroscópio permite avaliar o impacto das LC sobre a córnea.

Deve realizar-se na primeira consulta de revisão (passadas 2 ou 3

semanas) e nas restantes consultas de controlo.

3.5. – Resolução de problemas

3.5.1. – Sensação de corpo estranho

A situação mais comum é a sensação de corpo estranho devido a um

desenho do bordo inadequado (bordos finos ou muito grossos e fusão

imprópria de curvas periféricas). A solução assenta no melhoramento do

bordo e/ou da fusão das bandas periféricas. Há rejeitar a interposição de

corpos estranhos no espaço pós-lente ou outra causa provável.

3.5.2. – Movimento da LC

Uma adaptação plana (ou aberta) origina irritação da conjuntiva

palpebral e do limbo esclero-corneal, observando-se (com a lâmpada de

fenda) injecção vascular do limbo e erosão corneal (usar fluoresceína). A

Fig.34

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solução requer outras LC cujos raios de curvatura sejam mais fechados ou

se é possível modificar apenas o diâmetro.

Uma LC demasiado fechada comprometerá a troca lacrimal pós-lente.

Neste caso devemos abrir o raio de curvatura base ou diminuir o diâmetro

total da LC.

3.5.3. – Acuidade visual

O paciente queixa-se de visão enevoada, distorção ou visão intermitente.

Este tipo de problemas normalmente estão relacionados com uma LC

descentrada, mas pode derivar de alterações das superfícies da LC (por

exemplo, excesso de depósitos nas superfícies), de deformação da LC, de

uma potência incorrecta, ... O exame pós-adaptação (de revisão) incidirá

na observação do comportamento da LC e também na análise dos seus

parâmetros, qualidade das suas superfícies, ... Identificada a causa

soluciona-se facilmente o problema.

3.5.4. – Dinâmica palpebral

Um palpebrado insuficiente (incompleto ou defeituoso) implica uma

alteração da humificação da LC e do pólo

anterior do olho humano (erosão [tingido]

superficial 3-9 horas) (Fig.35: Esquema da

imagem fluoroscópica do tingido 3-9 horas;

modificado de A.L. Alemany et al). Há que

ensinar a pestanejar de modo rítmico e

completo. Os usuários de computadores

tem tendência para pestanejar menos vezes, tornando-se necessário

recordar-lhes a necessidade de pestanejar mais frequentemente.

3.5.5. – Filme lacrimal e depósitos

Concentrações elevadas de lípidos ou de mucina significa um aumento de

depósitos sobre as superfícies das LC, tornando-as hidrofóbicas, causando

sensação de corpo estranho quando se pestaneja. A solução exige maiores

cuidados de limpeza (surfactantes e enzimáticos).

3.5.6. – Flexibilidade

Uma flexibilidade excessiva da LC pode causar visão enevoada depois de

cada pestanejo. Neste caso deve-se optar por uma LC de maior espessura.

Fig.35

Comentário [ES41]: Para fechar uma LCRGP temos várias opções: 1. Diminuir o raio de curvatura base.

2. Aumentar o diâmetro total.

3. Aumentar o diâmetro da zona óptica. 4. Diminuir a espessura e/ou o raio das bandas

periféricas.

Comentário [ES42]: Para abrir uma

LCRPG temos várias opções: 1. Aumentar o raio de curvatura base.

2. Diminuir o diâmetro total.

3. Diminuir o diâmetro da zona óptica. 4. Aumentar a espessura e/ou o raio das bandas

periféricas.

Comentário [ES43]: A estabilidade dimensional de uma LCRPG depende da dureza

do material. O índice de refracção, nas LCRPG,

aumenta com o conteúdo de PMMA.

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3.5.7. – Soluções de higiene, assepsia e manutenção

O paciente ao colocar a LC sente-a incómoda. Observaremos através do

biomicroscópio (usando fluoresceína) se existe erosão superficial difusa. O

problema liga-se (habitualmente) a uma reacção aos componentes (ou a

um componente) das soluções de higiene, assepsia e manutenção de LC.

Soluciona-se recomendando outra solução de composição diferente.

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TEMA 11

ADAPTAÇÃO DE LC HIDRÓFILAS ESFÉRICAS

Actualmente adaptam-se percentualmente mais LCH. Esta percentagem

ronda os 80%. São LC mais cómodas, versáteis e aparentemente menos

exigentes de conhecimentos técnicos por parte do adaptador. Discutiremos

as indicações e contra-indicações destas LC e a metodologia de adaptação.

1. – Vantagens das LC hidrófilas esféricas

A principal vantagem é sua comodidade. Dada sua estrutura mole, as

LCH sentem-se menos (provocam menor sensação de corpo estranho em

seu contacto com o pólo anterior do olho e em sua relação com os bordos

palpebrais). O processo de adaptação é mais rápido.

As LCH têm um diâmetro maior que as LCR. A adaptação é por debaixo

das pálpebras (sob-palpebral). A aderência à superfície ocular é melhor,

preferindo-se este tipo de LC para certas actividades, como as

desportivas.

As características das LCH permitem o uso esporádico.

As LCH, por sua estrutura não rígida (flexibilidade do material) e

desenho de suas superfícies, amoldam-se ao perfil córneo-conjuntival

admitindo menor rigor na aferição das medidas queratométricas. Como

veremos trata-se de uma relevância incompetente quando existe

astigmatismo.

A LCH não interfere com a curvatura ocular como sucede com as LCR, em

que o paciente manifesta uma baixa de acuidade visual temporária (até à

normalização da estrutura corneal) quando retira as LCR e coloca os

óculos. O provável edema corneal difuso que a LCH provoca não altera a

curvatura ocular, mas o edema circunscrito provável com uma LCR

alterará a curvatura e consequentemente o seu poder refractivo.

O síndrome de sobre-uso que se manifesta por dor ocular e que está

relacionado com exagero de uso de LCR é raro com LCH e quando ocorre é

menos doloroso.

O diâmetro total da LCH e concludentemente o maior diâmetro da zona

óptica afasta a possibilidade de fotofobia, deslumbramento e transtorno

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da visão nocturna (que assinalam os momentos iniciais da adaptação às

LCR).

2. – Desvantagens das LC hidrófilas esféricas

Ao reproduzir o perfil corneal anterior, as LCH apenas corrigem

astigmatismos menores que 0,75 D (nalguns casos até 1,50 D em função

da maior ou menor flexibilidade da LCH – que depende do material em

que está fabricada e da espessura). Esta desvantagem é ilusória, pois

existem LCH de geometria tórica.

As LCH têm menor duração e por isso substituem-se mais

frequentemente, apresentando maior tendência para acumular depósitos

e subsequentemente aumenta o risco de contaminação e de episódios

infecciosos. Estas características significam que a LCH sofre uma

degradação progressiva alterando-se os parâmetros, desidratando-se e

tornando-se hidrofóbicas, ocasionando visão instável e reacções

indesejáveis. Por tudo isto, os sistemas de manutenção das LCH são mais

exigentes (estritos). Subordinando-se às características do usuário as LC

têm um tempo de eficácia maior ou menor.

3. – Processo de adaptação

Regra geral, o candidato ao uso de LCH não deve ter um astigmatismo

maior que 1,50 D. As LCH (pela sua espessura central e diâmetro) estão

recomendadas nos operados a cataratas que não se corrigiu com lente

intra-ocular. O usuário deste tipo de LC deve compreender a imposição da

sua higiene, assepsia e manutenção.

3.1. – Aspectos referidos ao material e ao desenho

No processo de selecção da LCH torna-se imprescindível considerar o

material (e o método de fabricação da LC) e o desenho da lente.

A composição do material determina a hidratação. Esta pode ser maior ou

menor. Uma LC de desenho idêntico e menor hidratação terá uma

durabilidade maior, compensará melhor o astigmatismo, terá menor

transmissibilidade ao O2 e menos tendência para acumular depósitos.

Também aumenta o risco de ocorrência do síndrome de sobre-uso. Estão

mais indicadas para pacientes com problemas lacrimais. Apresentam

maior movimento quando adaptadas. Uma LC com maior hidratação (e

Comentário [ES44]: Os diferentes métodos de fabricação de LC condicionam o seu

comportamento quando adaptadas. As LC

centrifugadas são mais flexíveis e, assim, os parâmetros de adaptação podem ser mais

limitados, aceitando-se que as lentes tenham

menor movimento com o pestanejo do que as lentes torneadas ou moldadas.

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desenho idêntico) tem uma duração menor, não compensará tão bem o

astigmatismo, terá maior transmissibilidade aos gases, maior tendência

para acumular depósitos. Dificilmente se apresentará o síndrome de

sobre-uso. É pouco provável que surja episódio de secura ocular.

O desenho da LC relaciona-se com diferentes espessuras. O mesmo

material e uma espessura menor implicará maior transmissibilidade ao

O2, optimização do conforto, possibilidade de adaptar mais fechada,

menor movimento do que com uma LC de maior espessura, mas diminui

sua capacidade para compensar astigmatismos. O mesmo material e uma

espessura maior implicará menor transmissibilidade aos gases, menor

conforto, maior aptidão para corrigir astigmatismo, adaptando-se o mais

planas possível e o seu movimento será maior.

O peso da LC relaciona-se com a composição do material, hidratação

resultante e espessura. Quanto maior for a hidratação maior a

fragilidade, obrigando a desenhar as LC com maior espessura e peso

consequente. Maior peso provoca maior deslocamento para baixo (pela

acção da gravidade). Para evitar que as lentes interfiram com o limbo

esclero-corneal, preferem-se diâmetros maiores.

A flexibilidade é uma propriedade que depende do material (estrutura do

polímero), hidratação e espessura. Menor espessura manifesta maior

flexibilidade. Maior espessura expressa menor flexibilidade. Quanto

maior a hidratação maior é a flexibilidade. Para hidratação menor, menor

flexibilidade. Em termos práticos, quanto menor a flexibilidade mais

plana (ou aberta) é a adaptação.

A LCH deve ter um diâmetro total que exceda o limbo esclero-corneal

1mm (em toda a circunferência). Um diâmetro menor originaria pressão

contínua do bordo da LC sobre os vasos do limbo comprometendo a

circulação sanguínea local. A relação entre o diâmetro e a curvatura base

(posterior) da lente constitui um aspecto relevante. Considerando um

mesmo raio de curvatura base, quando o diâmetro aumenta, a

profundidade sagital também é maior, reclamando uma adaptação mais

fechada. Diminuindo o diâmetro, a profundidade sagital é menor e a

adaptação deve ser mais aberta. Para um mesmo diâmetro, quando o raio

de curvatura base aumenta, diminui a profundidade sagital e a adaptação

será mais aberta. Diminuindo a curvatura base, a profundidade sagital

aumenta e a adaptação deve ser mais fechada. Existe uma regra geral

Comentário [ES45]: Nas LCH, o índice de refracção diminui à medida que aumenta a

hidratação. Nos materiais hidrófilos, cuja matéria-prima de base é o HEMA, a

permeabilidade aos gases aumenta

exponencialmente à medida que aumenta o conteúdo de água (hidratação). Quer dizer,

aumenta com a hidratação. Nos materiais de

Silicone-Hidrogel (Si-Hi), aumenta a permeabilidade à medida que se reduz a

hidratação. Acima dos 50% de hidratação, as

lentes de Si-Hi apresentam uma permeabilidade aos gases semelhante à dos materiais hidrófilos

convencionais, prejudicando a humectabilidade

e as propriedades mecânicas do material., pelo que não compensa.

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55

que permite alterar a curvatura base ou o diâmetro da LC sem modificar

a relação (contacto): por cada 0,05mm de alteração do diâmetro

modificaremos 0,20mm a curvatura base.

Outro aspecto importante é o desenho do bordo. Se é demasiado grosso

torna a LC inconfortável. Se é excessivamente fino pode rasgar-se.

3.2. – Princípios gerais da adaptação

As LC devem adaptar-se obtendo um contacto (ou apoio suave) em três

pontos: ápice corneal e dois periféricos (Fig.36: Adaptação da LCH;

modificado de A.L. Alemany et al). O diâmetro das LCH deve ser maior

que o diâmetro corneal

para garantir a centragem

e a estabilidade do apoio.

Adaptam-se mais planas

que o raio de curvatura

mais plano (K) da córnea.

O apoio sobre o ápice da

córnea pode requerer reduzir o diâmetro da LC ou tornar mais plano o

raio de curvatura base da lente. Regra geral, as LCH de 12 a 13mm de

diâmetro adaptam-se 2,00 a 3,00 D mais planas que K, enquanto que as

de diâmetro de 14 a 15mm adaptam-se 3,00 a 5,00 D mais planas que K.

A adaptação de LCH fabricadas pelo processo de centrifugação impõe o

uso de combinações possíveis de curvatura base, potência e/ou diâmetro.

Este método exige um stock considerável.

A adaptação de LCH torneadas ou moldadas faz-se utilizando caixa de

provas que podem manter constante o diâmetro e a potência e variar a

curvatura base (ou em alguns casos, mantendo constante a potência e a

curvatura base e alterando o diâmetro).

Utilizando a caixa de prova, seleccionaremos a LC cuja curvatura base se

adapta melhor ao perfil corneal, realizando (uma vez adaptada a lente) a

refracção clínica para determinar a potência final de correcção. A LC final

não deveria ter uma potência maior de 3,00 D que a LC de ensaio, sob

pena de o comportamento da lente definitiva não corresponder com o da

LC de ensaio. Em todo o processo de selecção e pré-adaptação de LC de

ensaio temos de proceder à assepsia das lentes utilizadas e acessórios.

Fig.36

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56

3.3. – Metodologia da adaptação

O processo de adaptação propriamente dito inicia-se com a selecção de

uma LC de ensaio em função dos dados obtidos do exame preliminar, tais

como: raios de curvatura da face anterior das córnea, diâmetro da íris

visível e o estado refractivo.

Adaptada a LC de ensaio, observa-se o seu comportamento e processa-se a

sobre-refracção se necessário.

Descrevemos a continuação as fases do método.

1. Determinação do raio de curvatura mais plano (K) da córnea.

2. Medir o diâmetro horizontal da íris visível. A LC deve ter um diâmetro

igual ou maior que 2mm que o DHIV.

3. Determinar a potência esférica da lente em função do componente

esférico da prescrição optométrica com o cilindro expresso em negativo. Se

a potência cilíndrica é superior a 0,50 D há que calcular o valor esférico

equivalente21. Se a potência é maior que 4,00 D calcularemos o valor

equivalente da potência ao nível do plano corneal.

4. Seleccionaremos uma LC de ensaio cujo raio de curvatura base seja

2,00 ou 3,00 dioptrias (K + 0,40-0,60mm) mais plana que K (para uma LC

com um diâmetro de 12 a 13mm). Se o diâmetro é de 14 a 15mm, o raio de

curvatura base da LC de ensaio será 3,00 a 5,00 dioptrias (K + 0,60-

1,20mm) mais plana que K. Devemos preferir uma LC de ensaio cuja

potência seja a mais próxima da potência final.

5. Observar o comportamento da LC de ensaio adaptada e se necessário

modificar os parâmetros para optimizar contacto. Encontrada esta lente,

avaliaremos a acuidade visual corrigindo com o máximo positivo (menor

negativo).

6. Se necessário realizaremos os cálculos de equivalência entre os planos

óculos de prova e corneal.

4. – Avaliação clínica da LC adaptada

A avaliação do contacto da LCH processa-se observando a centragem da

LC relativamente ao limbo esclero-corneal, o movimento da LC sobre o

pólo anterior do olho, a acuidade visual resultante, ... A seguir

21 Potência esférica cujo ponto focal coincide com o circulo de menor confusão de um sistema esférico-cilíndrica. O equivalente esférico de uma prescrição esférico-cilíndrica é igual à soma algébrica do valor

da potência esférica e metade da potência cilíndrica. Na combinação esférico-cilíndrica – 3,00 – 2,00

(180º) o equivalente esférico é – 4,00.

Comentário [ES46]: O factor a somar a K para determinar o raio de curvatura da LC

depende do sistema de fabricação e/ou da hidratação da LC. As LC torneadas e de baixa

hidratação por serem mais espessas e apresentar

maior mobilidade podem adaptar-se somando 0,8 a 1,0mm, enquanto que as LC de alta

hidratação, moldadas ou centrifugadas, podem

adaptar-se com um incremento de adaptação de 0,3 a 0,6mm (mais fechadas).

Comentário [ES47]: Encomenda-se a LC ao laboratório e quando se receba comprovar-se-ão os parâmetros. Ensina-se o paciente a

manipular as LC e os cuidados de higiene,

assepsia e manutenção, definindo um plano de visitas de seguimento.

Considere-se que a adaptação de LCH

centrifugadas impõe o recurso a um stock de lentes, de modo que os parâmetros da LC

definitiva sejam muito semelhantes aos da LC

de ensaio.

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57

sumariamos a didáctica desta apreciação realçando aspectos

proeminentes.

A centragem da LCH avalia-se tomando como referência o limbo esclero-

corneal, sucedendo movimentos pequenos pela acção palpebral,

movimento ocular e gravidade, mas sem que a LC desencubra a córnea.

Quando a centragem é correcta, após o palpebrado a LC adquire a posição

ideal de apoio.

Entre as causas de descentramento da LC, estão pálpebras tensas,

córneas grandes, astigmatismos contra a regra, córneas assimétricas ou

LC de elevado peso (afáquia, altas miopias). A acumulação de depósitos

na superfície anterior da LC dificulta o deslizamento das pálpebras,

arrastando a lente, que inicialmente estava bem centrada.

O movimento apropriado da LC deve ser de 0,50 a 1mm, exibindo maior

movimento quando a hidratação é menor (ou a transmissibilidade ao O2) e

menor movimento quanto maior seja a hidratação ou transmissibilidade

ao O2. Se o movimento é excessivo a adaptação é plana. Se o movimento é

menor o apoio é fechado. (Fig.37: Esquema do comportamento da LC com

o palpebrado e o movimento ocular; adaptado de A.L. Alemany et al).

Quando o paciente move o globo ocular o movimento da LC deve ser em

sentido contrário (sempre cobrindo a córnea) (Fig.38: Avaliação do

movimento e centragem de uma LCH em diferentes posições do olhar. A.

Fig.37

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58

Inferior; B. Superior: C, Nasal; D. Temporal. Note que em todas as

posições a LC permanece centrada cobrindo totalmente a córnea sem

ultrapassar o limbo esclero-corneal; R. M. Herranz).

Pressionando através da pálpebra inferior o bordo inferior da LC, esta

deslocar-se-á para cima. Quando

deixamos de pressionar, a LC

retoma suavemente a sua posição de

contacto inicial (Fig.39: push up). Se

não há deslocamento ou o

movimento de vai e vem é lento, a

LC está fechada. Se o deslocamento

é rápido e a LC descobre a córnea

superior (descaindo subitamente), a

adaptação é aberta.

Quando o movimento é lento a LC

está presa em seu apoio e a única

Fig.38

Fig.39

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59

solução é mudar de LC, havendo duas possibilidades: mantendo o raio de

curvatura base mas diminuindo o diâmetro ou conservando o diâmetro

mas abrindo o raio de curvatura base. Contrariamente, se a adaptação é

aberta utilizaremos uma LC de curvatura base mais fechada ou uma LC

de diâmetro total maior.

Se o apoio da LC não é estável e harmonizado a visão não será contínua

(sofre oscilações). Outras causas que comprometem a acuidade visual

através das LC são secura ocular, depósitos na lente, alteração da

dinâmica palpebral, astigmatismo residual, ...

Se a adaptação é fechada, a visão é nítida imediatamente depois do

palpebrado, sendo enevoada antes e depois dos primeiros segundos

seguidamente ao pestanejar. Este efeito resulta da pressão palpebral que

rapidamente favorece o contacto da LC com o ápice corneal melhorando a

visão durante uns segundos após o pestanejar. Contrariamente, se a

adaptação é aberta, pronuncia-se visão enevoada imediatamente depois

do pestanejar, sendo nítida antes e depois dos primeiros segundos

seguidamente ao palpebrado. Nesta situação a LC aberta apoia-se sobre o

ápice corneal. Ao pestanejar altera-se o contacto e momentaneamente

ocorre o enevoamento da visão.

O apoio da LC assenta em três pontos de contacto suave. Este toque

origina um menisco lacrimal negativo. Esta potência negativa compensa-

se adicionando + 0,25 a +0,50 dioptrias à prescrição óptica de base,

dependendo do tipo de LC.

Para avaliar a relação entre a LC e a superfície ocular observaremos a

qualidade das imagens das miras queratométricas22 reflectidas na

superfície anterior da LC. Numa adaptação correcta essas imagens são

nítidas, antes e depois do palpebrado. Numa adaptação plana as imagens

são nítidas antes do pestanejo e deformam-se imediatamente depois,

recuperando a sua nitidez seguidamente aos primeiros segundos.

Contrariamente, um contacto fechado mostra-se através de imagens que

apenas são nítidas imediatamente depois de pestanejar, deformando-se

antes e após uns segundos de pestanejar (Fig.40: Imagens

queratométricas antes e depois de pestanejar. A. Adaptação correcta; B.

Adaptação aberta; C. Adaptação fechada).

22 Também se pode utilizar o retinoscópio e as respectivas imagens formadas por reflexão na superfície

anterior da LC. A acumulação excessiva de depósitos sobre as superfícies da LC pode comprometer a

aptidão da prova.

Comentário [ES48]: É preferível uma adaptação mais aberta do que fechada, mas uma

LC excessivamente plana torna-se incómoda. Por outro lado, há que considerar que a LCH

tem tendência a fechar com o uso. A LCH

centrifugada excessivamente aberta soluciona-se trocando por outra de diâmetro maior.

Uma adaptação fechada habitualmente não

causa desconforto imediato, mas com o uso torna-se incomoda. A LCH centrifugada

demasiado curva (fechada) soluciona-se

diminuindo o diâmetro (ou a sua espessura). É conveniente dispor de vários tipos de LC, de

diferente fabricação e fabricantes, diversos

desenhos e geometrias.

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Fig.40

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61

TEMA 12

ADAPTAÇÃO DE LC RÍGIDAS TÓRICAS

Nem sempre é possível corrigir um astigmatismo utilizando uma LCR

esférica. A potência do astigmatismo e a orientação do seu eixo são a

chave da decisão. Pode existir um astigmatismo residual não corrigido

pela LCR esférica. A superfície anterior corneal pode ser tórica tornando

impossível o apoio da LCR esférica, que estará descentrada, roçagando a

córnea e a conjuntiva. A adaptação nestes (e noutros similares) casos

exige a adaptação de uma LCR de desenho tórico posterior (superfície

posterior da lente) para compensar o astigmatismo e garantir a

estabilização da lente numa córnea tórica. A lente pode ser tórica em sua

superfície anterior para compensar um astigmatismo residual. Noutras

situações a LC será tórica em ambas as superfícies (bi-tórica).

1. – Vantagens e desvantagens das LC rígidas tóricas

As LCRT não permeáveis aos gases ou as LCRT permeáveis aos gases

têm as vantagens e as desvantagens das lentes PMMA e das RPG

indicadas em capítulo precedente. A vantagem do desenho tórico reside

na possibilidade de corrigir astigmatismos elevados que não se podem

corrigir com LCR esféricas.

O desenho tórico acrescenta dificuldades técnicas de adaptação.

2. – Desenho das LC rígidas tóricas

Existem diferentes desenhos de LCRT. A continuação sumariamos os

desenhos e os aspectos fundamentais relacionados. Na tabela 2

apresentamos uma síntese.

2.1. – LCRT de curva base esférica e curvas periféricas tóricas

Nos casos em que uma LCR esférica permite corrigir o astigmatismo mas

o apoio da LC é instável, soluciona-se adaptando uma LCRT de

curvaturas periféricas tóricas.

É necessário informar o fabricante indicando as medidas queratométricas

do caso.

Comentário [ES49]: O astigmatismo resulta de uma diferença de curvatura das superfícies ópticas em diferentes meridianos. A imagem de

um ponto objecto não é um ponto imagem mas

dois pontos focais. Para corrigir o astigmatismo há que determinar

o seu valor em dioptrias e a orientação do eixo.

Quando corrigimos com lentes oftálmicas não necessitamos saber quais as estruturas do olho

que provocam o astigmatismo. Porém,

corrigindo com LC há que identificar todos os componentes do astigmatismo total do olho.

O astigmatismo, segundo a regularidade das

superfícies, classifica-se como regular e irregular. O astigmatismo diz-se regular

quando a refracção é constante em toda a

extensão de cada meridiano, havendo dois meridianos perpendiculares ditos principais (um

correspondendo ao meridiano de menor

potência e o outro ao meridiano de maior potência). O astigmatismo diz-se irregular

quando a refracção varia entre os meridianos e

também nos distintos pontos de um mesmo meridiano. O astigmatismo irregular resulta

normalmente de deformações patológicas da

córnea, traumatismos, cirurgia ocular, ... Uma outra classificação, muito mais útil ao

adaptador de LC, classifica o astigmatismo

segundo a estrutura ocular que o forma. Assim, diz-se astigmatismo corneal, interno, total e

residual (externo). O astigmatismo da face

anterior da córnea é o mais significativo de todos eles. O astigmatismo interno é todo aquele

que não é corneal anterior (resultante da

toricidade posterior da córnea, cristalino ou retina). O astigmatismo total é a soma dos

astigmatismos corneal e interno. O astigmatismo

residual externo resulta do contacto de uma LC sobre uma córnea astigmática, devido à

diferença de índices de refracção entre a córnea

e o filme lacrimal e habitualmente tem um valor aproximado de 1/nono do astigmatismo corneal.

Rememore o que estudou no módulo de Óptica Geométrica.

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2.2. – LCRT de curva base tórica

Se a toricidade da córnea é significativa adapta-se uma LCR de superfície

posterior tórica optimizando o apoio da lente com córnea.

2.3. – LCRT de superfície anterior tórica

A adaptação de uma LCR esférica tem um óptimo contacto mas para

melhorar a acuidade visual necessitamos adicionar potência cilíndrica.

Neste caso adaptaremos uma LCR de superfície tórica anterior.

2.4. – LCRT de superfície anterior e posterior tóricas

Quando necessitamos optimizar o contacto da superfície posterior da LC

com a superfície anterior da córnea e corrigir um astigmatismo residual.

2. – Metodologia da adaptação

Não se dispõe normalmente de caixa de provas deste tipo de lentes. Isto

obriga-nos a manter uma relação especial com o fabricante ou fornecedor

que facilite provar uma LCRT baseados nos cálculos partindo dos

parâmetros clínicos e da avaliação do apoio de uma LCR esférica sobre a

córnea do paciente. os dados que daremos ao fabricante serão a potência e

a curvatura base da LCR esférica de ensaio, as medidas queratométricas

(ou a curvatura base tórica que calcularmos), o valor em dioptrias

Tabela 2

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esféricas e cilíndricas (e não o equivalente esférico)da sobre-refracção,

diâmetro e tipo de material da LC (de ensaio e final).

A selecção dos parâmetros da LC inicial é igual à que estudámos para as

LCR esféricas, excepto para os parâmetros que distinguem uma lente

esférica da tórica. Sintetizemos.

Quando uma LCR esférica adaptada é instável sobre uma córnea

astigmática, apesar de corrigir inteiramente o defeito, optaremos por uma

LCRT de curvaturas periféricas tóricas. Se a eficácia óptica da LCR

esférica adaptada está compremetida, optaremos por uma LCRT de

superfície posterior tórica.

Para o cálculo dos raios de curvatura da superfície posterior das LCRT

adoptaremos o seguinte método:

1. Medidas queratométricas

2. Diferença entre os meridianos principais (o de maior e menor potência)

3. Determinar a quarta parte (1/4) da diferença anterior

4. Somar a quarta parte da diferença ao valor do meridiano de menor

potência (mais plano)

5. Subtrair a quarta parte da diferença ao valor do meridiano de maior

potência (mais curvo)

Exemplo:

1. Medidas queratométricas:

º000,4800,42 aDD

2. Diferença entre os meridianos principais (o de maior e menor potência):

D00,600,4200,48

3. Determinar a quarta parte (1/4) da diferença anterior:

50,14

00,6

4. Somar a quarta parte da diferença ao valor do meridiano de menor

potência (mais plano):

50,4350,100,42;00,42 K

5. Subtrair a quarta parte da diferença ao valor do meridiano de maior

potência (mais curvo):

50,4650,100,48

Os raios de curvatura da superfície tórica posterior serão:

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dioptriase 50,4650,43 ou milímetrose 26,776,7

Admitindo que a LC esférica de ensaio tem potência de – 3,00 D e que a

sobre-refracção indica – 0,75 – 1,25 a 80º, a potência final da LCRT será

de – 3,75 – 1,25 a 80º.

Se adaptamos esta LC e a visão não é boa é provável que exista

astigmatismo residual, em cujo caso a LC terá de ser bi-tórica. A

estabilização da lente através da superfície posterior tórica é provável,

senão haveria que optimizar este aspecto mediante um sistema de

estabilização (balastro prismático ou truncado).

O comportamento da LCRT final deve avaliar-se rigorosamente.

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TEMA 13

ADAPTAÇÃO DE LC HIDRÓFILAS TÓRICAS

As LCHT facilitam muito o processo de adaptação de LC em casos de

astigmatismo. Os materiais, o desenho e a oferta de parâmetros

disponíveis no mercado permitiu alcançar uma eficácia clínica

surpreendente.

Rememorando, as LCH esféricas permitem neutralizar astigmatismos

baixos. O compromisso é tanto mais aceitável quanto maior a potência

esférica (regra geral: potência cilíndrica menor de 20% do grau esférico).

Ao LCH esféricas amoldam-se ao perfil corneal tórico de modo que existe

uma fina camada de lágrima pós-lente cuja potência de correcção é no

máximo de 0,75 D, dependendo da espessura central, do grau de

hidratação e da flexibilidade da LC. Quanto maior a espessura central

(entre 0,15 e 0,22mm) e menor a flexibilidade e a hidratação (entre 38 e

40%) melhor a capacidade da LCH para compensar astigmatismos. Em

contrapartida, as LCH de espessura reduzida e de elevada hidratação não

facilitam corrigir astigmatismos, adaptando-se e reproduzindo totalmente

o desenho tórico corneal.

Se o astigmatismo é superior a 1,00 dioptrias ou existe astigmatismo

interno, adaptaremos LCHT.

1. – Vantagens e desvantagens das LC hidrófilas tóricas

A vantagem destas LC relativamente às LCRT é a sua comodidade e

acessível técnica de adaptação. As apreciações que fizemos sobre as

vantagens e as desvantagens das LCH relativamente às LCR aplicam-se

aqui.

2. – Desenho e geometria das LCHT

2.1. – LCH de superfície posterior tórica

A superfície anterior é esférica e a superfície posterior é tórica. O desenho

tórico da superfície interna possibilita um apoio (ou contacto) optimizado

com a superfície tórica corneal, contribuindo para a estabilização da LC.

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Este desenho utiliza-se nos casos em que existe astigmatismo corneal

(não em caso de astigmatismo interno).

2.2. – LCH de superfície anterior tórica

A superfície posterior é esférica e a superfície anterior é tórica. Neste tipo

de LC a geometria interna esférica não garante a estabilização da LC,

tornando-se necessário incorporar sistemas de estabilização (ut infra).

Este tipo de lentes possibilita corrigir qualquer tipo de astigmatismo,

tanto corneal como interno e segundo qualquer orientação do eixo.

2.3. – Sistemas de estabilização do eixo

Normalmente as LC tóricas rodam em sentido nasal superiormente, pela

acção (pressão sobre as lentes) palpebral e a interacção entre a geometria

da lente e a topografia corneal. A estabilização do eixo da potência

cilíndrica faz-se através de diferentes sistemas: balastro prismático,

truncado, estabilização dinâmica e balastro truncado.

2.3.1. – Balastro prismático

O balastro prismático situa-se na zona inferior da LC, actuando como

contrapeso dum sistema de gravidade periférico e inferior. Este elemento

aumenta não só a espessura periférica inferiormente mas a espessura

central da LC, preferindo-se materiais com uma hidratação maior de 40%

para aumentar a transmissibilidade do O2.

2.3.2. – Truncado

Esta técnica consiste num corte horizontal inferior facilitando o apoio da

LC sobre o bordo palpebral inferior. A LC não é circular. É um sistema

pouco eficiente e clinicamente controverso (provoca erosões e

neovascularização corneal na direcção vertical às 6 horas).

2.3.3. – Estabilização dinâmica

A LC em sua superfície frontal contém duas zonas, uma superior e outra

inferior (opostas entre si e de menor espessura) que interagem com as

pálpebras estabilizando a lente.

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2.3.1. – Balastro truncado

É uma combinação dos sistemas de truncado e balastro prismático. Este

actua por gravidade e aquele por apoio sobre a pálpebra inferior. É um

método pouco utilizado.

3. – Metodologia da adaptação

No processo de adaptação de LCHT é essencial relacionar o eixo do

astigmatismo corneal com o eixo do astigmatismo total, analisar a posição

das pálpebras relativamente à córnea, avaliar a pressão e tonicidade

palpebral, estimar a qualidade e frequência do palpebrado e medir o

tamanho da abertura palpebral. Também é útil conhecer os diferentes

tipos de LCHT (geometria, desenho e características técnicas). A

experiência clínica ou técnicoprofissional aperfeiçoará a técnica.

A teoria que sintetizamos a continuação é fundamental.

Para adaptar LCHT podemos utilizar LCH esféricas como primeira

abordagem ou dispor de um surtido de LCHT.

3.1. – LCH esférica

Servimo-nos de uma caixa de provas de LC hidrófilas esféricas. A

geometria da superfície posterior da LCH esférica de ensaio será a mesma

que a da LCH tórica definitiva (de toricidade anterior). Hoje existem

lentes de ensaio asféricas, cujos desenhos são congéneres com a topografia

corneal.

A adaptação da LCH de ensaio deve ser do mesmo material, diâmetro,

raio de curvatura base, igual hidratação e potência o mais próxima do

grau esférico.

Exemplo:

Grau de correcção óptica com óculos: º17500,250,3 .

Medidas queratométricas: º18055,785,7

DHIV: mm75,11

Seja uma LCH esférica de ensaio seleccionada em material Poli HEMA

com as seguintes características:

hidrofilia 38,5%

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14,00 mm de diâmetro ( 2 mm que o DHIV)

raio de curvatura base 8,70 mm (K 0,80)

grau esférico – 3,00 D

A sobre-refracção apresenta os seguintes valores: º17500,225,0 .

A LCHT prescrita seria em material Poli HEMA e com as seguintes

características:

hidrofilia 38,5%

superfície anterior tórica

diâmetro 14,00 mm

raio de curvatura base 8,70 mm

grau º17500,225,3

3.2. – LCH tórica

Utilizamos um surtido de LCHT de geometria interna e de geometria

externa, de diferentes parâmetros, como lentes de ensaio.

Os parâmetros fundamentais que temos de determinar são o diâmetro da

LC, o raio de curvatura, a potência e o eixo de equilíbrio.

3.2.1. – Diâmetro

O diâmetro da LC deve ser 2 a 3mm maior que o DHIV. São preferíveis os

diâmetros grandes (14,00mm) por corresponder uma zona óptica maior

(optimizando assim a acuidade visual, o campo visual e anulando os

reflexos nocturnos). A abertura palpebral (ou fenda palpebral) influi na

selecção do diâmetro da LC, preferindo diâmetros < 13,00mm quando a

fenda palpebral é recta ou estreita.

3.2.2. – Raio de curvatura

Podemos usar a seguinte regra:

IAKK

Ro

2

21

O valor do incremento de adaptação (IA) varia entre 0,80 e 1,30mm,

dependendo do diâmetro da lente seleccionada e da natureza da

ametropia. Quanto maior o diâmetro maior é o incremento de adaptação.

Os defeitos refractivos 10,00 D (grosso modo) impõem um incremento de

adaptação menor (raio de curvatura base mais fechado), pois, ao

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69

aumentar a espessura aumenta o peso, facilitando o descentramento

vertical e a rotação (oscilação) da lente.

3.2.3. – Potência

A LCHT de ensaio deve ter uma potência aproximada da prescrição. Se o

componente esférico é superior a 4,00 D levaremos em conta a distância

de vértices (o componente cilíndrico habitualmente não se modifica).

A refracção sobre uma LCHT é dificultada pela combinação de potências

cilíndricas e eixos, pelo que não se realiza. A potência da LCHT

normalmente coincide com a prescrição de lentes oftálmicas (modificada,

quando necessário, em função da distância de vértices).

3.2.4. – Eixo de equilíbrio

As LCHT têm marcas gravadas na superfície anterior que facilitam

relacionar o eixo do astigmatismo e o eixo do componente cilíndrico do

grau da LC tórica. O eixo da potência cilíndrica da LC tórica é o mesmo

eixo da potência cilíndrica da lente oftálmica. Porém, a LCHT, quando

adaptada, pode sofrer rotação. Um giro equivalente a uma hora do relógio

é igual a 30º de rotação. Para quantificar o valor do giro orientamo-nos

pelas marcas de referência verificando a estabilização da LCHT (métodos:

a) retículos adaptados às oculares do biomicroscópio binocular; b) uma

armação de prova e um teste para lentes tóricas com escala graduada

segundo o sistema TABO; c) axímetro calibrado em graus; secção óptica

da lâmpada de fenda do biomicroscópio [com o paciente olhando em posição

primária, usando uma secção óptica luminosa em posição vertical, rodando até à

coincidência com as marcas da lente; a posição das marcas quantifica-se usando a escala

graduada que existe na zona superior da maioria dos biomicroscópios]). Anota-se a

magnitude e o sentido da rotação. Identifica-se três tipos de rotação:

1. Rotação instável: o diâmetro e o raio de curvatura base são apropriados

mas existe rotação a 30º . É problemático adaptar LCHT.

2. Rotação 5º: Os

parâmetros da LCHT são

adequados.

3. Rotação 5º: Neste caso

aplicaremos a regra DRES (direita restar e esquerda somar). (Fig.41).

Fig.41

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70

Para confirmar se a estabilização da LCHT não é acidental giramos (com

o dedo) a LC aproximadamente 45º. Passados 5 minutos compararemos as

posições.

Exemplo:

Um paciente tem a seguinte prescrição de óculos (OD):

º18050,200,4 .

As medidas queratométricas são º18080,700,8 .

O DHIV é de 12,30mm

Adaptou-se uma LCHT de ensaio em material PHEMA, com uma

hidrofilia de 45%, superfície anterior tórica e superfície posterior asférica,

diâmetro 14,50mm (12,30 + 2mm) e raio de curvatura base 8,90mm (7,90

+ 1). A potência desta lente era de º18050,200,3 . A LC rodou 20º

para a esquerda. Somou-se 20º segundo a regra DRES.

A LCHT prescrita foi em material PHEMA, hidrofilia 45%, tórica externa,

asférica interna, sistema de estabilização dinâmica, diâmetro de

14,50mm, raio de curvatura base de 8,90mm e potência

º2050,200,4 .