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ESTADO DO MARANHÃO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL 38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA 8ª VARA CÍVEL DA CAPITAL DO ESTADO DO MARANHÃO. Processo 19518-76.2007.8.10.0001 (19518/2007 ) Manutenção de Posse Processo 8690-84.2008.8.10.0001 (8690/2008) Reintegração de Posse Autores: ADEMAR MARIO ZAUZA e ADEMILSON DALL AGNOL Réus: ASSOCIAÇÃO DE HORTIFRUTIGRANJEIROS DE SÃO JOAQUIM e Outros. APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL – 38° Promotoria de Justiça Especializada em Conflitos Agrários. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO, por sua 38° Promotoria de Justiça Especializada de Conflitos Agrários, nos autos da Ação de Manutenção de Posse com pedido de liminar e Reintegração de Posse , com pedido liminar , respectivamente, todas propostas por ADEMAR MARIO ZAUZA e ADEMILSON DALL AGNOL em desfavor da ASSOCIAÇÃO DE HORTIFRUTIGRANJEIROS DE SÃO JOAQUIM E OUTROS, não se conformando, data vênia, com a r. sentença que julgou simultaneamente procedente os pedidos formulados nas Iniciais das Ações Cíveis supramencionadas, vem INTERPOR

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ESTADO DO MARANHÃOMINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA 8ª VARA CÍVEL DA CAPITAL DO ESTADO DO MARANHÃO.

Processo nº 19518-76.2007.8.10.0001 (19518/2007) – Manutenção de PosseProcesso n° 8690-84.2008.8.10.0001 (8690/2008) – Reintegração de Posse

Autores: ADEMAR MARIO ZAUZA e ADEMILSON DALL AGNOLRéus: ASSOCIAÇÃO DE HORTIFRUTIGRANJEIROS DE SÃO JOAQUIM e Outros.

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL – 38° Promotoria de Justiça Especializada em Conflitos Agrários.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO, por sua 38° Promotoria de Justiça Especializada de Conflitos Agrários, nos autos da Ação de Manutenção de Posse com pedido de liminar e Reintegração de Posse , com pedido liminar , respectivamente, todas propostas por ADEMAR MARIO ZAUZA e ADEMILSON DALL AGNOL em desfavor da ASSOCIAÇÃO DE HORTIFRUTIGRANJEIROS DE SÃO JOAQUIM E OUTROS, não se conformando, data vênia, com a r. sentença que julgou simultaneamente procedente os pedidos formulados nas Iniciais das Ações Cíveis supramencionadas, vem INTERPOR

A P E L A Ç Ã O

EM SEU DUPLO EFEITO, DEVOLUTIVO E SUSPENSIVO, para o E. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, com fundamento nos artigos 82, inc. III, 83, inc. I, 84, 499, 513 e 520, caput, todos do Código de Processo Civil, do Provimento da Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Maranhão número 29/2009, art. 563 e seguintes do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, art. 197 da Constituição do Estado do Maranhão, art. 5ª, inc. XXIII, 170, inc. III, 127, caput, 129, inc. III, e 186, inc. I, II, III e IV, todos do Texto Básico, pelas razões de fato e de direito que expõe

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS em separado.

Requer que, recebido o recurso em seus efeitos legais, inclusive, com efeito suspensivo, seja o mesmo devidamente processado e, após a constatação do cumprimento das regularidades formais, o encaminhamento dos presentes autos ao E. Tribunal ad quem para oportuno julgamento.

Nestes termos,P. deferimento.

São Luís, MA, 07 de maio de 2014.

HAROLDO PAIVA DE BRITOPromotor de Justiça da 38° Promotoria de Justiça

Especializada de Conflitos Agrários

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EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA,PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL,SENHORES DESEMBARGADORESDOUTA PROCURADORIA DE JUSTIÇA,

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO, por sua 38° Promotoria de Justiça Especializada de Conflitos Agrários, pretende, com o presente recurso, a ANULAÇÃO, em julgamento rescindente, ou caso não seja esse o entendimento, a REFORMA da sentença proferida nestes autos pelo Juiz de Direito da 8° Vara Cível da Comarca de São Luís, em julgamento substitutivo, que julgou procedente os pedidos formulados respectivamente, nas Ações de Manutenção e Reintegração de Posse, convolando em definitiva a liminar anteriormente concedida.

Para tanto, apresenta desde logo as razões do seu inconformismo, visando obter o provimento da presente Apelação e a consequente anulação ou reforma da sentença guerreada.

I – DA TEMPESTIVIDADE DO PRESENTE RECURSO.I – DA TEMPESTIVIDADE DO PRESENTE RECURSO.

Estabelecem os arts. 506, inc. II e 508, caput, do Código de Processo Civil, que o prazo para interposição do recurso de Apelação Cível é de 15 (quinze) dias, contados a partir da intimação das partes do processo. De se observar, também, ser aplicável a regra do art. 188 do CPC, que outorga ao Ministério Público prazo em dobro para recorrer.

No caso vertente, Excelências, o Ministério Público Estadual só tomou conhecimento da existência da propositura das ações originárias, acima referidas, após ser informado por representantes da Associação de Hortifrutigranjeiros de São Joaquim, momento em que este representante ministerial imediatamente oficiou o Juízo da 8° Vara Cível desta Capital, pugnando pela abertura de vistas ao Ministério Público (fls. 417/420), quando tal requisição fora deferida, sendo este membro do Parquet efetivamente

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS intimado de maneira formal da sentença prolatada por aquele Juízo, na data do dia 10 de abril do ano de 2014, razão de que, neste contexto, mostra-se evidente e patente a tempestividade do presente recurso de APELAÇÃO CÍVEL , conforme se vê de termo de abertura de vistas às fls. 422 dos autos.

II – QUESTÃO DE ORDEM – PREVENÇÃO DA PRIMEIRA CÂMARA CIVIL.

Excelências, verifica-se que, em razão de a liminar deferida pelo Juízo da 8° Vara Cível desta Capital, originária da Ação de Manutenção de Posse, fora suspensa definitivamente nos autos, após interposição do Agravo de Instrumento n° 25.575/2007, julgado pelo então Relator, o Excelentíssimo Senhor Desembargador PAULO SERGIO VELTEN PEREIRA, que substituía à época, conforme Portaria n° 132/2008 – TJMA em anexo (doc. I), a Excelentíssima Senhora Desembargadora RAIMUNDA SANTOS BEZERRA, Relatora originária, que, inclusive, foi quem julgara a Apelação Cível interposta pelos Réus, mas que já se encontra aposentada após realizar permuta com a Excelentíssima Senhora Desembargadora ÂNGELA MARIA MORAES SALAZAR, conforme notícia a página eletrônica do Tribunal de Justiça do Estado, (doc. II) CONSTATA-SE que, nos termos do art. 242, caput, do Regimento Interno desse Egrégio Tribunal, ser a competência preventa do Órgão Julgador da PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL e da Senhora Relatora ÂNGELA MARIA MORAES SALAZAR, para julgamento do presente feito, tendo em vista que esta realizou permuta com a Relatora originária, razão que se REQUER, de logo, o encaminhamento à distribuição dos presentes autos, e, em seguida, ao Órgão Julgador da Primeira Câmara Cível, na pessoa da Excelentíssima Senhora Desembargadora, ÂNGELA MARIA MORAES SALAZAR, Relatora que se tornou, portanto, competente por prevenção para julgar presente demanda.

III – DA LEGITIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICOIII – DA LEGITIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL PARA ATUAR NA QUALIDADE DEESTADUAL PARA ATUAR NA QUALIDADE DE CUSTUS LEGIS,CUSTUS LEGIS, EM EM CONFLITOS AGRÁRIOS DE CONFLITOS AGRÁRIOS DE NATUREZA COLETIVA.NATUREZA COLETIVA.

Sobre o Ministério Público no exercício da função de custos legis, Excelências, ANTÔNIO CLÁUDIO DA COSTA MACHADO nos oferece a seguinte lição: "O que defende o custos legis é o interesse do Estado de ver a

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS lei perfeitamente aplicada a situações jurídicas de extrema relevância social. (...) Para cumprir esse encargo que a lei lhe atribui, fiscaliza o órgão do Parquet não só toda a atuação das partes, seus representantes, como também a do próprio juiz, propugnando sempre pela solução mais conforme com os ditames das leis materiais e processuais." (A intervenção do Ministério Público no processo civil brasileiro. SP, Saraiva, 1998, p. 285/286).

Realmente, é inegável que o Ministério Público, ainda que interveniente como custos legis, detém legitimidade e interesse na interposição de recursos, porquanto visa tutelar o interesse indisponível. É como decidiu o C. STJ no REsp 498280/CE (ementa parcial):

"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO OPOSTA POR REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO COMO CUSTOS LEGIS EM AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO CONEXA A AÇÃO CIVIL PÚBLICA. (...) 3. O Ministério Público, como custos legis, opina pela procedência ou improcedência do pedido, decorrendo de sua expectativa legal, o direito de oferecer as exceções instrumentais. CPC. Aliás, é essa mesma ratio que autoriza o recurso do Ministério Público como parte ou como fiscal da lei (art. 499, do CPC). 4. Recurso especial provido." (STJ - REsp 498280/CE, Relator Ministro LUIZ FUX, j. 09/09/2003, pub. DJ 29/09/2003).

Neste diapasão, no caso em apreço, constata-se de forma bem cristalina e robusta que o litígio ora vergastado, trata de conflito agrário de natureza coletiva, no qual, portanto, revela-se indispensável a participação do Ministério Público Estadual, nos termos da lei e da remansosa e sedimentada jurisprudência e doutrina pátria.

Nesse sentido, foi instaurado nesta Promotoria de Justiça Especializada em Conflitos Agrários, Procedimento de Investigação Preparatório, Portaria n° 01/2014, em anexo (doc. III), com base em notícias veiculadas pelos representantes da Associação de Hortifrutigranjeiros de São Joaquim, bem como da entidade civil, GTI – Grupo de Trabalho Intergovernamental e Intersetorial pela Regularização Fundiária da Ilha de São Luís, subscrita por sua Articuladora, Vereadora ROSE SALES, visando a apuração de responsabilização criminal pelas ameaças perpetradas no local do conflito pelos Autores contra os Réus.

No decorrer das diligências promovidas por este Órgão Ministerial ficou comprovado, conforme se extrai do Relatório do Estudo

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS Social realizado na Comunidade de São Joaquim de Itapera, Tibiri Zona Rural, confeccionado pelo Núcleo de Serviço Psicossocial das Promotorias de Justiça da Capital – NSP/MP/MA e do relatório do Instituto de Terras e Colonização do Maranhão - ITERMA, em anexo (doc. IV e V), que a Comunidade de São Joaquim de Itapera já possui caráter de consolidação no local do conflito, devido a sua existência de há mais de 13 (treze) anos, inclusive com a presença dos serviços públicos, tais como energia elétrica e investimentos promovidos pelos programas federais de apoio a produção rural, como o PRONAF, entre outros.

Assim, ficou plenamente comprovada a natureza coletiva da demanda sub judice, tendo em vista que na aludida comunidade há 77 (setenta e sete) casas, com 49 (quarenta e nove) habitadas, onde os seus moradores aplicam a função social da terra, fazendo-a moradia e ora produzindo da terra a agricultura, ora criando animais de pequeno porte para sua subsistência, ou seja, vêm empregando em boa parte do imóvel, objeto da lide, a verdadeira função social exigida pela Constituição Federal, inclusive e sobretudo com relação à utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente, razão de ser curial a intervenção do Ministério Público Estadual.

IV – BREVE EXPOSIÇÃO DOS FATOS.IV – BREVE EXPOSIÇÃO DOS FATOS.

Cuida a espécie de, respectivamente, Ação de Manutenção e Reintegração de Posse, com pedido de liminar, todas propostas por ADEMAR MARIO ZAUZA e ADEMILSON DALL AGNOL em desfavor da ASSOCIAÇÃO DE HORTIFRUTIGRANJEIROS e OUTROS, "e demais sem-terras existentes no local do conflito (...)", sob alegação, em síntese, de que os autores são legítimos senhores e possuidores de um imóvel rural denominado Formigueiro I-A, localizado na Estrada Itapera-Quebra Pote, Distrito do Bacanga, nesta Capital, com área de 200.0009210 hectares, de cuja posse foi esbulhado pelos demandados na data de julho de 2007.

Informam ainda, que tal imóvel fora adquirido da empresa Áurea Empreendimentos S/A, sucessora de Armando Gaspar Administração e Participação LTDA em 05.04.2007, por Instrumento Particular de Contrato de Promessa de Compra e Venda de Imóvel Rural.

Ao despachar a Inicial, o então Juiz titular da 8° Vara Cível desta Capital, deferiu em sede de inaudita altera parte a liminar pleiteada, em decisão de fls. 77, à revelia do Ministério Público Estadual e sem

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS observância do procedimento específico e formalidades essenciais previstas no Provimento nº 29/2009, da Corregedoria Geral da Justiça do Estado, ratificado no Manual de Diretrizes Nacionais para a Execução de Mandados Judiciais de Manutenção e Reintegração de Posse Coletiva, de lavra do Ministério do Desenvolvimento Agrário (docs. VI e VII) para as ações possessórias, que fora cumprida efetivamente com apoio de força policial, conforme se vê às fls. 86.

Sucede, Senhora Relatora, Senhores Desembargadores, Senhor Procurador, que esta ordem veio a ser suspensa em sede de decisão monocrática de Agravo de Instrumento n° 25.575-2007, interposto pelos Réus, proferida pelo Senhor Relator Substituto, o Excelentíssimo Desembargador PAULO SÉRGIO WELTEN PEREIRA, constante às fls. 146/147, a qual posteriormente, foi confirmada a favor destes, os quais permanecem no local.

Os Réus, citados, apresentaram contestação, arguindo questões processuais e de mérito (fls. 109/116), sobre as quais foi oportunizada ao autor manifestação a respeito (fls. 150/152).

Determinada designação de repetidas Audiências de Conciliação com as partes, e todas restaram infrutíferas, sendo, contudo, tomados os depoimentos das partes e das testemunhas arroladas, conforme se vê as fls. 202, 204, 215/217, 234/237.

Alegações Finais dos requerentes às fls. 240/244.

Alegações Finais dos requeridos às fls. 246/249.

De mais a mais, ocorre que, em face da noticia constante dos autos, de que a área estaria encravada em terras do domínio útil do Estado do Maranhão, ao invés de ser determinado a citação do Estado do Maranhão para ingressar no feito, com a necessária declinação de sua competência para uma das Varas Judiciais de Fazenda Pública, o Juiz titular da 8ª Vara, depois de manter os autos paralisados por quase 03 (três) meses, sentenciou o feito (fls. 259/261) e inclusive, estendendo os efeitos da Ação de Manutenção de Posse à Ação de Reintegração de Posse, em decorrência da conexão, sem que fosse completada a prova documental plenamente necessária bem como sem que fosse oportunizado ao Ministério Público Estadual a apresentação de seu parecer final, em evidente e intolerável cerceamento de defesa e violação das prerrogativas do Ministério Público do Estado do Maranhão, com todo o respeito ao Eminente Magistrado.

Destaca-se nos autos a Decisão de julgamento de Apelação Cível pela PRIMEIRA CÂMARA, às fls. 327/336, interposto pelos Réus, em que foi negado provimento ao seu APELO.

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Decisão de julgamento de Ação Rescisória pela TERCEIRA CÂMARA CÍVEL às fls. 414/416, ajuizada pelos Réus, em que foi JULGADO IMPROCEDENTE o pleito rescisório.

Ás fls. 417/420, este Órgão Ministerial se manifestou nos autos pugnando pela abertura de vistas visando o ingresso no feito, o que foi, finalmente, oportunizado e acolhido conforme o despacho judicial (fls. 422).

É o de mais importante que se tinha a relatar.

V – NULIDADE DA DECISÃO PROFERIDA SEM PRÉVIA OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO – CPC, arts. 82, inc. III; 83, inc. I; 84 e 246 e PROVIMENTO n° 29/2009 DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA.

Em se tratando de conflito coletivo pela posse da terra rural, inafastável a intimação do Ministério Público para participar de todos os atos do processo, inclusive para oferecimento de parecer final antes da sentença, sob pena de nulidade, como se depreende dos arts. 82-III, 83-I, 84 e 246, todos do CPC, bem como do já prefalado Provimento.

Não ocorrendo a intervenção necessária do órgão ministerial, quando indeclinável era a sua participação no feito, nulo é o processo a partir do momento em que nele deveria intervir e a tanto não foi chamado, sendo certo que tal nulidade é absoluta e não depende de prova de efetivo prejuízo, o qual, no caso, se mostrará, à exaustão que, efetivamente, houve seríssimos danos a toda uma coletividade que vive e trabalha da terra!!!

No caso, como já exposto no relatório dos fatos, acima elaborado, este Órgão Ministerial nunca fora intimado pessoalmente, para promover requerimentos nos autos, e sequer participou de algum ato processual, tais como as diversas audiências de conciliação realizadas sem a presença de um membro do Parquet, inclusive de nenhum dos processos que cuidam de demandas coletivas agrárias ajuizados perante o Juízo da 8° Vara Cível desta Capital.

Cabe aqui um parêntese para esclarecer que, com a presença do Ministério Público Estadual e do Estado do Maranhão na lide, as informações faltantes que dissolveria a verdadeira essência do conflito, qual

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS seja, de que área seria pertencente ao Estado do Maranhão, portanto, de grande utilidade para o deslinde da causa, levaria a um outro desfecho judicial, além de, principalmente, destacar a inafastável necessidade de cumprir o disposto no artigo I do Provimento n° 29/2009, facilitando a execução do Plano Nacional de Reforma Agrária no Estado do Maranhão, atendendo principalmente a determinação constitucional de aplicação da função social da terra.

Também de ressaltar que, lastreado no mesmo PROVIMENTO DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA , seria imprescindível nos autos, a realização da inspeção judicial, onde o Magistrado poderia, certamente, melhor aquilatar se o pretenso proprietário estaria aplicando a função social da terra, o que não ocorreu.

Logo, constata-se que na atual ordem jurídica dos fatos, embora o direito de propriedade continue assegurado como garantia individual na Constituição Federal de 1988 (art. 5º, XII e 170, II, CF), esse direito foi relativizado, com exigência do cumprimento de mais um requisito para a proteção possessória. Agora a propriedade se destina ao cumprimento de uma função social (art. 5º, XXIII, 170, III e 186), regulados pela Lei da Reforma Agrária (Lei nº 8.629/93) e no recepcionado Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/64) que disciplinam o procedimento administrativo de reforma agrária para fins de desapropriação.

Neste respeito, com base na legislação constitucional e infraconstitucional vigente, a propriedade atende plenamente a função social quando preencher simultaneamente aos requisitos constituídos pelo elemento econômico, ambiental e social. Esses requisitos se constituem no seguinte: a) o econômico, consistente no aproveitamento racional e adequado da propriedade, identificado especialmente pela sua produtividade; b) o ambiental, consistente na utilização adequada dos recursos naturais e preservação do meio ambiente, c) o social, consistente na observância das normas que regulam as relações de trabalho e a exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e trabalhadores.

Diante desse paradigma constitucional, no presente caso, segundo noticia relatada nos autos principais, é sabido que a área total ora em conflito, constitui-se em exatamente 200.0009210 hectares.

Contudo, convém ressaltar que essencialmente a área em xeque, conforme Relatório do ITERMA (doc. IV), que encontra-se por assim dizer na posse das partes em comento, digo Autor e Réus, remonta em uma ocupação propriamente dita, a um total tão somente de 81 hectares.

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS Assim, a função social da terra estaria sendo aplicada em sua

totalidade no caso em voga? Com certeza que não. Deste modo, salta aos olhos, de forma cristalina, que os ora recorridos, nunca aplicaram e sequer aplicarão como afirmam a plena função social da área rural denominado Formigueiro I-A, localizado na Estrada Itapera-Quebra Pote, Distrito do Bacanga.

Assim, diante da complexidade dos fatos, seria indispensável oportunizar ao Ministério Público atuar em todas as fases do processo, bem como após o oferecimento de alegações finais pelas partes. Não tendo assim procedido o Magistrado, é de se impor a decretação da nulidade da sentença proferida sem que fosse ouvido o Órgão Ministerial, o Estado do Maranhão, o ITERMA.

Em reforço a esse entendimento, convém trazer à baila os seguintes precedentes jurisprudenciais (grifos nossos):

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. AUSÊNCIA DE INTERVENÇAO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PARECER FINAL. NULIDADE. Tratando-se de demanda que envolve interesse público, a falta de intervenção do Ministério Público em primeiro grau gera nulidade (art. 82, inciso III, e art. 246, caput, do CPC). DADO PROVIMENTO AO APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA DESCONSTITUIR A SENTENÇA. PREJUDICADO O EXAME DA APELAÇÃO DO AUTOR." (Ap. Cível nº 70014508568, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogério Gesta Leal, j. 18/05/2006).

"APELAÇÃO CÍVEL - CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE AÇÃO DE USUCAPIÃO - FALTA DE INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA EMITIR PARECER FINAL E A NÃO REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO DESIGNADA - INTERVENÇÃO OBRIGATÓRIA - NULIDADE DA SENTENÇA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO - DECISÃO UNÂNIME. - Tratando-se de feito que exige intervenção obrigatória do Ministério Público, a falta de intimação para oferecer parecer final, implica nulidade absoluta da sentença." (TJSE – AP. CÍVEL 2008214648, Relator: DES. ROBERTO EUGENIO DA FONSECA PORTO, j. 10/11/2008, 1ª CÂMARA CÍVEL).

"APELAÇÃO CÍVEL. CURADORIA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA OFERECIMENTO DE PARECER FINAL ANTES DA

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS SENTENÇA EM PROCESSO QUE EXIGE A SUA INTERVENÇÃO. NULIDADE DA SENTENÇA, A TEOR DO ART. 82, III E 246 DO CPC. RECURSO PROVIDO." (TJRS – Ap. Cível nº 70049768146, Sétima Câmara Cível, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, j. 06/07/2012).

VI – INEXISTÊNCIA DOS REQUISITOS ESSENCIAIS À CONCESSÃO DA MEDIDA RECLAMADA .

Em homenagem ao Princípio da Eventualidade ou da Concentração, caso não prospere a arguição de nulidade da sentença, por não interveniência do Ministério Público Estadual nesta causa de interesse coletivo agrário, o que evidentemente não se espera, esta sentença atacada deverá ser reformada, para julgar improcedente o pedido dos autores, ante a inexistência dos requisitos autorizadores da concessão da tutela pretendida.

Como se sabe, são requisitos para a concessão do mandado proibitório: a prova pelo autor de sua posse e o justo receio de nela ser molestado (CPC, art. 932).

Além disso, em se tratando de imóvel rural, como é o caso, a posse exigida caracteriza-se pelo exercício de uma das formas de atividade agrária produtiva, por isso chamada posse agrária.

É o que se extrai, inclusive, da seguinte conclusão de um dos grupos de trabalho do Fórum de Assuntos Fundiários, criado como instituição nacional e permanente no âmbito do E. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA: "Recomendar o estudo aprofundado do conceito de posse agrária, posto que as decisões judiciais em sua maioria estão baseadas na posse civil."

Neste respeito, insta esclarecer, ainda, que este subscritor, no uso de suas atribuições legais, após obter informações deste conflito agrário, imediatamente instaurou Procedimento de Investigação Preparatório (doc. III), promovendo diligências com as partes envolvidas visando a conciliação do conflito agrário de natureza coletiva, o que levou a diversas visitas in loco realizando "inspeção" no imóvel sub judice, logrando constatar que os Autores ali não desenvolvem em sua totalidade a função social da terra, dado que inclusive, foi omitido na sentença judicial de 1° Grau, e por este sequer aquilatado quando da tramitação do processo.

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS Conclui-se, portanto, que a proteção possessória do

imóvel rural, por intermédio da tutela jurisdicional, está condicionada ao cumprimento da função social da propriedade rural, aplicando-se-lhe, quanto aos pressupostos, a teoria da posse agrária, não bastando a comprovação da posse dita civil.

A propósito do tema, convém citar a lição autorizada do Ilustre Desembargador OSVALDO OLIVEIRA ARAÚJO FIRMO, ex-Juiz da Vara Agrária de Minas Gerais (grifos e destaques do próprio autor):

"O direito à propriedade que a Constituição garante é aquele referente à propriedade que ela mesma define, ou seja, à propriedade (art. 5º, XXII) que cumpre sua função social (art. 5º, XXII). (...) Se a propriedade há de realizar uma função social, nos termos da Constituição e da lei, por ilação e óbvia conclusão, a posse a ela correspondente haverá de cumprir, também, necessária função social no efetivo uso e/ou fruição do bem. (...) Ressalte-se, em esclarecimento, o bem imóvel territorial rural é bem de produção, vocacionado ao serviço social, mesmo embora em mãos privadas ou particulares. E se assim é, a função social dele exigida toma o caráter de trato sucessivo. (...) Desta sorte, em sede de ação possessória a exigência de prova da posse há de acontecer observando a exigência constitucional. Se quanto à propriedade se pode discutir a prova de sua existência a partir de um registro cartorário válido, a posse, por essencialmente visível no mundo fático, tem justo na sua faticidade a prova eficiente de sua existência. (...) Frente a um pedido de cunho possessório, sobretudo se ombreado a um pleito incidental de concessão liminar inaudita altera parte, importa exclusivamente refletir sobre a qualidade da posse do requerente. Tal análise baliza-se, por primeiro, nos eflúvios que exalados da Constituição Federal. A questão elementar, na espécie, é de cunho principiológico e reside na Carta Fundamental de Direitos do ordenamento jurídico. (...) Há, por equívoco, quem entenda despiciendo perquirir da função social da propriedade em sede das possessórias. (...) É possível colacionar dos tribunais decisões que, ao arrepio da Constituição e da boa e mais atualizada doutrina, têm por sem importância a produtividade, o bem-estar, o respeito às leis ambientais e trabalhistas de um imóvel rural – enfim, o cumprimento da função social –, bastando-se por vezes nas exigências de uma leitura fundamentalista do art. 927 do CPC.[1] (...) Na possessória, há de haver prova cabal de atendimento satisfatório ao elemento constitutivo da função social. (...) A função social eleva-se a tema irresistível. Não se trata de discuti-lo, reconhecendo-o viável ou não; ele se impõe à literatura jurídica porque radicado no texto da Constituição Federal, quer como princípio assim reconhecido ou como regra positivada, declaradamente garantida como direito fundamental. (...) A posse defluente

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS da propriedade, e que como tal vem sendo requerida nos interditos que tramitam nesta Vara Agrária, há de atender à função social prescrita pela Constituição vigente para a propriedade, nos exatos termos que a lei infraconstitucional dispuser. (...) O Código Civil, o Código de Processo Civil e as leis extravagantes civis – as que de perto nos interessam aqui – só se compreenderão à luz do princípio da função social. Só é propriedade ou posse aquela que cumpra a função social, e só em sendo assim podem assumir-se como objetos de proteção judicial dominial ou possessória. (...) Ora, quando o Código de Processo Civil (art. 927, I, do CPC) exige do autor de uma ação possessória, de pronto, a prova de sua posse, exige-a consoante ao que o ordenamento jurídico positivo e mesmo o Direito, por suas demais manifestações ou formas de expressão [2] (doutrina, jurisprudência, costumes: princípio da juridicidade), entendam por posse. E a posse agrária, ou posse imobiliária rural constitucional – se assim a pudermos designar –, é a cumpridora da função social (art. 186 da CRFB/88). (...) Assim, inquestionável, a teor do art. 927 do CPC, competir ao autor da possessória (seja qual for) o dever de, necessariamente, provar a sua posse. Até aqui prevalece a imposição da lei processual. É comando inequívoco. No entanto, não é a lei processual quem definirá o conteúdo da 'posse' que exige seja provado. Para a concepção da posse, há o intérprete e aplicador da lei socorrer-se da lei material para desvelar o sentido da posse."[3]

No caso em particular, relativamente ao requisito posse, o Julgador monocrático a considerou "inconteste" diante da prova documental colacionada pelos Autores, levando somente em consideração as alegações daqueles, sem obtemperar, nos autos, através de necessárias diligências, o oficiamento do Estado do Maranhão para demonstrar interesse e ingressar no feito, bem como outras diligências, como por exemplo, a inspeção judicial, onde facilmente se verificaria a ausência de aplicação dos requisitos do artigo 186, caput, e incisos, do Texto Maior, bem como sua regulamentação, alinhavada na Lei Federal 8.629/1993.

De mais a mais, ocorre que os documentos mencionados na decisão recorrida não são aptos, por si sós, a comprovar a posse do imóvel, mesmo porque, como adverte HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, "[...] todo cuidado é de ser dispensado pelo juiz à prova documental in casu, já que, versando o interdito sobre fatos, como soem ser a posse, o esbulho, a turbação e a respectiva data, dificilmente seus pressupostos vêm retratados em verdadeiros documentos." (Curso de direito processual civil, RJ, Forense, 1993, vol. III, p. 144).

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS Em reforço a esse entendimento, convém trazer à baila os

seguintes precedentes jurisprudenciais (grifos nossos):

• "CERCEAMENTO DE DEFESA - Fatos alegados na inicial e na impugnação que estavam a merecer dilação probatória, principalmente por se tratar de ação de reintegração de posse em que discute a posse, que é eminentemente fática – O direito à prova é uma decorrência natural do direito à Jurisdição - O Poder Judiciário não pode deixar dúvidas a ponto de causar perplexidade nos litigantes - As partes devem ser devidamente convencidas das razões de decidir - Recurso provido para a produção das provas almejadas pelas partes litigantes". (Apelação Cível nº 991.08.023605-4, 19ª Câmara de Direito Privado do TJSP, Rel. Des. PAULO HATANAKA, j. 28.05.2010)

• "Havendo matéria de fato, como a prova da posse e seus requisitos, imperiosa afigura-se a dilação probatória. Fatos controvertidos evidenciados, sendo igualmente relevantes, de molde a exigir a instrução do feito. Julgamento antecipado da lide o qual configura inequívoco cerceamento de defesa. Sentença desconstituída. Apelo provido". (Apelação Cível nº 70001609890, 18ª Câmara Cível do TJRS, Rel. Des. MARTA BORGES ORTIZ, j. 10.09.2001)

• "AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE (...) AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVAS - CERCEAMENTO DE DEFESA - OCORRÊNCIA - SENTENÇA CASSADA. (...) O art. 130 do CPC, permite ao julgador - condutor do processo - determinar as provas necessárias à instrução processual, ou, de outro lado, indeferir as que repute inúteis para o caso que lhe é posto para julgamento. Todavia, é necessário que esse dever-poder - mais dever do que poder - conferido ao julgador seja balizado pelos princípios norteadores do processo e do procedimento, mormente os que têm previsão constitucional, como é o caso do princípio da ampla defesa (art. 5º, LV, da CF). O juiz deve, pois, possibilitar o contraditório e a ampla defesa e, com base na análise dos documentos e demais provas produzidas nos autos, formar o seu convencimento fundamentadamente. Em razão da inexistência de oportunidade às partes de especificarem e produzirem as provas que entendessem necessárias, configurado restou o cerceamento de defesa, o que acarreta a nulidade da sentença proferida". (TJMG - Ap. Cível nº 1.0338.05.038358-1/003 - Rel. Des. ELPÍDIO DONIZETTI)

• "Não se deve, com risco, levar um processo a final indesejado, pois, surgindo dúvida sobre a necessidade da prova para a

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS parte, que, neste caso, a suscita de forma razoável, deve-se permitir a sua produção, já que a anulação do processo, após longo tempo, trará prejuízo maior". (Agravo de Instrumento Cível nº 0338343-7/2001, 3ª Câmara Cível do TAMG, Rel. Juiz WANDER MAROTTA, j. 30.05.2001)

Como se observa na simples leitura do caderno processual dos presentes autos, além de não exigir prova mínima pertinente à posse, nem mesmo na sua concepção civil (cabendo lembrar que não houve a realização de inspeção judicial no imóvel, tampouco audiência de justificação prévia antes do deferimento da liminar pleiteada), o Magistrado a quo ignorou completamente que, de acordo com a melhor e mais adequada interpretação constitucional, a posse que deflui da propriedade, há de atender à função social, sob pena de não poder ter assegurada a sua defesa nas ações possessórias.

Os defensores de que a discussão de função social não deve adentrar a seara possessória, como é o caso do prolator da sentença recorrida, estão em total dissonância com o mandamento constitucional e apegados umbilicalmente à legislação infraconstitucional, que deve sempre ser interpretada e aplicada à luz da Carta Magna, pois o fundamento do regime jurídico da propriedade é a Constituição, e este direito só se garante uma vez atendida a função social, o que, de forma incontroversa, não demonstraram os Autores, ora Recorridos, nos autos.

Com efeito, nas sábias palavras do Ilustre Desembargador Osvaldo Firmo, ex-Juiz da Vara Agrária de Minas Gerais, " O direito à propriedade que a Constituição garante é aquele referente à propriedade que ela mesma define, ou seja, à propriedade (art. 5°, XXII) que cumpre sua função social (art. 5°, XXII). " (obra citada, p. 86).

Outro Magistrado da Vara Agrária de Minas Gerais, o não menos ilustre Doutor RENATO LUÍS DRESCH, também compartilha do entendimento de que as ações possessórias envolvendo o interesse coletivo de luta pela terra não podem continuar a ser decididas ao arrepio da Constituição e da boa e mais atualizada doutrina e opõe judiciosas críticas aos "civilistas de concepção dogmática napoleônica" que ainda insistem em afirmar que qualquer ocupação, mesmo em propriedade improdutiva e abandonada é ilícita. Confira-se:

"Tratando-se de conflito fundiário consistente na ocupação coletiva de terras rurais, comporta a matéria análise à luz do direito agrário e não com base no Código Civil, que é destinado

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS a regular os conflitos de direito privado. Ao exigir que a propriedade cumpra a função social, a Constituição Federal de 1988 criou uma nova ordem na definição do direito de propriedade. Constitucionalizou-se e publicizou-se de forma explícita o regime jurídico do direito de propriedade, abarcando de vez o conceito de propriedade com a exigência de cumprimento da função social conforme requisitos que já figuravam no art. 2º do Estatuto da Terra. (...) Desse modo, a propriedade que não cumpre uma função social será passível de desapropriação sanção e mais, não lhe pode ser assegurada a proteção possessória. (...) Portanto, o direito público de onde se extrai a função social deve nortear o magistrado no julgamento dos conflitos coletivos de posse. (...)

1

Cfr., dentre outros: STJ: EDcl na IF 15/PR 1992/0032907-1 – Corte Especial – Rel. Min. Adhemar Maciel – j. 17.12.1993 – publ. DJ 9.5.1994. TJMG: AI nº 2.0000.00.492837-0/ 000(1) – 11ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Des. Teresa Cristina da Cunha Peixoto – j. 31.8.2005 – publ. 24.9.2005; AI nº 2.0000.00.509471-5/ 000(1) – 9ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Des. Pedro Bernardes – j. 6.9.2005 – publ. 24.09.2005; AI nº 2.0000.00.519782-6/000(1) – 11ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Des. Afrânio Vilela – j. 9.11.2005 – publ. 17.06.2006; AI nº 1.0024.05.785685-8/ 000(1) – 17ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Des. Luciano Pinto – j. 17.11.2005 – publ. 1.12.2005; AI nº 2.0000.00.518.899-2/000 – 14ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Des. Renato Martins Jacob – j. 01.12.2005 – publ. 1.2.2006; AI nº 1.0024.05.811922-3/001 – 15ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Des. Guilherme Luciano Baeta – j. 20.7.2006 – publ. 5.9.2006; Ap nº 2.0000.00.477227-8/000(1) c/c Ap nº 2.0000.00.477221-6/000 – 9ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Des. Pedro Bernardes – j. 1.8.2006 – publ. 16.9.2006; AI nº 1.0024.06.088432-7/001 – 14ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Des. Dídimo Inocêncio de Paula – j. 11.1.2007 – publ. 26.1.2007. TAMG: AI nº 20000.00.478797-9/000(1) – 2ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Juíza Evan-gelina Castilho Duarte – j. 9.3.2005 – publ. 29.3.2005; AI nº 2.0000.00.461399-2/ 000(1) – 4ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Juiz Nilo Lacerda – j. 10.11.2004 – publ. 27.11.2004; AI nº 20000.00.407689-7/000(1) – 4ª Câmara Cível – Comarca de Belo Horizonte – Rel. Juiz. Saldanha Fonseca – j. 18.6.2003 – publ. 9.8.2003; AI nº 353.105-3 – 6ª Câmara Cível – Comarca de Patrocínio – Rel. Juiz Domingos Coelho – j. 7.2.2002 – publ. 26.2.2002; AI nº 2.0000.00.288830-8 – 3ª Câmara Cível – Comarca de Conselheiro Pena – Rel. Juiz Kildare Carvalho – j. 15.3.2000 – publ. 25.3.2000; AI nº 20000.00.030170-4/000(1) – 1ª Câmara Cível – Comarca de Uberlândia – Rel. Juiz Nepomuceno Silva – j. 13.6.2000 – publ. 1.7.2000; AI nº 289.617-9 – 5ª Câmara Cível – Rel. Juiz. Armando Freire – j. 28.11.1996; TJRS: AI nº 70005770664 – Rel. Des. Ícaro Carvalho de Bem Osório – j. 30.1.2003.

2 FRANÇA, R. Limongi. Op. cit., Cap. III, p. 21-25.

3 Direito aplicado: vivências judiciárias de conflitos coletivos agrários em Minas Gerais, Brasília, MDA, 2009, p. 86-103.

(4) THEODORO Jr., Humberto. Curso de direito processual civil. 39. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 513. v. 1.

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS Inobstante a infinidade de litígios rurais, a questão atinente ao cumprimento da função social da propriedade não tem sensibilizado boa parte dos operados do direito, que se limitam a compilação antigas jurisprudências fundadas na conceituação clássica da propriedade, sem atentar para o seu aspecto constitucional e publicista. (...) Nessa linha de raciocínio não há dúvidas de que a função social da propriedade é norma cogente, constituindo-se de requisito constitucional para a proteção possessória. (...) A atividade jurisdicional deve adaptar-se a essa nova realidade, cumpre aos juízes, sem temor de modificar o 'status quo' estabelecido e imposto com o suor e sangue dos menos afortunados, se empreender para que sejam implementados os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, com a construção de uma sociedade, livre, justa e solidária, com a erradicação da pobreza e as desigualdades sociais, como exige o art. 3º da Carta Republicana de 1988. (...) Os civilistas de concepção dogmática napoleônica, afirmam que qualquer ocupação, mesmo em propriedade improdutiva e abandonada é ilícita, de modo que caberia aos movimentos sociais provocar a atuação do governo através do Poder Judiciário. Ora, a atuação do Poder Jurisdicional de regra demanda anos para encerrar causas simples. Os trabalhadores famintos e sedentos por terra e trabalho não dispõem de tempo para esperar, de modo que essa solução importa na perpetuação da pobreza, negando mais uma vez a realização de qualquer reforma agrária no Brasil. Como poder soberano no Estado Democrático de Direito, no exercício da sua atividade típica, mais do que solucionar os conflitos de interesses, cumpre ao Poder Judiciário observar e fazer cumprir os preceitos constitucionais, especialmente os direitos e garantias fundamentais e fazer com que se cumpram os direitos e deveres individuais e coletivos. A atuação jurisdicional do juiz deve ter por norte e refletir as ideias do art. 3º da Constituição Federal como já afirmado, visando à construção de uma sociedade livre justa e solidária, com a erradicação da pobreza e a marginalização com a redução das desigualdades sociais e regionais, e ainda promovendo o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (...) O Poder Judiciário tem grande parcela de responsabilidade para implementação dos objetivos fundamentais da República, como tem a sua responsabilidade com a desigualdade social hoje instalada, já que sempre se

(5) WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. Teoria geral do processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 591. v. 1.

(6) NERY Jr., Nélson. Princípios fundamentais: teoria geral dos recursos. 3. ed. São Paulo: RT, 1996. p. 378. v. 1.

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS manteve silencioso cumpridor das leis, mesmo aquelas leis que feriam de morte garantias fundamentais. (...) Pensando-se num ideal de justiça embasado numa 'justiça humanitária', não se pode desprezar que a nação brasileira vive diante de conflitos sociais graves, em que as garantias fundamentais de acesso à saúde ao ensino, a moradia, ao trabalho e à terra são negados. Na questão fundiária se verifica que de um lado trabalhadores famintos lutam por um pequeno espaço de terra para plantar. De outro lado, há latifúndios improdutivos que é uma antítese ao desejo de que uma sociedade justa. (...) A reforma agrária com a distribuição das terras que não cumprem a função social (portanto abandonadas) é dever do Poder Executivo, mas o Poder Judiciário não pode ficar desatento à realidade conflituosa que impera no campo. O magistrado não pode se descurar da responsabilidade atinente à função jurisdicional de que no cumprimento da lei deve realizar justiça. Desse modo, ajuizada ação em razão da omissão do Poder Executivo, transmuda-se a responsabilidade pela solução do problema para a atividade jurisdicional, cabendo ao poder jurisdicional suprimir a inércia governamental. Pensamento em sentido contrário faz mais uma vez dos julgadores responsáveis pela desigualdade social que impera e se agrava cada dia em nossa Nação. A inércia da atividade jurisdicional existe até a provação. A partir de então lhe cumpre agir ativamente para fazer justiça a fim de que os anseios constitucionais se cumpram, deve exigir a atuação do Poder Executivo e quando isso não é possível cumpre-lhe suprir inércia e fazer cumpria a Constituição. A sociedade brasileira espera que a atividade jurisdicional seja dirigida ao cumprimento do mandato que lhe foi outorgado para o cumprimento dos anseios constitucionais. Exige-se uma magistratura comprometida com uma 'justiça humanitária', que vise a consecução dos objetivos fundamentais da república elencados no art. 3º já referido, pela construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com erradicação da pobreza e redução das desigualdades sociais. A nova ordem jurídica de definição do direito de propriedade e os conflitos sociais instalados por aqueles que lutam pelo direito de seu espaço, associado ao grande fosso de desigualdades sociais, exige do Poder Judiciário uma escolha. Pode manter o 'status quo' e transformar em letra morte diversos preceitos fundamentais da Constituição Federal, ou ser um agente ativo na transformação social, realizando uma justiça humanitária atuante na construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com a redução das desigualdades sociais. (...) Não basta um ordenamento jurídico constitucional recheado de direitos e garantias fundamentais. Há necessidade de consciência dos operadores do direito, especialmente dos juízes, para fazer atuar esses direitos, já que a atividade jurisdicional é destinada a cumprir os preceitos maiores da Constituição Federal, fazendo justiça, visando reduzir as desigualdades sociais." (Aspectos jurídico das liminares possessórias em ações

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS coletivas sobre a posse de terras rurais, Revista de Direito Agrário nº 18/2006, p. 141-161).

Quanto ao deveres de "observar e fazer cumprir os preceitos constitucionais" e "empreender para que sejam implementados os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil", mencionados na lição acima transcrita, são eles exigidos de todos os Magistrados, conforme o disposto nos arts. 2º e 3º do Código de Ética da Magistratura Nacional, verbis:

"Art. 2º Ao magistrado impõe-se primar pelo respeito à Constituição da República e às leis do País, buscando o fortalecimento das instituições e a plena realização dos valores democráticos."

"Art. 3º A atividade judicial deve desenvolver-se de modo a garantir e fomentar a dignidade da pessoa humana, objetivando assegurar e promover a solidariedade e a justiça na relação entre as pessoas."

Comentando esses dispositivos, o já mencionado Douto Lourival Serejo nos oferece lição irrefutável:

"A obediência que o magistrado deve à lei precisa ser crítica, não submissa, sob pena de tornar-se um juiz montesquiano, que só serve para pronunciar a letra da lei. (...) Toda aplicação da lei, atualmente, deve submeter-se à perspectiva constitucional. À magistratura é reconhecida hoje importante função na efetivação do Estado Democrático de Direito, assegurando as promessas da democracia aos cidadãos e a transparência do jogo democrático, conforme preconizado por Garapon e Bobbio. (...) Essas atuais atribuições do juiz decorrem da situação de insegurança do cidadão diante das omissões do legislador e dos mandatários que não cumprem suas promessas em favor do cidadão. (...) Ao regular suas decisões pelos princípios da Lei Maior, está o juiz assegurando o funcionamento do Estado Democrático de Direito; está tornando eficaz as normas constitucionais e prestigiando os direitos fundamentais dos cidadãos”. A Constituição da República é o documento que abriga as garantias e os direitos individuais, as regras de funcionamento do governo e traça todo o arcabouço do Estado, notadamente se ela foi elaborada por uma assembleia constituinte legitimamente constituída pela vontade soberana do povo. O juiz há de estar sempre voltado para a aplicação dos princípios constitucionais, como fonte

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS motivadora de suas decisões, além de demonstrar o espírito público que deve orientar sua postura. Por inspiração constitucional é que se forma o juiz republicano, preocupado com o bem comum, com a coisa pública, com a eficiência das políticas públicas e com a efetivação da justiça social. (...) Não se admite mais o juiz que decide somente pela letra da lei, ressuscitando o velho brocardo dura lex sed lex para justificar decisões injustas e alheias às peculiaridades do caso concreto. (...) É obrigação do juiz cumprir e fazer cumprir a Constituição, zelar pela sua efetivação e pugnar pela aplicação dos seus princípios, dentre os quais se ressalta o da dignidade da pessoa humana. Os princípios constitucionais devem servir de sustentáculos argumentativos para o pensar e o decidir de todo juiz. (Comentários ao código de ética da magistratura nacional, 1ª ed. – Brasília, DF: ENFAM, 2011)."

Fácil concluir, portanto, que a intenção do legislador foi cristalina ao determinar que o imóvel rural só merece proteção como direito individual se preenchidos os requisitos previstos para o cumprimento da função social, posicionamento alinhado com a mais avançada doutrina em torno da matéria, senão vejamos:

"A proteção possessória assegurada no Código Civil tem como pressuposto o cumprimento da função social da propriedade rural, ou seja, somente as propriedades rurais que cumpram sua função social é que poderão ter assegurada a proteção possessória." (GRAU, Eros Roberto. Parecer. In STROZAKE, Juvelino (org.). A questão agrária e a justiça. São Paulo:RT, 2000, p. 201).

"Para julgamento do mérito, deve o magistrado socorrer-se efetivamente dos laudos, e, se constatado o não-cumprimento da função social, julgar improcedente a reintegratória." (OLIVEIRA, Umberto Machado de Oliveira. Princípios de Direito Agrário na Constituição Vigente. Curitiba: Juruá, 2006, p. 179).

"Agora, porém, diante do novo conceito de propriedade no direito positivo brasileiro – consubstanciado no art. 1228 e seu respectivo § 1º do Código Civil -, a teoria objetiva da posse formulada por Jhiering há de ser concebida sob nova óptica, no sentido de que a propriedade que não cumpre função social não pressupõe posse e, nesse caso, não há falar em proteção jurídica da posse, muito menos como corolário da propriedade. (...) Destarte, assiste razão à emergente doutrina defensora da conveniência e necessidade de se exigir do autor de uma ação reintegratória de posse - em face de ocupações coletivas promovidas pelos movimentos sociais -, além dos requisitos alinhados no art. 927, do Código de Processo Civil, também a

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS prova do cumprimento da função social na integralidade de seus requisitos." (MARQUES, Benedito Ferreira. Direito Agrário Brasileiro, 7ª ed. - São Paulo: Atlas, 2007, p. 47 e 48).

"(...) é defensável concluir que é incongruente com a norma constitucional e a mens legis deferir proteção possessória ao titular de domínio cuja propriedade não cumpre integralmente sua função social, inclusive (e especialmente) no tocante ao requisito da exploração racional. A liminar que seja deferida concedendo a reintegração de posse de imóvel nessa condição pode até atender a dogmática do Código Civil, mas se choca de frente com o novo texto constitucional." (FACHIN, Luiz Edson. A justiça dos conflitos no Brasil. In A questão agrária e a justiça. SP: RT, 2000, p. 277-291).

"Quem não cumpre a função social da propriedade perde as garantias, judiciais e extrajudiciais, de proteção da posse, inerentes à propriedade, como o desforço privado imediato (CC, art. 502) e as ações possessórias. A aplicação das normas do Código Civil e do Código de Processo Civil, nunca é demais repetir, deve ser feita à luz dos mandamentos constitucionais, e não de modo cego e mecânico, sem atenção às circunstâncias de cada caso, que podem envolver o descumprimento de deveres fundamentais." (COMPARATO, Fábio Konder. Direitos e deveres em matéria de propriedade. In A questão agrária e a justiça. SP: RT, 2000, p. 130-147).

"Pode-se afirmar que a Constituição de 1988 criou um novo pressuposto para a obtenção da proteção processual possessória: a prova do cumprimento da função social. Assim, o art. 927 do CPC, que enumera os pressupostos para a concessão da proteção possessória, deve ser aplicado como se ali houvesse um novo inciso (o inciso V), que se reputa um pressuposto implícito, decorrente do modelo constitucional de proteção da propriedade. A correta interpretação dos dispositivos constitucionais leva à reconstrução do sistema de tutela processual da posse, que passa a ser iluminado pela exigência de observância da função social da propriedade. Parafraseando Humberto Ávila: se não há regra expressa neste sentido, ela deve ser extraída da aplicação direta do princípio da função social da propriedade." (Júnior, Fredie Didier. A função social da propriedade e a tutela processual da posse. Disponível em: www.frediedidier.com.br/main/artigos - Acesso em 14/06/2013).

Importa considerar, ainda, que a função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, aos requisitos

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS elencados no art. 186 da Constituição Federal, dentre eles, “aproveitamento racional e adequado da terra”, "a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente", justamente o que se visava comprovar com a prova cerceada.

Entretanto, foram tecidas pelo Magistrado meras conjecturas ou suposições que de modo algum ensejam previsão de perigo iminente de turbação ou esbulho, motivo pelo qual resta patente e inarredável a não procedência do pedido dos Autores, ora recorridos, vez que, durante toda a fase processual, não se vislumbrou o propósito judicial de se aquilatar essencialmente se no presente caso, estava se aplicando o preceito constitucional da aplicação da função social da terra.

VII – DA CONCESSÃO DO EFEITO SUSPENSIVO AOVII – DA CONCESSÃO DO EFEITO SUSPENSIVO AO PRESENTE RECURSO.PRESENTE RECURSO.

A atribuição de efeito suspensivo à devolução ora operada e APELADA constitui-se em medida indispensável à realização da JUSTIÇA, tendo em vista que a decisão ora objurgada, viola direitos sociais e liberdades da mais alta importância, restando demonstrado que o Magistrado incorreu em manifesto error in judicando, data venia, ao prolatar a decisão vergastada, fundamentando sua decisão com base em provas insuficientes da posse e sem visualizar se os Autores estão aplicando a função social da terra.

Como cediço, além do efeito devolutivo a Apelação detém o efeito suspensivo, como mencionado no art. 520, caput, do Código de Procedimentos, onde a Apelação deve ser recebida no efeito suspensivo e devolutivo. Cabe destacar que o próprio artigo excepciona as hipóteses para o efeito suspensivo (§ único).

Desse modo, o efeito suspensivo é imprescindível para a paz social, uma vez que, se preterido, a decisão poderá produzir seus efeitos no mundo exterior imediatamente, sem que haja uma definição sobre o litígio. E isso é grave, a decisão judicial modifica o patrimônio, a personalidade, a vida familiar e a liberdade das pessoas. A incerteza não é harmoniosa com o Direito e com a Justiça, uma vez que, se esta é dar a cada um o que lhe pertence, a instabilidade do decisório não traz certeza e liquidez da propriedade do objeto da lide. O escopo do efeito suspensivo é justamente isso preservar as partes dos imediatos efeitos da decisão.

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O processo em sua essência serve para tutelar os direitos individuais ou subjetivos ameaçados ou violados. A imediata eficácia de uma decisão verdadeiramente remete às partes uma ameaça, porquanto, irá pairar incerteza sobre a decisão.

Citando o grande doutrinador Humberto Theodoro Júnior(4) quando preleciona sobre o efeito suspensivo, verbis: "Enquanto não se esgotam os meios de debate e defesa, enquanto não se exaure o contraditório, não está o Poder Judiciário autorizado a invadir o patrimônio da parte (CF, art. 5º, LIV e LV)" .

Assim, é a regra a Apelação ter efeito suspensivo. A Lei determinou o duplo efeito para esse recurso, sendo manifesto o art. 520 do CPC. Quanto a isto não há dúvidas, Araken de Assis, Luiz Rodrigues Wambier(5) e Nelson Nery Jr.(6), fora tantos outros, são mestres do Direito Processual Civil e consolidam essa afirmação. Portanto, o juízo de admissibilidade do recurso de Apelação é feito estritamente. O órgão jurisdicional apenas seguirá o que o legislador previu, no caso, se nada há, o recebimento é no duplo efeito. Ademais, o juiz, no despacho que recebe a Apelação, deve ser expresso se houver exceção ao referido efeito, pois, se se omite de declará-la, presume-se o recebimento no duplo efeito.

Logo, deve-se, no caso em apreço, sopesar os valores e princípios pertinentes, constatando-se à Luz do primado da proporcionalidade, que o princípio da segurança jurídica e primazia da lei devem se sobrepor aos supostos direitos individuais do proprietário do imóvel, pelo que se pugna no momento do recebimento do presente, o efeito suspensivo da decisão recorrida.

VIII – DOS PEDIDOS.

Em razão de todo o exposto, PEDE O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL:

a) a imediata concessão de efeito suspensivo, nos termos dos art. 520, caput, do CPC, para que seja sobrestado o cumprimento da decisão de reintegração de posse até o julgamento do presente recurso;

b) seja o presente Apelo conhecido e, ao final, provido, para que, em julgamento rescindente, seja reconhecida a nulidade da sentença proferida com cerceamento de provas, em ofensa aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, bem como sem prévia oitiva do Ministério Público, desde do momento processual, antes do saneamento do processo,

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38ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA ESPECIALIZADA EM CONFLITOS AGRÁRIOS deveria ter atuado; e, se não for este o entendimento dessa Egrégia Corte,

c) que, em julgamento substitutivo, reforme a decisão para não acolher o pedido dos Autores, por não terem efetivamente demonstrado, de forma alguma, que estão aplicando a função social à terra sob litigio, onde residem mais de quarenta (40) famílias produtoras rurais, há muito mais de 05 (cinco) anos, conforme relatórios do Núcleo Social do Ministério Público do Estado do Maranhão e do Instituto de Colonização e Terras do Maranhão – ITERMA (docs. IV e V).

Nestes termos, Pede provimento.

São Luís, MA, 07 de maio de 2014.

HAROLDO PAIVA DE BRITOPromotor de Justiça da 38° PJ Especializada de Conflitos Agrários