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Rev. CEFAC, São Paulo ADAPTAÇÃO PARA A LÍNGUA PORTUGUESA E APLICAÇÃO DE PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO DAS DISARTRIAS DE ORIGEM CENTRAL EM PACIENTES COM DOENÇA DE PARKINSON Adjustment to the Portuguese and application to patients with Parkinson’s disease of protocol within central origin dysarthrias’ assessment Angélica Suelen Fracassi (1) , Ana Rita Gatto (2) , Silke Weber (3) , André Augusto Spadotto (4) , Priscila Watson Ribeiro (5) , Arthur Oscar Schelp (6) RESUMO Objetivo: traduzir e adaptar protocolo desenvolvido por pesquisadores alemães, adequando-o às características fonéticas e linguísticas do português falado no Brasil. Caracterizar os componen- tes de fala mais alterados na população com doença de Parkinson, comparando-os com grupo de sujeitos normais na mesma faixa etária. Método: realizou-se a tradução e adaptação do protocolo. Posteriormente foram avaliados 21 pacientes com diagnóstico neurológico de Doença de Parkinson nos estágios Hoehn &Yarh, entre 2 e 3, e 10 sujeitos normais. O protocolo incluía avaliação da res- piração, fonação, ressonância, articulação, prosódia e a análise acústica dos parâmetros vocais. Resultados: o protocolo mostrou-se de fácil aplicação clínica. Nos sujeitos com doença de Parkinson foram observadas alterações predominantes na fonação (85,9%) e articulação (42,9%). Conclusão: o estudo demonstrou ser o protocolo uma ferramenta eficiente para a avaliação da disartria em pacientes com doença de Parkinson. DESCRITORES: Disartria; Doença de Parkinson; Avaliação (1) Médica Generalista da Assistência Médica Ambulatorial – Águia de Haia, São Paulo, SP. (2) Fonoaudióloga do Departamento de Neurologia e Psiquia- tria da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botu- catu, SP. (3) Médica; Professora Doutora do Departamento de Oftalmo- logia e Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botucatu, SP. (4) Bacharel em Sistemas de Informação, departamento de Neurologia e Psiquiatria da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botucatu, SP; Doutor em Engenharia Elétrica pela Universidade de São Paulo. (5) Fonoaudióloga do Departamento de Neurologia e Psiquia- tria da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botu- catu, SP. (6) Médico; Professor Doutor do Departamento de Neurolo- gia e Psiquiatria da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botucatu, SP. Conflito de interesses: inexistente do mecanismo da fala devido lesão no sistema nervoso central ou periférico 1 . Pode afetar um ou mais componentes da produção oral, sendo estes a respiração, fonação, ressonância, articulação e prosódia 2 . Dependendo da etiologia neurológica têm-se quadros disártricos distintos. Na Doença de Parkinson (DP) descrita, inicial- mente, pelo inglês James Parkinson em 1817 como uma doença degenerativa progressiva do sistema extrapiramidal, observa-se alterações relacionadas principalmente à fonação, articulação e prosódia, tais como, monotonia de picht e loudness, redução no stress das palavras, imprecisão na produção de consoantes e voz rouco-soprosa 3-5 . Analisando 200 pacientes com diagnóstico de Doença de Parkinson, pesquisadores observaram que cerca 89% deles apresentaram desordens vocais, tais como soprosidade, rouquidão, aspe- reza e tremor. Distúrbios articulatórios foram encon- trados, por sua vez, em 45%, dos pacientes 6 . No diagnóstico dessas alterações, via de regra, o examinador não tem acesso a protocolos bem INTRODUÇÃO A disartria é definida por um conjunto de altera- ções resultantes do distúrbio no controle muscular

Avaliação da disartria

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  • Rev. CEFAC, So Paulo

    ADAPTAO PARA A LNGUA PORTUGUESA E APLICAO DE PROTOCOLO DE AVALIAO DAS DISARTRIAS DE ORIGEM

    CENTRAL EM PACIENTES COM DOENA DE PARKINSON

    Adjustment to the Portuguese and application to patients with Parkinsons disease of protocol within central origin dysarthrias assessment

    Anglica Suelen Fracassi (1), Ana Rita Gatto (2), Silke Weber (3),

    Andr Augusto Spadotto (4), Priscila Watson Ribeiro (5), Arthur Oscar Schelp (6)

    RESUMO

    Objetivo: traduzir e adaptar protocolo desenvolvido por pesquisadores alemes, adequando-o s caractersticas fonticas e lingusticas do portugus falado no Brasil. Caracterizar os componen-tes de fala mais alterados na populao com doena de Parkinson, comparando-os com grupo de sujeitos normais na mesma faixa etria. Mtodo: realizou-se a traduo e adaptao do protocolo. Posteriormente foram avaliados 21 pacientes com diagnstico neurolgico de Doena de Parkinson nos estgios Hoehn &Yarh, entre 2 e 3, e 10 sujeitos normais. O protocolo inclua avaliao da res-pirao, fonao, ressonncia, articulao, prosdia e a anlise acstica dos parmetros vocais. Resultados: o protocolo mostrou-se de fcil aplicao clnica. Nos sujeitos com doena de Parkinson foram observadas alteraes predominantes na fonao (85,9%) e articulao (42,9%). Concluso: o estudo demonstrou ser o protocolo uma ferramenta eficiente para a avaliao da disartria em pacientes com doena de Parkinson.

    DESCRITORES: Disartria; Doena de Parkinson; Avaliao

    (1) Mdica Generalista da Assistncia Mdica Ambulatorial guia de Haia, So Paulo, SP.

    (2) Fonoaudiloga do Departamento de Neurologia e Psiquia-tria da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botu-catu, SP.

    (3) Mdica; Professora Doutora do Departamento de Oftalmo-logia e Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botucatu, SP.

    (4) Bacharel em Sistemas de Informao, departamento de Neurologia e Psiquiatria da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botucatu, SP; Doutor em Engenharia Eltrica pela Universidade de So Paulo.

    (5) Fonoaudiloga do Departamento de Neurologia e Psiquia-tria da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botu-catu, SP.

    (6) Mdico; Professor Doutor do Departamento de Neurolo-gia e Psiquiatria da Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP, Botucatu, SP.

    Conflito de interesses: inexistente

    do mecanismo da fala devido leso no sistema nervoso central ou perifrico1. Pode afetar um ou mais componentes da produo oral, sendo estes a respirao, fonao, ressonncia, articulao e prosdia2. Dependendo da etiologia neurolgica tm-se quadros disrtricos distintos.

    Na Doena de Parkinson (DP) descrita, inicial-mente, pelo ingls James Parkinson em 1817 como uma doena degenerativa progressiva do sistema extrapiramidal, observa-se alteraes relacionadas principalmente fonao, articulao e prosdia, tais como, monotonia de picht e loudness, reduo no stress das palavras, impreciso na produo de consoantes e voz rouco-soprosa 3-5.

    Analisando 200 pacientes com diagnstico de Doena de Parkinson, pesquisadores observaram que cerca 89% deles apresentaram desordens vocais, tais como soprosidade, rouquido, aspe-reza e tremor. Distrbios articulatrios foram encon-trados, por sua vez, em 45%, dos pacientes6.

    No diagnstico dessas alteraes, via de regra, o examinador no tem acesso a protocolos bem

    INTRODUO

    A disartria definida por um conjunto de altera-es resultantes do distrbio no controle muscular

  • Fracassi AS, Gatto AR, Weber S, Spadotto AA, Ribeiro PW, Schelp AO

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    estruturados para investigao das disartrias. Estudos sobre a percepo da inteligibilidade de fala nas disartrias, baseados em observao clnica, concluem que ao compararmos a anlise de um profissional bem treinado e um indivduo que no trabalha na rea, ambos apresentam capacidade de percepo das alteraes de fala sem diferena estatisticamente significante7.

    A avaliao clnica da disartria, presente em inmeras doenas neurolgicas pressupe prefe-rencialmente a anlise de parmetros vocais por meio da percepo auditiva. Provas de repetio de palavras e frases, discurso e produes orais pr-estabelecidas so alguns dos instrumentos utili-zados na prtica clnica, sem que isso pressuponha a aplicao de protocolo especfico 8,9.

    Alm da avaliao clnica igualmente impor-tante para a concluso diagnstica da disartria a observao de aspectos objetivos fornecidos por programas especficos de anlise acstica da voz. A relao entre as avaliaes subjetiva e objetiva fornece maior segurana no diagnstico, acompa-nhamento e controle da eficcia teraputica nos pacientes com tais comprometimentos. O estudo acstico requer a anlise de diferentes parmetros, incluindo frequncia fundamental (correlato fsico correspondente altura), durao (tempo de arti-culao) e intensidade (energia vocal utilizada pelo falante).

    Na lngua portuguesa, no dispomos de muitos protocolos clnicos validados para avaliao da disartria em pacientes com doenas neurolgicas. Grande parte dos estudos refere-se anlise perceptiva auditiva e objetiva dos parmetros vocais em sujeitos com diagnstico de disartria previa-mente definido10. Walshe et al.11, e Ackermann e Ziegler12, por exemplo, relacionaram aspectos de inteligibilidade e articulao disartria em grupo de sujeitos disrtricos. Outro aspecto que chama ateno o fato de que esses autores limitam-se a discutir distrbios isolados da fala e no o seu conjunto. J Ortiz13 aplicou protocolo de disartria baseado na traduo e adaptao de outros proto-colos propostos por autores de lngua inglesa, possibilitando a anlise conjunta dos componentes da produo oral.

    O objetivo do presente estudo foi traduzir e adaptar protocolo desenvolvido por pesquisadores alemes, adequando-o s caractersticas fonticas e lingusticas do portugus falado no Brasil. A partir de sua aplicao, detalhar os componentes de fala mais alterados em grupo de pacientes com Doena de Parkinson nos estgios 2 e 3 de Hoehn &Yahr 4.

    MTODO

    Foi realizada pesquisa cientfica de carter original desenvolvida no Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina de Botucatu.

    Participaram do estudo 31 sujeitos, com faixa etria variando de 54 a 75 anos. O grupo com diag-nstico neurolgico de Doena de Parkinson foi constitudo por 21 sujeitos classificados entre os estgios 2 e 3 de Hoehn &Yahr4. O grupo controle se constituiu de 10 sujeitos sem histria ou queixa de comprometimento neurolgico que pudesse comprometer a fala.

    O protocolo que serviu de base para a presente proposta de anlise foi cedido pelo Professor Wolfrang Ziegler, nome do grupo de estudo em Neurofontica da Unidade de Neuropsiquiatria no Instituto Max-Planck Psiquiatric, Bogenhaus, em Munique, Alemanha 14, desenvolvido no perodo de 1984 a 1988.

    A primeira verso do protocolo para a lngua portuguesa foi feita por mdico neurologista brasi-leiro. A traduo reversa foi realizada por mdica otorrinolaringologista, procedente de pas de lngua alem e a adaptao realizada por fonoaudilogas do servio.

    Os dados do exame clnico neurolgico foram obtidos no exame de rotina do Ambulatrio de Doenas do Movimento do Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina de Botucatu UNESP. O estagiamento da Doena de Parkinson foi estabe-lecido conforme proposto por Hoehn e Yahr. Foram selecionados somente os que se enquadravam nos nveis 2 e 3, ou seja, os que apresentavam sinais e sintomas bilaterais, ausncia de altera-es de ajuste postural evidente, sem necessidade de auxlio em atividades de vida diria. As aplica-es do protocolo foram realizadas por um nico avaliador.

    O protocolo de avaliao incluiu a anlise dos seguintes componentes da fala (Anexo 1):

    a) Respirao: foi analisada a frequncia respi-ratria, realizando-se a contagem do nmero de ciclos respiratrios durante um minuto; e o nmero de palavras por expirao, observadas a partir da contagem numrica inversa espontnea (40 a 1) e durante a fala espontnea.

    b) Fonao: foi realizada avaliao perceptivo-auditiva da qualidade vocal e anlise acstica. Refe-rindo-se a perceptivo-auditiva avaliou-se o tempo mximo de fonao durante a emisso das vogais sustentadas /a/ e /i/, das fricativas surda e sonora /s/ e /z/ (proporo entre elas) e a fala espontnea. Avaliou-se a qualidade vocal, sensao de frequ-ncia e intensidade (pitch e loudness) e caracters-ticas da emisso (ataque vocal e estabilidade).

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    Aps a avaliao subjetiva foi feita a anlise acstica utilizando Programa Anlise de Voz 2.3 DSP Instrumentos, desenvolvido por ps-gradu-ando em processamento de sinais da USP So Carlos 15. Foram analisados os parmetros acs-ticos da voz: frequncia fundamental (f0), medidas de perturbao (jitter, shimer), suavidade espec-tral de resduo (SFR), suavidade espectral de filtro inverso (SFF), amplitude do pitch (PA) e coeficiente de excesso (EX) (Figura 1). Para obteno dos dados foi solicitada a emisso sustentada da vogal /a/. A gravao foi realizada em sala com acstica ambiente, porm, sem rudos demasiados.

    c) Ressonncia: foi observada a movimentao velar e farngea pela emisso dos fonemas /a/ e //, alternadamente, e durante a repetio da slaba /Ka/. Tais movimentos foram classificados como ausente, mnimo e adequado. A emisso nasal foi avaliada com o auxlio do espelho milimetrado de glatzel. Foi solicitada a emisso de palavras e frases, classificando-as como normal, hipernasal ou hiponasal, nos nveis de leve a grave.

    d) Articulao: caracterizada pela amplitude dos movimentos de lbio, lngua e mandbula com avaliao da constncia e velocidade. Foi solici-tado que os sujeitos emitissem espontaneamente de forma sobrearticulada o /i/, /u/, e /pa/, e as

    slabas /Ka/ e /ta/ alternadamente e com velocidade crescente.

    Alm disso, para avaliar a articulao, foram observadas a fala espontnea, a descrio de figuras e a leitura de palavras isoladas, com pontos e modos articulatrios distintos (plosivas, fricativas, nasais, lquidas, retroflexas e vibrantes, encontros consonantais e vogais), alm das diadococinesias.

    Cada item foi classificado como normal ou alte-rado, e a preciso articulatria graduada de inteli-gvel a ininteligvel numa escala de 0 a 6.

    e) Prosdia: foi observada, por meio da leitura, durante a fala espontnea e a partir da entonao dada fala ao emitir frases afirmativas, interroga-tivas e exclamativas. Para os sujeitos que no apre-sentavam habilidade de leitura, as frases eram lidas pelo avaliador sem qualquer entonao, visando no induzir a resposta do paciente.

    Para quantificar a disartria, cada componente de fala foi graduado a partir de escala de 0 a 6, sendo o 0 a ausncia do distrbio e 6 um distrbio grave. Aps esta anlise a pontuao obtida em cada componente foi somada, classificando a disartria em leve (1-10 pontos), moderada (11- 20 pontos) ou grave (21- 30 pontos).

    O projeto foi aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa Mdica CREMESP, Hospital das Clnicas, UNESP com o nmero do protocolo

    Parmetro Unidade Descrio F0 Hz Avalia o nmero de ciclos do pulso glotal que ocorrem por segundo. O

    limiar masculino/feminino, segundo avaliao estatstica, foi estipulado ser 160Hz, no indicando disfonias enquanto o limiar de 250Hz indica uma alterao nos padres de normalidade.

    JITTER % Avalia a perturbao da freqncia do sinal. calculado pela razo entre as variaes do perodo e o perodo mdio constantes da amostra selecionada. Determinou-se como valor de normalidade o limiar de 2%

    SHIMMER % Avalia a perturbao da amplitude do sinal. Calcula-se o parmetro pela substituio do perodo pela amplitude do sinal. Determinou-se o valor do limiar (15%)

    PA Adimensional Amplitude do Pitch: a quantificao desta medida corresponde mediana da amplitude do segundo pico da autocorreo do sinal residual.

    EX Valor absoluto

    Coeficiente de Excesso: uma medida da forma da distribuio de amplitudes do sinal residual. uma avaliao da razo entre o sinal/rudo. o valor estabelecido como limiar 2,0.

    SFR dB Suavidade Espectral do Resduo: uma medida da variao espectral do sinal, isto , est relacionado variao das amplitudes das componentes espectrais do sinal. o sinal SFR traz informaes do formato do pulso glotal.

    SFF dB Suavidade Espectral do Filtro Inverso: quantifica a suavidade das componentes espectrais relativas aos lbios, trato vocal e glote. o parmetro SFF avalia a ressonncia do trato vocal, ou seja, uma medida quantitativa da atuao do trato vocal.

    Figura 1 Parmetros acsticos da voz: Programa Anlise da voz 2.3 DSP Instrumentos

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    31/2005. Todos os sujeitos includos no protocolo de estudo, tiveram cincia e deram consentimento livre e esclarecido.

    Os dados foram submetidos anlise estatstica com teste t de Student para as variveis que apre-sentaram distribuio normal e o teste no-param-trico de Mann-Whitney para as demais variveis. Para estudo da associao entre as variveis foi utilizado o teste do qui-quadrado.

    RESULTADOS

    O protocolo de avaliao das disartrias mostrou-se de fcil aplicao em pacientes com Doena de Parkinson (Anexo 1), incluindo os componentes da fala: respirao, fonao, ressonncia, articulao e prosdia, alm da anlise acstica da voz.

    Ao ser aplicado nos sujeitos do grupo controle e nos sujeitos com diagnstico neurolgico de Doena de Parkinson, observamos que houve diferena estatisticamente significante (p < 0,05) apenas em relao varivel tempo mximo de fonao (TMF). Sendo que o grupo com DP apresentou TMF signi-ficantemente mais curto que os sujeitos normais,

    com variao entre 8,2 e 4,2 segundos, e o grupo controle com variao entre 14,9 e 3,4 (Tabela 1).

    Como verificado na tabela 2 pode-se observar frequentes alteraes na fonao nos indivduos do Grupo com Doena de Parkinson, constatando-se alterao na intensidade em 13 indivduos (61,9%), presena de ataque vocal em 8 (38,1%), alterao na frequencia em 10 (47,6%) e no tempo mximo de fonao em 14 (66,7%).

    Em relao anlise acstica realizada a partir da emisso sustentada da vogal /a/ observou-se diferena estatstica entre os grupos avaliados em relao s variveis jitter, shimer, Suavidade Espectral do Filtro Inverso (SFF) e Amplitude do pitch (PA) (Tabela 3).

    Na anlise do grupo de sujeitos com diagns-tico de Doena de Parkinson relacionado aos componentes da fala, observaram-se alteraes significantes na fonao em 18 sujeitos (85,7%), seguidas da articulao em 8 sujeitos (38,1%) e 7 na prosdia (33,3%) (Tabela 4), sendo que no grupo controle no se observou alterao nos parmetros clnicos avaliados.

    Variveis Grupo

    Estatstica t Valor p Parkinson Normal

    Ciclos respiratrios 20,55,3 16,92,6 3,58 0,05 TMF 8,24,2 14,93,4 -4,39

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    DISCUSSO

    A sistematizao na avaliao de sinais e sintomas fator essencial no estabelecimento do diagnstico e planejamento teraputico. A utilizao de protocolos imperativa tanto no que se refere eficincia como na reprodutibidade dos achados e subsequente anlise. A verso, adaptao e norma-tizao devem ter sua aplicao aferida pela utili-zao tanto em indivduos normais como naqueles portadores de distrbios.

    A traduo e adaptao do protocolo cedido pelo Professor Wolfrang Ziegler, apresentada neste estudo, refora a necessidade de instrumentos capazes de fornecer dados qualitativos e quantita-tivos, que auxiliem a prtica clnica.

    A aplicao do protocolo j traduzido e adap-tado s particularidades fonticas e fonolgicas do portugus falado no Brasil demonstrou que o distrbio vocal foi a anormalidade mais frequente, encontrada em 89% dos pacientes com Doena de Parkinson. Dado este que corrobora os achados da

    literatura que encontraram o distrbio vocal como sendo o mais frequente nessa populao6.

    A disfuno larngea tem sido apontada como caracterstica comum da disartria hipocintica, sendo o distrbio da fonao frequentemente obser-vado nos estgios iniciais da doena. As caracters-ticas de disfunes larngeas mais prevalentes em nosso estudo foram o tempo mximo de fonao (66,7%) e a reduzida intensidade vocal (61,9%).

    O tempo mximo de fonao (TMF) mostrou-se significantemente mais curto em indivduos com DP quando comparados ao grupo controle, dados estes que corroboram com o estudo de Midi et al16.

    O elevado percentual de alteraes vocais (85,7%) e articulatrias (38,1%) registrados no atual estudo confrontam com o percentual relativa-mente baixo (23,8%) de alteraes de ressonncia. Esses resultados repetem aqueles apresentados por Logemann6 com distrbios articulatrios em 45% dos pacientes com DP e somente 10% com disfuno de ressonncia. Ackermann12 chama a ateno para o fato de que na DP os distrbios articulatrios relacionados ao tempo de fala no

    Grupo

    Parkinson (n=21) Normal (n=10)

    No % No Fonao 18 85,7 - Respirao 4 19,0 - Articulao 8 38,1 - Ressonncia 5 23,8 - Prosdia 7 33,3 -

    Tabela 4 Porcentagem de alteraes dos componentes da fala nos grupos com Doena de Parkinson (DP) e Grupo Controle

    Variveis Grupo

    Estatstica t Valor p Parkinson Normal

    Jitter 3,43,6 1,00,7 2,15 0,04 Shimer 11,36,9 5,52,4 2,56 0,02 SFR -6,83,9 -4,67,2 -1,10 0,28 SFF -16,21,5 -18,41,7 3,64 0,001 PA 0,280,08 0,350,07 -2,18 0,037 Ex 61,622,3 69,427,8 -0,84 0,41 FO Feminino 184,233,9 209,134,1 -1,39 0,19 FO Masculino 130,422,6 149,343,6 -0,82 0,43

    Tabela 3 Dados de anlise acstica

    Mdia e desvio-padro, estatstica t e valor p referentes s variveis segundo grupo. Emisso da vogal sustentada /a/.

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    so alteraes evidentes. Os pacientes analisados apresentaram reduo no movimento e amplitude dos articuladores. Neste estudo, da mesma forma, este distrbio mostrou-se pouco frequente (38,1%).

    Quanto anlise acstica os parmetros com diferena estatisticamente significantes foram jitter, shimmer, SFF e PA. Na literatura observou-se que as medidas jitter e shimmer encontram-se freqen-temente alteradas na DP 10.

    Levando em conta todos esses achados possvel estabelecer a hiptese de que a menor incidncia de distrbios articulatrios em nossos pacientes estava relacionada ao estgio da doena. No entanto, so necessrios outros estudos com maior nmero de sujeitos correlacionando o grau de comprometimento, tempo de evoluo, faixa etria e gnero para que essa relao seja mais bem estabelecida. Estudos destacam que embora o fator inteligibilidade de fala seja uma caracters-tica frequentemente alterada em pacientes com DP esta ainda no foi bem descrita quanto sua relao com a gravidade da doena, durao ou fentipo motor 17.

    No estudo que serviu de base para este proto-colo foram analisados 12 pacientes com Doena de Parkinson, incluindo outros diagnsticos como depresso, demncia e diferentes graus de alte-raes de compreenso, sem qualquer preocu-pao com estagiamento da doena, o que inviabi-lizou a comparao com resultados da pesquisa14. No entanto, a utilizao do protocolo original em

    outro estudo com sujeitos disrtricos ps-acidente vascular enceflico confirma a importncia da exis-tncia de parmetros quantitativos e qualitativos que possibilitem a anlise confivel dos achados clnicos 18.

    O acompanhamento clnico de pacientes com quadros disrtricos, especialmente relacionados ao processo de identificao e avaliao, tem ocorrido, principalmente, por meio da anlise perceptiva audi-tiva e acstica da fala. Esses parmetros, segundo a literatura, so complementares entre si10. O esta-belecimento de protocolos especficos que contem-plem as variaes e peculiaridades da lngua portu-guesa falada no Brasil visto como ferramenta importante na avaliao da disartria por diferentes profissionais que atuam com essa populao.

    Os dados obtidos com a aplicao do proto-colo proposto neste estudo fornecem parmetros de auxlio para a prtica clnica relacionada tanto avaliao, como terapia e prognstico na disartria.

    CONCLUSO

    O presente estudo fornece protocolo de fcil aplicao para avaliao da disartria. O protocolo uma ferramenta importante na atuao clnica. No entanto, faz-se necessria a continuidade dos estudos visando possveis modificaes no protocolo e aplicao deste em maior espectro de sujeitos e distrbios neurolgicos para validao plena do mesmo.

    ABSTRACT

    Purpose: to translate and adapt the protocol developed by German researchers, adjusting it to the phonetic and linguistic characteristics of Brazilian Portuguese. Observe the amended speech components in a group of patients with Parkinsons disease, and comparing them with normal subjects in the same age. Method: twenty one patients with neurological diagnosis of Parkinsons disease in the Hoehn & Yarh stages (2-3), and 10 control subjects were assessed. The protocol was translated, adjusted and applied to the subjects of both control and Parkinsons disease group, assessing the breathing, phonation, resonance, articulation, prosody and acoustic analysis. Results: in the dysarthria evaluation, the protocol showed to be simple and it presented a fast clinical application. In the subjects with Parkinsons disease, we observed alterations in both phonation (85.9%) and articulation (42.9%). Conclusion: the study demonstrated that the protocol is an efficient tool for dysarthria assessment in patients with Parkinsons disease.

    KEYWORDS: Dysarthria; Parkinson Disease; Evaluation

  • Avaliao das Disartrias

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    REFERNCIAS

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    RECEBIDO EM: 10/08/2010ACEITO EM: 06/10/2010

    Endereo para correspondncia: Priscila Watson Ribeiro Campus Universitrio da Unesp Botucatu SPCEP: 18618-000E-mail: [email protected]

  • Fracassi AS, Gatto AR, Weber S, Spadotto AA, Ribeiro PW, Schelp AO

    Rev. CEFAC, So Paulo

    PROTOCOLO DE AVALIAO DA DISARTRIA Nome:____________________________________________________ RG: ___________________ Idade:________________ Profisso:___________________________________________________ Fumante: ( ) No ( ) Sim Tempo _________ Escolaridade: _______________________________ HDNeurolgica:________________________________ Imagem: ____________________________ Data da Internao::_____________________________Data Avaliao: ______________________ I RESPIRAO - Velocidade: _____________ Ciclos/minuto (nl 12 a 20 c/min). - Tempo mximo (nl - 10 a 20 segundos) de fonao - observao da manuteno tonal: /a/ _______s /i/ _______s /s/ _______s /z/ _______s OBS: _____________________________________________________________

    ______________________________________________________________ - Relao s/z : __________ (nl - 0,7 a 1,3) - Palavras por expirao - contagem espontnea de nmeros (40 a 1): _________

    II FONAO - Qualidade Vocal: Normal ( ) Pastosa ( ) Trmula ( ) Rouca ( ) spera ( ) Soprosa ( ) - Altura Vocal: Adequada ( ) Grave ( ) Aguda ( )

    Voz: Anlise indica comprometimento de grau: 0---1---2---3---4---5---6 (grau 0 ausncia; 6 grave)

    Respirao: Anlise indica comprometimento de grau: 0---1---2---3---4---5---6 (grau 0 ausncia; 6 grave)

    - Ataque Vocal: Isocrnico ( ) Brusco ( ) Aspirado ( )

    - Intensidade Vocal (int): Adequada ( ) Alta ( ) Baixa ( )

    - Variao da qualidade vocal: Estvel ( ) Instvel ( )

    Anexo 1

  • Avaliao das Disartrias

    Rev. CEFAC, So Paulo

    III RESSONNCIA - Movimento velar - /a/ e // alternadamente: Adequada ( ) Mnima ( ) Ausente ( ) - Emisso nasal (espelho): Mamo x papai / pau x mau Vov viu a uva. Normal ( ) Hipernasalidade: leve ( ) grave ( ) Hiponasalidade: leve ( ) grave ( )

    IV - ARTICULAO

    - Movimentos Lbio (i/u e pa) espontneos e forados: Normal ( ) Alterado ( )

    - Lngua (ka/ta velocidade crescente): Normal ( ) Alterado ( )

    - Mandbula - abertura: Normal ( ) Alterado ( )

    - Desenho para paciente descrever/ conversa espontnea:

    Respirao ____________________________ Articulao ____________________________ Ressonncia ___________________________

    - Leitura de monosslabos e de frases (n: ____ ):

    Plosivas: Banco Tucano Dedo Panela Porco Gato Batata Tomate Normal ( ) Alterado ( ) Ligaes consonantais e Fricativas: Janela Vaso Gilete Vaca Faca Lanche Sapo Farinha Chave Chapu Fogo Gema Normal ( ) Alterado ( )

    Ressonncia: Anlise indica comprometimento de grau: 0---1---2---3---4---5---6 (grau 0 ausncia; 6 grave)

    - Movimentao parede farngea ka ka: Adequada ( ) Mnima ( ) Ausente ( )

    Plosivos e nasais, na emisso de palavras e fora: P T K Cama Balo B D G Po Caminho m/ n/ nh Mo Normal ( ) Alterado ( )

    Vogais isoladas e vogais nas palavras: A E I O U Meia Pia Bia Ba Normal ( ) Alterado ( )

    Papai pediu pipoca. A fita de fil verde. Amanh mame amassar mamo.

  • Fracassi AS, Gatto AR, Weber S, Spadotto AA, Ribeiro PW, Schelp AO

    Rev. CEFAC, So Paulo

    Lquidas: Lpis Milho Lua Olho Bolo Ilha Normal ( ) Alterado ( ) Encontros Consonantais Prato Blusa Flores Fralda Normal ( ) Alterado ( )

    - Preciso articulatria

    0---1---2---3---4---5---6

    (grau 0 ininteligvel; 6 - inteligvel)

    V - PROSDIA

    - Entonao (repetio sem induo de entonao permitida):

    1- Afirmao: proibido fumar aqui. Normal ( ) Alterado ( )

    2- Interrogao: Voc gostaria de comprar bolo ou sorvete? Normal ( ) Alterado ( )

    3- Exclamao: Maria chegou! Normal ( ) Alterado ( )

    - Velocidade: Normal ( ) Alterado ( ) - Pausas na fala

    0---1---2---3---4---5---6

    (grau 0 sem pausas; 6 muitas pausas)

    Prosdia: Anlise indica comprometimento de grau: 0---1---2---3---4---5---6 (grau 0 ausncia; 6 grave)

    Articulao: Anlise indica comprometimento de grau: 0---1---2---3---4---5---6 (grau 0 ausncia; 6 grave)

    DISARTRIA ( ) LEVE (1 a 10 pontos) ( ) MODERADA (11 a 20 pontos) ( ) GRAVE (21 a 30 pontos)

    Diadococinesia (repetio espontnea velocidade crescente*): Pataka* Badaga Fasacha Normal ( ) Alterado ( )