13
 PESQUISA SOCIAL: A ANÁLISE DE CONTEÚDO D’ÁVILA, Ana Paula F. ¹; TAVARES, Larissa F². 1  Universidade Federal de Pelotas/UFPel ; 2 Universidade Federal de Pelotas/UFPel , Resumo Este ensaio versa sobre a problematização da aplicação da técnica análise de conteúdo. Objetiva discutir as possibilidades e desdobramentos da análise de conteúdo a partir de alguns textos do livro “Valorize a sua carreira (2003)” o qual está organizado com reportagens publicadas no caderno “Empregos e Oportunidades” do jornal Zero Hora. Buscando contextualizar tal fato no Rio Grande do Sul e, em decorrência da variabilidade de perspectivas que versam sobre o processo de operacionalização da técnica de análise de conteúdo, foram selecionados alguns capítulos do livro acima mencionado adotando-se uma análise a partir de dois rumos: uma que assenta na perspectiva predominantemente quantitativa e outra assentada na perspectiva predominantemente qualitativa, na tentativa de desvendar os significados presentes no texto, uma vez que a análise de conteúdo “oscila entre os dois pó los do rigor da objetividade e da subjetividade, absolve e cauciona o investigador pela atração do escondido, latente, não aparente, potencial de inédito (do não- dito), retido por qualquer mensagem” (B  ARDIN, 2011, p.15). Na discussão da técnica a aplicação de ambas as abordagens e procedimentos, a saber: indutivo e qualitativo; dedutivo e quantitativo num mesmo conteúdo propicia a compreensão não somente do conteúdo da mensagem, mas também o significado desse conteúdo, gerando então mais pontos a serem explorados e debatidos na pesquisa. Palavras-Chave: análise de conteúdo; dedução; indução

Bardin

Embed Size (px)

Citation preview

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 1/13

 PESQUISA SOCIAL: A ANÁLISE DE CONTEÚDO

D’ÁVILA, Ana Paula F.¹; TAVARES, Larissa F². 1 Universidade Federal de Pelotas/UFPel; 2 Universidade Federal de Pelotas/UFPel,

Resumo

Este ensaio versa sobre a problematização da aplicação da técnica análise de

conteúdo. Objetiva discutir as possibilidades e desdobramentos da análise de

conteúdo a partir de alguns textos do livro “Valorize a sua carreira (2003)” o qual

está organizado com reportagens publicadas no caderno “Empregos e

Oportunidades” do jornal Zero Hora. Buscando contextualizar tal fato no Rio Grande

do Sul e, em decorrência da variabilidade de perspectivas que versam sobre o

processo de operacionalização da técnica de análise de conteúdo, foram

selecionados alguns capítulos do livro acima mencionado adotando-se uma análise

a partir de dois rumos: uma que assenta na perspectiva predominantemente

quantitativa e outra assentada na perspectiva predominantemente qualitativa, na

tentativa de desvendar os significados presentes no texto, uma vez que a análise de

conteúdo “oscila entre os dois pó los do rigor da objetividade e da subjetividade,

absolve e cauciona o investigador pela atração do escondido, latente, não aparente,

potencial de inédito (do não-dito), retido por qualquer mensagem” (B ARDIN, 2011,

p.15). Na discussão da técnica a aplicação de ambas as abordagens e

procedimentos, a saber: indutivo e qualitativo; dedutivo e quantitativo num mesmo

conteúdo propicia a compreensão não somente do conteúdo da mensagem, mas

também o significado desse conteúdo, gerando então mais pontos a serem

explorados e debatidos na pesquisa.

Palavras-Chave: análise de conteúdo; dedução; indução

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 2/13

1. Introdução

 A perspectiva da análise de conteúdo é interessante ao ramo das ciências

sociais, pois além de realizar a descrição do conteúdo ainda infere-se a respeito dos

efeitos da mensagem no público leitor. Desse modo, propicia um método de

pesquisa sistematizado, tornando possível produzir dados relevantes à

problematização aliada a teorias afins ao problema de pesquisa.

Contudo, este ensaio focaliza-se na aplicação e discussão da técnica, tendo

em vista a importância de analisar documentos de uma maneira que se possam

conhecer outras realidades e não somente aquela da mensagem.

Segundo Pires (2010) “as ciências sociais não podem se contentar exclusivamente com os métodos científicos usuais, visando evidenciar o que está

escondido”, daí a importância, entre outras coisas, de dispor de investigações

quantitativas e qualitativas. É neste sentido que se procurou a metodologia análise

de conteúdo: quantitativa e qualitativa.

Para Cea D’Ancona (1998) ao longo do desenvolvimento das ciências sociais

existem diferentes abordagens metodológicas que, em geral, dependem do objeto

de estudo. Numa perspectiva que busca adequar metodologia e objeto a autoracoloca que se pode assinalar a utilização de técnicas as quais estejam alinhadas

com os objetivos da pesquisa, sendo a categorização destas técnicas amplamente

debatida por diversos autores. Desse modo, levando em consideração o objeto de

pesquisa, e os objetivos do trabalho compreende-se como fio condutor da análise

metodológica a análise de conteúdo.

Nesse ensaio, não se tem como objetivo discorrer acerca dos principais tipos

de pesquisas utilizadas no campo das Ciências Sociais, mas sim fazer um recortedestacando e discutindo a aplicação da técnica de análise de conteúdo a partir do

conceito de Bardin (2011).

Segundo a autora, a análise de conteúdo

é um conjunto de técnicas de análise das comunicações visandoobter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição doconteúdo das mensagens indicadores (quantitativos ou não) quepermitam a inferência de conhecimentos relativos às condições deprodução/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens(BARDIN, 2011, p. 48) 

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 3/13

O objeto de aplicação da técnica tem como tema o perfil profissional exigido

no mercado de trabalho. Desse modo, o tratamento dos resultados compreende de

um lado, a análise de conteúdo quantitativa e por outro lado, análise de conteúdo

qualitativa. Contudo, o tratamento é especificado ao longo do trabalho, mas não é

estanque, no sentido de que um pode implicar no outro.

Nesse sentido, os objetivos deste estudo compreendem em analisar as

características da mensagem nos textos sobre o perfil profissional; através da

análise temática do texto; descobrir quais os efeitos que se espera obter com as

mensagens, bem como explorar os valores e crenças do autor/autores da

mensagem veiculada e problematizar a aplicação da técnica.

O presente trabalho estrutura-se da seguinte maneira: primeiramenteabordamos o referencial teórico, pontuando as questões relevantes de acordo com

os objetivos do trabalho, num segundo momento descrevemos a aplicação da

técnica propriamente dita, em terceiro lugar expomos os resultados e realizamos a

discussão, e, logo apresentamos a conclusão.

2. Desenvolvimento

2.1 Referencial teórico:

De acordo com Bardin (2011, p. 52) a análise de conteúdo tem como objetivo

a manipulação de mensagens, tanto de conteúdo como de expressão de conteúdo

“para evidenciar os indicadores que permitam inferir sobre uma outra realidade que

não a da mensagem”. Assim, a análise de conteúdo difere da análise documental a

qual tem como objetivo “a representação condensada da informação, para consulta

e armazenamento” (Bardin, 2011, p. 52).

Quando comparada à linguística a autora coloca que

a linguística estabelece o manual do jogo da língua; a análise deconteúdo leva em consideração as significações (conteúdo),eventualmente a sua forma e a distribuição desses conteúdos eformas (índices formais e análise de coocorrência) (BARDIN, 2011,p. 49)

 A análise de conteúdo visa à descrição do mesmo, mas não é só isso, pois

após o tratamento dos dados pode-se compreender aquilo que ele explica no seu

contexto mais amplo. Desse modo, neste estudo, segue-se a perspectiva de Bardin

(2011) no sentido de adotar primeiramente como procedimento a descrição analítica.

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 4/13

 A descrição analítica seria um primeiro momento da técnica, pois “a intenção

da análise de conteúdo é a inferência de conhecimentos relativos às condições de

produção (ou eventualmente, de recepção), inferência esta que recorre a

indicadores (quantitativos ou não)” (Bardin, 2011, p. 44).  Seria o momento de

deduzir e interpretar a descrição, através então da inferência e da análise de

conteúdo qualitativa a qual visa descobrir os valores, crenças e atitudes do autor/

autores.

Entretanto “se a descrição é a primeira etapa necessária e se a interpretação

é a última fase, a inferência é o procedimento intermediário, que vem permitir a

passagem explícita e controlada de uma à outra” (Bardin, 2011, p. 45). Busca-se,

então, explicar os efeitos das mensagens contidas nos textos em questão. Nessesentido, a inferência é a dedução lógica.

 A abordagem quantitativa funda-se na frequência da aparição dedeterminados elementos da mensagem a abordagem nãoquantitativa recorre a indicadores não frequenciais suscetíveis depermitir inferências [...], por exemplo, a presença (ou ausência) podeconstituir um índice tanto (ou mais) frutífero que a frequência deaparição. (BARDIN, 2011, p. 144)

Nesse sentido, é possível predizer que a análise quantitativa obtém dados

descritivos por meio de método estatístico, buscando obter significados: “esses

saberes deduzidos dos conteúdos podem ser de natureza psicológica, sociológica,

histórica” (Bardin, 2011, p. 44). A fim de ilustrar tal fato segue-se o exemplo das

caixas de sapatos:

Imagine-se certo número de caixas, por exemplo, de sapatos [...] atécnica consiste em classificar os diferentes elementos nas diversasgavetas segundo critérios suscetíveis de fazer surgir um sentidocapaz de introduzir alguma ordem na confusão inicial (Bardin, 2011,

p. 43)

Em contrapartida, a autora coloca que “a análise qualitativa seria um

procedimento mais intuitivo” (Bardin, 2011), devido ao fato de que nessa, o

pesquisador busca encontrar, por meio da análise, o contexto de produção da

mensagem  – as ideias promovidas pelo autor - explorando os valores, e crenças

veiculados pelo autor que permeiam o texto, enquanto que na análise quantitativa é

necessário contar a presença das palavras/ ideias, isto é, contar e montar 

categorias.

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 5/13

Desse modo, o que caracteriza a análise quantitativa é o fato de se constituir 

primeiramente, a contagem e organização das categorias e segundo realizar a

inferência, e esta, conforme Bardin (2011) deve ser fundada na presença do índice

(tema, palavra, personagem etc.), e não sobre a frequência da sua aparição em

cada comunicação individual, tendo em vista seu objetivo de deduzir os efeitos da

mensagem no leitor.

2.2 Descrição da aplicação da técnica:

 As fases da análise de conteúdo obedecem aos critérios gerais colocados por 

Bardin (2011), a saber: pré-análise, exploração do material, tratamento dosresultados, inferência e interpretação.

Dessa forma, nesse estudo, durante a pré-análise realizou-se a leitura

flutuante, a qual consiste em “estabelecer o primeiro contato com o texto” (BARDIN,

2011, p. 126). O primeiro passo realizado foi o procedimento indicado a fim de

organizar os elementos, visualizar as ideias e conceitos da mensagem. Na

sequência, escolheu-se o documento, elaboraram-se os objetivos e hipóteses. Ao

longo dos textos analisados existem testes e resultados oferecidos ao leitor com oobjetivo de verificação e atualização, entretanto, os mesmos não foram analisados

neste ensaio, uma vez que foram priorizados os textos escritos pelos autores

conforme publicados no jornal.

Num segundo momento, o material foi organizado por amostragem de forma a

constituir um corpus o qual obedece aos critérios de exaustividade;

representatividade; adequação e homogeneidade, conforme Richardson (2008).

Nesse sentido, para este estudo, consideramos a exaustividade comocompreendendo o livro em questão, pois ele está organizado a partir de reportagens

publicadas durante determinado período no jornal Zero Hora1. Já no critério de

representatividade o livro obedece à regra da homogeneidade, ou seja, as

reportagens foram produzidas tendo por base o mesmo tema, a saber, emprego e

oportunidades. Quanto ao critério de adequação, considera-se que o livro

corresponde aos objetivos do presente ensaio.

1  O jornal Zero Hora circula nos Estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Fundado em

maio de 1964. 

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 6/13

Na análise quantitativa, por exemplo, após a leitura flutuante estabeleceram-

se operações de codificação, ordenação dos elementos e categorias a serem

utilizados no estudo. Nesse sentido, a elaboração e codificação dos resultados

respondem aos critérios de objetividade, sistematização e generalização conforme

Richardson (2008). De acordo com o autor, esses critérios tangem respectivamente,

a não ambiguidade do código estabelecido; a possibilidade que os resultados sejam

sistematizados e generalizados ao conjunto do documento.

O procedimento quantitativo baseia-se nos conceitos defendidos por Bardin

(2011) e compreende a freqüência com que as palavras aparecem no texto. Assim,

as unidades de registro consideradas são às palavras; e unidade de contexto diz

respeito à frase. O critério de categorização utilizado corresponde ao semântico, por exemplo, os elementos que refletem comprometimento serão agrupados nesta

categoria temática e assim por diante.

Depois de elaboradas as categorias por meio de operações estatísticas,

realiza-se a síntese e seleção dos resultados em forma de tabela, bem como a

inferência, a qual de acordo com Richardson (2008 apud  LASWELL, et al., 1952)

implica em responder às questões: “quem diz o que, a quem, como e com que

efeito?” deduzindo, assim, logicamente o efeito visado pela mensagem.Na busca pelos elementos presentes no mercado de trabalho da conjuntura

brasileira, utilizaram-se como base para análise as características elencadas por 

BOLTANSKI E CHIAPELLO (2009):

 Autonomia; espontaneidade; mobilidade; capacidade rizomática;polivalência; comunicabilidade; abertura para os outros e para asnovidades; disponibilidade; criatividade; intuição visionária;sensibilidade para as diferenças; capacidade de dar atenção àvivência alheia; aceitação de múltiplas experiências; atração pelo

informal; busca de contatos interpessoais (BOLTANSKI eCHIAPELLO, 2009, p. 130).

 Além disso, realizou-se a análise de conteúdo qualitativa visando descobrir 

valores e atitudes dos autores. Dessa forma a análise de conteúdo qualitativa,

obedece aos critérios estabelecidos por Bardin (2011) tendo como unidade de

análise os elementos não gramaticais, ou seja, analisam-se dois capítulos do livro

para determinar os valores e atitudes que são estimadas e incentivadas ao público-

alvo interessado. Como unidade de contexto compreende-se o parágrafo e oscritérios de categorização são critérios de intensidade (tempo do verbo: futuro,

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 7/13

condicional, imperativo); a semântica do verbo: advérbios de modo e adjetivos

qualificativos; e critérios de qualidade: a. bom +; b. ruim -.

2.3 Exposição dos resultados e discussão

Como forma de operacionalizar o objetivo em questão, partindo das

categorias propostas por Boltanski (2009), foram organizadas categorias que

abarcassem e estivessem em consonância com os elementos em voga atualmente

no mercado de trabalho. Desse modo, sistematizaram-se esses elementos em

categorias por meio da contagem de freqüência em que os mesmos surgem ao

longo do texto:

Categorias Frequência

a. equilíbrio emocional 36

b. criatividade 7

c. flexibilidade e adaptabilidade 25

d. iniciativa/autonomia/ autodesenvolvimento 50

e. habilidade de relacionamento interpessoal 23

f. postura empreendedora 30

g. comprometimento 21

h. qualificação profissional não é suficiente 6

Para agrupar os elementos em determinadas categorias utilizamos os

seguintes critérios:

a) Equilíbrio emocional: compreende a conciliação entre coração

(sentimentos) e razão, ou seja, há relação direta entre a estabilidade nas relações

familiares e harmonia no ambiente de trabalho; cuidar da mente e do corpo, através

da alimentação, do exercício físico e se preciso terapia; ter outros valores como a fé.

b) Criatividade: pessoa que busca soluções criativas para os problemas que

surgem;

c) Flexibilidade e adaptabilidade: capacidade de aprender e desaprender o

tempo todo se adaptando as circunstâncias da melhor forma possível;

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 8/13

d) Iniciativa/autonomia/autodesenvolvimento: capacidade de resolver 

problemas e tomar iniciativas; capacidade de responder as exigências técnicas e

tecnológicas que surgem; estar atento às mudanças e tendências;

e) Habilidade de relacionamento interpessoal: habilidade de relacionar-se com

vários grupos de pessoas, culturas, e setores da hierarquia profissional;

f) Postura empreendedora: estar atento às tendências do mercado, ter visão

de negócio, trocar informações por meio de seminários, colegas;

g) Comprometimento: gostar do que faz e estar atento aos resultados da

empresa;

h) Qualificação profissional não é suficiente: títulos acadêmicos e histórico na

carreira não são suficientes para manter-se no emprego.

 Assim, a partir da análise dos textos e através da contagem de frequência dos

elementos que estão em voga no mercado, obteve-se um quadro inicial, daquilo que

vem sendo descrito como elementos solicitados no mesmo, tendo como carro chefe

a categoria iniciativa/autonomia/autodesenvolvimento, seguido de equilíbrio

emocional, postura empreendedora, flexibilidade e adaptabilidade, habilidade de

relacionamento interpessoal, comprometimento, criatividade, e qualificaçãoprofissional.

 A maioria desses elementos corresponde às características elencadas por 

Boltanski e Chiapello (2009), entretanto no presente ensaio designaram-se critérios

próprios de classificação dos elementos, dispondo o que cada categoria de análise

contemplaria e desse modo, não se utilizou a mesma descrição daquilo que os

elementos de Boltanki e Chiapello (2009) abarcam.

Dessa forma, uma vez que os discursos sobre os elementos solicitados noatual mercado brasileiro não priorizam somente a qualificação profissional, mas sim

questões como iniciativa autonomia e autodesenvolvimento, isto é, há uma

preponderância de elementos subjetivos tendo como efeito no público leitor, a

valorização dos mesmos.

 Assim, deduziu-se que o efeito no público leitor seria o de repensar não só

sua atualização perante a qualificação profissional, mas incentivar o envolvimento

subjetivo, psíquico e social no processo de trabalho, ou seja, “o indivíduo é instado a

apelar para técnicas próprias de sobrevivência, seja material ou psíquica”

(BENDASSOLI, 2000, p. 211). Nesse sentido, conforme o autor, seja para arrumar 

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 9/13

um emprego ou até mesmo um relacionamento afetivo, um novo discurso

empresarial incita agora a todos a se pautarem pela própria ação individual.

Refletindo acerca de tal fato e considerando que o mercado mudou de

fisionomia, alterando as regras do jogo de maneira muito dinâmica, é possível

considerar que, não só os níveis de escolarização subiram como também “o

refinamento dos currículos e das experiências se tornaram mais complexas”.

(BENDASSOLI, 2000, p. 205).

Tendo em vista tais mudanças no mercado, a partir da análise qualitativa dos

textos é possível perceber uma argumentação no sentido de fomentar o

autoconhecimento, um cuidado de si, ser mais altivo, a adaptabilidade às mudanças

constantes, dentre outros aspectos, isto é, um discurso em que o indivíduo “não visaa nada senão a si mesmo, não tem outra meta senão seu próprio desenvolvimento

pessoal” (BENDASSOLI, 2000 p. 215), o qual aparece estritamente relacionado ao

desenvolvimento profissional, como se o esforço por desenvolvimento pessoal

refletisse em igual medida no trabalho do indivíduo.

Verifica-se também ao longo dos textos um receituário o qual sugere tanto

exercícios físicos, como também alimentação balanceada e terapia. Dentre outros

aspectos, os valores por detrás das reportagens organizadas no livro (Oliveira, 2003)dizem respeito a um saber ser, que deveriam auxiliar na inter-relação, na adaptação

do trabalhador, no saber se relacionar com os demais e na necessidade de ser bem

humorado. Em geral, pode-se dizer que os textos objetivam tratar da importância do

equilíbrio entre mente e corpo.

Nesse sentido, as exigências estão voltadas mais no nível de atitude das

pessoas, uma vez que “os profissionais são contratados pelo seu conhecimento e

habilidades e demitidos por questões relacionadas a comportamento” (OLIVEIRA,2003, p. 23). Ademais se coloca ainda a questão da autoconfiança a qual pode ser 

adquirida pela constante autoavaliação que permite o aprendizado dos próprios

limites. Nesse sentido o texto veicula que o “autoconhecimento é a capacidade de

avaliar de maneira coerente com a realidade as próprias virtudes e dificuldades,

evitando distorções em relação a si mesmos e aos outros ” (OLIVEIRA, 2003, p.35).

 A questão da realização pessoal aparece no texto, sempre atrelada à realização

profissional e, desse modo, percebeu-se que a respeito da realização pessoal,

considerada única e exclusivamente, esta aparece somente uma vez no texto.

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 10/13

Verifica-se ainda que o indivíduo é posto como um indivíduo autocontrolado

(controle interiorizado), pois de acordo com o texto argumenta-se que quando o

individuo não se autoconhece está à mercê de emoções e impulsos o que dificulta,

dentre outros aspectos, por exemplo, o trabalho em equipe. Tal indivíduo é remetido

também à ideia de empreendedor de sim mesmo, no sentido que Bendassoli (2000,

p. 217) destaca: “é dentro dessa nova realidade que o indivíduo é convocado a

tomar seu lugar e a fazer de si mesmo seu melhor patrimônio”.

Prevalece, ainda, a questão de relações de trabalho não verticais, onde a

importância então é colocada na rede de contatos, na horizontalidade nas relações,

cooperação, na forma de sociabilidade, dentre outros aspectos. Conforme

Bendassoli (2000 apud EHRENBERG, 1998) a percepção de uma modificação nasregras de sociabilidade é possível de ser notada em quaisquer domínios, tais como

na empresa, na escola ou na família. Tais regras,

não mais se articulam em torno de noções como obediência,disciplina ou conformidade à moral; pelo contrário, as noções agoraem uso são flexibilidade, mudança, rapidez de reação, motivação,comunicação, entre tantas outras do gênero. Domínio de si, agilidadepsíquica e afetiva, capacidade de ação, impõem a todos “a tarefa deadaptação permanente a um mundo que perde precisamente suapermanência, um mundo instável, provisório, feito de fluxos e de

trajetórias irregulares. Bendassoli (2000 apud EHRENBERG, 1998)

Nesse sentido, enfatiza-se ainda ao longo dos textos a importância do

equilíbrio nas relações familiares, por exemplo, “o ser humano é como uma hélice de

duas pás: de um lado o trabalho, e do outro, a família. Quando uma das pás está

quebrada, o avião não decola” (OLIVEIRA, 2003 p. 55). Desse modo, evidencia-se

que os valores e crenças dos autores dos textos analisados estão afinados com a

transformação do mercado de trabalho, guiando o público alvo a reorganizar-se

frente a essas transformações e não questionando as novas questões suscitadas,mas partindo delas de forma a legitimá-las.

Partindo dessa perspectiva, pode-se dizer que se presencia hoje uma fase

incerta em “que se misturam uma antiga sociedade de trabalhadores e uma

sociedade de indivíduos impulsionados à tomada do controle de sua própria vida

com os recursos que têm”. (BENDASSOLI, 2000, p. 225). Corroborando essas

questões e a fim de ilustrar tal fato, Oliveira (2003, p. 10) aponta que “a empresa tem

plano estratégico. Plano de carreira quem tem é o profissional. Portanto, o únicoresponsável pelo seu desenvolvimento pessoal e profissional é você mesmo”

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 11/13

deixando claro o controle e equilíbrio entre esfera pessoal e profissional que o

indivíduo deve ter em mente para se manter no mercado de trabalho.

3 .Conclusão

Definida a unidade de análise e o argumento de pesquisa, é preciso se

pensar a técnica que melhor operacionaliza esta verificação. Ao pesquisar 

documentos, o pesquisador se depara com o excesso de documentação e

informações disponíveis sobre o assunto abordado. Desse modo, ao coletar as

fontes a serem utilizadas, é importante testar a validade e fidedignidade dessas

informações para que estas não sejam inexatas ou errôneas (LAKATOS, 2010).Como toda metodologia, a metodologia análise de conteúdo tem seus prós e

contras. Nesse sentido, os aspectos positivos dizem respeito ao que o pesquisador 

por meio dela pode acessar nos documentos e modos de pensar de um determinado

tempo-espaço e relacioná-los com outro contexto, problematizando-os. Entretanto a

referida metodologia de pesquisa necessita de tempo para ser realizada, e antes

disso, treino.

É preciso também dar atenção à teoria a ser utilizada na pesquisa, a fim de seter maior familiaridade com o tema para a elaboração das categorias que irão

operacionalizar a pesquisa. Para isso, é possível começar aplicando os referenciais

metodológicos em textos diversos a fim de que o pesquisador exercite e adquira

prática no procedimento, conhecendo também seu próprio tempo necessário para

cada análise.

Não obstante, o método análise de conteúdo quantitativa oferece ao

pesquisador subsídios para sistematizar, organizar e deduzir aquilo que amensagem tem como objetivo, ou seja, aquilo que ela visa causar. Outro ponto

interessante que pode ser analisado é o efeito da mensagem no leitor, uma vez que,

o método de análise de conteúdo qualitativo propicia ao pesquisador investigar os

valores, e crenças do autor do referido texto.

Desse modo, considera-se relevante ao analisar um documento, adotando a

perspectiva de análise de conteúdo, considerar ambas as análises, a saber,

quantitativa e qualitativa a fim de cercar o documento e fornecer tanto à pesquisa,

como posteriormente ao leitor, mais elementos que auxiliem a compreender, explicar 

e problematizar a realidade.

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 12/13

Neste estudo, a aplicação de tal técnica possibilitou o conhecimento prévio do

objeto analisado, bem como uma maior aproximação das teorias utilizadas para este

estudo. A partir disso, foi possível complementar algumas informações e resultados

obtidos durante a análise que será corroborada futuramente a partir da aplicação de

outras técnicas e quem sabe, do processo de triangulação - “combinação de

métodos de investigação (não similares) na medição de uma mesma unidade de

análise”. (CEA D`ANCONA, 1998, p. 52)

 Além disso, outro aspecto relevante, além das leituras atentas ao texto objeto,

é o fato de explicitar no trabalho como se chegou a tal conclusão e que

procedimentos foram adotados. Ainda assim, deve-se realizar uma análise crítica do

texto, tentando pensar como o mesmo foi construído.Por fim, pode-se mencionar que hoje o pesquisador tem a sua disposição,

determinados softwares2 especialmente desenvolvidos como os programas de

computador destinados à análise quantitativa e qualitativa. Dessa maneira, ao

utilizar esses programas o pesquisador tem um ganho de tempo significativo, porém

é preciso praticar, a fim de conhecer o programa.

2Programa ou grupo de programas que instrui o hardware sobre a maneira como ele deve executar uma

tarefa, inclusive sistemas operacionais, processadores de texto e programas de aplicação.

7/27/2019 Bardin

http://slidepdf.com/reader/full/bardin 13/13

Referências:

BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.

BENDASSOLLI, Pedro Fernando. Público, privado e o indivíduo no novo

capitalismo. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo,12(2): 203-236, novembro

de 2000.

BOLTANSKI, Luc; CHIAPELLO, ÈVE. O Novo Espírito do Capitalismo. São Paulo:

Editora WMF Martins Fontes, 2009. P. 117-132.

CEA D’ANCONA, M.ª Ángeles. El análises de la realidade social: aproximaciones

metodológicas. In: Metodología cuantitativa: estratégias y técnicas de investigación

social. Madrid: Editorial Síntesis, S.A. 1998. P. 43-77.

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de A. Projeto e relatório de pesquisa. In:

Fundamentos de metodologia científica. São Paulo: Atlas, 2010.

OLIVEIRA, Deise de (Org.). Valorize sua carreira: como ter uma trajetória

profissional de sucesso. Porto Alegre: RBS Publicações, 2003. P. 9-55.

PIRES, ÁLVARO P. Sobre algumas questões epistemológicas de uma

metodologia geral para as ciências sociais. In: A pesquisa qualitativa: enfoques

epistemológicos e metodológicos. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010. P. 43-94.

RICHARDSON, Roberto J. Análise de Conteúdo. In: Pesquisa Social: Métodos e

Técnicas. São Paulo: Atlas, 2008. P. 220-244.