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(*) Extracto da resposta "o Inquérito Etnográfico organizado pelo Governo da Colónia em 1946. Publica-se agora, dado o pouco conhecimento que geralmente há desta região, a princípio escassamente povoada por nalús e nos últimos tempos teatro de invasão de outros povos, que a vieram valorizar. Como na Carta da Colónia de 1933 (Comissão de Cartografia do Ministério das Colónias) esta zona aparece em branco, junta- se um esboço feito por A. Teixeira da Mota (rios e estradas), com a distribuição das povoações baseada em elementos fornecidos por J. P. Garcia de Carvalho.-NOTA DA REDACÇÃO. A área do Posto Administrativo de Bedanda, criado recentemente, compreende 2 territórios e 1 regulado: Cantanhez e Cabedú outrora pertencentes ao Posto Administativo de Catió, e Guilege, desanexado da área da antiga Circunscrição Civil de Buba. Os seus limites são: ao Norte o rio Cumbijã; ao Sul o rio Cacine e o Oceano Atlântico; a Oeste o Rio Cumbijã; e a Este a Guiné Francesa e o Rio Cacine. O terreno da região é de natureza argilosa, em parte, sendo, no entanto, a maior extensão, constituída por terrenos pantanosos, aqueles cobertos de uma vegetação exuberante, principalmente no território de Cantanhez onde existe a célebre mata do mesmo nome, habitada por elefantes, e estes próprios para a cultura do arroz.

Bedanda

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(*) Extracto da resposta "o Inquérito Etnográfico organizado pelo

Governo da Colónia em 1946. Publica-se agora, dado o pouco conhecimento

que geralmente há desta região, a princípio escassamente povoada

por nalús e nos últimos tempos teatro de invasão de outros povos, que a

vieram valorizar. Como na Carta da Colónia de 1933 (Comissão de

Cartografia do Ministério das Colónias) esta zona aparece em branco, junta-

se um esboço feito por A. Teixeira da Mota (rios e estradas), com a

distribuição das povoações baseada em elementos fornecidos por J. P.

Garcia de Carvalho.-NOTA DA REDACÇÃO.

A área do Posto Administrativo de Bedanda, criado

recentemente, compreende 2 territórios

e 1 regulado: Cantanhez e Cabedú outrora pertencentes ao

Posto Administativo de Catió, e Guilege, desanexado da área da

antiga Circunscrição Civil de Buba. Os seus limites são: ao

Norte o rio Cumbijã; ao Sul o rio Cacine e o Oceano Atlântico; a

Oeste o Rio Cumbijã; e a Este a Guiné Francesa e o Rio Cacine.

O terreno da região é de natureza argilosa, em parte, sendo,

no entanto, a maior extensão, constituída por terrenos

pantanosos, aqueles cobertos de uma vegetação exuberante,

principalmente no território de Cantanhez onde existe a célebre

mata do mesmo nome, habitada por elefantes, e estes próprios

para a cultura do arroz.

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Os principais rios que banham a área são o rio Cumbijã, o

rio Cacine e o rio Cabochanque, não contando com os

numerosíssimos braços que neles têm a sua origem e que

irrigam abundantemente toda esta fértil região.

Terra habitada, ainda há tempos, exclusivamente pela tribo

Nalú, encontra-se hoje povoada por indígenas das tribos

balanta, futa-fula, sôssa, nalú e uma minoria de papéis,

manjacos e bijagós, sendo no entanto a tribo balanta a mais

numerosa.

Estas diferentes tribos, ocupando uma área de mil e cem

quilómetros quadrados e em número de 10.000 indivíduos,

aproximadamente, acham-se divididas em 63 povoações, a

saber:

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Como se vê, a tribo mais populosa da área do Posto

Administrativo de Bedanda é a Balanta seguindo-se-lhe

imediatamente a Futa-fula e só depois a Nalú e Sôssa, não

contando com a Manjaca, Papel e Bijagó por serem uma minoria

insignificante e quase não figurarem na vida económica da

região.

TRIBO BALANTA - Esta tribo há aproximadamente 25 anos

que se começou a fixar nesta área. É proveniente da região de

Mansoa, de onde veio primeiramente para o Cubisseque e

depois para o Tombali, vulgarmente conhecido por «Chão de

Nalús», transformando-o no celeiro da Colónia. A ela se deve o

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enorme incremento que tem tido nos últimos anos a

Circunscrição Civil de Catió, pois além de ser a tribo cultivadora

de arroz - base da alimentação da maioria dos indígenas - é a

que mais se presta para todo e qualquer trabalho que se

pretenda realizar .

O motivo que levou esta tribo a emigrar para esta área foi a

procura de novos e mais férteis terrenos para as sua lavouras.

TRIBO FUTA-FULA - No tempo em que a região do Tombali e

Cacine era habitada apenas pela tribo Nalú, que estava

instalada unicamente nas ilhas de Melo e Olmo, provavelmente

no «reinado» de Alfa Bacar Guidali, um grupo de caçadores, nas

suas correrias, deparou com esta região. Mais tarde, pelas

notícias dadas pelos mesmos, um grupo de fulas cativos,

oriundos de Boé Francês e chefiados por Turá-Iá, atraídos pela

fertilidade do terreno, imigraram para o território a que puseram

o nome de Guilege, fundando a povoação do mesmo nome e

pouco depois a de Salancaur de Fulas. No entanto, deram a toda

esta região O nome de «Chão de Nalús» por serem estes o único

povo nela encontrado.

Com escrita própria, credo religioso estabelecido e

costumes mais civilizados, o fula, nascido com a única ambição

do mando, em breve se tornou senhor de toda a região. O

nalú não se atrevia a sair das suas ilhas, pois seria

imediatamente feito escravo e remetido para o Forreá, como

raça inferior. Daí a mestiçagem de costumes fula-nalú que

actualmente se constata em algumas povoações,

nomeadamente Cadique e Cabedú.

Às primeiras invasões de Fulas-pretos sucedeu-se a

avalanche migratória dos Futa-fulas do Boé Francês que,

infiltrando-se em todo o leste da Colónia, em grande número se

estabeleceram em Guilege. À excepção da povoação de Quebo,

recentemente fundada – 1917 - e exclusivamente habitada por

fulas pretos franceses, do Boké, os invasores de Guilege

dominaram completamente a região impondo aos vencidos as

doutrinas da religião de Maomet, ensinando e desenvolvendo

entre eles a agricultura, sistema de alimentação e doando-lhes

também a sua escrita. Estes eram a principio escravos

capturados nas razias em que todo o fula era useiro e vezeiro.

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Aquando da terrível discórdia entre Fulas forros e Fulas

pretos - 1891 - novas hordas de Fulas do Futa, por motivos

políticos, abandonaram seu lares, vindo estabelecer-se neste

território um pouco mais ao leste de Guilege, no local

denominado Cantanhez. Eram seus chefes Souleimane Djaló,

Bacar Dumbuia, Bela Colubali e Mutaro Calissa; edificaram a

povoação de Jambarém, próximo da de Camecote

quase à mesma altura fundada por indígenas Sossos do Boké

que nessa ocasião também começavam a invadir o território,

virgem e fértil. Deram-se bem as duas tribos. O território de

Cantanhez tinha como chefe dos Fulas Souleimane Djálo, e o

mestiço francês Lourenço Lavy chefiava os Sôssos. Ao tempo,

esta região já era completamente independente do regulado de

Guilegc. Fundou-se depois a povoação fula de Madina.

Lourenço Davy pretendeu assenhorear-se de todo o «Chão

de Nalús» até à povoação de Cantomane, o que os Fulas não lhe

permitiram.

Findas as guerras, o Nalú, vendo o território assim invadido,

resolveu-se a sair das suas ilhas, instigado por antigos parentes

que, tendo sido escravos dos fulas de Forreá, com eles

aprenderam a religião muçulmana e todos os demais predicados

que o indígena arabizado possuía de ascendente sobre os

outros. Chefiados por Cubé, que fora escravo e depois «batulai»

do régulo de Forreá, Cherno Cali, passaram ao continente - 1896

- estabelecendo-se primeiramente em Cabedú e fundando suces-

sivamente as povoações de Calaque, Caiai, Cauntchinque, e,

recentemente, Cadique (1926). Constitui-se assim o território de

Cabedú de que era chefe o Cubé, com sede em Cabedú.

Por morte de Turá-Iá (1918) foi nomeado régulo de Guilege

Alfá Mamadú Seilú, um dos lugares tenentes do guerreiro Abdul

Injai nas guerras de pacificação da Colónia. Findas estas, Alfá

Mamadú Seilú, grande príncipe do Futa-Jálom, recusou a

compensação monetária que o Governo lhe oferecia, preferindo

o regulado de Guilege para onde seguiu com todos os seus

vassalos (1919); inteligente e instruído, em três anos de reinado

desenvolveu largamente a região, fundando as povoações de

Mejo, Bomane, Um-Siré, Tandá, Banco-Bunge, Banhege, etc ..

Tornou-se senhor absoluto de toda a actual área deste Posto

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com a submissão, voluntária, à sua autoridade, do chefe de

Cantanhez, Souleimane Djálo.

Mandava em Quebo e no território de Cabedú. Fiel partidário do

seu chefe Abdul, morreu em Mansoa, nos preparativos da

revolta de Abdul contra os Portugueses (1921). Neste tempo,

começaram a povoar os territórios de Cantanhez e Cabedú, em

grande índice, indígenas Balantas, apa recendo depois

pequenos núcleos de Manjacos, Papéis e Bijagós, os primeiros

atraídos pela grande extensão de terrenos férteis e

propícios à lavoura do arroz e os outros pela abundância de

palmares.

Ao grande régulo de Guilege, Alfá Mamadú Seilú, sucedeu

seu filho Amadú Uri que 3 anos depois era deposto e desterrado

para Porto de Goli onde veio a falecer.

Mamadú Seilú, irmão e sucessor de Amadú Uri, morreu

depois de 5 anos de «reinança». O presuntivo herdeiro, Mamadú

Saliu, filho de Alfá Mamadú Seilú, era criança e ficou o regulado

por ocupar, escolhendo cada povoação o seu chefe.

Aí por volta do ano de 1935 começaram a formar-se dois

partidos: um a favor do legitimo herdeiro e o outro apoiando

Adjibo, padrasto daquele e chefe da povoação de Bomane.

Adjibo, mais experimentado, derrotou o partido contrário e

conseguiu ser nomeado régulo (1937). Porém, em menos de um

ano, o régulo que era visto pelos indígenas como um usurpador

e por isso os trazia num estado latente de insubordinação, foi

deposto por se insurgir contra a autoridade administrativa

(Chefe de Posto de Cacine - João Carlos Pereira Jordão).

Ficou o território sem régulo, quase num caos, até 1941, em

que foi nomeado Mamadú Saliu, legítimo herdeiro, que transferiu

a Sede do regulado para a povoação de Salancaur,

Nos últimos tempos a preponderância Fula nos hábitos

Nalús decresceu, impondo os Sossos, já numerosos, os seus

princípios mais facilmente adaptados pelos Nalús, devido à

afinidade de costumes das duas tribos.

TRIBO NALÚ - Em tempos remotíssimos, muitas dezenas de

anos antes das caravelas de Nuno Tristão aproarem à então

Guiné Portuguesa, no local denominado «Canchafari», hoje

pertencente à Guiné Francesa, a tribo Nalú, que se encontrava

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fixada para além do Futa-Jalom, no território por eles chamado

do «Mandi», juntamente com as tribos Bagá e Sôssa,

devido à forte pressão que a tribo Tilibó, chefiada por Samodoi,

que declarara querer conquistar todo o território até chegar à

«água salgada», sobre eles estava exercendo, chefiada por

Manga Tauliá, imigrou para o território que hoje constitui a

Guiné Portuguesa, parando primeiro na região de Bafatá em que

fundou a povoação de Begine. Mais tarde, depois de se terem

reunido os retardatários da tribo, o chefe Manga Tauliá

convocou os «grandes» a fim de decidirem em conjunto

a direcção que deviam tomar; assente esta, abandonaram

Begine c espalharam-se por toda a região compreendida entre

os rios Tombali e o de Boké, conforme as 5 sub-divisões

existentes dentro da tribo. Uma parte fixou-se desde o rio

Tombali até ao Cumbijã; outra entre este e o Cacine; outra no

actual regulado de Quitáfine; outra na restante área do Posto de

Cacine e a última entre o rio Cacine e o de Boké. Estas 5 sub-

divisões eram devidas apenas à ligeira diferenciação das

línguas embora todos se entendessem entre si e estivessem

sujeitas à autoridade do mesmo chefe.

O primeiro grupo sofreu a influência da tribo Beafada já

estabelecida na região do Cubisseque, Fulacunda e Buba. Os

Beafadas quiseram submetê-Ios tendo feito várias arremetidas

e obrigando-os a refugiar-se na Ilha de Como de onde só sairam

após a submissão deste território à soberania portuguesa.

O segundo grupo, estabelecido entre os rios Cumbijã e

Cacine, ocupava toda a actual área do Posto Administrativo de

Bedanda e era chefiada por Saiandi que sucedera a Manga lura,

descendente de Manga Tauliá na época da ocupação.

Muitos anos após a descoberta da Guiné, aproaram os

franceses à hoje Guiné Francesa- região do Boké - onde então

chefiava os Naiús Almam Diná, irmão de Saiandi, e que os

recebeu bem. Vendo isto o Saiandi dirigiu-se a Bolama pedindo

ao Governo da Colónia que mandasse ocupar a região, tendo

então sido fundada a Administração da Circunscrição Civil de

Cacine, hoje extinta.

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Nesse tempo havia apenas Nalús em toda a área do

Tombali e estavam divididos em 4 regulados: Tombali, Cubetai,

Quitáfine e Cacine; Tombali chefiado por Bassurú, Cubetai por

Sichope, Quitáfine por Samane e Cacine por Saiandi.

Mas deixo as restantes áreas para me ocupar apenas da

área deste Posto, a antiga Cubetai dos Nalús.

Por volta de 1889 começaram a invadir esta região os

indígenas da tribo Fula. Os Nalús, menos aguerridos, recuaram a

pouco e pouco sendo finalmente compelidos a refugiarem-se

nas Ilhas de Como e Melo.

Desta invasão resultou a conversão ao islamismo dos Nalús

aprisionados, que, por sua vez, depois de regressarem à sua

terra vieram a converter outros.

Depois da paz reinar na região por intervenção dos

Portugueses, os Nalús, chefiados por Cubé, ex-escravo e

«batulai» do régulo de Forreá, Cherno Cali, passaram ao

continente, estabelecendo-se novamente nas povoações que

haviam abandonado c fundando outras.

A área do Posto ficou então dividida em 3 regulados:

Guilege, Catonco e Cabedú.

Guilege, chefiada por Alfá Mamadú Seilú; Catonco, chefiada

por Sumacri Camará; Cabedú, chefiada por Cubé.

Poucos anos depois, devido à decrepitude do régulo de

Catonco, Sumacri Camará, e ao facto do filho ser ainda uma

criança e não ter nenhum irmão, este entregou o regulado a um

sobrinho, de nome Massimare Basse, o que provocou o

descontentamento dos Nalús porque este, embora fosse

sobrinho do régulo, era filho de um Sosso.

Levado o facto ao conhecimento da autoridade

administrativa, Massimare Basse deixou o regulado sendo este,

até ao herdeiro Aliu Camará atingir a maioridade, anexado ao de

Cabedú.

Um ou dois anos depois, o régulo de Cabedú, Cubé, devido a

uma multa avultada que lhe foi imposta pelo então

Administrador Ramalho, fugiu para o Forreá sendo colocado em

Cabedú, como encarregado do regulado, Bacar Turé, que ainda

hoje ocupa esse posto .

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Dois anos depois, tendo sido nomeado Administrador,

Joaquim Monteiro Sérgio e devido a ter encontrado os regulados

de Catonco e Cabedú vagos, para evitar a política desenvolvida

pelos vários pretendentes, dividiu-os em grupos de povoações:

A povoação de Cabedú era e é ainda a mais importante.

A situação mantém-se actualmente tal como a criou o

Administrador Monteiro Sérgio, com as seguintes diferenças:

Catonco passou a denominar-se Cantanhez e tem mais

algumas povoações de Balantas, formadas posteriormente. O

grupo de povoações de Canchinque passou a denominar-se

Cadique e a ser chefiado pelo herdeiro do regulado de Catonco-

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Cantanhez, que atingiu a maioridade e tem mais algumas

povoações de Balantas e Nalús recém-fundadas.

Cabedú: mantém o mesmo nome; o grupo de povoações de

Cabankanbol passou a denominar-se Cafal e compreende mais

algumas povoações recém-fundadas por Papéis, Manjacos e

Balantas; o grupo de povoações de Cassincha desapareceu,

fazendo agora parte do de Cabedú que compreende mais

algumas povoações fundadas por Balantas e Nalús e que ainda

é chefiado por Bacar Turé em virtude de não haver herdeiro.

Esta é a divisão indígena, porque a oficial continua a ser em

1 regulado e 2 territórios, dos quais só Guilege tem um único

chefe.

SOSSOS - Esta tribo só há 56 anos, aproximadamente,

chegou a esta área, chefiada pelo mestiço Lourenço Davy, mas

em número reduzidissimo, tendo depois da sua morte estado

sempre sob as ordens de chefes Nalús.

É oriunda também de «Mandi» e foi «civilizada» pela tribo Tilibó.

Saída de Mandi, fixou-se na região entre o rio de Boké e Conakri

e só muito depois um pequeno número de Sossos chefiado por

Lourenço Davy passou a esta região, ao princípio com fins

comerciais e depois com intuitos de domínio, no que foram

contrariados pelos Fulas.

Só há uns 15 anos é que começou a aumentar o número de

Sossos, com a fundação das povoações de Cachamba de

Sossos e os núcleos Sossos das povoações de Cafal, Cafine,

Calaque e Darsalame.

Joaquim Pereira Garcia de Carvalho Chefe do Posto

Administrativo de Bedanda