Blog-jornalismo: interatividade e construção coletiva da informação

Embed Size (px)

Citation preview

  • 8/8/2019 Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao

    1/8

    Blog-jornalismo: interatividade e construo coletivada informao

    Ktia Fonseca Aguiar

    2006

    ndice

    1 Interatividade e Inteligncia Coletiva:conceitos em aberto 2

    2 Jornalismo Interativo e Coletivo 43 Blog do Noblat: um exemplo de jor-

    nalismo interativo e coletivo 64 Concluso 7

    IntroduoAs ltimas dcadas foram marcadas por umintenso avano tecnolgico, que se reflete emmudanas significativas em todas as esferasda sociedade. Na comunicao, muita coisamuda, principalmente, com o desenvolvi-mento da Internet e dos diversos fenmenoscomunicacionais nascidos a partir dela.

    Nesse contexto, novas formas de jorna-lismo surgem e se desenvolvem. O web-

    jornalismo traz novidades na produo, di-vulgao e consumo de notcias. Os blogs1

    Trabalho apresentado como requisito parcial paraa aprovao na disciplina Pensamento Comunicacio-nal contemporneo, ministrada pelo professor DelfimAfonso Neto. Curso de Especializao em Comuni-cao: Imagens e Culturas Miditicas. UniversidadeFederal de Minas Gerais-UFMG.

    1A expresso blog (cunhada pelo norte-americanoJorn Barger em 1997 e inserida em 2003 no dicio-

    so exemplos dessas novas maneiras de lidarcom a informao no ciberespao. Com umgrande potencial interativo, eles se apresen-tam como a possibilidade de um jornalismocoletivo, construdo a muitas mos, numa co-municao horizontal. O pblico deixa deser encarado como uma massa disforme epassa a se constituir de pessoas, ativas, pron-tas para se expressarem e opinarem.

    Para tentar dar conta da complexidadedesses novos fenmenos de comunicao edas transformaes scio-culturais que seprocessam a partir desse cenrio, idias econceitos surgem, ganham novos contornose passam a pautar as discusses sobre comu-nicao.

    Interatividade e Inteligncia Coletiva so

    nrio Oxford da lngua inglesa) uma abreviao deweblog que, por sua vez, vem da juno de duas pa-lavras em ingls: web (forma simplificada de se refe-

    rir world wide web), que significa rede, e log, quesignifica registro. Assim, weblogs ou blogs so umaespcie de registro na web.

    Duas caractersticas principais os diferenciam deoutros tipos de pginas: o microcontedo e a orga-nizao cronolgica. Alm disso, marcante o usodos recursos de comentrios, que so espaos onde oleitor ou visitante tem a oportunidade de comentar ecriticar as mensagens postadas e at mesmo sugerirassuntos para novas mensagens.

  • 8/8/2019 Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao

    2/8

    2 Ktia Fonseca Aguiar

    apenas alguns desses conceitos a partir dosquais os pensadores, tericos, profissionaisde comunicao e a sociedade em geral ten-tam compreender e explicar essa realidadedesterritorializada e virtualizada da comuni-cao mediada por computador (CMC).

    1 Interatividade e IntelignciaColetiva: conceitos em aberto

    No cenrio da comunicao mediada porcomputador, a interatividade aparece comouma das mais festejadas potencialidades. Adefinio para o termo, no entanto, no consensual. Para Lvy, a interatividade muitas vezes invocada a torto e a direito,como se todos soubessem perfeitamente doque se trata (1999, p. 79). Esse uso in-discriminado tanto por parte de tcnicos epesquisadores quanto pelo pblico em geralgera questionamentos e definies variadas.

    De acordo com o dicionrio Houaiss deLngua Portuguesa2, interatividade se refere capacidade de um sistema de comunica-o ou equipamento de possibilitar intera-o, ou ao ato ou faculdade de dilogo in-tercambivel entre o usurio de um sistema ea mquina, mediante um terminal equipadode tela de visualizao. Essas definiestrazem tona dois aspectos comumente rela-cionados ao termo: a troca intersubjetiva de

    informaes e a mediao dessa troca pelamquina.Nesse sentido, Lemos (1997) prope uma

    classificao das diversas formas de intera-o que fazem parte do cotidiano. Ele serefere troca de informaes entre homem-homem definindo-a como interao social e troca entre homem-mquina, denominada

    2Houaiss: http://houaiss.uol.com.br

    de interao tcnica. no rol desse ltimotipo de interao que ele situa a interativi-dade. Assim, para ele, interatividade podeser caracterizada como uma ao dialgicaentre o homem e a tcnica. Essa ao di-algica pode estar inserida em um contextoanalgico-mecnico ou concernida em am-biente eletrnico-digital. Neste caso, almde interagir com a mquina, o homem podetambm interagir com o contedo, com a in-formao e com outro homem.

    J Primo restringe a interatividade inte-rao mediada por computador, definindo-a como uma ao entre os participantesdo encontro. Segundo ele, nesse sentido,o foco volta-se para a relao estabelecidaentre os integrantes e no para as partes quecompem o sistema global (2004,p.38). Oautor prope a existncia de dois tipos deinterao mediada por computador: a in-terao mtua, em que ocorre uma trans-

    formao em ambos os plos da comuni-cao, com constante negociao entre elese a interao reativa, onde h previsibili-dade e automao nas trocas (ibid, p.55). possvel, ainda, segundo ele, se pensar emum processo de multiinterao, que ocorrequando, numa mesma situao comunicaci-onal, o usurio se depara com interaes m-tuas (conversas com outra pessoa num chat,por exemplo) e reativas (relacionamento coma interface do software, mouse, teclado etc).Nesse sentido, em muitos casos, podem-se estabelecer, simultaneamente, interaestanto reativas quanto mtuas (ibid, p.56).

    Partindo da idia de que a interatividadese refere participao ativa do benefici-rio de uma transao de informaes, Lvyanalisa o termo a partir de uma outra pers-pectiva, mais centrada na mdia, mas sem sedeter exclusivamente na comunicao medi-

    www.bocc.ubi.pt

  • 8/8/2019 Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao

    3/8

    Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao 3

    ada por computador. Para ele, qualquer re-ceptor a menos que esteja morto, nunca passivo (1999, p. 79), uma vez que ele de-codifica a mensagem que lhe apresentada ese posiciona em relao a ela. Desta forma,para ele, qualquer situao comunicacionalimplica em interao, em participao do re-ceptor.

    Ainda assim, reforando o fato de que de-finir e estudar a interatividade no pode sertarefa to simples, Lvy defende que pos-

    svel definir o tipo de interatividade a partirda relao entre receptor e mensagem, clas-sificando essa relao em: mensagem li-near no-altervel em tempo real; interrup-o e reorientao do fluxo informacionalem tempo real e implicao do participantena mensagem. Ele prope ainda uma classi-ficao dos dispositivos de comunicao em:difuso unilateral; dilogo, reciprocidadee dilogos entre vrios participantes (ibid,

    p.83).Ele apresenta tambm cinco eixos a par-tir dos quais possvel se analisar as si-tuaes ou dispositivos de comunicao ecompreend-los no que concerne a seu graude interatividade maior ou menor:

    as possibilidades de apropriao e depersonalizao da mensagem recebida,seja qual for a natureza dessa mensa-gem,

    a reciprocidade da comunicao (asaber, um dispositivo comunicacionalum-um ou um-todos),

    a virtualidade, que enfatiza aqui o cl-culo da mensagem em tempo real emfuno de um modelo e de dados de en-trada,

    a implicao da imagem dos participan-tes nas mensagens,

    a telepresena (ibid, p.82).

    Ele ilustra sua idia com diversos exem-plos e salienta que uma mesma mdia podeapresentar diferentes graus de interatividade,dependendo do eixo escolhido para se proce-der a anlise.

    A partir da explanao e das discussesdesses autores, que so apenas alguns dos

    que tratam deste tema, possvel perceberque o termo interatividade, assim como assuas implicaes podem ser analisados tendoem vista vrios enfoques, vrias perspecti-vas.

    em funo dessa multiplicidade e das di-ficuldades de se formular um conceito nicoe vlido em qualquer situao que Lvychama a ateno para o fato de que a intera-tividade assinala muito mais um problema, a

    necessidade de um novo trabalho de observa-o, de concepo e de avaliao dos modosde comunicao, do que uma caractersticasimples e unvoca atribuvel a um sistema es-pecfico (1999, p.82).

    Assim, para se fazer um estudo de um bloginformativo a partir do seu potencial intera-tivo necessrio, antes, se fazer um recortenesse conceito amplo. Para esta anlise, es-pecificamente, parece ser vivel a utilizaodo eixo que Lvy chama de reciprocidadeda comunicao. Essa reciprocidade umadas marcas dos blogs, que se mostram comoambientes propcios para a troca de informa-es, para o dilogo e para a construo co-letiva da notcia.

    Essa conjuntura de troca e de colaboraopara a construo da informao uma dasbases para o que Lvy chama de intelign-cia coletiva. Uma inteligncia distribuda

    www.bocc.ubi.pt

  • 8/8/2019 Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao

    4/8

    4 Ktia Fonseca Aguiar

    por toda a parte, incessantemente valorizada,coordenada em tempo real, que resulta emuma mobilizao efetiva das competncias(2003, p.28).

    O conceito de inteligncia coletiva remete idia de um princpio em que as intelign-cias individuais so somadas e compartilha-das por toda a sociedade. Esse compartilha-mento possibilitado pela interconexo dasinteligncias individuais que, por sua vez, potencializada pelo advento das novas tec-

    nologias de comunicao, como a Internet.O ciberespao seria, portanto, no mais queo indispensvel desvio tcnico para atingir ainteligncia coletiva (LVY, 1999, p.130).

    Para chegar proposta de uma intelignciacoletiva, Lvy (2003) parte de um vis evo-lucionista e apresenta quatro diferentes fasespor que a humanidade passou ou vem pas-sando, chamando a ateno para o fato deque o surgimento de um novo perodo no

    exclui os anteriores, mas convive com eles eos complementa.Num primeiro momento, que ele chama

    de espao nmade da terra, a identidade seconstri a partir de totens e linhagens e a co-municao se d atravs de ritos e mitos. Emseguida, no que ele chama de espao do ter-ritrio, surgem a escrita, a geometria e a car-tografia e as identidades passam a se consti-tuir a partir da inscrio territorial. Um ter-ceiro momento, chamado de espao das mer-cadorias marcado pela construo da iden-tidade a partir do lugar na produo e no con-sumo, enquanto que a sociedade se organizaem torno da economia, dos bens materiais eda estatstica.

    Por fim, no chamado espao do saber, aidentidade se baseia em competncias, na co-operao e na hibridizao contnua ao passoque a sociedade converge em torno do ci-

    berespao e da economia do conhecimento.Esse perodo, tambm chamado de noolticoou de noosfera, no existe propriamente, masest em pleno processo de construo e en-contra suas bases na inteligncia coletiva.

    Esta inteligncia se assenta sobre doisconceitos fundamentais: cooperao e com-petio. O aspecto cooperativo se refere aovnculo social proporcionado pela dinmicacriada pelos participantes dos eventos comu-nicativos que tm lugar no ciberespao. Uma

    dinmica orientada pela horizontalidade dasrelaes e pela sinergia das colaboraes in-dividuais. J o aspecto competitivo se refereao constante debate de idias contraditriasou divergentes que surgem nesse ambiente.

    Sob essa tica, possvel se pensar osblogs informativos como ambientes interati-vos de cooperao e competio, em que ainformao jornalstica construda coleti-vamente e permanentemente alterada e am-

    pliada tanto pelo jornalista quanto pelos lei-tores/usurios, atravs dos conflitos que sur-gem ao longo do processo.

    2 Jornalismo Interativo eColetivo

    Por se tratar de ferramentas comunicacio-nais simples, baratas e de fcil utilizao3,

    3A principal atrao dos blogs a facilidade para

    se criar e manter uma pgina. O blogueiro no pre-cisa conhecer e entender linguagens de programao(HTML). Ele tem a sua disposio templates (mode-los) prontos que devem ser seguidos. Esses modelosfacilitam todo o processo de criao e manuteno,que passa a ser, ento, realizada de uma forma intui-tiva e visual, sem a necessidade de complicados c-digos. No Brasil, alguns servidores disponibilizamessas ferramentas, como Blogger, Weblogger, Blig,dentre outros.

    www.bocc.ubi.pt

  • 8/8/2019 Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao

    5/8

    Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao 5

    os blogs vm se multiplicando na rede, as-sim como vm se multiplicando, tambm, asformas de utilizao e os objetivos deste tipode pginas. O que nasceu como um queridodirio virtual ou como uma espcie de guiade navegao4 ganha nova roupagem e co-mea a despontar como uma nova tendncia jornalstica. Alm de divulgar informaese desabafos do autor, alguns blogs assumemum carter informativo e tratam de poltica,economia, esporte, alm, claro, de trazer

    as consideraes, crticas e opinies do au-tor sobre esses assuntos. Debates, divergn-cias de opinies, interpretaes variadas tm,nesse meio, espao garantido.

    Como toda novidade, os blogs esto longede serem unanimidade no meio acadmicoe jornalstico. Por se tratar de um veculoainda novo e em pleno processo de constru-o, eles ainda so encarados com ressalvastanto por jornalistas quanto por pesquisado-

    res da rea de comunicao.A principal polmica surge com o pri-meiro grande furo dado por um blog: a divul-gao do caso entre o ento presidente norte-americano Bill Clinton e a estagiria Mnica

    4As primeiras pginas desse tipo surgiram em me-ados da dcada de 1990 e se apresentaram como umaespcie de guia para os usurios. Atravs de linkspara outras pginas, o editor do blog conduzia o lei-tor no emaranhado de sites que se acumulavam de-sordenadamente na web. Esses links normalmente vi-

    nham acompanhados de um texto explicativo ou cr-tico. Com o desenvolvimento de ferramentas de bus-cas mais eficazes, eles perderam sua funo de orga-nizao dos contedos espalhados pela web. Ganhoumais espao, ento, uma verso que j existia, maspassou a se destacar: a verso eletrnica do queridodirio. Nesse contexto, os blogs se tornam espaopara o registro de confisses e divagaes pessoaisdos seus editores. Esse vis sempre esteve presentenos blogs, mesmo naqueles que se propunham a guiaros internautas na busca de informaes na internet.

    Lewinsky, por Matt Drudge5, em janeiro de1998. Na poca, o blog foi chamado, pejo-rativamente, de panfleto digital e suscitouuma discusso at hoje acirrada acerca da va-lidade de se considerar os blogs como vecu-los jornalsticos (RECUERO, 2003).

    Discusso esta que ganhou novo flegoem 2003, no episdio da invaso do Ira-que pelo exrcito americano. Com informa-es censuradas tanto pelo governo do Ira-que quanto pelo exrcito americano, surge o

    blog de Salam Pax6, um suposto iraquianoque descrevia tudo o que via, ouvia ou pre-senciava durante a invaso a Bagd. O blo-gueiro de Bagd, como ficou conhecido,acabou se transformando em fonte de infor-maes sobre o desenvolvimento da guerra.Durante o conflito, outros blogs surgiram,tanto de jornalistas que faziam a cobertura daguerra, quanto de pessoas comuns narrandosuas experincias (RECUERO, 2003).

    A discusso acerca da validade dos blogscomo veculos jornalsticos se justifica, afi-nal, eles tocam em pontos cruciais e delica-dos do jornalismo, como a objetividade e aneutralidade.

    Silva ressalta que aquilo que veiculadoem um blog no tem a pretenso de ser umainformao neutra. Ao contrrio, existe opressuposto claro de que algum escreve eque a informao corresponde ao relato, opinio deste algum sobre o evento (2003).

    No se trata de dizer que a expresso deopinio seja algo novo na mdia e que textosopinativos no faam parte da imprensa con-vencional. Ao contrrio, as opinies, expl-citas ou no, sempre tiveram espao no jor-

    5Blog de Matt Drudge:http://www.drudgereport.com

    6Blog de Salam Pax:http://www.dearraed.blogspot.com

    www.bocc.ubi.pt

  • 8/8/2019 Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao

    6/8

    6 Ktia Fonseca Aguiar

    nalismo em todas as suas formas. Mas, noambiente digital, mais especificamente nosblogs,

    vemos o fenmeno mais caracterizado,onde se fomentam discusses e deba-tes atravs da anlise e opinio nos tex-tos. Estes debates traduzidos sob formade opinies e discusses so estimula-dos atravs dos sistemas de comentrios,dentro dos quais os leitores podem in-

    teragir com a publicao e com o autor.(SILVA, 2003, p. 8).

    Na blogosfera7, a relao entre o jornalistae o leitor radicalmente diferente daquelaestabelecida entre eles na mdia convencio-nal, j que existe uma troca constante de da-dos, uma produo e compartilhamento desentidos atravs da relao entre os sujeitosenvolvidos e no a transmisso de informa-es pura e simples. Essa troca tambm estpresente em outras mdias atravs das seesde cartas de leitores, por exemplo. Mas, nosblogs essa participao ampliada e a rela-o que se estabelece mais prxima e hori-zontal.

    Partindo do pressuposto de que o jorna-lismo se assenta sobre a publicao peridicade informaes de interesse da coletividadeatravs de meios de comunicao massiva,pode-se dizer que os blogs constituem, de

    fato, uma forma de jornalismo. Em contra-partida, alguns pressupostos do jornalismoesto ausentes dessa prtica, como a trans-misso de informaes, que nos blogs noso meramente fornecidas, mas construdascoletivamente por jornalista/blogueiro e lei-tores/visitantes. A nfase na objetividade e

    7Blogosfera: neologismo que se refere ao mundodos blogs.

    na neutralidade, como j foi comentado ante-riormente, outro aspecto considerado rele-vante no jornalismo e que se rompe no blog.

    O fato que os blogs so uma realidadeque vem mexendo com as estruturas da m-dia convencional. Algumas empresas jorna-lsticas j percebem essa situao e inves-tem nessa nova forma de comunicao. Osprincipais sites noticiosos brasileiros comoO Globo8, O Estado de So Paulo9, ltimoSegundo10 e Folha de So Paulo11, por exem-

    plo, criam blogs para seus colunistas e man-tm uma comunicao paralela com seu p-blico atravs deles, inclusive utilizando cha-madas nas suas pginas principais para tex-tos desses blogs. Enquanto isso, nos EstadosUnidos, o jornal The New York Times12, porexemplo, proibiu seus jornalistas de mante-rem este tipo de pgina pessoal.

    A discusso pertinente e deve se alongarpor muito tempo ainda antes que se chegue a

    um consenso. Mas, a realidade que muitosjornalistas esto virando blogueiros e muitosblogueiros esto desempenhando o papel dejornalistas.

    3 Blog do Noblat: um exemplode jornalismo interativo ecoletivo

    Ricardo Noblat um desses jornalistas

    que viraram blogueiros. Depois de passarpor importantes veculos impressos do pas,como as revistas Veja e Isto, Jornal do Bra-

    8Jornal O Globo: http://oglobo.globo.com9O Estado de So Paulo:

    http://www.estadao.com.br10ltimo Segundo: http://ultimosegundo.ig.com.br11Folha de So Paulo: http://www.folha.uol.com.br12The New York Times: http://www.nytimes.com

    www.bocc.ubi.pt

  • 8/8/2019 Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao

    7/8

    Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao 7

    sil e Correio Brasiliense, ele migrou paraa web. O Blog do Noblat13 est no ar desdemaro de 2004, fazendo a cobertura dos bas-tidores da poltica brasileira.

    A web-estria do jornalista acontece emfuno de uma coluna semanal mantida nojornal O Dia. Como suas notas no se sus-tentavam at o final da semana, surgiu a idiade criar um blog para poder atualizar os tex-tos mais freqentemente. Assim, ele poderiaaproveitar a possibilidade de realizar atuali-

    zaes contnuas em seus textos.Mesmo com o fim da coluna, o blog se

    manteve e passou a servir de referncia nadiscusso de assuntos ligados poltica na-cional. Em tempos de corrida presidencialo acesso pgina aumenta e, conseqente-mente, o nmero de posts e de comentriostambm.

    Entre os dias 30 de abril e 06 de maio fo-ram disponibilizados 281 posts, entre textos

    e imagens, numa mdia de 40 blocos de in-formaes por dia. O nmero de acessos no disponibilizado na pgina, mas os comen-trios giraram em torno dos 1.820 por dia,totalizando 12.759 comentrios ao longo dasemana.

    Dois assuntos ganharam destaque du-rante esse perodo: a greve de fome dopr-candidato presidncia da Repblica,Anthony Garotinho e a crise do gs combus-tvel deflagrada pelo anncio da estatizaoda explorao do petrleo feita pelo governoboliviano.

    Quanto ao primeiro assunto, a greve defome de Anthony Garotinho, tantos os tex-tos do jornalista quanto os comentrios sofortemente marcados pela ironia. J em re-lao ao segundo tema, a crise em torno da

    13Blog do Noblat: http://noblat1.estadao.com.br

    estatizao da explorao de petrleo pelogoverno da Bolvia, o tom dos textos, bemcomo dos comentrios mais srio. Sobreesse assunto, os debates so mais acirradosentre os leitores simpatizantes do Partido dosTrabalhadores e os que rechaam o governofederal.

    A possibilidade oferecida aos leitores paraque eles deixem suas impresses faz comque o espao dos comentrios seja conver-tido em uma espcie de palanque poltico.

    Idias divergentes se encontram e os con-flitos aparecem. Essa troca de informaese esses debates sobre temas polmicos soexemplos claros daquilo que Primo (2004)chama de interao mtua, em que ocorremconstantes negociaes. Essa realidade re-mete, tambm, idia de Lvy de que a in-teratividade se refere participao ativa da-quele que recebe a informao e ao dilogoentre vrios participantes ou, ainda, reci-

    procidade da comunicao.Esse ambiente de troca e compartilha-mento de sentidos pode ser entendido comoaquele que Lvy considera adequado para aconstruo da inteligncia coletiva, que su-pera a mera somatria de saberes individuaise emerge como uma nova forma de lidar como conhecimento e com a informao.

    4 Concluso

    Polmica e mutante, a Internet se mostra umcampo frtil para o surgimento de novas for-mas de comunicao e, conseqentemente,para novas discusses acerca das mesmas.Situaes novas pedem conceitos novos e exatamente isso que vem acontecendo emtorno da grande rede.

    Conceitos como cibercultura, ciberespao,interatividade, inteligncia coletiva, webjor-

    www.bocc.ubi.pt

  • 8/8/2019 Blog-jornalismo: interatividade e construo coletiva da informao

    8/8

    8 Ktia Fonseca Aguiar

    nalismo dentre tantos outros nascem, setransformam, ganham destaque no meio aca-dmico e fora dele. Conceitos estes que nemsempre encontram uma definio clara e pre-cisa. Do mesmo modo, novos veculos de in-formao surgem, como os blogs, por exem-plo, e trazem consigo o embrio de mais emais discusses acadmicas ou no.

    Analisar um dispositivo comunicacionalnovo sob a tica de conceitos igualmente no-vos no tarefa fcil, mas, com certeza,

    algo instigante e desafiador. Essa, contudo, uma rea movedia em que as certezas seperdem facilmente e sempre h coisas novas,olhares novos, problemas novos surgindo.

    Assim, o presente trabalho no tem, nempoderia ter, a inteno de apresentar umaidia conclusiva e definitiva sobre os blogsinformativos como ambientes interativos deconstruo coletiva da inteligncia. Mas, apartir da anlise desses conceitos e do que

    vem sendo postulado por autores que tra-tam desses temas, possvel se tirar algumasconcluses provisrias a esse respeito.

    No difcil perceber que a postura do su-jeito inserido nesse contexto muda sensivel-mente. Ele j no recebe passivamente asinformaes, mas precisa acess-las, busc-las. E, ele tambm no apenas absorve as in-formaes, mas tambm ajuda a constru-las,fornecendo uma resposta ao emissor, agoraconvertido em seu interlocutor.

    Nesse contexto, mudam os papis do jor-nalista e do leitor. A dissoluo dos plosemissor-receptor, o deslocamento do papeldo jornalista que passa de emissor para co-autor e o carter fluido, inconstante e per-manentemente em construo da informaoso algumas das caractersticas das peculia-ridades da informao veiculada na Rede.

    Embora haja um questionamento a res-

    peito da validade desse jornalismo feito emblogs, o fato que a utilizao desse tipode recurso cada vez maior e vem se mos-trando eficaz no para a mera transmisso deinformaes, mas para o estabelecimento dedebates e dilogos e para a promoo de umaparticipao mais efetiva do pblico na cons-truo da informao.

    No se trata, de forma alguma, de di-zer que essa nova forma de jornalismo queemerge com o surgimento dos blogs v subs-

    tituir o jornalismo convencional. No entanto,no se pode simplesmente fechar os olhosa essa realidade. Os blogs esto a, infor-mando, promovendo a construo e o de-bate de idias e de informaes. Em parce-ria com a mdia convencional, eles surgemcomo uma forma de comunicao comple-mentar, que aproxima jornalista e leitores,veculo e pblico.

    www.bocc.ubi.pt