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Boletim 43 / junho 2009 1 COMISSÃO MARANHENSE DE FOLCLORE - CMF SUMÁRIO Editorial ..................................................................................................................................................... 2 O guerrilheiro da cultura popular ................................................................................................................ 3 Joãozinho Ribeiro Nelson Brito: guerrilheiro da cultura popular .............................................................................................. 3 Elisene Casto Matos e Flávia Andresa Oliveira de Menezes Quando os cazumbás saem por aí... .............................................................................................................. 5 Elisabeth Bittencourt Casa de artigos religiosos ............................................................................................................................. 7 Thiago Lima dos Santos Reminiscências: Rua do Sol ......................................................................................................................... 9 Carlos de Lima Mãe d’Água ............................................................................................................................................... 11 Reinaldo Freitas Soares Junior Maio, mês de Maria – Ladainha de N. Senhora ........................................................................................... 12 Zelinda Lima Mineiros e umbandistas católicos ................................................................................................................ 13 Fabrine Pereira de Brito Virou crente: sincretismo e mudança de religião em populações afro-brasileiras ............................................ 14 Mundicarmo Ferretti JANELA DO TEMPO Festa do Divino Espírito Santo na Casa de Rosa Guardamor ....................................................................... 15 Ruben Almeida RESUMOS E RESENHAS: Monografias de Especialização em Jornalismo Cultural ................................. 15 Ester Marques NOTICIAS ................................................................................................................................................ 18 Roza Santos PERFIL POPULAR: Mestre Antonio Vieira .............................................................................................. 20 Nívea Saraiva BOLETIM DA CMF Nº 43 JUNHO 2009 ISSN: 1516-1781 CNPJ 00.140.658/0001-07 DIRETORIA Presidente: Maria Michol P. de Carvalho Vice-presidente: Roza Maria dos Santos Secretária: Nizeth Aranha Medeiros Tesoureira: Lenir Pereira dos S. Oliveira CONSELHO EDITORIAL Carlos Orlando de Lima Lenir Pereira dos S. Oliveira Maria Michol P. de Carvalho Mundicarmo M.R. Ferretti Roza Maria dos Santos Sergio Figueiredo Ferretti Zelinda de Castro Lima EDIÇÃO Mundicarmo M.R. Ferretti Roza Maria dos Santos REVISÃO DE TEXTO: Antonio Regino de Carvalho Neto DIAGRAMAÇÃO: Riba Silva VERSÃO INTERNET: www.cmfolclore.ufma.br Correspondência COMISSÃO MARANHENSE DE FOLCLORE CASA DE NHOZINHO Rua Portugal, 185 – Praia Grande CEP 65010-480 – São Luís-Maranhão Fone: (0xx98) 3218-9952; (0xx98) 3218-9951 As opiniões publicadas em artigos assinados são de inteira responsa- bilidade de seus autores, não comprometendo a CMF

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COMISSÃO MARANHENSE DE FOLCLORE - CMF

SUMÁRIO Editorial ..................................................................................................................................................... 2

O guerrilheiro da cultura popular ................................................................................................................ 3Joãozinho Ribeiro

Nelson Brito: guerrilheiro da cultura popular .............................................................................................. 3Elisene Casto Matos e Flávia Andresa Oliveira de Menezes

Quando os cazumbás saem por aí... .............................................................................................................. 5Elisabeth Bittencourt

Casa de artigos religiosos ............................................................................................................................. 7Thiago Lima dos Santos

Reminiscências: Rua do Sol ......................................................................................................................... 9Carlos de Lima

Mãe d’Água ............................................................................................................................................... 11Reinaldo Freitas Soares Junior

Maio, mês de Maria – Ladainha de N. Senhora........................................................................................... 12Zelinda Lima

Mineiros e umbandistas católicos ................................................................................................................ 13Fabrine Pereira de Brito

Virou crente: sincretismo e mudança de religião em populações afro-brasileiras ............................................ 14Mundicarmo Ferretti

JANELA DO TEMPOFesta do Divino Espírito Santo na Casa de Rosa Guardamor ....................................................................... 15Ruben Almeida

RESUMOS E RESENHAS: Monografias de Especialização em Jornalismo Cultural ................................. 15Ester Marques

NOTICIAS ................................................................................................................................................ 18Roza Santos

PERFIL POPULAR: Mestre Antonio Vieira .............................................................................................. 20Nívea Saraiva

BOLETIM DA CMF Nº 43 JUNHO 2009 ISSN: 1516-1781

CNPJ 00.140.658/0001-07

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CONSELHO EDITORIALCarlos Orlando de LimaLenir Pereira dos S. OliveiraMaria Michol P. de CarvalhoMundicarmo M.R. FerrettiRoza Maria dos SantosSergio Figueiredo FerrettiZelinda de Castro Lima

EDIÇÃOMundicarmo M.R. FerrettiRoza Maria dos SantosREVISÃO DE TEXTO:Antonio Regino de Carvalho NetoDIAGRAMAÇÃO:Riba SilvaVERSÃO INTERNET: www.cmfolclore.ufma.br

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CASA DE NHOZINHORua Portugal, 185 – Praia Grande

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As opiniões publicadas em artigosassinados são de inteira responsa-

bilidade de seus autores, nãocomprometendo a CMF

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Emudeceram os tamboresCalaram o cacuriáA roda de capoeiraNão consegue mais girarFoi-se embora um grande amigoPai de família exemplarNelson Brito guerrilheiroDa cultura popular!

O LABORARTE está de lutoDo fofão o ulaláNão se escuta, só se ouveO seu triste soluçarEnquanto o choro dos céusEscorre na terra a clamar:Nelson Brito guerrilheiroDa cultura popular!

As águas de março em janeiroParecem anunciarUm convite irrecusávelPro guerreiro descansarSerá Terezinha Jansen?Ou Felipe de Sibá?Nelson Brito guerrilheiroDa cultura popular!

Vai, meu velho companheiro,Teu exemplo ficaráComo um grande brasileiroQue fostes e sempre serásA rosa da tua vidaEm nós jamais murcharáNelson Brito guerrilheiroDa cultura popular!

O guerrilheiro dacultura popular1

1 Distribuído no velório de Nelson Brito e divulgado na INTERNETem 13/01/09, por Abmalena Sanches – [email protected] .

O Boletim 43 registra com pesar duas grandes perdaspara a cultura popular do nosso Estado: o falecimentode Nelson Brito, do LABORATE, homenageado pelo

poeta Joãozinho Ribeiro e relembrado por Elizene Matose Flavia Andresa Mendes; e o desaparecimento do mun-do dos vivos do compositor Antonio Vieira, retratado porNivia Saraiva em Perfil Popular.

O numero 43 começa com a ladainha de Nossa Se-nhora, trazida por Zelinda Lima, rezada no mês de maioem várias instituições católicas e em família e repetidaquase o ano todo nos terreiros de religião afro-brasileirada capital. Em Janela do Tempo Ruben Almeida, mem-bro-fundador da CMF, faz também referência a antigosfestejos do Divino Espírito Santo em São Luís que, embo-ra realizados no dia de Pentecostes, são também organi-zados nos terreiros em quase todos os meses do ano. Nessemesmo número; Carlos Lima, em Reminiscências, falasobre a Rua do Sol, uma das mais importantes do centrode São Luís; e Elisabeth Bittencourt reflete sobre o bum-ba-meu-boi do Maranhão, destacando na brincadeira afigura do cazumbá (também conhecido por cazumba).

Continuando a tratar sobre cultura tradicional e reli-gião popular do Maranhão Reinaldo Soares Junior mostraa atualidade da crença em Mãe d´Água na região de Cu-rurupu; e Thiago Santos relata observações realizadas emcasas de comercialização de produtos religiosos, mais co-nhecidas como lojas de umbanda. Dois outros artigos doBoletim 43 giram em torno das relações entre religiõesafro-brasileiras, catolicismo e protestantismo. Fabrine Britoanalisa o pertencimento dos mineiros e umbandistas aocatolicismo e Mundicarmo Ferretti trata sobre experiên-cias de membros de terreiros afro-brasileiros com o protes-tantismo e fala de preconceito de evangélicos para com acultura popular.

Resumos e Resenhas disponibilizam aos nossos leito-res resumos de monografias defendidas em 2008, no Cur-so de Especialização em Jornalismo Cultural da UFMA,coordenado por Ester Marques. E em Notícias Roza San-tos apresenta os novos dirigentes de órgãos de cultura doestado e do município e informa sobre os principais even-tos da área ocorridos no 1º semestre de 2009 incluindo:congressos, simpósios, lançamento de publicações, expo-sições, apresentações musicais e eventos teatrais.

Como ocorreu com o numero anterior, o Boletim 43não foi impresso e distribuído em eventos de cultura po-pular ou enviados pelo Correio a pessoas cadastradas e sópode ser encontrado no site da CMF. Essa mudança foimotivada em parte pelo crescimento dos usuários de IN-TERNET e em parte porque a CMF deverá publicar ain-da em 2009 uma coletânea de artigos divulgados nos bole-tins de número 21 a 41 (de dezembro de 2001 a agosto de2008), semelhante a organizada em 2003, com o tituloOlhar, memória e reflexões sobre a gente do Maranhão,com matérias selecionadas dos boletins de 1 a 20 (de agos-to de 1993 a agosto de 2001). Agradecendo o apoio recebi-do desejamos a todos boa leitura.

Editorial

Joãozinho Ribeiro

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Nelson Brito: guerrilheiro da cultura popular2Elisene Casto Matos3 e Flávia Andresa Oliveira de Menezes4

Nascido em 1953, o ator e diretor tea-tral Nelson Brito foi figura de des-

taque tanto na cultura popular comonas questões sociais que envolvem oteatro maranhense. Bacharel em Co-municação Social, com especializaçãoem Jornalismo, Nelson foi muito incen-tivado por sua mãe, Dona Lucinda, ase relacionar com o mundo da culturae das artes. Iniciou sua carreira nas ar-tes cênicas em 1969, com um curso deiniciação teatral com o teatrólogo Rey-naldo Faray, o que resultou em sua en-trada para o grupo TEMA (Teatro Ex-perimental do Maranhão), principal gru-po de teatro naquela época. Fez aindaoutros cursos, como interpretação, dire-ção, iluminação e teatro de bonecos.Durante os seis anos que esteve no gru-po, ele, juntamente com um elenco maisou menos fixo de atores maranhenses,produziram intensamente diversos espe-táculos de teatro infantil e adulto, che-gavam a ser seis espetáculos ao ano. Látambém se envolveu com a parte de ilu-minação, contra-regra e cenotécnica.

No entanto, mesmo com um apren-dizado intenso, intuitivo, prático e coma orientação de Reynaldo Faray, Nel-son Brito não encontrava no grupoTEMA oportunidade para atuar em ou-tras expressões cênicas, o que favore-ceu sua entrada e permanência noLABORARTE (Laboratório de Expres-sões Artísticas do Maranhão), até os úl-timos dias de sua vida, como descreveem entrevista no livro “Memória doTeatro Maranhense”:

Quando vim para o LABORARTE, viven-ciei uma forma diferente: em primeiro lu-gar, na montagem dos espetáculos, procu-rava-se o que montar, fazer o roteiro numadiscussão coletiva, depois, ter uma atuaçãomais participativa na montagem. Um tra-balho mais dirigido para a rua. Comecei ater um aprendizado de rua e de bonecos.Eram coisas novas que eu ainda não tinhatrabalhado.

Diferente do trabalho no TEMA,onde o enfoque era apenas na atuaçãopara palco e montagem dos textos sele-cionados pelo diretor do grupo, no LA-BORARTE Nelson Brito, ao lado depessoas como o teatrólogo Tácito Bor-ralho, passou a contribuir na constru-

ção dos roteiros dos textos que seriamencenados, o que acredita-se ter sido oponto inicial para seu trabalho comoescritor de teatro, dentre os texto queescreveu cita-se:”Súditos da Folia”,1986;”Te Gruda no meu Fofão”, 1992 e“A Saga de Casemiro Coco”, 1997.

Por certo, o LABORARTE, funda-do em 1972, surge com uma propostade confronto ideológico em relação aoTEMA, possuindo inclusive, departa-mentos de produção em várias áreasartísticas, a citar cênicas, plásticas emúsica, e tendo o teatro como carrochefe, pois em geral essas áreas atua-vam como apoio aos espetáculos. Ou-tras características que destacaram oLABORARTE foram: a presença dacultura popular, bem como o trabalhocom as questões sociais, inseridos nasapresentações do grupo.

Assim esse grupo atuou diretamen-te na organização do Movimento Tea-tral no Maranhão, enquanto Federa-ção e Nelson Brito como um militantepelas políticas culturais dessa área as-sumiu diversas funções, assim como osoutros membros do grupo. Dentre elas,ele foi secretário da ABTB (Associa-ção Brasileira de Teatro de Bonecos),em 1981 e 1982; tesoureiro e diretorregional da CONFENATA (Confede-ração Nacional de Teatro Amador), de1984 a 1989, e foi também presidenteda Federação de Teatro Amador doMaranhão duas vezes, em 1984/85 e1989/90.

A FETAMA (Federação de TeatroAmador do Maranhão), criada em 1977,devido à sua grande atuação e necessi-dade de afirmar-se acabou assumindoalguns compromissos que seriam obri-gações do Estado, como a realização deMostras de Teatros e curso de capaci-tação para ator, desta forma, foi muitoimportante para o movimento teatraldaquela época, pois esses eventos aca-bavam fomentando a discussão a res-peito da produção teatral do Estado,que era também apoiada pela veicula-ção de jornais impressos sobre o tema.

Nelson Brito, participante ativo detodos esses movimentos, relatou qual oretorno que o teatro lhe deu:

Eu estou vivo, andando, e a base de tudoisso foi esse movimento de arte que medeu. Não especificamente o teatro se euestiver pensando como ator e diretor. Oconjunto, o trabalho de arte é que me man-tém. Quanto à questão emocional, há mui-tos anos não consigo pensar minha vida deoutra forma, a não ser trabalhando com omovimento artístico, da forma mais plenapossível.5

Ele considerava o teatro como umaarte comunitária que necessita direta-mente de pessoas para ouvir, assim, nãodesconsidera que se trata de um pro-cesso lento, demorado, porém nistoexiste um sentido de fazer teatro, o qualele descrevia que era sua forma de ‘di-zer’, de ter individualidade intelectuale de interferir na cidade, no Estado,no País.

Daí ter sido escolhido também paradesempenhar papéis públicos, como pre-sidente da Fundação Municipal deCultura, de 2001 a 2002. Neste períodocoordenou o Festival Internacional deMúsica acontecido em 2002. De acor-do com o jornal impresso do LABO-RARTE também:

Foi coordenador e co-autor do projeto ‘Car-naval de Rua’, da Fundação Municipal deCultura, de 1994 a 1998; Diretor do Tea-tro Arthur Azevedo no período de 1987 a1989, Coordenador de Cultura da Funda-ção Municipal de Cultura no período de1993 a 1998" (2009, p.04)

Nos últimos anos, Nelson Brito etodo o conjunto de artistas do LABO-RARTE, destacaram-se na cultura po-pular através de espetáculos de rua, quepara ele tinha grande força e em con-seqüência conquistou um público mui-to maior que o espetáculo de palco, aexemplo do bumba-meu-boi, e maisespecificamente enquanto produção dogrupo o cacuriá de Dona Teté, que pos-sui grande destaque nas festas do perí-odo junino, e que resultou, segundo ele,em quase vinte brincadeiras no final dadécada de 80.

Nelson Brito assumiu a coordena-ção geral do LABORARTE em 1979, efoi reeleito diversas vezes, e somente em2001 decide sair dessa função6 pra as-sumir apenas a coordenação do setorde Artes Cênicas.

2 Título retirado do poema “A Morte de um Guerreiro”, do poeta e Secretário de Joãozinho Ribeiro. (Ver p. 2).3 Pesquisadora e Licenciada em Educação Artística, com habilitação em Artes Plásticas e mestranda em Ciências Sociais, ambos pela UFMA.4 Pesquisadora e Licenciada em Educação Artística, com habilitação em Artes Cênicas pela UFMA.5 Entrevista Nelson Brito. In: LEITE, Aldo. Memória do Teatro Maranhense. São Luís: EDFUNC, 2007, p 240.6 Foi sucedido por Rosa Reis.

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CONTINUAÇÃO

Durante todo este período atuoucomo diretor, ator, dançarino e algumasvezes também como escritor de espe-táculos. Em sua trajetória com o grupomontaram diversos espetáculos queparticiparam de festivais nacionais elocais; executaram projetos no prédiodo LABORARTE como o “Tarde nocasarão” (1993), o “Sexta no Labô” (1997,1999 a 2006) e o Iê Camará – Encontrode Capoeira Angola (1993, 1995 a 1997e 2002); bem como criaram um calen-dário fixo de atividades que abrange oRompendo o Aleluia, que acontecedesde 1984, o Carnaval de 2ª, desde1989 e mais recentemente, desde 2005,o Aniversário de Teté e etc.

Também idealizou uma série de pro-jetos patrocinados mais recentemente porgrandes e empresas a exemplo da Valedo Rio Doce, como é o caso dos projetos“Vale um papo Cultural” (2007 e 2008),que segundo Rosa Reis, tinha uma aten-ção especial do Nelson, pois foi realiza-do nos municípios, e tem por objetivouma conversa com as pessoas envolvidascom cultura nestas localidades, bem comoa oferta de cursos de Empreendedoris-mo cultural e de Elaboração de Projetospara captação de recursos.

Destaca-se ainda o “Caravana La-borarte”, que durante um fim de sema-na leva diversas atividades a comuni-dades por onde passam os trilhos daVale, como oficinas de teatro, dançapopular, bijuterias, etc, durante o dia eshows do grupo durante a noite. Nelsonatuava ainda como coordenador do “Pon-to de Cultura”, projeto patrocinado peloMINC, aprovado em 2005 e conveniadoem 2007, que oferece a crianças e ado-lescentes oficinas de dança popular, tea-tro, percussão, tambor de crioula e infor-mática e antes do seu falecimento estavatrabalhando na execução do projeto de“Ação Griô”, que trabalhará junto a Es-cola Modelo com os mestres da culturapopular Gonçalino, Zé Olhinho, Roxa ePatinho e mais o “Griô Aprendiz” queseria Nelson Brito, o qual foi substituídopela atriz e dançarina Aicram.

Nelson era muito ligado a culturapopular, tanto que deve muito de suaformação nesta área a convivência queteve com algumas das figuras que tra-balham a frente desses grupos, comoele mesmo declarou à revista ConexõesUrbanas, estes foram:

(...) referências decisivas para a sua forma-ção cultural como Mestre Felipe (tamborde crioula), Dona Teté (cacuriá e DivinoEspírito Santo) e Mestre Patinho “tem ain-

da quatro mestre que contribuíram forte-mente na minha formação: Apolônio Me-lônio, Leonardo, Bico de Brasa e Tabaco.Como cultura é uma coisa que você estásempre aprendendo eu cito também Mes-tre Gonçalino do tambor de crioula e oMestre Zé Carlos, do Pela Porco”.

Desta forma atuou como produtorde Cd’s, dentre eles “Cacuriá de DonaTeté”, “Tambor de Crioula de MestreFelipe”, “Te gruda no meu fofão” e tam-bém esteve ligado a produção dos 4 CDsresultados do projeto “Brincando noArraial”, do qual foi coordenador.

Em sua vida pessoal ao lado da suaesposa Rosa Reis sempre levava as dis-cussões políticas e conversas sobre a cul-tura para o recinto familiar o que ficoumarcado pela participação natural desuas filhas nestas conversas e nas ativi-dades do LABORARTE, desta formacada uma delas desenvolveu mais forte-mente um traço ligado às artes e a cul-tura, apesar de as três serem dançarinasdo cacuriá e de certa forma estarem li-gadas ao planejamento e coordenaçãodas atividades do grupo. Rosa Reis ementrevista destacou bem estas caracte-rísticas. Assim, Imira é a mais ligada aprodução cultural, sempre esteve ao ladodo pai na administração da casa e nacoordenação de alguns projetos do gru-po, Luana, mais ligada à dança e ao te-atro, destacando-se por sua expressivi-dade cênica, e Camila, dedicada ao can-to, a música e as discussões políticas, eainda destaca-se a participação de Nel-sinho como professor de capoeira no gru-po. Tal formação familiar é reconheci-da pelas filhas e foi expressada por Imi-ra Brito em um texto de sua autoria:

MEU HERÓI

Meu herói enfrentou as adversidades nocaminho e foi ao meu encontro.Meu herói me carregou no colo e mechamou assim, filhona.Meu herói foi dedicado e passou noitesem claro por minhas enfermidades

Meu herói era carinhoso e complacente.Meu herói insistiu comigo, me viu lon-ge, e por isso eu cheguei até aqui.Meu herói teve dúvida, mas não hesitoue recebeu meu filho como seu

Meu herói era trabalhador e não tinhalida que ele não desse conta ou que nãosoubesseMeu herói era forte como um touro esuportou as calúnias que lhe lançaramMeu herói era honesto e seu caráter temo mesmo valor que o de um diamantebruto

Meu herói nem sempre foi palhaço, mastinha o dom de levar alegria aos outrosMeu herói não acreditava em Deus, acre-ditava que podíamos ir mais longe, ser maisMeu herói não era tão grande, mas suahumanidade era descomunal, gigantesca

Meu herói não usava máscaras, ou roupascoloridas, nem ocultava sua identidadeMeu herói era amor, fraternidade, ami-zade, companheirismo, simplicidade...Meu herói era meu amado pai, NelsonDe sua filha amada, Imira Brito

Desta forma percebe-se que a con-tinuidade do trabalho de Nelson foibem encaminhada. Como grande pi-lar do Labô – como é popularmenteconhecido o LABORARTE – ao qualultimamente dava dedicação exclusi-va, e membro do Conselho Estadual deCultura, deixa aos 55 anos uma traje-tória de vida que marcou não somenteo teatro maranhense, mas as causassociais e políticas que envolvem a cul-tura popular deste Estado. Deixa alémde sua família, inúmeros amigos, artis-tas e admiradores.

Tal destaque teve em conseqüên-cia uma despedida, marcada por apre-sentações de grupos de tambor de cri-oula, rodas de capoeira e apresentaçãodo bloco Fuzileiros da Fuzarca, comoa certeza de que este artista foi um dosmais representativos homens da cultu-ra popular do Maranhão.

BIBLIOGRAFIA

LABORARTE Notícias, São Luís, abrilde 2009 – N- 1LEITE, Aldo de Jesus Muniz. Memó-ria do Teatro Maranhense. – São Luís,EDFUNC, 2007.SALLES, Écio. Perfil: Nelson Brito,mestre das artes, de brincar, interagir,criar. Revista Conexões Urbanas.LABORARTE, 18 anos de idealismoatuante. VAGALUME, SuplementoCultural do SIOGE. Ano III, nº 12, Nov- Dez 1990.ASCOM-SECMA. Cultura de luto:Nelson Brito falece em São Luís. In:http://www.cultura.ma.gov.br/2009/1/12/Pagina376.htmSANTIAGO, Paulo Rubem. Nelson Bri-to: um maranhense cidadão do mundo.In: http://paulorubem.blogspot.com/2009/01/neso-brito-um-maranhanse-cidado.htmlCULTURA de luto: Nelson Brito faleceem São Luís. In: http://www.jornalpequeno.com.br/2009/1/12/Pagina96195.htm

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O Olimpo dos gregos abre a cena apre-sentando uma teodicéia fértil, em que

os deuses habitam o mundo dos humanos.É pela fala grega que os deuses apare-

cem reluzentes, cheios de ecos, anuncian-do a visão que o horror e o belo consagra-ram da existência humana, transfiguraçãode “pavores e sustos da existência” (NIET-ZSCHE, 1977, p. 201).

Memoriais do horror e do inescrutávelque nos ronda no dia-a-dia.

É do mundo intermediário olímpico –do reino do entre – que os gregos tiram osubstrato para suportar - ao mesmo tempo– o terror, que o absurdo do viver fulgura, ea revelação da eterna alegria, que do fundoa vida nos anuncia, transitória e poderosa,iluminando a tragédia do estar no mundo.

A tragédia de fazer parte desse espetá-culo desejante que a vida, por anunciar amorte, “resplandece”, como diz Lacan(1988, p. 354), fazendo ecoar um travo deamargor que insiste em se insinuar na maistenra felicidade.

Fio do horror que traz em sua rabiola –saltitante como uma pipa colorida de papelno ar – o horrível. Haveria alguma coisa debelo no horrível?

O horrível traz à cena a estranheza queinquieta. Abre Outro umbral de sensações.Ilumina sombras, suportes, máscaras de queo sinistro precisa para poder se “monstrar”...(WEILL, 1987, p.11).

O sinistro ganha uma possibilidade deganhar uma forma, incipiente, mas mesmoassim uma forma, capaz de trazer à tona oque de mais estranho há em nosso “intimus”,que em seu superlativo quer dizer o mais in-terior, profundo, secreto, recôndito, que atuano interior (FERREIRA, 1986, p. 961).

Se o belo traz o sentido do absolutonuma sensação que se sente una, harmôni-ca, esférica – experiência que corresponde,que afirma o belo, dissociado do horrível –, aexperiência do estranho fissura essa unida-de, revelando a falha que o imaginário queresconder.

Freud, ao recortar o conceito de unhei-mlich, o “estranhamente familiar”, expõeuma estética em que o belo perde sua prima-zia se conjugando com o horrível, trazendoà cena o equívoco (FREUD, 1976, p. 277).

O horrível, fruto do equívoco que o “es-tranhamente familiar” traz, expõe a fendado inconsciente, divide, duplicando o eu,apresentando um outro patamar do sentir:o horror, como preferem os antigos, ou oterror, como preferem os armamentistas.

QUANDO OS CAZUMBÁS SAEM POR AÍ...Elisabeth Bittencourt7

7 Psicanalista e Psicóloga carioca de nascimento e maranhense de coração.8 Abel Teixeira nasceu em 19 de novembro de 1939, artista que faz a “careta” do Cazumbá.

Diante do horror, o único recurso pos-sível é o grito, um “som ligeiramente dolori-do” (CUNNINGHAN, 2003, p. 50) que ecoano silêncio do dia. Somente o som do hor-ror ecoa diante do emudecimento do ser quenesse instante “padece do significante” (LA-CAN, 2001, p. 149). A palavra falta...

O equívoco passa a ser então esse lugartopológico que “oculta e desvela o horrívelem um só tempo”. Lugar de inseminaçãode interrogações: um querer saber do “enig-ma da semelhança” e da “diferença do aves-so” (FRANÇA, 1997, p. 131-132).

A arte, este campo de produção ficcio-nal, teima em apostar que é possível criar...rendinhas face ao vazio, como no hipopó-tamo de Salvador Dali ou em qualquer ou-tra coisa, tanto faz, representações em tor-no do vazio.

A arte, que se alimenta de equívocos,vive a buscar Olimpos, suportes, seres in-ventados, seres falantes que suportem sus-tentar a voz dos deuses, aquela que o cristi-anismo quis exterminar, conforme Lacananunciou no seminário da ética (LACAN,1988, p. 314).

No Olimpo da cultura afro-maranhensesurge um ser inventado do reino do entre –entre os espíritos e os humanos –, o Cazumbá.

Efeito do equívoco que o “es-tranhamente familiar” promoveno belo, surge esse personagemque, apesar de existir “pra brin-car” – como disse “seu” Abel8 ,mestre na arte de cazumar–, ilu-mina no outro um olhar, umainquietação, amálgama que reluzuma nuance sinistra, que nosameaça e nos alegra ao mesmotempo! (FREUD, 1976, p. 277).

Mas... Como diz seu Abel,disso ele não sabe, não. Para ele,o Cazumbá foi feito pra fazergraça...

E como fui eu que vi, vouprecisar me explicar, mas nãomuito, porque, se explicar mui-to, é “seu” Abel quem diz, corroo risco de “perder a noção da coi-sa”, que perdida já está. Afinal,a coisa da arte só não pode serrepresentada por Outra coisa?

Inusitado, nem homem, nemmulher, nem bicho, nem coisa, oCazumbá é “inédito e é pra brin-car”. A sua graça vem desse lugarque usa uma “careta” que não sediz totalmente. Nem macho, nemfêmea. Nem bicho, nem gente.

O Cazumbá é mais um que habita oreino do entre, entre os humanos e os ani-mais. Entre-duas-mortes. Esse “entre” fo-menta a fascinação que habita o campo detransição: entre os homens e os espíritos.Transição dos humanos para o mais-além dosaber (LACAN, 1988, p. 327).

De uns tempos para cá, o Cazumbá ga-nhou o mundo, e as pessoas insistem em que-rer desvendar seu enigma. Seu Abel, como “nãoviu o começo”, só sabe explicar que o Cazum-bá é “pra brincar”; dessa história de espíritoque vem da palavra de origem ele não sabe não.

Cazumbi, Zumbi, Nzumbi. Origináriodo Kibundo Nzumbi (macrogrupo etnolin-güístico Bantu), é um espírito que se supõeestar pelo mundo participando com os vi-vos (LODY, 1999, p. 6).

Mais uma vez, “seu” Abel diz que fui euque vi que Cazumbá é para fazer graça, daí acareta: “A gente não pode fazer uma graça semter uma careta”. Ele insiste: “o Cazumbá é prafazer alegria e medo nas pessoas que estão as-sistindo, essa história de espríto são eles quedizem”.

O Cazumbá provoca nos outros umaespécie de encantamento em que o enigmase conserva: espaço de ficção recheado pelaangústia. Não conseguimos decifrar aquela

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imagem, que se beneficiou do caráter toscoe irregular das máscaras africanas, que nosaparece, inusitada, juntando elementos apa-rentemente tão dessemelhantes.

A distorção da expressão anatômica efacial da careta do Cazumbá faz com quealgo da ordem do estranho se pinte. A brin-cadeira passa a ser então o espaço topológi-co que permite uma passagem para a ordemintermediária: entre os humanos e as forçasdesconhecidas que nos rodeiam.

É isso, essa que é a brincadeira. O Ca-zumbá, por não ser decifrável, tem na estra-nheza sua potência. Potência de represen-tar imagens, de colocar em cena o jogo doenigma da semelhança e do avesso da dife-rença.

O nosso eu, que pensa que é o tal, seassusta. Se assombra. São os fantasmas quehabitam o reino do dentro de cada ser. Ofantasma de dentro, aquele que cada um denós criou para traçar sua própria trilha, nes-te mundo belo e difícil de se achar, num cer-to lugar.

Mas voltando ao Cazumbá, este, por serarte, produção da cultura afro-maranhense,revela um estilo. Pegada identificatória quepromove circulação no espaço da Brincadei-ra da nação Brasil. Segundo Hermano Vian-na: “Nesse espaço, tudo circula: pedaços demelodias, versos, instrumentos musicais, de-talhes de indumentária; trechos de encena-ções teatrais”. (VIANA, 2003).

Artefatos da arte popular, matéria-primana produção da Brincadeira. Brincadeira éuma nomeação que o povo deu aos “folgue-dos populares, folias, autos e festas”. Quemcomemora nas praças, ruas e ladeiras da na-ção Brasil sabe o que é festejar a vida nas ruas,se misturando com os vagabundos que vivemem torno das cidades (VIANA, 2003).

O espaço da Brincadeira, como em Ra-belais, dissolve as distâncias, permite a en-trada dos excluídos, estica os limites do su-posto real do cotidiano. Fissura o absoluto,transgride.

Homens podem ser mulheres, mulhe-res brancas podem se sentir negras pela es-cravidão do trabalho, gente pode virar ani-mal, Cazumbá pode aparecer para assustar ealegrar. É como diz seu Abel: “Quem dá sen-tido é o outro. Eu faço a careta, acho queparece com um cachorro, mas não digo nada.Aí quando alguém fala: ‘olha, parece um ca-chorro’, aí eu começo a latir”.9

Com isso, seu Abel já me deu a dica deque, na Baixada Maranhense, o de que setrata é de um estilo que se faz, no qual a troçae a provocação dão o tom da brincadeira. Amaneira como cada povo cria a sua arte – e ageografia importa –, quando se trata de re-cortar territórios culturais da Brincadeira.

Uma coisa seu Abel não pode negar: a“careta” do Cazumbá vem da arte negra, ber-ço de onde ele vem, lá de Lajedo, povoado deViana, Baixada Maranhense, onde o que nãofalta é magia e brincadeira, e muita, muitaarte...

Falta pão, não falta magia que ressoa nocorpo, efeitos da percussão dos tamboresnum corpo que é também brasileiro.

Como falar de um corpo que é tambémbrasileiro? Ou seja, um corpo que já nasceunum certo embalo, da mãe que embala e doritmo que nossa cultura faz pulsar? E issosó para lembrar que por lá, é tempo, todoano tem, de pandeirões, tempo do bumba-meu-boi, bumbá.

Um corpo que nasce nesse caldeirão deritmos se particulariza na cultura universal.Joãozinho Trinta (1985, p.24-25), num en-contro com psicanalistas, disse que os quese envolvem de perto com a dança popularpossuem seu corpo. Ou seja, não são possu-ídos pelo corpo. Ou melhor, não são despos-suídos.

O Cazumbá existe então para presenti-ficar que nós, os seres humanos, somos fei-tos de uma mestiçagem de substâncias tãoheterogêneas quanto aquelas que constitu-em nosso corpo. Esse corpo que parece nãose acomodar bem nele próprio.

Mas o que o Cazumbá quer mesmo pre-sentificar é a arte, no sentido da catarse, puradescarga, efeito de alegria, meio de produ-ção que por aqui e lá é abundante. Às vezespenso que esta é mais abundante com aque-les que não têm quase nada a perder. Mas

REFERÊNCIAS

CUNNINGHAM, Michael. As horas. São Paulo: Cia. das Letras, 2003.FERREIRA, Aurélio B. de Holanda. Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.FRANÇA, Maria Inês. Psicanálise, Estética e Ética do Desejo. São Paulo: Perspecti-va, 1997.FREUD, Sigmund. “O estranho”. In: FREUD, Sigmund. Obras psicológicas comple-tas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1976. v. 17.GOLDING, John. Picasso y el surrealismo: Picasso 1881-1973. Barcelona: Gustavo Gili,1974.LACAN, Jacques. A ética da psicanálise. In: O Seminário – Livro 07: Trad. AntonioQuinet. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988.LODY, R. Cazumbá. Máscara e drama no boi do Maranhão. Museu do FolcloreEdison Carneiro, Rio de Janeiro: Ministério da Cultura, 1999.NIETZSCHE, Friedrich W. O nascimento da tragédia no espírito da música / Obelo autônomo. Organização e seleção de textos. Rodrigo Duarte. Belo Horizonte:UFMG, 1977.RABELAIS, François. Gargantua. Trad. Aristides Lobo. Rio de Janeiro: Ediouro, s/d.TRINTA, Joãozinho. Psicanálise Beija Flor: Joãozinho Trinta e os analistas do colé-gio. Rio de Janeiro: Taurus, 1985.VIANA, Hermano. Ser outra coisa. Disponível em: http://wwwmundoaocontrario.com.br Acesso em: 12 fev. 2003.WEILL, Alain-Didier. Fim de uma análise, finalidade da Psicanálise. Rio de Janeiro:Jorge Zahar, 1987.

sempre concluo que isso é romantismo meu.O Cazumbá, essa figura especial, nasci-

do na Baixada Maranhense, serve de supor-te para dar “forma aos nossos terrores e nos-sos desejos”, cumprindo assim o que Picas-so dizia ser o sentido próprio da arte (PI-CASSO apud GOLDING, 1974, p.158).

Só que – e isso é importante – ele se fazde uma matéria-prima em que a troça, a ale-gria, a provocação, os tambores e a dança, éclaro, são o seu fermento, presenteando-noscom aquilo que há de mais ético num artis-ta: seu estilo.

Para terminar, quero revelar que o mai-or gosto que o Cazumbá me dá é a possibili-dade de me surpreender. De me lembrar dainfância, tempo em que a surpresa de viverconstrói o cotidiano. Nós, herdeiros da ido-latria do saber, tentamos tamponar aquilode que a surpresa se alimenta: a falta de sa-ber que nos constitui.

Nós, brasileiros, o que podemos então –além de fazer samba nas limitações – é teceruma disponibilidade interna para a surpre-sa. Despossuídos de um certo saber, talvezpossamos conservar aquilo que considerouma ética para o próximo milênio, a possibi-lidade de se espantar.

Em um mundo onde a exclusão dos queestão fora do mercado passa a ser uma ne-cessidade do próprio mercado, que reinaabsoluto, nada mais espanta.

Ainda bem que existem os Cazumbás,que, rodopiando, nos prometem que no pró-ximo milênio vão continuar a nos espantar. Oespanto é a nossa esperança para o futuro...

9 Fragmento da entrevista feita com Abel Teixeira.

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INTRODUÇÃO

As pesquisas sobre cultura afro-brasi-leiras são muito variadas e tentam dar con-ta da presença desta em vários âmbitos dacultura nacional. Música, dança, estética eculinária são indiscutivelmente resultadosde processos de sincretismo cultural. A aná-lise do sincretismo no plano religioso pres-supõe a interpretação de uma realidade vi-vida por inúmeras pessoas no país e queteve sua origem em tempos coloniais. Istoparece tão claro quando pensamos as religi-ões afro-brasileiras que o assunto, quandoabordado, em livros de história não ocupamuito espaço e nos livros didáticos não me-recem mais que o espaço de uma nota derodapé como.

No entanto os fatos não são operadosnesse plano e possuem muitos desdobra-mentos. Nessa perspectiva que pressupo-nho um olhar para as casas de artigos religi-osos a tentativa de compreender como, emuma sociedade preconceituosa orientadapor religiões que se julgam superiores, avenda de artigos religiosos está sendo de-senvolvida e quais suas conseqüências noplano cultural.

Esses estabelecimentos estão localiza-dos próximos a Igrejas Católicas e as rela-ções entre esses dois credos são expostasaqui como resultado da interação de ele-mentos distintos em um mesmo espaço oqual chamei de sincrético.

A CONQUISTA DE ESPAÇOSSOCIAIS E A GÊNESE DOSESPAÇOS SINCRÉTICOS: A

CULTURA NEGRA PRESENTE NAVENDA DE ARTIGOS RELIGIOSOS

Da lei Áurea até os dias atuais uma sé-rie de desdobramentos sociais econômicose políticos podem ser entendidos como ele-mentos integrantes para a construção deum espaço em que a cultura negra ganhouprogressiva liberdade e adeptos, galgandoposições em um ambiente que mesmo as-sim ainda é hostil às representações religio-sas africanas. Tal cultura manteve-se pre-sente resistindo a pressões de outra cultu-ra dita superior através de imbricados pro-cessos que devem ser analisados conjunta-mente na tentativa de se entender o atualquadro cultural do qual fazem parte.

Historicamente, observamos como asreligiões africanas se desenvolveram no Bra-

sil e como ga-nharam espaçoem uma socie-dade mestiça ecriando um mo-saico com todasas variações donegro ao bran-co. De fato, oscultos afros sedisseminarampor toda a soci-edade, seja pelascondições des-tas em se desli-gar de qualquertipo de institui-ção dogmática,ou seja, pela re-lação muitoprópria e peculiar entre o indivíduo e seuorixá.

Os cultos afros oferecem uma gama deserviços mágico-religiosos que podem sercomprados por qualquer indivíduo. O aten-dimento e a rápida solução oferecida aosproblemas não só espirituais, mas tambémmateriais, além de uma não necessidade devinculação à religião afro a transforma emum espaço de liberdade do indivíduo e uma

alternativa social importante para diferen-tes segmentos sociais que vivem numa so-ciedade como a nossa, em que ética, códi-go moral e normas de comportamento es-trita podem valer pouco, ou comportarvalores muito diferentes.12

Estabelecida essa relação comercial vol-to meu olhar para as casas de artigos religi-osos onde estão disponíveis toda sorte debanhos, essências, defumadores, velas en-tre outros símbolos das religiões afro.

Algumas dessas lojas não vendem itensexclusivos das religiões afro-brasileiras, mascontam com um público em sua maioriaconsiderado popular ou “povão” como sereferiu o dono de um dos estabelecimen-tos fazendo referência a uma análise de queos cultos dos terreiros são caracterizadospela participação em massa de pessoas dascamadas mais pobre da população emboraessa analise possua suas variantes.

Segundo ele “poucas pessoas vão alipara buscar alguma coisa da Igreja Católi-ca”. Embora as lojas não façam distinção depúblico o dono afirma que “quando é coisapra Igreja Católica” os consumidores bus-

cam outras lojas como uma livraria católi-ca ou até mesmo outra loja especializadana venda de artigos religiosos, mas que oambiente apresenta uma estética diferen-te daquelas que vendem material para aumbanda e candomblé.

Estas palavras mostram um mercadodisputado que por sua vez revela com a reli-gião ainda é muito forte na vida dos indiví-duos que cada vez mais buscam novas ex-periências para sanar rapidamente seus pro-blemas.

A VENDA DE ARTIGOSRELIGIOSOS E A CONFIGURAÇÃO

DO ESPAÇO SINCRÉTICO

A grande quantidade de casas de artigosreligiosos situados no centro da cidade acabaconfigurando um espaço sincrético uma vezque esta área é também densamente pontea-da por Igrejas Católicas. Não é a existênciadesses dois elementos que por si só que pode-riam configurar um espaço sincrético, obser-vando dessa maneira a análise proposta pode-ria ser concluída de maneira superficial semdar conta de uma série de relações existentesdentro deste contexto.

Primeiramente vamos observar a no-ção de sincretismo aqui utilizada e a partirda qual surgiu a idéia deste trabalho. Oantropólogo Ordep Serra compreende porsincretismo

“todo processo de estruturação de um cam-po simbólico religioso ‘interculturalmen-te’ constituído, correlacionando modelos

CASAS DE ARTIGOS RELIGIOSOS10

Thiago Lima dos Santos10

10 Retoma trabalho apresentado no Simpósio da ABHR de 2008 integrando contribuições de Camila Portela, que colaborou na coleta de alguns dados e realizououtras entrevistas.

11 Graduando de História da UFMA; bolsista do PIBIC/FAPEMA orientado por Sergio Ferretti.12 PRANDI, Reginaldo. Herdeiros do Axé, p. 1-50 (versão disponível na internet)

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míticos e litúrgicos ou gerando novos para-digmas dessa ordem que assinalem expres-samente outros (que se refiram a outros)de maneira a ordenar o novo espaço cultu-ral.” (SERRA 1995 p. 197 -198).

Um espaço sincrético necessariamen-te não é um espaço em que dois elementosde culturas diferentes estejam postos ladoa lado, isso poderia ser caracterizado comoum simples posicionamento visual de ele-mentos opostos e em decorrência do hibri-dismo cultural brasileiro. A presença de umacasa de artigos religiosos na mesma rua emque uma Igreja Católica pode não signifi-car muita coisa em um local marcado peladiversidade cultural, mas as relações exis-tentes entre estes dois ambientes acaba cri-ando este espaço sincrético, ou seja, umambiente em que culturas diferentes tro-cam experiências e a linha que as divide oraé bem definida ora não.

Esta outra conotação do termo sincre-tismo pode ser aplicada no ambiente acimarelatado onde símbolos de religiões diferen-tes e contraditórios não estão somente pró-ximos, mas ordenando um espaço com “no-vos códigos e novas práticas sociais derivadasdeste” (SERRA 1995 p. 198). Nesse local, cris-tãos interagem com umbandistas de modonem sempre harmonioso evidenciando cer-tos casos em que o duplo pertencimento reli-gioso ainda é gerador de conflitos.

As casas de artigos religiosos estão aber-tas a qualquer pessoa, independente da re-ligião do indivíduo e mesmo que algunsdonos e empregados das lojas afirmem quea maior parte do público situa-se entre um-bandistas não podemos excluir a participa-ção de católicos e até mesmo protestantesneste comércio. “Os católicos compramprincipalmente defumadores e velas, pois éa crendice popular afastar maus espíritos”e mesmo com todos os dogmas da Igreja “aspessoas não acreditam estar praticando al-gum mal ao defumarem sua casa ou acen-der uma vela colorida em frente ao seu san-to de devoção” afirma um empregado deuma das lojas pesquisadas.

Essa afirmação esta relacionada com doisfatos, um é o duplo pertencimento religiosoonde o indivíduo não sofre conflitos ao par-ticipar de dois cultos, pois interpretam que,em essência, a maneira com a qual entramem contato com o sagrado possui a mesmaraiz, esta “questão de fé” está muito presentenas pessoas que freqüentam tanto a missaquanto o terreiro para se sentirem espiritual-mente realizadas. O outro é o fato de que anoção de pecado que acompanha o católicoserve como limitador de suas ações e caso estaprática for geradora de dúvida a vela não seráacesa nem o defumador queimado.

Outro item observado é a possível parti-cipação dos neo-pentecostais neste merca-

do. Este fato foi levantado por um dos en-trevistados que diz com convicção que pes-soas da Igreja Universal do Reino de Deuscompram aquilo que os pastores utilizamno culto e na e nas propagandas televisivas.O sal está entre um dos principais produ-tos procurados além de banhos e outrosprodutos com a denominação abre cami-nho. Ao ser questionado em que ele se ba-seava para emitir tal afirmação ele respon-deu que “a resposta está na televisão” e tam-bém pelo fato do “crente ouvir o pastor fa-lar de abre caminho e ele buscar algo seme-lhante na loja”.

Não tendo dados para comprovar talfato exponho este argumento assim comome foi passado por um dos entrevistados,mas que não deve ser excluído, pois a pre-sente situação além de ser atravessada dequestões de cunho individual (questões defé), neste cenário sincrético novas práticaspodem surgir e desaparecer com o passardo tempo.

Outra prática relatada por um vende-dor e constatada pela maioria dos entrevis-tados é a prática da “compra para o vizi-nho”. Uma vendedora afirma: “o maranhen-se é uma pessoa muito boa e vive fazendofavor pros outros, muita gente vem aqui ausando a desculpa de que o vizinho pediuou ‘que fulano lá da rua está precisando’”.Esta benevolência expressa na hora da com-pra faz parte de outro medo que as pessoastêm que é o do preconceito que possamsofrer por estarem comprando artigos reli-giosos nas lojas em questão ou se assumi-rem como adeptos de alguma religião afro.

Este preconceito gera conflitos que porsua vez tendem a estarem presentes na vidadaqueles que se assumem adeptos de algu-ma religião afro-brasileira. Um caso eviden-te disso ocorre com dona Maria que temsituado ponto comercial em sua residên-cia. Ela afirma ser vítima de preconceitono seu dia-a-dia, mas que releva tais fatos,pois se sente bem no que faz e não se inco-moda se ainda hoje as pessoas não sentamao seu lado na missa por saberem que pos-sui além de uma loja de artigos religiososum terreiro de umbanda. Afirma tambémque muito do preconceito por ela sofridojá diminuiu com os 24 anos que está insta-lada naquele local, os xingamentos e expres-sões caluniosas que os vizinhos emitiamforam desaparecendo e hoje os mesmo re-correm a ela em caso de necessidade.

CONCLUSÃO

As análises aqui apresentadas não po-dem ser tomadas de maneira independen-te. A venda de artigos religiosos está relaci-onada não só com uma demanda comerci-al, mas também religiosa, tanto de alguns

donos como dos consumidores que neces-sitam manter contato constante com oseu(s) deus(ses). Objetos como medalhas, ve-las, essências, defumadores são elos de co-nexão entre o homem e o sagrado. Esta cons-tante busca uma satisfação espiritual e tam-bém das necessidades materiais de manei-ra imediata seja então a raiz do deslocamen-to que muitas pessoas operam quando bus-cam em um terreiro o aconselhamento

Neste contexto cabe aos indivíduosescolherem qual credo seguir e na escolhadas religiões de matriz africana passará poruma série de experiências novas. Tentandodar conta de algum desses processos estapesquisa focaliza para um tipo de comer-cio muito forte em uma sociedade muitoreligiosa e também muito diversificada nes-te ultimo aspecto.

Apresentei algumas práticas que sãomuito fluidas e que variam a cada loja visi-tada. Com a entrevista efetuada seja com odono ou com um vendedor cada um destesexpõe situações vividas por eles e não de-vem ser desconsideradas por serem parteda vivência cultural do país onde algumaspráticas são pouco estáveis outras – comoo preconceito - são quase unânimes em re-lato dos entrevistados.

Tratar religião também sucinta dúvi-das e olhares estranhos e enquanto uns res-ponderam livremente as questões levantan-do hipóteses e concluindo pensamentos apartir de suas experiências outros com umsimples “não posso responder” sinalizavamapós minha apresentação.

Levando em conta tantas experiênciaspessoais e tentando relacioná-las e encaixá-las nesse contexto sincrético torna-se evi-dente a necessidade dos símbolos religio-sos na vida das pessoas, independente dareligião que professem. Encerro de manei-ra propositadamente comercial que nascasas de artigos religiosos você encontrarátoda sorte de símbolos religiosos para satis-fazer suas necessidades espirituais e por-que não, materiais.

REFERENCIAS

MATTOS, Regiane Augusto de. Histó-ria e Cultura Afro-Brasileira. São Paulo:Contexto, 2007.COSTA, Wagner Cabral da (org.). Histó-ria do Maranhão: Novos estudos. SãoLuis: EDUFMA, 2004.MEIRELES, Mario M. Dez EstudosHistóricos. São Luis: ALUMAR, 1994.PRANDI, Reginaldo. Herdeiros do Axé,p. 1-50 (versão disponível na internet)SERRA, Ordep. Águas do Rei. Petrópo-lis-RJ: Vozes, 1995.

Siteswww.ma.gov.br

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Vamos agora subir a Rua do Sol, começandopelo primeiro prédio, mesmo que ele per-

tença, de fato, ao Largo do Carmo (Praça JoãoLisboa).

Para alargar a Rua do Egito demoliram obar “Excelsior” (ao qual me refiro no capítulo“Liceu”) e a “Farmácia Sanitária”, de Jesus Nor-berto Gomes (um farmacêutico idealista e cria-tivo, autor de muitos medicamentos - “Antigri-pal”, “Hidrocálcio”, etc., etc., comprimidos, po-madas e ungüentos de sua fórmula, e o refrige-rante “Cola-guaraná “Jesus” - “o sonho cor-de-rosa das crianças”! Em seu lugar ergueram oprédio feioso da agência da Caixa EconômicaFederal. O sobrado de azulejos, junto, pertenceaos herdeiros do Dr. Luís Carvalho, citado em“Vida Profissional”. Era homem bonito e sisudo,usava cavanhaque bem tratado, ternos escurose, apesar de tê-lo conhecido já idoso, lembro-me bem de sua figura espigada e elegante e doconceito que gozava de advogado sério e com-petente. Um dos melhores de São Luís.

A seguir, vinha o edifício da firma Pinhei-ro Gomes & Cia., do pai do ex-frade e econo-mista José Tribuzi Pinheiro Gomes (o poetaBandeira Tribuzi), o português Joaquim, dequem já falamos, e do Sr. Acir Marques, seusócio, pai do Glacymar e do Ary, que tambémlá trabalhavam. Antes, aí conheci, numa mo-rada inteira térrea, a Madame Adolfina Har-ms, uma alemã cinqüentona, alta, alourada,de grandes olhos azuis, afamada chapeleira.Vem depois a ex-sede do Grêmio Lítero-Re-creativo Português, a casa meio desprezada,alugada para restaurante, para boate, etc., etc.,mas que nunca se firmam. Pois foi no salãodeste clube, ali pelos anos de 42/43, que dan-cei com a Zelinda pela primeira vez, e pormuitas e muitas vezes; antes de casar, depoisde casado. Que bailes de Carnaval! Que révei-llons! Quanta alegria! E agora... quanta sauda-de! As famílias tradicionais, a rapaziada docomércio e dos bancos, os cadetes da EscolaMilitar, a oficialidade do 24 BC.... Muita comi-da e bebida, confetes, serpentinas, lança-per-fumes... e nada de brigas, todos possuídos deinocente alegria... “Oh! Jardineira, por que es-tás tão triste?... “Nêga do cabelo duro, qual é opente que te penteia?... “As águas vão rolar,garrafa cheia eu não quero ver sobrar.... “Umpierrô apaixonado, que vivia só cantando...”Oh! tempos! Oh! Saudade!

Mais adiante era o “Bar do Castro”, ummisto de casa de diversão, botequim, banco,casa beneficente e academia dos novos. Deum lado ficavam as mesas de sinuca, perma-nentemente ocupadas pelos alunos gazetei-ros e pelos profissionais do taco. Uns chega-vam a rasgar o pano verde com sua inexperi-ência; outros realizavam partidas memoráveise provocavam apostas às vezes absurdas!D’outro lado do prédio, ao redor de mesinhasde mármore, abancavam-se, em confortáveispoltronas de vime, os intelectuais jovens paradiscutir escolas e autores e para apresentaraos amigos suas últimas produções em prosa everso. E como falavam muito, obrigavam-se amolhar as línguas com muita cerveja, cachaçaou um coquetel de fórmula misteriosa, criaçãodo dono da casa, no qual figuravam todas asbebidas “encalhadas” nas prateleiras. Exalta-va-se o Modernismo, recitava-se Fernando

REMINISCÊNCIAS: RUA DO SOL13Carlos de Lima14

Pessoa ou, patrioticamente, relembrava-seGonçalves Dias e Maranhão Sobrinho. (Este,mais pela boemia exemplar do que pela artepoética.) Ao final dessas seções literárias so-bravam sempre muitos “espetos” e outros tan-tos pileques.

No Bar aparecia pontualmente, aos sába-dos, um linotipista de “O Imparcial” por apeli-do “Camelinho”, por ser corcunda. Enchia-sede vinho tinto “Casca de Mangue” que o pu-nha escornado, dormindo sobre a mesa. Ma-noel Castro, Joaquim Itapary, Manuel Ribeiroe outros moleques (hoje senhores respeitáveis)arranjaram uma escada, carregaram Seu Ca-melinho e o colocaram na marquise dos Cor-reios e Telégrafos, defronte, com o risco dopobre homem, bêbado, cair lá de cima e que-brar-se no chão. Imagino o espanto dele quan-do, passada a carraspana, acordou e viu-se,inexplicavelmente, naquelas alturas... Deve terpensado: “- Êpa! cachaça danada! que faz atéa gente voar!...” De outra feita, ensoparam deágua oxigenada a carapinha de um preto, poli-dor de assoalho, que também se embriagavalá, e que despertou surpreso, completamentelouro! Ao tempo em que isso era estranho. Hojehá cabeleiras de todas as cores do arco-íris paramulheres, homens e os do 3º, 4º e 10º sexos.

A agência dos Correios e Telégrafos, jádissemos, ficava em frente, outro edifício feio,modernoso, do detestável pó-de-pedra em moda,no lugar em que deveria erguer-se o primeiroteatro, se os frades do Carmo não tivessem obri-gado os donos a virá-lo de frente para a Rua doSol, porque não ficava bem uma construçãoprofana (E bota profana nisso!) ao lado de umtemplo religioso. Finalmente o teatro foi feitoconforme os cânones e lá está o belo prédio quese chamou “União”, “São Luís” e “Artur Azeve-do”, em cujo camarim no. 1 nasceu a grandeatriz Apolônia Pinto e cujo palco recebeu des-de as companhias de óperas italianas e de zar-zuelas espanholas até o famoso artista Carlosde Lima (desculpem a imodéstia!), passandopor Renato Viana, Procópio Ferreira, VicenteCelestino, o “Teatro do Estudante”, de PascoalCarlos Magno, Jaime Costa, Sandro-Delacosta-Celli, Tônia Carrero e tantos outros como BiduSaião e a Sinfônica de Eleazar de Carvalho,além da prata da casa, talentosa e esforçada,sob a competente e entusiasta direção de Rey-naldo Faray, a quem o Maranhão deve umadefinitiva e justíssima consagração.

Atravessando a rua, temos o sobradinhode azulejos, onde, nos começos do século, re-sidiu Dr. Nina Rodrigues, médico, que, pordefender uma tese sobre as propriedades nu-tritivas da mandioca, tomou o apelido de “Dr.Farinha Seca”. Por conta de nossa tradicionalirreverência Nina Rodrigues compôs seu re-nome na Bahia, com seus trabalhos de psiqui-atria. Ali, naquele sobrado, ainda conheci afamília do Dr. Ribamar Pereira, advogado gor-do e bochechudo, que exibia seus dotes depoeta, pianista e barítono sempre que se apre-sentava ocasião. Foi prefeito, e nessa qualida-de empreendeu uma reforma da Praça Bene-dito Leite. À pracinha pequena passou o povoa chamar “Tetéia”, tratamento carinhoso querecebia em casa a filha do alcaide, uma moçoi-la grande, muito gorda e rechonchuda, sem-pre metida nuns vestidos cheios de laços e

babados que a transformava num bebê tama-nho família. Ribamar Pereira, já dissemos, é oautor da marchinha carnavalesca do cordão dasmoças do “Lunáticos”. Mais tarde, morto o Ri-bamar e mudada a família para o Rio, ali insta-lou-se o “Foto Amorim”, sendo o titular um fotó-grafo capaz de milagres extraordinários, como odo retrato oficial do governador Paulo Ramos,feio de doer, que ele transformou em manceboformoso, de pele lisa e rósea, de fazer inveja aopróprio Narciso. Rugas, calombos, vales e cra-teras sumiram num passe de mágica, graças aovirtuosismo do artista que “terraplenou” tudo,fazendo do Quasímodo surgir um Adônis per-feito, de tal forma belo, que nem as artes do Dr.Pitangui conseguiriam igual!

Apegado, era a morada-inteira do Dr. JoséPires Sexto, o governador que, ao tempo darevolução de 30, saiu fugido pelos fundos doPalácio dos Leões, entregando o governo aoAjudante de Ordens, o Sargento Aprígio. Aolado, a Faculdade de Direito (a primeira doMaranhão), fundada por Henrique Couto eDomingos Perdigão, de memorável história etradição. Transpunha-se o Beco do Teatro (Go-dofredo Viana) e chegava-se ao “Anexo” do“Maranhão Hotel”, de Seu Castro, um belo so-brado com escadaria senhorial, onde, antesresidira a família Dunshee de Abranches (ci-tado em “O Cativeiro”) e, depois, a do Dr. Ge-nésio Rego. Hoje é o “Edifício Colonial”, umadas excrescências na paisagem colonial paraquem olha a cidade do bairro de São Francis-co. No antigo prédio, que ocupava praticamen-te metade do quarteirão, realizaram-se, no tér-reo, magníficos “salões de arte”.

Ao lado do teatro ficava o escritório da“Companhia de Cigarros Souza Cruz” (ondeeste memoriaista trabalhou e penou, confor-me relato em outra passagem desta história) econtíguo a este, a famosa “Movelaria” de Pe-dro Paiva, que congregou uma plêiade de mo-ços que se tornariam depois figuras exponen-ciais da literatura, da arte, da política, da ma-gistratura. Mais em frente vê-se o enorme so-brado de azulejos do “Instituto Nina Rodri-gues”, do saudoso poeta Carlos Cunha, sendoque o também sobrado, junto, abrigou a famí-lia Lages Castelo Branco, nossa aparentada.

Na Travessa da Passagem, no sobradinhode esquina, ficava a “República” dos portu-gueses-caixeiros da Praia Grande. Na mora-da-inteira seguinte, o pessoal de Amadeu Aro-so, acho que já sem o seu chefe. Eu o conhecina Rua Grande, na casa senhorial do Campode Ourique (depois AABB) e onde participeide um baile de carnaval que nunca esqueci: oAmadeu mandava fechar o portão para que osfoliões não fossem embora antes de consumirtoda a bebida que ele punha para gelar nagrande banheira de ferro esmaltada.

O enormíssimo sobrado de três andares,logo a seguir, residência de uma família cujonome não me lembra, foi por algum tempo sededa “Fundação Cultural” (embrião da Secreta-ria da Cultura), sob a dedicada direção domestre Domingos Vieira Filho, o administra-dor mais escrupuloso que jamais conheci, e,acredito, jamais existiu. Sua extremada hones-tidade até, por vezes, lhe embaraçava a ação,mas ele não abdicava da mais minuciosa fisca-lização, do mais rigoroso controle das contas, a

13 Ver também Rua Grande (Boletim 27) e Rua da Paz (Boletim 42).14 Historiador; folclorista; membro da Academia Maranhense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão e da Comissão Maranhense de Folclore.

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cujo sistema, para dar o exemplo, era ele oprimeiro a submeter-se. Onde se situam osconsultórios médicos dos Moreira Lima (meusqueridos amigos José Henrique, de saudosamemória, e o filho Henrique Augusto), moravao Sr. Arnaldo Júlio Correia, importante sóciode Joaquim Júlio Correia & Cia. Parece-me vê-lo à janela, em companhia da esposa, a apreci-ar o pouco movimento da rua na tarde calma, etenho presente, bem nítida, sua fisionomia bo-nachona, os óculos de aros de ouro que o torna-vam muito parecido com o primeiro-ministroalemão Helmut Koll. Defronte morou, por al-gum tempo, Osvaldo Soares e, depois, ali este-ve o Instituto Brasil-Estados Unidos. Hoje meparece que abriga uma repartição pública. En-tão chegamos ao sobrado dos Duailibes - SalimNicolau Duailibe e Linda Saddy Duailibe e osfilhos Vitória, José, Jorge, Alfredo, Maria deLourdes, João (meu colega, no Liceu), Zila, Luiz,Antônio Benedito, Carlos Alberto e Norma, to-dos empenhados em conservar e distribuir asimpatia e a fraterna bondade do povo libanês.Nessa casa Josué Montelo situou a história co-movente de seu romance “Os degraus do Para-íso”. Mais em frente e do mesmo lado, o “Colé-gio São Luiz Gonzaga”, da insigne professoraD. Zuleide Fernandes Bogéa que, com D. RosaCastro e D. Zoé Cerveira, formava o mais bri-lhante trio de educadoras do Maranhão. Ape-gado, o sobradinho do Sr. Delmiro Botelho e, naesquina, já com entrada pela Rua de São João,a residência e o museu de Osvaldo Soares, cujoacervo, vendido ao bispo, constitui 80% domuseu de Sobral, no Ceará.

Confrontando D. Zuleide, a bela residên-cia, o magnífico, o imponente, o extraordináriopalácio de José Francisco Jorge (pertenceu an-tes a Gomes de Souza, o genial matemáticomaranhense), do qual falo quando aludo às visi-tas que meu avô fazia ao seu patrão Zé Jorge.

Dr. Alexandre Costa, engenheiro (quechegou a Ministro de Estado e Senador daRepública; também meu ex-colega do Liceu),morou no sobrado, o primeiro da próxima qua-dra (com entrada pela Rua de S. João). Tam-bém aí foi a sede do IPASE - Instituto de Pen-sões e Aposentadoria dos Servidores do Esta-do, teatro da brilhante conclusão do Delegadode Polícia Paulo Pupupu, contada em outrocapítulo. Numa morada-inteira, em frente, re-sidia Dr. Tucídides Barbosa e logo após, o Dr.Brito Passos, na bela casa que ele mesmo cons-truiu, hoje sede do Sindicato dos Bancários.Defronte, na esquina da Rua das Flores (Pe-reira Rego), ficava o antigo “Grupo EscolarBarbosa de Godois”, depois “Tribunal Eleito-ral”, incendiado na época da “depuração” deSatu Belo e da famigerada “revolução de Eu-gênio Barros”. Transposta a rua, vinha a “Livra-ria Borges”, dos Borges (que o que tinham defeios tinham de gentis); a casa dos Carvalhos -Antônio Maria, meu companheiro de B.B.), ados Lobos (Lobão e Lobinho, também do Li-ceu) e o sobrado de Pedro Vasconcelos, váriasvezes citado nestas memórias.

Defronte, a “Farmácia Pedrosa” e o belopalacete de Manoel João de Moraes Rego,depois, de Jorge Nahuz e finalmente de Harol-do Cavalcante, pai de Célia, Lígia (ex-noiva domeu filho Álvaro), Heloísa e Junior. Na meia-morada junto, D. Odila Pinho, professora, quejá conheci velha, mas que caprichava na ma-quilagem, vestia-se na última moda, e que, fa-lando alto, acompanhava-se de largos gestosque faziam tilintar suas muitas pulseiras e porem evidência seus anéis de brilhantes. Lem-bro-me de uma noite em que se formou umgrupinho à porta do sobrado de meu tio. Épraxe antiga no Maranhão a derradeira con-

CONTINUAÇÃO

versa na calçada; demore-se o tempo que fordentro de casa, fale-se tudo o que se tem afalar, que sempre restará um assunto que háde prender as pessoas, à despedida, na portada rua. Estávamos, pois, nessa conversinha deúltima hora, quando ouvimos um chororó so-noro e forte, quebrando a solidão da hora tar-dia. Passada a surpresa, todos de uma vez iden-tificamos o ruído: Dona Odila satisfazia as exi-gências da natureza...

Junto do sobrado quedava-se a moradiade José Nunes, comerciante, onde Nely, sobri-nha do dono da casa, nos prodigalizava (a mime aos meus primos) gentilezas e carinhos e atése permitia receber-nos em trajes menores, noseu quarto. E foi por causa de uma dessas visi-tas que eu me atrasei, chegando tarde em casa,no Caminho Grande. Papai me perguntou ondeeu estivera e como lhe disse a verdade, leveiuns cachações... E embora ele nunca me ti-vesse explicado o porquê do castigo, dele melembrei depois em situações de perigo...!

Na esquina morava a família de José Do-mingues da Silva, Diretor da Estrada de Ferro,e irmão do ex-Governador Luís Domingues,pai de muitos filhos, entre os quais Maria, es-posa de Paulo Abreu, por sua vez pais de meuamigo Paulinho Abreu.

Contava o desembargador DomingosAmérico que, certo dia, encontrara-se com oJosé Domingues, vindo de palácio, e que sefelicitava por ter chegado a tempo de, mesmoem último lugar, inscrever seu nome no livrode presença da comemoração do aniversáriode Paulo Ramos, embora a reunião já se tives-se desfeito. “- Ora, Zé Domingues - disse-lheAmérico - todo mundo sabe que tu és puxa-saco, mas tu não precisas fazer propagandadessa fraqueza!”

Na casa em frente, com entrada pelo Becodos Craveiros (Pereira Rego) residia TotonhoLajes (Antônio) e de suas irmãs Cotinha (Ma-ria) e Canjinha (Arcângela). Antes fora resi-dência dos Cortês: D. Mariana, a matriarca dafamília, do filho Raimundo Maximiliano Cor-tês e da nora D. Ana Amália Machado (Sinha-zinha), tia-avó de minha mulher. Deste Cor-tês, um mentiroso de truz, rival de Cecílio Lo-pes, conto estórias em Acredite, amigo velho,do meu livro “As minhas e as dos outros”. De-fronte, a primeira casa do próximo quarteirãopertencia ao Dr. Hanleto de Godois (“O Chi-nês”, como era conhecido, por sua fisionomiatipicamente oriental), filho do historiador Bar-bosa de Godois, casado com d. Vinólia Pinhoe tendo por filha de criação uma menina sape-ca chamada Éthel. Chegava-se então ao escri-tório da Imobiliária de D. Vitória Coqueiro,dirigida pelo Sr. Tupinambá, e que enfrentavaa porta-e-janela do “Chocolate”, um mulatopernóstico, dono das lanchas do porto. Apega-do era a residência de outro Cortês (Zezico),funcionário dos Correios, casado com umaNeves e pai de Nevinha e Conchinha. De-pois, era a antiga morada de meu tio NavaRodrigues, onde jogávamos as “peladas” dasquais falo em outro lugar. Em frente, ficava oimponente sobrado de Miguel Nicolau Duaili-be (irmão do Salim), pai de Nicolau, José, Hen-ry, Herbert, Maria Lúcia, Tereza e Ivete; e naesquina, na morada inteira de mirante, que foide Aluísio Azevedo, residiu o desembargadorDomingos Américo de Carvalho, de quem jáfalamos tanto, (personagem do conto “O de-sembargador, o sofá e Gutemberg”, de meucitado livro). Anos mais tarde, a família doGeneral Alexandre Colares Moreira ocupou oprédio. Em frente, a residência do Dr. José deRibamar Ferreira, pai de Fernando, José eAntônio. Xis com eles, a família de meu amigo

José Monteiro e, ao lado, o médico Dr. Rai-mundo de Matos Serrão com a irmã Maria José,professora de Química. Defronte, o Dr. Urba-no Franco, que colecionava diplomas: advo-gado, farmacêutico, professor, ferreiro, sapa-teiro, alfaiate, etc., etc., etc.

Colado a ele, o desembargador HenriqueCosta Fernandes, Presidente do Tribunal deJustiça. Era uma figura estranha, caladão, cir-cunspecto, a quem Domingos Américo se refe-ria recitando, ferino: “- Costa Fernandes, CostaFernandes, Costa Fernandes.... de orelhas gran-des, de orelhas grandes, de orelhas grandes...”Chegava do Tribunal e entrava direto para asala de visitas. Vestia o pijama e sentava-se narede, permanentemente armada, onde almoça-va, lia, recebia os amigos e dormia. Dizia-se quetinha um penico, atrás da estante de livros, ondefazia suas necessidades, e dali só saía de novodiretamente para a rua.

Em frente era a mercearia de meu pai e osobradinho de nossa residência, que desmoro-nou com as chuvas... cenário de minha belamocidade. Na esquina, a “Padaria Vitória”,também fabricante de beijos-de-moça, e, dooutro lado, o sobrado de azulejos verdes dosJorge, Domingos e José, casados, respectiva-mente, com as duas irmãs Odessa e Odila.Parece-me vê-los, numa noite, tomando o car-ro para ir ao baile de máscaras, elas de vesti-dos longos, faiscantes de pérolas e pedrarias,de máscaras venezianas, eles de smoking esummer-jacket. Junto deles morava meu tioAntoninho Figueiredo, até a família se trans-ferir para Teresina (PI).

Logo adiante, do outro lado, D. EtelvinaDomingues da Silva, que foi minha professorade História, no Colégio de São Luís e, depois, acasa ajardinada de Seu Newton e D. NizethValente; vizinha, a meia-morada das irmãs Car-doso - Graci e Delci, colegas do Liceu e que,ainda no ginásio, morreriam tuberculosas.

Defronte, o grandioso sobrado de azulejosverdes de Zeca Pereira (pastor da Igreja BatistaCentral Ebenézer, patrimônio da família), aondefui, menino, com meus pais, à requintada recep-ção que o casal ofereceu à sociedade, para mos-trar as preciosidades que trouxera de sua recen-te viagem ao Egito! Um quarteto de cordas toca-va música de câmera e os criados, de libré, tran-sitavam pelos ricos salões, oferecendo canapés ebebidas finas às visitas, em grandes bandejas deprata maciça. A seguir, vinha a casa de D. Guio-mar Franco de Sá e, confrontando-a, a residên-cia de Othelo Cavalcante, pai de Haroldo e Ar-naldo. Chegamos, então, ao último prédio daesquina, a morada-inteira de Seu Éder Santos,pai de Maria da Graça e José Mário. Da casaantiga restam umas quatro paredes e o mirante enão há Patrimônio Histórico que consiga obrigaros Gaspar a restaurá-la; estão eles no firme pro-pósito de deixá-la cair de todo para então, com aconivência de um “governo amigo”, erguer alium espigão. (Oh! Brasil! Oh! Maranhão!)

“... as casas, como os homens, têm seu desti-no, com as suas exaltações e as suas humilha-ções. A barbearia modesta pode ser, amanhã,elegante loja de modas. Na sala em que funcio-nou a livraria pode estabelecer-se, dentro de umano, o seleiro, que vende arreios, ou o armeiro,que vende punhais.” Humberto de Campos.

Os restos da casa de Éder Santos agoraestá convertido em um estacionamento de au-tomóveis!

E aqui encerraríamos este nosso passeiopelo tempo, pela memória e pelo coração, semeu amigo Arlindo Carvalho não me cobrasseinsistentemente uma idêntica caminhada pelaRua dos Afogados. Para satisfazê-lo comece-mos partindo da Rua dos Remédios.

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Este ensaio foi constituído a partir de relatos de alguns moradores da cidade de

Cururupu. Tomamos como principal infor-mante o senhor Marcos Aurélio, de 30 anos,atualmente evangélico, mas que tem boaparte de sua família, inclusive sua falecidasogra, ligada a pajelança, tipo de manifesta-ção popular-religiosa do espaço social dacidade de Cururupu. Não a denominamoscomo religião afro porque percebemos nelatanto elementos “africanos” quanto indí-genas. Este trabalho foi realizado com resi-dentes do bairro de Areia Branca no perío-do natalino do ano de 2008.

Ao perguntar para um senhor se elesabia algo sobre Mãe d´Água, este nos res-pondeu que ela é um mito, que faz partedas muitas historias contadas na cidade deCururupu. Ele fez uma descrição de comoesta era representada pelos antigos. De acor-do com suas palavras, Mãe d´Água é umamulher branca, de cabelos brancos, e olhosazuis, muito formosa, mas alguns a descre-vem com cabelos loiros, de pele branca, deolhos azuis e roupa branca apresentando,portanto, diferença em relação ao relato dosenhor Marcos no cabelo e na forma de sevestir. Segundo o mesmo informante,quem quisesse vê-la deveria ir à fonte ou aorio ao meio dia, que é o horário que elacostuma está assentada na tábua onde asmulheres lavam roupa na beira dos rios.

Na descrição da forma física de Mãed´Água, o senhor Marcos nos informoutambém que ela possui guelras como as depeixe, no pescoço, e acrescentou que, se umhomem quisesse tê-la como companheiradeveria agir da seguinte maneira: quandoela estivesse tomando banho na fonte, sen-tada na tábua de lavar, molhando os seuscabelos, a pessoa interessada deveria correre golpeá-la nas costas com bastante força,para que ela vomitasse as guelras e o indiví-duo pudesse levá-la para a sua casa, paratorná-la companheira. No entanto, nãopoderia deixá-la comer peixe, caso contrá-rio ela voltaria a ter guelras e desapareceriada casa daquele que a levou.

Um detalhe interessante no relato dosenhor Marcos foi a comparação por ele re-alizada dela com Iemanjá. Ele não nos disseque são a mesma entidade ou pessoa, poisenfatizou uma diferença entre elas: uma édo mar enquanto a outra é dona das fontes,onde houver uma nascente lá estará ela. Éinteressante que uma senhora com quemconversamos em Cururupu se referia a ela(Mãe d´Água) sempre como Mãe da Fonte.

O senhor Marcos nos relatou que asmães costumavam proibir as crianças de iràs fontes ao meio dia e que também, inde-

Mãe d´aguaReinaldo Freitas Soares Junior15

15 Graduando de Ciências Sociais e membro do GPMINA– UFMA.

pendente de qualquer horário, elasnão deveriam brincar com um de-terminado tipo de peixe pequenoporque poderiam correr o risco deserem flechados por ela, o que sig-nifica ali receber uma correçãoou coação, que pode se manifes-tar por um mal estar físico. Se-gundo a senhora Florzinha, umade nossas entrevistadas, até parapegar água da fonte deve-se pe-dir permissão para a dona dafonte, isto também deverá serobservado para pegar água empoços. Segundo ela, o indiví-duo que fosse pegar água, prin-cipalmente no horário de 18:00horas, deveria dizer “com licen-ça”, pois como nos foi dito porela e por outros moradores dacidade de Cururupu, aqueleé o horário que ela está maisatuante ou que ela mais seapresenta. Como nos expli-caram, se um adulto ou cri-ança não cumprisse aquelaregra, ou se as crianças to-massem banho já passandodo meio dia ficariam doen-tes. Na grande maioria dosrelatos os sintomas apresentados seriamfebre e moleza no corpo, um dos sinais quede que teriam sido flechados.

O senhor Marcos nos disse também quenão tem informações convincentes sobre aexistência de Mãe d´Água, como tem do Cur-rupira. Ele nos afirmou que deste, de fato,ouviu muita coisa. Em seguida falou queele era um demônio e que, por causa dele,pessoas ficaram cegas literalmente. Na ex-plicação de nosso informante, as pessoasquando estavam na mata perdiam-se e, quan-do estavam na “boca” da saída, voltavam parao centro da mata por conta de Currupira.Segundo o senhor Marcos, esta entidadepossuía uma capacidade de influenciar aspessoas dentro da mata e que a única formade sair da floresta era o individuo vestir suacamisa do avesso, quando ficaria livre, oumelhor, poderia encontrar a saída, e que ovirar a camisa do avesso tem a ver com os pésdo Currupira, que são voltados para trás.

Ainda sobre Mãe d´Água, uma senho-ra nos relatou que antes da cidade de Cu-rurupu ter luz, iluminação elétrica, haviaperíodos da noite, principalmente das dezhoras em diante, que os indivíduos deveri-am ter cuidado ao sair porque, segundo al-guns, poderiam ser flechados ou ate mortospor aquela. Ela nos disse que a Mãe d´Água

assobiava e seu assobio possuía um poderhipnótico sobre aquele que escutava, e tam-bém nos disse que ela ia até a janela da casade determinadas pessoas para assobiar, comouma forma de “atuação” sob elas. Segundoesta informante, há dois casos que levam àsua “atuação” sobre uma pessoa: se alguémpegasse um de seus peixinhos, de sua fonte,ela ia até a residência daquele que pegou opeixe e se ele não ficasse doente “fisicamen-te” poderia ficar mentalmente, devido ao tipode ação que ela exerceria sobre a pessoa. Ooutro caso é o de pessoas que, segundo ela,possuem uma espécie de influencia, desde oseu nascimento, desse tipo de entidade, nocaso os hundinos (termo que indica um per-tencimento, uma predisposição de um de-terminado grupo de pessoas, sem explicaçãológica para quem não pertence ao grupo so-cial que dele se utiliza).

É evidente que nestes relatos encon-tramos algumas divergências, no entanto,isto não pode nos causar espanto ou des-confiança em relação à veracidade destesrelatos, porque cada um deles esta mediadopela experiência própria de cada indivíduo,com sua própria cultura e realidade, e nãopodemos esquecer que cada pessoa temuma forma de interpretar os fenômenoscom os quais se depara.

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Kirie, eleison.Chiste, eleison.Kirie, eleison.Chiste, audi nos.Chiste, exaudi nos.Pater de caelis, Deus, miserere nobis.Fili, Redemptor mundi, Deus,Spíritus Sancte, Deus,Santa Trinitas, unus Deus,Sancta Maria – ora pro nobis.Sancta Dei Génitrix,Santa Virgo virginum,Mater Chisti,Mater divinae gratiae,Mater puríssima,Mater castissima,Mater inviolata,Mater intemerata,Mater amabilis,Mater admirabilis,Mater boni consilii,

Maio, mês de Maria – Ladainha de N. SenhoraA devoção à mãe de Jesus em São

Luís é muito forte. Durante o mêsde maio muitas pessoas se reúnempara rezar a “Ladainha de Nossa Se-nhora”. Depois do Concílio VaticanoII os sacerdotes e ministros religiososcatólicos costumam rezá-la em portu-

guês, mas nas casas de culto afro-brasi-leiro, nas residências de devotos e nassedes de grupos folclóricos ela conti-nua cantada em latim, como ocorriano passado nos ambientes controladospelos sacerdotes. As ladainhas popu-lares apresentam algumas variações e

nelas, como era de se esperar, o latimnem sempre é o mesmo que fora ensi-nado nos seminários católicos, mas afé na Virgem Maria é a mesma. O tex-to transcrito a seguir é o cantado nomês de maio pela família de ZelindaLima, membro-titular da CMF.

LADAINHA DE N. SENHORA

Mater Creatoris,Mater Salvatoris,Virgo prudentíssima,Virgo veneranda,Virgo praedicanda,Virgo potens,Virgo clemens,Virgo fidelis,Speculum justitiae,Sedes sapientiae,Causa nostrae laetitiae,Vas spirituale,Vas honorabile,Vas insigne devotionis,Rosa mystica,Turris Davidica,Turris ebúrnea,Domus áurea,Foederis arca,Janua caeli,Stella matutina,Salus infirmorum,Refugium peccatorum,Consolatrix afflictorum,Auxilio chistianorum,Regina angelorum,Regina patriarcharum,Regina prophetarum,Regina apostolorum,Regina martyrum,Regina confessorum,Regina virginum,Regina sanctorum omnium,Regina sine labe originali concepta,Regina sacratissimi rosarii,Regina pacis.

Agnus Dei, qui tollis peccata mundi – parce nobis, Domine.Agnus Dei, qui tollis peccata mundi – exaudi nos, Domine.Agnus Dei, qui tollis peccata mundi – miserere nobis.

Ora pro nobis, sancta Dei Genitrix.Ut digni efficiamur promissionibus Chhrisri.

OremosConcede nos fâmulos tuos, quaesumus, Domine Deus, per-petua mentis ET corporis sanitate gaudere: ET gloriosaBeatae Mariae semper Virgonis intercessione a praesenti li-berari tristitia, ET aeterna perfrui laetitia. Per ChristumDominum nostrum. Amem.

Zelinda Lima*

* Versão fornecida por Zelinda Lima.

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Quando se trata de caracterizar as religiões deraiz africana no Brasil torna-se inevitável fa-

lar sobre o sincretismo com o catolicismo portugu-ês, esta é uma das principais características que per-meiam os estudos sobre as religiões afro-brasileiras.Portanto, vale retomarmos as origens deste tema.

No século XVI, quando os negros foram trazi-dos ao Brasil para serem escravizados vieram juntocom eles as religiões de várias etnias africanas. Nes-sa nova terra os cultos africanos encontraram, alémde outras culturas, o catolicismo – religião oficial e,sobretudo, obrigatória. Apesar de estarem sendocatequizados pela Igreja, durante o período em queforam escravizados os negros africanos cultuavamseus deuses nas senzalas.

Sendo a religião oficial o catolicismo e o cultoaos deuses africanos considerados heresia pela Igre-ja, os grupos religiosos negros passaram a mascarara adoração de seus deuses com a associação destescom os santos católicos, como meio de manteremsua religião. As relações entre divindades e santoseram feitas ligando-se as divindades aos santos queteriam características semelhantes às suas, por his-tória de vida ou por aspectos físicos e emocionais.

A princípio, o sincretismo com o catolicismofoi marcado pela resistência étnica e cultural donegro africano, resistência esta que foi passada avárias gerações até as religiões fundadas por antigosescravos se firmarem no cenário nacional. Com opassar dos séculos as religiões de raiz africana abri-ram suas fronteiras para diferentes raças e etnias,independentes de classe social.

Apesar da resistência do sincretismo impostoa partir do século XVI com o catolicismo, no sécu-lo XX o Candomblé iniciou um processo de aban-dono dos elementos do catolicismo e retomada dasorigens negras. Intitulado processo de africaniza-ção (PRANDI, 1991), há reflexões deste movimen-to no Maranhão. Em São Luís destaca-se o terreiroFanti-Ashanti que aderindo ao processo de africani-zação consagrou-se como terreiro de Candomblé.

Mesmo com toda força e valorização da reli-gião afro-brasileira no mercado religioso, ocasiona-das pelo processo de africanização, grande partedos terreiros (e reportamo-nos principalmente aosterreiros do Maranhão), mantêm em sua estruturaelementos do catolicismo e seus participantes, en-tre eles os pais e mães-de-santo, permanecem nasduas religiões: não só desenvolvem uma religiãoafro-brasileira tradicional (no sentido exposto porBastide (1983), todavia não mais como imposiçãopresente nos seus primeiros séculos de estabeleci-mento) como também são católicos praticantes –freqüentam missas, procissões e independentes deassociações com entidades adoram santos (práticacomum ao catolicismo popular brasileiro).

De certo que a religião afro-brasileira de agoranão é a mesma praticada pelos africanos escraviza-dos no Brasil, observamos o que antes era considera-do resultado de coerção social agora parece consti-tuir de maneira essencial as religiões afro-brasileirasque conhecemos. Esse é um dos aspectos mais mar-cantes nos terreiros da cidade de São Luís, tanto emseus elementos como entre seus participantes.

Apesar da associação dos santos católicos comentidades, percebemos algumas festas tendo os san-tos homenageados sem equivalências com as entida-des. O pai-de-santo da Tenda de Mina Santo Antô-nio (que completa 44 anos de fundação no dia 13 demaio) Tote nos declarou ser devoto de Maria e temo Rosário de Maria como livreto para guiar suasorações. Na Tenda Santo Antônio há festa para gran-de número de santos. As entidades do terreiro sãodevotas destes santos, dificilmente são comparadas

MINEIROS E UMBANDISTAS CATÓLICOS16Fabrine Pereira de Brito15

16 O conteúdo desse artigo é parte integrante da Monografia de conclusão do Curso de Ciências Sociais da UFMA, com modificações.17 Graduada em Ciências Sociais – UFMA; ex-bolsista de Iniciação Cientifica (PIBIC/CNPq 2005-2007) e membro do GPMINA/UFMA sob orientação de

Sergio Ferretti; ex-estagiaria do Centro de Cultura Popular Domingos Vieira Filho.

ou relacionadas a eles. Durante as cerimônias os mé-diuns lembram a todo o momento dos santos ho-menageados, pedem graças e gritam viva a eles.

D. Mariinha, mãe-de-santo da Tenda de Um-banda Santa Terezinha (25 anos de existência) reali-za várias missas e as ladainhas antes dos toques sãocantadas em latim no seu terreiro. Suas festas nemsempre coincidem com as festas dos santos. Devo-ta de São José de Ribamar, D. Mariinha não realizatoque em seu terreiro para ele, prefere ir ao festejoque acontece na cidade com o nome do santo, loca-lizada na ilha de São Luís.

Antes de iniciar os rituais, ao entrar no barra-cão e ao se dirigir até o altar os médiuns fazem osinal da cruz, como se entrassem em uma igrejacatólica, assim ocorre em diversos terreiros da cida-de. O próprio nome dos terreiros é homenagemaos santos. Outro aspecto a ser destacado é a reali-zação de missas nos terreiros, um ritual católicodentro do templo de outra religião.

Destacamos a festa do ano de 2005 na TendaSanto Antônio pela peculiar celebração do batiza-do dos filhos de alguns médiuns e missa, celebradosdentro do terreiro após o derrubamento do mastrono mês de dezembro levantado em homenagem aSanta Luzia. O festejo tem seus ritos iniciais no dia01 de dezembro com o levantamento do mastro etem seu término no dia 14 do mesmo mês com oderrubamento. Durante esse período o terreiro éprestigiado com toque de caixeiras e são feitas ho-menagens a Santa Bárbara (festejada no dia 04), aNossa Senhora da Conceição (festejada no dia 08) eSanta Luzia (festejada no dia 13).

No salão de danças foram colocadas váriascadeiras para os visitantes e uma mesa para o padreque ficou entre os dois altares do terreiro, na pare-de em frente ao portão de entrada do barracão. Oaltar das Pombagiras, entidades que possuem cultoespecial na casa e são comumente associadas a atri-butos negativos e sexuais foi coberto com uma capa.

A missa e o batizado foram realizados durante anoite. O celebrante foi o padre da Paróquia de SantaBárbara, em São Luís, Igreja Católica Apostólica Bra-sileira. O padre usava estola de cor verde, mesma cordas vestes de Santa Luzia. Como o período em queocorreu a festa era o do Advento, de acordo com aIgreja Católica as vestes deveriam ser de cor roxa. Osmédiuns estavam todos de branco e com lenços nacabeça, eles pediam benção ao padre beijando-lhe asmãos, da mesma forma que pedem a benção ao pai-de-santo. As caixeiras que tocaram no derrubamentodo mastro também assistiram a cerimônia.

A missa foi celebrada de acordo com a liturgiada Igreja Católica. No início da missa o padre fezbreve comentário sobre a importância de visitarreligiões diferentes das suas, falou que não há malem se conhecer o ‘outro’ e incentivava as pessoas aisso. Na homilia ele proferiu sobre a história deSanta Luzia, sobre um deus único e os santos. Emtorno de dez crianças estavam sendo batizadas, es-tas foram posicionadas formando um círculo eacompanhadas pelos padrinhos o padre batizou umaa uma. Padrinhos e madrinhas foram escolhidosentre os próprios médiuns.

Na Tenda Santa Terezinha enfocamos a missarealizada no dia 13 de maio do ano de 2006. Nestadata é comemorada no Brasil a abolição da escrava-tura. Para celebrá-la alguns terreiros de Mina e ter-reiros de Umbanda realizam toques para as entida-des conhecidas como Pretos-velhos. Na tenda San-ta Teresinha o dia 13 é comemorado com missapela manhã, almoço para os presentes, salva (aber-tura de festa, geralmente acontece pela manhã ouao meio-dia) no início da tarde e toque a noite.

A missa da manhã do dia 13 de maio de 2006aconteceu dentro do barracão ornamentado comtecidos e fitas de papel nas cores azul e branco. Aimagem de São Benedito estava no altar do terreiroe na mesa que colocaram para o padre celebrar amissa. A vela no centro do barracão estava acesa.Antes de a celebração ser iniciada defumaram obarracão. Foi encenada uma pequena dramatiza-ção no início da missa.

Enquanto entoavam um cântico a Verequete(divindade africana que adora a São Benedito) umasenhora negra de idade entrou com as mãos acor-rentadas e sentou frente ao altar da missa, logosurgiu D. Mariinha e retirou-lhe as correntes dasmãos. O padre congregado pela Igreja CatólicaApostólica Romana entrou em seguida e junto dasmédiuns acompanhou o cântico fazendo reverên-cia e defumação do altar.

O padre utilizava estola estampada compon-do suas vestes, apresentou a missa em homenagemàs mães, a São Benedito e a alguns falecidos. Seguiua missa de acordo com a liturgia católica e durantea homilia falou sobre Jesus Cristo, salvação, me-diunidade, escravidão e condições dos negros en-quanto subordinados. Explicou que a encenaçãoque inicializou a cerimônia simbolizava a liberta-ção dos escravos. Proferiu sobre a comemoraçãodo dia 13 de maio e lembrou os pais-de-santo quesofreram discriminação.

No ofertório as médiuns entraram com pe-quenas quantidades de café, arroz e açúcar. O padredisse representarem o que era produzido pelos ne-gros no tempo da escravidão. Os comentários dopadre durante a cerimônia sempre lembravam asmães, pois em maio é comemorado o Dia das Mães,e a D. Mariinha por ser mãe duas vezes (mãe e mãe-de-santo). No fim da celebração ocorreu a comu-nhão e distribuíram uma mensagem de paz para ospresentes. O padre aspergiu água benta com alfaze-ma nos presentes. Ele entregou o ramo para a D.Mariinha benzê-lo. Depois da missa doutrinaram aPreto-velho e cantaram parabéns servidos de cho-colate para beber e bolo.

Baseados em exemplos como estes, ressalta-mos a manutenção dos elementos do catolicismonão mais denotando condição de dominação, estessubsistem de forma espontânea com o culto dasdivindades. A dessincretização não se apresentacomo uma necessidade. Há uma contradição entreo crescente processo de africanização (em menorintensidade em São Luís) e a força do catolicismopopular nos terreiros. Nas missas realizadas nos ter-reiros os padres admitiram a diversidade religiosa.A grande maioria dos representantes das religiõescristãs, porém, não tolera a associação com as reli-giões de matrizes africanas. Elementos cristãos queforam adotados como meio de manter viva a cultu-ra religiosa africana no Brasil acabaram por torna-rem-se elementos “naturalmente” fundamentaisdessas religiões.

REFERÊNCIAS:

BASTIDE, Roger. Estudos afro-brasileiros. SãoPaulo: Editora Perspectiva, 1983.BRITO, Fabrine Pereira de. Tambor de Mina eUmbanda: sincretismo em terreiros de São Luís.Monografia (Graduação em Ciências Sociais) –Universidade Federal do Maranhão, São Luís,2008.PRANDI, Reginaldo. Os candomblés de SãoPaulo: a velha magia na metrópole nova. SãoPaulo: HUCITEC: Editora da Universidade deSão Paulo, 1991.

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É comum na trajetória de pessoas ligadas àreligião afro-brasileira a passagem por mais

de um terreiro (comunidade religiosa afro-bra-sileira), às vezes de denominações diferente(Mina, Umbanda, Candomblé e outras); a con-sulta a vários pais-de-santo e curadores; as ex-periências com o espiritismo, com o catolicis-mo e com outras religiões. Como era de se es-perar, essa pluralidade de experiências podeprovocar a mudanças acomodadoras nas reli-giões envolvidas e a levar algumas pessoasenvolvidas ao pertencimento a mais de umacomunidade religiosa.

O sincretismo da religião afro-brasileiracom o catolicismo e com outras religiões vemsendo observado pelos pesquisadores desdeNina Rodrigues, no final do século XIX. Essesincretismo, independente de ser um parale-lismo, uma fusão ou uma justaposição de reli-giões, tem sido interpretado como assimilaçãopelos escravos africanos da religião do coloni-zador imposta a eles pela catequese, ou temsido interpretado como uma camuflagem dereligiões africanas usada por afro-brasileirospara escapar da repressão sofrida por elas.

Apesar de na segunda metade do séculoXX alguns terreiros terem deflagrado um mo-vimento contra o sincretismo com o catolicis-mo e de procurarem se libertar da influenciadaquela religião, o catolicismo do “povo de san-to” continua forte. Muitos sacerdotes e adep-tos das religiões afro-brasileiras foram batiza-dos no catolicismo, quando crianças, e conti-nuam vinculados a essa religião pela fé rece-bendo sacramentos, participando de ritos ofi-ciais, de associações religiosas e realizando deritos do catolicismo popular, pois a Igreja Cató-lica, embora se apresente como universal e aúnica verdadeira – herdeira direta do cristia-nismo -, vem adotando no Brasil uma estraté-gia de “tolerância” em relação à religião afro-brasileira e tem aceito e até mesmo reconheci-do o catolicismo do “povo de santo”. Devido aesse duplo pertencimento religioso e tambémà falta de consciência da “completude” dasreligiões afro-brasileiras (de sua equiparação aoutras religiões existentes no Brasil), muitosmembros de terreiros sem engajamento no mo-vimento negro ou na luta contra o sincretismo,quando indagados sobre sua opção religiosacostumam afirmar que são católicos, em vezde se afirmarem como “mineiros”, adeptos docandomblé ou de outra denominação religiosade matriz africana.

Nos últimos anos tem também crescido onúmero de filhos-de-santo que tem ou teve al-guma vinculação com igrejas evangélicas (As-sembléia de Deus, por exemplo) ou que utili-zam ou já utilizaram os recursos terapêuticosda igreja Messiânica e de outras igrejas do blo-co protestante. Contudo, como as igrejas evan-gélicas não têm para com as religiões afro-bra-

VIROU CRENTE: SINCRETISMO E MUDANÇA DERELIGIÃO EM POPULAÇÕES AFRO-BRASILEIRAS

Mundicarmo Ferretti15

18 Antropóloga; membro da CMF.

sileiras a mesma “tolerância” apresentada pelaIgreja Católica a que nos referimos anterior-mente, muitos evangélicos ao se vincularem auma comunidade de terreiro se afastam de suascongregações evangélicas e muitos “médiuns”ao se vincularem a uma congregação evangéli-ca se afastam dos terreiros a que estavam vin-culadas, embora possam continuar a ler a Bí-blia com maior freqüência do que outros quenunca foram evangélicos. Mas, apesar desseafastamento e do controle exercido pelas igre-jas evangélicas sobre seus membros, os con-vertidos ao protestantismo provenientes deterreiros nem sempre abandonam inteiramen-te suas obrigações para com as entidades reli-giosas afro-brasileiras, como tem sido propala-do. Alguns tendem a reproduzir o “duplo per-tencimento” observado em relação ao catoli-cismo, embora nesse caso o duplo pertenci-mento costume ocorrer de forma menos decla-rada do que o observado nos “afro-brasileiroscatólicos”.

Até bem pouco tempo, os casos de con-versão de pessoas de religião afro-brasileira aoprotestantismo pareciam raros, mas, nos últi-mos anos, a experiência de afro-brasileiros como protestantismo, em especial com igrejas pen-tecostais ou neo-pentecostais, vem crescendobastante e, em São Luís, levou um terreiro deumbanda a fechar suas portas e a doar aomuseu do Centro de Cultura Popular do esta-do roupas e objetos de culto.

Freqüentemente se explica a ausência defilhos-de-santo nos rituais de religião afro-bra-sileira com a expressão “virou crente”, o quegeralmente parece normal e não suscita maio-res comentários na comunidade de terreiro.Além do conhecido proselitismo daquelas igre-jas e do costumeiro pertencimento dos filhos-de-santo a duas igrejas, para muitos deles areligião afro-brasileira é uma obrigação penosaassumida por imposição das entidades espiri-tuais ou recebida de antepassados escravosou pobres cuja memória nem sempre se gosta-ria de preservar. Embora uma percentagem sig-nificativa da população afro-brasileira hoje seorgulhe de ser negra e de suas entidades espi-rituais africanas, a ideologia do branqueamen-to ainda é bastante forte e a identificação coma África e com uma religião trazida por escra-vos continua sendo um fator negativo na afir-mação de sua identidade e na sua ascensãosocial. Deste modo a conversão ao protestan-tismo pode parecer a algumas delas como umaoportunidade de libertação de um pesado far-do, como nos foi explicado por uma vodunsique se afastou de um terreiro de mina da capi-tal maranhense: “eu sempre tive vontade deservir a Jesus de outra forma”...

Mas, embora a mudança de religião ou aadesão a outra “crença” (ou a outra “lei”) sejageralmente encarada nos terreiros com natu-

ralidade e ninguém costume recriminar a pes-soa que adotou tal opção, a comunidade deterreiro parece não considerar essa opção comodefinitiva ou irreversível e parece aguardar oseu retorno. Embora se afirme que as pessoassão livres para ter outra religião, fala-se que ocorpo de médium não pertence só a ele e, aqualquer momento, a entidade espiritual comquem divide aquele corpo pode trazê-lo devolta ao terreiro. E, se a pessoa que mudou dereligião, tiver ofendido gravemente o seu “guia”ou tiver um “guia” rancoroso, corre o risco deficar “doente da cabeça” e de ter que voltar aoterreiro em busca de cura (algumas dessaspessoas logo que se converteram quebraramas imagens dos santos de sua devoção e quei-maram as roupas que usavam quando recebi-am seus encantados).

Nos terreiros de mina São Luís os relatosde casos de pessoas que deixaram a religiãoafro-brasileira (às vezes por mais de 20 anos)para seguir outra “lei” e que, depois foram co-bradas ou castigadas por suas entidades espi-rituais e tiveram que retomar às suas obriga-ções para com elas para não ficarem loucas,abobalhadas, ou sofrerem outras desgraças.Durante a nossa pesquisa ouvimos falar defilha-de-santo que “passou para a lei de cren-te” e deixou de participar de rituais públicos,mas continuou colaborando com as ativida-des dos terreiros; que depois de convertida aoprotestantismo, vez por outra voltava ao terrei-ro em dia de festa, já incorporada, falando:“crente é ela, eu não tenho nada com isso”;retornou ao terreiro dizendo que não conse-guiu ficar na IURD porque o demônio era cha-mado o tempo todo.

Embora não se pretenda avaliar se o nú-mero de adeptos das religiões afro-brasileirasconvertidos ao protestantismo que “voltam àcasa paterna” é maior do que o dos que nãoretornam aos terreiros, o impacto da expansãodo pentecostalismo (ou neo-pentecostalismo)nas religiões afro-brasileiras é uma questão quemerece ser pesquisada e pode nos ajudar acompreender e importância das religiões afro-brasileiras para diversos segmentos da popu-lação afro-brasileira. O que se pode perceber apartir de dois depoimentos de vodunsis que seintegraram a igrejas evangélicas citados pornós anteriormente (“eu sempre tive vontadede servir a Jesus de outra forma” e “na IURD odemônio é chamado o tempo todo”), que ademonização das religiões afro-brasileiras quevem sendo realizada pelas igrejas pentecos-tais e neo-pentecostais, especialmente pelaIURD, parece não atingir profundamente osconvertidos provenientes das religiões afro-bra-sileiras e que é provável que muitos daquelesconvertidos não aceitem a redução a demôni-os das entidades espirituais cultuadas nas reli-giões afro-brasileiras.

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JANELA DO TEMPO

Ruben Almeida20

“FESTA DO DIVINO ESPÍRITO SANTO” NA CASA DE ROSA GUARDAMOR19

Mulata de estatura regular, gorda, es-padaúda, de cara larga, valia a pena se assis-tir aos festejos em honra do Divino.

Rosa Guardamor tinha esse sobreno-me por haver vivido com um guardamor doEstado.

Tinha belos cordões de ouro portugu-ês com crucifixo bem trabalhado, pulseirasde chapas estampadas, grossas escravas e degrandes argolas de ouro polido que lhe ba-louçavam nas orelhas.

Acostumara-se a usar camisas partidasde renda e de labirintos, pondo à mostraparte do colo, de saias ramalhudas e cheiasde folhos largos, Rosa andava diariamente,pelas ruas da Praia Grande, o Centro Co-mercial de São Luís.

No seu grosso pescoço, nos dias de fes-tas, quando não apresentava as suas jóiasde ouro, punha belas voltas de coral e ou-tras contas multicolores.

Em cada conta brilhante, que usavarefletia um valor.

Quando metida em saias feitas de reta-lhos ou amostras de chitas, que adquirianos grandes armazéns da Praia Grande, ou

lhe ofereciam os velhos portugueses comer-ciantes da cidade, Rosa Guardamor, torna-va-se uma das mulatas mais atraentes da-queles tempos.

As suas saias eram bem feitas e geral-mente costuradas a mão, davam a impres-são de serem as fazendas estampadas.

Por causa das grandes festas do DivinoEspírito Santo que realizava, se tornoumais conhecida ainda.

Nas Ruas do Passeio, do Norte e SantaRita, onde morou, deixou recordações agra-dáveis.

As caixeiras que podiam, envergavambonitas saias ramalhudas e casaco de ren-das e bordados, sandálias de veludo encar-nado, belos cordões de ouro com crucifixo,pulseira, broches e linda figa de azevicheeram usadas.

Na casa de Antônia Passo Largo, comoera conhecida essa festeira e na da velhaLibânea, à Rua do Outeiro, lugar mais co-nhecido por “Palhoça”, o fuzuê era tambémespantoso, pois, enfeitando o mastro viam-se galhos de murta, de fruteiras agitadospelo vento e no alto balançava uma bandei-

ra com a figura do Espírito Santo.Como já disse, era também assombran-

te a festança na residência do velho Caeta-no, à Rua da Palha. Era ele um festeiro,empregado da Alfândega de São Luís, e, naépoca dos festejos tornava-se incansável.Dava sempre aos festejos de sua casa umbrilho descomunal, tanto que de “cana-ca-pim” a cerveja e de muitas outras bebidaseram encontradas a fartar.

João Francisco, morador à Rua doMarajá, também fazia grandes festas. De-pois de muitos anos mudara-se esse festei-ro dessa rua para a de Santa Amélia.

Mãe Severa – velha mineira residenteno Apeadouro que fazia festança em ho-menagem ao Espírito Santo, com invulgarencantamento, desde o dia do levantamen-to do mastro em todos os terreiros, as ceri-mônias se estendiam até alta madrugada.

Na casa de Raimunda Conceição (co-nhecida por Maria Porca), bem em frenteao portão do largo do Matadouro, a festan-ça sempre fora de espantar. Tanto as indu-mentárias dos festeiros como as caixeirascausavam admiração geral.

19 Transcrito de Prosa, poesia e iconografia/Ruben Almeida. Coordenada por Alberico Carneiro Filho e Chagas Val. São Luís: SECMA, 1982. p.248-249. (Col.Série Inéditos 2).

20 Maranhense de ascendência portuguesa, falecido em 1979; catedrático de Língua Portuguesa do Liceu Maranhense e da Faculdade de Filosofia do Maranhãoe professor de Direito Civil da Faculdade de Direito do Maranhão; estudioso e grande apreciador da cultura popular; e membro fundador da ComissãoMaranhense de Folclore.

* Colaboração de Ester Marques - CMF; Professora UFMA;

MONOGRAFIA2008

ABREU, Poliana Marta Ribeiro de. Acrítica cinematográfica e suas adaptaçõesao suporte digital: breve análise do sitecríticos.com.br. MONOGRAFIA. Cursode Especialização em Jornalismo Cultural.São Luís, UFMA, 2008. Professora orien-tadora: Ester Marques.

RESUMO:Sabe-se que a web oferece espaço ilimi-

tado para todos os tipos de conteúdo, comas mais variadas intenções, desde a puradiversão até a divulgação de notícias e estu-dos científicos. Em virtude do espaço cadavez mais reduzido nos jornais impressospara o trabalho da crítica cultural – especi-almente a cinematográfica, objeto destetrabalho -, muitos críticos têm utilizado ainternet como meio de veiculação de seustextos, que têm como foco a análise de pro-duções cinematográficas. O presente arti-go pretende verificar como a crítica tem se

adaptado ao suporte digital e até que pon-to a utilização do ciberespaço é favorávelou prejudicial à formatação dos textos crí-ticos. Para tanto, será analisado o sitecriticos.com.br, que reúne um vasto con-teúdo elaborado por profissionais de reno-me na área.

BARBOSA, Andréia da Silva. Econo-mia da cultura em perspectiva: desafios parao estado do Maranhão. MONOGRAFIA.Curso de Especialização em JornalismoCultural. São Luís, UFMA, 2008. Profes-sora orientadora: Ester Marques

RESUMO:Este trabalho discorre sobre o tema da

economia da cultura e suas implicaçõespara o Maranhão. Ao analisar a combina-ção entre economia e cultura, discute a re-percussão na agenda pública e no cotidia-no, as possibilidades e variações do consu-mo cultural e a relação com os indicadoressociais, políticos e econômicos que permei-

am as argumentações da economia da cul-tura como elemento para superação da po-breza e de geração de trabalho e renda.

DIOGO AZOUBEL, Diogo. Fotogra-fia no Maranhão: perspectiva histórica epercurso de Dreyfus Nabor Azoubel. MO-NOGRAFIA. Curso de Especialização emJornalismo Cultural. São Luís, UFMA,2008. Professora orientadora: Ester Mar-ques.

RESUMO:O texto indica o fazer fotográfico em

São Luís - MA, desde o início da carreira deDreyfus Nabor Azoubel como fotojorna-lista e artista que, com suas imagens estáti-cas, revelou o espírito de uma época. Alémde tratar das peculiaridades de algumasimagens dele que servem de elo entre a atu-alidade e o passado em uma cidade arraiga-da de sentidos e significados, por vezes, dis-tantes. Trata-se de uma abordagem históri-ca que levou em consideração o contexto

RESUMOS E RESENHAS*

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RESUMOS E RESENHASsócio-econômico e político de São Luísdurante parte do século passado, nas esfe-ras fotojornalística e artística.

ESTEVANIM, Mayanna. A cachaçacomo produto da cultura maranhense.MONOGRAFIA. Curso de Especializaçãoem Jornalismo Cultural. São Luís, UFMA,2008. Professora orientadora: Ester Mar-ques.

RESUMO:Como uma bebida se insere no cotidi-

ano de uma sociedade? Será por prazer, para“afogar” as mágoas, para melhorar a saúde,para ser admirada e degustada ou para aca-bar com a timidez? Este artigo se propõe alevantar uma discussão sobre a presença daaguardente inserida na experiência doMercado da Praia Grande – se a presençadesta bebida se constitui como um produ-to da cultura e de que forma isto acontece.

EWERTON NETO, José de Ribamar.A invenção de nomes próprios: algo maisdo que um costume. Seráarte?MONOGRAFIA. Curso de Especia-lização em Jornalismo Cultural. São Luís,UFMA, 2008. Professor orientador: José deRibamar Ferreira Júnior.

RESUMO:Dentro do universo das palavras inven-

tadas, a criação de nomes próprios tem sidovista, com freqüência, como um costumeou mania de baixa densidade cultural. Oautor sugere que a carga de simbolismo ede busca de identidade inerentes a esse pro-cesso fazem com que este atinja muitasvezes, as complexidades peculiares às dofenômeno artístico.

FERREIRA, Bruno Soares. Abduçãosemiótica na Capoeira e São Luís. MONO-GRAFIA. Curso de Especialização em Jor-nalismo Cultural. São Luís, UFMA, 2008.Professor orientador: Arão Paranaguá deSantana

RESUMO:O presente artigo tem por objetivo abor-

dar o método da Consciência pelo Movi-mento, desenvolvido na Capoeiragem porMestre Patinho em São Luís – MA, e cons-truir pela semiótica, através da Abdução,imagens sobre as formas culturais de assi-milação da Capoeira nesse tipo de aprendi-zado. Para isso, serão utilizados os concei-tos da Comunicação da Experiência e deInteracionismo Simbólico sob a perspecti-va dos estudos culturais que vêm sendodesenvolvidos na contemporaneidade.

FREIRE, Karla Cristina Ferro. O reg-gae em São Luís na contemporaneidade:identificação cultural, segmentação e mer-cado. MONOGRAFIA. Curso de Especia-

lização em Jornalismo Cultural. São Luís,UFMA, 2008. Professora orientadora: Es-ter Marques.

RESUMO:O reggae em São Luís é um fenômeno

de massa. Popularizando-se entre as classessociais mais pobres, antes mesmo de se tor-nar midiático, o ritmo, importado da Ja-maica, conquistou espaço na Ilha atravésde um processo de identificação, que nãocompreendeu, necessariamente, uma im-posição cultural.

Com a ampliação do público do reggae,no entanto, o estilo musical ganha novasproporções, inclusive, na mídia hegemôni-ca do Maranhão. A partir de então, verifi-ca-se um movimento de segmentação doreggae, dos espaços, dos públicos e mesmodas formas de publicização do ritmo.

LISBOA, Conceição de Maria Caldas.Uma etnografia interpretativa dos blocostradicionais de São Luís. MONOGRAFIA.Curso de Especialização em JornalismoCultural. São Luís, UFMA, 2008. Profes-sora orientadora: Ester Marques.

RESUMO:Os Blocos Tradicionais compõem uma

categoria específica no conjunto de mani-festações culturais dentro do Carnaval deSão Luís (Maranhão), e estão particular-mente situados num cenário que incluioutras expressões como as Tribos de Índi-os, os Blocos Organizados, os Corsos, aCasinha da Roça, as Charangas, os BlocosAlternativos e as Escolas de Samba. Estesgrupos carnavalescos carecem de pesquisasque desvendem sua origem, registrem suatrajetória histórica, seus sentidos e as prá-ticas sociais no contexto em que estão in-seridos. Neste aspecto, o intuito deste tra-balho é pesquisar os Blocos Tradicionaisque, ainda, não possuem registros escritose documentais que abranjam algumas di-nâmicas aqui apresentadas.

LOBO, Juliana Campos. A mídia e o tam-bor: reconhecimento publicizado?. MONO-GRAFIA. Curso de Especialização em Jor-nalismo Cultural. São Luís, UFMA, 2008.Professora orientadora: Ester Marques.

RESUMO:Este artigo tem a intenção de suscitar

reflexões sobre o Tambor de Crioula no quetange a sua publicização enquanto Patri-mônio Imaterial da Humanidade. No perí-odo de um ano, foram analisadas as matéri-as da editoria de cultura veiculadas sobre amanifestação, em dois jornais de grandecirculação no Estado: O Imparcial e o Esta-do do Maranhão. A análise baseou-se noscritérios de noticiabilidade apresentadospor Mauro Wolf, um dos grandes teóricosda Comunicação Social.

MENEZES, Giselle Adrianne JansenFerreira de. A indústria cultural da Capoei-ra Angola de São Luís, Maranhão. MONO-GRAFIA. Curso de Especialização em Jor-nalismo Cultural. São Luís, UFMA, 2008.Professor orientador: Francisco Gonçalves

RESUMO:O presente artigo analisa a formação

do campo da capoeira angola na cidade deSão Luís (MA), apresenta o processo decomodificação da capoeira angola a partirda experiência dos grupos organizados noCentro Histórico, esboça uma análise crí-tica da inserção da capoeira angola na in-dústria cultural e, ao mesmo tempo, dessemercado cultural.

MORAIS, Maria do Carmo Lima. Ainvenção da expressão “Jamaica brasileira”.MONOGRAFIA. Curso de Especializaçãoem Jornalismo Cultural. São Luís, UFMA,2008. Professor orientador: FranciscoGonçalves

RESUMO: Atualmente São Luís éconhecida como a “Jamaica Brasileira” pelapresença e consolidação do reggae na capi-tal há quase 40 anos. Essa constatação fun-damenta-se no processo de criação e apro-priação da expressão, bem como nas rela-ções de interação simbólica estabelecidasdurante todos esses anos. A mídia, especi-almente, produtora e divulgadora do nome,sustenta esse discurso pondo em questão ojogo das sucessivas imagens construídas aolongo da história da cidade, descritas numbreve percurso simbólico.

NOGUEIRA, Gislleyne de LourdesCosta. EMOCORE – Grupo como leiturasocial. MONOGRAFIA. Curso de Especi-alização em Jornalismo Cultural. São Luís,UFMA, 2008. Professora orientadora: Es-ter Marques.

RESUMO:Após a Segunda Guerra Mundial

(1939-1945), várias reações foram desenca-deadas ao redor do mundo, em que gruposde caráter rebelde manifestaram-se de for-ma agressiva contra o sistema político etoda a situação que alastrava o mundo. Es-ses movimentos fizeram nascer dezenas degrupos “subalternos” ou simplesmente sub-culturas, que, tendo como suporte a músi-ca, expunham letras politizadas, em virtu-de das conseqüências da Grande Guerra.Punks aparecerem, dando origem ao Hard-core Punk – gênero musical enraizado dorock e grande influenciador para a forma-ção do Emocore. No primeiro momento,este artigo tentará definir e fazer algunsapontamentos sobre a estética da moda dogrupo Emocore traduzida pelo estilo de vidaque levam e suas características comporta-mentais.

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RESUMOS E RESENHASPELLEGRINI, Paulo Augusto Emery

Sachse. A atuação das fontes na constru-ção do discurso jornalístico. MONOGRA-FIA. Curso de Especialização em Jornalis-mo Cultural. São Luís, UFMA, 2008. Pro-fessor orientador: Francisco Gonçalves

RESUMO: Aborda-se o jornalismocomo forma de conhecimento, constituí-da e constituinte da realidade. Apresentam-se os principais fatores de construção dodiscurso jornalístico. Analisa-se o jornalis-mo como campo social capaz de conferirvisibilidade aos fenômenos e aos demaiscampos. Examina-se como se dá a atuaçãodas fontes na construção deste discurso.Compreende-se o processo de promoção deacontecimentos que se transformam empautas jornalísticas, através de determina-das estratégias institucionais.

PEREIRA JÚNIOR, José Antonio.You Tube: recriação ou descaracterizaçãoda linguagem do videoclipe? MONOGRA-FIA. Curso de Especialização em Jornalis-mo Cultural. São Luís, UFMA, 2008. Pro-fessora orientadora: Ester Marques.

RESUMO:O videoclipe conjuga, em uma só lin-

guagem, imagem e som. Em meados dosanos 80, este jeito de se produzir músicatomou conta dos veículos de comunicação,especialmente após o surgimento da MTV.Concebe-se, assim, videoclipe como produ-to da indústria cultural contemporânea.Com o avanço das novas tecnologias, surgi-ram diferentes espaços, como o site Youtu-be, para divulgação de videoclipes. Nessecontexto, discute-se até que ponto essenovo espaço recria ou descaracteriza a lin-guagem videoclíptica.

RAMOS, Januária Oliveira. Vitrinesda periferia: um breve olhar sobre o híbri-do e o kitsch expostos na feira da CidadeOperária. MONOGRAFIA. Curso de Es-pecialização em Jornalismo Cultural. SãoLuís, UFMA, 2008. Professor orientador:José de Ribamar Ferreira Júnior.

RESUMO: Este trabalho tem a inten-ção de mapear, dentro da periferia da cida-de de São Luís, alguns aspectos do hibri-dismo cultural do kitsch que podem ser vi-sualizados em pequenos produtos vendidosem mercados populares. Para esta pesqui-sa, o corpus escolhido é a feira da CidadeOperária, que é um dos bairros mais popu-losos da capital maranhense. Notamos queo hibridismo está presente neste ambientepor meio de objetos - muitos importadosde outros países como mercadoria piratea-da, e das criações que simulam realidades,recriam contextos e promovem encontrosinusitados na concepção visual dos produ-tos expostos. Vamos examinar esses aspec-

tos inusitados e verificar o kitsch em dife-rentes pontos de extravagância.

RODRIGUES, Wanderson Ney Lima.O Mercado da Praia Grande na contempo-raneidade. MONOGRAFIA. Curso de Es-pecialização em Jornalismo Cultural. SãoLuís, UFMA, 2008. Professora orientado-ra: Ester Marques.

RESUMO:Analisa-se a história do mercado mais

antigo do Maranhão, a Feira da Praia Gran-de. Seu surgimento, o posterior declínio e arecente revitalização são abordados. Consi-dera-se a série de transformações culturaisque influenciaram na maneira pela qual osvisitantes e feirantes se relacionam uns comos outros. Para compreensão deste fenôme-no, trabalhou-se com os conceitos de tradi-ção de Eric Hobsbawn, identidade de StuartHall e cultura de Clifford Geertz. A feira,antes tida como um espaço para a aquisiçãode produtos de primeira necessidade, passa aser encarada, contemporaneamente, comoum local de trocas culturais, de apresentaçõesfolclóricas e de manifestações religiosas.

SANTOS, Amarilis Cardoso. ProjetoEditoria do Suplemento Cultural e Literá-rio “GUESA ERRANTE”: Entre a teoria ea prática. MONOGRAFIA. Curso de Es-pecialização em Jornalismo Cultural. SãoLuís, UFMA, 2008. Professora orientado-ra: Ester Marques

RESUMO:A finalidade deste estudo é analisar os

Anuários do Suplemento Cultural e Lite-rário “Guesa Errante”, publicados há cin-co anos no Jornal Pequeno, como um exem-plo de Jornalismo Cultural. A idéia é verifi-car se os objetivos propostos por seu Edito-rial estão sendo cumpridos. A partir do pri-meiro editorial do Guesa Errante, a inten-ção é analisar os indícios textuais das pu-blicações dos Anuários, tentando observarse ele obtêm os efeitos desejados, tanto paraos editores, quanto para o público leitor,proposto pelo editorial.

SAUAIA, Anuar Sadat. O Boi da Mai-oba e a contemporaneidade. MONOGRA-FIA. Curso de Especialização em Jornalis-mo Cultural. São Luís, UFMA, 2008. Pro-fessor orientador: Francisco Gonçalves

RESUMO:Este trabalho propõe a discussão sobre

alguns conceitos como cultura popular nacontemporaneidade, transformações cultu-rais, tipologias culturais e tradição, a partirde uma perspectiva paradigmática que nãonegligencia o caráter dinâmico da cultura esua contextualização histórica. Como panode fundo, elegemos o Boi da Maioba em vir-tude de sua representatividade no campo

cultural maranhense. Nesse contexto trata-remos de demonstrar a construção simbólicaque todo aspecto de cultura contemporânearepresenta, utilizando a referida manifesta-ção e os aspectos de transformações mais re-centes observados neste grupo folclórico.Buscaremos fomentar, de alguma maneira,questões referentes ao debate sobre identi-dade cultural na contemporaneidade.

SILVA, Thatianny Cristina Soares e. OMecenato no Premio Universidade: demo-cratização ou alienação da cultura? MONO-GRAFIA. Curso de Especialização em Jor-nalismo Cultural. São Luís, UFMA, 2008.Professora orientadora: Ester Marques.

RESUMO:Processo de utilização da cultura como

ferramenta de mercado baseado na oferta.Analisa-se o Prêmio Universidade FM e arelação de mecenato com sua principal pa-trocinadora Vale - maior produtora mundi-al de minério de ferro - em termos de recur-sos destinados ao evento, observando seususos e efeitos dentro da complexificaçãodas sociedades globais.

VIEIRA, Raimundo Nonato de Araú-jo. Banca de revistas: um espaço democrá-tico, heterogêneo e de convivência cultu-ral. MONOGRAFIA. Curso de Especiali-zação em Jornalismo Cultural. São Luís,UFMA, 2008. Professor orientador: Silva-no Bezerra

RESUMO: Este estudo discute a ban-ca de revistas como o espaço de produção edisseminação de sentido. A banca de revis-tas é entendida como uma espécie de en-troncamento de informações, o que vemcaracterizá-la como específico na paisagemda cidade. Busca-se avaliar os diferentes si-nais presentes na banca de revistas, na con-dição de portadores de significados e queindicam modos de convivência social.

WADA, Mieko Damasceno. O reggaecomo instrumento político na cultura ma-ranhense. MONOGRAFIA. Curso de Es-pecialização em Jornalismo Cultural. SãoLuís, UFMA, 2008. Professora orientado-ra: Ester Marques.

RESUMO: A pretensão é entender oreggae como um fenômeno político demassa, tendo em vista sua predominânciatradicional nos bairros periféricos de SãoLuís, onde o nível de instrução de grandeparcela da população é limitado. A idéia éperceber como esta manifestação culturalpode influenciar os seus adeptos na horade escolher os seus representantes nos car-gos em que concorrem, tendo como ban-deira de luta o movimento regueiro, noMaranhão. A adesão de simpatizantes éresultante de vários artifícios de marketing,como a realização de eventos e festas, nosquais os representantes são simbolizadoscomo heróis.

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XIV CONGRESSOBRASILEIRO DE FOLCLORE

A cidade de Vitória, Espírito Santo, noperíodo de 24 a 29 de novembro de 2009, ésede do folclore brasileiro. Neste períodoacontece o XIV Congresso Brasileiro de Fol-clore que reúne folcloristas, mestres popu-lares, estudiosos e pesquisadores para de-bates sobre o tema: Folclore, DiversidadeCultural e Políticas Públicas para o SéculoXXI. Uma realização da Comissão Nacio-nal de Folclore, Comissão Capixaba de Fol-clore e a da Universidade Federal do Espíri-to Santo. Quem se inscreveu para apresen-tar trabalhos tem o período de 1º de junhoa 31 de agosto para envio de texto integraldos Artigos de Comunicações aceitas paraparticiparem do Simpósio. Mais informa-ções no site www.folclorecapixaba.org.br

REZAS, BENZIMENTOS EORAÇÕES EM LIVRO

Dona Zelinda Lima lança o livro Re-zas, Benzimentos e Orações: A fé do povo– resultado de suas anotações de pesqui-sadora e de seu convívio, desde a infância,com rezadeiras e benzedeiras, pessoas quecuram doenças com rezas e benzimentos.No livro encontramos biografias de san-tos, orações e rezas para achar coisas per-didas; maridos para moças e solteironas;contra tempestades e raios, etc. práticasdo povo simples na linguagem singela edireta que bem traduz a religiosidade po-pular. Numa brochura elegante, o livro temna capa foto de Edgar Rocha, da esculturade Magnólia Mendes (Magui) e ilustraçõesdo artista plástico Ciro Falcão, projeto eplanejamento gráfico de Edgar Rocha eNazareno Almeida.

NHOZINHO – IMENSASMIUDEZAS

A Casa de Nhozinho/SCP-SECMA,na Rua Portugal, 185, Praia Grande, cria-da, em 2002, para abrigar o acervo de brin-quedos populares dos artesãos maranhen-ses, recebe Nhozinho – Imensas Miudezas,exposição, edição de vida e obra em livro edocumentário sobre Antonio Bruno Pin-to Nogueira (1904-1974) artista maranhen-se, nascido em Cururupu, aos 32 anos, jáem estado de deformação, vem para SãoLuis. Notável pela superação das adversi-dades, limitações físicas, dor e preconcei-

Notícias – Roza Santosto, produz suas imensas miudezas: cofresde segredo, carrinhos de boi, brinquedos,caixa de rendeiras, rodas de brincantes debumba-meu-boi - miniaturas em buriti,palmeira nativa do Maranhão - preciosida-des que o imortaliza como artista popular.O museu Casa de Nhozinho, a Sábios Pro-jetos e a Arco e Arquitetura Produções sobo patrocínio da Merck, Lei de Incentivo doMinC, reuniram grande parte de sua obranesta exposição composta pelo acervo daCasa de Nhozinho, da Família Alcântara,da Família Dino e de Zelinda Lima. As fo-tografias, do acervo da família e de amigose do arquivo da Casa que leva o nome doartista. Depois do êxito na cidade do Riode Janeiro, realizada na Galeria mestre Vi-talino, no Museu do Folclore Edison Car-neiro, a exposição chega à São Luis. A cu-radoria e projeto de exposição é de HeloisaAlves e equipe técnica.

CRIME DA BARONESA,SÉC. XIX, JULGAMENTO

SIMULADO

Alunos do 4º período do Curso de Di-reito da UNDB, sob a Coordenação Geralda professora Especialista Marineis Mer-çon, realizaram, dia 9 de maio, ciclo de pa-lestras e uma simulação do julgamento daBaronesa de Grajaú, crime ocorrido em1876, trabalho efetivado a partir da obra“O Crime da Baronesa” de autoria do Dr.José Eulálio Figueiredo de Almeida, juizmaranhense. Os alunos puderam discutiro impacto da acusação contra uma barone-sa na Província do Maranhão, em meadosdo século XIX, além de tentar expressar umpouco do clima e da tensão que causou naSão Luís da época o crime em que a vítimaera um negro escravo. Foram apresentados,ainda, um vídeo acerca do espaço social quea Baronesa de Grajaú ocupava e uma refle-xão crítica sobre o papel do negro, e umapeça teatral do julgamento da baronesa comacompanhamento musical da regente docoral da UNDB, Angélica Vieira da Silva.As apresentações envolveram 150 graduan-dos do Curso e o ciclo de palestras contoucom a participação especial dos professo-res Dr. Sérgio Ferretti e Dra. MundicarmoFerretti, do Mestrado de Ciências Sociaise Políticas Públicas da UFMA. No términodo evento a Dra. Mundicarmo doou à bi-blioteca da UNDB o livro organizado porela “Pajelança do Maranhão no séc.XIX: oprocesso de Amélia Rosa’”. São Luís: CMF/FAPEMA.2004 que gira em torno do pro-cesso-crime de Amélia Rosa, cognominada

Rainha da Pajelança, condenada com vari-as companheiras, entre as quais a mãe dedois meninos escravos mortos em São Luisno Crime da Baronesa. O referido proces-so, localizado no Arquivo Histórico do Tri-bunal de Justiça do Maranhão, foi trans-crito por Jacira Pavão, com bolsa da FAPE-MA e orientação da organizadora do livro.

NOVO DICIONÁRIOHISTÓRICO-

GEOGRÁFICO DAPROVINCIA DO

MARANHÃO

A Academia Maranhense de Letrasentrega aos pesquisadores a terceira edição- revista e ampliada pelo acadêmico e editorapaixonado Jomar Moraes - do DicionárioHistórico-Geográfico da Província do Ma-ranhão, concebido por César AugustoMarques, em 1870. Na versão 2009, JomarMoraes nos revela um novo Dicionário,uma obra volumosa com 1.028 páginas,1.559 verbetes e 1.508 anotações, trabalhoque durou 10 anos de dedicação desse mes-tre em edições e reedições de livros da his-tória e da cultura do Maranhão. O “Dicio-nário Histórico-geográfico da Província doMaranhão” é uma obra com informaçãosobre a história e geografia do Maranhãocolonial, imperial e republicano: das inva-sões francesa e holandesa às povoações in-dígenas; da Companhia de Jesus à Compa-nhia de Comércio; da revolta de Bequimãoà Balaiada; da proclamação da Constitui-ção Política do Império ao Governo de Ja-ckson Lago; do Parque Antonio Vieira ao“Jornal de Timon” (de João Francisco Lis-boa). Nesses 140 anos do Dicionário, vári-os estudiosos da história e acadêmicos emgeral se debruçaram no original e contribu-íram na recomposição dos apontamentosde César Marques. Num primeiro momen-to o acadêmico Antonio Lopes incluiu naobra novas informações. Mais adiante umacomissão formada pelos historiadores Má-rio Meirelles, Domingos Vieira Filho e Vir-gilio Domingues, analisaram os aponta-mentos de César Marques com o intuitode reeditá-lo. Porém só em 1970 publicou-se a segunda edição, idealizada por Raimun-do Nonato Cardoso que fez a costura ne-cessária dos originais de César Marquescom as anotações de Antonio Lopes. Em2009, do alto de seus 70 anos, Jomar Mora-es nos presenteia com o resultado de seuCurso Intensivo de História do Maranhão.

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CARTILHA DEARQUEOLOGIA

O Centro de Pesquisa de História Na-tural e Arqueologia do Maranhão lança aCartilha Arqueologia do Maranhão visan-do desenvolver trabalho de educação patri-monial junto às escolas, aos freqüentado-res das suas exposições temáticas e nas co-munidades interioranas. Relata com ilus-trações o grande potencial de nosso patri-mônio arqueológico, os sítios arqueológi-cos identificados, assim como a presençade índios que por volta de 10.000 anos AP(antes do presente) sobreviveram pratican-do a caça, coleta e pesca, produzindo arte-fatos de pedra e assando seus alimentos emfogueiras. A Cartilha tem concepção e tex-tos de Deusdédit C. Leite e Eliane Gaspare Projeto Gráfico de Henrique Dias. OCentro de Pesquisa fica na Rua do Giz, nº59 - Praia Grande – São Luis-MA. Fone(98) 3218 9906. Aberto à visitação de 2ª a 6ª.

FOTOGRAFIA E MEMÓRIAEM DEBATE

Fotógrafos, cineastas, produtores cul-turais e professores participaram do Ciclode Debates Fotografia e Memória: Histó-ria e Políticas Públicas no Maranhão. En-tre os aspectos de reflexão estavam a foto-grafia enquanto expressão estética e docu-mental e a promoção da fotografia e doaudiovisual no Maranhão. O debate apon-tava para a urgência de implantação doMuseu de Imagem e do Som do Maranhão.Dias 24, 25 e 26 de março. Realização: SE-CMA, FUNARTE/ Programa Rede Naci-onal Funarte Artes Visuais, UFMA/Pro-grama de Mestrado em Cultura e Socieda-de/Núcleo de Etnologia e Imagem;UEMA/Centro de Ciências e Tecnologia/Curso de Arquitetura e Urbanismo.

IV SEMANA DO TEATRODO MARANHÃO

A Diretoria do Teatro Arthur Azevedorealizou, no período de 23 a 29 de março, aIV Semana do Teatro no Maranhão. Como tema Abrindo Cortinas para o Mundo,levou para teatros, museus, praças e sedesde grupos teatrais em São Luis e aos muni-cípios de Vargem Grande, Miranda do Nor-te, Paço do Lumiar, Cururupu, Humbertode Campos, Bacabal e Arari, de 01 a 05 deabril, espetáculos, performances, oficinaspalestras, cortejo, leituras dramática e ex-posição.

CONTINUAÇÃO

HISTÓRIA DOMARANHÃO

OITOCENTISTA

O Curso de História da UniversidadeEstadual do Maranhão realiza Simpósio deHistória do Maranhão Oitocentista. A con-ferencia “As províncias e a construção doEstado Brasileiro” pelo Doutor Théo Lo-barinhas Piñeiro (UFF) abriu o evento e asmesas-redondas sobre o Maranhão Oito-centista deram enfoque: a construção doestado; à escravidão; à religião; aos docu-mentos e arquivos; aos gênero e família; àliteratura; e ao ensino, livro e leitura. Dias22 a 24 de abril.

MÚSICA NO MUSEU2009/O ANO DE VILLA-

LOBOS

A Diretoria do Museu Histórico e Ar-tístico do Maranhão recebeu dia 26 demarço o Quarteto Colonial: Doriana Men-des, Daniela Mesquita, Geilson Santos eLuiz Kleber Queiroz que interpretaramCanções Brasileiras de Villa-Lobos ao sé-culo XXI. O projeto Musica no Museu,patrocinado pelo BNDES/Lei de Incenti-vo MinC, comemora os 50 anos da mortedo compositor brasileiro Heitor Villa-Lo-bos. Direção de Sérgio da Costa e Silva.

MUSEUS E TURISMO:VIAJE NO TEMPO

Os museus de todo Brasil comemoramo 18 de maio – Dia Internacional de Mu-seus, com a 7ª Semana Nacional de Mu-seus. Este ano o tema Museus e Turismo éuma demonstração da potencia, da atuali-zação e do desenvolvimento do campo mu-seal do Brasil, bem como da importância dese investir na relação museus e turismo. OMHAM abriu a Semana com a palestraMuseu - Equipamento Turístico comoMeio de Comunicação e Informação”, pro-ferida pelo Prof.Dr. Francisco Gonçalvesda UFMA.

MUDANÇAS NA SECMA/GOVERNO ROSEANA

A posse da Governadora Roseananos trouxe novo naipe de administra-dores da SECMA, alguns já empossa-dos: Secretário de Estado da Cultura – LuisHenrique de Nazaré Bulcão; Secretaria

Adjunta – Marlildes Mendonça; Superin-tendente de Cultura Popular – Sérgio Ha-bibe; Diretor do Centro de Cultura Popu-lar Domingos Vieira Filho – Sebastião Car-doso Junior; Diretor da Casa de Nhozinho– Jandir Gonçalves; Superintendente dePrograma Mais Cultura – Cláudio Pinhei-ro; Superintendente de Ação e DifusãoCultural – Wellington Reis; Diretor doCentro Pesquisa de História Natural e Ar-queologia do Maranhão – Deusdédit Car-neiro Leite Filho; Superintendente de Pa-trimônio Cultural – Margareth Figueire-do; Teatro Arthur Azevedo – Roberto Bran-dão; Museu Histórico e Artístico do Mara-nhão – Maria Luisa Raposo; Diretor Bibli-oteca Pública Benedito Leite – Rosa Ma-ria Ferreira.

A CULTURA NAPREFEITURA MUNICIPAL

O prefeito João Castelo, formou a suaequipe, para administrar a cultura de SãoLuís, com nomes conhecidos nos festivaisde cinema e de música: Fundação Munici-pal de Cultura – Euclides Moreira Neto;Chefe de Gabinete – Mauro Falcão; Coor-denador Financeiro - Márcio Berredo; Co-ordenador de Eventos – Fernando Olivei-ra; Assessor de Imprensa – Joel Jacintho;Assessores Técnicos – Breno Ferreira, Cel-so Brandão e Francisco Colombo

CLAUDETE NASECRETARIA DE

IGUALDADE RACIAL

Claudete Ribeiro, professora de Histó-ria aposentada da UFMA e ex- Presidenteda FUNAC, tomou posse como Secretáriade Igualdade Racial. A professora tem umavasta experiência em questões relativas aopovo negro e atualmente trabalhava comadolescentes em situação de risco, no Co-roadinho.

PERDA DE MESTREPOPULAR

Antonio Vieira – morreu, na manhãde 7 de abril, aos 88 anos, no UDI Hospital,vítima de acidente vascular cerebral, e en-terrado dia 8 no Cemitério do Gavião. Ar-tistas de todas as vertentes foram homena-gear o mestre Antonio Vieira, compositor,cantor arranjador e percussionista, que fa-ria 89 anos, dia 9 de maio. Suas músicasforam gravadas por Rita Ribeiro, Rosa Reis,Mano Borges, Elza Soares, Sivuca, Ary Loboe Zeca Baleiro, citando alguns.

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Antônio Vieira, a escolha do nome pa-rece ter sido premeditada, fruto de um amortropical entre Seu Wilson Vieira e DonaItamar Farias, nasceu na Rua de São João,centro de São Luís, aos 09 dias do mês demaio do ano de 1920.

Nascido em família humilde, MestreVieira como ficou eterna e carinhosamen-te conhecido, dividia com mais 03 irmãosos cômodos apertados de sua casa. O pri-mogênito da família Vieira logo cedo seriaapadrinhado pela família Lomba (descen-dente de portugueses) que lhe proporcio-nou novas possibilidades oportunamenteaproveitadas. Sua adolescência rotineira edisciplinada, o transportaria para um “mun-do paralelo”, imaginário e proibido: o mun-do da música. O retorno para a casa dospais biológicos, devido o falecimento do pa-drinho João Batista, foi marcante em suavida, realidades diferentes despertaram emVieira reflexões em torno da sociedade, pre-sentes em suas composições.

Concluído o curso de Contador pelaEscola Superior de Comércio Centro Cai-xeiral transitou em várias áreas profissio-nais: milícia de guerra, mecânico, comerci-ante, motorista, diretor administrativohospitalar... Até se dedicar exclusivamenteao mundo mágico da música. Sua primeiracomposição, Mulata Bonita, ocorrida aos16 anos, retratou sua visão apaixonada pelavida e claro pela mulher maranhense: “Issonão é mais do que uma ode elogiando a be-leza da mulata, eu acho que as mulatas sãoperfeitas de corpo, são mais bonitas que asbrancas, a música foi para todas as mara-nhenses”, segundo ele (2004).

Freqüentador de programas de rádio,se dizia “macaco de auditório” da RádioTimbira, sua primeira apresentação profis-sional nos idos de 1942, foi realizada no

PERFIL POPULAR

Mestre Antonio VieirMestre Antonio VieirMestre Antonio VieirMestre Antonio VieirMestre Antonio Vieiraaaaa

21 Nivia Saraiva dos Santos - Especialista em História do Maranhão (UFMA); Professora do Ensino Público e pesquisadora da vida e obra de Antonio Vieira.

Nívea Saraiva20

conjunto vocal Anjos do Samba, a partirdaí Antonio Vieira despontaria para umatrajetória musical que o levaria ao reconhe-cimento e sucesso a partir da gravação docompacto Velhos Moleques participandode diversos conjuntos musicais: JB Trio,Tira-Teima, Bambaê, Urubu Malandro, ci-tando os mais conhecidos.

A primeira composição gravada em suavoz foi “Na cabecinha da Dora”, no vinilVelhos Moleques, em 1986. Parcerias comgrandes amigos enriqueceram seu acer-vo: Nascimento de Moraes Filho, LagoBurnett, Pedro Giusti, Oton Santos,Lopes Bogéa com quem, inclusive,lançou o livro e vinil Pregões deSão Luís.

Seu primeiro trabalhosolo, CD-O Samba é bom,foi lançado somente em2001, a partir daí ma-ranhenses se ren-deriam ao talentodessa pérola negra. Seu cancio-neiro foi várias vezes premiado: II FestivalMúsica Nova no Maranhão Novo, FestivalA Voz de Ouro do ABC (SP), indicação noPrêmio Sharp, Personalidade Cultural doMaranhão, Prêmio Universidade FM, Fes-tival de Música Carnavalesca...

Antônio Vieira, compositor, intérpre-te, percussionista e arranjador, tornou-seum dos mais completos representantes douniverso musical maranhense, alcançandotambém sucesso nacional, fez da músicasua razão de ser, é dono de um estilo ímparde compor e interpretar o Maranhão, suasquase 400 composições entre sambas, val-sas, canções, marchas, toadas e boleros fo-ram inspiradas no cotidiano popular comtemas regionais e influenciadas pelo talen-to de grandes referências artísticas locais:Armando Cavalcanti, Nilton Vieira, Ser-

gio Miranda, Agostinho Reis, Messias, Pe-dro Giusti, Sidney Maciel... Assim comoNoel, Ary Barroso, Lupicínio...

As composições do Mestre Antônio Viei-ra refletiam uma visão particular de mundo,poemáticas-reflexivas, não retratavam um Ma-ranhão ilusório e sim o real, vitimado pelasmazelas humanas. Sua música sempre o reju-venesceu, ele sempre dizia que não sentia avelhice chegar porque se refugiava nesse mun-do atemporal acompanhado de seu inesquecí-vel violão. Falecido a sete de abril de 2009, An-tônio Vieira foi coroado “anjo do samba”.

Finalizo com uma frase de nosso eter-no Mestre que sempre foi motivo de nos-sas inúmeras discussões, a valorização denossa cultura: “Meu maior desejo é que opovo brasileiro escute a minha música; nãohá glória maior para o compositor”.

Que seja feita a sua vontade!