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Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP Departamento de Engenharia de Construção Civil ISSN 0103-9830 BT/PCC/543 José Luís Serra Ribeiro Sílvia Maria de Souza Selmo São Paulo 2010 Método e critérios para a previsão de compatibilidade eletroquímica de reparos localizados em estruturas com corrosão de armaduras induzida por carbonatação.

Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP Departamento ...maior rapidez e despassivar a armadura, tornando-a mais suscetível à corrosão do que antes do reparo. Após o surgimento

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Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP

Departamento de Engenharia de Construção Civil

ISSN 0103-9830

BT/PCC/543

José Luís Serra Ribeiro Sílvia Maria de Souza Selmo

São Paulo – 2010

Método e critérios para a previsão de compatibilidade eletroquímica de reparos

localizados em estruturas com corrosão de armaduras induzida por carbonatação.

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Escola Politécnica da Universidade de São Paulo Departamento de Engenharia de Construção Civil Boletim Técnico – Série BT/PCC Direto: Prof. Dr. Ivan Gilberto Sandoval Falleiros Vice-Diretor: Prof. Dr. José Roberto Cardoso Chefe do Departamento: Prof. Dr. Orestes Marracini Gonçalves Suplente do Chefe do Departamento: Prof. Dr. Alex Kenya Abiko Conselho Editorial Prof. Dr. Alex Abiko Prof. Dr. Francisco Ferreira Cardoso Prof. Dr. João da Rocha Lima Jr. Prof. Dr. Orestes Marraccini Gonçalves Prof. Dr. Paulo Helene Prof. Dr. Cheng Liang Yee Coordenador Técnico Prof. Dr. Alex Kenya Abiko O Boletim Técnico é uma publicação da Escola Politécnica da USP/ Departamento de Engenharia de Construção Civil, fruto de pesquisas realizadas por docentes e pesquisadores desta Universidade. Este texto faz parte da tese de título “Contribuição para a avaliação da compatibilidade eletroquímica entre argamassas de reparo e concreto carbonatado”, que se encontra à disposição com os autores ou na biblioteca da Engenharia Civil.

FICHA CATALOGRÁFICA

Ribeiro, José Luís Serra Método e critérios para a previsão de compatibilidade eletroquímica de reparos localizados em estruturas com corrosão de armaduras induzidas por carbonatação. – São Paulo : EPUSP, 2010. 22 p. – (Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP, Departamento de Engenharia de Construção Civil, BT/PCC/543) 1. Concreto armado (recuperação) 2. Argamassas (compatibilidade) 3. corrosão galvânica 4. Aço carbono I. Selmo, Sílvia Maria de Souza II. Universidade de São Paulo. Escola Politécnica. Departamento de Engenharia de Construção Civil III. Título IV. Série ISSN 0103-9830

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RESUMO

MÉTODO E CRITÉRIOS PARA A PREVISÃO DE COMPATIBILIDADE

ELETROQUÍMICA DE REPAROS LOCALIZADOS EM ESTRUTURAS COM

CORROSÃO DE ARMADURAS INDUZIDA POR CARBONATAÇÃO A durabilidade das estruturas de concreto tem se tornado um assunto de interesse mundial nas últimas décadas. Os custos econômicos associados à recuperação de estruturas são cada vez maiores. A corrosão de armaduras de aço-carbono é freqüente nessas intervenções, e o seu tratamento requer um diagnóstico adequado, além da escolha de produtos e técnicas apropriadas aos elementos em reparação.

No Brasil, a técnica de intervenção corretiva mais utilizada é a de reparos localizados com argamassas industrializadas à base de cimento Portland, modificadas com aditivos e adições. Um dos insucessos desse tipo de tratamento é a volta da corrosão nas armaduras, porém localizada em áreas adjacentes ao reparo, que antes estavam intactas. Isto ocorre com maior freqüência em estruturas de concreto aparente, ou em certos elementos das estruturas comuns, com condições críticas de exposição à umidade. Esse tipo de deterioração em armaduras já reparadas é conhecido na literatura como ânodo incipiente e decorre das mudanças nas características eletroquímicas do meio que envolve o aço na região do reparo, em relação ao concreto original. Estas mudanças, por sua vez, podem levar a um desequilíbrio de potencial de corrosão entre as regiões da barra de aço nesses meios, dando origem à chamada incompatibilidade eletroquímica e desencadear a corrosão por macrocélula.

Este trabalho apresenta um método para a avaliação da compatibilidade eletroquímica entre materiais de reparo e um substrato de concreto carbonatado de uma estrutura de concreto com problemas de corrosão. O método foi elaborado com base nos experimentos da tese de Ribeiro (2010). Os critérios sugeridos são exclusivos para a corrosão de armaduras induzida por carbonatação e umidade e não se aplicam à corrosão por outros agentes agressivos.

Palavras-chave: estruturas de concreto, corrosão de armaduras, reparo localizado, compatibilidade eletroquímica, macrocélula de corrosão.

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ABSTRACT

METHOD AND CRITERIA FOR THE PREDICTION OF ELECTROCHEMICAL

COMPATIBILITY OF PATCH REPAIRS IN STRUCTURES WITH REINFORCEMENT

CORROSION INDUCED BY CARBONATION

The durability of concrete structures has become a subject of global interest in the past decades. The economic costs associated with the recovery of structures are increasingly higher. Corrosion of carbon steel reinforcement is common in these interventions, and its treatment requires proper diagnosis as well as the selection of products and techniques suitable for the elements being repaired.

In Brazil, the most widely used corrective intervention technique is the patch repair with industrialized Portland cement mortars modified with additives and additions. One drawback of this type of treatment is the recurrence of reinforcement corrosion in areas adjacent to the repair, which were previously intact. This occurs more often in exposed concrete structures, or in certain elements of common structures, under critical conditions of exposure to humidity. This type of deterioration in repaired structures is known in the literature as incipient anode and results from changes in the electrochemical characteristics of the medium surrounding the steel in the repair area in comparison with the original concrete. These changes may lead to a corrosion potential imbalance between the regions of the steel bar in these mediums, in turn leading to electrochemical incompatibility and macrocell corrosion.

This paper presents a method for assessing the electrochemical compatibility between repair materials and a carbonated concrete substrate of a concrete structure with corrosion problems. The method was based on experiments described in the doctoral thesis by Ribeiro (2010). The suggested criteria are unique to reinforcement corrosion induced by carbonation and moisture, and do not apply to corrosion by other aggressive agents.

Key-words: concrete structures, reinforcement corrosion, patch repair, electrochemical compatibility, corrosion macrocell.

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1 INTRODUÇÃO A recuperação de estruturas de concreto com corrosão de armaduras, por meio de

reparos localizados, deve envolver decisões criteriosas, para a seleção de

materiais e sistemas de reparo.

O grande incremento de novos materiais de reparo no mercado mundial aumentou

a complexidade para a seleção de materiais em projetos de recuperação, assim

como o potencial de ocorrência de problemas (MAILVAGANAM, 2001;

VAYSBURD et al., 2004).

Por outro lado, normas recentes como a série EN 1504 que trata da proteção e

reparo das estruturas de concreto, aprovada na Comunidade Européia, ainda não

prevêem a compatibilidade eletroquímica entre o material de reparo e o substrato

como uma característica a ser considerada para a escolha do sistema de reparo.

Entretanto, segundo Emmons et al. (2000), a compatibilidade eletroquímica do

material de reparo com o substrato de concreto é uma importante consideração e

fundamental para a durabilidade dos reparos localizados. Este requisito aumenta

em relevância, quanto mais desfavoráveis forem as condições de exposição da

estrutura ou dos elementos a serem reparados.

As pesquisas sobre a formação de macrocélulas em reparos localizados ainda são

poucas e possivelmente iniciaram na década de 1980. Alguns trabalhos sobre

compatibilidade eletroquímica em reparos localizados têm sido realizados, com

contribuições importantes no que diz respeito ao entendimento dos fenômenos de

macrocélula.

Dentre as publicações disponíveis na literatura especializada, apenas duas

tiveram como objeto os reparos aplicados em substrato de concreto carbonatado:

Gulikers; van Mier (1992) e Schiessl; Breit; Raupach (1994). A maioria das

pesquisas sobre formação de macrocélulas se concentrou em reparos aplicados a

concretos contaminados por cloretos (NEPOMUCENO, 1992; HELENE;

MONTEIRO, 1993; CLELAND; YEOH; LONG, 1997; NOUNU; CHAUDHARY,

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1999; CASTRO et al., 2003 e QIAN; ZHANG; QU, 2006), onde a eficiência dessa

tecnologia é questionável, mas atrativa pelo menor custo por m2, em relação às

soluções mais eficientes.

Para o caso de reparos em estruturas contaminadas com cloreto, há o método

ASTM G 109 que pode ser usado como auxiliar em seleção de materiais de

reparo, tal como feito por Barkey (2004).

Todavia, não se tem, ainda, norma com critérios, para orientar a escolha e o

desenvolvimento de produtos de reparo pelas indústrias especializadas, no que

diz respeito à suscetibilidade ao desenvolvimento de macrocélulas de corrosão,

quando a corrosão das armaduras tem origem apenas em carbonatação e

umidade no concreto.

Este trabalho propõe um método para a avaliação da compatibilidade

eletroquímica entre materiais de reparo e um substrato de concreto carbonatado,

que possa vir a ser extraído como testemunho, de uma estrutura com problemas

de corrosão de armadura. Pretende-se que seja mais um passo na direção de

uma futura normatização, para a escolha de materiais de reparo que minimizem a

probabilidade de retorno da corrosão no aço por efeito de macrocélula. O método

foi elaborado com base nos experimentos da tese de Ribeiro (2010).

2 MACROCÉLULAS EM REPAROS LOCALIZADOS DE ESTRUTURAS COM

CORROSÃO DE ARMADURAS INDUZIDA POR CARBONATAÇÃO O aço-carbono corrói com velocidade desprezível, quando está no interior de

concretos de cimento Portland, de boa qualidade. Isto acontece devido à

alcalinidade da solução de poro (pH entre 12 e 14), que pode induzir à formação

de uma película de óxido na superfície da armadura (película passiva). A

carbonatação baixa o pH do concreto para valores inferiores a 9, podendo levar à

quebra dessa película e ocasionar corrosão na armadura.

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A frente de carbonatação1 progride no interior da estrutura de concreto de modo

irregular, normalmente devido à diferença de umidade ao longo da superfície da

estrutura ou, à heterogeneidade característica do concreto de cimento Portland.

Ao atingir a armadura de maneira descontínua, favorece o aparecimento de

processos corrosivos em pontos isolados da armadura.

Os reparos localizados, de base cimentícia, produzem mudanças nas

características eletroquímicas do meio que envolve o aço, em relação ao concreto

original da estrutura. A sua alcalinidade elevada promove a repassivação dos

trechos da armadura sob os reparos, resultando no aumento de seus potenciais.

Por outro lado, sob o concreto de substrato, junto ao reparo, especialistas como

Gulikers; van Mier (1992) e Raupach (1994) consideram que o aço perde a função

predominantemente catódica que a área anódica removida pelo reparo lhe

proporcionava. Assim, a frente de carbonatação, nessas áreas, pode avançar com

maior rapidez e despassivar a armadura, tornando-a mais suscetível à corrosão do

que antes do reparo.

Após o surgimento de corrosão na armadura na região do substrato, o trecho

repassivado pelo reparo pode transforma-se em uma área catódica e agravar esse

processo corrosivo. Desse modo, os reparos localizados podem levar ao

surgimento de macrocélulas de corrosão, com a área catódica localizada no

interior do reparo, e a área anódica na região da armadura sob o concreto original,

adjacente ao reparo. As considerações teóricas sobre o processo corrosivo nos

reparos aqui tratados podem ser consultadas na tese de Ribeiro (2009) ou nas

publicações específicas do mesmo autor (Ribeiro; Panossian; Selmo, 2007; 2008).

1 Por frente de carbonatação entende-se a posição da interface entre a região carbonatada, de

baixa alcalinidade por ação do CO2 sobre os produtos alcalinos da hidratação do cimento, e a região contígua, não-carbonatada, de elevado pH (HELENE, 1993).

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3 MÉTODO E CRITÉRIOS PARA A PREVISÃO DE COMPATIBILIDADE

ELETROQUÍMICA DE REPAROS LOCALIZADOS EM ESTRUTURAS COM

CORROSÃO DE ARMADURAS INDUZIDA POR CARBONATAÇÃO

3.1 Objetivo

Este método visa selecionar uma argamassa de reparo que apresente a menor

incompatibilidade eletroquímica com o substrato de uma estrutura com corrosão

de armaduras induzida por carbonatação, de modo a minimizar efeitos de

corrosão por macrocélula que possam surgir após o reparo.

A proposição deste método e dos critérios para análise dos resultados é feita a

partir da tese de Ribeiro (2010).

3.2 Campo de aplicação

Este método descreve um modo pelo qual pode ser feita a escolha de uma

argamassa de reparo para uma estrutura de concreto com corrosão de armadura,

induzida por carbonatação e umidade, em fase de projeto de recuperação por

reparos localizados, no que diz respeito à compatibilidade eletroquímica entre o

concreto carbonatado e o material de reparo.

O método pressupõe que as argamassas de reparo a serem testadas já tenham

sido pré-selecionadas por critérios de compatibilidade estrutural e de deformações

com o concreto da estrutura em recuperação e de compatibilidade com o(s)

microclima(s) de exposição das peças, por meio de documentos técnicos

pertinentes como, por exemplo, a série européia de normas EN -1504 (Products

and systems for protection and repair of concrete structures. Definitions,

requirements, quality control and evaluation of conformity).

As armaduras da estrutura, por sua vez, já devem ter sido inspecionadas e

“mapeadas” quanto ao potencial de corrosão, conforme a norma ASTM C 876

(2009). As faixas de variação de potencial de corrosão, para divisão das regiões

da estrutura, devem atender a intervalos máximos de 100 mV. A análise dessa

inspeção deve ter permitido a identificação das regiões de armaduras com valores

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de potencial de corrosão mais negativos, de modo que testemunhos cilíndricos

sejam extraídos de pelo menos três dessas regiões, conforme o item 3.4 adiante.

3.3 Aparelhagem

3.3.1 Voltímetro

Instrumento para medir tensão contínua, de preferência digital, com impedância

interna variável de 10 MΩ a 200 MΩ e que permita ler uma diferença de potencial

de 20 mV ou menos, sem necessidade de interpolação, e com precisão de ± 3 %.

Deve ser feito um teste de verificação da adequação do voltímetro segundo a

ASTM C 876 (2009).

3.3.2 Eletrodo de referência (ER)

Pode ser usado o eletrodo de calomelano saturado ou o de cobre-sulfato de cobre,

dependendo da disponibilidade.

Para uso acessório com o eletrodo de referência, recomenda-se encapsular o

mesmo em uma ponte salina com conexão elétrica de platina fundida em tubo de

vidro especial2, de modo a minimizar a contaminação do concreto pela ponta do

eletrodo.

3.3.3 Equipamento para extração de testemunho de concreto

De acordo com o prescrito na norma ABNT NBR 7680 (2007).

3.3.4 Formas dos corpos-de-prova

Para os corpos-de-prova homogêneos de argamassa, devem ser usadas formas

cilíndricas de 5 cm de diâmetro e 10 cm de altura e, para corpos-de-prova mistos

devem ser usadas formas cilíndricas de diâmetro 75 mm ou 100 mm, conforme o

diâmetro da sonda rotativa empregada para a extração dos testemunhos de

concreto da estrutura.

2 Sugestão da Prof.

a Zehbour Panossian, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São

Paulo

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3.3.5 Amperímetro de resistência nula (ZRA)

No método complementar para análise da compatibilidade eletroquímica, item 3.7,

é necessário o uso de um amperímetro de resistência nula.

3.4 Testemunhos e corpos-de-prova (CPs)

3.4.1 Dimensões e preparação

Testemunhos armados do concreto de substrato da estrutura em análise devem

ser extraídos segundo a norma ABNT NBR 7680 (2007), com diâmetro de 75 mm

ou 100 mm, de três ou mais regiões pré-selecionadas, como indicado no item 3.2,

aceitando-se variações de potencial entre barras de uma mesma região, de até

± 50 mV.

As amostras extraídas devem ser envolvidas em sacos plásticos, imediatamente

após suas extrações, para o transporte até o local de ensaio.

Os corpos-de-prova a serem usados para este método podem ser de dois tipos:

a) corpos-de-prova mistos com a composição ilustrada na Figura 1, com uma

metade extraída do concreto armado da estrutura a ser reparada, e a outra

moldada com a argamassa de reparo. Essa geometria permite uma análise mais

completa dos materiais em estudo, conforme o item 3.7, ou;

b) corpos-de-prova homogêneos, apenas de concreto armado (testemunhos

extraídos da estrutura), ou apenas de argamassas de reparo, armados com aço

original da obra, sendo os de argamassa moldados em formas cilíndricas de 5 cm

de diâmetro e 10 cm de altura, conforme a Figura 2.

3.4.1.1 Corpos-de-prova mistos

No caso de serem confeccionados os corpos-de-prova mistos, da Figura 1, os

testemunhos de concreto devem conter, no seu interior, um segmento de barra de

aço da estrutura, na posição B, disposto diametralmente, e devem ser serrados

com disco de corte diamantado (abrasivo), de modo a deixar uma camada de

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concreto sobre a barra de, aproximadamente, 10 mm, enquanto o outro lado deve

permanecer com o cobrimento original da estrutura.

Deve ser feito um orifício longitudinal numa das extremidades da barra B, imersa no

concreto de substrato, de modo a permitir sua conexão com o voltímetro por meio

de um conector de pressão tipo “banana” a ser encaixado nesse orifício. Se o

diâmetro da barra for fino ou os conectores dos equipamentos forem apropriados

ao diâmetro da barra, pode-se dispensar o orifício.

A outra metade de cada CP deve ser moldada sobre a face serrada do concreto,

com cada uma das argamassas de reparo a serem testadas. Para melhorar a

aderência da argamassa no substrato, a face do concreto pode ser jateada com

areia ou escarificada com escova de aço. O preparo das argamassas deve

atender às instruções de cada fabricante.

A metade de argamassa, no corpo-de-prova misto da Figura 1, também deve

conter um segmento de armadura na posição A, a aproximadamente 10 mm da

interface com o concreto. Essa barra de aço deve ser de procedência e de

diâmetro similares à barra B, em posição paralela àquela e com parte situada

externa à argamassa ou com perfuração adequada, para permitir uma conexão

elétrica externa. O cobrimento (C) sobre a barra A, na metade de argamassa,

deve ter a mesma dimensão do cobrimento da estrutura de concreto na região do

reparo, conforme a Figura 1.

A face curva do corpo-de-prova deve ser impermeabilizada de modo a evitar a

penetração de água pela interface aço/concreto ou pela interface aço/argamassa.

3.4.1.2 Corpos-de-prova homogêneos

Caso não possam ser confeccionados os corpos-de-prova mistos, da Figura 1,

ainda assim devem ser extraídos os testemunhos de concreto com um segmento

de armadura em cada amostra.

Neste caso, devem ser produzidos corpos-de-prova de argamassa separados,

moldados em forma cilíndrica, com 5 cm de diâmetro e 10 cm de altura, armados

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no centro com uma barra de aço-carbono original da estrutura, como mostrado na

Figura 2, para realizar as medidas descritas no item 3.5.

Para corpos-de-prova de concreto e argamassa independentes, apenas o critério

das diferenças de potencial pode ser aplicado à seleção da argamassa, sem

permitir ensaios complementares previstos no item 3.7.

3.4.2 Número de CPs e cura

Moldar pelo menos três corpos-de-prova por tipo de argamassa em análise.

A cura deve obedecer às recomendações do fabricante de cada argamassa. No

caso de argamassa dosada em laboratório, o período mínimo recomendável de

cura deve ser de três dias em câmara úmida3, ou prazo maior se houver garantia

da sua aplicação na execução da recuperação.

Após a cura, os CPs podem permanecer expostos em ambiente de laboratório ou

imersos em recipiente com soluções saturadas de sólidos, previamente

preparadas com água destilada e iguais quantidades de amostras moídas do

concreto de substrato e de cada argamassa de reparo, em cubas individuais,

como ilustrado na Figura 3, até o final dos ensaios.

3.5 Execução do ensaio

3.5.1 Saturação dos corpos-de-prova

Caso os CPs permaneçam expostos em ambiente de laboratório após a cura,

devem ser umedecidos até a saturação, conforme a norma ABNT NBR 9778

(2005) e permanecer por, pelo menos, 14 dias imersos, antes da monitoração do

potencial de corrosão das barras, como descrito no item 3.5.2. É recomendável

observar a constância de massa por um prazo mínimo de 48 h, após 72 h da

saturação inicial.

3 A câmara úmida deve observar o que prescreve a Norma NBR 5738/2003. Concreto –

procedimento para moldagem e cura de corpos-de-prova.

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A saturação pode ser feita seguida da cura e deve-se observar o mesmo

procedimento descrito acima quanto à constância de massa.

3.5.2 Monitoração do potencial de corrosão das barras em cada meio

Antes da medida do potencial de corrosão de cada barra, deve ser ajustada a

impedância interna do voltímetro, necessária à obtenção de leituras precisas. Esse

procedimento é feito, conforme a ASTM C 876 (2009), medindo-se o potencial de

cada barra com a impedância do voltímetro inicialmente regulada para 10 MΩ. A

impedância deve ser aumentada, gradualmente, até que duas leituras de potencial

de corrosão seguidas sejam constantes. As medidas de potencial devem ser

executadas, então, com o equipamento ajustado para a menor impedância das

duas últimas medidas.

A monitoração deve ter duração mínima de 10 minutos, de forma ideal, até 30

minutos, para que seja assegurada a estabilização da medida, quando, então,

deve ser registrado.

Os eletrodos de referência devem, preferencialmente, ser usados com uma ponte

salina, em especial para monitorações de corrente em prazos superiores a 6h,

para evitar contaminação da solução (eletrólito de trabalho) com íons do eletrodo.

O potencial de corrosão de cada barra deve ser monitorado até 90 dias da

moldagem dos CPs, prazo estimado para a passivação completa de aço-carbono

em compósitos de cimento Portland, segundo dados da pesquisa reportada por

Poursaee; Hansson, (2007).

Os critérios de análise dos resultados por este método baseiam-se nos

experimentais de Ribeiro (2010), em corpos-de-prova mistos, e são os seguintes:

quando a diferença de potencial de corrosão, em módulo, entre a barra de aço-

carbono no interior do material de reparo e a barra no substrato de concreto

carbonatado for menor que 50 mV, a tendência à formação de macrocélula de

corrosão será desprezível;

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quando a diferença de potencial de corrosão, em módulo, entre a barra de aço-

carbono no interior do material de reparo e a barra no substrato de concreto

carbonatado estiver entre 50 mV e 200 mV, a possibilidade de formação de

macrocélula de corrosão será moderada;

quando a diferença de potencial de corrosão, em módulo, entre a barra de aço-

carbono no interior do material de reparo e a barra no substrato de concreto

carbonatado for maior que 200 mV, a possibilidade de formação de macrocélula

de corrosão será alta.

3.5.3 Monitoração eletroquímica complementar

Eventualmente, pode ser necessária monitoração eletroquímica, para análise

complementar da compatibilidade eletroquímica entre as argamassas de reparo e

o concreto da estrutura, conforme o item 3.7.

3.6 Resultados

3.6.1 Cálculo da diferença de potencial de corrosão em módulo (|ΔΦ|)

A diferença de potencial de corrosão entre as barras A e B de cada CP misto, na

condição da Figura 3, é calculada, em módulo, mediante a seguinte expressão:

|ΔΦ| = |ΦA - ΦB|

Onde:

|ΔΦ| = diferença de potencial de corrosão em módulo;

ΦA = potencial de corrosão da barra A imersa na argamassa, em relação

ao eletrodo de referência adotado para a leitura;

ΦB = potencial de corrosão da barra B imersa no concreto da amostra da

estrutura, em relação ao mesmo eletrodo.

Como resultados para cada argamassa, considerar a média dos resultados dos

três corpos-de-prova, e em caso da média de ΔΦ resultar com diferença superior a

50 mV em relação aos valores individuais, então recalcular a média para os dois

valores mais próximos.

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No caso do estudo de barras de aço imersas em corpos-de-prova homogêneos,

pode-se fazer a média dos potenciais, para as três barras A’, imersas em cada

argamassa, e a média dos potenciais para as três barras B’, imersas nos

testemunhos de concreto, representativos de cada região de interesse na

estrutura. A diferença de potencial pode então ser calculada diretamente entre os

respectivos valores médios dos grupos de barras A’ e B’, assim considerados:

- barras A’, em cada tipo de argamassa e;

- barras B’, de cada região pré-selecionada na estrutura original.

Deve ser escolhida a argamassa que apresentar a menor diferença média de

potencial de corrosão, em módulo, entre as barras A e B ou entre as barras A’ e B’.

3.7 Método complementar para análise da compatibilidade eletroquímica

Quando a escolha da argamassa pelo critério da diferença de potencial em

módulo (|ΔΦ|) não for suficiente para a escolha de uma argamassa, deve ser

usado o método complementar para análise da compatibilidade eletroquímica.

Este método baseia-se na medida da densidade de corrente de macrocélula.

Apenas as argamassas que obtiveram os melhores desempenhos no critério da

diferença de potencial devem ser submetidas aos ensaios complementares.

Para a execução do método deve ser usado o dispositivo de ensaio, conforme

esquematizado na Figura 4.

A argamassa a ser escolhida deverá ser a do CP que apresentar a menor corrente

de macrocélula entre as barras A e B.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho apresenta uma contribuição para a avaliação da compatibilidade

eletroquímica entre materiais de reparo e um substrato de concreto carbonatado,

que possa vir a ser extraído como testemunho, de uma estrutura com problemas

de corrosão de armadura. Pretende-se que seja mais um passo na direção de

uma futura normatização, com métodos e critérios correspondentes, para a

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escolha de materiais de reparo que minimizem a probabilidade de retorno da

corrosão no aço por efeito de macrocélula.

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Figura 1 – Ilustração esquemática do corpo-de-prova misto (C = cobrimento de concreto da estrutura = cobrimento de argamassa)

Figura 2 – Ilustração esquemática dos corpos-de-prova homogêneos: (a) corpo-de-prova homogêneo a partir de testemunhos de concreto da estrutura (≈C = cobertura de concreto sobre a armadura, com espessura semelhante a do cobrimento da estrutura - C); (b) corpo de prova homogêneo de argamassa de reparo

barra de aço da estrutura (B) barra de aço na argamassa (A)

argamassa de reparo concreto da estrutura 10 mm

C C

10 mm

barra de aço da estrutura (B’)

concreto da estrutura

C

≈C argamassa de reparo

5 cm

10 c

m

barra de aço do CP (A’) (a) (b)

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Figura 3 – Disposição do corpo-de-prova misto e ligações das barras A e B, em separado, no voltímetro, para medidas do seu potencial de corrosão em relação ao eletrodo de referência (ER)

Figura 4 – Dispositivo de ensaio para monitoração da corrente de macrocélula entre as barras do corpo-de-prova misto

voltímetro

ER

COMPUTADOR ZRA

ER

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