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INFORMATIVO DA PROVÍNCIA FREI BARTOLOMEU DE LAS CASAS – DOMINICANOS NO BRASIL CIRCULAÇÃO INTERNA DOMINGOS: GOVERNO, ESPIRITUALIDADE E LIBERDADE Mensagem do Mestre da Ordem sobre o tema para 2015 do Novenário do Jubileu OP Se permanecerdes em minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos e conhecereis a verdade e a verdade vos libertará.” (Jo 8.31-32). Cristo nos libertou para que sejamos verdadeiramente livres.” (Gl 5,1) A verdade vos libertará!” Esta promessa de Jesus me traz à mente a imagem do grupo que caminhava com Jesus, anunciando o Reino de aldeia em aldeia. Todos eles, cada um e cada uma a seu modo, tinham sido libertados. Libertados do peso de suas culpas, dos impasses de suas mentiras, do peso de sua história, das divisões alienantes. Levados pelo desejo de seu Mestre e Senhor de ir para outras cidades, eles o acompanhavam confortados pelo fato de se sentirem, junto a Ele, num sopro divino que os tornava cada dia mais livres, para serem eles mesmos livres. Livres por se terem entregues a esta amizade divina oferecida por Deus, através de seu Filho. Livres para serem enviados, livres de serem discípulos de Cristo, e, por sua vez, de convidar outros para se juntarem a eles. É o sopro divino da pregação de Jesus que os liberta, mesmo que eles talvez não tivessem realmente considerado no que haviam se envolvido ao responder a seu convite para segui-lo, ou juntando-se a Ele por própria iniciativa, agradecidos pela graça da misericórdia que dele tinham recebido. Ao ficarem ao seu lado em sua proclamação do Reino, descobriram que ficavam livres de uma maneira que jamais teriam ousado esperar. Livres por causa da palavra de seu amigo e Senhor. “Se guardardes minha palavra sereis, de fato, meus discípulos e conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Libertos pela Palavra da verdade! Creio que é a esta liberdade do pregador que se refere o tema deste ano de preparação à celebração do Jubileu da Ordem: “Domingos - governo, espiritualidade e liberdade”.

Bruno Cadore, Domingos, Governo, Espiritualidade e Liberdade

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Fr. Bruno Cadoré, Domingos...

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  • INFORMATIVO DA PROVNCIA FREI BARTOLOMEU DE LAS CASAS DOMINICANOS NO BRASIL CIRCULAO INTERNA

    DOMINGOS: GOVERNO, ESPIRITUALIDADE E LIBERDADE

    Mensagem do Mestre da Ordem sobre o tema para 2015 do Novenrio do Jubileu OP

    Se permanecerdes em minha palavra, sereis verdadeiramente meus discpulos e conhecereis a verdade e a verdade

    vos libertar. (Jo 8.31-32). Cristo nos libertou para que sejamos verdadeiramente livres. (Gl 5,1)

    A verdade vos libertar! Esta promessa

    de Jesus me traz mente a imagem do grupo que

    caminhava com Jesus, anunciando o Reino de

    aldeia em aldeia. Todos eles, cada um e cada uma

    a seu modo, tinham sido libertados. Libertados do

    peso de suas culpas, dos impasses de suas

    mentiras, do peso de sua histria, das divises

    alienantes. Levados pelo desejo de seu Mestre e

    Senhor de ir para outras cidades, eles o

    acompanhavam confortados pelo fato de se

    sentirem, junto a Ele, num sopro divino que os

    tornava cada dia mais livres, para serem eles

    mesmos livres. Livres por se terem entregues a

    esta amizade divina oferecida por Deus, atravs de

    seu Filho. Livres para serem enviados, livres de

    serem discpulos de Cristo, e, por sua vez, de

    convidar outros para se juntarem a eles. o sopro

    divino da pregao de Jesus que os liberta, mesmo

    que eles talvez no tivessem realmente

    considerado no que haviam se envolvido ao

    responder a seu convite para segui-lo, ou

    juntando-se a Ele por prpria iniciativa,

    agradecidos pela graa da misericrdia que dele

    tinham recebido. Ao ficarem ao seu lado em sua

    proclamao do Reino, descobriram que ficavam

    livres de uma maneira que jamais teriam ousado

    esperar. Livres por causa da palavra de seu amigo

    e Senhor. Se guardardes minha palavra sereis,

    de fato, meus discpulos e conhecereis a verdade e

    a verdade vos libertar. Libertos pela Palavra da

    verdade! Creio que a esta liberdade do pregador

    que se refere o tema deste ano de preparao

    celebrao do Jubileu da Ordem: Domingos -

    governo, espiritualidade e liberdade.

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    Lembramo-nos de alguns textos importantes que

    nos foram propostos nas ltimas dcadas sobre

    estes temas (o governo na Ordem, a obedincia, a

    liberdade e a responsabilidade...) e que seremos

    contentes de reler. Parece-me que o tema deste

    ano nos convida, na perspectiva aberta por estes

    textos, a focalizar nossa ateno naquilo que

    talvez seja o mago da espiritualidade da Ordem:

    vivenciar a ousadia da liberdade do pregador,

    aprendendo a tornarem-se discpulos. E este a

    perspectiva do governo na Ordem.

    Sempre salientamos a importncia

    essencial e nica dada obedincia, na profisso

    de sermos pregadores: Prometo obedincia a

    Deus... Os historiadores lembram que Domingos

    pedia aos primeiros irmos de lhe prometer

    obedincia e vida em comum. So dois

    caminhos para se tornar discpulo de Cristo:

    escutar a Palavra e seguir seu exemplo na

    convivncia com os outros, seguindo-o como esta

    primeira comunidade de amigos que

    acompanhavam Jesus de cidade em cidade para

    aprender com ele como ser um pregador. Escutar e

    viver juntos, fazendo deste seguimento da Palavra

    a fonte da unanimidade.

    CONSAGRADOS NA PREGAO: ENVIADOS A PREGAR O EVANGELHO

    Neste ano, dedicado vida consagrada,

    parece-nos que somos convidados a voltarmos

    constantemente a esta fonte de nossa vida: sermos

    consagrados evangelizao da Palavra de Deus,

    sermos consagrados pregao da Palavra,

    permanecer na sua Palavra. Se permanecerdes

    em minha palavra sereis verdadeiramente meus

    discpulos. O governo para Domingos

    favorecer este desejo - dos indivduos e das

    comunidades - de serem verdadeiramente seus

    discpulos. Isto significa ser o guardio desta

    morada na Palavra. Novamente, o critrio da

    misso que se impe. De fato, o que esta

    Palavra? Sabemos o que essa Palavra significa

    para ns, a partir da conversao do Filho com o

    Pai no sopro do Esprito: Aqueles que me

    destes..., Que onde estou, tambm eles possam

    estar junto comigo.... E intimidade filial, em que

    a misso est entranhada Como voc me enviou,

    tambm eu os envio.... Esta permanncia na

    Palavra no significa nenhum tipo de imobilismo

    contemplativo egocntrico. E menos ainda se

    refere a uma observncia moral que poderia

    estabelecer ou procurar um definitivo estado de

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    perfeio. Permanecer na Palavra, na escola de

    Domingos, significa penetrar no movimento da

    Palavra que vem ao encontro da humanidade para

    a estabelecer sua morada e tornar-nos livres pelo

    poder do seu Esprito. permanecer na inspirao

    prpria da misso do Filho. Significa se tornar

    discpulo e comunidade de discpulos, em

    conformidade com esta proximidade amiga e

    fraterna para com o Filho. Nas palavras de Toms

    de Aquino, quando ele fala de Verbum spirans

    amorem (a Palavra que transmite o amor)

    podemos, com efeito, pensar que permanecer na

    Palavra permanecer nesta Palavra que transmite

    o amor; isto , a amizade, a fraternidade e a

    comunho em ns e entre ns. O sopro do

    Esprito, a Palavra da verdade e da liberdade.

    Uma das primeiras decises de Domingos,

    considerada pela histria da Ordem como uma das

    mais importantes, foi dispersar os irmos de So

    Romano de Toulouse, a fim de que o gro no se

    amontoasse. Desta forma ele mostrou que o

    governo na Ordem ter de ser essencialmente

    finalizado pregao. Este governo, portanto,

    implica certa dinmica de vida espiritual

    procurando promover e servir a liberdade de cada

    um e tem sua origem na Palavra de Deus. Como o

    prprio Jesus tinha feito com seus discpulos,

    Domingos envia seus irmos, dois a dois, nas

    trilhas da pregao. Na realidade, ele os envia, ao

    mesmo tempo, para estudar e para pregar. Foi

    graas a esta deciso da disperso dos frades que a

    Ordem pode se desenvolver, se organizar,

    suscitando e acolhendo novas vocaes. Essa

    disperso estabeleceu a itinerncia como um

    mtodo para se tornar discpulos, convidando

    os pregadores a permitirem que sua vida seja

    marcada pelos encontros que eles tero, ao sair

    pelo mundo como irmos. Tambm os conduzir

    a irem estudar nas primeiras universidades, para

    poder enraizar sua procura pela verdade da

    Palavra na abertura aos conhecimentos de seu

    tempo; e para fortalecer seu respeito pela

    capacidade humana em conseguir o conhecimento,

    no estudo do mistrio da revelao de Deus

    criador e salvador. Permanecer em sua Palavra

    significa estar mais prximo do dilogo de Deus

    com a humanidade: aquele dilogo que Jesus,

    primeiro e nico mestre da pregao do Reino,

    tornou visvel aos olhos de todos.

    Deus, que manifestou a ternura e a

    humanidade de seu Filho em seu amigo

    Domingos, possa transfigurar-vos imagem....

    Esta prece da bno para a festa de S. Domingos

    reflete a escolha do papa Joo Paulo II, ao

    desenvolver sua reflexo sobre a Vita

    consacrata luz do mistrio da Transfigurao

    (VC, 14). Nesta perspectiva e porque tem a misso

    de chamar, conduzir e apoiar no caminho de se

    tornar discpulos para se tornar pregadores, o

    governo dominicano procura continuamente

    promover as condies necessrias para esta

    economia da transfigurao. A pregao do

    Reino o caminho que a Ordem prope aos

    irmos e irms para se deixar conformar ao Cristo

    pelo Esprito. A contemplao do evento da

    Transfigurao revela as dimenses essenciais

    desta aventura. Num momento importante de sua

    jornada de pregao Jesus levou consigo trs de

    seus discpulos, para que presenciassem a sua

    Transfigurao: a contemplao do mistrio do

    Filho est no mago da misso do pregador. A

    partir da, o pregador recebe aquilo que ele tem

    por misso de transmitir: a realidade do Filho de

    Deus junto com a revelao da economia do

    mistrio da salvao. Lembremos o relato da

    Transfigurao: Vamos levantar trs tendas, uma

    para voc, uma para Moiss e outra para Elias.

    E Jesus no demorou a responder: A tenda de

    fato ser erguida, mas ser no Glgota, em

    Jerusalm. L tambm ele ter dois

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    companheiros, mas sero ladres, expulsos da

    sociedade como ele e condenados morte. luz

    brilhante da montanha da Transfigurao

    corresponde a luz que rasgar os cus, como a

    confirmar, de antemo, o cumprimento de sua

    descida habitao dos mortos, de onde o Filho

    surgir vivo, vencendo de uma vez por todas a

    escurido da morte e levando com ele, presena

    plena do Pai, aqueles que, a partir de ento,

    vivero com ele para sempre. Na montanha da

    Transfigurao os discpulos finalmente recebero

    a misso que lhes trar alegria: ir com Jesus at

    Jerusalm onde a palavra da Verdade revelada

    plenamente. L, onde a vida oferecida do Cristo

    a fonte de nossa liberdade. Estar sob o signo da

    Transfigurao tomar um caminho no qual nosso

    desejo de tornarmo-nos discpulos pode crescer,

    permanecendo em sua Palavra, deixando que ela

    nos ensine a obedincia e o amor do Filho, que

    foram revelados no Glgota e na manh da

    Pscoa, e recebendo de seu Esprito a misso,

    como no dia de Pentecostes.

    PERMANECEI EM MINHA PALAVRA

    Em sua Carta apostlica aos consagrados,

    o Papa Francisco os convida os religiosos a

    acordar o mundo, procurando criar outros

    lugares onde florescero a lgica evanglica da

    doao, da acolhida das diversidades e do amor

    mtuo. Esses lugares devem tornar-se cada vez

    mais o fermento de uma sociedade inspirada pelo

    Evangelho, aquela cidade sobre o monte que

    proclama a verdade e a fora das palavras de

    Jesus. Esses lugares so nossas comunidades,

    onde nos comprometemos a aprender a nos tornar

    aqueles expertos em comunho dos quais o Papa

    fala nessa mesma Carta apostlica. importante e

    essencial que na Ordem, a funo do/a superior/a

    esteja localizada precisamente na interseco

    desses dois horizontes de nossa promessa:

    obedincia e vida em comum. Trata-se da

    obedincia apostlica: Domingos queria que ela

    moldasse os pregadores para se tornarem irmos

    daqueles a quem eram enviados, em sua

    itinerncia mendicante; e tambm para se deixar

    converter e transformar na fraternidade da

    vivncia comunitria. Essa irmandade apostlica,

    para a qual nos comprometemos pelo voto de

    obedincia, a trilha proposta por Domingos para

    receber plenamente nossa liberdade. Obedincia e

    vida comunitria: duas maneiras para orientar a

    ateno comunho escatolgica prometida ao

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    mundo, para a qual ele foi criado apto, do

    mesmo modo que dizemos que o mundo foi criado

    apto para Deus; duas maneiras de engajar

    plenamente nossa liberdade: usque ad mortem

    (at a morte). Uma vez mais, compete ao superior

    convidar-nos a tomar esse caminho para se

    colocar sob a autoridade da Palavra, para se

    tornar servidor deste dilogo de Deus com a

    humanidade que o Verbo veio realizar, morando

    entre os homens. Obedincia e vida comum, de

    modo que a pregao esteja enraizada, ao mesmo

    tempo, na comunidade dos discpulos que escutam

    a Palavra viva e na comunidade esperada como a

    comunho escatolgica que foi anunciada pelos

    profetas, e selada pelo Filho com sua prpria vida.

    Aquilo que poderia ser uma rvore da

    pregao, fruto dessa promessa de vida

    evanglica e apostlica, est enraizado nas trs

    formas que a tradio da Ordem nos oferece para

    permanecer em sua Palavra: comunho

    fraterna, celebrao da Palavra e da orao,

    estudo. uma tarefa especfica do governo na

    Ordem - talvez sua responsabilidade primeira - a

    de promover entre os frades, s irms e os leigos a

    qualidade desta trplice base, que garante e

    promove a liberdade apostlica.

    A comunho fraterna o lugar onde os

    irmos e irms podem testar a capacidade das

    palavras humanas para ajudar na procura da

    verdade que os tornar livres. atravs da vida

    comunitria que chegamos a alcanar nossa

    liberdade, ao contribuir para a comunho. Por isso

    nossa vida religiosa capitular essencial para

    nossa espiritualidade: cada membro da

    comunidade tem sua prpria voz, est engajado no

    processo comum da procura do bem de todos e

    est adaptado misso de ser um servo da

    Palavra: ele participa plenamente do governo da

    Ordem. Este governo democrtico, no pelo fato

    do exerccio do poder pela maioria, mas porque

    promove a procura democrtica da unanimidade.

    Este exerccio de vida comunitria exigente. Ns

    o sabemos, pois ela pede a cada um de nunca

    omitir sua prpria participao no dilogo para

    este processo. Tambm exigente porque requer a

    expresso, a mais plena possvel, de suas prprias

    posies e argumentos, mesmo se isto leva a

    objetivar discordncias entre os irmos, tendo

    sempre a confiana de que ningum jamais ser

    desprezado por sua opinio ou posio deferente,

    mas sempre acolhido e amado como um irmo.

    exigente tambm porque pede que todos os

    membros de uma comunidade, aps paciente

    busca do ponto que seja o mais prximo possvel

    da unanimidade, tomem parte com determinao

    na realizao da deciso tomada por todos. a

    esta condio, ento, que todos sero acolhidos,

    reconhecidos e apoiados por todos no momento de

    expressar sua prpria generosidade e criatividade

    apostlica. Talvez seja por causa da dificuldade

    deste exerccio que abandonamos facilmente este

    compromisso de nossa permanncia na Palavra

    pela nossa vida comunitria.

    A orao o segundo elemento do

    enraizamento da rvore da pregao na Palavra.

    A orao pessoal e comunitria no pode no ser

    considerada como um exerccio a ser cumprido

    para sermos coerentes com o compromisso da

    vida consagrada regular. um meio pelo qual,

    individualmente e em comunidade, fazemos a

    escolha de pontuarmos o tempo de nossa histria

    humana atravs da meditao sobre o mistrio da

    histria de Deus com o mundo. Pode-se dizer que

    possuir a histria da Revelao em resposta a

    esse Deus que vem, em seu Filho, possuir cada

    um de ns. questo de deixar, na orao, o

    Esprito soprar onde quer. Desta forma a orao

    surge da escuta da Palavra e leva de volta a ela,

    estabelecendo o centro de gravidade de nossa vida

    pessoal e da vida de nossas comunidades na

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    contemplao do mistrio da Revelao do qual as

    Escrituras so a narrao. A celebrao da Palavra

    na Liturgia, sua contemplao na meditao dos

    mistrios do Rosrio, a orao silenciosa e

    perseverante: tudo isso nos ajuda a situar a

    consagrao de nossa vida para pregao entre a

    contemplao e o estudo. So os dois meios de

    procurar a verdade de sua Palavra, da qual

    queremos transmitir o sabor para aqueles e

    aquelas a quem somos enviados. Se

    permanecerdes em minha palavra, sereis

    verdadeiramente meus discpulos. Permanecer

    assim torna-se uma oportunidade para ns - como

    o foi para os primeiros amigos de Jesus ao

    pregarem - de sentirmo-nos livres, porque fomos

    elevados por seu chamado, fortificados pelo seu

    amor e sua misericrdia, encorajados e enviados

    por sua graa a anunciar sua Palavra de verdade.

    Permanecer na palavra, ento, nos leva a carregar

    conosco, neste silncio de escuta e espera, aquelas

    e aqueles a quem fomos enviados, que contam

    com nossa orao, que nos foram dados por Deus.

    Desse modo, misteriosamente, aceitamos que Ele

    vincule o destino deles ao nosso na mesma graa

    da salvao. Nesta rea, o governo da Ordem

    como um vigia, para garantir que a liberdade dos

    indivduos e das comunidades esteja realmente

    enraizada na contemplao deste mistrio, no qual

    o prprio Filho, em sua humanidade, trouxe a

    salvao para o mundo, harmonizando sua

    liberdade quela do Pai.

    A orao nos coloca na escola de Nossa

    Senhora dos Pregadores. Com ela, os Pregadores

    podem descobrir e ser constantemente

    maravilhados pela capacidade da vida humana de

    se tornar uma vida para Deus. Com ela, cantando

    os Salmos que orientam a contemplao deles na

    histria da Revelao, as palavras humanas dos

    pregadores so baseadas numa compreenso

    amorosa do dilogo pelo qual Deus prope

    humanidade sua adoo. E ainda mais: graas

    orao a Ordem estabelece no centro de sua

    pregao o sinal proftico da converso

    comunho fraterna, anncio seguro da plena

    realizao da promessa da aliana Naquele que a

    Verdade. Na escola de Nossa Senhora dos

    Pregadores, esta espiritualidade da obedincia na

    vida comunitria une intimamente a Ordem ao

    mistrio da Igreja, pela partilha do amor de Cristo,

    pela adoo da inspirao de sua vida, pela doao

    ao mundo.

    O estudo o terceiro elemento para o

    enraizamento da pregao como um permanecer

    na Sua Palavra. o lugar da procura e da

    contemplao da Verdade. E por causa disso que

    o estudo constitui uma observncia muito

    importante em nossa tradio dominicana. Sempre

    profundamente alimentado pela escuta das

    Escrituras e na fidelidade doutrina e ao

    magistrio da Igreja, o estudo na Ordem o meio

    privilegiado para entreter nosso dilogo com

    Deus, levando tambm a um dilogo amigvel e

    fraterno com os muitos sistemas de pensamento

    que orientam o mundo e que tambm procuram a

    verdade, cada um a seu modo. Pelo estudo, a

    Ordem convida-nos a crescermos sem cessar na

    liberdade, no por elevar num estilo mundano o

    nvel dos conhecimentos adquiridos, mas sim,

    para convidar-nos a avanar no caminho da

    humildade da verdade. Elevar a inteligncia

    humana nesta aventura que tem a audcia de tentar

    tornar o mistrio compreensvel atravs de

    palavras e conceitos humanos finitos, significa

    no s agradecer a Deus criador, que quis que a

    razo humana, embora finita e limitada, fosse

    capaz de Deus, como tambm permitir

    sobrepujar a razo na esperana de uma plenitude

    que nenhum conceito pode realmente alcanar.

    Esta aventura revela a verdadeira dimenso de

    nossa liberdade. O governo na Ordem tem a

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    responsabilidade de impedir que abandonemos

    este prtica do estudo e tambm de estimular

    nossa criatividade para encontrarmos

    constantemente os modos mais compatveis de

    propor aos outros esta aventura da evangelizao

    da razo.

    GOVERNO E ESPIRITUALIDADE

    Esta perspectiva dada espiritualidade da

    Ordem - permanecer na Palavra e conhecer a

    verdade que liberta - permite-nos identificar certos

    princpios essenciais do governo na Ordem. J

    vimos que o governo finalizado essencialmente

    misso da pregao, e procura promover um

    estilo de vida que caracterstico da tradio

    dominicana e que proporciona aos irmos as

    condies para enraizar sua pregao na Palavra.

    O primeiro princpio encorajar

    constantemente a celebrao dos captulos para

    colocar os irmos numa responsabilidade

    apostlica comum. Em sua recente Carta

    apostlica o Papa Francisco expressa o desejo de

    que as pessoas consagradas procurem entender o

    que Deus e a humanidade esto pedindo. Em

    nossa tradio, isso destaca a importncia

    renovada que devemos dar realidade de nossos

    captulos. claro que os captulos conventuais,

    provinciais e gerais tm a responsabilidade de

    tomar decises claras de organizao e legislao

    para nossa vida e misso. E, como temos

    destacado, so momentos privilegiados onde nos

    colocamos humildemente na escola da verdade

    que procuramos juntos, em fraternidade. As

    preciosas reflexes de meus predecessores

    ajudaram-nos a compreender como a democracia

    na Ordem no simplesmente uma forma de

    exerccio do poder pela maioria, mas sim, de

    procura para alcanar a maior unanimidade

    possvel. O dilogo e o debate entre os irmos

    muito importante em nossa tradio, fazendo com

    que todos possam participar, com liberdade e

    confiana, numa articulao partilhada do bem

    comum, para o qual cada um se empenha em

    contribuir. Tal dilogo fraterno possvel na

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    medida em que houver entre ns respeito, abertura

    e liberdade de irmos para expressarmos nossos

    pensamentos.

    Um dos objetivos essenciais desses debates

    deve ser a ateno aos sinais de nosso tempo e a

    compreenso das necessidades e dos clamores que

    so feitos e que interpelam o carisma prprio da

    Ordem, para levarmos ao corao da Igreja a

    memria da pregao evanglica. Numa carta que

    logo irei enviar - em resposta aos pedidos do

    Captulo de Trogir - tratarei sobre o tema do

    projeto comunitrio, cuja elaborao parece-me

    ser o ponto de referncia para o governo na

    Ordem. Somente na medida em que todos

    participarem do desenvolvimento deste projeto

    que realmente teremos condies de avaliar e

    direcionar nosso servio Igreja e ao mundo pela

    pregao. A comunho fraterna construda a

    partir de uma preocupao comum pela misso,

    que no apenas a determinao do que queremos

    fazer, mas tambm a colocao em comum da

    nossa compaixo pelo mundo, a partir da qual

    ns queremos compartilhar esse dom precioso da

    libertao pela palavra da Verdade.

    Baseado nesta responsabilidade apostlica

    comum, e porque o servio do governo da Ordem

    consiste em garantir este enraizamento na verdade

    da Palavra, o segundo princpio do governo o de

    enviar a pregar. Domingos queria que a resposta

    a esta misso fosse itinerante e mendicante a

    fim de que a pregao da Ordem prolongasse a

    economia da Palavra que, em Jesus, veio ao

    mundo como amiga e irm, mendigando a

    hospitalidade para aqueles que queria convidar a

    participar na conversao com o Pai. As

    assinaes feitas pelo superior (aos frades e

    irms) deveriam sempre objetivar este horizonte

    de itinerncia mendicante para a misso. Trata-se,

    ento, da itinerncia apostlica, desta no

    instalao, como um meio de se tornar discpulo.

    Eu te seguirei onde quer que fores, disse um

    dos apstolos, ao qual Jesus respondeu: As

    raposas tm tocas e as aves tm ninhos. O Filho

    do Homem, contudo, no tem sequer um lugar

    para deitar sua cabea.... esta afirmao que

    Domingos queria assumir seriamente, dando desta

    forma aos irmos uma oportunidade de fazer

    novamente a pergunta dos discpulos de Joo

    Batista: Senhor, onde moras?: Vem e vers.

    Isto o que deveria nos ajudar a entender o

    exerccio de governo na Ordem. Entender e

    escutar no mago de nossa vida os ministrios e

    responsabilidades prprios de cada um: no centro

    das realidades mais estabelecidas, talvez dos

    sucessos e das carreiras mais brilhantes, nas

    funes mais importantes; um chamado que pode

    ressoar, que nos pede para partir a fim de, mais

    adiante e com maior liberdade, reingressar numa

    outra dimenso da misso comum da Ordem para

    a Igreja. Estas mudanas, s vezes penosas, mas

    normalmente fecundas de frutos, tm

    caractersticas que so constantemente

    relembradas na vida de Domingos: a compaixo, a

    fronteira entre a vida e a morte, entre o humano e

    o no humano, o desafio da justia e da paz, a

    necessidade de um dilogo entre as religies e

    culturas, muitas realidades que ecoam nas

    fronteiras existenciais, das quais o Papa

    Francisco fala em sua Carta. prefervel termos

    compaixo para com os pecadores do que

    estarmos ligado aos nossos prprios pecados, que

    nos fazem centrar em ns mesmos. prefervel

    estarmos ao servio da comunho da Igreja e do

    seu crescimento do que dar importncia muito

    grande a identidades que nos tranquilizam mas

    que nos aprisionam em ns mesmos. Permanecer

    na Palavra estar na brisa plena da inspirao da

    prpria Palavra, da Palavra da qual desejamos nos

    tornar discpulos. Esta itinerncia da pregao ,

    portanto, o caminho para a nossa liberdade, a

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    fim de sermos livres. pelo fato de o exerccio do

    governo na Ordem estar direcionado a este envio,

    que uma ateno toda especial deveria ser

    prestada a cada pessoa, a seus dons, a sua

    criatividade, para que a liberdade de cada um seja

    mais bem realizada a

    servio do bem comum e da misso. No centro

    desta ateno, em nome da procura comum pela

    verdade da Palavra, os superiores devem ter

    conscincia da necessidade da misericrdia e da

    justia. A misericrdia to cara nossa tradio

    deve se expressar, antes de tudo, no cuidado para

    as pessoas. deste modo que as relaes de

    fraternidade entre as pessoas, como as relaes

    dentro de uma comunidade, deveriam ser o ponto

    focal que nos permite lembrar que ningum de ns

    deve ser marginalizado por suas falhas ou

    fracassos. A fraternidade realmente acontece

    quando cada um descobre que sua plena dignidade

    elevada e preservada pela misericrdia de Cristo

    que se manifesta por meio dela e pelo chamado

    que ela constantemente faz de se deixar libertar,

    para ser livre. Mas, ao mesmo tempo, esta

    dignidade deve sempre ser reconhecida na

    disponibilidade para assumir responsabilidades.

    Na perspectiva da Palavra da verdade que liberta,

    no existe liberdade individual que possa

    reivindicar para si de ser uma ilha, de ser o

    centro de gravidade da vida de todos os outros. A

    fraternidade, como Cristo a vivenciou, ensina-nos

    como devemos assumir nossa verdadeira liberdade

    numa abertura para a reciprocidade, onde o outro

    sempre conta tanto quanto eu mesmo. por isso

    que o governo tem a responsabilidade exigente de

    manter sempre unidos a preocupao pela

    misericrdia e o dever da justia. A referncia

    atenta e objetiva s nossas Constituies, ao bem

    comum, s decises de nossos captulos, permite-

    nos de preservar o bem comum a salvo da

    arbitrariedade de reivindicaes de liberdades

    individuais. A tarefa, alguma vezes, parece rida

    e ingrata. Mas ao preo deste equilbrio exigente

    que podemos evitar uma referncia demasiado

    dcil uma misericrdia que nada seno

    covardia, irresponsabilidade ou indiferena; e a

    este preo que cada um poder receber a graa que

    veio procurar na Ordem: a de ser chamado para se

    deixar libertar pela Palavra da Verdade.

    Ao concluir este comentrio sobre o tema

    anual do Jubileu, gostaria de mencionar um ltimo

    princpio espiritual do governo da Ordem: o da

    unidade e comunho. Aqui tambm, sobre o

    critrio da misso que nos devemos apoiar. na

    medida em que assumimos com pacincia os

    meios para o discernimento comum que orientam

    o ministrio da pregao, que os indivduos, as

    comunidades, as provncias e todas as entidades

    da Famlia dominicana podem entrar na dinmica

    da integrao numa nica unidade. Cada uma

    destas instncias convidada e convocada a trazer

    para o bem comum sua prpria identidade pessoal,

    cultural e eclesial. Mas, por causa da referncia

    comum ao entusiasmo fundador que nos tm

    consagrado todos juntos, pregao, a nossa

    vontade deve ser de responder juntos a este envio.

    Alis - o que at mais exigente - pedimos ao

    Esprito que nos faa uma comunho de pregao.

    Fazemos este pedido ao mesmo tempo em que

    continuamente rezamos que o Esprito de

    comunho possa abrir neste mundo o horizonte de

    salvao e estabelea em nossos coraes a

    esperana da nova criao. Acima da porta da

    Baslica de Santa Sabina, doada a Domingos pelo

    papa Honrio III, um mosaico representando a

    Igreja da Circunciso e a Igreja dos Gentios

    recorda este primeiro horizonte da pregao da

    Ordem. A Palavra da verdade impele-nos a servir

    a comunho prometida, atravs da pregao e do

    testemunho. para isto que somos enviados. Na

    porta da mesma Baslica a representao da

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    Crucifixo faz-nos lembrar de que esta pregao

    nos levar a nos tornar discpulos de Cristo, que

    livremente deu sua vida para que todos possam ser

    convocados na unidade.

    A verdade vos libertar

    Fr. Bruno Cador , OP

    Mestre da Ordem dos Pregadores

    (Traduo: Maria Antonietta Degani Natariani - Amparo)