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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE FÍSICA DE SÃO CARLOS LICENCIATURA EM CIENCIAS EXATAS Caio Marques Neves Nunes – Nº USP: 9064360 A Gênese da delinqüência juvenil E a Anatomia das gangues São Carlos 2015

Caio Marques Neves Nunes – Nº USP: 9064360 · disciplina SLC 0631 ... Compreender o fenômeno da formação das gangues e da delinquência juvenil em ... Nos anos 50 e 60, a maioria

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

INSTITUTO DE FÍSICA DE SÃO CARLOS

LICENCIATURA EM CIENCIAS EXATAS

Caio Marques Neves Nunes – Nº USP: 9064360

A Gênese da delinqüência juvenil

E a

Anatomia das gangues

São Carlos 2015

A Gênese da delinqüência juvenil

E a

Anatomia das gangues

Monografia apresentada ao curso de

Licenciatura em Ciências Exatas, na

disciplina SLC 0631 – Psicologia da

Educação II, Instituto de Física de

São Carlos – USP, como parte do

critério de avaliação do curso.

Docente: Prof.º Dr. José Fernando

Fontanari

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Sumário

Objetivo...............................................................................................

Introdução............................................................................................

As gangues e a subcultura......................................................................

As gangues e a adolescência...................................................................

Motivações para ser um gângster............................................................

Da pichação à bandidagem........................................................................

“A família da rua”...........................................................................................

Normas de obediência de uma gangue: Entrar, permanecer e sair de uma

gangue...........................................................................................................

Ser o líder.......................................................................................................

Alternativas ao “mundo do crime’.....................................................................

As gangues no cinema e na literatura...............................................................

Considerações finais.........................................................................................

Referências........................................................................................................

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1- Objetivos

Compreender o fenômeno da formação das gangues e da delinquência juvenil em

diferentes âmbitos sociais, (através da análise de teorias criminológicas, sociológicas,

psicológicas) que podemos encontrar em sala aula no exercício da profissão docente

em instituições públicas, privadas;

Compreender a necessidade humana de pertencer a grupos e sua relação com

constituição das gangues

2- Introdução

A escola é a instituição social que mais abriga indivíduos jovens com diversas

necessidades, aptidões, valores sociais e perspectivas futuras (oportunidades)

em uma sociedade marcada por diversas manifestações de desigualdades. É

nesse meio propício ou mesmo fora dele (bairros, ruas, guetos, Instituições

correcionais) que surge o fenômeno das “gangues”. Voltando ao passado

vamos perceber que a origem dos gangsters aconteceu nos Estados Unidos,

quando a Emenda 18 (de 1919) proibiu a produção e venda de bebidas

alcoólicas. Assim, surgiram várias quadrilhas que faziam o contrabando de

álcool. Mais tarde, quando a Emenda 18 ficou sem efeito, ocorreram várias

tentativas para desmantelar as organizações criminosas comandadas pelos

gangsters, mas isso não foi possível, porque elas já tinham atingido uma

grande força e autonomia. Alguns dos contrabandistas mais famosos dessa

altura foram Al Capone (em Chicago) e Lucky Luciano (em Nova Iorque).Um

dos mais famosos gângsters da história foi o americano de origem italiana

Alphonsus Gabriel Capone, o Al Capone, que atuou em diversos crimes ligados

ao contrabando, nos Estados Unidos, nos anos 1920 e 1930. Foi preso por

sonegação de impostos.

Gangues criminosas certamente existem há tanto tempo quanto o crime não é

necessário uma cabeça criminosa para perceber que há força nos números. A

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urbanização que acompanhou a Revolução Industrial deu origem à gangue de

rua moderna. A cidade de Nova Iorque foi o epicentro da atividade das gangues

nos Estados Unidos no século XIX. Áreas pobres da cidade, tais como Five

Points, forneceram terreno fértil para gangues com fortes identidades étnicas,

geralmente irlandesas. Gangues baseadas nas etnias polonesa, italiana ou em

outras, também eram muito comuns. Os Forty Thieves, Shirt Tails e Plug Uglies

lutavam pelo território, roubavam e assaltavam pessoas e às vezes uniam-se

para lutar contra gangues de outras áreas da cidade, como a zona portuária e o

distrito de Bowery. A atividade das gangues aumentou gradualmente no século

XX. Nos anos 50 e 60, a maioria das gangues estava nas grandes cidades,

embora cidades próximas e subúrbios possam ter hospedado ramificações de

gangues quando ligados por meio de autoestradas importantes. Gangues com

etnia europeia tinham quase desaparecido e as gangues tornaram-se quase

que exclusivamente negras ou hispânicas na sua filiação. Algumas das

gangues mais notórias nos Estados Unidos são os Crips e os Bloods. Os Crips

começaram em Los Angeles no final dos anos 60, em parte em resposta às

atividades de outras gangues da zona leste da cidade. Conforme a gangue

cresceu em poder, gangues menores juntaram-se a ela, até que gangues

afiliadas aos Crips dominaram a cidade. Os Bloods formaram-se em resposta,

conforme as gangues menores e não pertencentes aos Crips procuravam sua

própria base de força. A rivalidade entre Crips e Bloods é um círculo vicioso,

mas brigas internas entre diferentes "bandos" de cada gangue provavelmente

resultaram em mais assassinatos que a hostilidade em si. Hoje, ambas as

gangues têm gangues "franquiadas" operando fora das cidades por todo o

país.

No Brasil isso não é diferente é que aqui e em quase toda a América latina as

gangues fogem um pouco dos estereótipos estampados nos filmes americanos

como o Clube da luta ou Vidas sem rumo. Em termos cinéfilos nossa realidade

está mais próxima ao famoso longa Cidade de Deus, que narra o embate entre

gangues de uma típica favela de um país emergente.

Esse fenômeno tem sido objeto de estudo de uma grande parte das pesquisas

contemporâneas em todo mundo. Apesar da grande diversidade de estudos,

podemos agrupá-los em duas categorias: os que consideram as gangues como

um resultado dos atributos específicos de seus membros e os que as

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descrevem pelas diversas formas de ação criminosa ou "desviante” praticada

por seus membros. O erro dessas interpretações é que elas deturpam a

natureza do fenômeno e subestima as relações entre as condições estruturais

da sociedade e a própria gangue. Sendo assim, para bem compreender o

acontecimento é preciso analisar em que condições as circunstâncias

estruturais da sociedade afetam o desenvolvimento e a conduta das gangues.

Antes de iniciar a análise, é importante identificar alguns dos problemas

levantados pelas conclusões mais recentes dessas pesquisas.

O surgimento das gangues juvenis pra muitos autores está associado ao

preenchimento de certas necessidades com destaque para o consumo de

certos produtos que serão o marco definidor de status do jovem dentro da

gangue. Ao longo do texto vamos analisar a origem das gangues juvenis,

expondo a opinião de diversos estudiosos como Albert Cohen, e sua teoria da

subcultura delinqüente, possíveis caminhos que distam do mundo do crime, a

influência das redes sociais nesses “bandos” alguns aspectos da dissertação

de mestrado de Flávia Nasciutti (programa de pós-graduação em psicologia d

Universidade Católica de Goiás) e da tese de doutorado em Antropologia Social

de Carla Coelho de Andrade pela UnB (Universidade de Brasília).

3. As gangues e a subcultura

Pensando em uma definição mais geral uma gangue seria um grupo de pessoas que compartilha de uma mesma identidade e possuem um objetivo emcomum. O termo está relacionado de forma negativa, já que originalmente é designado a aquele grupo de pessoas que se reuniam para fazer atividades ilegais, como consumo de drogas, roubos e assaltos, além de brigar com outras gangues. Mas é preciso ter muito cuidado ao usar o termo gangue, pois este também pode ser utilizado a um grupo de pessoas que tem sim um

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mesmo objetivo, mas que não agem para o mal, apenas para se reunirem ou confraternizarem-se.

3.1 Teorias da Subcultura Delinquente - Desenvolvida por Wolfgang e Ferracuti (1967), esta teoria defende a existência de uma subcultura da violência, que faz com que alguns grupos passem a aceitar a violência como um modo normalde resolver os conflitos sociais. Mais que isso, sustenta que algumas subculturas, na verdade, valorizam a violência, e, assim como a sociedade dominante impõe sanções àqueles que deixam de cumprir as leis, a subcultura violenta pune com o ostracismo, o desdém ou a indiferença os indivíduos que não se adaptam aos padrões do grupo.

O conceito de subcultura decorre das chamadas sociedades complexas. Pode ser imaginado como uma “cultura dentro da cultura”. É, na realidade, a existência de padrões normativos opostos – ou pelo menos divergentes – dos que presidem à cultura dominante. Antes de tudo faz se necessário, inicialmente compreender o que é cultura, logo após o que é subcultura, para que se chegue finalmente, a teoria da subcultura delinquente.

Cultura: Modelos coletivos de ações, identificados nos modos de pensar, sentir e de comportar-se de uma comunidade, dinamicamente transmitidos de geração para geração e dotados de certa durabilidade. São os conhecimentos, crenças, artes, direitos, costumes, etc.

Subcultura: Divisão dentro da cultura dominante, que tem as próprias normas e valores, ou seja, é uma cultura dentro da cultura. Compartilham linguagens, ideias e práticas culturais que diferem das seguidas pela comunidade geral.

Algumas questões sociais propiciaram o nascimento do pensamento subcultural. No final da Segunda Grande Guerra Mundial, os norte-americanos estavam confiantes e orgulhosos em relação a suas instituições, que tinha raízes em valores culturais protestantes bastante arraigados. Entre estes se incluía a fé na razão, na ciência e na tecnologia; uma ética puritana de empenho no trabalho e autoaperfeiçoamento.

No final dos anos 50, no entanto começam a proliferar alguns problemasem grandes cidades norte-americanas, decorrentes da não acessibilidade de alguns jovens aos valores consagrados por essa sociedade.

O choque entre a cultura e a estrutura social, que não fornecia as condições de acesso aos bens sociais para todos, cria uma espécie de desilusão em relação ao sistema de vida americana.

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Um outro aspecto a se destacar é que há uma característica geral da cultura americana, segundo a qual jovens de diferentes origens e proveniências devam ser julgados com base nos mesmos padrões, de maneira que jovens de classes sociais distintas, raças e etnias diversas veem-se numa competição pelo status e pela aprovação, sob o mesmo conjunto de regras.

Assim, a constituição das subculturas criminais representa a reação necessária de algumas minorias altamente desfavorecidas diante da exigência de sobreviver, de orientar-se dentro de uma estrutura social, apesar das limitadíssimas possibilidades legitimas de atuar. A subcultura, noentanto, não é uma manifestação delinquencial isolada. Vários indivíduos, cada um dos quais funcionando como objeto de referência dos outros, chegam de comum acordo a um novo conjunto de critérios e aplicam estes critérios entre si.

Cada sociedade é internamente diferenciada em inúmeros subgrupos, cada um deles com distintos modos de pensar e agir, com suas próprias peculiaridades e que podem fazer com que cada indivíduo, ao participar destes grupos menores, adquira culturas dentro da cultura, isto é, subculturas.

Os principais teóricos da criminalidade afirmam que as pessoas cometem crimes por uma razão justificável racionalmente. Alguns furtamcoisas porque precisam delas. Elas podem ser comidas, colocadas como ornamentos, utilizadas de qualquer forma ou mesmo vendidas para obtenção de dinheiro. Todas essas diferentes atitudes significam que a posse da coisa subtraída destina-se a um fim especifico. Um fim racional e utilitário.

Várias críticas, ao longo do tempo, são feitas ao pensamento subcultural. Tal perspectiva não consegue oferecer uma explicação generalizadora da criminalidade, supervalorizando algumas conclusões válidas, em princípio, somente para determinadas manifestações da delinquência juvenil nos grandes centros urbanos. A principal lição que se pode tirar de tais teorias, sem qualquer dúvida, é que dadas suas características particulares, o combate a essa criminalidade não se podefazer através dos mecanismos tradicionais de enfrentamento do crime. Sendo que a ideia central dessa forma de prática delituosa tem certas particularidades que são dessemelhantes de outras formas mais corriqueiras, ademais , algumas dessas manifestações não se combatem com a pura repressão, mas sim com um processo de cooptação dos grupos, envolvendo-os com o mercado de trabalho e como acesso à sociedade produtiva.

Mas essa teoria só se consagrou e se tornou mundialmente conhecida em 1955, com a publicação do livro Delinquent Boys, de Albert Cohen que diz que “a delinquência não é uma expressão ou um a invenção de uma forma particular de personalidade; poderá existir em qualquer tipo de personalidade, se as circunstâncias favorecerem a associação com modelos delinquentes. O processo de se chegar a ser um delinquente é o mesmo o de se chegar a ser

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um escoteiro. A única diferença é o modelo cultural com o qual o jovem se associa”

3.2- Teorias da Subcultura Delinquente de Albert Cohen

Jovens de classe baixa, devido às condições sociais, encontravam geralmente muitos obstáculos e dificuldades para seguir por meios legítimos o caminho de alcance ao sucesso traçado pela classe média segundo os moldes desta, que produz nesses jovens o que Cohen chamou de Estado de Frustração (Status Frustracion).

Esse estado de frustração provoca, segundo Cohen “fortes sentimentos de humilhação, angustia e culpa, devido a interiorização da ética e do sucesso, que tem, como componente decisiva, a tendência para confundir o sucesso com a própria virtude”.

“Uma saída possível, para essa situação, seria repudiar-se ao jogo e sair dele, recusando-se a reconhecer regras que para eles, não tem qualquer aplicação eestabelecer novos jogos com as regras e critérios de status, regras segundo asquais eles possam realizar-se satisfatoriamente”

Em virtude disso, os jovens reúnem-se em grupos subculturais e desenvolvem comportamentos característicos. Cohen os classificou em seis: não utilitários, maus, negativistas, versatilidade, hedonismo-imediatista e a autonomia do grupo.

1) Não utilitário: Muitas gangues furtam sem motivação utilitarista, já que o valor do objeto furtado é por si mesmo, uma motivação, pois esse objeto roubado engloba sentimentos glória, bravura e satisfação;

2) Maus: Os membros das gangues de delinquentes jovens revelam um evidente prazer em agredir ou molestar as pessoas e desafiar os tabus sociais;

3) Negativista: a subcultura representa a subversão total e a inversão de valores da cultura dominante. A subcultura delinquente toma suas normas da cultura dominante, porém, invertidas

4) Versatilidade: a conduta delitiva pode ser praticada de várias formas pela mesma subcultura delinquente;

5) hedonismo-imediatista: desconsideração pelos objetivos a longo prazo, no planejamento de atividades e administração do tempo; ou qualquer

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outra atividade que envolva conhecimento ou habilidades que somente são adquiridas pela prática, deliberação e estudo;

6) Autonomia: os membros da subcultura delinquente se opõem a toda restrição de controle dos pais, professores e outros agentes de controle social; essa organização proporciona aos seus integrantes um propósito, uma forma de vida que demanda lealdade, reciprocidade e colaboração mútua, subordinando os desejos e aspirações pessoais às demandas e prioridades do grupo.

Dessa forma , a delinquência não é um produto inerente à classe inferior, mas, ao contrário, é uma função das limitações sociais e econômicas suportadas pelos membros dos grupos sociais desafortunados. O entorpecimento da responsabilidade da pobreza é o real vilão na criação da carreira delinquente.

4. - As gangues e a adolescência

Entretanto de um modo geral, estudos recentes indicam que os grupos de gangue encontram-se em todos os níveis socioeconômicos da população brasileira e caracterizam-se, basicamente, por um agrupamento de pessoas (em sua maioria jovens entre 15 e 24 anos de acordo com critério apontado pela ONU, 2004) que se organiza em seusterritórios, identificando-se com líderes, tipos de linguagem e gestual, criando normas próprias para entrada e permanência no grupo. A UNESCO dispõe de uma estatística que analisa a composição das gangues por idades: 7% estão integradas por garotos menores de doze anos; 15% por adolescentes de doze a catorze anos; 38% têm membrosde catorze a dezesseis anos; e 40% estão compostas por jovens de dezoito anos ou mais

Muitos estudos realizados indicam que o fenômeno das gangues relaciona-se diretamente ao período da adolescência, pois, segundo Aguiar, Bock e Ozella (2002, p. 167 e 169), este é um período que se caracteriza pelas relações sociais e culturais do momento. Sendo assim, a adolescência torna-se “referência cultural para o próprio sujeito que se constitui”.

Várias pesquisas atuais levantam um ponto fundamental na vinculação de adolescentes a grupos de gangue: a questão da vulnerabilidade social dos jovens diante da atual conjuntura da sociedade capitalista. Há questões importantes a serem considerados como experiência de trabalho, nível educacional, composição e recursos familiares, assim como oportunidades sociais e culturais na vivência dos jovens na atualidade.

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Por outro lado, na analise de Goldstein e Conoley (2004) da cultura da violência na sociedade norte-americana, esta coexiste na conjuntura social comquestões relacionadas a pobreza, desemprego, racismo, escolas inadequadas, alienação cultural, fácil acesso a armas, álcool e drogas, falta de infra-estruturas sociais para jovens, redução da influência de instituições socializadoras, como igreja e família, e difusão de ideologias e soluções 24 agressivas por meio da mídia. Estes autores sugerem ainda que atos de vandalismos, violência e formação de gangues vinculam-se diretamente a toda essa conjuntura.

Além de atos ilícitos e de práticas de violência, as gangues também se caracterizam por relações que legitimam os laços de amizade e afinidade (MARTINS e TELAROLLI, 2004; WAISELFISZ, 1998).

Os grupos são constituídos por meio das relações de vizinhança, proximidade de bairros e também na sociabilidade do ambiente escolar, ou seja, estabelecimento de amizade nas relações no âmbito da escola.

5 - Motivações para ser um gângster

São vários os motivos que levam as pessoas a optarem por fazer parte de uma

gangue, dentre eles podemos listar os seguintes:

5.1- Pertencer a um grupo: muitas vezes as pessoas sentem-se excluídas e

veem nas gangues certa aceitação, mesmo que não seja real; busca de

identidade e auto-estima.

5.2- Receber proteção/Insegurança: as gangues ajudam seus membros, e

estar dentro delas faz com que se tenha certa segurança. Muitos acabam

parando dentro de uma gangue quando se sentem ameaçados por alguém;

5.3- Desejo de vingança: Defender um amigo ameaçado ou agredido por

outro jovem, que por sua vez reúne outros amigos para se vingar.

5.4- Ganhar dinheiro: por fazerem atividades ilegais como roubo e tráfico de

drogas, há possibilidade de dinheiro fácil, além da possibilidade de se tornar

conhecido e famoso

Acesso facilitado às drogas

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Como Cohen (1955) fala da já citada subcultura adolescente por meio da qual

o indivíduo busca a satisfação de suas “necessidades sócio-emocionais” que,

não satisfeitas pelo primeiro grupo de referência, podem ser supridas pelo

grupo de pertencimento.

6.- Da pichação a bandidagem

Baseado nas pesquisas da doutora em antropologia social, as gangues juvenis

fazem parte de uma realidade que adentra o cotidiano Dos núcleos urbanos

das capitais (DF). No começo tratava-se se pequenos grupos- “turmas de

chegados” que se reuniam exclusivamente com o intuito de pichar, o que

considerado uma brincadeira, uma diversão (processo lúdico). Paulatinamente,

esses grupos foram crescendo, seus integrantes abandonando a prática de

pichação envolvendo-se cada vez mais com o consumo e tráfico de drogas,

com armas, roubos, assaltos e crimes. A diversão que era uma situação

recorrente lúdica transformou-se em bandidagem. Ou seja, as atividades

delinqüentes iniciam-se em razão da necessidade de aquisição dos sprays

usados paras as pichações e, em seguida se intensificai pela possibilidade de,

por meio delas, os jovens terem acesso ao mundo do consumo. “ficar nos

panos para fazer estilo nos baile no funk.

Assim a pichação pode ser entendida como “forma inaugural de uma

linguagem das gangues” (Diógenes, 1998) que aos poucos vai sendo

entrecortada pela dimensão da violência, emergindo assim uma nova

configuração desses grupos, que, mesmo abandonando a pichação, continuam

fazendo da rua. “São identificadas apenas pelo nome que se referem

principalmente à bandidagem, rebeldia e ao demoníaco “Unido do inferno”,

“Destemidos contra-atacam ou alguns signos materiais e visuais que os

distinguem” Bode branco”, “Adidas”, Nike.

As características delimitadoras e diferenciadoras desses grupos são bastante

difusas e misturadas. A própria complexidade da dinâmica e da conformação

dessas associações torna fútil qualquer tentativa de tipificação estrita. Até

porque, como já foi dito, as gangues assumem existência oportunamente e

seus membros podem transitar de uma identidade à outra, ou seja, pertencem,

ao mesmo tempo, a uma galera, a um grupo de quadra ou de amigos da escola

e a uma gangue. Dizendo de outro modo, o membro de uma gangue de

pichadores pode ser ao mesmo tempo consumidor de drogas, assaltante,

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ladrão, cantor de rap, trabalhador, estudante. Por isso embora os jovens

identifiquem vários tipos de gangues, os seus contornos são sempre bastante

fluidos e sutis. Ceilância, samanbaia e Planaltina. A idéia de solidariedade

construída em torno das noções de fraternidade, lealdade e fraternidade, da

motivação de responder pelo coletivo.

Existem grupos que se dedicam apenas à pichação. Na maioria dos casos são

formados por adolescentes que picham pelo aspecto lúdico da atividade, pra se

divertir, “pra curtir” e comprar o spray com o pouco dinheiro que conseguem

obter da família. Porém optar unicamente pela pichação pode ser motivo de

discriminação por parte dos grupos que assumem a vida criminosa, pois dando

a impressão de que são pessoas medrosas, sem malandragem, “sem atitude”

só tem admiração de seus próprios companheiros. Vale ressaltar aqui nesse

ponto, que a inserção escolar e no trabalho podem ser considerados fatores

significativos de proteção contra o envolvimento de jovens com gangues, mas

não são suficientes para impedir que desenvolvam tais filiações. Até porque a

escola foi um dos espaços importantes para o contato com esses grupos.

6.2- A família da rua

Está “família da rua” é percebida como uma comunidade emocional que

ampara, apóia e da proteção em situações nas quais a “família de casa” não

pode intervir, mesmo porque quase sempre desconhecem as inquietações dos

jovens que são abertamente discutidas nesse outro cenário de socialização. “

Na família da rua” o jovem pode construir uma outra posição no espaço social,

distinta da que é pautada pela relação vertical e assimétrica existente na

família de casa.

O interessante é que esse grupos podem ficar tão sólidos a ponto de ter mais

de cinqüenta integrantes tendo a necessidade destes cadastrarem seus

nomes, apelidos endereços e telefones, se vestem da mesma maneira,

mesmas marcas de roupas, criam uma linguagem própria com gírias e

cumprimentos diferenciados.Possuindo ainda o vínculo com pessoas mais

velhas, mães de famílias dispostas a ajuda- los em momentos difíceis.

Leupoutre (1997) faz questão de enfatizar o quanto à noção de honra conserva, ainda em nossos dias, um enorme poder explicativo. O antropólogo francês, a partir de suas experiências com jovens adolescentes da banlienue

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parisiense, defende a idéia de que a honra é “determinante na análise da conduta de indivíduos e também dos grupos” (Leupoutre, op. Cit: 270)

Isso acontece, sobretudo com os jovens do sexo masculino, onde a honra é umvalor fundamental na decisão de aderir a uma gangue, sendo uma palavra praticamente inexistente em seus discursos. “Honra” existe em seus discursos por meio da noção de ”reputação”, fortemente presente em suas consciências.

O fato é que os jovens dão grande importância para os juízos formados acerca deles, principalmente para os julgamentos tecidos por seus pares. O valor da pessoa é medido no interior do seu grupo, para o qual devem provar coragem física, bravura, audácia, intrepidez e demonstrar que aderiram aos valores e ideais partilhados por todos os membros. É por isso que para ser honrado e reconhecido por uma gangue faz-se necessário passar por ritos de iniciação.

7.- Normas de obediência: Entrar, permanecer e sair da gangue

O processo de admissão de uma gangue e sua conseqüente permanência são regidos por códigos de honra, traduzidos na demonstração de coragem, força, temeridade e astúcia, predicados considerados de uma “pessoa de atitude”. Lealdade ao grupo, impiedade para com os outsiders e adversários, obediênciaas regras fundamentais, como a lei do silencio, participam do mesmo código. Tudo com o intuito de tornar previsível e confiável o comportamento de seus participantes. Dessa forma para se tornar um membro da gangue, o indivíduo precisa cumprir certas obrigações e pode ser submetido a diversas provas a fim de mostrar seu comprometimento com o código de valores. Os jovens pagam pedágios, isto é, dão dinheiro para o grupo, mesmo que para isso tenham que roubá-lo, ou tem que fornecer bebidas objetos de valor, além de normalmente serem “batizados”, apanhando e passando por um corredor polonês.

Ocorrem casos em que os chamados pactos de sangue são feitos como prova de lealdade ao grupo. Os jovens autoflagelam riscam-se, cortam-se, tatuam-se,queimam-se com cigarros adquirindo uma marca identificatória como sinal de reconhecimento.

Assim como para ingressar numa gangue, também existe para o indivíduo permanecer fazendo parte de uma. O jovem deve-se manter fiel ao pacto inicialde não denunciar companheiros e seguir a lei do silêncio. E na periferia, segundo os jovens, para alguém mostrar que é uma “pessoa de atitude” é preciso aceitar os desafios, vingar-se, impor moral, ter malandragem, andar armado. A atitude é à medida que estabelece o grau de reputação e respeito, principalmente no código masculino.

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A saída de uma gangue se torna um processo bastante difícil, uma vez que experiências foram partilhadas, compromissos foram assumidos e pactos preestabelecidos. Quem deseja sair geralmente, é mal visto, pode apanhar e sofrer agravos provocados pelos companheiros. Chegando ao ponto de muitas vezes serem obrigados a desaparecer, a mudar de endereço e de cidade satélite.

7.2 -Ser o líder

Desde o momento da formação da gangue a expressão de um fenômeno de liderança é bastante evidente. Para tornar-se um líder é necessário que o jovem se “notabilize” pela atitude e coragem “Bateu ou atirou em alguém”, pela malandragem e tenha dado provas de ser uma pessoa solidária, capaz de identificar nas situações mais imprevisíveis, aquilo que representa ameaça ao grupo.

Kroak líder de uma gangue de Samambaia, explica que o seu papel é o de comandar o grupo, organizando a participação de todos, marcando as reuniões, conseguindo armas, recolhendo fundos para compra de spray, bebidas, drogas e outras necessidades dos membros. Convocar o grupo par a briga em situações de conflitos com grupos rivais, estar presente em todas as brigas protegendo o grupo.

7.3- Códigos de conduta para roubos e assaltos (caso específico da gangue estudada na tese)

Os roubos e assaltos são, em geral, pautados por determinadas regras, como não estuprar, não roubar velhos, não roubar pai de família, trabalhador, parentes próximos. Assaltar e roubar dentro da própria área é também considerado uma falta bastante grave.

O sentimento de classe e de identificação com o pobre acaba sinalizando as zonas que se devem ser preservadas intactas das práticas transgressoras e delinqüentes dos integrantes das gangues. Como diz Glória Diógenes, ”é comose fosse possível designar um termo relativo a uma prática ‘consentida’ de violência e os limites que não podem ser transpostos no campo dessas práticas, construindo assim referenciais compactuados entre seus participantes” (Diógenes 1998).

Principalmente entre os adolescentes existe uma lógica pautada por uma ética “robinwoodiana”, tirar dos ricos para dar e distribuir entre os pobres.

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7.4 - Rivalidades entre as gangues

O conflito entre, os grupos como foi mencionado anteriormente, é um dos motivos que levam os integrantes das gangues a se reunirem. Quando o conflito se manisfesta, procuram-se munir com um maior número de armas, comprando-as, roubando-as, e escolhem aqueles que participam da briga.

As razões para os embates entre gangues/galeras, segundo os informantes, são inúmeras: pode ser um simples “olhar que o outro não gosta”, um esbarrão,uma rivalidade entre as turmas, um provocação, um deboche, invasão de território, mulheres. As brigas se dão por causa de um boné, de uma chinela, de armas. Pichar em cima de outra pichação ou a defesa de uma assinatura pode levar a conflitos extremos.

7.5 – Convívio natural com a morte

A morte violenta é um fato na atividade das gangues, o que faz com que, além de conviver com ela, dá-se à mesma valoração significativa. Para alguns jovens não apenas morrer, mas também matar é visto como natural, como um ato de defesa, ligado a sobrevivência, e para qual a pessoa precisa ter coragem. O ato de matar uma pessoa não é julgado a priori como um crime, segundo a concepção do Estado brasileiro de justiça. O ofício de matar outorgaprestígio e reconhecimento social no interior dessa subcultura. Para ser levado a sério é necessário mostrar que se é capaz de matar, ou seja, deve traduzir o discurso de coragem e valentia numa prática violenta. Em certas ocasiões é preciso matar para não morrer e o ato de matar pode trazer fama aos jovens.

7.6- Preconceito e discriminação em relação à condição feminina

De acordo com a tese de doutorado ficou evidente que o perfil desses agrupamentos juvenis é essencialmente masculino, o que não significa que nãoexistam mulheres no seu interior. Contudo, o envolvimento das mulheres nas gangues não tem a mesma magnitude que o dos homens. Elas situam-se em posições periféricas nesses grupos: são namoradas, amigas ou vizinhas integrantes. Alguns jovens atribuem o envolvimento de meninas em gangues à influência dos namorados bandidos e malandros, ao abandono familiar e à falta do que fazer. As jovens, quando necessário, também conseguem dinheiro para os jovens, através da “manha”, ou seja, atraem homens e roubam como qualquer elemento masculino.

8. - Alternativas ao mundo do crime

O ingresso no “mundo do crime” e o final trágico que ele projeta são realidade de muitos jovens com gangues em várias periferias por todo Brasil. O fato é que o destino incontornável de quem “cai na bandidagem” é a prisão, a

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invalidez e a morte violenta. Trata-se mesmo de “vocação”, destino irreversível? Ou ainda é possível mudar essa trajetória? Para reflitir essas questões, proponho deter-me na trajetória de quatro jovens ex-integrantes de gangues, cujas histórias colocam em xeque essa idéia de irreversibilidade do destino de quem “mergulha” no mundo do crime. Suas histórias – Uma adesão ao movimento Hip-Hop e três de conversão religiosa.

8.1- Da gangue para o Hip- Hop: A história de Jadson Jones

8.2 – De integrante de gangue a homem de Deus: história de Jeferson, Eduardo e Carliomar

9.- As gangues na literatura e no cinema

O fenômeno das gangues representa um pouco da realidade da necessidade e dos estilos sociais dos seres humanos, principalmente na fase da adolescência. Só por esse fato já era de se esperar que este fosse muito retratado de diferentes perspectivas sociais e culturais ao redor do mundo em grandes clássicos da literatura e do cinema.

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9.1- Laranja Mecânica: Em um dos grandes clássicos da literatura distópica e também adaptado ao cinema, Alex de Large (Malcolm McDowell) e os seus “droogs” espalham terror pela noite de uma Londres futurística.

9.2- Vidas sem rumo: Baseado em um livro do escritor S.E. Hinton, o filme acompanha a vida dos membros de uma gangue de Oklahoma, em plenos anos 60. As disputas dos Greasers contra os Socs revelaram aos cinemas grandes atores como Tom Cruise, Matt Dillon, Patrick Swayze, e Emilio Estevez.

9.3- Cidade de Deus: (Fernando Meirelles, 2002)

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Sinopse: A história é em torno de Buscapé (Alexandre Rodrigues), que cresce em um universo

de muita violência, onde reinam duas principais gangues, a de Zé Pequeno e a de Mané

Galinha.

9.4- Capitães da Areia: Uma gangue de meninos de rua à solta na cidade grande, ociosos, abandonados à própria sorte. Uma mistura de miséria, violência, ódio, trapaça, humilhação e solidão, valentia, fraternidade, sonhos.

A primeira obra a escancarar o universo da delinquência juvenil noBrasil provocou reações exacerbadas assim que saiu do prelo. Publicado em 1937, pouco depois da instauração do Estado Novo,o livro foi lançado sob o prenúncio da inovação e da polêmica, o que gerou uma resposta política imediata por parte das autoridades. A primeira edição foi apreendida, e 808 de seus exemplares, queimados em praça pública na capital baiana, Salvador, na presença de membros da Comissão de Busca e Apreensão de Livros. O argumento? Os livros eram "simpatizantesdo credo comunista", segundo o jornal O Estado da Bahia de 17 de dezembro daquele ano.

9.5- Pixote a lei do mais fraco: Neste filme, Hector Babenco construiu um dos mais cruéis retratos da realidade nas ruas de São Paulo, onde crianças têm sua inocência retirada ao entrarem em contato com um mundo

de crimes, prostituição e violência.

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10. - Considerações finais

A sociedade atual descreve um espaço social propício à formação de identidades coletivas, ou seja, as gangues e outras formações de grupos de jovens têm manifestações distintas ligadas a música, lazer e delinqüências. Pormeio dessas manifestações, esses grupos e os seus sujeitos integrantes encontram formas de afirmação de identidades (WAISELFISZ e col. 1998). Pegoraro (2002) analisa que os jovens vivem, desde os anos 80, uma mudançacrucial em seu processo socializador, pois, cada vez mais, a família, a escola e o trabalho têm deixado de assumir sua função formadora dos indivíduos na sociedade. É cada vez maior o espaço ocupado pelos meios de comunicação de massa, as vivências em grupos minoritários e o espaço urbano das ruas noscenários de afirmação e formação dos sujeitos.

11.- Referências:

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http://tede.biblioteca.ucg.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=155

http://www.ebah.com.br/content/ABAAAfj1UAH/teoria-subcultura-delinquente

http://pascal.iseg.utl.pt/~cesa/files/Doc_trabalho/WP120.pdf

http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=929

http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_34/rbcs34_02.htm

http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/RevCiencJurid/article/view/8993/5030

http://pessoas.hsw.uol.com.br/gangues1.htm

http://bdtd.bce.unb.br/tedesimplificado/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=2865

http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1413-389X2010000100005&script=sci_arttext

tese de doutorado em antropologia social entre gangues e galeras

http://listasliterarias.blogspot.com.br/2014/04/10-gangues-famosas-da-literatura.html

Adesão aos “valores da violência”

http://bdtd.bce.unb.br/tedesimplificado/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=286

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