Caminhos Da Colonização Alemã No RS

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    CAMINHOS DA COLONIZAÇÃO ALEMÃ NO RIO GRANDE DO SUL:

    POLÍTICAS DE ESTADO, ETNICIDADE E TRANSIÇÃO

    Raul Rebello Vital Junior  

    1 Introdução

    A camada dominante da sociedade brasileira que vai ancorar o movimento de

    independência política do País irá identificar-se como integrante de um Estado

     profundamente hierarquizado e escravista.

    D. Pedro era visto pelas elites que apoiaram a independência política do Brasil

    como a saída para um processo sem traumas. Preservar o sistema monárquico foi a

    fórmula pensada para evitar movimentos republicanos, abolicionistas e a participação

    das camadas populares no processo separatista. Evitar radicalismos e manter a

    escravidão eram desafios que se impunham ao Estado recém-formado.

    A monarquia brasileira que se constituiu a partir de 1822 trouxe consigo um

    formato social herdado das antigas estruturas coloniais. Latifúndio, monocultura e mão

    de obra escrava integraram o tripé que perpetuou a herança colonial para a base

    econômica do Brasil. Formou-se um Estado aristocrático, voltado para os interesses deuma elite escravocrata.

    Pode-se perguntar: que espaço existiria diante dessa dinâmica para uma política

    imigratória? Se dependesse da mentalidade das elites agrárias do País, essa resposta

     poderia ser dada de forma simples e objetiva: nenhum.

    A escravidão brasileira encontrava-se de tal forma incorporada ao ethos  das

    elites nacionais que seguramente não cogitariam alternativas a ela. O sistema escravista

    fazia parte da “ordem natural da economia brasileira”. O trabalho, para a SociedadeImperial, não se apresentava como um valor. O destino da aristocracia com ascendência

    europeia era usufruir das benesses do trabalho servil.

     Neste sentido, percebe-se uma aparente contradição entre os interesses do

    Império e os dos setores escravocratas no Brasil. Convém lembrar que as pressões

    internacionais cresciam de forma considerável para a abolição do tráfico internacional

     Mestre em História. Professor da FAPA e da rede municipal de ensino de PortoAlegre. 

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    de escravos. Desde a fase Joanina, a Inglaterra tentava impor ao Estado português o fim

    do comércio escravista desde o ano de 1810, por conta do Tratado de Aliança e

    Amizade. Em 1827, novo tratado foi firmado entre Brasil e Inglaterra. O compromisso

    do governo brasileiro em extinguir o tráfico até o ano de 1830 não se efetivou. A

    tentativa de decretar o fim do tráfico em 1831, por Feijó, também não foi colocada em

     prática. A culminância dessas pressões resultou na Bill Aberdeen (1845). Com esta lei,

    a Inglaterra se outorgava o direito de capturar qualquer navio negreiro, independente de

    sua nacionalidade, e julgar os traficantes.

    Mesmo com o contexto desfavorável para a manutenção do sistema escravista,

    mexer no sistema de mão de obra no Brasil não foi algo simples. Houve um longo

     período de transição. Logo, volta-se à questão anterior: qual a função da imigração em

    um País com uma estrutura escravocrata tão consolidada? Estaria o Estado brasileiro à

    frente dos próprios grupos que o mantinham? Certamente, não. Nem tampouco pode-se

    considerar a questão servil como fator único nas ações do Estado brasileiro diante da

     política imigratória na primeira metade do século XIX.

    Já na segunda metade do século XIX, essa situação mudou, e a questão servil

    ganhou corpo principalmente a partir da lei Eusébio de Queiroz (1850).

    Para as questões apresentadas, encontramos parte da resposta na necessidade de

    formação de um grande exército, voltado para a defesa do território, principalmente em

    áreas de fronteira. O recém-formado Estado brasileiro dava continuidade à pretensão

     portuguesa do século XVIII por intermédio do Conselho Ultramarino, que entendia a

    colonização como forma de firmar soberania. A mesma intenção foi reafirmada na fase

     joanina. Em 1808, foram promulgados dois decretos por D. João, dando início à política

    de estabelecimento de colônias agrícolas na Brasil, sendo determinada a vinda de 1.500

    famílias trazidas dos Açores para a Capitania do Rio Grande do Sul e permitida a

    concessão de sesmarias a estrangeiros, buscando aumentar a lavoura e a população. Noano de 1818, foi fundada a colônia de Nova Friburgo, na então província do Rio de

    Janeiro.

    Junto com essa demanda, existia a necessidade de ocupação dos espaços vazios,

    conjugando-os ao desenvolvimento da agricultura e de outras áreas da economia.

    Os séculos que marcaram as práticas escravistas no Brasil naturalizaram a crença

    na incapacidade para o trabalho por parte do caboclo e do negro. Entre os séculos XIX e

    XX, essa crença passou a ser incorporada como verdade por parte da intelectualidade brasileira. No entanto, não era só a suposta incapacidade que estava em jogo. A ideia de

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     branqueamento da sociedade brasileira vinha perpassando as iniciativas governamentais

     pelo menos desde 1818, quando o Brasil ainda era uma colônia portuguesa. A

    independência do Haiti e as agitações decorrentes nas primeiras décadas do século XIX

    criaram nas elites brasileiras um verdadeiro pavor em torno da expectativa de uma

    superioridade negra num País que iniciava sua história com uma população em que dois

    terços apresentavam-se como negros e mestiços. Branquear o recém-formado Estado

     brasileiro era fundamental. O imigrante alemão enquadrava-se nas necessidades de uma

    ação eugênica de um Estado europeizado e escravista.

    2 As expectativas diante da política imigratória

    Diferentes expectativas apresentavam-se diante da colonização europeia durante

    o I Reinado (1824-1831). O imperador tinha como pretensão maior o recrutamento de

    soldados mercenários. A imperatriz, de forma idealista, buscava, por intermédio dos

    colonos, trazer para o Brasil a cultura europeia como forma de “civilizar” a recém-

    formada nação. José Bonifácio defendia a colonização como forma de pôr fim ao

    sistema escravista. Alguns intelectuais, como, por exemplo, Hypolito José da Costa,

    defendiam a colonização europeia enquanto possibilidade de qualificação cultural,

     povoamento, qualificação “física e moral”, bem como preparar o caminho da abolição

    (LEMOS, 1993, p.13).

     No Correio Brasiliense, em 1810, Hypolito da Costa, ao discutir o Tratado de

    Comércio entre Brasil e Inglaterra, chamou atenção para o perigo de ruína do comércio

    externo brasileiro. Pensou como alternativa no aumento da população e do comércio

    interno (PETRONE, 1982, p. 18). A saída era a imigração.

    Independente das posições não consensuais por parte dos representantes do

    Estado acerca da imigração, durante o I Reinado, foi assumido um projetoinstitucionalmente organizado que se voltava não só para questões militares, mas para a

    constituição da pequena propriedade rural.

    O imigrante europeu alemão no Rio Grande do Sul, segundo o discurso oficial,

    deveria superar as deficiências da produção nacional para abastecer os núcleos urbanos.

     Nas regiões não ligadas diretamente à cultura de produtos para o mercado externo, os

    imigrantes utilizariam sua própria força de trabalho, e assim deveriam diminuir os

    efeitos da crise de mão de obra na produção de alimentos, povoando as áreas devolutas.O projeto não incluía posseiros e indígenas presentes nas áreas coloniais.

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    Cabe ressaltar que os interesses de ocupação das terras devolutas no nordeste do

    Rio Grande do Sul não ficaram restritos apenas à questão da produção e do

    abastecimento. Existiu forte interesse em promover um processo de valorização

    fundiária decorrente do processo de povoamento de terras, que passaram a constituir-se

    como um elemento de grande importância nesse cenário. Esse processo de valorização

    fundiária esteve diretamente ligado à Lei de Terras, de 1850, que, além de gerar uma

    diminuição da oferta de terras, contrastaria com o aumento da demanda decorrente da

     política migratória.

    É possível encontrar estas práticas especulativas mesmo antes de 1850. No

     período da fundação de São Leopoldo, objetivando o povoamento da área das antigas

    Missões, foi feita a transferência para São João das Missões. Além da questão do

     povoamento, foi buscada a valorização fundiária da área. O isolamento da região acabou

    inviabilizando o projeto (PETRONE, 1982, p. 17).

    A política migratória trouxe para a então província a expectativa do

    desenvolvimento de outros setores da economia, bem como a possibilidade de

    implementar serviços de infraestrutura na região.

    Por meio do agenciamento, o Governo Imperial recrutou, em vários Estados

    germânicos, simultaneamente, colonos e soldados, buscando definir, inclusive, questões

    de soberania nacional.

    Pensar na criação de classes sociais intermediárias no sul do País como forma de

    atenuar o poder das elites latifundiárias e escravocratas era outra preocupação existente.

    Enfim, a pequena propriedade, o mercado interno, a ocupação do território e a

    constituição de efetivos militares são algumas das razões que levaram a uma política

    colonizatória por parte do Império brasileiro.

    3 O cenário europeu diante da política imigratória

    A menor influência, se comparado com a Inglaterra e a França, diante do cenário

     brasileiro, não impediu que, no século XIX, o País recebesse uma quantidade

    significativa de imigrantes alemães. A imigração alemã deu início a uma política

    intencional do governo de atrair contingentes populacionais europeus não portugueses

     para o Brasil. A intensificação do contato se deu a partir do casamento da princesa Dona

    Leopoldina, da casa de Habsburgo, com o Imperador Pedro I.

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    Até o início do século XIX, a Alemanha manteve-se como uma região

    essencialmente agrária. Os 38 Estados alemães integrantes da Confederação Germânica

    mantinham forte oposição à unificação. A hegemonia austríaca sobre esses Estados só

    conseguiria ser mantida mediante a permanência da fragmentação do território. Nestas

    condições, o desenvolvimento capitalista esteve travado.

    A exceção a esse cenário é a região da renana. A influência da Prússia provocou

    uma relativa expansão industrial e comercial. A criação do Zollverein (união aduaneira

    dos Estados alemães), no ano de 1830, colaborou para esse processo. A Unificação da

    Alemanha, que só se consumou em 1871, foi influenciada por uma Europa em constante

    transformação. A Europa, nesse período, atravessou ondas revolucionárias das mais

    diversas ordens. Os movimentos liberais de 1830 e 1848, e a aceleração econômica

    decorrente das Revoluções industriais mudaram a feição do continente. Trabalhadores

    agrícolas e outros contingentes populacionais foram duramente atingidos por essas

    transformações.

    Em um período de uma Alemanha ainda não unificada, a velocidade das

    transformações econômicas trouxe sequelas sociais que estimularam o processo

    migratório em suas diferentes fases. O desenvolvimento industrial, a partir de 1850,

    acelerou a passagem de uma sociedade rural para urbana e abriu caminho para grandes

    deslocamentos populacionais.

    Junto com as transformações econômicas, cabe a lembrança das ondas

    nacionalistas despertadas na Europa durante a era napoleônica. A derrota de Napoleão, a

    reação conservadora legitimada pelo Congresso de Viena (1815) e pela Santa Aliança,

    não foram suficientes para abrandar o ímpeto revolucionário. Este cenário mais amplo

    refletiu de maneira incisiva sobre a unificação da Alemanha. Tensões sociais, políticas e

    fortes mudanças econômicas constituíram um quadro favorável para que representantes

    do governo brasileiro buscassem a mão de obra excedente no continente. Nestecontexto, havia uma equação possível entre a carência de trabalhadores que existia no

    Brasil com a necessidade de espaço e trabalho das populações europeias.

    4 Colonização alemã no Rio Grande do Sul (1824-1840)

    Georg Schaeffer aportou no Rio de Janeiro no ano de 1818. Amparado pelo

    título de “navegador mundial” e dono de uma indiscutível cultura, aproximou-se da princesa Leopoldina. As portas da Corte lhes foram abertas em um curto espaço de

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    tempo. As facilidades oferecidas na fase joanina renderam dividendos ao major com o

    futuro imperador do Brasil, D. Pedro I. O militar embarcou em missão oficial e sigilosa

     para Europa em setembro de 1822 (LEMOS 1993, p. 32-33).

    O embarque para a Europa, em 1822, do agenciador major Schaeffer, pouco

    antes da independência, deixaram claras as intenções da Corte em obter a aprovação dos

    governos da Santa Aliança para a causa brasileira, assim como de atrair mercenários

     para a guerra iminente contra Portugal.

    Além da questão portuguesa, as constantes tensões no Prata, no período pós-

    independência, criavam necessidades do aumento do contingente militar na região. No

    ano de 1825, lideranças separatistas da Cisplatina, sob o comando de Lavalleja e cientes

    da adesão de Frutuoso Rivera, proclamaram a independência da província em relação ao

    Brasil. A declaração de guerra do Brasil foi imediata. O conflito durou até 1828. A

    intervenção diplomática da Inglaterra fez com que o Brasil aceitasse o Uruguai como

    um Estado independente.

    Os encaminhamentos feitos na Europa para os recrutamentos em questão

    descreditaram o projeto do governo de D. Pedro I diante das elites brasileiras e de

    grande parte dos governos europeus (CUNHA, 2010, p. 282).

    O objetivo maior de recrutamento militar para formar os batalhões estrangeiros

    denunciados por jornais contribuiu muito para o descrédito da missão. Era evidente a

    existência de uma lógica geopolítica presente nas intenções do Estado brasileiro durante

    o I Reinado.

    Cabe ressaltar que o processo de ocupação das terras devolutas não trouxe

    consigo qualquer princípio de respeito com as populações autóctones das regiões

    distribuídas aos colonos. Os conflitos gerados entre colonos e índios levaram a um

     processo acentuado de extermínio étnico. A figura dos bugreiros ganhou importância

    nas áreas coloniais para dirimir conflitos entre o colonizador europeu e os índios.Quanto à tentativa de recrutamento na Europa, o resultado não foi o esperado.

    As críticas foram duras, pois desagradou muito o fato de o governo ter confiado tão

    importante missão a alguém que não estaria à altura de tal empreitada (LANDO;

    BARROS, 1981, p. 35).

    Entre 1824 e 1828, conseguiram embarcar para o Brasil cerca de 4.500

    imigrantes, entre soldados e colonos em 21 expedições. Se considerado o período de

    1824 a 1830, tem-se o número aproximado de 5.350 imigrantes. Abaixo, tem-se a

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    reprodução de um bilhete de viagem utilizado por um dos milhares de imigrantes

    alemães que vieram para o Brasil no período.

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    Ilustração 1 –  Passagem de imigrante para o Brasil: século XIX

    Fonte: Disponível em . Acesso em: 31 jul 2011.

    Como não se fala, neste período, de um Estado unificado, os imigrantes alemães

    que para cá vieram integravam grupos étnicos distintos e com dialetos próprios. Os

     primeiros colonos vieram de Hunsrück, Saxônia, Württeerg, Saxônia-Coburg. Diante da

    nova realidade, confrontados com uma cultura estranha, desenvolveram entre eles umsentimento de pertencimento étnico.

    As promessas do governo brasileiro foram muitas. Dispunha-se a pagar as

     passagens e os custos da viagem para os que quisessem vir como colonos. Os que se

    dispusessem a vir como soldados receberiam, a partir do embarque, um soldo em

    dinheiro. Ao chegar ao Brasil, o colono teria o direito de escolher a função a

    desempenhar (soldado, colono, artesão, etc.). Para os colonos, ficaria garantido um lote

    gratuito, com a infraestrutura adequada para sua manutenção e a da sua família. Ésabido que as promessas feitas foram cumpridas de forma parcial.

    A primeira fase caracterizou-se como um período de intensas dificuldades. Os

    colonos enfrentaram um forte isolamento, agravado pela ausência de infraestrutura. A

    Ilustração 2, abaixo, retrata as precárias condições de vida dos primeiros colonos, bem

    como sua situação de isolamento.

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    Ilustração 2 –  Imigrantes alemães instalando-se em São Leopoldo/RS: século XIX

    Fonte: Disponível em: . Acesso em: 31 jul 2011.

    As ameaças “naturais” levavam a epidemias. Os enfrentamentos com índios

    foram constantes nessa fase. A demarcação de linhas e lotes nas colônias era feita pelo

    imigrante, bem como a construção de pontes e estradas, a edificação de alojamentos

     públicos, etc. Havia demora na obtenção dos títulos definitivos de propriedade.

    O isolamento a que os colonos foram submetidos reforçou a criação de um

    sentimento étnico, cultural e religioso próprio. O reforço desse sentimento está

    vinculado à ausência de direitos políticos por parte dos colonos que aqui chegaramdurante o século XIX. Essa situação de isolamento era mais agravada entre colonos

    luteranos do que entre católicos.

    O Estado mostrava-se ausente nas áreas coloniais. A carência de políticas

     públicas para a região denunciava uma mentalidade que se estendia aos demais setores

    da sociedade brasileira. A governabilidade do Império não se dava pela sua relação com

    os mais diversos segmentos sociais. O que importava era que se estivesse atento às

    demandas das elites agrárias. Logo, desenvolver políticas públicas em áreas coloniais

    não fazia nenhum sentido. O resultado foi a produção de “quistos étnicos” que, em

     parte, dissociavam a realidade colonial do restante da província, forjando uma

    aproximação identitária que se sobrepôs às diferenças entre os grupos germânicos que

    colonizaram a região.

    Escola, igreja e família se configuraram como instituições que passaram a

    exercer um papel determinante na afirmação da identidade coletiva entre os alemães. As

    escolas, nas colônias, ganharam contornos étnicos, sendo orientadas por princípios

    germânicos, que reforçavam a consciência étnica dos filhos dos imigrantes. Essa

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    identidade também seria fortalecida por outros elementos, como existência de uma

    imprensa local de língua alemã, bem como de produções literárias, entre outras

     publicações que circulavam junto às comunidades. Os primeiros jornais voltados para a

    comunidade alemã, escritos em alemão, surgiram, em Porto Alegre e no Rio de Janeiro,

    em 1852 e 1853, respectivamente.

    A síntese desse processo relacionado à constituição de uma identidade étnica foi

    a composição de um campesinato com características próprias, apesar da diversidade

    existente entre os grupos que vieram para o Brasil. Afirmar o reforço do sentimento

    étnico do grupo não significa desconsiderar a diversidade daqueles que para cá vieram.

    Essa diversidade se encontra em decorrência das regiões de origem dos

    imigrantes, como bem apresenta o Quadro 1, a seguir.

    Quadro 1 –  Procedência de alguns grupos alemães para o Sul do Brasil

    Localidade Fundação Origem

    São Leopoldo/RS 1824 Hunsrück, Saxônia, Württeerg, Saxônia-Coburg

    Sta. Cruz/RS 1849 Renânia, Pomerânia, Silésia

    Sto. Angelo/RS 1857 Renânia, Saxônia, Pomerânia

     NovaPetrópolis/RS

    1859 Pomerânia, Saxônia, Boêmia

    Teutônia/RS 1868 WestfáliaSão Lourenço/RS 1857 Pomerânia, Renânia

    Blumenau/SC 1850 Pomerânia, Holstein, Hannover, Braunschweig, Saxônia

    Busque/SC 1860Bade, Oldenburgo, Renânia, Pomerânia, Schleswig-Holstein, Braunschweig

    Joinville/SC 1851 Prússia, Oldenburgo, Schleswig-Holstein, Hannover, Suiça

    Curitiba/PR 1878 Teutos do Volga

    Sta. Isabel/ES 1847 Hunsrück, Pomerânia, Renânia, Prússia, Saxônia

    Sta.

    Leopoldina/ES1857 Pomerânia, Renânia, Prússia, Saxônia

    Fonte: WILLEMS, Emílio. A aculturação dos alemães no Brasil: estudoantropológico dos imigrantes alemães e seus descendentes no Brasil. 2 ed. São Paulo:Ed. Nacional, 1980, p.38-39.

    A diversidade também se manifestou em torno de interesses divergentes que se

    configuraram na dinâmica econômica do mundo colonial. Essas diferenças são

    manifestas também em decorrência da orientação religiosa.

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    Os primeiros colonos chegaram ao Rio Grande do Sul no ano de 1824. O

    Presidente da Província, José Feliciano Fernandes Pinheiro, encaminhou os imigrantes

     para a Feitoria do Linho Cânhamo. A partir de abril de 1824, a feitoria passou a se

    chamar “Colônia Alemã de São Leopoldo”. O município de São Leopoldo foi o berço

    da colonização alemã no sul do Brasil, juntamente com Três Forquilhas (RS, alemães

     protestantes) e São Pedro de Alcântara das Torres (RS, alemães católicos).

    São Leopoldo se constituiu como o primeiro empreendimento de sucesso. Tal

    sucesso foi atribuído à fertilidade das terras e à privilegiada posição geográfica do

    município. A Ilustração 3, a seguir, retrata a abrangência do recém-criado município de

    São Leopoldo:

    Ilustração 3 –  Carta da Colônia de São Leopoldo

    Fonte: Disponível em: . Acesso em: 30 jul 2011.

    Esgotadas as terras da região do Vale dos Sinos, dadas aos primeiros imigrantes,

    os próximos colonos passaram a receber terras mais distantes, próximas a outros rios,

    como os do Vale do Caí, os do Vale do Rio Taquari e os do Vale do Jacuí. Todas essas

    regiões receberam grande influência germânica na construção da sua cultura. No Vale

    dos Sinos, surgiram as colônias de Campo Bom, em 1825; Dois Irmãos, em 1824; e

    Ivoti, em 1828.

    Inúmeras são as defesas feitas em torno do sucesso do empreendimento

    colonizador em decorrência do fator étnico como essencial ao sucesso colonial. Maestri

    (2010, p. 129) contradiz essa tese ao afirmar que

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    [...] colônias de Três Forquilhas e de São Pedro vegetaram na pobreza, em razão da baixa qualidade das terras e, principalmente dadistância dos mercados consumidores provinciais. Isolados e esquecidos, oscolonos germânicos terminaram semiacaboclados, quase se confundindo comas populações brasileiras que ali viviam.

    Os alemães do Rio Grande do Sul buscavam a posse de terras. A partir de 1824,constituiu-se um sistema de colonização fundamentado na pequena propriedade

    familiar.

    Além da agricultura, que ocupou espaços significativos na dinâmica econômica

    das colônias alemãs no Rio Grande do Sul, merece destaque que, na fase inicial da

    colonização ainda voltada para a subsistência, o artesanato doméstico desenvolveu um

     papel fundamental. Eram produzidos tecidos de linho e algodão. A produção artesanal

    disseminou-se em vários ofícios como o de alfaiate, sapateiro, etc. A importância de produzir artigos para a vida local era grande. Com o desenvolvimento dos transportes e

    com o surgimento do comerciante no mundo colonial, a atividade artesanal tendeu a

    desaparecer (MOURE, 1992, p. 97-98).

    A imigração no Rio Grande do Sul foi interrompida entre 1830 e 1844 em parte

    em decorrência do movimento Farroupilha (1835-1845). O Estado brasileiro, a partir da

    abdicação de D. Pedro I, teve sua instabilidade política agravada. Além do movimento

    Farroupilha, outras rebeliões se espalharam pelo País. O governo acabou por cortar

    recursos destinados à imigração, e só retomou a partir de 1846. Nesse período, a

    representação diplomática brasileira em Berlim deixava clara a intenção do governo

     brasileiro em investir na colonização alemã.

    Possíveis relações que possam ser feitas entre imigração, colonização e leis

    restritivas ao tráfico negreiro devem considerar que o fato de a imigração ser percebida

    como alternativa à diminuição de mão de obra escrava, não se dá em decorrência de

     pensar o escravismo como uma instituição imoral. O sistema é percebido como arcaico.

     Nestes termos, a África não é cogitada como continente que pudesse servir como base

    imigratória, mas percebida como um continente bárbaro; os negros, como inaptos para o

    trabalho. Trazê-los em outra situação, que não a de escravos, terminantemente

    desqualificaria uma sociedade em formação como a brasileira. Logo, não se rompe com

    uma percepção “naturalizada” no Brasil do século XIX sobre a inferioridade do negro

    diante do imigrante europeu (SEYFERTH, 2002, p.202).

    Apesar de os colonos terem sido fixados em áreas que não interessavam ao

    latifúndio, a forte oposição dos grandes proprietários rurais à política de colonização

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    também reforçou o corte de recursos na Lei do Orçamento, aprovada em dezembro de

    1830. A luta dos grandes proprietários rurais era em torno da manutenção do sistema

    escravista. O trabalho escravo no Brasil praticamente deixou homens livres fora do

    sistema produtivo. No Brasil do século XIX, o trabalho manual era considerado coisa de

    escravo, visto como propriedade do fazendeiro. As pressões inglesas e a distribuição

    gratuita de terra aos colonos (77 ha em 1824) não era visto como compatível com os

    interesses da grande lavoura. O descaso com uma política oficial de imigração entre

    1830 e 1850 demonstrou de forma clara a força política dos grandes proprietários rurais.

     Neste quadro apresentado pode-se pensar o espaço rio-grandense como

    diferenciado. Cabe questionar se, comparativamente a São Paulo, os colonos alemães no

    Rio Grande do Sul apresentavam uma ameaça maior aos grandes proprietários rurais

    quanto à quebra da hegemonia latifundiária. Acredita-se que não, na medida em que

    estavam distantes das áreas de grande propriedade, e sua produção econômica era

    diversa do latifúndio. Além do mais, as terras designadas para colonização no Rio

    Grande do Sul não eram de interesse dos grandes proprietários rurais. Vale lembrar que

    o latifúndio no Rio Grande do Sul configurou-se economicamente por intermédio da

     pecuária destinada ao mercado interno. Por conta disso, a demanda de mão de obra, se

    comparada com a de São Paulo, não era tão grande. Consequentemente, o imigrante não

    seria visto com o mesmo peso para a resolução de problemas ligados à crise da mão de

    obra. Vale lembrar que as elites gaúchas apresentaram-se fortemente apegadas ao

    sistema escravista praticamente durante todo o Império.

    Logo, os conflitos de interesses encontravam-se diluídos em duas realidades que

     permaneceram como paralelas durante o período do Império.

    5 Colonização alemã no Rio Grande do Sul (1840-1870)

    A política de imigração nas mãos das províncias não prosperou. Ainda que, no

    ano de 1848, o Governo Geral, por meio da Lei Geral nº 514, tenha cedido a cada uma

    de suas províncias 36 léguas quadradas de terras devolutas para colonização. O Governo

    Imperial, ainda no período do Primeiro Reinado, já havia extinto o regime de sesmarias,

    dotando as áreas de colonização com dimensões menores. No ano de 1848, os lotes, que

    antes eram de 77 hectares, foram reduzidos para 48.

    O setor privado, ao fazer investimentos nos contratos de parceria na região deSão Paulo, não conseguiu encontrar o equilíbrio entre a utilização de mão de obra livre e

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    uma economia amparada no latifúndio escravista. Uma das primeiras experiências

     privadas com o sistema de parceria ocorreu por intermédio do Senador Nicolau

    Vergueiro, proprietário da Fazenda Ibicaba, que trouxe imigrantes para trabalhar no

    Brasil, na fazenda de sua propriedade. O imigrante tinha o valor do transporte

    adiantado, e o colono devolveria o valor em parcelas.

    A empreitada foi malsucedida, na medida em que os ganhos finais dos

    imigrantes mal davam para pagar as despesas com alimentação, ocasionando dívidas

    impagáveis. Além disso, os fazendeiros não faziam distinção clara entre os limites do

    trabalho livre, para o escravo, o que dificultava o relacionamento com os colonos. Os

    contratos também não eram respeitados.

    Tal cenário só iria modificar-se de forma mais incisiva a partir de 1850, com a

    Lei Eusébio de Queiroz, e com a ampliação da produção de café, fazendo com que o

    Brasil recebesse maior fluxo migratório. Fatores externos ligados à crise econômica e à

     política na Europa também vão contribuir para alterar esse quadro.

    Observem-se os dados da Tabela 1, abaixo:

    Tabela 1 –  Imigração alemã no Brasil

    Período Total

    1824-471848-721872-791880-891890-991900-091910-191920-291930-391940-49

    1950-591960-69

    8.17619.52314.32518.90117.08413.84825.90275.80127.4976.807

    16.6435.659

    Fonte: MAUCH, Claudia; VASCONCELOS, Naira (Org.). Os alemães no sul doBrasil: cultura, etnicidade e história. Canoas: Ed. Ulbra, 1994, p. 165.

    Essa tabela confirma os efeitos da expansão cafeeira e da Lei Eusébio de

    Queiroz sobre a entrada de imigrantes no Brasil. Tal cenário acabou atingindo a vinda

    de alemães. No período de 1848-1872, a imigração alemã atingiu índices muitos mais

    elevados do que no período de 1824-1847. As razões já evidenciadas passaram a ser a

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    garantia de um processo irreversível de transição da mão de obra de escrava para livre

    no Brasil.

    Mesmo com a necessidade de braços livres ampliada, o sistema de parceria não

    conseguiu pôr fim a uma mentalidade escravista fortemente presente. Denúncias de

    abusos por parte de grandes produtores rurais fizeram com que países europeus

    restringissem o envio de colonos para o Brasil. Este cenário levou o governo Imperial a

    reassumir o controle do processo de colonização, mesmo que de forma lenta e com

     políticas oficiais duvidosas diante da perspectiva futura dos colonos no País. Ainda em

    1870 podem ser encontradas inúmeras dificuldades diante do quadro colonizatório.

    A imigração foi retomada no Rio Grande do Sul a partir de 1845, atingindo a

    região do Vale do Taquari e do Rio Pardo. O governo provincial, a partir de quatro de

    dezembro de 1851, por meio da Lei nº 229, assumiu a incumbência de instituir agentes

     para atuar na Europa com a finalidade de promover a imigração alemã para o Rio

    Grande do Sul. Nesse período de colonização provincial, vale destacar a fundação de

    Santa Cruz (1849), Santo Ângelo (1857), Nova Petrópolis (1858) e Monte Alverne

    (1859).

    Santa Cruz foi a primeira colônia provincial. Foi fundada em terras devolutas

     por intermédio da Lei nº 514, de 28 de outubro de 1848. A primeira Lei Provincial

    remete à Lei nº 229, já citada. Essa lei autorizava a Província a medir, demarcar,

    designar valor em terras de colônias existentes ou por serem estabelecidas. No entanto,

    o início efetivo da colonização provincial se fez por intermédio da Lei nº 304, de 1854,

    que se constituiu como uma adaptação do Rio Grande do Sul à Lei de Terras (IOTTI,

    2001, p. 30-31).

    Cabe lembrar que todas as colônias alemãs que alcançaram destaque, com

    exceção da colônia de São Leopoldo, foram fundadas na segunda metade do século

    XIX.Ao contrário do que ocorreu na fase inicial do processo colonizatório (1824) − 

    quando a busca por mercenários orientava as ações do governo brasileiro na Europa −,

    no ano de 1850, a prioridade foi a busca por agricultores e artesãos.

    O Decreto nº 537 dizia que, para os colonos desembarcarem no Brasil, deveriam

    ter na bagagem instrumentos de ofício, sementes e outros utensílios destinados ao

    trabalho agrícola. É curiosa a preferência existente pelo colono alemão por parte das

    elites e do Estado brasileiro. Experiências anteriores eram utilizadas como exemplo dosucesso empreendedor trazido pela colonização germânica (SEYFERTH, 2002, p.122).

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    O interesse manifesto do governo provincial pelas terras da região para o

    estabelecimento de colônias no Vale do Taquari não foi suficiente para sua participação

    efetiva. Esse processo, a partir de 1850, foi desenvolvido por empresas particulares que

    tiveram empreendimentos maiores que os do Estado. Apesar da participação de

    empresas particulares, o Estado não abriu mão de buscar o controle sobre o processo de

    imigração. Nesses empreendimentos, se havia uma participação reduzida por parte do

    Império, menor seria ainda a da Província, que ficava em torno de 1% dos

    empreendimentos entre 1850 e 1889.

    Apesar dessa pouca participação da Província, existia uma previsão legal quanto

    às condições de chegada dos colonos: alojamento, sustento e deslocamento dos

    imigrantes do desembarque ao destino final. Centros como Rio Grande, Porto Alegre e

    Rio Pardo eram importantes locais de desembarque. A concentração geográfica do

     processo colonizatório no período em questão fez-se nos vales dos rios Jacuí, Taquari e

    em seu entorno (KARAM, 1992, p. 43).

    Esta etapa caracterizou-se por um processo em expansão (1845-1870) decorrente

    da produção de excedentes agrícolas. Os colonos praticavam a policultura e criavam

    animais. A essas atividades estava associada a produção artesanal de derivados.

    Dependiam de relações comerciais com os estabelecimentos existentes na região

    (Ilustração 4).

    Ilustração 4 –  Casa de comércio na região de São Leopoldo

    Fonte: Disponível em: . Acesso em:

    29 jul. 2011.

    As trocas comerciais decorrentes desse processo deram origem ao comerciante

    alemão que acumularia capitais advindos da produção colonial. O isolamento das

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    colônias criou condições adequadas para que um grupo de comerciantes pudesse

    deslocar os excedentes para a capital da Província, tirando proveito da situação por

     possuírem meios adequados de transporte (KUHN, 2002, p. 91).

    Os lucros obtidos pelos comerciantes eram grandes. Também obtinham lucros

    no transporte de mercadorias e em empréstimos. Com os ganhos, obtinham o capital de

    giro necessário para novos investimentos, que se ampliaram para a indústria, as

    empresas de navegação, os bancos, etc. (PESAVENTO, 1985, p. 49).

    A ideia de comerciantes alemães explorando colonos coloca em xeque a tão

    apregoada “solidariedade” étnica na região. O fato de São Leopoldo estar às margens do

    Rio dos Sinos criou condições favoráveis para o fluxo comercial com Porto Alegre.

    Esse fluxo comercial, ao intensificar-se, trouxe consigo o crescimento

     populacional de São Leopoldo. Entre 1852 e 1854, quando houve o implemento de

    embarcações a vapor, deu-se o favorecimento da posição de entreposto e intermediário

    da região. Essa situação se estendeu até o ano de 1874, quando se estabeleceu a via

    férrea, ligando Porto Alegre a São Leopoldo e criando novos e diferentes vínculos de

    comércio (ROCHE, 1969, p. 429-430).

    Com a expansão do capital comercial, os comerciantes alemães dominaram não

    só o comércio de suas colônias. No período pós-1875, com a chegada dos italianos, eles

    iriam dominar comercialmente também essas colônias.

    A progressiva hegemonia do capital comercial em São Leopoldo criou um fluxo

    econômico que, se por um lado acentuou as desigualdades sociais na região, por outro

    criou condições para que ocorresse um crescimento populacional que impulsionasse a

    ocupação de novas áreas. Mesmo sendo percebido nessa segunda fase um

    empreendedorismo que ampliava os espaços econômicos dos imigrantes para a esfera

    comercial, e a partir de 1870, para a industrial, os problemas não cessaram. Havia

     precários recursos para a promoção de serviços públicos. Assistência médica, educaçãoe segurança pública passavam longe das áreas coloniais. As demarcações de terras eram

    imprecisas; os transportes, precários; e as vias de comunicação, mesmo com alguns

    avanços, ainda deixavam muito a desejar.

    6 Conclusão 

    O Rio Grande do Sul passou, durante o século XIX, pelo processo de imigraçãoe colonização, com a consequente formação de pequenas e médias propriedades

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    voltadas para o mercado interno. Viu-se que tal experiência propiciou a formação de

    uma produção destinada ao mercado interno, oportunizando uma diversidade produtiva

    não encontrada no latifúndio pecuarista. As diferentes etapas da colonização alemã

    manifestaram distintos interesses que envolveram o processo colonizatório ao longo do

    século XIX. Enquanto no Primeiro Reinado constataram-se interesses na

    arregimentação de mercenários na Europa, no Segundo Reinado, por conta da proibição

    do tráfico negreiro, a vinda do imigrante progressivamente passou a cumprir a função na

    substituição de braços na lavoura. Viu-se também que, no contexto econômico rio-

    grandense dominado pelo latifúndio pecuarista, tal impacto não se fez sentir de forma

    tão rápida, e que o conflito entre latifúndio e imigração foi menos intenso por ocuparem

    espaços e interesses distintos.

    A questão da branquidade foi outro elemento importante destacado. Ao se

    colocar em evidência esse ponto, observa-se que ele perpassou a questão colonizatória

    ao longo de todo o século XIX, evidenciando o caráter racista das elites brasileiras.

    Quando foi abordado o isolamento a que foram submetidas as colônias alemãs, foi

    chamada atenção para a formação de um “quisto étnico” que forjou uma identidade

    teuto-brasileira, apesar das diferenças internas existentes nos grupos de imigrantes que

    vieram para o Brasil.

    A ocupação de terras devolutas por colonos e artesãos, a formação de quadros

    militares, a dinamização de mercado interno e outras dinâmicas envolvidas no processo

    colonizatório alemão no Rio Grande do Sul trouxeram para o Estado novas dinâmicas

    econômicas relacionadas à agricultura, ao comércio e à indústria que romperam com

    uma cultura latifundiária no Estado, mas que não foram suficientes para dirimir as

    mazelas decorrentes do processo de transição da mão de obra escrava para a livre tanto

    em nível nacional como regional.

    Referências

    BARROS, Eliane Cruxên; LANDO, Aldair Marli. A colonização alemã no RioGrande do Sul: uma interpretação sociológica. Porto Alegre: Movimento, 1981.

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     KARAM, Elaine Maria Consoli. Raízes da colonização: em destaque a colônia deGuaporé e município de Dois Lajeados. Porto Alegre: CORAG, 1992.

    KUHN, Fábio. Breve história do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Leitura XXI,

    2002.

    LEMOS, Juvêncio Saldanha. Os mercenários do imperador: a primeira correnteimigratória para o Brasil. Porto Alegre: Palmarinca, 1993.

    MAESTRI, Mario. Breve história do Rio Grande do Sul. Passo Fundo: Ed. UPF,2010.

    MOURE, Telmo. A inserção da economia imigrante na economia gaúcha. In: LANDO,Aldair Marli et al. (Org.). RS: imigração & colonização. Porto Alegre: Mercado Aberto,1992.

    PESAVENTO, Sandra Jatahy. História do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: MercadoAberto, 1985.

    PETRONE, Maria Thereza Schorer. O imigrante e a pequena propriedade (1824-1930). São Paulo: Brasiliense, 1982.

    ROCHE, Jean. A colonização alemã no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Globo,1969.

    SEYFERTH, Giralda. Colonização, imigração e a questão racial no Brasil. In: RevistaUSP, São Paulo USP, n. 53, mar./maio 2002, p. 117-149.