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9 JORNAL DA UNICAMP Campinas, 1º a 7 de setembro de 2008 CARMO GALLO NETTO [email protected] ão é comum que cer- tos problemas práti- cos de patrulhamento urbano sejam trata- dos pela universida- de brasileira. Em dis- sertação de mestrado, orientada pelo professor Antonio Carlos Moretti e co-orientada pela professora Marga- rida P. Mello, apresentada ao Depar- tamento de Matemática Aplicada do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Cientifica (Imecc) da Unicamp, Washington Alves de Oli- veira desenvolveu um sistema que permite a implantação de rotas para o patrulhamento urbano preventivo. O objetivo do trabalho é possibilitar a melhoria da logística de operações de corporações militares ou de em- presas de segurança. A metodologia foi desenvolvida com base em estu- do de caso na cidade de Vinhedo, da região metropolitana da Campinas. O pesquisador, que milita na área de segurança, estudou um aspecto do problema de planejamento do patru- lhamento urbano preventivo que é o da construção de rotas a serem per- corridas pelos veículos da força po- licial. Entre outras finalidades, a ela- boração de rotas visa garantir boa vi- sibilidade para o patrulhamento de maneira a proporcionar sensação de segurança para a população, permi- tir melhor localização para atendi- mento de ocorrências, vigiar e visi- tar determinados locais, estabeleci- mentos públicos, hospitais, escolas, evitar atos ilegais etc. O planejamen- to das rotas deve levar em considera- ção os recursos disponíveis, tais como número de veículos, garantia de agili- dade e distribuição equânime do tra- balho entre as viaturas utilizadas. O produto final do trabalho desen- volvido por Oliveira é um módulo computacional capaz de automatica- mente gerar rotas que atendam às ne- cessidades determinadas pelos res- ponsáveis pela segurança pública. Ele afirma que foi possível criar um mo- delo computacional que viabiliza um patrulhamento preventivo ágil e efi- ciente dentro de condições previa- mente impostas pelo administrador de segurança: “Obtivemos resultados satisfatórios na aplicação feita na ci- dade de Vinhedo, em que algumas ro- tas foram sugeridas para o serviço de segurança de patrimônios públicos sob a responsabilidade da Guarda Civil Municipal. O trabalho foi pos- sível graças ao apoio do comandante e secretário de segurança local”. Segundo Oliveira, o estudo con- duziu à análise de outros problemas, relacionados à área de segurança pú- blica e privada, que poderia ser be- neficiada com a realização de mais pesquisas semelhantes às desenvol- vidas no trabalho. Considera que os profissionais que atuam no setor de segurança têm tarefas e funções va- riadas a cumprir e que nas guardas municipais e nas policias estaduais é considerável o número de pessoas que necessitam de treinamento na utilização de equipamentos como veículos, armas e dispositivos para comunicações apoiados em progra- mas computacionais. Entre os problemas enfrentados pelos administradores da área, ele ali- nhava escala de serviço, distribuição e alocação de homens e veículos, alocação de sedes, postos, delegaci- as e batalhões, distribuição de turnos de serviços, cobertura de regiões ou locais pré-fixados e logísticas de ma- teriais. Considera que esses proble- mas estão interligados e também de- vem ser tratados levando em conta prioridades hierárquicas, índices de Pesquisador desenvolve no Imecc metodologia que prevê implantação de rotas para o patrulhamento urbano Prevenção e ocorrências, prioridades de atendi- mento etc. Entende que os diversos serviços das equipes de prevenção, salvamentos, treinamento, manuten- ção entre outros, que são realizados ao mesmo tempo e em diversos locais em uma cidade ou estado, exigem efi- ciente administração para que possam ser executados de forma satisfatória. O trabalho desenvolvido por Oli- veira se atém à distribuição de veí- culos em rotas de cobertura em lo- cais pré-fixados e mostra que pesqui- sas podem ser realizadas com gran- de sucesso nesta área. Se aplicadas, pondera o pesquisador, podem faci- litar muito a tarefa dos administra- dores e conseqüentemente melhorar a qualidade dos serviços prestados por profissionais de segurança, au- mentado-lhes o nível de satisfação e o dos cidadãos por eles servidos. No estudo, o pesquisador adaptou o modelo para o Problema de Rotas de Cobertura multi-veículo (m-PRC), que consiste em um programa linear inteiro cujo tamanho e complexida- de torna inviável a aplicação de mé- todos exatos para sua solução. Solu- ções sub-ótimas foram obtidas apli- cando-se as heurísticas propostas por M. Hachicha e outras criadas pelo próprio pesquisador. As heurísticas foram implementadas em Matlab e sua validação, assim como a do mo- delo, foi feita através da resolução de problemas gerados aleatoriamente. Além disso, foi resolvido o modelo construído a partir de dados reais obtidos junto à cidade de Vinhedo. Oliveira esclarece que, embora as heurísticas utilizadas não garantam a obtenção de soluções ótimas, em to- dos os testes conseguiram alcançar re- sultados que podem ser consideradas bons em tempo computacional acei- tável. Em alguns casos foi possível mostrar que as soluções estão entre 2% a 5% do valor ótimo. No modelo, um grafo, isto é, um conjunto de vér- tices e arestas ligando pares de vérti- ces, representa a região geográfica a ser patrulhada. No caso da cidade de Vinhedo, o grafo foi construído a par- tir do mapa digital da cidade. Uma rota é constituída por uma se- qüência alternada de nós e arestas e começa e termina na base do serviço. Os pontos de visita obrigatória são as- sociados a vértices que devem perten- cer a rotas, e os pontos de cobertura obrigatória são associados a vértices que devem estar suficientemente pró- ximos das rotas. O objetivo final é construir rotas eficientes. “Procura- mos gerar rotas de tamanho menor possível, para que cada circuito seja percorrido o maior número de vezes durante um turno de serviço. Os re- sultados se mostraram promissores e a análise das soluções obtidas permi- tirá aprimorar o modelo”, explica ele. N Oliveira diz que no mestrado utilizou no programa uma lin- guagem ainda lenta, mas no doutorado, que já iniciou, pretende implementá-lo em uma linguagem mais rápida, o que permitirá franquear seu uso aos administradores de segurança. E explica: “Um programa mais ágil possibilitará que o administrador tenha possibilidade de determinar rotas de acordo com as circunstânci- as de cada dia, pois se sabe que as necessidades de patrulhamento durante a semana são diferentes das dos fins de semana e feriados, além do que, eventos ou ocorrências podem determinar rotas diferentes, a critério das exigências impostas pelo momento, o que exige remanejamento de viaturas. Hoje, o programa não permite ainda interação com o administrador e a definição rápida de novas rotas, além das previamente estabelecidas. “A idéia, e isso faremos no doutorado, é chegar a um programa que possa ser utilizado por qualquer administrador de acordo com os parâmetros por ele estabelecidos”. Washington Alves de Oliveira, graduado em licenciatura ma- temática pela Unicamp, foi atraído para o estudo porque milita na área de segurança e conhece como as viaturas são utilizadas na segurança, sabendo das dificuldades em direcioná-las. Por isso se interessou em determinar um meio de criar rotas mais racio- nais de forma a melhorar os serviços oferecidos. Ele considera que a forma de determinar rotas está pronta e independe do tamanho das regiões, embora o aumento da quan- tidade de dados torne o processo mais lento, o que pode ser resolvido com a utilização de uma linguagem mais eficiente. Julga muito interessante ter levado para o Imecc a questão da segurança porque, em geral, os órgãos de segurança, princi- Estudo abre novas frentes palmente da área mili- tar, têm regras mais rí- gidas para disponibilizar seus dados para a co- munidade, diferente- mente do que acontece em alguns outros paí- ses como os EUA e Ca- nadá, onde esses pro- blemas são estudados pela comunidade acadêmica. Ele acredi- ta que o pioneirismo da iniciativa deve motivar, no futuro, outros pesquisadores, possibilitando a criação de referências nacionais, o que determinará que futuros trabalhos sejam desenvolvidos de forma menos solitária. “Leva-se sozinho o peso de propor um problema não muito discutido no meio acadêmico. Isso nos deixa sem referência, pois não existem outros trabalhos tão próximos que possam oferecer parâmetros. É um pouco solitário”, admite o pesquisador, que menciona também as dificuldades na obtenção de dados. “As pessoas e os organismos da área de segurança não estão acos- tumados a esse tipo de trabalho e encontram-se tolhidos por or- dens legais quanto ao fornecimento de informações que esse tipo de pesquisa exige, apesar de disporem de diversos registros que possibilitam vastas pesquisas. Acredito que daqui a algum tempo as coisas se tornarão muito mais fáceis”. Carro da Polícia Militar durante patrulhamento em Campinas: objetivo da pesquisa é possibilitar a melhoria da logística de operações Washington Alves de Oliveira, autor do trabalho: módulo computacional gera rotas Prevenção e Carro da Polícia Militar durante patrulhamento em Campinas: objetivo da pesquisa é possibilitar a melhoria da logística de operações inteligência inteligência Fotos: Antoninho Perri

Campinas, 1º a 7 de setembro de 2008 inteligência Prevenção e · 2008. 8. 29. · Unicamp, Washington Alves de Oli-veira desenvolveu um sistema que permite a implantação de

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9JORNAL DA UNICAMPCampinas, 1º a 7 de setembro de 2008

CARMO GALLO NETTO

[email protected]

ão é comum que cer-tos problemas práti-cos de patrulhamentourbano sejam trata-dos pela universida-de brasileira. Em dis-

sertação de mestrado, orientada peloprofessor Antonio Carlos Moretti eco-orientada pela professora Marga-rida P. Mello, apresentada ao Depar-tamento de Matemática Aplicada doInstituto de Matemática, Estatísticae Computação Cientifica (Imecc) daUnicamp, Washington Alves de Oli-veira desenvolveu um sistema quepermite a implantação de rotas parao patrulhamento urbano preventivo.O objetivo do trabalho é possibilitara melhoria da logística de operaçõesde corporações militares ou de em-presas de segurança. A metodologiafoi desenvolvida com base em estu-do de caso na cidade de Vinhedo, daregião metropolitana da Campinas.

O pesquisador, que milita na áreade segurança, estudou um aspecto doproblema de planejamento do patru-lhamento urbano preventivo que é oda construção de rotas a serem per-corridas pelos veículos da força po-licial. Entre outras finalidades, a ela-boração de rotas visa garantir boa vi-sibilidade para o patrulhamento demaneira a proporcionar sensação desegurança para a população, permi-tir melhor localização para atendi-mento de ocorrências, vigiar e visi-tar determinados locais, estabeleci-mentos públicos, hospitais, escolas,evitar atos ilegais etc. O planejamen-to das rotas deve levar em considera-ção os recursos disponíveis, tais comonúmero de veículos, garantia de agili-dade e distribuição equânime do tra-balho entre as viaturas utilizadas.

O produto final do trabalho desen-volvido por Oliveira é um módulocomputacional capaz de automatica-mente gerar rotas que atendam às ne-cessidades determinadas pelos res-ponsáveis pela segurança pública. Eleafirma que foi possível criar um mo-delo computacional que viabiliza umpatrulhamento preventivo ágil e efi-

ciente dentro de condições previa-mente impostas pelo administradorde segurança: “Obtivemos resultadossatisfatórios na aplicação feita na ci-dade de Vinhedo, em que algumas ro-tas foram sugeridas para o serviço desegurança de patrimônios públicossob a responsabilidade da GuardaCivil Municipal. O trabalho foi pos-sível graças ao apoio do comandantee secretário de segurança local”.

Segundo Oliveira, o estudo con-duziu à análise de outros problemas,relacionados à área de segurança pú-blica e privada, que poderia ser be-neficiada com a realização de maispesquisas semelhantes às desenvol-vidas no trabalho. Considera que osprofissionais que atuam no setor desegurança têm tarefas e funções va-riadas a cumprir e que nas guardasmunicipais e nas policias estaduais éconsiderável o número de pessoasque necessitam de treinamento nautilização de equipamentos comoveículos, armas e dispositivos paracomunicações apoiados em progra-mas computacionais.

Entre os problemas enfrentadospelos administradores da área, ele ali-nhava escala de serviço, distribuiçãoe alocação de homens e veículos,alocação de sedes, postos, delegaci-as e batalhões, distribuição de turnosde serviços, cobertura de regiões oulocais pré-fixados e logísticas de ma-teriais. Considera que esses proble-mas estão interligados e também de-vem ser tratados levando em contaprioridades hierárquicas, índices de

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ocorrências, prioridades de atendi-mento etc. Entende que os diversosserviços das equipes de prevenção,salvamentos, treinamento, manuten-ção entre outros, que são realizadosao mesmo tempo e em diversos locaisem uma cidade ou estado, exigem efi-ciente administração para que possamser executados de forma satisfatória.

O trabalho desenvolvido por Oli-veira se atém à distribuição de veí-culos em rotas de cobertura em lo-cais pré-fixados e mostra que pesqui-sas podem ser realizadas com gran-de sucesso nesta área. Se aplicadas,pondera o pesquisador, podem faci-litar muito a tarefa dos administra-dores e conseqüentemente melhorara qualidade dos serviços prestadospor profissionais de segurança, au-mentado-lhes o nível de satisfação eo dos cidadãos por eles servidos.

No estudo, o pesquisador adaptouo modelo para o Problema de Rotas

de Cobertura multi-veículo (m-PRC),que consiste em um programa linearinteiro cujo tamanho e complexida-de torna inviável a aplicação de mé-todos exatos para sua solução. Solu-ções sub-ótimas foram obtidas apli-cando-se as heurísticas propostas porM. Hachicha e outras criadas pelopróprio pesquisador. As heurísticasforam implementadas em Matlab esua validação, assim como a do mo-delo, foi feita através da resolução deproblemas gerados aleatoriamente.Além disso, foi resolvido o modeloconstruído a partir de dados reaisobtidos junto à cidade de Vinhedo.

Oliveira esclarece que, embora asheurísticas utilizadas não garantam aobtenção de soluções ótimas, em to-dos os testes conseguiram alcançar re-sultados que podem ser consideradasbons em tempo computacional acei-tável. Em alguns casos foi possívelmostrar que as soluções estão entre

2% a 5% do valor ótimo. No modelo,um grafo, isto é, um conjunto de vér-tices e arestas ligando pares de vérti-ces, representa a região geográfica aser patrulhada. No caso da cidade deVinhedo, o grafo foi construído a par-tir do mapa digital da cidade.

Uma rota é constituída por uma se-qüência alternada de nós e arestas ecomeça e termina na base do serviço.Os pontos de visita obrigatória são as-sociados a vértices que devem perten-cer a rotas, e os pontos de coberturaobrigatória são associados a vérticesque devem estar suficientemente pró-ximos das rotas. O objetivo final éconstruir rotas eficientes. “Procura-mos gerar rotas de tamanho menorpossível, para que cada circuito sejapercorrido o maior número de vezesdurante um turno de serviço. Os re-sultados se mostraram promissores ea análise das soluções obtidas permi-tirá aprimorar o modelo”, explica ele.

N Oliveira diz que no mestrado utilizou no programa uma lin-guagem ainda lenta, mas no doutorado, que já iniciou, pretendeimplementá-lo em uma linguagem mais rápida, o que permitiráfranquear seu uso aos administradores de segurança. E explica:“Um programa mais ágil possibilitará que o administrador tenhapossibilidade de determinar rotas de acordo com as circunstânci-as de cada dia, pois se sabe que as necessidades depatrulhamento durante a semana são diferentes das dos fins desemana e feriados, além do que, eventos ou ocorrências podemdeterminar rotas diferentes, a critério das exigências impostaspelo momento, o que exige remanejamento de viaturas. Hoje, oprograma não permite ainda interação com o administrador e adefinição rápida de novas rotas, além das previamenteestabelecidas. “A idéia, e isso faremos no doutorado, é chegar aum programa que possa ser utilizado por qualquer administradorde acordo com os parâmetros por ele estabelecidos”.

Washington Alves de Oliveira, graduado em licenciatura ma-temática pela Unicamp, foi atraído para o estudo porque milita naárea de segurança e conhece como as viaturas são utilizadas nasegurança, sabendo das dificuldades em direcioná-las. Por issose interessou em determinar um meio de criar rotas mais racio-nais de forma a melhorar os serviços oferecidos.

Ele considera que a forma de determinar rotas está pronta eindepende do tamanho das regiões, embora o aumento da quan-tidade de dados torne o processo mais lento, o que pode serresolvido com a utilização de uma linguagem mais eficiente.

Julga muito interessante ter levado para o Imecc a questãoda segurança porque, em geral, os órgãos de segurança, princi-

Estudo abre novas frentes

palmente da área mili-tar, têm regras mais rí-gidas para disponibilizarseus dados para a co-munidade, diferente-mente do que aconteceem alguns outros paí-ses como os EUA e Ca-nadá, onde esses pro-blemas são estudados pela comunidade acadêmica. Ele acredi-ta que o pioneirismo da iniciativa deve motivar, no futuro, outrospesquisadores, possibilitando a criação de referências nacionais,o que determinará que futuros trabalhos sejam desenvolvidos deforma menos solitária.

“Leva-se sozinho o peso de propor um problema não muitodiscutido no meio acadêmico. Isso nos deixa sem referência, poisnão existem outros trabalhos tão próximos que possam oferecerparâmetros. É um pouco solitário”, admite o pesquisador, quemenciona também as dificuldades na obtenção de dados. “Aspessoas e os organismos da área de segurança não estão acos-tumados a esse tipo de trabalho e encontram-se tolhidos por or-dens legais quanto ao fornecimento de informações que essetipo de pesquisa exige, apesar de disporem de diversos registrosque possibilitam vastas pesquisas. Acredito que daqui a algumtempo as coisas se tornarão muito mais fáceis”.

Carro da PolíciaMilitar durante

patrulhamento emCampinas: objetivo

da pesquisa épossibilitar a melhoria

da logística deoperações

Washington Alves de Oliveira,autor do trabalho: módulocomputacional gera rotas

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inteligênciainteligênciaFotos: Antoninho Perri