Cannabis Medicinal_Não lemos, Não-gostamos?

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  • 8/8/2019 Cannabis Medicinal_No lemos, No-gostamos?

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    Cannabis Medicinal

    G:Patricia

    Cannabis Medicinal: No lemos e no-gostamos?

    Em Maio deste ano foi realizado o Simpsio Internacional: Por uma

    Agncia Brasileira da Cannabis Medicinal? sob minha presidncia,contando com a participao de cientistas do Brasil, Canad, Estados

    Unidos, Inglaterra e Holanda, representantes brasileiros de vrios rgos

    pblicos, sociedades cientficas e numerosa audincia. Aps dois dias de

    intensas discusses foi aprovado por unanimidade um documento

    recomendando ao Governo Federal a oficializao da criao da Agncia

    Brasileira da Cannabis Medicinal.

    Esperava uma discusso posterior, cientfica e acalorada, pois sabia de

    algumas opinies contrrias proposta. Entre estas o parecer do

    Departamento de Dependncia Qumica da Associao Brasileira de

    Psiquiatria (ABP) cujos representantes compareceram apenas para

    apresentar seu parecer, ausentando-se totalmente, antes e depois, de

    todo o restante do simpsio.

    Esta havendo sim a esperada discusso, veiculada principalmente atravs

    da Folha de So Paulo, mas num nvel de entristecer. De fato, expresses

    como o dom de iludir; Lobby da maconha; Maconhabras; uma

    idia fixa: a legalizao das drogas; elementos com pretensa

    respeitabilidade; paixo dos lobistas; exemplo de indigncia

    intelectual; querem maiores facilitaes para o consumo; travestidos

    de neurocientistas; no se coadunam com a seriedade que deveprevalecer em qualquer discusso cientfica. Os autores de tais infelizes

    afirmaes certamente no leram a celebre frase de Claude Bernard, o

    pai da medicina experimental: em cincia criticar no sinnimo de

    denegrir.

    Por outro lado, os contrrios ao uso medicinal da maconha utilizaram de

    argumentos inverdicos (para dizer o mnimo) quando tentam criar uma

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    G:Patricia

    atmosfera de pnico, desviando o foco da ateno (maconha como

    medicamento). Assim:

    Legalizao da Maconha O item 6 da carta do Simpsio diz

    cristalinamente: o uso clnico dos derivados da Cannabis sativa

    L ou de seus derivados naturais ou sintticos no pode ser

    confundido com o uso recreativo (no-mdico) da planta. Os

    autores das infelizes frases no leram, portanto, esta resoluo.

    O uso mdico esta longe de receber aprovaes de rgos

    como a Agncia FDA dos EUA, dizem os autores das

    afirmativas.

    Ora, um princpio ativo da maconha, o 9-THC, esta aprovado como

    medicamento por esta Agncia desde a dcada de 1990, sendo o produto

    Marinol produzido e utilizado nos Estados Unidos, e exportado para

    vrios pases h quase 20 anos.

    Portanto, os autores de tal afirmativa tambm no leram nada a

    respeito. Mas no s isso, pois a maconha e seus derivados tambm j

    tm aprovao para uso mdico em pases como Canad, Reino Unido,Holanda e Espanha. A Ministra da Sade da Espanha chegou a declarar:

    ao aprovar o seu uso para a Esclerose Mltipla: O uso teraputico da

    cannabis estudado h anos, por isso existem testes clnicos e evidncias

    cientficas de sua utilidade em determinadas doenas

    Dizem ainda os autores das frases:O uso teraputico da maconha

    no tem comprovao cientfica. Se recomendado negaria a busca

    da cincia... por produtos cada vez mais seguros.

    A Dra. Nora Volkow diretora do Instituto Nacional do Abuso de Drogas

    (NIDA) dos Estados Unidos declarou em Maro deste ano a uma revista

    brasileira No existe droga segura, o que uma verdade, tambm para

    a maconha. Vem da a necessidade de um mdico estudar a relao

    risco/benefcio de qualquer droga que prescreve. Por exemplo, segundo

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    dados do FDA de 1997 a 2005 houve 196 relatos de suspeita de morte

    coincidente com o uso de antiemticos (uma indicao tambm aprovada

    para a maconha). No houve nenhuma suspeita de morte pelo uso da

    maconha. Por outro lado a Dra. Valria declarou tambm que os

    canabinides tm algumas aes teraputicas teis como efeitoantiemtico, aumento do apetite em casos de cncer e AIDS, benefcios

    analgsicos e em glaucoma.

    A alegao de que no precisamos que o Governo Federal crie, por

    meio de Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD), uma agncia para

    .....a maconhabras

    Primeiramente preciso esclarecer que a SENAD uma sigla para

    Secretaria Nacional de Polticas sobre Drogas, conforme j aprovado h

    mais de trs anos; portanto, os autores dos artigos na Folha de So Paulo

    no leram a respeito. preciso ainda esclarecer que a SENAD no

    patrocinou e no auxiliou com qualquer quantia a realizao do Simpsio.

    Por outro lado, por se ausentarem de quase todo o simpsio, no sabem

    que o solicitado na carta foi a oficializao ONU do nome de AgnciaNacional da Cannabis Medicinal; conforme enfatizado pelo INCB, rgo

    da ONU, em 2009. De fato, as leis necessrias para esta criao j foram

    aprovadas pela Lei 11.343 de 23/08/2006 e seu Decreto regulamentador

    n 5.912 de 27/09/2006.

    A maconha causa dependncia segundo os autores das frases.

    Ningum nega esta propriedade indesejvel da maconha, como

    tambm ocorre com muitos outros medicamentos. Mais uma vez

    cabe a anlise da relao risco/benefcio ao se utilizar os derivados

    da maconha ou de qualquer outra droga. Teriam os autores da frase

    opinio semelhante a muitos outros medicamentos que so fortes

    indutores de dependncia como morfina e vrios outros opiceos

    responsveis por milhares e milhares de casos desta reao

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    adversa? Pretenderiam eles solicitar proibio de uso clnico destas

    drogas?

    At hoje hpouco estudos controlados, com amostras pequenas e

    o uso de teraputicos da maconha no tem comprovao

    cientfica...

    Muita literatura mdica precisaria ser lida para permitir afirmativa to

    categrica. Existem j dezenas de livros e centenas de artigos cientficos

    publicados sobre as propriedades medicinais da maconha. Por exemplo,

    em duas extensas revises recentes (Journal of Ethnopharmacology 105,

    1-25, 2006; Cannabinoids 5 (special issue), 1-21, 2010) mais de uma

    centena de trabalhos cientficos so analisados, a maioria delesdemonstrando os efeitos que so negados pelos autores das frases. Estas

    revises concluem que: cannabinides apresentam um interessante

    potencial teraputico, principalmente como analgsicos em dor

    neuroptica, estimulante do apetite em molstias debilitantes (cncer e

    AIDS) bem como no tratamento da esclerose mltipla.

    H ainda a salientar que vrias sociedades cientficas americanas j seposicionaram favoravelmente ao uso mdico da maconha tais como:

    Associao Psiquitrica Americana, Sociedade de Leucemia e Linfoma dos

    EUA, American College of Physicians e Associao Mdica Americana.

    Isto sem contar que os Ministrios da Sade do Canad, Estados Unidos,

    Espanha, Dinamarca e Reino Unido j aprovaram o uso medicinal.

    Segundo os autores das frases os proponentes da CannabisMedicinal usam a estratgia de confundir o debate e ...a

    confuso fica por conta de a ativistas comprometidos com a

    causa da legalizao

    Ora, esta argumentao poderia bem ser utilizada no sentido oposto,

    como pareceria ser o caso. Sendo totalmente contrrio a qualquer uso da

    maconha investem contra o seu uso medicinal, parecendo tentar

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    G:Patricia

    convencer o pblico de que aprovao do uso mdico e legalizao

    seriam a mesma coisa, o que esta longe de ser verdadeiro. bem possvel

    que um forte sentimento ideolgico possa estar por trs da confuso

    armada, o que seria lamentvel. Para continuar uma discusso cientfica

    minimamente aceitvel dever-se-ia por iniciar a leitura de dois artigospublicados neste ano de 2010, em duas das mais serias e respeitveis

    revistas cientficas do mundo: Maconha mdica e a Lei (New England

    Journal of Medicine 362, 1453-1457, 2010) e Como a Ideologia modela a

    evidencia e a poltica: o que conhecemos sobre o uso da maconha e o que

    deveramos fazer?(Addiction 105, 1326-1330, 2010).

    Realmente, sem ler no possvel continuar este debate! Sugiro quetodos faam o dever de casa, atualizando o seu conhecimento com as

    leituras de mais artigos cientficos recentes.

    E. A. Carlini

    Professor-Titular de Psicofarmacologia

    UNIFESPDiretor do CEBRID Centro Brasileiro de

    Informaes sobre Drogas Psicotrpicas

    Membro Titular do CONED (Conselho Nacional

    de Polticas sobre Drogas)

    Membro do Comit de Peritos sobre lcool e

    Drogas OMS (7 mandato)

    Ex-membro do Conselho Internacional de

    Controle de Narcticos (INCB ONU) (2002-

    2007)