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Capítulo 2: Superfícies Líquidas 13 Superfícies Líquidas Espera-se que após a leitura do primeiro capítulo o leitor tenha aprendido a: 1- Reconhecer interfaces e situações de desigualdade de forças presentes nesta região. 2- Perceber a influência das interfaces em diferentes aplicações científicas e tecnológicas. Nesse capítulo, é nosso objetivo é definir e discutir algumas das leis que regulam diferentes fenômenos e que possibilitam sua quantificação. Espera se que a compreensão de fenômenos envolvidos em diferentes aplicações esteja acrescida de formulações que permitam sua quantificação ou estimativa. Neste sentido, a definição e a aplicação de algumas propriedades e fenômenos como tensão superficial, capilaridade e molhamento serão discutidas. Além disso, serão apresentados alguns aspectos da termodinâmica de superfície e do comportamento da tensão superficial com a temperatura. Será discutida a origem de uma diferença de pressão decorrente da curvatura da superfície, deduzindo-se a equação de Laplace, a primeira relação fundamental da físico-química de superfície. 2.1 Introdução Como mencionado no capítulo anterior, algumas propriedades da região interfacial são distintas das propriedades do interior da fase. O principal motivo é a diferença na interação entre as moléculas na interface, ocasionando um desequilíbrio de forças e tornando esta região desfavorável do ponto vista termodinâmico. A principal conseqüência é a resistência ao aumento da área de contato entre duas fases, ou seja, da área interfacial. Desta forma, para expor mais moléculas à condição de desequilíbrio interfacial, há a necessidade de se introduzir certa quantidade de energia no sistema. Diversas conseqüências deste efeito são vivenciadas diariamente, tais como a representada na Figura 2.1. Na Figura 2.1(a), pode-se observar uma aranha pousado sobre a água, sem afundar, e na Figura 2.1(b) observa-se a resistência oferecida pela água quando se tentar aumentar sua área superficial. A análise da situação apresentada na Figura 2.1 mostra que o peso do mosquito levou a uma deformação da superfície da água, em torno das patas do inseto, aumentando o contanto água-ar e, consequentemente, o número de moléculas de água na superfície. Esta condição de equilíbrio mostra que a força relacionada ao peso do mosquito está sendo compensada pela resistência das moléculas de água em migrarem para a superfície. Esta resistência é denominada de tensão superficial da água, representando a oposição ao aumento da superfície.

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  • Captulo 2: Superfcies Lquidas

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    Superfcies Lquidas

    Espera-se que aps a leitura do primeiro captulo o leitor tenha aprendido a:

    1- Reconhecer interfaces e situaes de desigualdade de foras presentes nesta regio.

    2- Perceber a influncia das interfaces em diferentes aplicaes cientficas e tecnolgicas.

    Nesse captulo, nosso objetivo definir e discutir algumas das leis que regulam diferentes fenmenos e que possibilitam sua quantificao. Espera se que a compreenso de fenmenos envolvidos em diferentes aplicaes esteja acrescida de formulaes que permitam sua quantificao ou estimativa. Neste sentido, a definio e a aplicao de algumas propriedades e fenmenos como tenso superficial, capilaridade e molhamento sero discutidas. Alm disso, sero apresentados alguns aspectos da termodinmica de superfcie e do comportamento da tenso superficial com a temperatura. Ser discutida a origem de uma diferena de presso decorrente da curvatura da superfcie, deduzindo-se a equao de Laplace, a primeira relao fundamental da fsico-qumica de superfcie.

    2.1 Introduo

    Como mencionado no captulo anterior, algumas propriedades da regio interfacial so distintas das propriedades do interior da fase. O principal motivo a diferena na interao entre as molculas na interface, ocasionando um desequilbrio de foras e tornando esta regio desfavorvel do ponto vista termodinmico. A principal conseqncia a resistncia ao aumento da rea de contato entre duas fases, ou seja, da rea interfacial. Desta forma, para expor mais molculas condio de desequilbrio interfacial, h a necessidade de se introduzir certa quantidade de energia no sistema. Diversas conseqncias deste efeito so vivenciadas diariamente, tais como a representada na Figura 2.1. Na Figura 2.1(a), pode-se observar uma aranha pousado sobre a gua, sem afundar, e na Figura 2.1(b) observa-se a resistncia oferecida pela gua quando se tentar aumentar sua rea superficial.

    A anlise da situao apresentada na Figura 2.1 mostra que o peso do mosquito levou a uma deformao da superfcie da gua, em torno das patas do inseto, aumentando o contanto gua-ar e, consequentemente, o nmero de molculas de gua na superfcie. Esta condio de equilbrio mostra que a fora relacionada ao peso do mosquito est sendo compensada pela resistncia das molculas de gua em migrarem para a superfcie. Esta resistncia denominada de tenso superficial da gua, representando a oposio ao aumento da superfcie.

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    O trabalho mecnico necessrio para levar uma molcula do interior da fase para a superfcie pode ser mais bem compreendida como o trabalho para levantar um bloco de massa M, como representado na Figura 2.2. Para um bloco de massa igual a 100 Kg, o trabalho necessrio para desloc-lo do cho at uma altura de 1 m igual a 980 J. Como comparao, o trabalho necessrio para trazer um mol de molculas de gua do seio da fase para a superfcie aproximadamente igual 1000 J. Com este exemplo, tem-se uma idia de como foras intermoleculares, de relativo curto alcance, originam um fenmeno macroscpico (a tenso superficial) e envolvendo elevadas quantidades de energia.

    F

    M

    lquido

    vapor

    Figura 2.2 Analogia entre o trabalho realizado para levantar um bloco de massa M e para deslocar uma molcula do seio da fase para a superfcie.

    Do ponto de vista termodinmico, o aumento da rea interfacial sempre resulta em aumento da energia livre. Esta relutncia de uma fase slida ou liquida para aumentar a superfcie define muitas das propriedades interfaciais de fases condensadas. Em slidos, a principal conseqncia do desequilbrio de foras na superfcie capacidade de adsoro. Superfcies com altos valores de tenso superficial, sempre que possvel, sero sempre cobertas com substncias com menor tenso superficial, como mostrado esquematicamente na Figura 2.3. Metais so cobertos por xidos se a energia interfacial entre o metal e o gs maior que a soma das energias interfaciais do metal-xido e xido-gs. Da mesma forma, gua ir adsorver e cobrir o xido se ocorrer uma reduo na energia interfacial, ou mesmo a gua adsorvida pode ser deslocada ou coberta por uma camada orgnica com menor tenso superficial.

    (a) (b)

    Figura 2.1 Efeitos da tenso superficial da gua: (a) aranha sobre a superfcie da gua, sem afundar; (b) resistncia oferecida pela gua ao aumento da rea superficial.

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    Metal

    orgnico

    gua

    xido

    Figura 2.3 Ilustrao das camadas formadas ou adsorvidas sobre a superfcie de um metal para a reduo da energia interfacial.

    No caso de lquidos, a principal conseqncia a curvatura da superfcie: esta tende a contrair-se espontaneamente, reduzindo a rea superficial. Young foi um dos pioneiros em tentar explicar a tenso superficial em termos de foras de atrao e repulso entre as molculas de um lquido. Esta atrao entre molculas vizinhas acontece plenamente no seio da fase, enquanto as molculas na superfcie so atradas menos intensamente que as do interior da fase.

    Figura 2.4 Gota de gua aproximadamente esfrica, devido s foras interfaciais.

    Desta discusso deve ficar claro que h necessidade da realizao de trabalho para aumentar a rea interfacial. Ento, considerando a situao da Figura 2.4, onde um filme de sabo formado no interior de um quadro de arame, tendo uma das extremidades mvel, submetido a uma expanso de rea pela ao de uma fora F, o trabalho escrito como o produto desta fora pelo deslocamento.

    L

    x

    F

    Figura 2.4 Representao esquemtica do experimento do filme de sabo

    Trabalho = F dx (2.1)

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    Considerando o equilbrio com a fora de oposio ao deslocamento, exercida pela tenso superficial (), que atua por unidade de comprimento, a seguinte relao pode ser escrita:

    Trabalho = L dx = dA (2.2)

    Esta equao emprica e tambm uma definio de tenso superficial. Nesta formulao, a tenso superficial tem as dimenses de energia por unidade de rea, ou seja, erg/cm2 no sistema cgs e J/m2 no SI. Considerando a igualdade de foras, comparando as equaes 2.1 e 2.2, a tenso superficial tambm pode ser expressa em dimenses de fora por unidade de comprimento, ou seja, dina/cm ou N/m.

    A tabela 2.1 apresenta valores de tenso superficial e de tenso interfacial (com a gua) para algumas substncias. Alguns efeitos interessantes podem ser notados, como o aumento da tenso interfacial com o aumento da cadeia hidrocarbnica, tanto na srie de alcois quanto na de hidrocarbonetos. Observa-se tambm, pelo valor da tenso superficial do argnio, o papel das foras de disperso, exclusivamente, na existncia da fase lquida desse gs nobre.

    Ao analisar os valores da tenso interfacial, comportamentos distintos podem ser identificados. A interao do butanol com a gua, por exemplo, diminui o desequilbrio de foras na interface, como pode ser observado pelo valor de tenso interfacial menor que o de tenso superficial do butanol. No caso do octano e do heptano, a tenso na interface com a gua superior tenso superficial desses compostos, o que explicado pela existncia de efeitos hidrofbicos induzidos pelo contato destes hidrocarbonetos com a gua.

    Tabela 2.1 Tenso superficial e interfacial de algumas substncias.

    Interface com ar (mN/m) (25 C) Interface com gua (mN/m) (20 C) Mercrioa 485,5 Mercriob 415,0 guaa 72,0 - - 1-Butanola 25,0 1-Butanolb 1,8 1-Propanola 23,3 - - Etanola 22,0 Etanol solvel n-Octanoa 21,4 n-Octanoa 51,0 n-Heptanoa 19,6 n-Heptanob 50,2 Argnio (90K) a 11,9 - -

    a- Butt, b- Adamson, c- Israelachvili

    Como ser demonstrado nos prximos captulos, a tenso superficial est relacionada energia livre de superfcie, a qual se estende a alguns dimetros moleculares da superfcie. uma propriedade medida com preciso atravs de vrios mtodos experimentais. Seu valor rapidamente estabelecido no caso de substncias puras com viscosidade ordinria; mtodos dinmicos indicam que a tenso superficial estabelecida na ordem de milisegundos ou menos.

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    Outro aspecto fenomenolgico importante a dinmica das molculas na regio interfacial. Neste livro e em vrios outros que tratam do assunto, para simplificao e estabelecimento de relaes simples, porm muito teis, a interface apresentada como esttica, ou seja, o movimento das molculas presentes nesta regio no considerado. No entanto, a interface uma regio de grande turbulncia. simples obter a ordem de grandeza do tempo de residncia de uma molcula na regio interfacial. Por exemplo, para a interface entre as fases lquida e vapor, podemos obter a freqncia de coliso das molculas presentes na fase vapor com a interface. Utilizando a teoria cintica dos gases, ou seja, Z=P(1/2piMRT)1/2, obtemos uma freqncia de Z= 0,02 moles/cm2.s, ou Z = 1,2 x 1022 molculas/cm2.s. Estimando a rea de uma molcula de gua como 10 2, obtm-se um tempo de residncia para uma molcula na regio interfacial de aproximadamente 0,1 s. Uma estimativa da troca de molculas entre a regio interfacial e o seio da fase lquida tambm pode ser obtida atravs do clculo do deslocamento de cada molcula devido ao movimento Browniano (equao de Einstein: D = x2/2t), considerando a ordem de grandeza do coeficiente de difuso de lquidos (D = 10-5 cm2/s). Neste caso, a ordem do tempo de residncia das molculas na superfcie tambm da ordem de microsegundos, evidenciando uma troca de molculas muito rpida entre a superfcie e as camadas adjacentes.

    A anlise do pargrafo anterior suscita a dvida sobre a extenso da regio interfacial. Qual a profundidade da regio onde as foras entre as molculas esto desbalanceadas? Isso depende primeiramente da ordem de grandeza das foras intermoleculares envolvidas. Exceto quando ons esto presentes, a fora principal que atua entre as molculas a chamada fora de van der Waals. Este tipo de fora diminui com a stima potncia da distncia intermolecular e, consequentemente, para uma dada molcula as foras de interao so importantes somente para a primeira ou a segunda camada de molculas vizinhas. Em outras palavras, uma molcula sofre foras essencialmente simtricas, desde que esteja distante da superfcie poucos dimetros moleculares.

    Outro critrio utilizado para avaliar a profundidade da regio interfacial a orientao das molculas. Sabe-se que as molculas de gua, por exemplo, esto aleatoriamente orientadas no seio da fase, enquanto que prximas interface lquido-gs orientam-se preferencialmente com o oxignio apontado em direo fase vapor. Molculas de alcois tambm apresentam orientao preferencial: molculas prximas interface lquido-gs expem sua poro hidrocarbnica para a fase vapor enquanto que aquelas prximas interface lquido-gua apontam suas hidroxilas para a fase aquosa.

    Evidncias desta orientao superficial surgiram de estudos de adeso entre as fases. A adeso est relacionada ao trabalho necessrio para a separao de duas fases, WAB, e dada pela diferena entre a energia livre de superfcie nas duas condies, como descrito na equao 2.3 e ilustrado na Figura 2.10.

    ABBAABW += (2.3)

    WAB fornece o trabalho de adeso, que o trabalho mnimo necessrio para separar uma interface AB de rea unitria em duas interfaces lquido-vapor, A, e slido-vapor, B, por exemplo. Similarmente, o trabalho de coeso, WAA, corresponde ao trabalho reversvel para separar duas superfcies de rea unitria a partir de um meesmo material, A, e descrito pela equao 2.14 e tambm ilustrado na Figura 2.5.

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    AAA 2W = (2.4)

    AB

    B

    A(a)A

    A(b)

    Figura 2.5 Trabalho de adeso e de coeso

    Alguns valores dos trabalhos de coeso e de adeso para diferentes materiais so apresentados na Tabela 2.2.

    Tabela 2.2 Alguns valores do trabalho de adeso e coeso, em mJ/m2 (Adamson e Gast, 1968).

    Interface com ar Trabalho coeso Interface com gua Trabalho de adeso

    Heptano 40 Heptano 42

    Octano 44 Octano 44

    Octanol 55 Octeno 73

    cido heptanico 57 Octanol 92 Acido heptanico 95

    Os dados da Tabela 2.2 mostram valores para os trabalhos de coeso e adeso parecidos para os hidrocarbonetos alifticos, indicando que as interfaces so similares. Entretanto, quando h a presena de grupos polares na molcula, pode-se observar alguma variao no trabalho de coeso e um aumento significativo no trabalho de adeso com a gua. Este resultado indica que as interaes entre lcoois ou cidos com as molculas de gua leva a valores menores para a energia superficial, aumentando o trabalho necessrio para formao de duas interfaces distintas, conforme pode ser observado pela equao 2.3. Em outras palavras, a assimetria destas molculas (lcoois e cidos) possibilita uma reduo no desequilbrio de foras na interface atravs da orientao de seus grupos funcionais em direo s molculas de gua.

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    A idia que molculas assimtricas estaro orientadas na interface bem aceita, e essa orientao necessria para ocorrer uma transio mais gradual possvel de uma fase para outra. Langmuir props, qualitativamente, que cada parte de uma molcula possua uma energia livre local de superfcie. Utilizando etanol como exemplo, pode-se aplicar este princpio para decidir como as molculas estariam orientadas na superfcie, de acordo com as duas possibilidades apresentadas na Figura 2.6. No primeiro caso (Fig. 2.6 (a)), os grupos hidroxila estariam direcionados para a superfcie, cuja energia superficial cerca de 190 mJ/m2. No segundo caso (Fig. 2.6 (b)), a energia superficial deveria ser prxima a de hidrocarbonetos saturados, i.e., cerca de 50 mJ/m2 (Tabela 2.1). A diferena entre as duas situaes de 140 mJ/m2, ou cerca de 30 x 10-14 mJ/molcula. O valor experimental da tenso superficial do etanol de cerca de 30 mJ/m2, muito mais prximo do valor de hidrocarbonetos, evidenciando a preferncia pela orientao dos grupos carbonila para a superfcie.

    C

    C

    H

    OH

    H

    HH

    H

    (a)

    CHH

    H

    CH HOH

    (b)

    Figura 2.6 Possibilidades de orientao do etanol na interface com a fase gasosa.

    2.2 A equao de Young-Laplace

    conveniente relacionar a tenso superficial com a variao de energia e caractersticas geomtricas do sistema em questo, atravs de uma relao funcional. A anlise da variao do volume em uma bolha de sabo de raio r, apresentada na Figura 2.7, pode levar a esta relao. Na ausncia de campos potenciais, tal como o gravitacional, a bolha de sabo esfrica, forma que apresentam a menor relao possvel entre superfcie e volume.

    r

    dr

    Figura 2.7 Desenho esquemtico da variao de volume em uma bolha de sabo.

    Pela definio da tenso superficial, a energia livre de superfcie total dada por 4pir2 e, se houver um decrscimo no raio de dr, a variao na energia livre de superfcie ser (8pir)dr. Uma vez que a reduo de volume diminui a energia superficial, para evitar o colapso da bolha, esta tendncia precisa ser compensada por uma diferena de presso atravs do filme, P. Desta forma, no equilbrio, a variao na energia livre de superfcie contrabalanada pelo trabalho relacionado reduo do tamanho da bolha (P dV). Assim, no equilbrio, podemos escrever a seguinte relao:

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    dr r 8dr)r 4(P 2 pi=pi (2.5)

    Ou

    r

    2P = (2.6)

    Note-se que, quanto menor o tamanho da bolha, maior ser a presso no seu interior em comparao com a presso externa. Por exemplo, uma bolha com 1 mm de dimetro, considerando-se uma tenso superficial igual da gua, apresenta uma diferena de presso de 288 N/m2. Se o dimetro da bolha reduzido para 100 nm, uma incrvel diferena de presso em torno de 30 bar observada.

    Nos pulmes, a dinmica de trocas gasosas pelos alvolos, que nos mantm vivos, regulada pela diferena de presso atravs da parede dos mesmos. Como mostra a Figura 2.8, os alvolos so esfricos, de forma que a equao (2.4) se aplica. Assim, como a presso interna muito superior externa, no ato da expirao, medida que o ar sai, os alvolos contraem (r diminui), aumentando ainda mais a diferena de presso entre interior e exterior, de forma que haveria uma tendncia ao colapso das estruturas. Por outro lado, a produo de um surfactante natural, base de DPPC (dipalmitoil fosfatidil colina), que diminui a tenso superficial na parede dos alvolos, contrabalana o aumento de P, evitando, assim, o colapso dos alvolos. Na verdade, existe uma distribuio de tamanho dos alvolos e o efeito ainda mais complexo. Uma curiosidade que a liberao adequada desse surfactante pulmonar s ocorre a partir da 35 quinta semana de gestao e, por isso, a incidncia de problemas respiratrios em bebs muito prematuros comum.

    (a) (b)

    Figura 2.8 (a) Ilustrao dos pulmes e sua elevada rea superficial; (b) Detalhe dos alvolos pulmonares.

    A equao 2.6 um caso especial de uma relao matemtica mais geral deduzida por Young e Laplace em 1805, reconhecida como o primeiro princpio fundamental da termodinmica de superfcie. Para obter a expresso geral da equao de Young e Laplace necessrio descrever a superfcie curva atravs de dois raios de curvatura, que, no caso especial de uma esfera, so iguais. Uma pequena seo de uma superfcie curva arbitrria mostrada na Figura 2.6. Os dois raios de curvatura R1 e R2 , so indicados na figura e a seo

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    da superfcie suficientemente pequena, de forma que se pode considerar que os raios R1 e R2 so constantes.

    Figura 2.6 Seo de uma superfcie curva arbitrria.

    Se a superfcie deslocada em uma pequena distncia, a variao na rea ser dada por:

    ydyxdxxy-dy) dx)(y (x A +=++= (2.7)

    O trabalho realizado para formar esta quantidade adicional de superfcie, como discutido anteriormente, pode ser escrito como:

    dx)y dy (x W += (2.8)

    Como no caso da bolha de sabo, existir uma diferena de presso P atravs da superfcie; essa atua na rea xy e atravs da distncia dz. O trabalho correspondente representado por:

    dzy x PW = (2.9)

    Da comparao entre tringulos semelhantes, tem-se:

    11 Rx

    dzRdx x

    =

    +

    +

    ou,

    1Rdzx dx =

    (2.10)

    e

    22 Ry

    dzRdy y

    =

    +

    +

    ou,

    2Rdzy

    dy =

    (2.11)

    Para que a superfcie esteja em equilbrio mecnico necessrio que os dois termos de trabalho (equaes 2.6 e 2.7) sejam iguais. Substituindo-se as expresses para dx e dy (equaes 2.8 e 2.9), obtm-se a seguinte relao:

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    +=

    21 R1

    R1

    P (2.12)

    A equao 2.12 uma das equaes fundamentais dos fenmenos interfaciais e ser utilizada com freqncia neste curso. Essa equao reduz-se equao 2.4 quando os dois raios de curvatura so iguais, como o caso de uma esfera. Para uma superfcie cilndrica, um dos raios de curvatura infinito e a expresso se reduz a P = /R1. Em uma superfcie plana, os raios de curvatura so infinitos e P zero, significando que no h diferena de presso atravs de uma superfcie plana.

    Um exemplo da aplicao da equao de Young-Laplace a caracterizao da distribuio de tamanho de poros de um meio poroso. No caso de membranas microporosas, uma das tcnicas empregadas denominada ponto de bolha, pela qual a membrana inicialmente impregnada com um lquido e, em seguida, submetida pressurizao utilizando um gs inerte. A Figura 2.7 ilustra a situao para uma membrana com os poros cilndricos e sem tortuosidade.

    Figura 2.7 Remoo de um fluido do interior dos poros de uma membrana microporosa.

    O gs fora o lquido para fora dos poros, o que implica uma deformao da interface gs-lquido com aumento da rea interfacial. Conforme j discutido, a tenso superficial se ope a este aumento. Desta forma, quando ocorre a expulso do lquido, pode-se considerar que as condies necessrias para o equilbrio de foras foram atingidas e ligeiramente ultrapassadas. Nesta condio, medindo-se a presso da fase gasosa e conhecendo-se o valor da tenso superficial, pode-se aplicar a equao de Young-Laplace (r=2/P) e determinar o tamanho do poro cilndrico equivalente. Como na presso mnima necessria para expulsar o lquido apenas os poros maiores so afetados, permanecendo os demais ainda impregnados pelo lquido, pode-se determinar a vazo do gs atravs da membrana e calcular o nmero de poros livres aplicando uma equao para o escomento, como a de Hagen-Poiseuille (veja Figura 2.8)1. Aumentando-se gradativamente a presso, o lquido vai sendo removido de poros sucessivamente menores, at a sua total remoo da membrana. Para cada acrscimo de presso, pode-se medir o aumento da vazo e calcular o nmero correspondente a cada tamanho de poro. Uma curva tpica para o aumento da vazo de gs atravs de uma membrana com a presso apresentada na Figura 2.8, para a membrana seca e para a membrana impregnada. Note-se que, para o caso da membrana impregnada, somente a partir de uma presso mnima pode-se medir a vazo do gs atravs da membrana. Quando as duas curvas se encontram, pode-se considerar que o lquido foi expulso de todos os poros. O mtodo do

    1 Para uma reviso sobre escoamento de fluidos, recomenda-se o livro de R.Byron Bird, Warren. E. Stewart e

    Edwin N. Lightfoot, Transport Phenomena, John Wiley & Sons, N.Y.

    lquido

    membrana

    gs

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    ponto de bolha foi utilizado pela primeira vez por Bechhold, em 1908, para testar a integridade de meios filtrantes.

    Presso

    Vazode gsatravsda membrana

    P1 = 2 / Rmax P2 = 2 / Rmin

    Membranaimpregnada

    Membrana seca

    Equao de

    Hagen-Poiseuille:

    L R Pn

    8 Q

    4

    pi

    =

    Figura 2.8 Comparao do aumento da vazo de gs atravs de membrana porosa seca e de membrana impregnada com lquido em funo da presso. (Q vazo, n nmero de poros de tamanho R, R raio do poro, - viscosidade do gs, L comprimento do poro, P diferena

    de presso atravs da membrana)

    2.3 Molhamento: ngulo de contato

    A Figura 2.9 mostra gotas de gua de diversos tamanhos formadas sobre uma superfcie metlica. Estas gotas se formar pois, quando um lquido entra em contato com uma segunda fase condensada, ocorre um desequilbrio de foras que via orientar a interface entre estes, levando-a a assumir uma nova posio de equilbrio, que, por sua vez, d origem a um ngulo de contato entre as fases.

    Figura 2.9 Gotas de gua sobre uma superfcie metlica.

    Um desenho esquemtico mostrando a localizao do ngulo de contato pode ser vista na Figura 2.10. A anlise desta figura mostra que, quanto menor o ngulo () entre o lquido e o slido, maior ser o espalhamento do lquido sobre a superfcie do slido. Quando o ngulo de contato for nulo, o lquido encontra-se totalmente espalhado na superfcie do slido. Por outro lado, medida que o ngulo vai aumentado, o lquido tende a formar gotas

  • Captulo 2: Superfcies Lquidas

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    aproximadamente esfricas na superfcie do slido. Para ngulos de contato superiores a 90, diz-se que no ocorre molhamento.

    Lquido

    gs

    slido

    sl

    lg

    sg

    Figura 2.10 Molhamento de uma superfcie slida por um lquido.

    O desenvolvimento de superfcies superhidrofbicas, nas quais o ngulo de contato da gua se aproxima de 180 de grande interesse tecnolgico. Entre as aplicaes de interesse, pode-se citar seu uso em tecidos prova dgua, em tintas para cobrimento de circuitos eletrnicos, em vidros para a indstria automotiva, entre outros. A inspirao para esse tipo de superfcie veio da observao, na natureza, do formato de gotculas de gua sobre a folha de determinadas plantas, em partcula, a folha da Ltus, uma das superfcies mais hidrofbicas conhecidas, sobre a qual o ngulo de contato chega a aproximadamente 150 . Outro exemplo de superfcie hidrofbica encontrada na natureza so as penas das aves. Estes animais possuem glndulas que produzem uma gordura, que espalhada sobre as penas no ato de bicar. O aumento do ngulo de contato da gua na superfcie das penas aliado presena de bolhas de ar aprisionadas nas mesmas, so responsveis pela capacidade desses animais de flutuar. Ambas as situaes so ilustradas na Figura 2.11.

    (a) (b)

    Figura 2.11 (a) Gotas de gua sobre a folha da Flor de Ltus; (b) Gotas de gua sobre a pena de uma ave.

    Lembrando que a tenso interfacial sempre exerce uma fora tangencial superfcie, o molhamento de um slido por um lquido pode ser interpretado como resultado de um balano de foras de superfcie atuando no contato entre as fases lquida, slida e gasosa. Na condio de equilbrio, o balano de foras pode ser escrito como:

    sgsllg )cos( =+ (2.13)

    Ou,

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    lg

    slsg)cos(

    =

    (2.14)

    A equao 2.13, conhecida com equao de Young, foi obtida inicialmente por uma derivao mecnica, mostrada acima. No entanto, posteriormente foi realizada uma derivao termodinmica, mais rigorosa, levando mesma equao e comprovando sua validade.

    Quando ocorre molhamento, h um aumento das interfaces lquido-gs e slido-lquido e uma reduo da rea da interface slido-gs. Desta forma, o balano de foras descrito pela equao 2.13 representa a condio onde ocorre a minimizao da energia interfacial, de acordo com as caractersticas de cada fase.

    A anlise da equao 2.13 mostra que o quociente (sg sl)/lg deve ser sempre menor que 1 para que ocorra a formao de um ngulo de contato. Ou seja, sg < sl + lg. Quando sg = sl + lg, o ngulo de contato igual a 0, ou seja, ocorre espalhamento do lquido sobre o slido. No sistema em que sg > sl + lg no h formao de uma ngulo definido, havendo tambm espalhamento. Para permitir um conhecimento prvio sobre a habilidade de um lquido em melhor determinado slido, criou-se o coeficiente de espalhamento S:

    S = sg sl lg (2.15)

    Quando S maior ou igual a zero, o lquido ir espalhar sobre o slido, formando um filme sobre o mesmo. o que ocorre em muitos casos onde o lquido hidrofbico (possui baixa tenso superficial como hidrocarbonetos, por exemplo) e o slido hidroflico (apresenta alta tenso superficial como vidros e superfcies metlicas). Ao contrrio quando S menor que zero no h espalhamento e o lquido ir formar um ngulo definido. o que geralmente ocorre para o se tenta espalhar um lquido de alta tenso superficial como a gua sobre uma superfcie hidrofbica como o teflon ou silicone.

    A equao 2.3, para o trabalho de adeso pode ser facilmente combinada com a equao 2.14, para o ngulo de contato, ou seja:

    ))cos(1(W lgAB += (2.16)

    Desta forma, a partir da medida das tenses superficiais entre um lquido e uma fase gasosa e da determinao do ngulo de contato entre o lquido e outra fase condensada (slido ou lquido), possvel determinar o valor do trabalho de adeso. Combinando tambm as definies de trabalho de adeso e coeso, dados pelas equaes 2.3 e 2.4, com a definio do coeficiente de espalhamento S (equao 2.15), obtm-se que:

    SAB = WAB - WAA (2.17)

    Uma anlise da equao 2.15 mostra que, quando o coeficiente de espalhamento S positivo, as foras adesivas predominam o que justifica o espalhamento do lquido sobre o slido. J coeficientes negativos indicam que foras coesivas prevalecem, preferindo o lquido reduzir sua interao com a superfcie, o que justifica o no espalhamento observado neste caso.

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    Histerese do ngulo de contato

    Embora tenha sido dito anteriormente que o ngulo de contato constante para um dado sistema slido/lquido/fluido, existem situaes em que os valores encontrados para o ngulo diferem entre si, dependendo da maneira como foram medidos. Por exemplo, o ngulo de contato encontrado quando um lquido avana sobre uma superfcie (denominado ngulo de avano) pode diferir tipicamente em cerca de 20 do ngulo encontrado quando este mesmo lquido recua sobre essa superfcie (ngulo de recuo), que j est previamente molhada. A diferena entre esses ngulos caracteriza o que se chama de histerese na medida. Um exemplo comumente citado para este efeito aquele observado quando uma gota de chuva escorre pelo pra-brisa de um carro, como ilustrado na Figura 2.12.

    Figura 2.12 ngulo de contato de avano (A) e recuo (R).

    A histerese na determinao experimental do ngulo de contato pode ter duas causas principais: heterogeneidades na composio qumica do material e irregularidades superficiais.

    Na situao mais simples, uma superfcie heterognea produzida a partir de dois materiais distintos. Neste caso, o ngulo de contato naquela superfcie (M) ser uma mdia entre os ngulos de contato obtidos em cada material separadamente (1 e 2), ponderada pelas fraes de cada material na superfcie. Ou seja:

    2211M xx += (2.18)

    Com esta simples equao, possvel estimar com surpreendente preciso a composio superficial de um material, como confirmado por anlise com XPS (espectroscopia fotoeletrnica de raios X), por exemplo.

    A influncia da rugosidade de uma superfcie sobre o ngulo de contato produzido sobre ela tambm bastante pronunciada e com implicaes importantes. Mesmo superfcies finamente polidas apresentam rugosidades da ordem de 10 a 1000. Uma correlao atribuda a Wenzel estabelece que:

    )cos(R)cos( LwR = (2.19)

    Rw o chamado fator de rugosidade, sendo Rw 1,5, para superfcies altamente polidas. Este efeito tem uma importante conseqncia prtica para a indstria de tintas e

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    recobrimentos, por exemplo. Isto porque introduo de irregularidades na superfcie atravs do aumento da sua rugosidade (que podem ser produzidas com o uso de lixas), pode tanto tornar a superfcie mais hidroflica quanto mais hidrofbica. Ou seja,

    o

    Ro

    L 9090

    Assim, se um lquido molha bem uma superfcie lisa, molhar ainda melhor uma superfcie rugosa constituda do mesmo material. Ao contrrio, se o lquido no molha bem a superfcie lisa, o molhamento ser ainda pior na superfcie tornada rugosa. As propriedades de tecidos e outros materiais ditos prova dgua so fortemente baseadas nesses princpio.

    Na prtica, pouqussimos sistemas no apresentaram histerese na medida do ngulo, de forma a se obter um valor realmente constante e independente de fatores diversos. Assim, ao se deparar com uma medida de ngulo de contato em uma tabela ou mesmo ao obt-lo experimentalmente, deve-se ter em mente que a maneira como ele foi medido e outros fatores externos podem estar influenciando naquele valor, o qual, desta forma, no absoluto.

    2.4 Capilaridade

    O fenmeno da capilaridade est presente em diversas situaes do dia-a-dia. Se um lquido molha a parede do capilar, a sua superfcie tende a permanecer paralela a esta parede, levando a formao de uma superfcie com forma cncava no interior do capilar, em contato com a fase gasosa. Se a seo transversal do capilar circular e o seu raio pequeno, o menisco ser aproximadamente hemisfrico, como ilustrado na Figura 2.13.

    r

    h

    P = 0

    P 0

    < 90 Lquido molha a parede do capilar

    Figura 2.13 Ascenso capilar (capilar ampliado em relao ao recipiente).

    O fenmeno de ascenso capilar pode ser facilmente equacionado atravs da equao de Young e Laplace. Existe uma diferena de curvatura entre a interface lquido-ar dentro do capilar (pequeno raio de curvatura) e a interface lquido-ar no reservatrio do lquido (raio de curvatura infinito). Esta diferena de curvatura vai originar uma diferena de presso entre os pontos A e B da Figura 2.13, que provocar a ascenso do lquido no tubo. O lquido vai subir at que essa fora motriz para a ascenso capilar seja contrabalanada pela presso hidrosttica causada pela coluna do lquido. Se h a altura do menisco acima da superfcie plana do lquido, ento o valor de P na equao de Young-Laplace (eq. 2.6) igual presso hidrosttica do lquido. Assim, P= .g.h, onde diferena entre a densidade da fase lquida e da fase gasosa, g a acelerao da gravidade. Substituindo esta expresso na equao 2.20 obtm-se,

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    2a h r g

    2==

    (2.20)

    A quantidade a, definida pela equao 2.20, conhecida como constante de capilaridade.

    No caso mais geral onde o lquido no molha perfeitamente a parede do capilar, o menisco formado no hemisfrico e o ngulo de contato deve ser levado em conta. A equao ento fica:

    h r g

    cos2=

    (2.21)

    O oposto da ascenso capilar a depresso capilar, onde um lquido que no molha a parede do capilar expulso por este (vide Exerccio 2).

    O fenmeno da capilaridade muito importante e tem diversas implicaes. A distribuio da gua desde a raiz de uma rvore at a sua copa, por exemplo, , em parte, explicada pela ascenso da gua atravs de uma intrincada rede de capilares (xilemas), ilustrado na Figura 2.14.

    (a) (b)

    Figura 2.14 Exemplos de sistema com capilaridade: (a) ascenso capilar em uma pipeta; (b) sesso transversal do caule de uma planta onde, ao centro, est o conjunto de vasos

    que transportam gua e nutrientes (xilema).

    Embora normalmente associada ascenso ou depresso em tubos verticamente dispostos, a capilaridade tambm responsvel pelo movimento de lquidos no sentido horizontal, um fenmeno denominado wicking, uma espcie de drenagem, ilustrado na Figura 2.15. Este escoamento a base da tecnologia por trs dos uniformes esportivos, por exemplo, os quais exibem uma conveniente capacidade de manter o suor longe do corpo dos atletas. Estes uniformes so constitudos de duas camadas de tecidos: a primeira, prxima ao corpo, possui caractersticas mais hidrofbicas, proporcionando um ngulo de contato com a gua mais elevado. A segunda camada, mais hidroflica e, portanto, com menor ngulo de contato, contacta a primeira e apresenta elevada rea superficial. O suor , ento, continuamente drenado da primeira camada para segunda, de onde evapora, mantendo o material menos mido.

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    O escoamento, neste caso, provocado por uma diferena entre o ngulo de contato da gua com os diferentes materiais. Como maior no primeiro material, a presso na fase lquida dentro deste material tambm maior, levando a um fluxo em direo a segunda camada, mais externa.

    Figura 2.15 Escoamento (wicking) em um capilar formado entre fibras com caractersticas hidroflicas diferentes.

    No tratamento utilizado at agora, a tenso superficial dos materiais foram consideradas constantes e esta uma considerao vlida em grande parte dos sistemas. No entanto, complicaes na anlise dos fenmenos como os de capilaridade surgem quando gradientes de tenso superficial esto presentes. Neste caso, a existncia desses gradientes gera um fluxo mssico superficial, fenmeno este que se tornou conhecido como efeito de Gibbs-Marangoni. O efeito de Gibbs-Marangoni tem origem, normalmente, na presena de substncias com propriedades surfactantes no meio. Um exemplo clssico deste fenmeno conhecido como lgrimas de vinho. O vinho pode ser encarado, simplificadamente, como uma soluo de gua e etanol. Em contato com a parede da taa, o vinho sobe por capilaridade. O aumento da rea superficial aumenta a taxa de evaporao do lcool, fazendo com que a concentrao deste diminua e, assim, a tenso superficial local da mistura aumente, o que intensifica ainda mais a ascenso do vinho. Pela ao da gravidade, o lquido, ento, desce na forma de lgrimas, como ilustrado na Figura 2.16.

    Apesar de introduzir uma maior complexidade ao sistema, este efeito geralmente benfico, como no caso da estabilizao das espumas, ou mesmo vital, como fica demonstrado, por exemplo, no papel dos surfactantes em reduzir o trabalho dos pulmes na respirao, diminuindo sua tendncia ao colapso dos alvolos na expirao e controlando a taxa com que os alvolos expandem na inspirao.

    Figura 2.16 Lgrima de vinho, um exemplo do efeito de Gibbs-Marangoni (latinstok Nmero: RF89bb).

    sentido do escoamento