Capítulo 3: O Motivo Para Ficar · Isso não pode tá relacionado com a dissolução da terceira ... membros da banda do começo. ... O punho da Chiaki estava prestes a pular bem

Sayonara Piano Sonata

1 | Light Novel Project

Capítulo 3: O Motivo Para Ficar

Diziam que Kagurazaka Kyouko já havia participado de três bandas antes mesmo de chegar aos

dezesseis anos.

A primeira banda foi formada com seus companheiros de clube durante o primeiro ano

do Fundamental II. O baixista era um garoto que pensava que podia tocar músicas usando

apenas uma corda, enquanto o baterista nem conseguia separar a sincronia das mãos e dos

pés. Para resolver isso, Kagurazaka Kyouko teve uma ideia ingênua, pedindo à garota que

deveria ser a vocalista para ajudar tocando a caixa da bateria. Contudo, a garota reclamou,

dizendo que não conseguiria cantar se fizesse isso. Então Kagurazaka-senpai assumiu os

comandos e virou a vocalista - ela praticou para valer as três músicas do Green Day que eles

haviam escolhido para a apresentação. Porém, um dia antes do aniversário da escola, a garota

disse que também queria cantar e acusou Kyouko de ser dissimulada; a garota acabou não

comparecendo ao ensaio. O baixista e o baterista ficaram do lado da garota e também

culparam Kyouko. No dia da apresentação, Kagurazaka Kyouko subiu no palco sozinha com sua

guitarra e começou seu ato solo com <Desperado>1 do Eagles. Embora sua performance tenha

sido muito bem recebida, a banda foi dissolvida no mesmo dia.

A segunda banda foi formada no verão do seu segundo ano no Fundamental II. Era um

grupo de música disco formado só por garotas. Kyouko se juntou à banda pois ficara intrigada

com um cartaz de recrutamento que penduraram numa casa de shows que ela frequentava. A

banda havia se promovido usando a frase "O Michael Jackson do Rock Gospel", e ela ficou

atraída pelo conceito estranho, porém interessante, escrito ali. Por isso, embora estivesse um

pouco preocupada com a diferença de idade entre ela e o restante da banda, ela ainda assim

se inscreveu. Surpreendentemente, ela ficou extremamente popular entre as outras

integrantes e elas imediatamente decidiram fazer um show. Contudo, durante uma das festas

de comemoração, foi revelado que Kagurazaka Kyouko frequentava as casas de várias

integrantes da banda para passar a noite e que tinha até tomado banho e dormido com elas.

Com isso, a festa virou a maior confusão e até os fãs acabaram envolvidos. A única pessoa que

1 https://www.youtube.com/watch?v=iDNtqy0zjJA

Capítulo 03


conseguiu escapar foi a pessoa em questão, que acabou por estar sóbria no momento. A

banda também foi dissolvida no dia seguinte.

A terceira banda foi formada depois que ela havia acabado de ir para o terceiro ano do

Fundamental II. Ela foi convidada a entrar na banda pelo assistente da loja de música que

frequentava. Os três outros membros eram todos homens e a média de idade deles era bem

alta - um dele já era casado. Contudo, a banda tocava principalmente hard rock britânico,

gênero pelo qual ela estava obcecada na época, por isso ela concordou em entrar na mesma

hora. Porém, a banda foi dissolvida depois de três meses.

—... E isso significa que o Clube de Pesquisa de Música Popular é a quarta?

— Ei, espera um pouco. Não pula a parte mais importante antes de terminar a

conversa. — Sentado de frente para a Senpai, perguntei rapidamente — Por que a terceira

banda foi dissolvida?

Como aumentei minha voz sem querer, todo mundo no McDonald’s – incluindo a

Chiaki, que estava sentada do meu lado, assim como a Mafuyu, que estava na minha diagonal -

olhou para mim.

— Hum? Não posso te contar sobre a terceira banda. Ah é, você conhece a Loja de

Instrumentos Musicais Nagashima, né? A loja que eu trabalho agora. O dono dessa loja era um

dos membros da banda e o incidente tem a ver com sua reputação.

Não pude evitar sentir um arrepio correndo pelo meu corpo. Então pensei na guitarra

extremamente cara da Senpai. De acordo com a Chiaki, Senpai a conseguiu ao descobrir as

fraquezas do dono e de o ameaçar com isso.



Isso não pode tá relacionado com a dissolução da terceira banda, né?

— Estou mais preocupada com a segunda banda. — Chiaki mordeu o canudo da sua

Coca e disse de maneira furiosa — Senpai, você já pegou garotas até demais!

— Hum, também estou pensando nisso. Bom, eu não fiz minha lição de casa direito

naquela época, por isso nunca pensei que ter um relacionamento lésbico também infringisse a

Lei da Imoralidade.

Isso não tem nada a ver com a Lei da Imoralidade, né?! Fala sério... Por que as

conversas dessa garota sempre vão por esse caminho?

Como os terceiranistas tinham lição e exames hoje, não pudemos praticar. Por isso,

nós quatro passamos no McDonald’s no caminho para casa. Embora a Senpai tivesse dito que

falaria sobre a apresentação, só conversamos sobre besteiras que não tinham nada a ver com

o assunto. Isso era bem preocupante para os membros da recém-formada banda.

— Mas então, com o objetivo de fazer a banda ter um caminho estável até o sucesso,

decidi três coisas. Primeiro, se for para entrar em outra banda, eu é que tenho que começá-la.

E com isso, Senpai olhou para todos nós. Essa foi a primeira vez que ela reuniu os

membros da banda do começo. Como a Senpai é uma idealista, não acho mesmo que seria

uma boa ideia ela entrar na banda dos outros.

— Segundo, a razão entre homens e mulheres na banda. A primeira foi 2:2, a segunda

foi 0:4, e a terceira foi 3:1 - e nenhuma deu certo. Como eu sou garota, a única opção que

restou foi formar uma banda com três garotas e um garoto.

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—... Então você me chamou pra banda por um motivo idiota desses?

Depois de me ouvir dizer isso com uma expressão perplexa, Senpai franziu as

sobrancelhas.

— Não é idiota, e esse também não foi o único motivo. Eu já te falei, não é?

Bom, ela não está errada. Essa garota parece falar sério sobre tudo, mas será que tem

mesmo alguma relação entre a quantidade de homens e mulheres com a duração da banda?

— Por último, a última pessoa a entrar tem que escolher o nome da banda.

Senpai olhou para Mafuyu, que estava sentada ao seu lado. Até então, Mafuyu havia

ficado em silêncio o tempo todo, olhando para as fritas. Mas quando ouviu Senpai dizer aquilo,

levantou a cabeça com o susto.

—... E-Eu?

— É. — Senpai segurou a mão de Mafuyu entre as suas.

— P-Por quê?

Mafuyu estava confusa, e eu também. Por que a Mafuyu que tem que escolher o nome

da banda?



Senpai pegou a caixinha das fritas.

— Essa sou eu... — Senpai pegou uma batata e a colocou na badeja. — Seguida pela

Camarada Aihara... — Ela olhou brevemente para Chiaki, então pegou outra batata e a colocou

ao lado da primeira. — O próximo é o jovem... — Ela pegou uma terceira batata ligeiramente

menor. — E por fim a Camarada Ebisawa. — Senpai então escolheu a maior batata que tinha.

Depois de passar um tempo arrumando as primeiras três batatas, ela usou a última como uma

corda para unir as três com um nó.

— Viram, a gente se juntou por causa da Camarada Ebisawa. Podemos formar nossa

banda porque você se juntou a nós. Portanto: se é para termos um nome, ele deve ser

escolhido por essa pessoa aqui.

Senpai colocou a trouxa de batatas na frente de Mafuyu. Ela então apontou para as

três batatas mais a grandona e disse:

— Você deve ser a pessoa a dar o nome da banda. Assim você não vai poder sair dela.

Contanto que você não saia, os outros três nunca irão se separar.

Senpai continuou olhando diretamente nos olhos de Mafuyu. Esta mordeu o lábio e

abaixou a cabeça para desviar o olhar.

— Mas eu...

— Você pode dar o nome que quiser. É só usar palavras que você gosta.

— Vou ficar com problemas se você disser isso.

Capítulo 03


— Por quê?

— Porque... eu só entrei porque fui atrás do Naomi.

Chiaki olhou para mim com um olhar sério, mas eu só conseguia fixar os olhos nos

lábios pálidos de Mafuyu.

O que tá acontecendo aqui? Por que a Mafuyu tá com tanto medo?

— Por isso, não posso ser eu a decidir algo tão importante quanto isso.

— É justamente por ser algo tão importante que eu quero que a Camarada Ebisawa

decida.

Senpai trouxe seu rosto para perto do de Mafuyu e disse gentilmente:

— Não estou dizendo para você escolher o nome agora. Porém, tenho que alugar o

lugar em que vamos nos apresentar e também fazer os pôsteres e os ingressos. Por isso, se der,

me dê a resposta depois de amanhã ou, no máximo, até antes da viagem.

— Ainda não decidi se quero ir na viagem.

— Você não quer ir? Por quê?

Mafuyu interrompeu as palavras da Senpai ao chacoalhar seus cabelos castanhos com

força. Eu e Chiaki trocamos olhares por um momento - sua expressão era de alguém confuso.



Nós havíamos conseguido a aprovação do Ebichiri há dois dias, mas Mafuyu ainda não

havia demonstrado nenhuma intenção de ir na viagem. Eu e Senpai tínhamos feito de tudo

para convencermos o Ebichiri, mas por algum motivo, era bem difícil para nós tocarmos no

assunto com a Mafuyu; por isso, nunca perguntamos a ela se queria ir na viagem.

Portanto, essa era a primeira vez que ouvimos da Mafuyu que ela continuava indecisa

quanto a ir. Fiquei um pouco deprimido. E pensar que nós já tínhamos atingido aquele nível de

entendimento quando o assunto era música e, mesmo assim, Mafuyu ainda não se misturava

com a gente? Até eu fiquei comovido com a música da Mafuyu quando tocamos <Kashmir>2...

Quando Senpai estava prestes a falar, Mafuyu empurrou sua cadeira para trás com

tudo e se levantou.

—... Mafuyu? O qu...

Ignorando minhas palavras, Mafuyu colocou a guitarra no ombro e caminhou por entre

as mesas até chegar nas escadas, desaparecendo em um instante.

Isso fez com que eu - que estava a meio caminho de ficar de pé - ficasse sem escolha a

não ser me sentar novamente.

Mas que droga, por que as coisas ficaram assim do nada? Alguém disse alguma coisa

que deixou ela triste?

— Ai ai... Essa garota é bem sensível — Senpai murmurou. Ela retirou a presilha para

soltar os longos cabelos negros e deu um suspiro.

2 https://www.youtube.com/watch?v=ZDwotNLyz10

Capítulo 03


— Não foi minha intenção repreendê-la, mas parece que ela percebeu de qualquer

forma.

O-O que é isso? A Senpai disse alguma coisa errada agora há pouco? Eu não tinha ideia

do que estava acontecendo.

— Nao, o que você tá fazendo aqui numa hora dessas?

O punho da Chiaki estava prestes a pular bem no meio da minha cara.

— Vai atrás dela! Por que você tá sentado aí?

— Hã? Quê? Eu?

— Vai logo atrás dela, idiota! Caramba, como você é tapado!

Chiaki deu um chute na minha coxa. Levantei na mesma hora e fui rapidamente até as

escadas.

Alcancei a Mafuyu na entrada da estação de trem. Em meio à multidão que descia as

escadas até a plataforma, avistei uma cabeça com cabelos castanhos e algo que parecia uma

capa de guitarra. Peguei rapidamente meu bilhete e me espremi entre os portões.

— Mafuyu!



Ela estava no fim do lance de escadas, passando pelos bancos. Mafuyu virou a cabeça.

Parecia haver lágrimas no canto de seus olhos.

—... Para de me seguir.

— Por que você tá nervosa?

— Eu não estou nervosa.

Todas as pessoas à nossa volta estavam olhando para mim, o que fez com que eu me

sentisse sem graça. Havia colegas meus estavam entre elas.

— Hum... então por que você agiu daquela forma?

Minha voz foi abafada pelo alerta que anunciava a chegada do trem. Continuei

seguindo Mafuyu e embarquei no vagão sem hesitar.

—... Você devia pegar o trem no sentido oposto, não é?

— Hã? É, você tá certa...

Parando pra pensar, minha mala e o meu baixo ficaram no McDonald’s. O que eu faço?

Será que eu tenho que voltar? Será que as duas vão me esperar?

O trem começou a andar. Mafuyu se sentou em um lugar vazio na ponta e apoiou a

guitarra nos joelhos, para não deixar que ninguém visse seu rosto. Fiquei em pé ao seu lado e

me recostei perto da porta.

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— Por que você me seguiu?

— Não faço ideia. De repente senti uma vontade louca de pegar o trem para um lugar

que eu nunca tinha ido e de dar um passeio por lá.

— Idiota.

E com isso, Mafuyu não disse mais nada. A fim de diminuir a atmosfera tensa, comecei

a contar um monte de piadas ruins - para falar a verdade, acho melhor eu corrigir essa minha

mania logo.

Quando o balançar do trem começou a se alastrar pela parte de cima do meu corpo,

comecei a me lembrar da conversa que tive com o Ebichiri. Só podemos esperar até que a

Mafuyu tenha vontade de falar. Quem disse isso fui - Ah, é verdade... não fui eu, foi o Tetsurou.

Mas não era isso o que eu tinha em mente. Nessa hora, eu já não conseguia mais

esperar. Eu estava mesmo era a fim de jogar longe a guitarra que a Mafuyu abraçava tão

apertado e botar a minha cara na frente da dela para perguntar o que é que ela estava

pensando exatamente.

E teve uma vez que eu até disse para ela: se tiver alguma coisa incomodando você, é

só falar.

Então no fim ela não acreditou no que eu disse?

Enquanto o trem fazia uma de suas inúmeras paradas em alguma estação, Mafuyu se

levantou de repente. Eu quase fiquei para trás quando ela saiu do vagão logo após o sinal - que

queria dizer que ele estava prestes a sair - tocar.



Era uma estação pequena e remota; quase ninguém desembarcou nela. Quase não

havia área coberta na plataforma e os fortes raios solares, vindos do Oeste, brilhavam com

força no asfalto.

Eu podia ver pedaços de pequenas fazendas do outro lado da cerca, uma estrada

pavimentada com cascalho e casas esparsamente espalhadas.

Hã? Quando eu perguntei a ela onde ela morava...

— Mafuyu, sua casa fica aqui perto?

Mafuyu carregava sua guitarra no ombro, com as costas voltadas para mim. Ela então

virou a cabeça e disse:

—... Só fiquei com vontade de descer em alguma estação desconhecida.

Após murmurar isso, ela começou a andar em direção à catraca.

Parando pra pensar, na verdade ela já fugiu de casa várias vezes, né? Como será que

ela faz quando quer desaparecer? Tô começando a entender por que o Ebichiri é tão

superprotetor com a filha.

Como eu tinha que pegar outro bilhete, quase perdi a Mafuyu, que havia rapidamente

passado pela catraca, de vista. Finalmente a alcancei na estrada de cascalho, que ficava situada

entre dois campos de milho. Porém, não fui capaz de gritar seu nome, por isso fiz o que estava

acostumado a fazer - andar quietamente atrás dela a uma distância de cinco metros.

Capítulo 03


Andamos por um bom tempo antes que Mafuyu finalmente interrompesse sua

caminhada. Ela parou no meio de uma ponte que se estendia por cima de um córrego quase

seco. Ela parou devido a uma solitária melodia eletrônica que vinha de longe. Era uma

transmissão - tocada em vários lugares públicos às 17 horas - para lembrar às crianças que já

era hora de irem para casa. A melodia era tocada nos alto falantes de alguns lugares

específicos da cidade. Parece que a música era a mesma para todas as cidades do Japão. Era o

segundo movimento da <Sinfonia do Novo Mundo>3 do Dvořák.

A mesma melodia também tocava em outro alto falante mais longe ainda. Ela se

misturou gentilmente à primeira melodia, que já havia começado a tocar há algum tempo,

formando um cânone confuso.

Mafuyu agarrou a cerca da ponte e deixou que seu olhar vagasse pelo ar, explorando a

melodia ao nosso redor.

Ela murmurou enquanto eu a alcançava:

—... Por que o Japão transmite uma música tão triste todo fim de tarde? Eu viajei por

todo o Japão por causa das minhas apresentações, mas, todo lugar em que fui, sempre ouvia a

mesma música.

Inclinei a cabeça para o lado. Que estranho.

— Essa música na verdade é tocada em funerais nos Estados Unidos e em outros

países — ela disse enquanto olhava para o córrego.

3 https://www.youtube.com/watch?v=hOX15agZ3-0



É mesmo? Acho que deve ser uma diferença cultural.

— Bom, essa música mais tarde deu origem à <A Caminho De Casa> e à <Pôr Do Sol

Nas Montanhas Distantes> porque ela dá às pessoas a sensação de que já está anoitecendo e é

hora de voltar para casa... pelo menos para nós japoneses.

— Jura? — Com isso, Mafuyu fechou os olhos e inclinou o ouvido para escutar o som

que ressoava enquanto era sugado pelo ar.

Provavelmente não havia muitas pessoas que sabiam que essa música era escrita pelo

Dvořák. E provavelmente menos ainda sabiam que essa peça era na verdade a substituta de

uma carta a ser enviada para sua terra, a República Tcheca, do Novo Mundo, a América, e que

ela era recheada de saudade de sua terra natal.

—... Por quê?

Quando o som ao nosso redor voltou a ser o canto das cigarras e o barulho de um trem

distante, Mafuyu me perguntou de forma delicada.

— Por que... você me convidou pra entrar na banda?

—... Hã?

— Deixa pra lá. Não foi nada.

Capítulo 03




Mafuyu tirou a guitarra do ombro e a apoiou na cerca.

— Eu só entrei na banda porque perdi a aposta com você. A culpa é sua.

— A culpa é minha...?

— A Senpai também deve achar isso... De qualquer jeito, isso é uma coisa que todo

mundo sabe.

O que a Kagurazaka-senpai... acha disso? E aí?

— Por isso, não tenho nenhum motivo pra ficar naquela sala.

— Isso não é... — Será que não é mesmo verdade...? Engoli minhas palavras no meio

do caminho.

Se pensarmos bem, pode até parecer que ela foi forçada a entrar no clube por mim e

pela Senpai. Embora todos estivessem se esforçando para não pensar nisso, a Senpai já havia

notado, e então...

“É justamente por ser algo tão importante que eu quero que a Camarada Ebisawa

decida. ”

Então é por isso que ela disse aquilo?

— A banda... não é legal?

Capítulo 03


Tentei perguntar de forma gentil.

— Não sei.

O que você quer dizer com isso?! Eu é que devia falar isso!

— Mas eu me sinto bem feliz quando nós quatro tocamos juntos.

— Não é bom se você se sente feliz?

— Não.

Por quê? Eu queria saber o motivo, mas não consegui perguntar. Mafuyu subiu na

cerca e esticou a cabeça para olhar o córrego. Por um segundo, pensei que ela fosse mesmo

pular.

— Você... não quer ir na viagem?

Eu estava bem perto de contar a ela tudo o que eu e a Senpai fizemos para convencer

o Ebichiri. Porém, não fazia muito sentido contar isso só para tentar fazer com que ela se

sentisse grata a nós.

Mafuyu apoiou os cotovelos na cerca e balançou a cabeça.

— Mesmo se eu for atrás de vocês nessa tal viagem...



— Não tem nada a ver com ir atrás da gente! — Eu cortei. — Nós vamos praticar com a

banda, não tem sentido se algum de nós não for.

— Tá tudo bem mesmo em eu ficar na banda? Eu já não sei mais.

— O problema não é se tá tudo bem ou não, não é? — Eu realmente não fazia a

mínima ideia do que a Mafuyu estava tentando dizer. — Eu pedi pra você entrar porque queria

fazer uma banda com você.

— A c-culpa é sua!

Mafuyu ergueu a cabeça para me olhar. Seu rosto estava um tanto vermelho, e parecia

que não era apenas devido ao sol poente.

— É tudo porque você diz coisas assim!

Com lágrimas no canto dos olhos e com o corpo levemente trêmulo, ela me deu um

empurrão. Recuei um passo.

O quê? Por que ela tá brava?

Mafuyu colocou a guitarra no ombro e passou por mim, indo na direção da qual

viemos. Fui rapidamente atrás dela, mas não pude andar ao seu lado ou chamá-la por trás.

E por causa disso, por um breve momento, não reparei que ela estava tentando voltar

para a estação. Levei muito tempo antes de me lembrar que seu senso de direção era péssimo.

Capítulo 03


Mafuyu ficou no meio dos exuberantes campos verdes e virou a cabeça para me olhar

com uma expressão perdida. Naquele momento, o sol já havia quase desaparecido no

horizonte.

— Não pode ser que você...

— E-Eu não estou perdida! Deve ser por aqui!

Ao ver como Mafuyu estava andando na direção completamente oposta, eu a puxei de

volta enquanto tentava resistir à minha vontade de suspirar. Então comecei a caminhar em

direção à estrada de cascalho. Se tem alguém por perto quando você está com algum tipo de

problema, você deve ser sincero com essa pessoa. Pode parecer algo simples, mas é difícil de

fazer na vida real. Contudo, essa é uma das principais coisas na vida.

O céu estava escuro quando chegamos na estação. Também havia muito mais

passageiros desembarcando do trem. Nós mal nos falamos e, considerando a situação em que

nos encontrávamos, foi impossível para mim segui-la até sua casa. Eu só podia vê-la partir

enquanto aguardava na plataforma. Eu então peguei meu celular.

— O que aconteceu com a Mafu-Mafu?

— Ah... Hum, ela foi pra casa. — Eu não fazia ideia do motivo, mas meu coração ficou

aliviado quando a voz da Chiaki soou a mesma de sempre - e por isso dei essa resposta boba.

— Não, não foi isso que eu quis dizer... Pra que você foi atrás dela então?

— Desculpa, eu também não sei. Ah, é, onde você tá agora? Minhas coisas ficaram no

McDonald’s.



— Eu peguei pra você.

— Ah, desculpa o incômodo.

— Eu vou levar pra você. Até mais.

Nesse momento, o trem que eu estava esperando entrou na plataforma. Chiaki

desligou sem nem esperar pela minha resposta.

A casa da Chiaki ficava a cinco minutos a pé da minha.

Cinco minutos eram referentes ao tempo que levaria para fazer o caminho normal da

casa dela até a minha; porém, se considerarmos o caminho mais direto entre as nossas casas,

provavelmente levaria não mais que dois minutos. O tal "caminho direto" era referente a uma

rota que consistia em passar por uma área restrita debaixo de fios de alta tensão, se espremer

em um beco apertado pelo qual provavelmente só um gato conseguiria passar, e entrar no

quintal da minha casa, antes de finalmente escalar a árvore que fica do lado da parede, e

então, acabar bem do lado de fora da minha janela. Esse era um caminho que só a Chiaki faria.

Depois de muita dificuldade, finalmente cheguei em casa às oito da noite. Depois de

confirmar que o Tetsurou não estava em casa, fui imediatamente para o meu quarto no

segundo andar. Peguei o álbum <Trilogy>4 do Emerson, Lake & Palmer, coloquei ele no

aparelho e fui relaxar na minha cama depois de apertar o play. Porém, antes mesmo de chegar

na <Fugue>5, escutei o barulho de alguém batendo na janela.

— Tô entrando...

4 https://www.youtube.com/watch?v=nQxc2-ERPug&list=PL94gOvpr5yt1w5OvRNqhZUUfvcC47jWFg

5 https://www.youtube.com/watch?v=NnRf4-GByKo

Capítulo 03


Eu tinha aberto as janelas mais cedo para ventilar o quarto, o que permitiu que a

Chiaki entrasse nele antes que eu pudesse responder. Ela já tinha colocado uma camiseta e um

shorts jeans. Depois de colocar a minha mochila e o meu baixo perto da janela, ela se sentou

na minha cama sem cerimônia nenhuma. Era como se a casa fosse dela.

— Por que você decidiu entrar pela janela segurando todas essas coisas? — Deve ter

sido difícil para subir na árvore, né?

— Você devia começar me agradecendo, tá?

Ela me deu uma cotovelada nas costas. Como doeu.

— Desculpa. Obrigado.

— O Tio não tá em casa hoje? Eu podia ter entrado pela porta da frente se soubesse

disso antes.

— Hum, ele deve ter saído pra beber ou sei lá.

— É? Então vamos beber também! Deve ter saquê na geladeira, né? Pega uns

salgadinhos pra gente comer junto.

— Eu não vou beber! O que você tem na cabeça?

Mudei minha posição na cama e fixei o olhar no teto. Nessa hora, Chiaki veio andando

devagar. Ela esticou a cabeça sobre mim e me fitou.



— Você também devia aprender a beber aos poucos! A Mafu-Mafu parece não

aguentar um copo. Vai ser bem solitário se só eu e a Senpai bebermos nas comemorações.

— É porque eu ainda sou menor de idade... Espera, então a Senpai também bebe? —

Acabei me levantando sem querer.

— Hum. Ninguém era capaz de beber como eu depois que o vovô morreu - isso é, até

eu conhecer a Senpai. Foi a primeira vez que encontrei alguém melhor do que eu.

Deixei escapar um suspiro. A lei não diz que só podemos beber depois dos vinte?

— Não sei por que, mas de alguma forma parece que foi o destino que fez com que eu

conhecesse a Senpai.

— É, foi por causa dela que você começou a tocar bateria também...

Era bem impressionante que ela tivesse conseguido ficar tão boa na bateria tendo só

esse motivo impuro em mente.

— Qual é o problema com o motivo ser impuro? O mais importante é ser feliz. Se pelo

menos a Mafu-Mafu pensasse assim também.

—... Hã?

Como a Chiaki tinha tocado no nome da Mafuyu de forma tão repentina, fiquei

encarando-a por um tempo.

Capítulo 03


— Vocês não conversaram sobre isso?

— Hum...?

Parecia que nós tínhamos e, ainda assim, parecia que não. De fato, Mafuyu estava

agonizando sobre seu motivo para ficar na banda e se estava ou não tudo bem em continuar

nela.

— Isso significa que a Mafu-Mafu ficou na banda por causa de outro motivo impuro e é

por isso que ela tá angustiada? Deve ser isso. Além do mais, ela é do tipo que se preocupa até

com os menores detalhes, diferente de mim.

— O que você quer dizer com "motivo impuro"? É impuro porque ela perdeu uma

aposta comigo?

Pode até ser impuro - mas a Mafuyu está mesmo incomodada com isso? Eu é que

deveria estar pensando nisso, não? Contudo, tudo o que a Chiaki fez foi ficar olhando para a

minha cara - com a boca entreaberta - por um bom tempo. Depois, ela apoiou a testa nos

joelhos e suspirou.

— Eu sei que você é idiota e tapado, mas nunca pensei que fosse tanto assim.

Tudo que puder fazer foi engolir minhas palavras de volta. Eu não podia retrucar aquilo

porque era exatamente como a Chiaki tinha dito. Desculpa mesmo por isso!

O problema é: como você quer que eu saiba alguma coisa se a Mafuyu não diz nada

sobre o assunto?!



— É, pois é. Quero dizer, ele ainda não se tocou depois de mais de dez anos, como ia

perceber uma coisa que só tem três meses?

— Hã? Desculpa, o que você disse?

Chiaki mostrou a língua para mim e me ignorou.

Por favor, eu tô perdido aqui!

Enquanto eu não tinha certeza do que estava acontecendo, Chiaki se levantou e

ajeitou os amassados da roupa com as mãos.

— Tá certo, agora eu vou deixar o idiota tapado em paz e ir pra casa. Vou pensar em

alguma coisa eu mesma.

— O que você quer dizer com isso?

— Você vai ficar preocupado se a Mafu-Mafu continuar se afastando da banda, não é?

Se a situação nos forçar a isso, seremos só nós três na viagem.

Concordei rigidamente com a cabeça.

— Hum. Eu também vou ficar bem preocupada. Eu não gosto de vitórias incontestáveis

e nem de perder sem lutar.

Depois de dizer um monte de coisas que eu não entendi, Chiaki foi até a janela e saiu

do meu quarto. Coincidentemente, a <Fugue> tocada pelo Keith Emerson tinha acabado

Capítulo 03


exatamente naquele momento; a segunda parte do <The Endless Enigma>6 estava prestes a

começar.

6 N.T.: “O Enigma Sem Fim”.

https://www.youtube.com/watch?v=YSJ8DVnngms

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Capítulo 3: O Motivo Para Ficar · Isso não pode tá relacionado com a dissolução da terceira ... membros da banda do começo. ... O punho da Chiaki estava prestes a pular bem