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12 2. ELEMENTOS E COMPORTAMENTO MECÂNICO DAS VIAS PERMANENTES Via permanente é a denominação utilizada para o conjunto de camadas e de elementos que possibilitam a passagem de trens. Os componentes da via permanente, apresentados na Figura 2.1, são divididos em dois grupos: a infra- estrutura e a superestrutura. Figura 2.1 - Componentes da via permanente A infra-estrutura refere-se à camada inferior de terraplenagem, chamada de subleito ou plataforma, e a todas as obras localizadas abaixo do nível determinado por esta camada. Quanto à superestrutura, os principais componentes são os trilhos, as fixações, os dormentes, o lastro e, em muitos casos, o sublastro. O conjunto formado pelos dormentes, fixações e trilhos é, comumente, denominado de grade da via. A classificação dos elementos da via entre superestrutura e infra-estrutura, no entanto, não são iguais em todos os países do mundo. Enquanto no Brasil e na França, utiliza-se a divisão acima exposta, na Inglaterra e nos Estados Unidos, o lastro é considerado um componente da infraestrutura. Nestes locais, a infraestrutura, composta por lastro, sublastro, subleito e obras localizadas abaixo do lastro, é formada portanto pelo conjunto de elementos constituídos por materiais particulados.

Capitulo2

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  • 12

    2. ELEMENTOS E COMPORTAMENTO MECNICO DAS VIAS PERMANENTES

    Via permanente a denominao utilizada para o conjunto de camadas e de

    elementos que possibilitam a passagem de trens. Os componentes da via

    permanente, apresentados na Figura 2.1, so divididos em dois grupos: a infra-

    estrutura e a superestrutura.

    Figura 2.1 - Componentes da via permanente

    A infra-estrutura refere-se camada inferior de terraplenagem, chamada de subleito

    ou plataforma, e a todas as obras localizadas abaixo do nvel determinado por esta

    camada. Quanto superestrutura, os principais componentes so os trilhos, as

    fixaes, os dormentes, o lastro e, em muitos casos, o sublastro. O conjunto formado

    pelos dormentes, fixaes e trilhos , comumente, denominado de grade da via.

    A classificao dos elementos da via entre superestrutura e infra-estrutura, no

    entanto, no so iguais em todos os pases do mundo. Enquanto no Brasil e na

    Frana, utiliza-se a diviso acima exposta, na Inglaterra e nos Estados Unidos, o

    lastro considerado um componente da infraestrutura. Nestes locais, a

    infraestrutura, composta por lastro, sublastro, subleito e obras localizadas abaixo do

    lastro, formada portanto pelo conjunto de elementos constitudos por materiais

    particulados.

  • 13As principais funes da via permanente so: orientar a passagem de trens de

    maneira estvel e segura, e transmitir os esforos resultantes da passagem de

    veculos fundao.

    2.1. COMPONENTES DA VIA PERMANENTE TRADICIONAL

    O desempenho da via est relacionado com os alinhamentos vertical e horizontal do

    sistema de camadas. Para que isso ocorra, necessrio que cada componente do

    sistema realize suas funes adequadamente perante as condies climticas e os

    carregamentos impostos pelo trfego (SELIG; WATERS, 1994). As funes dos

    principais componentes sero, a seguir, descritas para a melhor compreeso do

    comportamento mecnico de ferrovias.

    2.1.1. Trilhos

    Os trilhos so os componentes de ao, posicionados longitudinalmente na via,

    responsveis por:

    Transmitir e distribuir as cargas provenientes da passagem dos veculos nos dormentes;

    Orientar o trajeto dos trens; Fornecer uma superfcie de rolamento adequada e distribuir as foras de

    acelerao e frenagem; e

    Conduzir corrente eltrica para os circuitos de segurana da via.

    A rigidez dos trilhos deve ser adequada para que essas funes sejam realizadas

    sem que ocorram deflexes excessivas entre os dormentes. Defeitos ou

    descontinuidades nos trilhos, como juntas, podem causar efeitos dinmicos danosos

    via permanente e vibrao no desejada nos veculos. Os principais limitantes da

  • 14vida til dos trilhos so: o desgaste, devido ao contato metal-metal que ocorre entre

    a roda e o trilho, e a fadiga causada pelo carregamento cclico que provoca um

    rearranjo da microestrutura do metal que pode levar a sua ruptura.

    Alm das solicitaes provenientes dos veculos, os trilhos esto sujeitos a tenses

    provocadas pela variao da temperatura. Essas tenses decorrem do impedimento

    da variao de comprimento do trilho. Com o aumento da temperatura, o metal do

    trilho tende a se dilatar. No entanto, como a dilatao impedida aparecem tenses

    de compresso. Quando a temperatura diminui, o impedimento da contrao do

    metal provoca tenses de trao.

    2.1.2. Dormentes

    Os dormentes so componentes transversais via e perpendiculares aos trilhos

    cujas principais funes so:

    Garantir suporte adequado e seguro dos trilhos; Manter a bitola e a estabilidade vertical, lateral e longitudinal da via; Transmitir as cargas provenientes dos trilhos o mais uniformemente possvel para

    o lastro;

    Amortecer, parcialmente, as vibraes.

    Os materiais mais utilizados em dormentes so: madeira, concreto e ao. Esses

    materiais devem resistir s solicitaes mecnicas e s condies ambientais da via.

    A madeira apresenta propriedades adequadas para utilizao em dormentes, porm,

    devido escassez de fontes e s exigncias ambientais, alm de dificuldade de

    reciclagem devido ao tratamento qumico pelo qual os dormentes passam, a

    utilizao deste material est diminuindo.

    Os dormentes de concreto so mais durveis, resistentes, fceis de fabricar e de

    alterar a geometria. O peso elevado dos dormentes de concreto contribui para a

    estabilidade da via, mas dificulta as operaes de construo e de manuteno. H

    dormentes de concreto fabricados com diferentes tecnologias, como os dormentes

  • 15tipo monobloco (concreto protendido), dormentes bibloco (dois blocos de concreto

    armado interligados por uma barra de ao) e dormentes de blocos independentes

    (blocos independentes em concreto armado, no interligados por barra de ao, que

    so acomodados nas vias em placa (slab track), que sero apresentadas a seguir.

    Entre as desvantagens dos dormentes de concreto, encontram-se a baixa

    capacidade de absorver vibraes, maior transmisso de cargas dinmicas para os

    lastros (aumento de cerca de 25%) e aumento dos riscos de dano por impacto

    (ESVELD, 2001).

    Os dormentes de ao apresentam alta vida til e boa conformidade geomtrica, no

    entanto seu custo elevado pode inviabilizar sua utilizao em alguns casos. Alm

    disso, esses dormentes so mais leves, o que desfavorece a estabilidade de vias

    que operam cargas elevadas, embora facilitem a colocao e retirada para

    manutenes.

    Atualmente, a utilizao de dormentes de polimeros, novos e recilcados, esta sendo

    estudada. Os fabricantes afirmam que o comportamento mecnico destes

    dormentes similar aos de madeira e apresentam ainda vantagens como ser menos

    suceptvel a intempries.

    2.1.2.1. Fixaes e Placas de Apoio

    As fixaes ferrovirias so utilizadas para manter os trilhos corretamente

    posicionados nos dormentes. Deste modo, elas evitam que os trilhos sofram

    deslocamentos verticais, laterais e longitudinais provocados pelos esforos das

    rodas dos veculos e pela variao de temperatura (SELIG; WATERS, 1994).

    Existem numerosos tipos de fixaes, os quais podem ser divididos em dois grupos:

    as rgidas e as elsticas. Pregos de linhas e parafusos (Tirefond) so as fixaes

    rgidas mais usuais. No entanto elas se afrouxam com o tempo por causa dos

    impactos e da vibrao da via. As fixaes elsticas so as mais utilizadas por no

    se soltarem com a passagem dos veculos, mantendo assim uma presso constante

    sobre o trilho. A escolha da fixao depende das caractersticas dos dormentes e da

    seo transversal do trilho.

  • 16Placas de apoio, instaladas entre trilhos e dormentes, so necessrias em

    dormentes de madeira para proteger o material contra o desgaste mecnico e para

    aumentar a capacidade de suporte da madeira (SELIG; WATERS, 1994). Tambm

    so necessrias em dormentes de concreto pelo mesmo motivo, sendo usual a

    utilizao de palmilhas elastomricas entre trilho e placa de apoio para evitar a

    concentrao de tenses no concreto do dormente e para contribuir com a

    elasticidade da via. Estas palmilhas colaboram ainda com a adequao das

    caractersticas de transmissibilidade de vibraes entre trilho e dormente.

    2.1.3. Lastro

    O lastro uma camada formada por material granular localizado acima do sublastro

    ou diretamente sobre o subleito cuja espessura usual varia de 250mm a 350mm. As

    principais funes do lastro so:

    Suportar e distribuir uniformemente as elevadas tenses verticais, que ocorrem na interface dormente/lastro decorrentes da passagem dos veculos;

    Transmitir tenses reduzidas s camadas inferiores de sublastro e subleito, tornando-as aceitveis para os materiais destas camadas;

    Garantir a estabilidade dos dormentes e trilhos perante as foras laterais, longitudinais e verticais;

    Permitir a drenagem da via; Facilitar a manuteno, permitindo o rearranjo das partculas durante as

    operaes de nivelamento e alinhamento da via;

    Proporcionar a elasticidade da via que, por sua vez, minimiza as cargas dinmicas; e

    Amortecer vibraes e rudos.

    O material do lastro usualmente obtido pela britagem de rochas. Seu

    comportamento mecnico determinado pelas caractersticas das partculas e da

    graduao do material. Um material adequado para lastro apresenta as seguintes

  • 17propriedades: forma cbica e angular, faces britadas, rugosidade superficial, dureza

    elevada, graduao uniforme e a ausncia de poeiras e materiais finos. Essas

    propriedades sero discutidas em detalhes no Captulo 3.

    Apesar do conhecimento atual das caractersticas tcnicas que determinam o

    comportamento da camada, observa-se com freqncia a utilizao de critrios de

    carter econmico e de disponibilidade para a escolha do material (KLASSEN;

    CLIFTON; WATTERS, 1987).

    2.1.4. Sublastro

    Sublastro a camada constituda por material granular, geralmente bem graduado,

    localizada entre o lastro e o subleito. Essa camada age como filtro, prevenindo a

    penetrao do solo do subleito no lastro. As principais funes do sublastro so:

    Reduzir as cargas advindas do lastro, provenientes da carga rolante, para adequ-las resistncia do subleito;

    Evitar o bombeamento de finos, fenmeno no qual a lama, resultante da mistura do solo fino com gua, bombeada, pela ao do trfego, para a camada de

    lastro, alterando suas propriedades; e

    Reduo da espessura da camada de lastros o que favorece a economia j que o material utilizado no sublastro de menor custo.

    2.1.5. Subleito

    Subleito, ou plataforma, a fundao da ferrovia. Pode ser constitudo pelo solo

    natural ou por camada de solo selecionado. Sua principal funo garantir a

    estabilidade da fundao, evitando recalques excessivos.

    As tenses resultantes da passagem dos veculos podem ser dissipadas a at cerca

    de 5m de profundidade a partir da parte inferior do dormente. Como as camadas de

  • 18lastro so pouco espessas, geralmente inferiores a 0,5 metros, o subleito tambm

    tem um importante papel mecnico. Ele influencia a resilincia da estrutura e

    contribui para a deflexo elstica da via (SELIG; WATERS,1994).

    2.2. VIAS SEM LASTRO

    Existem vias permanentes que no possuem a camada de lastro. Na maioria destas

    vias, a superestrutura apoiada em lajes de concreto armado, e so chamadas Slab

    Tracks. Araujo (2011) comenta que atualmente existem os seguintes 5 tipos de Slab

    Tracks, classificadas segundo a disposio dos trilho e dormentes: embedded rail

    (via embutida), resilient baseplate (vias nas quais trilhos apoiam-se em lajes de

    concreto, as quais encontram-se envolvidas por palmilhas de borracha), booted

    sleeper (dormentes bi-bloco com galochas de borracha), cast-in sleeper (o trilho

    fixado no dormente por meio de uma base resiliente) e floating slab (o trilho apoia-se

    em uma laje apoiadas em molas ou borrachas como na Figura 2.2).

    O aumento da utilizao de vias sem laje ocorreu a partir de 1899 quando uma

    ferrovia nos Estados Unidos colocou lajes de concreto abaixo da via existente para

    estabilizar parte da via que se encontrava apoiada em solos pouco resistentes

    (BILOW; RANDICH, 2000). So utilizadas, principalmente, em linhas de trens de alta

    velocidade, trens leves e em pontes e tneis de ferrovias tradicionais.

    Figura 2.2 - Exemplo de Slab Track (Airport Technology, 2011)

  • 19

    Segundo Esveld (2001), as maiores vantagens de vias em placas so a reduo de

    intervenes de manuteno, a reduo do peso da estrutura, aumento da vida de

    servio, a maior resistncia lateral da via e a maior estabilidade da via. Segundo o

    autor, o problema da via permanente com lastro a degradao contnua do lastro

    devido ao trfego. A abraso, quebra dos gros, a deformao vertical da via e a

    colmatao alteram as propriedades da camada, sendo necessria a realizao de

    manutenes frequentes para restabelecer o realinhamento da via.

    As principais desvantagens so os custos de construo, a dificuldade de

    construo da superelevao da via, maior tempo e custo de restauraes caso

    ocorram descarrilamentos.

    Bilow e Randich (2000) relataram que no Japo, os custos mdios para a construo

    de vias em laje das linhas Shinkansen (trem super rpido japons) foram 30% mais

    caros do que vias permanentes convencionais. No entanto, como os custos de

    manuteno correspondem a valores entre 18% e 33% (podendo chegar at 70%)

    dos custos de manuteno de vias permanentes convencionais, estima-se que os

    custos extras de construo sero compensados em um perodo de 8 a 12 anos de

    operao da via.

    2.3. ESFOROS NA ESTRUTURA DA VIA PERMANENTE

    O conjunto de elementos que constituem a via permanente possibilita a transferncia

    das cargas provenientes da passagem dos veculos para a fundao. Cada um dos

    elementos absorve parte das tenses que nele chegam, transmitindo tenses

    menores para a camada seguinte.

    Esveld (2001) fornece a ordem de grandeza das tenses em cada camada para uma

    carga de 200 kN por eixo (Figura 2.3), tpica de trens de passageiros. Entre a roda e

    o trilho ocorrem as maiores tenses, da ordem de 300 MPa. No exemplo dado, para

    a carga de 100 kN por roda, obtm-se tenses entre o trilho e a placa de apoio de

    aproximadamente 3,0 MPa. Na interface placa de apoio e dormente, como a rea de

    contato maior, as tenses sero menores com valores de aproximadamente 1,2

  • 20MPa. Entre os dormentes e o lastro, a tenso cai para 0,3 MPa. E, finalmente, na

    fundao chegam tenses da ordem de 0,05 MPa.

    Figura 2.3 - Ordem de grandeza das tenses mdias em cada camada (Adaptado de ESVELD,

    2001; DUMONT, 2011).

    Para compreender as tenses que atuam na camada do lastro necessrio

    conhecer os esforos que atuam na via permanente e a maneira como ocorre a

    transmisso de tenses de um elemento para outro. Os esforos originados pela

    passagem de veculos podem ser classificados segundo sua direo de atuao:

    longitudinal, vertical e transversal.

    2.3.1. Esforos Longitudinais

    Os esforos longitudinais so causados essencialmente por foras decorrentes da

    variao da temperatura (item 2.1.1), do caminhamento da via, da acelerao e da

    frenagem dos veculos. Caminhamento da via a denominao utilizada para o

    fenmeno no qual o trilho desloca-se longitudinalmente da sua posio inicial ou

    quando o trilho e o dormente afastam-se da sua posio em relao ao lastro

    (ESVELD, 2001). A magnitude desses esforos no influencia o desempenho da via

    a no ser em algumas pontes e obras de arte (ALIAS, 1984).

  • 212.3.2. Esforos Transversais

    As solicitaes transversais so mais difceis de estudar teoricamente do que as

    solicitaes verticais. Os trilhos so submetidos a esforos secundrios de toro

    devido excentricidade de aplicao de carga e existncia de uma folga entre o

    friso das rodas e o trilho (ALIAS,1984). Os esforos transversais resultantes de

    foras aplicadas no sentido longitudinal dos dormentes so, principalmente,

    causados por:

    Foras centrfugas no compensadas geradas pela existncia de uma curva; Ao de ventos laterais; Foras de origem trmica; Contato entre friso e trilho em curvas; e Componentes dinmicos devido a irregularidades da via.

    Apesar de apresentarem menores intensidades que as foras verticais, as foras

    transversais so importantes, pois o lastro menos rgido e menos resistente no

    sentido transversal1 (ALSHAER, 2005). Alm disso, a razo entre os valores dos

    esforos transversal (T) e os esforos verticais (V), detalhado a seguir, um fator importante para a anlise da estabilidade do veculo quanto ao descarrilamento.

    2.3.3. Esforos Verticais

    As cargas verticais impostas via pela passagem de veculos podem ser separadas

    em estticas e dinmicas. As cargas estticas resultam, principalmente, do peso dos

    vages, obtidos pela soma da tara do veculo e do material transportado. As cargas

    dinmicas so causadas tanto por propriedades da via, como a presena de

    irregularidades geomtricas ou variaes de rigidez, quanto pelas caractersticas de

    1Algunsautoresutilizamotermotransversaleoutrosotermolateral.

  • 22rolagem no contato roda/trilho, como a existncia de irregularidades nos trilhos, nas

    rodas e por descontinuidades nas junes de trilhos.

    A carga dinmica pode ser decomposta em duas componentes. A primeira, com

    frequncia elevada (superior 500Hz), causada essencialmente por irregularidades

    nas rodas ou nas soldas e ondulao nos trilhos cuja intensidade aumenta

    continuamente com a velocidade. A outra, com freqncias mais baixas (inferiores a

    100 Hz) condicionada pela geometria e caractersticas mecnicas da via e pouco

    influenciada pela velocidade do trem (ESVELD, 2001).

    Segundo Alias (1984), quando as cargas dinmicas de baixa freqncia localizam-se

    na banda de freqncia de 70 a 90 Hz, elas podem gerar um fenmeno de

    ressonncia da superestrutura que provoca a desagregao do lastro e o

    assentamento da via. Conforme a massa no suspensa aumenta, a banda de

    freqncia de ressonncia se desloca para menores valores.

    Observa-se que as maiores tenses, e consequentemente as maiores deformaes,

    ocorrem quando as cargas estticas somam-se com o mximo das cargas dinmicas

    (SELIG & WATERS, 1994). Como os esforos dinmicos exatos que solicitam a via

    so de difcil previso, eles so considerados em projeto por um fator de incremento

    dinmico que pode chegar a 2,4 vezes a carga esttica (SELIG & WATERS, 1994).

    Eisenmann2 (1970 apud SADEGUI, 2008) props para o clculo do fator de

    incremento dinmico (FID) a utilizao da Equao 2.1 para vias cujas velocidades

    no excedem 60km/h e a Equao 2.2 para vias cuja velocidade encontra-se entre

    60 e 200 km/h. Essas equaes dependem da velocidade da via (V) e de dois

    coeficientes. O primeiro (c) corresponde a um fator referente confiabilidade do

    elemento que se deseja projetar. O trilho, por exemplo, por ser importante para a

    segurana da via e por estar em contado direto com a roda recebe um coeficiente 3

    que maior que o coeficiente do subleito que uma camada onde a tenso chega

    reduzida (Tabela 2.1). O segundo coeficiente (q) depende das condies da via

    (geometria, nivelamento, outros).

    qcFID .1 (2.1)

    140

    601..1 VqcFID (2.2)

    2EISENMANN,J.Stressdistributioninthepermanentewayduetoheavyaxleloadsandhighspeeds.In:ProceedingsoftheAmericanRailwayEngineeringAssociation(AREA),Vol.71,1970,pp.2459.

  • 23

    Tabela 2.1 - Coeficientes para clculo do fator de incremento dinmico (Adaptado de Esveld, 2001) Aplicao c Subleito 1

    Fora lateral, lastro 2 Trilhos, fixaes e suportes 3

    Condio da via q Muito boa 0,1

    Boa 0,2 Ruim 0,3

    Li e Selig (1998b) propuseram para o clculo do fator de incremento dinmico (FID) a utilizao da Equao 2.3, atualmente adotada pelo Manual da AREMA (2009),

    que alm da velocidade (V) considera tambm o dimetro da roda (DR).

    RDVFID .00521,01 (2.3)

    Nas equaes para a determinao do fator de incremento dinmico pode-se inferir

    os fatores que mais influenciam o aumento de tenses devido a solicitaes

    dinmicas. Entre eles encontram-se o nivelamento da via, o tamanho da roda, o

    estado das rodas e dos trilhos, e a velocidade dos veculos.

    2.4. DISTRIBUIO DE ESFOROS

    A Figura 2.4 ilustra de maneira simplificada a transmisso de tenses verticais em

    uma via permanente. As rodas impem uma fora vertical nos trilhos que faz com

    que as sees imediatamente abaixo da roda se desloquem para baixo, tracionando

    a parte inferior do trilho. No entanto, sees do trilho localizadas a certa distncia do

    ponto de aplicao de carga tendem a se deslocar no sentido oposto, tracionando a

    parte superior do trilho. As foras verticais nestas sees podem suspender

    momentaneamente os dormentes, fenmeno conhecido como sub-presso,

    explicado no Captulo 1.

  • 24Bathurst e Kerr (1995) comentam que a determinao das tenses e deformaes

    em todos os componentes da via importante para compreenso do comportamento

    mecnico da via. No entanto, esse problema extremamente complexo, pois

    envolve uma quantidade muito grande de variveis no conhecidas, como a

    variabilidade das propriedades dos meios granulares na extenso da via. Os

    mesmos autores sugerem que a anlise do comportamento mecnico da via

    permanente seja dividida em duas etapas. A primeira parte analisa as tenses nos

    trilhos por meio de uma viga de inrcia constante. E a segunda parte examina a

    resposta da base que suporta o trilho, constituda pelas placas de apoio, dormentes,

    lastro e subleito.

    Figura 2.4 Representao da distribuio de tenses verticais em vias permanentes

    (SELIG;WATERS,1994)

    2.4.1. Anlise de tenses nos trilhos

    Winkler3 (1867 apud KERR, 1977) analisou as tenses em vias permanentes nas

    quais o trilho era estudado como viga continuamente apoiada. Esta hiptese foi feita

    baseando-se no fato de que, neste perodo, muitas ferrovias eram construdas com

    3WINKLER,E.VortrageuberEisenbahnbau.VerlagH.Dominicus.Praga,RepblicaTcheca,1867.Emalemo

  • 25os dormentes posicionados longitudinalmente via. A Figura 2.5 mostra

    esquematicamente este modelo.

    Pelo equilbrio de foras em um elemento infinitesimal de um trilho, mostrado na

    Figura 2.6, e conhecendo-se a relao mostrada pela Equao 2.4, possvel obter

    a equao (2.5) de uma viga continuamente apoiada. Na Figura e nas Equaes, V a fora cortante, M o momento fletor, x o eixo de referncia do trilho, y(x) a deflexo vertical do eixo do trilho em x, q(x) representa a distribuio vertical das cargas das rodas no trilho, p(x) a tenso distribuda transmitida das bases dos trilhos aos dormentes, E o mdulo de elasticidade do trilho e, I o momento de inercia do trilho. Esses dois ltimos componentes, EI, esto relacionados rigidez a flexo de um trilho no plano vertical.

    Figura 2.5 - Viga continuamente apoiada sobre uma base elstica e submetida a cargas verticais

    (adaptado de KERR, 1977;BATHRUST, KERR, 1995)

    Figura 2.6 - Elemento Infinitesimal do Trilho analisado como uma via continuamente apoiada

  • 26

    4

    4

    2

    2

    .dxydIE

    dxMd

    dxdV (2.4)

    )()(. 44

    xqxpdx

    ydIE (2.5)

    A reao da base elstica segundo Winkler (1867 apud KERR, 1977) dada pela

    equao 2.6, onde u um parmetro chamado de mdulo de via que depende da natureza e composio de todos os elementos que as constituem.

    )(.)( xyuxp (2.6)

    Substituindo 2.6 em 2.5, obtm-se 2.7.

    )()(.. 44

    xqxyudxydIE (2.7)

    A soluo mostrada na Equao 2.8, para a Equao diferencial 2.7, foi apresentada

    por SCHWEDLER em 1882 para uma viga infinitamente longa sujeita a uma fora

    vertical concentrada Q (KERR,1977).

    )(cos2

    )( xsenxeu

    Qxy x (2.8)

    Onde:

    44EIu

    Quando as vias passaram a ser construdas com dormentes transversais, a hiptese

    de viga continuamente apoiada passou a ser criticada. Kerr (1977) cita diversos

    trabalhos que propunham novas abordagens para esse problema, como vigas em

    apoios elsticos discretos ou vigas em apoios rgidos discretos. Outros trabalhos

  • 27procuraram comparar os resultados obtidos analiticamente pela equao 2.8 com

    valores medidos experimentalmente. Como os valores obtidos experimentalmente e

    por equaes mais complexas foram bastante semelhantes aos resultados da

    Equao 2.8, a validade desta Equao passou a ser aceita por muitas ferrovias. A

    hiptese de apoio contnuo parecia justificvel j que, com o aumento da carga por

    eixo, os dormentes passaram a serem colocados uns mais prximos aos outros.

    Esse mtodo voltou a ser generalizadamente aceito na metade do sculo XX

    (KERR, 1977) e ainda aceito para anlise de tenses e deflexes dos trilhos,

    inclusive pela AREMA (2009).

    Alm da Equao 2.8, outras solues foram propostas por alguns autores. A Tabela

    2.2 mostra a soluo de Zimmerman4 (1888, apud BASTOS, 1999). Essas equaes

    so muito parecidas. Elas diferem principalmente quanto ao parmetro elstico do

    apoio, sendo que umas utilizam o coeficiente de lastro (C) e outras o mdulo de via (u). O coeficiente de lastro corresponde tenso necessria, na parte inferior do

    dormente, para produzir uma deflexo unitria. A unidade utilizada kN/m/m. J o

    Mdulo de Via relaciona a carga distribuda no trilho com a deflexo da via. Sua

    unidade , portanto, kN/m/m.

    Tabela 2.2 Soluo de Zimmerman (1888, apud BASTOS, 1999) Soluo da Equao 2.7 Novos coeficientes

    )(cos...2

    )(Lxsen

    Lxe

    LCbQxy L

    x

    v

    Onde: 4 4.1EICb

    Lv

    bv: Largura do trilho

    C: Coeficiente de lastro

    Multiplicando os valores encontrados para a tenso no centro de inercia dos

    dormentes p(x), obtida a partir das Equaes 2.6 e 2.8, pelo espaamento entre dormentes (a) encontra-se a fora resultante em cada dormente.

    4ZIMMERMANN,H.Dieberechnungdeseisenbahnoberbaues.VerlagW.Ernst&Sohn,1888(emAlemo).

  • 28A porcentagem das foras resultantes em cada dormente determinada, portanto,

    pela Equao 2.9, na qual a resultante em cada dormente (F) dividida pela carga de cada roda (Q). Observa-se que a porcentagem de fora transmitida no depende da fora aplicada.

    )(cos2.).(. xsenxea

    Qaxyu

    QF x (2.9)

    A Figura 2.7 mostra a porcentagem da carga inicial de uma roda (Q) que transmitida para os dormentes quando o mdulo de via 80 MPa, o trilho UIC54

    (E=2,1*108 kPa, I=2,35*10-5 m4) e o espaamento entre dormentes 0,6m. Por essa

    Figura, assim como pela Equao 2.9, possvel observar que as tenses diminuem

    quanto mais distante um local estiver do ponto de aplicao de carga.

    Figura 2.7 - Distribuio de tenses em dormentes devido carga de uma roda

    2.4.2. Anlise de tenses no contato entre dormente e lastro

    A maneira como as tenses so distribudas no contato entre lastro e dormente

    ainda no inteiramente conhecida. Sabe-se que essa distribuio varia em funo

    do acmulo da tonelagem transportada (DOYLE, 1980). A situao (a) corresponde

    a uma situao ideal na qual a tenso distribuda uniformemente do dormente para

  • 29o lastro, no entanto, esta situao no ocorre por que a prpria flexo do dormente

    causa variao na tenso (TALBOT et al.,1920). Assim que a socaria acabou de ser

    executada, o contato entre trilho e dormente ocorre principalmente na regio abaixo

    do trilho, provocando maiores tenses nessas regies, como mostra a Figura 2.8 (b).

    Observa-se que as tenses prximas ao eixo de simetria do dormente so muito

    inferiores as tenses abaixo do ponto de aplicao de carga.

    Figura 2.8 - Distribuio hipottica de tenses no contato entre dormente e lastro e respectivos

    diagramas de momento resultante nos dormentes (Adaptado de TALBOT et al., 1920)

    A situao (c) da Figura 2.8 ocorre principalmente em vias com dormentes de

    concreto ou de ao cuja manuteno negligenciada (DOYLE, 1980). Na situao

    chamada de center bound, os dormentes no apresentam suporte adequado e

    oscilam de uma lado para outro quando submetidos ao peso dos veculos

    (SOLOMON, 2001).

    Com o tempo, ou seja, com a reacomodao do sistema causada pela passagem

    dos veculos, a distribuio de tenses tende para uma distribuio mais uniforme

    (DOYLE, 1980), como mostrado na Figura 2.8 (d). Isso ocorre devido a vazios que

    se formam entre os dormentes e a superfcie do lastro.

    Alm dessa distribuio de tenses entre dormente e lastro variar com o tempo, ela

    tambm varia em funo do tipo de dormente. Segundo Queiroz (1990), dormentes

    de ao e de madeira concentram mais esforos abaixo na faixa de socaria,

    localizada abaixo dos trilhos, devido a maior flexibilidade destes materiais.

    Dormentes de concreto, por outro lado, distribuem mais uniformemente as tenses

    para o lastro, por causa da maior rigidez e robustez. No entanto, sabe-se que

  • 30dormentes de concreto podem causar cargas dinmicas mais elevadas devido ao

    impacto do material rigido no lastro.

    Para simplificar a anlise da transmisso de carga do dormente para o lastro, supe-

    se que uma distribuio uniforme no comprimento l, como mostra a Figura 2.9, que

    para a maioria dos dormentes aproximadamente um tero do comprimento total do

    dormente (Ld). DOYLE (1980) fornece mais detalhes sobre o clculo de l.

    Figura 2.9 - Tenso suposta entre o dormente e o lastro (Adaptado de ESVELD, 2001)

    A tenso entre dormente e lastro (dL) pode ser calculada pela equao 2.10. Onde Bd a largura do dormente e F2 um fator que depende do tipo de dormente e do estado da via. Esta equao utilizada no Manual da AREMA (2009) para o clculo

    de tenso e rea de influncia dos dormentes.

    223

    .F

    LBQF

    lBQ

    ddddL (2.10)

    No entanto, para a anlise de tenses nos meios granulares costuma-se supor que a

    distribuio de tenses entre lastro e dormente uniforme. Esta hiptese

    necessria, pois as equaes analticas so complexas e as equaes empricas

    foram determinadas considerando a uniformidade da distribuio das tenses no

    contato.

  • 312.4.3. Anlise de Tenses na Interface Lastro e Subleito

    O conhecimento da distribuio de tenses na camada de lastro importante, pois,

    como mencionado anteriormente, uma das principais funes do lastro reduzir as

    tenses impostas pelo carregamento e transmiti-las, em nveis aceitveis, para o

    subleito. Atualmente, para essa anlise de tenses so utilizadas solues

    baseadas em modelos tericos simplificados ou equaes semi-empricas e

    empricas. Outras tcnicas mais avanadas podem ser utilizadas como a da teoria

    de mltiplas camadas ou a de elementos finitos. Essas tcnicas so geralmente

    utilizadas com auxlio computacional, por meio de programas como o Kentrack,

    Geotrack e o Ferrovias, desenvolvidos com esse intuito.

    Apesar do conhecimento de diversas tcnicas, no existe ainda um mtodo

    comumente aceito para a determinao das tenses no lastro (BATHURST;KERR,

    1995). A seguir sero apresentadas as principais teorias utilizadas para avaliar

    essas tenses.

    2.4.3.1. Modelos Tericos

    Os principais modelos tericos utilizados para estimar as tenses atuantes nas

    camadas de lastro, sublastro e subleito, so as Equaes de Boussinesq (1885) e

    Love (1929) cujos mtodos so recomendados pela AREMA (2009). O modelo

    terico de Newmark5 (1935, apud PINTO, 2006), apesar de representar fisicamente

    o problema de diversos dormentes carregados uniformemente, no comumente

    utilizado para estudar transmisso de tenses em lastros, provavelmente devido

    complexidade analtica. Sua soluo baseada na Teoria da Elasticidade, assim

    como a de Boussinesq (1885) e a de LOVE (1929), e considera um carregamento

    uniformemente distribudo em uma rea retangular.

    5NEWMARK,N.M.Simplifiedcomputationofverticalpressuresinelasticfoundations.EngineeringExperimentStationCircularNo.24,UniversityofIllinois,1935.

  • 32A soluo de Boussinesq (1885) determina tenses, deformaes e deslocamentos

    no interior de um semi-espao infinito, composto por um material elstico,

    homogneo e isotrpico, causados por uma carga concentrada na superfcie. As

    tenses verticais so determinadas pela equao 2.11 cujos parmetros podem ser

    observados na Figura 2.10. A carga concentrada dada por Q, z a tenso profundidade z e r a distncia horizontal entre o eixo de aplicao de carga e o ponto estudado.

    25

    22

    1

    1..2.3

    zrz

    Qz (2.11)

    A Equao 2.11 pode ser simplificada quando a tenso avaliada no eixo de

    aplicao de carga, ou seja, quando r equivale a zero. Neste caso, o termo entre parentis equivale unidade e a operao das constantes vale aproximadamente

    0,48. A Equao resultante dada por 2.12.

    Figura 2.10 - Esquema ilustrativo dos parmetros da Equao de Boussinesq (PINTO, 2006)

    2

    *48,0z

    Qz (2.12)

    Verifica-se que a soluo das Equaes 2.11 e 2.12 apresenta problemas para a

    determinao de tenses em camadas muito prximas superfcie, como a camada

    de lastro, pois a tenso inversamente proporcional ao quadrado da profundidade.

    Deste modo, para valores muito pequenos de z, so obtidos valores muito elevados de z.

  • 33A Equao de Love (2.13), apesar de ser recomendada pela AREMA, considera um

    carregamento uniforme em uma rea circular de raio R, sendo geralmente utilizado para o dimensionamento de pavimentos rodovirios.

    23

    2

    1

    11

    zR

    dLz (2.13)

    Newmark (1935, apud VENKATRAMAIAH, 2006), atravs da integrao da equao

    de Boussinesq (1885), desenvolveu uma soluo para o clculo das tenses na

    parte interior de um semiespao infinito, causadas por carregamentos retangulares

    uniformemente distribudos em uma superfcie horizontal. A Figura 2.11 mostra

    esquematicamente o problema abordado por Newmark.

    Figura 2.11 - Esquema ilustrativo do problema de Newmark (Adaptado de NEWMARK, 1935)

    Este mtodo baseia-se na diviso da rea carregada em retngulos com uma aresta

    passando pelo ponto em estudo. A partir do princpio da superposio de efeitos,

    vlido na teoria da elasticidade linear, possvel somar ou subtrair retngulos.

    Para soluo deste problema so definidos parmetros, m e n, que relacionam o comprimento dos lados da rea retangular e a profundidade onde a tenso ser

    estudada. Essas relaes so dadas por m = a/z e n=b/z. A Equao 2.14 foi

  • 34elaborada aps a constatao de que as tenses eram as mesmas para

    configuraes, valores de m e n, iguais.

    22222/122

    222222

    222/122

    1)1(2

    )1)(1()2()1(2

    4 nmnmnmmnarctg

    nmnmnmnmnmmndL

    z (2.14)

    Essa soluo, no entanto, muito trabalhosa. Para simplific-la, desenvolveram-se

    bacos que determinam o valor de uma varivel J a partir da relao entre os parmetros m e n. Essa varivel J equivale a uma porcentagem da tenso inicial. Os mtodos tericos apresentados consideram que a Teoria da Elasticidade vlida

    e que os dormentes esto apoiados em um meio semi-infinito contnuo, a partir dos

    quais, as tenses independem das caractersticas dos materiais devido a

    simplificaes matemticas. Isso fica evidente das Equaes 2.12, 2.13 e 2.14, nas

    quais no necessrio informar nem o mdulo de elasticidade do material, nem o

    coeficiente de Poisson. Nestas equaes a tenso em um ponto depende de

    parmetros geomtricos (distncia horizontal at o ponto de aplicao de carga,

    profundidade) e do carregamento inicial.

    A Teoria da Elasticidade, no entanto, baseia-se em hipteses que nem sempre so

    observadas em ferrovias. Nesta teoria o material homogneo, isotrpico, e

    apresenta comportamento elstico-linear. O lastro, no entanto, composto por

    agregados britados que no so meios nem homogneos, nem contnuos e nem

    elsticos (BATHRUST; KERR, 1995). Alm disso, os materiais de lastro e de subleito

    no so os mesmos na extenso de uma ferrovia. No entanto, solues analticas

    que considerassem essas variabilidades seriam muito complexas, sendo somente

    viveis para programas computacionais baseados em mtodos numricos.

    2.4.3.2. Modelos Empricos e Semiempricos

    Os principais modelos empricos so a Equao de Talbot (1920) e a Equao da

    JNR (Japanese National Railways) desenvolvida em 1965 (BATHRUST; KERR,

    1995). A AREMA (2009) comtempla esses mtodos, juntamente com os dois

  • 35mtodos tericos descritos no item 2.4.3.1 para o projeto de espessura do lastro e

    para adequar as tenses que chegam ao subleito.

    Talbot (1920) conduziu uma srie de ensaios laboratoriais para a determinao de

    tenses na camada de lastro. A Figura 2.12 mostra o arranjo experimental utilizado.

    Nestes ensaios, foram variados a espessura de lastro, a quantidade de dormentes, o

    material de lastro e a posio dos dispositivos de medio de tenso. A Tabela 2.3

    mostra os valores e materiais utilizados por Talbot (1920).

    Os autores mostraram que a distribuio de tenses no lastro no depende do

    material utilizado, corroborando um comportamento previsto pela Teoria da

    Elasticidade. A utilizao de rochas britadas gerou resultados com maiores

    disperses. No entanto, isso foi associado s dimenses da rocha em relao aos

    dispositivos de medio.

    Figura 2.12 - Arranjo experimental utilizado por Talbot (1920)

  • 36

    Tabela 2.3 - Valores das variveis utilizadas por Talbot (1920)

    Parmetros Espessuras de camada / Materiais

    utilizados no lastro

    Espessura de lastro (h)

    6 (15,2 cm)

    9 (22,9 cm)

    12 (30,5 cm)

    18 (45,7 cm)

    25 (63,5 cm)

    Quantidade de Dormentes 1 e 3

    Material de lastro

    Areia

    Rochas britadas

    Seixo

    Quando os ensaios foram realizados com apenas um dormente, eles observaram

    que as tenses, obtidas no contato entre lastro e subleito (Ls), no eixo de simetria do dormente, podiam ser aproximadas pela Equao 2.156, j convertida para h em

    centmetros e tenso em kPa. Os autores ressaltam que os testes, que

    determinaram essa equao, foram feitos com a bitola padro (1,435 m), para um

    dormente de 8 ps de comprimento (2,44 m) e so vlidos apenas para espessuras

    de lastro superiores a 4 polegadas (0,1 m) e inferiores a 30 polegadas (0,76 m).

    dLLs h 25,187,53 (2.15)

    Quando os autores compararam os resultados obtidos dos ensaios com um

    dormente com os resultados dos ensaios com 3 dormentes carregados, eles

    concluram que a soma dos efeitos de dormentes individuais era razoavelmente

    prxima do efeito combinado de dormentes carregados, o que os levou a concluir

    que a hiptese de superposio de efeitos poderia ser utilizada.

    Para considerar o efeito de outros dormentes, alm do carregado, Talbot (1920)

    igualaram, no eixo de simetria do dormente, a equao de distribuio de tenso em 6AautoraconverteuasunidadesparaqueaespessuradolastrosejautilizadaemcentmetroseapressoemkPa.Talbotetal.(1920)utilizamaespessuraempolegadaseapressoempsi.

  • 37um plano horizontal devido a uma carga uniformemente distribuda (mostrada no

    termo esquerdo da Equao 2.16) equao experimental dada por 2.15.

    dLx

    xKdL

    d

    heKB 25,10

    87,5322

    (2.16)

    A partir da Equao 2.16 determina-se o valor da constante K.

    25,187,53hB

    Kd

    Substituindo-a na expresso de distribuio de tenses em um plano horizontal

    (termo esquerdo de 2.16), obtm-se a expresso terica 2.177 que determina a

    tenso que um dormente provoca em um ponto qualquer. Nesta equao, x a distncia entre o ponto estudado e a linha de simetria do dormente carregado.

    25,22

    287,53

    25,1

    87,53 xhBdLLs

    deh

    (2.17)

    Usualmente na bibliografia, quando se fala da equao de Talbot, refere-se

    Equao 2.15 que corresponde a apenas um dormente carregado. No entanto, como

    visto anteriormente, quando a roda encontra-se no eixo de simetria de um dormente,

    os dormentes adjacentes a este tambm sero solicitados. Ou seja, a utilizao da

    Equao 2.15, unicamente, sem a considerao das tenses nos demais dormentes

    pela Equao 2.17, pode subestimar os reais valores de tenses nas camadas

    granulares. A profundidade, na qual as tenses dos dormentes adjacentes comeam

    a influenciar as tenses no eixo de simetria, ser discutida em maior detalhe no

    Captulo 4.

    7AautoradesenvolveuaequaodamesmamaneiraqueTalbotetal.(1920)comaexceodavarivelquecaracterizao comprimentododormente (Bd),que foimantida literal,enquantoqueno trabalhooriginal foisubstitudapelocomprimentoutilizadologonoiniciodadeduo.

  • 38A Equao 2.18 foi determinada experimentalmente pela JNR (Japanese National

    Railways). A configurao de ensaio considerava uma tenso distribuda

    uniformemente entre lastro e dormente, e utilizava bitola mtrica (BATHRUST;

    KERR, 1995). Nesta equao, z a profundidade, expressa em metros, em um dado ponto no lastro.

    dLLs z 35,1)100(10

    50 (2.18)

    2.5. ESFOROS NA CAMADA DE LASTRO

    A dificuldade para determinar as tenses que atuam nas camadas granulares pode

    ser observada pela complexidade analtica mostrada nos itens anteriores. Alm do

    contato entre dormente e lastro alterar com o tempo, a maneira como ocorre a

    transmisso de tenses entre essas camadas no completamente compreendida.

    No entanto, as caractersticas do carregamento so extremamente importantes para

    avaliar o desempenho mecnico da camada, principalmente quanto s taxas de

    degradao e de recalque do material da via.

    Alguns autores, por meio de estudos em campo ou em vias em escala real,

    obtiveram dados relativos s tenses que atuam na camada de lastro. Indraratna et

    al. (2010) monitoraram um trecho de 60 metros de uma ferrovia em Bulli na

    Austrlia, na qual o material de lastro era composto por gros britados de basaltos

    com dimetros entre 75 e 19 mm. Nesta via, cuja espessura mdia de lastro era de

    300 mm e a do reforo de subleito era de 150 mm, para trens com 25t de carga por

    eixo, os autores obtiveram tenses entre os dormentes e o lastro de

    aproximadamente 370kPa e, entre o lastro e o reforo, as tenses reduziam para

    120 kPa.

    Quanto presso de confinamento, diversos autores relatam estimativas baseadas

    no conhecimento emprico e em ensaios do tipo box test, os quais apresentam

    condies de contorno diferentes de uma via real. Na via, o lastro no

    normalmente confinado lateralmente, enquanto nestes ensaios o material

  • 39confinado por uma estrutura mais rgida. Raymond e Davies8 (1978, apud Indraratna;

    Salim, 2005) indicaram que essas tenses dificilmente sero superiores a 140 kPa.

    Selig e Alva-Hurtado9 (1982, apud AURSUDKIJ, MCDOWELL,COLLOP, 2009)

    verificaram que a presso de confinamento de lastros na direo perpendicular ao

    trilho varia de 5 a 40 kPa por meio de estimativas de coeficientes geotcnicos.

    Tambm por meio de alternativas tericas, Porto (1984) estimou o confinamento na

    interface lastro subleito como sendo da ordem de 6kPa. Selig e Waters (1994)

    verificaram por meio de box tests que a presso de confinamento variava entre 18 e

    60 kPa. Nos ciclos iniciais do ensaio, a presso de confinamento variava em at 7

    kPa, entre o instante em que o dormente encontrava-se carregado e o instante

    seguinte quando o carregamento havia sido removido, como mostra a Figura 2.13.

    Figura 2.13 - Tenses horizontais obtidas por Selig e Waters (1994) em ensaios box-test

    A maneira como estas tenses alteram o comportamento e o desempenho da via

    ser abordada no Capitulo 3. O comportamento do material granular depende muito

    destas tenses, mas, ao mesmo tempo, elas so muito difceis de serem

    determinadas no campo. 8RAYMOND,G.D.,DAVIES,J.R.,Triaxialtestsondolomiterailroadballast.JournaloftheEngineeringDivision,Asce,104,pp.735751.9SELIG,E.T.,ALVAHURTADO,J.E.:Predictingeffectsofrepeatedwheelloadingontracksettlement.In:Proceedingsofthe2ndInternationalHeavyHaulConference,ColoradoSprings,1982,pp.476487.