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Características da Combustão de Biomassa Torrada num Reator de Queda Livre Francisco Fernández dos Santos Portela Costa Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia Mecânica Orientador: Professor Doutor Mário Manuel Gonçalves da Costa Júri Presidente: Professor Doutor Viriato Sérgio de Almeida Semião Orientador: Professor Doutor Mário Manuel Gonçalves da Costa Vogal: Professor Doutor Edgar Caetano Fernandes Maio de 2014

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Características da Combustão de Biomassa Torrada num Reator de Queda Livre

Francisco Fernández dos Santos Portela Costa

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

Engenharia Mecânica

Orientador: Professor Doutor Mário Manuel Gonçalves da Costa

Júri

Presidente: Professor Doutor Viriato Sérgio de Almeida Semião Orientador: Professor Doutor Mário Manuel Gonçalves da Costa

Vogal: Professor Doutor Edgar Caetano Fernandes

Maio de 2014

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Agradecimentos

Em primeiro lugar gostaria de agradecer ao meu orientador, Professor Doutor Mário Manuel

Gonçalves da Costa, por todo o apoio e amizade prestadas ao longo da elaboração da minha

tese de mestrado.

Agradeço ao Doutor Gongliang Wang por toda a ajuda e aconselhamento prestados no

desenvolvimento do trabalho.

Agradeço ao Manuel Pratas por todo o apoio na montagem da instalação, e auxílio prestados

durante todo o trabalho experimental desenvolvido nesta tese.

Agradeço ao Tiago Carvalho pela sua disponibilidade ao longo de todos os ensaios,

nomeadamente na ajuda a nível laboratorial, e por todas as ajudas e discussões sobre a tese.

Agradeço ao Jorge Coelho pelo tratamento das imagens da minha tese de mestrado.

Agradeço também a todos os meus colegas de laboratório, nomeadamente ao Bruno

Bernardes, ao António Silva, à Mafalda Henriques, ao Ulisses Fernandes, ao João Pina e à

Isabel Ferreiro por toda ajuda durante o desenvolvimento do presente trabalho.

Agradeço à minha família, em especial à minha Mãe, ao meu Pai e ao meu Avô por toda a

ajuda e todo o apoio durante todas as fases da minha vida.

Por fim, mas não com menos importância, agradeço à Joana, por todo o encorajamento, não

só durante a realização do trabalho, como no meu percurso de vida.

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Artigos com Origem no Presente Trabalho

Congressos internacionais/Revistas internacionais

Costa, F.F., Gongliang Wang, Costa, M., Combustion Kinetics and Particle Fragmentation of

Raw and Torrified Biomass in a Drop Tube Furnace, Aceite para apresentação oral no 35th

International Symposium on Combustion, San Francisco, California, U.S.A., 3-8 Agosto 2014.

Em processo de revisão para publicação nos Proceedings of the Combustion Institute.

Congressos nacionais:

Costa, F.F., Gongliang Wang, Costa, M., Avaliação do processo de combustão de biomassa

torrada num reator de queda livre. Actas do VII Encontro Nacional do Colégio de Engenharia

Mecânica, A Indústria e a Engenharia Portuguesa – Desafios e Perspetivas, Lisboa, 14-15 de

Março de 2014.

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Resumo

A torrefação é um processo que consiste em expor a biomassa a uma atmosfera inerte a

temperaturas entre 260 °C e 300 °C. Nestas condiçõe s, a hemicelulose é degradada e a

humidade e alguns compostos de baixo poder calorífico são removidos da biomassa original.

Deste processo resulta um material com características entre a biomassa e o carvão. O

presente estudo avalia o processo de combustão de biomassa torrada num reator de queda

livre (RQL). Foram estudados dois tipos de biomassa, nomeadamente casca de pinheiro e

bagaço de azeitona, as quais foram torradas num ambiente inerte de azoto a temperaturas

entre 280 °C e 300 °C. As biomassas originais e tor radas foram posteriormente queimadas no

RQL. Os resultados obtidos incluem temperaturas e valores de burnout medidos ao longo do

RQL para cinco temperaturas impostas às paredes do reator (900, 950, 1000, 1050 e 1100 ºC).

Foram ainda medidas as concentrações e distribuição das dimensões das partículas

resultantes do processo de combustão para uma condição de operação do RQL em duas

posições distintas, sensivelmente a meio do RQL e à sua saída. Os resultados mostraram que

1) o poder calorífico superior da biomassa torrada é superior ao da biomassa original,

aumentando em cerca de 25% para a casca de pinheiro e em cerca de 18% para o bagaço de

azeitona; 2) contrariamente ao observado para o bagaço de azeitona torrado, a casca de

pinheiro torrada necessita de tempos de residência no RQL semelhantes para atingir valores

de burnout próximos da casca de pinheiro não torrada; 3) os parâmetros cinéticos para ambos

as biomassas, original e torrada, mostram que a torrefação reduz a energia de ativação do

resido carbonoso; e 4) a torrefação não aumenta a fragmentação de partículas, mesmo para

biomassas que apresentem elevada tendência para esse fenómeno.

Palavras-chave

Reator de queda livre; biomassa; biomassa torrada; cinética da combustão; fragmentação de

partículas.

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Abstract

Torrefaction is a process that consists on exposing biomass to an inert atmosphere in

temperatures between 260 °C and 300 °C. In such conditions, the moisture content of the

biomass strongly decreases and the hemicellulose content reduces, leading to a release of

some low calorific value volatiles. This process allows obtaining a product, whose properties

stands between biomass and coal. This study focuses on the combustion kinetics and particle

fragmentation of raw and torrified biomass in a drop tube furnace (DTF). Two biomass fuels

were studied, namely pine shells and olive stones. Both biomass fuels have been torrified in a

nitrogen inert atmosphere at 280-300 ºC. Both the raw and torrified biomass fuels were then

burned in the DTF. The data reported includes gas temperatures and particle burnout measured

along the DTF for five furnace temperatures (900, 950, 1000, 1050 and 1100 ºC). In addition,

measurements of particulate matter (PM) concentrations and size distributions were made for

the two biomass fuels at 1100 ºC in the middle and near the exit of the DTF. The results showed

that 1) the high heating value of the torrified biomass fuels are higher than those of the raw

biomass fuels; specifically, for pine shells it increased by 25% and for olive stones by 18%; 2) in

contrast with the torrified olive stones, the torrified pine shells require similar residence times to

attain overall burnout values comparable to those of the untreated material; 3) the kinetic data

for both fuels, raw and torrified, indicates that the torrefaction reduces the activation energy of

the present biomass chars; and 4) torrefaction does not promote particle fragmentation even for

biomass fuels that present high tendency for it.

Keywords

Drop tube furnace; raw biomass; torrified biomass; combustion kinetics; particle fragmentation.

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Índice de Conteúdos

1. Introdução ............................................................................................................................... 1

1.1 Âmbito e enquadramento ............................................................................................... 1

1.2 Composição estrutural da biomassa ............................................................................ 3

1.3 Fundamentos da combustão da biomassa .................................................................. 4

1.4 Torrefação de biomassa ................................................................................................. 7

1.5 Fragmentação de partículas ........................................................................................ 10

1.6 Estudos anteriores ......................................................................................................... 11

1.7 Objetivos ......................................................................................................................... 15

2. Instalação experimental ...................................................................................................... 17

2.1 Descrição do torrador de biomassa ............................................................................ 17

2.2 Descrição do reator de queda livre ............................................................................. 18

2.3 Métodos e incertezas experimentais .......................................................................... 21

2.3.1 Medição de temperaturas ...................................................................................... 21

2.3.2 Captura e cálculo do burnout da partícula .......................................................... 21

2.3.3 Concentração e distribuição de tamanhos de partículas ................................. 22

3. Resultados e discussão ...................................................................................................... 25

3.1 Condições dos testes .................................................................................................... 25

3.2 Biomassa original vs biomassa torrada ...................................................................... 25

3.3 Perfis de temperatura e burnout da partícula ............................................................ 27

3.4 Parâmetros cinéticos ..................................................................................................... 29

3.5 Fragmentação de partículas ........................................................................................ 33

4. Fecho ..................................................................................................................................... 35

4.1 Conclusões ..................................................................................................................... 35

4.2 Trabalhos futuros ........................................................................................................... 35

5. Referências ........................................................................................................................... 37

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Índice de Figuras

Figura 1 – Balanço do carbono resultante da queima de biomassa (MADRP, 2005). a)

Fixação de CO2 pela biomassa. b) Libertação de O2 devido à fotossíntese. c)

Extração de carbono fixo presente na biomassa. d) Libertação de CO2 durante a

combustão 2

Figura 2 – Balanço mássico (M = uma unidade de massa) e energético (E = uma unidade de energia)

à torrefação, 8

Figura 3 – Biomassa antes e após a torrefação 9

Figura 4 – Torrefação integrada numa cadeia de valorização de biomassa 10

Figura 5 – Esquema da instalação usada para a torrefação da biomassa. 17

Figura 6 – Fotografia da instalação usada para a torrefação de biomassa 18

Figura 7 – Esquema do RQL 19

Figura 8 – Fotografia do RQL e do equipamento auxiliar 20

Figura 9 – Sonda de termopar usada para medir a temperatura no interior do RQL 21

Figura 10 – Diagrama de van Krevelen 26

Figura 11 – Perfis de temperatura ao longo do eixo do RQL. a) Casca de pinheiro, b) casca

de pinheiro torrada, c) bagaço de azeitona, d) bagaço de azeitona torrado 27

Figura 12 – Perfis de burnout da partícula ao longo do RQL. a) Casca de pinheiro, b) casca

de pinheiro torrada, c) bagaço de azeitona, d) bagaço de azeitona torrado 28

Figura 13 – Regressão linear para avaliação dos parâmetros cinéticos dos combustíveis. a)

300 < x < 500 mm, b) 500 < x < 700 mm, c) 700 < x < 900 mm, d) 900 < x < 1100

mm 31

Figura 14 – Concentração de partículas em x = 500 mm e x = 1100 mm para a temperatura

do RQL de 1100 °C a) Casca de pinheiro, b) casca de pinheiro torrada, c)

bagaço de azeitona, d) bagaço de azeitona torrado 33

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Índice de Tabelas

Tabela 1 – Combustíveis utilizados nas principais regiões do mundo (106 bep) [1] 1

Tabela 2 – Propriedades da biomassa original, torrada, e do carvão 23

Tabela 3 – Parâmetros cinéticos das biomassas estudadas 32

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Nomenclatura

Abreviaturas

IEA International Energy Agency

MADRP Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Regional e das Pescas

VM Matéria Volátil

VOC Volatile Organic Compounds

TGA Thermogravimetric Analysis

RQL Reator de Queda Livre

PID Proportional-Integral-Derivative Controller

CEN Comité Européen de Normalisation

ASTM American Standard for Testing Methods

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Lista de símbolos

Caracteres romanos

A Área da partícula [m2]

Ac Fator pré-exponencial para a combustão do resíduo carbonoso [s-1]

Av Fator pré-exponencial para a desvolatilização [s-1]

D Diâmetro do reator ou diâmetro da ponta do termopar [m]

Ec Energia de ativação para a combustão do resíduo carbonoso [kJ/mol]

Ev Energia de ativação para a desvolatilização [kJ/mol]

Nu Número de Nusselt [-]

k Condutividade térmica do ar [W/m.K] ��� Pressão parcial de oxidante [Pa]

R Constante universal dos gases perfeitos [J/mol.K]

R2 Coeficiente de correlação [-]

T Temperatura da partícula [K]

Tt Temperatura do termopar [K]

Tgas Temperatura do gás [K]

Tw Temperatura da parede [K]

wt% Percentagem mássica [%]

x Distância axial desde o ponto de injeção [m] ���� Perda mássica de resíduo carbonoso com o tempo [Kg/s]

���� Perda mássica de matéria volátil com o tempo [Kg/s]

Caracteres gregos

Ψ Burnout da partícula [%]

ωf Fração mássica de cinzas, em base seca, na biomassa inicial [-]

ωx Fração mássica de cinzas, em base seca, na amostra [-]

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1. Introdução

1.1 Âmbito e enquadramento

A biomassa constitui uma fonte renovável de enorme importância para a produção de energia,

sendo largamente utilizada e incentivada por países em desenvolvimento e desenvolvidos. De

facto, e de acordo com as estatísticas da International Energy Agency [1] (IEA) apresentadas

na tabela 1, a biomassa representa cerca de 8% das necessidades de energia primária a nível

mundial.

Região Petróleo Gás

Natural Carvão Biomassa Total

América

Latina 3.556,50 1.242,06 315,66 764,33 5.878,55

África 2.869,65 917,28 990,78 726,98 5.504,69

Ásia e

Austrália 2.707,67 2.013,98 9.494,88 1.557,80 15.774,33

Médio

Oriente 7.880,85 1.670,99 4,32 7,93 9.564,09

América

do Norte 3.480,33 4.734,11 4.212,42 599,12 13.025,98

Antiga

União

Soviética

3.697,29 4.689,44 1.516,68 312,85 10.216,26

Europa 2.197,07 1.950,57 1.610,58 255,46 6.013,68

Total 26.389,36 17.218,43 18.145,32 4.224,47 55.761,32

Tabela 1 – Combustíveis utilizados nas principais regiões do mundo (106 bep) 1 bep = 6,383 GJ, 2012 [1].

De acordo com a tabela 1, é possível observar que, nos países em desenvolvimento, o uso da

biomassa é mais predominante, enquanto nos países desenvolvidos a sua utilização é menor,

quando comparada com o consumo de combustíveis fósseis. Por outro lado, e devido à maior

preocupação ambiental derivada da queima de combustíveis fósseis, a biomassa tem

despertado um maior interesse nos países desenvolvidos, sendo expectável o seu crescimento

acentuado nos próximos anos.

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A biomassa é considerada um combustível de excecional potencial energético não só devido à

sua disponibilidade como à sua segurança de abastecimento, permitindo ainda uma redução

da emissão de gases com efeito de estufa, como o CO2.

A figura 1 esquematiza o balanço do carbono resultante da queima de biomassa. É possível

observar que a biomassa tem um balanço neutro de carbono. Durante a vida celular, a

biomassa fixa carbono através de processos de fotossíntese, sendo este posteriormente

libertado durante a combustão. Deste modo, não há aumento da concentração de gases com

efeito de estufa, como o CO2, devido à queima de biomassa. Este aspeto é importante realçar,

pois demonstra uma importante vantagem da biomassa face aos combustíveis fósseis.

Figura 1 – Balanço do carbono resultante da queima de biomassa (MADRP, 2005) [2]. a) Fixação de CO2

pela biomassa, b) libertação de O2 devido à fotossíntese, c) extração de carbono fixo presente na

biomassa, d) libertação de CO2 durante a combustão.

É ainda de referir outras vantagens do uso da biomassa como combustível, como, por

exemplo, o seu relativo baixo custo, que permite competir fortemente com os combustíveis

fósseis, a sua grande diversidade, que possibilita uma maior adaptação a diferentes sistemas

de combustão e, ainda, a possibilidade de se integrar parcialmente na queima com o carvão

(co-combustão).

No entanto, numa sociedade focada nos efeitos negativos da queima de combustíveis fósseis,

é necessário um conhecimento mais aprofundado e um melhoramento contínuo da biomassa

de modo a torná-la mais interessante do ponto de vista energético, aproximando-a das

características presentes no carvão. Assim, é necessário ultrapassar algumas das

desvantagens inerentes à biomassa, nomeadamente:

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3

1. Baixo poder calorífico (10-17 MJ/kg);

2. Elevado teor de humidade (até ~50%);

3. Comportamento higroscópico;

4. Pouco uniforme (com elevada diferença de tamanhos e formas);

5. Difícil e dispendioso processo de estilhaçamento, corte e pulverização;

6. Quantidade significativa de matéria inorgânica (Ca, Si e K);

7. Graves problemas relacionados com as cinzas (fusão, aglomeração);

8. Elevada emissão de nanopartículas.

Por forma a ultrapassar este conjunto de desvantagens inerentes à biomassa têm sido

publicados muitos estudos, sugerindo um vasto conjunto de técnicas e pré-tratamentos de

conversão físicas, térmicas, químicas, e biológicas da biomassa [3]. Entre estes métodos, a

conversão térmica tem sido o que mais atenção tem despertado entre a comunidade científica.

1.2 Composição estrutural da biomassa

Como é do conhecimento geral a biomassa, de origem lignocelulósica, pode ser dividida em

três constituintes estruturais, a celulose, a hemicelulose e a lignina. A celulose é constituída por

estruturas macromoleculares compostas por cadeias semi-cristalinas associadas com outras

moléculas delimitadas por átomos de hidrogénio. A hemicelulose é caracterizada por polímeros

lineares, normalmente substituídas por outras cadeias de açúcares para prevenir a formação

de outras estruturas cristalinas. A lignina é constituída por um polímero fenólico,

maioritariamente constituinte das paredes celulares, que concede resistência mecânica e

resistência a ataques enzimáticos.

Em geral, a decomposição térmica da hemicelulose ocorre a temperaturas entre 150 °C e

350 °C, enquanto para a celulose ocorre para temperaturas entre 300 °C e 350 °C. No caso da

lignina a sua decomposição dá-se a temperaturas superiores que podem chegar a 500 °C [4,5].

Sheng e Azevedo [6] desenvolveram correlações para o cálculo dos três constituintes

estruturais da biomassa, com base na sua análise elementar e imediata:

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4

��� = −1019,07 + 293,810(�/�) − 187,639(�/�)� + 65,1426(!/�) − 19,3025(!/�)� +21,7448("#) − 0,132123("#)�(1) %&'(&() = 612,099 + 195,366(�/�) − 156,535(�/�)� + 511,357(!/�) − 177,025(!/�)� −24,3224("#) + 0,145306("#)� (2)

A hemicelulose é calculada por diferença [6].

Esta correlação foi desenvolvida para um elevado número de amostras de biomassa com

rácios molares de O/C entre 0,56 e 0,83, H/C entre 1,26 e 1,69 e VM entre 73% e 86%, todos

os valores em base seca , sem cinzas. O coeficiente de correlação obtido pelos autores foi de

0,90 para a celulose e 0,81 para a lignina.

1.3 Fundamentos da combustão da biomassa

A combustão da biomassa é constituída pelas seguintes fases: aquecimento, secagem,

desvolatilização, combustão dos voláteis e combustão do resíduo carbonoso. Este processo

pode ser esquematizado da seguinte forma [7]:

*&�+) )ℎú+&.) → )0�1&+(2�/ 1)'+ → 3&�+) ) 1)

*&�+) ) → 4�)2& ()1)25õ ') ) + 5 &.��1)53�(� �

"�)2& + )5 → �� + ���(+!�,+7�&'+,+á1&.� &(�5'â(&1� ) : &.��1)53�(� � + )5 → �� +��� + 1&(;)

A biomassa é composta essencialmente por três frações, a humidade, a matéria volátil e o

resíduo carbonoso. Durante a combustão da biomassa ocorre primeiro a libertação da

humidade, posteriormente a libertação e oxidação da matéria volátil e, seguidamente, a

combustão do resíduo carbonoso, resultando por fim as cinzas. Nalgumas circunstâncias a

desvolatilização e combustão do resíduo carbonoso podem ocorrer (parcialmente) em

simultâneo.

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5

Seguidamente é apresentada, em mais detalhe, cada um dos processos característicos da

combustão da biomassa.

Secagem da partícula e aquecimento

A transferência de calor e massa controlam estes dois processos endotérmicos, tornando a

temperatura e o tamanho da partícula variáveis muito importantes. A energia necessária para

este processo é função da humidade presente na partícula, da sua dimensão e das suas

propriedades como a difusidade mássica, condutibilidade térmica e calor específico. O

processo de secagem caracteriza-se pela passagem da humidade à fase gasosa, movendo-se

pelos poros da partícula até à sua superfície.

É importante realçar que a humidade pode ser significativamente importante no processo de

combustão da biomassa já que alguns tipos de biomassa podem conter até 50% de humidade;

mesmo em ambiente seco este valor pode atingir valores na ordem de 15% a 20% de

humidade [7], contrastando com os teores de humidade observados no carvão.

Desvolatilização

A desvolatilização ocorre nas primeiras fases de combustão da biomassa, e desempenha um

papel muito importante devido ao elevado teor de voláteis característicos da biomassa.

Tipicamente, a desvolatilização inicia-se entre 160 °C e 250 °C para a biomassa enquanto para

o carvão betuminoso apenas se inicia em torno de 350 °C [8-12]. A quantidade e o tipo de

produtos resultantes da pirólise dependem não só da temperatura final como da taxa de

aquecimento da partícula, sendo também influenciada pelo tamanho da partícula. Um

aquecimento rápido associado a uma temperatura elevada origina a libertação de uma maior

quantidade de voláteis. As temperaturas elevadas favorecem a produção de gases em

detrimento dos voláteis orgânicos e alcatrões. Assim, durante a combustão da biomassa, os

voláteis que são libertados durante o aquecimento da partícula quebram-se formando CO, CO2,

H2O, assim como CH4, VOC, H2 e alguns vestígios de produtos inorgânicos [13-15].

É de notar que a matéria volátil na biomassa contem cerca de 70% do calor libertado na

combustão, enquanto no carvão a matéria volátil apenas representa tipicamente 36% do seu

poder calorifico. Assim, a combustão da matéria volátil domina a combustão da biomassa,

sendo a combustão do resíduo carbono de menor importância em termos de eficiência

energética quando comparado com o carvão. No entanto o resíduo carbonoso da biomassa

pode conter cerca de um terço do seu poder calorifico o que torna importante o conhecimento

dos hidrocarbonetos não queimados aglomerados nas cinzas [7].

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6

Combustão do resíduo carbonoso

A combustão do resíduo carbonoso representa aproximadamente 10% a 30% da massa total

da biomassa. No entanto, enquanto para o carvão os fenómenos de combustão do resíduo

carbonoso já se encontram relativamente bem estudados [16-19], só uma quantidade limitada

de informação está publicada sobre a reatividade e as taxas de combustão do resíduo

carbonoso da biomassa. É geralmente aceite que o resíduo carbonoso da biomassa é mais

reativo que o do carvão devido à sua estrutura desordenada. Este facto é de tal maneira

importante nas primeiras fases de combustão do resíduo carbonoso que este queima

praticamente sobre controlo da difusão em chamas de alta temperatura [20,21]. Relativamente

a este ponto é ainda importante reforçar que, ao contrário das partículas de carvão, que

durante a combustão tendem a assumir uma forma esférica, muitas partículas de biomassa

retêm a sua forma irregular o que dificulta o seu estudo relativamente ao carvão. Este facto

parece depender na quantidade de celulose e de potássio presentes na biomassa [22].

Os processos descritos acima podem ser claramente identificados quando a taxa de

aquecimento é baixa, até 30 °C/min. Quando as taxas de aquecimento são muito elevadas e

próximas das situações reais de combustão, da ordem de 105 °C/min, a desvolatilização e a

combustão do resíduo carbonoso ocorrem simultaneamente. Por outro lado, e devido a este

desvio entre as condições reais e as condições laboratoriais, como, por exemplo, na análise

termogravimétrica (TGA), a quantidade de matéria volátil efetiva é superior à revelada pela

análise imediata, como sugerido anteriormente.

Cinética química da combustão de biomassa lignocelulósica

De acordo com Di Blasi [23], e como descrito anteriormente, a oxidação da biomassa

lignocelulósica está associada a duas principais reações distintas, a desvolatilização e a

combustão do resíduo carbonoso.

No que diz respeito à desvolatilização, os modelos matemáticos aplicados são

maioritariamente de primeira ordem, descrevendo a libertação de voláteis. Esta reação pode

ainda ser desdobrada em duas reações distintas de primeira ordem. Uma primeira reação

ligada à degradação da hemicelulose e outra relacionada com a degradação da celulose. A

cada um destes processos está associada uma determinada energia de ativação, característica

de cada processo.

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7

Por seu lado, a combustão do resíduo carbonoso está relacionada com a composição de

lignina presente num determinado tipo de biomassa. A este processo de degradação está

associado também uma energia de ativação, característica de cada tipo de biomassa.

Naturalmente que cada reação descrita anteriormente pode ser dividida em reações

elementares, cada uma caracterizada por uma energia de ativação distinta.

Devido à forte variabilidade da biomassa, existe uma grande diferença em termos de

combustão e, consequentemente, a nível cinético entre diferentes biomassas. Este facto deve-

se maioritariamente não só às diferenças estruturais dos constituintes da biomassa, mas

também aos teores de metais presentes nas cinzas [23].

Em termos globais a energia de ativação relativa à desvolatilização toma valores tipicamente

entre 20 kJ/mol e 100 kJ/mol, enquanto para a combustão do resíduo carbonoso os valores

estão compreendidos entre 70 kJ/mol e 260 kJ/mol.

1.4 Torrefação de biomassa

A torrefação é um pré-tratamento realizado à biomassa, à pressão atmosférica, que permite

melhorar significativamente as suas propriedades. Este pré-tratamento consiste em expor a

biomassa num ambiente inerte, usualmente azoto devido a razões económicas, a uma

temperatura constante entre 250 °C e 300 °C durante um período entre 30 minutos a 2 horas.

Este processo permite reduzir o teor de hemicelulose da biomassa libertando alguns

compostos de baixo poder calorífico, como o O2, CO, CO2 e alguns ácidos orgânicos, assim

como libertar, quase na totalidade, a quantidade de humidade presente na biomassa. Como é

possível observar na figura 2, após a torrefação a perda mássica do produto é da ordem de

30% enquanto apenas 10% do conteúdo energético se liberta. Deste modo consegue-se

densificar energeticamente a biomassa.

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8

Figura 2 – Balanço mássico (M = uma unidade de massa) e energético (E = uma unidade de energia) à

torrefação,

Para além da densificação energética da biomassa, este processo transforma quimicamente a

biomassa, trazendo outras importantes vantagens. Através da torrefação, a biomassa adquire

uma estrutura frágil o que facilita e diminui a energia necessária para processos de corte,

estilhaçamento e pulverização. Este aspeto é determinante no que diz respeito a biomassas

como a palha que são combustíveis que colocam grandes dificuldades à sua moagem. Outra

vantagem deste processo consiste na natureza hidrofóbica da biomassa torrada, a qual

apresenta um comportamento químico que repele a humidade. Deste modo, a biomassa

torrada apresenta um menor custo de armazenamento já que pode ser colocada num ambiente

húmido sem que isso prejudique posteriormente o processo de combustão. Por outro lado, e

graças à densificação energética, o custo de transporte também diminui. A biomassa torrada

tem ainda razões de H/C e O/C inferiores à biomassa original, o que a aproxima

significativamente do carvão [24-30].

Estudos com foco nos benefícios da torrefação como pré-tratamento da biomassa relatam que,

no que diz respeito à energia de estilhaçamento, corte e pulverização, a biomassa torrada

necessita de um consumo energético 50-85% inferior ao da biomassa original [31,32]. Quanto

ao aumento de poder calorífico, Deng et al. [33] torraram palha de arroz e pedúnculos de colza

para avaliar o potencial da biomassa torrada na co-gasificação, relatando um aumento de

poder calorifico na ordem de 16%. Arias et al. [34] demonstraram ainda que, devido ao

processo de torrefação, a biomassa ganha propriedades hidrofóbicas, diminuindo

significativamente os custos de armazenamento e melhorando a eficiência da combustão da

biomassa.

A figura 3 mostra o aspeto da biomassa antes e após a torrefação.

BIOMASSA

1M 0.7M

0.3M 0.1E

250 - 300 ºC

0.9E1E

GASES

Celulose Celulose

Lignina Lignina

Hemicelulose Hemicelulose

1.3 E/M

BIOMASSA TORRADA

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9

Figura 3 – Biomassa antes e após a torrefação.

A literatura revela que a torrefação tem um potencial elevado para o melhoramento das

propriedades da biomassa. No entanto, apesar dos impressionantes estudos descritos na

literatura, existe muita informação que ainda não foi analisada em detalhe suficiente, como é o

caso da avaliação cinética da combustão da biomassa torrada assim como a influência da

torrefação na fragmentação de partículas. Estes são os principais aspetos em que este

trabalho se foca.

Tecnologia associada à torrefação

A figura 4 mostra esquematicamente como integrar a torrefação numa cadeia global de

valorização energética. Como é possível observar, a torrefação pode ser integrada numa

cadeia para acrescentar valor à biomassa. Assim, e após a pré-secagem, a biomassa pode ser

torrada e posteriormente densificada, o que aumenta significativamente o potencial deste

combustível. Por outro lado, os voláteis de baixo poder calorífico, podem ser reaproveitados de

modo a gerar algum do calor necessário aos processos de tratamento da biomassa, como a

pré-secagem e a torrefação, tornando o rendimento energético do processo superior quando

comparado como a torrefação como um processo isolado.

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10

Figura 4 – Torrefação integrada numa cadeia de valorização de biomassa.

1.5 Fragmentação de partículas

Durante a combustão, a partícula pode quebrar e dar origem a duas ou mais partículas,

diminuindo significativamente o seu tamanho. Este fenómeno, denominado como

fragmentação, é extremamente nocivo para a saúde humana e meio ambiente dado que as

nano partículas resultantes são dificilmente capturáveis através sistema convencionais de

tratamento de gases e, consequentemente, são emitidas para a atmosfera.

A fragmentação de partículas tem tido uma forte atenção por parte da comunidade científica e,

em especial, nas caldeiras domésticas de combustão de pellets energéticas de biomassa. Os

estudos nesta área são ainda pouco aprofundados e com um caracter muito qualitativo,

baseando-se maioritariamente na dimensão média das partículas durante a combustão, como

é o caso dos trabalhos de Xu et al. [35], Wen et al. [36] e Li et al. [37]. Outros trabalhos, como o

de Seames [38], focaram o estudo em imagens de microscópio eletrónico para, através da

morfologia e tamanhos de partículas, avaliar a extensão da fragmentação das partículas.

Por outro lado, a esmagadora maioria dos trabalhos nesta área foram realizados com carvão,

onde a combustão ocorre com o diâmetro da partícula aproximadamente constante. No caso

da biomassa, e como descrito anteriormente, esta retém a forma irregular, variando fortemente

o seu diâmetro médio durante a combustão, o que torna a avaliação da fragmentação por

microscópio eletrónico inconclusiva.

CombustãoCombustível fóssilbiomassa ou produto

Reaproveitamentode calor

TorrefaçãoBiomassa Pré-secagem Arrefecimento Densificação Produto

Syngasvapor de água

Limpeza de gás

Limpeza de gás

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11

O presente trabalho avalia a fragmentação das partículas com recurso à captura de partículas

em diferentes estágios do processo de combustão, procurando assim avaliar inequivocamente

a extensão do processo de fragmentação das partículas.

1.6 Estudos anteriores

Nesta seção, os trabalhos anteriores são analisados por forma a melhor compreender a

evolução dos estudos sobre torrefação e combustão de biomassa torrada, assim como

descrever, de forma breve, os objetivos dos trabalhos e as suas principais conclusões. A seção

encontra-se organizada por trabalhos anteriores em torrefacção, cinética/avaliação da

combustão de biomassa torrada e fragmentação de partículas.

Torrefação

A torrefação tem sido largamente estudada com a finalidade de melhorar as propriedades da

biomassa como um combustível para produção quer de calor quer de energia elétrica. Assim,

os desenvolvimentos nesta área recaem não só sobre o aumento do poder calorífico da

biomassa, como também pelo melhoramento das propriedades físicas, como a menor energia

de moagem necessária para processos de pulverização, entre outras descritas anteriormente.

Mais recentemente, foram publicados estudos que analisam a biomassa torrada do ponto de

vista da combustão e da cinética química, mencionando energias de ativação e comparando a

sua estrutura lignocelulósica com a da biomassa original. Estes estudos são apresentados na

secção seguinte relativa à cinética química da combustão da biomassa torrada.

Chen e Kuo. [39] estudaram a influência da torrefação na estrutura lignocelulósica de vários

tipos de biomassa com recurso à termogravimetria. O objetivo deste trabalho foi o de perceber

quais as diferenças a nível morfológico e estrutural da biomassa após serem torradas a

diferentes temperaturas. Os autores conseguiram observar a degradação isolada de cada um

dos três constituintes da biomassa, a celulose, hemicelulose e lignina. Chen e Kuo [39]

concluíram que as diferenças entre a biomassa original e a biomassa torrada são

principalmente ao nível da quantidade de hemicelulose que se reduz durante a torrefação. Por

outro lado, os resultados mostram que, em termos de eficiência energética, a torrefação menos

severa, a mais baixa temperatura, é aquela que gera maior potencial em termos de valorização

da biomassa. Este estudo é importante pois expõe as principais diferenças morfológicas entre

a biomassa original e a biomassa torrada o que contribui significativamente para prever o

comportamento do combustível durante o processo de combustão. Estas diferenças no

processo de combustão, devido à mudança estrutural da biomassa torrada, são referidas e

comentadas ao longo deste trabalho.

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12

Repellin et al. [27] avaliaram a energia necessária para a pulverização de madeira torrada.

Para tal, os autores torraram madeira a várias temperaturas distintas e durante tempos de

residência distintos. Posteriormente, as amostras foram colocadas num moinho de 0,5 mm e foi

avaliada a energia necessária para a pulverização e medido, por difração laser, o tamanho das

partículas resultantes. Os resultados mostraram que não só a energia de pulverização é

significativamente inferior no caso da biomassa torrada, diminuindo com a temperatura final de

torrefação, como a torrefação origina menores partículas após a pulverização, quando

comparado com a biomassa não tratada. Este trabalho mostra a importância da torrefação no

que diz respeito à energia necessária para cortar a biomassa. Como é do conhecimento geral,

o estilhaçamento de biomassa é um processo difícil e dispendioso, sendo que a torrefação vem

facilitar o corte da biomassa assim como originar partículas mais pequenas, o que pode ser

encarado como uma vantagem na co-combustão com carvão. A aproximação química e

morfológica da biomassa torrada com o carvão é uma importante vantagem da torrefação de

biomassa, que pode ser observada nos resultados da presente tese.

Combustão de biomassa torrada e cinética química

No que diz respeito ao estudo da cinética química da biomassa torrada ainda muito trabalho

terá de ser desenvolvido para melhor conhecer os fenómenos que dominam o processo de

combustão [40]. O estudo da caracterização da combustão a nível cinético tem sido

desenvolvido por vários autores recorrendo a uma análise TGA, afastando-se do caso real de

combustão, por forma a perceber, a nível elementar, a cinética da combustão da biomassa

torrada. Por outro lado, é geralmente aceite que a energia de ativação necessária para a

desvolatilização da biomassa torrada é, nos primeiros estágios, superior à da biomassa

original, já que durante a torrefação houve libertação de alguma matéria volátil. Por outro lado,

a energia de ativação para a combustão do resíduo carbonoso da biomassa torrada ainda se

encontra pouco estudada, sendo previsto o seu crescimento nos próximos anos.

Lu et al. [40] estudaram a cinética da combustão de biomassa original, torrada e do carvão.

Neste trabalho a madeira foi torrada a duas temperaturas finais diferentes e o seu potencial foi

avaliado com recurso à análise termogravimétrica. Foi também avaliada a cinética da

combustão com recurso a modelos de primeira ordem. Os resultados mostraram que a

biomassa torrada apresentava geralmente três fases reativas distintas. Todavia, a biomassa

torrada a maior temperatura apresentou quatro fases reativas diferentes. Por fim, os resultados

mostram que a energia de ativação da biomassa varia com a torrefação e que este

comportamento não é linear. Com efeito, verificou-se que à biomassa torrada, durante o

processo de desvolatilização, está associada uma energia de ativação superior, não se

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13

verificando esse comportamento para a combustão do resíduo carbonoso. Este estudo vem

enfatizar as diferenças a nível estrutural da biomassa torrada que resultam na modificação das

energias de ativação durante não só a desvolatilização como a combustão do resíduo

carbonoso. É importante notar que a reatividade do resíduo carbonoso da biomassa torrada se

aproxima dos valores conhecidos para o carvão, sendo importante realizar este tipo de estudo

para outros tipos de biomassa, o que pode ser encontrado neste trabalho.

Chen et al [41] avaliaram o potencial da biomassa torrada para utilização em altos-fornos. Para

tal usaram cinco tipos distintos de biomassa que torraram a três temperaturas diferentes,

comparando com as propriedades do carvão. Para avaliar o potencial de cada uma das

amostras avaliaram a sua combustão com recurso a um RQL. Os autores concluíram que

quanto maior a temperatura de torrefação maior é o teor hidrofóbico da biomassa torrada. Por

outro lado, quanto maior a temperatura de torrefação maior é a proximidade com as

propriedades do carvão e, como tal, mais facilmente se poderá conjugar com o carvão em co-

combustão. Com este trabalho é possível afirmar que quanto maior o grau de torrefação mais

próximas se tornam as propriedades da biomassa do carvão. No entanto quanto maior o grau

de torrefação mais dispendioso se torna o processo, pelo que economicamente terá de ser feita

uma análise à aplicação industrial da torrefação.

Fisher et al. [42] avaliaram as características da combustão de biomassa original e torrada.

Com recurso à análise termogravimétrica foi avaliada a reatividade do salgueiro torrado a

várias temperaturas diferentes. Neste trabalho os autores concluíram que quanto maior o grau

de torrefação menor é a reatividade do combustível. Com esta análise, em linha com os

resultados de Chen et al [40] e os apresentados nesta tese, é demonstrado o potencial

significativamente superior da biomassa torrada na co-combustão com carvão.

Mais recentemente, Broströma et al [43] estudaram a cinética da desvolatilização, oxidação da

matéria volátil e combustão do resíduo carbonoso da madeira torrada. Para esta avaliação os

autores recorreram à análise termogravimétrica apara quantificar a os vários processos da

combustão, tanto em ambiente inerte como em ar. De notar que, para a desvolatilização os

autores obtiveram valores da ordem de 100 kJ/mol e para a combustão do resíduo carbonoso

valores da ordem de 200 kJ/mol. Estes valores obtidos por Broströma et al [43] são típicos para

a biomassa torrada e semelhantes aos obtidos, através de um RQL, no presente trabalho. Este

facto vem enfatizar e validar a utilização de um RQL para avaliação da cinética de combustão

da biomassa.

Muitos outros estudos foram efetuados para analisar a combustão de biomassa torrada, mas

todos eles são baseados na análise termogravimétrica, o que contrasta com o presente

trabalho que analisa o potencial da combustão de biomassa torrada com recurso a um RQL.

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Fragmentação de partículas

A fragmentação de partículas tem despertado grande interesse em toda a comunidade

científica devido à emissão elevada de nano-partículas por parte da biomassa. Apesar dos

estudos nesta área serem escassos, os autores baseiam-se maioritariamente na análise de

partículas através do microscópio eletrónico por forma a, através da sua morfologia, concluir

quanto à fragmentação. Outros trabalhos enfocam apenas formas qualitativas, tentando

descrever a fragmentação de partículas, recorrendo à dimensão média de tamanhos. É

importante notar que, para a biomassa, os estudos para a fragmentação de partículas são

inconclusivos.

Xu et al. [35] avaliaram a fragmentação de partículas de carvão com recurso à dimensão média

das partículas. Os autores concluíram que a ocorrência da fragmentação está relacionada com

os últimos estágios da combustão do carvão. Apesar deste estudo ter sido realizado com

carvão, cujas partículas são consideradas aproximadamente esféricas e que a combustão

ocorre a diâmetro constante, apenas foi possível concluir que ocorreu fragmentação através da

redução do diâmetro médio das partículas. É de notar que, para a biomassa, a partícula tem

uma forma desordeira e há redução do seu tamanho durante a combustão, pelo que este

método aplicado à biomassa seria inconclusivo.

Seames [38] estudou, através de um RQL com janelas horizontais, a fragmentação de

partículas de carvão. Neste trabalho foram capturadas partículas em vários pontos do RQL e

foi avaliada a sua morfologia com recurso a um microscópio eletrónico. É possível concluir que,

para o carvão, nos últimos estágios da combustão, há o aparecimento de partículas com um

aspeto fraturado, indicando a ocorrência de fragmentação. Com este trabalho é demonstrada a

fragmentação de partículas no caso do carvão. No entanto para a biomassa, como a morfologia

das partículas é desordeira, este método, à semelhança do trabalho de Xu et al. [35], tornar-se-

ia inconclusiva.

No presente trabalho, com recurso ao cruzamento de resultados entre a classificação e

distribuição de tamanhos de partículas com os valores de burnout é possível avaliar a

fragmentação de partículas de biomassa. Por outro lado, ao contrário dos trabalhos de Xu et al.

[35] e Seames [38],este novo método torna possível a avaliação da fragmentação não só para

o carvão como para a biomassa.

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1.7 Objetivos

O objectivo geral deste trabalho foi avaliar as características da combustão de biomassa

torrada (e não torrada) num RQL. Os tipos de biomassa estudados foram a casca de pinheiro e

o bagaço de azeitona, que foram torrados num torrador de biomassa desenvolvido neste

trabalho. Os objectivos específicos do trabalho incluíram (i) o estudo da influência da torrefação

nas propriedades da biomassa, (ii) a obtenção de energias de ativação e fatores pré-

exponenciais para as várias fases da combustão, recorrendo a modelos de cinética química de

primeira ordem, e (iii) a avaliação do processo de fragmentação das partículas com recurso à

captura de partículas em diferentes estágios da combustão.

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2. Instalação experimental

Este capítulo descreve a instalação experimental utilizada no presente trabalho e os métodos

utilizados para a realização das medidas, incluindo as incertezas experimentais.

2.1 Descrição do torrador de biomassa

Na figura 5 encontra-se esquematizada a instalação utilizada para a torrefação da biomassa.

Como é possível observar, uma tomada de azoto com um caudal de 3 L/min foi ligada a um

pré-aquecedor elétrico de 200 W de potência. Este pré-aquecedor dispõe de um sistema de

controlo PID, sendo possível regular a temperatura de saída do gás até 425 °C. A biomassa

que se pretendia torrar era colocada no interior de um tubo de aço 316L de 400 mm de

comprimento e 20 mm de diâmetro. Para monitorizar a temperatura da biomassa foi colocado

um termopar móvel ao longo do tubo de aço, sendo possível monitorizar a temperatura a que a

biomassa estava sujeita em qualquer ponto do tubo. É de sublinhar que o tubo de aço foi

isolado com recurso a lã de vidro e folha de alumínio por forma a evitar perdas de calor pela

parede. A figura 6 mostra uma fotografia do sistema usado para torrar a biomassa.

Figura 5 – Esquema da instalação usada para a torrefação da biomassa.

Pré-aquecedor(200 W)

290 ºC

T

N2

3 L/min

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Figura 6 – Fotografia da instalação usada para a torrefação de biomassa.

2.2 Descrição do reator de queda livre

A figura 7 mostra esquematicamente o RQL usado no presente trabalho e a figura 8 mostra

uma fotografia da instalação experimental. Globalmente, o sistema é constituído por uma

unidade de alimentação de biomassa, pelo RQL e por uma unidade de captura de partículas. A

unidade de alimentação é composta por dois caudalimetros, um depósito, um alimentador de

parafuso ligado a um motor de velocidade variável, um vibrador e por um injetor arrefecido a

água. Os caudalimetros foram usados para monitorizar o ar primário e o ar secundário e o

combustível foi armazenado no depósito superior. Através do alimentador de parafuso foi

possível controlar o caudal de biomassa injetado no RQL, tendo sido colocado um vibrador

junto ao ponto de alimentação por forma a evitar o bloqueamento dos canais de admissão de

combustível. O RQL, eletricamente aquecido com uma potência total de 5600 W, é composto

por um tubo de cerâmica de 1300 mm de comprimento e 38 mm de diâmetro interior. As

resistências elétricas são monitorizadas por oito controladores PID que acionam as resistências

consoante as temperaturas lidas pelos oito termopares distribuídos uniformemente ao longo do

RQL. No que diz respeito à unidade de captura de partículas, esta é formada por uma sonda

arrefecida a água, por um filtro de quartzo de 47 mm de diâmetro inserido num impactor

TECORA e por uma bomba de vácuo usada para criar uma depressão no reator e possibilitar a

recolha de partículas.

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Figura 7 – Esquema do RQL.

T

T

T

T

T

T

T

T

BombaFiltro

Exaustão

ExaustãoAzoto

ø38ø22

3 furos deø 0,5mm

ø3

Água Água

Água

250

240

240

240

130

Ar Ar

Fluído de transporte (ar)

Combustívelsólido

Águ

a

Águ

aA

zoto

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20

Figura 8 – Fotografia do RQL e do equipamento auxiliar.

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21

2.3 Métodos e incertezas experimentais

2.3.1 Medição de temperaturas

A figura 9 representa a sonda usada para a medição da temperatura ao longo do eixo do RQL,

na qual foi instalado um termopar na sua extremidade. Este termopar, tipo R com 76 μm de

diâmetro, foi ligado a fios de platina e platina/13% ródio dispostos ao longo de todo o

comprimento da sonda. Para proteção dos fios, este foram colocados no interior de um tubo de

cerâmica de duplo furo. A leitura das temperaturas foi possível através de uma placa de

aquisição de dados ligada a um computador.

As incertezas experimentais máximas associadas à medição da temperatura com o termopar

foram estimadas em cerca de 14% da diferença entre a temperatura do termopar e a

temperatura da parede [44]. Foi estimado que a diferença máxima entre a temperatura do

termopar e a temperatura real do gás não excede 20 ºC. Esta estimativa foi feita com base na

seguinte equação:

<�=. >?� − ?@ABC + DE>?�F − ?GAHI�IF C = 0(3)

Nesta equação, a transmissão de calor por condução através dos fios do termopar foi

considerada desprezável, e portanto, a equação representa um balanço entre a convecção e a

radiação em regime estacionário.

Figura 9 – Sonda de termopar usada para medir a temperatura no interior do RQL.

2.3.2 Captura e cálculo do burnout da partícula

As partículas foram recolhidas ao longo do eixo da câmara de combustão com o auxílio de

uma sonda em aço inoxidável com 1,5 m de comprimento, arrefecida a água, conforme pode

ser observado na figura 7. O congelamento das reações químicas era assegurado através da

20mm 40mm 25mm 15mm10mm

10-1

5mm

5mm

25m

m

12m

m

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injeção direta de jatos de azoto sobre a amostra (gases e partículas) através de pequenos

orifícios localizados na extremidade da sonda. O tubo central da sonda, através do qual a

amostra era aspirada com uma velocidade isocinética, possuía um diâmetro interior de 3 mm.

Após deixarem a sonda, as partículas eram recolhidas com o auxílio de um dispositivo da

Tecora equipado com um filtro de quartzo de 47 mm de diâmetro. Após a recolha, as amostras

eram secas numa estufa a aproximadamente 105 °C. A secagem foi repetida até assegurar

que a diferença mássica da amostra fosse nula. A quantidade de cinzas presente na amostra

foi avaliada recorrendo ao procedimento descrito na norma CEN/TS 14775, sendo o burnout da

partícula calculado através da seguinte equação:

J(%) = 1 − LMLN1 − LM × 100(4)

As principais fontes de incerteza associadas ao cálculo do burnout da partícula recorrendo à

utilização das cinzas como traçador (referência), estão relacionadas com a volatilidade das

cinzas quando sujeitas a elevadas taxas de aquecimento e, também, à sua solubilidade em

água. No presente estudo, os cálculos efetuados revelaram incertezas desprezáveis [43]. É

ainda de sublinhar que estes testes foram repetidos várias vezes de forma a confirmar os

resultados obtidos.

2.3.3 Concentração e distribuição de tamanhos de pa rtículas

As concentrações e distribuição das dimensões das partículas resultantes do processo de

combustão foram obtidas com o auxílio de um impactor de três estágios em cascata de baixa

pressão (Tecora). As partículas foram recolhidas no eixo da câmara de combustão com o

auxílio da sonda de partículas descrita anteriormente. A amostragem das partículas foi

realizada em condições isocinéticas. De modo a evitar condensação de água no impactor, este

foi envolvido por uma manta aquecida (modelo Winkler WOTX1187). As partículas foram

recolhidas com o auxílio de filtros de quartzo de 47 mm de diâmetro, os quais eram foram

secos numa estufa antes de cada teste. Depois de cada teste os filtros eram novamente secos

na estufa, de modo a eliminar qualquer humidade residual, e pesados de modo a determinar a

sua massa. O impactor de três estágios permite classificar as partículas em três classes de

diâmetros, a saber: diâmetros superiores a 10 µm (PM10), diâmetros entre 2,5 µm e 10 µm, e

diâmetros inferiores a 2,5 µm (PM2,5).

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23

Parâmetro Casca de pinheiro Bagaço de azeitona

Carvão Original Torrado Original Torrado

Análise imediata (wt%, as received)

Matéria volátil

Carbono fixo

Humidade

Cinzas

58,9

25,9

13,9

1,3

69,4

27,6

1,0

2,0

57,8

19,7

9,4

13,1

60,6

23,1

0,3

16,0

44,6

51,4

1,7

2,3

Análise elementar (wt%, daf)

Carbono

Hidrogénio

Azoto

Enxofre

Oxigénio

47,8

5,6

0,3

0,0

46,3

54,4

5,5

0,4

0,0

39,7

43,2

5,6

1,9

0,0

49,3

47,8

5,1

2,3

0,0

44,8

79,3

5,9

1,9

0,5

12,4

Poder calorífico superior (MJ/kg) 18,82 23,52 17,54 20,67 35,04

Análise das cinzas (% wt, base seca)

SiO2

Al2O3

Fe2O3

CaO

SO3

MgO

TiO2

P2O5

K2O

Na2O

Cl

Outros Óxidos

9,6

11,9

2,1

50,9

2,0

12,1

0,0

5,6

4,1

0,8

-

0,9

30,4

10,6

9,9

9,9

0,7

7,2

0,9

7,4

18,7

2,9

-

1,4

39,4

23,2

24,7

3,5

1,5

1,0

1,7

0,2

1,2

2,6

-

1,0

Distribuição de tamanhos (µm)

< 30

< 70

< 100

< 300

< 500

< 1000

< 2000

SMD

13,6

28,5

34,7

53,1

67,0

95,1

100,0

177,8

9,9

17,5

21,3

37,1

49,8

94,1

100,0

97,0

38,4

61,4

69,9

94,2

100,0

100,0

100,0

19,7

Tabela 2 – Propriedades da biomassa original, torrada, e do carvão.

Page 40: Características da Combustão de Biomassa Torrada num ... · Características da Combustão de Biomassa Torrada ... ao Ulisses Fernandes, ... 3.1 Condições dos testes

24

Page 41: Características da Combustão de Biomassa Torrada num ... · Características da Combustão de Biomassa Torrada ... ao Ulisses Fernandes, ... 3.1 Condições dos testes

25

3. Resultados e discussão

3.1 Condições dos testes

As biomassas estudadas neste trabalho foram a casca de pinheiro e o bagaço de azeitona.

Ambas as biomassas originais foram inicialmente pulverizadas de modo a obter partículas até 1

mm de diâmetro. A distribuição das dimensões das partículas, tanto para a biomassa original

como para a biomassa torrada, foi determinada com o auxílio do Malvern Particle Sizer 2600.

Adicionalmente, e de modo a corroborar os resultados obtidos pela técnica de difração laser,

não foram observadas diferenças na forma das partículas através da análise do microscópio

eletrónico. Posteriormente, as biomassas foram torradas no dispositivo descrito anteriormente.

Após a colocação da biomassa no interior do tubo de aço, o dispositivo era alimentado com 3

L/min de azoto a 310 °C durante 1 hora. Durante est e processo a temperatura da biomassa

variava tipicamente entre 280 °C e 300 °C. Esta ape rtada monitorização foi conseguida através

do termopar móvel que atravessava todo o comprimento do tubo. A tabela 2 mostra as

propriedades das biomassas originais e torradas. Para efeitos de comparação, a tabela inclui

também as propriedades de um carvão betuminoso do Reino Unido. A análise imediata,

elementar e o poder calorífico foram determinados recorrendo aos procedimentos descritos nas

normas ASTM-D-3172, ASTM-D-3174, ASTM-D-3176 e ASTM-D-5865. A composição química

das cinzas foi determinada por espectroscopia de florescência de raio-X.

Foram realizados ensaios para as biomassas originais e torradas, para cinco temperaturas do

RQL (900, 950, 1000, 1050, 1100 °C) em que foram re colhidas partículas às distâncias de 200,

300, 500, 700, 900 e 1100 mm do ponto de injeção. Em cada ensaio, o caudal mássico de

biomassa era de 23 g/h e o caudal volúmico de ar de aproximadamente 4 L/min, de modo a

que o coeficiente de excesso de ar no RQL fosse de 2,5. O ar era alimentado ao RQL à

temperatura ambiente proveniente de um compressor. A velocidade inicial das partículas no

RQL foi estimada em cerca de 0,3 m/s. Para a avaliação da concentração e distribuição de

tamanhos de partículas optou-se por capturar as partículas a 500 e 1100 mm do ponto de

injeção, isto é, a meio e á saída do RQL.

3.2 Biomassa original vs biomassa torrada

Como se pode observar na tabela 2, a torrefação reduz significativamente a quantidade de

humidade presente na biomassa, nomeadamente de 13,9% para 1% no caso da casca de

pinheiro e de 9,4% para 0,3% no caso do bagaço de azeitona. A tabela 2 indica também que o

poder calorifico superior aumenta substancialmente com a torrefação; especificamente, de

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26

18,82 MJ/kg para 23,52 MJ/kg no caso da casca de pinheiro e de 17,54 MJ/kg para 20,67

MJ/kg no caso do bagaço de azeitona. Este facto vem corroborar o potencial da torrefação no

aumento da densificação energética da biomassa, ultrapassando assim uma das suas grandes

desvantagens.

A figura 10 apresenta o diagrama de van Krevelen para as biomassas estudadas e para o

carvão betuminoso, incluído para permitir comparações. É evidente que as razões atómicas

H/C se correlacionam fortemente com as razões O/C (com um coeficiente de correlação de R2

= 0,9476). Assim, a torrefação diminuiu o conteúdo de hidrogénio e oxigénio da biomassa

inicial, aproximando-os dos valores observados para o carvão. Este facto torna a co-combustão

de biomassa torrada com carvão mais interessante já que é possível uma aproximação química

entre os dois combustíveis.

Figura 10 – Diagrama de van Krevelen.

0,00

0,02

0,04

0,06

0,08

0,10

0,12

0,14

0,00 0,20 0,40 0,60 0,80 1,00 1,20

H/C

O/C

CarvãoCasca de pinheiroCasca de pinheiro torradoBagaço de azeitonaBagaço de azeitona torrado

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27

3.3 Perfis de temperatura e burnout da partícula

A figura 11 apresenta os perfis de temperatura obtidos ao longo do eixo do RQL para as

biomassas e temperaturas do RQL estudadas. É possível observar que a temperatura mais

alta, observada para a biomassa original, se localiza junto do injetor e que esta temperatura é

ligeiramente superior à da biomassa torrada devido à desvolatilização mais intensa e burnout

mais elevado da biomassa original. No entanto, à medida que a distância ao injetor (x)

aumenta, as diferenças de temperatura tornam-se cada vez menores.

Figura 11 - Perfis de temperatura ao longo do eixo do RQL. a) Casca de pinheiro, b) casca de pinheiro

torrada, c) bagaço de azeitona, d) bagaço de azeitona torrado.

A figura 12 mostra os perfis do burnout da partícula ao longo do eixo do RQL para todas as

biomassas e temperaturas do RQL estudadas. É de notar que, devido à elevada matéria volátil

presente na biomassa (~65%), grande parte dos resultados apresentados referem-se ao

processo de desvolatilização. De acordo com as temperaturas medidas (figura 11), a figura 12

mostra que os valores do burnout da partícula junto ao injetor são superiores no caso da

biomassa original, com a diferença diminuindo à medida que x aumenta.

A figura 12 revela ainda que a casca de pinheiro apresenta valores de burnout da partícula

superiores, independentemente da temperatura do RQL. Para x = 200 mm a casca de pinheiro

original apresenta valores de burnout da partícula entre ~63% a 900 °C e ~79 % a 1100 °C, e

para x = 1100 mm entre ~95% a 900 °C e ~99% a 1100 °C. Os valores correspondentes para a

0 200 400 600 800 1000 1200 0 200 400 600 800 1000 1200

0 200 400 600 800 1000 12000 200 400 600 800 1000 1200

0

200

400

600

800

1000

1200

Tem

per

atu

ra(º

C)

0

200

400

600

800

1000

1200

Tem

per

atu

ra(º

C)

0

200

400

600

800

1000

1200

0

200

400

600

800

1000

1200

Distância axial (mm) Distância axial (mm)

b)

c)

a)

d)

TW = 1100 °CTW = 1050 °C

TW = 1000 °C

TW = 950 °CTW = 900 °C

Page 44: Características da Combustão de Biomassa Torrada num ... · Características da Combustão de Biomassa Torrada ... ao Ulisses Fernandes, ... 3.1 Condições dos testes

28

casca de pinheiro torrada são de ~37% e ~69% quando x = 200 mm, e ~85% e ~99% quando x

= 1100 mm. Estes resultados indicam que, apesar dos valores inferiores da casca de pinheiro

torrada, esta não necessita de tempos de residência superiores para atingir burnouts

semelhantes aos da casca de pinheiro original, exceto para o caso dos 900 ºC em que não se

verificou essa tendência.

Tanto o bagaço de azeitona torrado como o original apresentam burnouts significativamente

inferiores aos da casca de pinheiro torrada e original, respetivamente. A figura 12 indica que

em x = 200 mm o burnout do bagaço de azeitona original varia entre ~5% a 900 °C e ~27% a

1100 °C, e em x = 1100 mm entre ~69% a 900 °C e ~94% a 1100 °C. Os valores

correspondentes para o bagaço de azeitona torrado são de ~1% e ~15% em x = 200 mm, e

~63% e ~86% em x = 1100 mm. Neste caso o bagaço de azeitona torrado requer maiores

tempos de residência para atingir burnouts comparáveis aos do bagaço de azeitona original.

Figura 12 - Perfis de burnout da partícula ao longo do RQL. a) Casca de pinheiro, b) casca de pinheiro

torrada, c) bagaço de azeitona, d) bagaço de azeitona torrado.

0 200 400 600 800 1000 1200

Distância axial (mm) Distância axial (mm)0 200 400 600 800 1000 1200

0102030405060708090

100

0

1020

3040

50

6070

8090

100

(%)

0

1020

30

40

5060

70

80

90100

010

20304050

607080

90100

0 200 400 600 800 1000 1200 0 200 400 600 800 1000 1200

(%)

TW = 1100 °CTW = 1050 °CTW = 1000 °CTW = 950 °CTW = 900 °C

a) b)

c) d)

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29

3.4 Parâmetros cinéticos

Para avaliação dos parâmetros cinéticos foram usados os modelos de primeira ordem descritos

seguidamente. Para a desvolatilização foi usado o modelo presente em [44]:

.".2 = PQ(1 − J)(5)

onde

PQ = RQSTUVW(6)

Analogamente, para a combustão do resíduo carbonoso [44]:

.+.2 = −RPX��� (7)

onde

PX = RXSTYVW(8)

No presente trabalho foi adotado o modelo de desvolatilização presente nas equações (5) e (6)

que pode ser reescrito da forma:

ln \ .".21 − J] = − ^Q:? + ln(RQ)(9)

analogamente para a combustão do resíduo carbonoso e reescrevendo as equações (7) e (8)

obteve-se:

ln \ .+.2−R�_�] = − X̂:? + ln(RX)(10)

A figura 13 mostra as regressões lineares usadas para derivar os parâmetros cinéticos ao

longo do RQL. Os vários pontos apresentados na figura 13 foram calculados com recurso às

equações (9) e (10) aplicadas a duas posições-x consecutivas no RQL. A tabela 3 lista as

energias de ativação e os fatores pré-exponenciais para quatro seções do reator, ou seja, para

300 < x < 500 mm, 500 < x < 700 mm, 700 < x < 900 mm, and 900 < x < 1100 mm. No que diz

respeito à casca de pinheiro original, as energias de ativação apresentadas sugerem a

Page 46: Características da Combustão de Biomassa Torrada num ... · Características da Combustão de Biomassa Torrada ... ao Ulisses Fernandes, ... 3.1 Condições dos testes

30

existência de três processos distintos: uma primeira fase de desvolatilização na região 300 < x

< 500 mm, uma segunda fase de desvolatilização na região 500 < x < 900 mm, e uma terceira

e última fase de combustão do resíduo carbonoso na região 900 < x < 1100 mm (cf. figura 12).

A casca de pinheiro torrada apresenta, todavia, apenas duas fases, uma primeira fase de

desvolatilização na região 300 < x < 700 mm e uma região de combustão do resíduo carbonoso

na região compreendida entre 700 < x < 1100 mm. Este facto pode ser atribuído à perda de

voláteis durante o processo de torrefação, que reduz a extensão do processo de

desvolatilização, aumentando a duração da combustão do resíduo carbonoso. Os resultados

obtidos para a energia de ativação do bagaço de azeitona, original e torrado, indicam um

comportamento semelhante com três fases distintas para ambos os casos: uma primeira fase

na região 300 < x < 700 mm, uma segunda fase de desvolatilização e combustão do resíduo

carbonoso na região 700 < x < 900 mm, e uma terceira fase de combustão do resíduo

carbonoso na região 900 < x < 1100 mm (cf. figura 12).

Os resultados cinéticos obtidos mostram que, para ambos as biomassas, original e torrada, a

torrefação reduz a energia de ativação para a combustão do resíduo carbonoso. Di Blasi [32]

fez uma compilação dos parâmetros cinéticos para a combustão de vários resíduos carbonosos

de biomassa e encontrou valores, para a energia de ativação, entre 144 kJ/mol e 230 kJ/mol,

na linha dos obtidos no presente trabalho. As incertezas relacionadas com a obtenção da

energia de ativação estão relacionadas com as incertezas na medição da temperatura e do

burnout. No presente estudo conduziu a uma incerteza máxima inferior a 2% nos valores

apresentados para a energia de ativação.

Page 47: Características da Combustão de Biomassa Torrada num ... · Características da Combustão de Biomassa Torrada ... ao Ulisses Fernandes, ... 3.1 Condições dos testes

31

Figura 13 - Regressão linear para avaliação dos parâmetros cinéticos dos combustíveis. a) 300 < x < 500

mm, b) 500 < x < 700 mm, c) 700 < x < 900 mm, d) 900 < x < 1100 mm.

030

011

0090

070

050

013

00 x

-21,0

-20,5

-20,0

-19,5

-19,0

-18,5

-18,0

-17,5

-17,0

-16,5

-16,0

-21,0

-20,5

-20,0

-19,5

-19,0

-18,5

-18,0

-17,5

-17,0

-16,5

-16,0-21,0

-20,5

-20,0

-19,5

-19,0

-18,5

-18,0

-17,5

-17,0

-16,5

-16,0

-21,0

-20,5

-20,0

-19,5

-19,0

-18,5

-18,0

-17,5

-17,0

-16,5

-16,0

-21,0

-20,5

-20,0

-19,5

-19,0

-18,5

-18,0

-17,5

-17,0

-16,5

-16,0

-21,0

-20,5

-20,0

-19,5

-19,0

-18,5

-18,0

-17,5

-17,0

-16,5

-16,0

-21,0

-20,5

-20,0

-19,5

-19,0

-18,5

-18,0

-17,5

-17,0

-16,5

-16,0

-21,0

-20,5

-20,0

-19,5

-19,0

-18,5

-18,0

-17,5

-17,0

-16,5

-16,0

0,0007 0,00075 0,0008 0,00085 0,0009 0,0007 0,00075 0,0008 0,00085 0,0009

1/T (1/K) 1/T (1/K)

ln[(

dm

/dt)

/(-A

PO

2)]ln

[(d

v/d

t)/(

1-ψ

)]ln

[(d

v/d

t)/(

1-ψ

)]ln

([(d

v/d

t)/(

1-ψ

)]

Casca de pinheiroCasca de pinheiro torrado

Bagaço de azeitonaBagaço de azeitona torrado

y = -27723x + 3,3R² = 0,9361

y = -30952x + 5,8R² = 0,9474R² = 0,9171

R² = 0,9289

R² = 0,9718

R² = 0,9551

R² = 0,9512

R² = 0,9238

R² = 0,9864

R² = 0,9849

R² = 0,9789

R² = 0,9381

R² = 0,9865

R² = 0,9911

R² = 0,9789

R² = 0,9826

y = -10796x - 10,2

y = -15620x - 6,9

y = -10384x - 9,4

y = -5990x - 13,3

y = -10364x - 9,4

y = -15125x - 5,5

y = -2612x - 15,4

y = -7024x - 11,5

y = -8710x - 10,2

y = -6089x - 12,9

y = -8695x - 10

y = -2597x - 15,7

y = -2559x - 15,2

y = -6963x - 11,3

Page 48: Características da Combustão de Biomassa Torrada num ... · Características da Combustão de Biomassa Torrada ... ao Ulisses Fernandes, ... 3.1 Condições dos testes

32

Seção do RQL

Casca de pinheiro Bagaço de azeitona

Original Torrado Original Torrado

Ev/c

(kJ/mol)

Av/c

(1/s) R2

Ev/c

(kJ/mol)

Av/c

(1/s) R2

Ev/c

(kJ/mol)

Av/c

(1/s)

R2

Ev/c

(kJ/mol)

Av/c

(1/s)

R2

300 < x < 500

mm 21.6 ± 0.3 0.3 0.9865 21.3 ± 0.3 0.4 0.9911 57.9 ± 0.8 19.1 0.9789 72.3 ± 1.0 76.6 0.9826

500 < x < 700

mm 50.6 ± 0.7 4.1 0.9864 21.7 ± 0.3 0.3 0.9849 58.4 ± 0.8 16.9 0.9789 72.4 ± 1.0 58.9 0.9381

700 < x < 900

mm 49.8 ± 0.7 2.8 0.9718 86.3 ± 1.2 129.7 0.9551 125.8 ± 1.8 6.9E+03 0.9512 86.2 ± 1.2 134.4 0.9238

900 < x < 1100

mm 129.9 ± 1.9 1670.4 0.9171 89.8 ± 1.3 54.9 0.9289 254.8 ± 3.7 5.5E+08 0.9474 230.5 ± 3.3 4.2E+07 0.9361

Tabela 3 – Parâmetros cinéticos das biomassas estudadas.

Page 49: Características da Combustão de Biomassa Torrada num ... · Características da Combustão de Biomassa Torrada ... ao Ulisses Fernandes, ... 3.1 Condições dos testes

33

3.5 Fragmentação de partículas

A figura 14 mostra a concentração de partículas em x = 500 mm e x = 1100 mm, para a

temperatura do RQL de 1100 °C, e para as quatro bio massas estudadas. No caso da casca de

pinheiro original (figura 14a) o burnout da partícula aumentou de 89,4% para 98,7% entre x =

500 e 1100 mm, enquanto a concentração de partículas inferiores a 10 µm (PM2,5 e PM2,5-

PM10) aumentou de 15% para 39%; no caso da casca de pinheiro torrada (figura 14b) o

burnout aumentou de 85,8% para 99,4% entre x = 500 e 1100 mm, enquanto a concentração

de partículas inferiores a 10 µm aumentou de 16% para 42,5%. Este facto sugere a existência

de fragmentação de partículas entre x = 500 e 1100 mm para ambas as biomassas (original e

torrado), mas que não foi a torrefação que promoveu a fragmentação das partículas.

No caso do bagaço de azeitona original (figura 14c) o burnout da partícula aumentou de 61,8%

para 93,9% entre x = 500 e 1100 mm, enquanto a concentração de partículas inferiores a 10

µm diminuiu de 10,5% para 7,1%; no caso do bagaço de azeitona torrado (figura 14d) o

burnout da partícula aumentou de 55,9% para 86,1% entre x = 500 e 1100 mm, enquanto a

concentração de partículas inferiores a 10 µm diminuiu de 12,5% para 10,3%. Deste modo é

possível concluir, de novo, que a torrefação não promoveu a fragmentação das partículas,

sendo que, neste caso, a fragmentação das partículas entre x = 500 e 1100 mm para ambos as

biomassas não parece ocorrer.

Figura 14 - Concentração de partículas em x = 500 mm e x = 1100 mm para a temperatura do RQL de

1100 °C a) Casca de pinheiro, b) casca de pinheiro torrada, c) bagaço de azeitona, d) bagaço de azeitona

torrado.

0100200300400500600700800900

1000

0100200300400500600700800900

1000

0100200300400500600700800900

1000

0100200300400500600700800900

1000

500 mm 1100 mm

500 mm 1100 mm 500 mm 1100 mm

500 mm 1100 mm

PM

(m

g/N

m3 )

PM

(m

g/N

m3 )

c)

a) b)

d)

PM2.5

PM2.5-PM10

PM10

Page 50: Características da Combustão de Biomassa Torrada num ... · Características da Combustão de Biomassa Torrada ... ao Ulisses Fernandes, ... 3.1 Condições dos testes

34

Page 51: Características da Combustão de Biomassa Torrada num ... · Características da Combustão de Biomassa Torrada ... ao Ulisses Fernandes, ... 3.1 Condições dos testes

35

4. Fecho

4.1 Conclusões

As principais conclusões deste trabalho são as seguintes:

• O poder calorífico superior da biomassa torrada é superior ao da biomassa original,

aumentando em cerca de 25% para a casca de pinheiro e em cerca de 18% para o

bagaço de azeitona;

• A análise à biomassa após a torrefação mostra que esta se aproxima do carvão devido

à diminuição das razões O/C e H/C relativamente à biomassa original;

• A casca de pinheiro, tanto original como torrada, apresenta valores de burnout

superiores aos do bagaço de azeitona, em cada ponto do RQL;

• Contrariamente ao observado para o bagaço de azeitona torrado, a casca de pinheiro

torrada necessita de tempos de residência no RQL semelhantes para atingir taxas de

combustão próximas da casca de pinheiro não torrada;

• Os parâmetros cinéticos para ambas as biomassas, original e torrada, mostram que a

torrefação reduz a energia de ativação do resíduo carbonoso;

• A fragmentação de partículas, no que diz respeito à biomassa não tratada, é mais

evidente na casca de pinheiro que no bagaço de azeitona.

• A torrefação não aumenta a fragmentação de partículas, mesmo para biomassas que

apresentem elevada tendência para esse fenómeno.

4.2 Trabalhos futuros

Como trabalhos futuros propõem-se os seguintes:

• Alargamento do presente estudo, em todos os seus aspectos, a outros tipos de

biomassa, nomeadamente casca de arroz, cortiça e palha.

• Desenvolver um torrador piloto com capacidade para torrar cerca de 10 kg/h de

biomassa.

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36

• Caracterizar o processo de combustão de biomassa torrada (e não torrada) na fornalha

piloto existente no laboratório do presente grupo de investigação.

• Caracterizar o processo de co-combustão de carvão com biomassa torrada (e não

torrada) na fornalha piloto existente no laboratório do presente grupo de investigação.

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