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ANÁLISE COMPARATIVA: CASAS GRELHA E DAS PÉRGOLAS DESLIZANTES
Neste estudo é feita a análise comparativa de duas casas projetadas pelo escritório paulista FGMF - Casa Grelha (2007) e Casa
das Pérgolas Deslizantes (2014). Tais casas forma eleitas por, aparentemente, possuírem esquemas tipológicos semelhantes,
caracterizados por arranjos “atomizados”, organizados a partir de uma grelha estruturadora e por varandas integradoras.
Implantação e Partido Formal
A casa Grelha está localizada em São Paulo, em uma região isolada da Serra da Mantiqueira. O lote no qual está inserida é amplo
(68000m²), possui uma topografia acentuada e uma vasta e importante vegetação. O local escolhido para a inserção da casa se
dá entre dois aclives topográficos que margeiam um pequeno recurso hídrico, onde os caminhos naturais do terreno se
encontram. A sua implantação conecta os dois pontos de aclives, permitindo a passagem de um lado ao outro pela cobertura da
residência, o que sugere a referência “poética” de uma casa-ponte. Com 3123m² construídos, a casa foi idealizada para ser uma
casa de férias, tendo, desta forma, um uso mais eventual. (Figura 1).
A casa das Pérgolas Deslizantes, por sua vez, tem a implantação com características opostas ao da Casa Grelha. Projetada para
ser uma residência unifamiliar, está situada em um lote de condomínio privado na cidade de Bauru/SP, com áreas de dimensões
significativamente menores - 500m² de terreno e 160m² de área edificada. O seu terreno é plano e a sua implantação é
fortemente influenciada pelos limites do lote, apesar de, como será visto ao longo da análise, a forma tipológica da casa absorver
e não evidenciar a geometria angulada do terreno inserido. (Figura 1).
A primeira casa está implantada de forma isolada no lote, em um ponto de altura intermediária e com relação direta com o
entorno, usufruindo fortemente das visuais promovidas pela paisagem. A segunda está integrada ao lote de faces irregulares,
fechando-se para o entorno.
CASA GRELHA CASA DAS PÉRGOLAS
DESLIZANTES Local: Serra da Mantiqueira - SP
Ano: 2007
Local: Bauru- SP
Ano: 2012 a 2014
Escritório FGMF Escritório FGMF
Autoras: Juliana Moroishi e Ana Elísia da Costa
Na primeira casa, uma grelha estrutural e compositiva de 5,5 x 5,5 x 3m caracteriza o seu elemento mais marcante (figura 2). De
grande extensão horizontal, essa grelha acomoda em um único pavimento o programa principal da casa, por meio da ocupação de
módulos isolados ou “atomizados”. Por outro lado, de modo quase contraditório, a horizontalidade dessa grelha se contrapõe à
verticalidade sugerida pela elevação da mesma do solo (Figura 3). Pode-se afirmar ainda que a casa, apesar de sua
ortogonalidade acentuada, busca a integração com o entorno, seja através da forma de sua inserção no terreno, seja através da
materialidade da malha modular em madeira, ou ainda, através da exploração das visuais da paisagem.
A Casa das Pérgolas Deslizantes, por sua vez, tem a modulação relacionada com a divisão do lote em 8 “fatias” de
aproximadamente 4m (Figura 2), marcadas pela estrutura metálica na qual desenvolve-se o programa da residência e também as
pérgolas móveis, elementos marcante de sua composição (Figura 3). “Pousada” sobre o terreno, a casa também assume uma
feição horizontalizada, em apenas um pavimento. Diferente da Casa Grelha que explora a relação com a paisagem, nesse caso, a
ausência de visuais interessantes leva à adoção de um partido introspectivo em relação à rua, abrindo-se para o interior do lote.
Neste sentido, observa-se a exploração de grandes aberturas que possibilitam completa integração do interior com as áreas
abertas ou pátios, ampliando a sua área construída de 160m² para 500m².
Figura 1: Implantação - (a) Casa Grelha (2007); (b) Casa das Pérgolas Deslizantes (2014). FGMF
Fonte: (a) Acervo FGMF // MOROISHI, Juliana, 2015. (b) http://www.archidaily.com.br
(a)
(b)
(a)
Figura 2: Grelha compositiva e estrutural - (a) Casa Grelha (2007); (b) Casa das Pérgolas Deslizantes (2014). FGMF
Fonte: (a) MOROISHI, Juliana, 2015. (b) CABRAL, Tamires, 2015 // Fotos: acervo FGMF
(a)
(b)
(a)
Figura 3: Horizontalidade x verticalidade - (a)Casa Grelha (2007); (b) Casa das Pérgolas Deslizantes (2014) – esquema pérgolas. FGMF
Fonte: (a) MOROISHI, Juliana, 2015. (b) http://www.archidaily.com.br
(a)
(b)
(a)
Horizontalidade / Barra Verticalidade
O partido formal das residências é aditivo, resultantes da ocupação rarefeita ou atomizada de módulos que compõem as suas
malhas estruturais, sendo tais módulos conectados pelas varandas na Casa Grelha e por uma circulação “avarandada” na Casa
das Pérgolas Deslizantes (Figura 4). Nas duas residências, o jogo volumétrico de “cheios e vazios” é claramente explorado – mais
evidente na Casa Grelha, que explicita os “módulos não ocupados”, e mais sutil na Casa das Pérgolas Deslizantes, que sugere ser
os muros de divisa os limites de sua composição.
Assim, apesar dos seus partidos semelhantes, variações de caráter são impostas pela relação do edifício com o lote – mais
exteriorizada na Casa Grelha e mais interiorizada na Casa das Pérgolas Deslizantes, contida pelas limitações de tamanho e
forma do lote.
Configuração funcional
Ambas as casas têm seus programas organizados em apenas um nível e de forma atomizada, ou seja, com alguns módulos
ocupados independentes entre si e conectados pela circulação. Obedecendo a uma lógica funcionalista, observa-se a clara
(a)
(b)
(a)
Figura 4: Jogo volumétrico estabelecido a partir da grelha: (a) Casa Grelha (2007) – horizontalidade x verticalidade; (b) Casa das
Pérgolas Deslizantes (2014) – esquema pérgolas. FGMF
Fonte: (a) e (b) MOROISHI, Juliana, 2017.
Modulação Módulos ocupados / fechados Circulação (varandas /” avarandada”)
definição de zonas-dia e zonas-noite, conectadas por uma rede circulatória hierarquizada, com maior ou menor grau de
linearidade. (Figura 5).
Na Casa Grelha, observam-se dois agrupamentos divididos pelo eixo de circulação principal. De um lado, concentra-se o
corpo principal que abriga os setores sociais, de serviço e parte do íntimo (com o dormitório do proprietário e um quarto
de hóspedes). A posição do setor de serviços se relaciona com acesso principal e a do setor social, com a exploração das
melhores visuais. (Figuras 6a e 6b). Do outro lado do eixo circulatório, encontram-se três unidades habitacionais
autônomas, que são os quartos dos filhos. A orientação dessas unidades autônomas busca explorar não só as visuais, mas
também proporcionar uma privacidade dramatizada, que isola física e visualmente as unidades habitacionais entre si, bem
como restringe o convívio familiar aos ambientes do corpo principal da casa. (Figura 6c)
(a)
(a)
(b)
Figura 5: Zoneamento e rede circulatória - (a) Casa Grelha (2007) (b) Casa das Pérgolas Deslizantes (2014) .FGMF
Fonte: (a) e (b) MOROISHI, Juliana, 2017.
Eixo arranjo linear Zona noite Zona dia
Na Casa das Pérgolas Deslizantes, o eixo linear não setoriza os espaços, mas é o eixo que interliga os módulos da
edificação. A posição do setor de serviço faz a interface direta com a rua, compondo a fachada da residência. As áreas
sociais, estrategicamente posicionadas no meio do lote, se abrem para os pátios internos. Ao fundo do lote, encontram-se
os dormitórios que, assim como a Casa Grelha, tem a privacidade dramatizada, na medida em que está o mais isolada
possível e com as visuais direcionadas para que não haja grande interferência do setor social. (Figura 6)
zona social zona serviço zona íntima
(a)
permeabilidades visuais
(b)
(c)
(a) (b)
Eixo arranjo linear
Bloqueio físico e visual
Figura 5: Zoneamento e visuais - Casa Grelha (2007) (a) e (b) zoneamento; (c) Diagrama visuais. FGMF
Fonte: MOROISHI, Juliana, 2016
A Casa Grelha permite ao usuário uma variedade de caminhos. É possível circular sobre a cobertura, que liga um pico do
terreno ao outro; sob a casa, passando pelo percurso hídrico; e no nível da casa, nos caminhos promovidos pelas varandas.
Há, nessas três possibilidades, um intenso diálogo físico e visual com o exterior. Na circulação pela residência, ainda
observa-se essa característica da diversidade de percursos, sendo os caminhos principais apenas sugeridos por sua
localização e dimensões. (Figura 7)
Já na segunda casa, o percurso principal é bem definido pelo corredor linear que configura trechos de circulações
especializadas, ao conectar os volumes e tangenciar as alas de serviço e íntima, e trecho de circulação sugerida, ao
interpenetrar a ala social, comprometendo em parte a sua privacidade, já que se configura como área de passagem para o
setor íntimo. Em todos os casos, contudo, a circulação é fechada por superfícies translúcidas que definem uma
espacialidade profundamente exteriorizada, mesmo que para um espaço intramuros. (Figura 8)
Figura 6: Zoneamento e visuais - Casa das Pérgolas Deslizantes (2014) (a) e (b) zoneamento; (c) Diagrama visuais. FGMF
Fonte: MOROISHI, Juliana, 2016
(c)
(a)
zona social zona serviço zona íntima permeabilidades visuais Eixo arranjo linear
Bloqueio físico e visual
Figura 7: Circulação - Casa Grelha (2007). FGMF
Fonte: MOROISHI, Juliana, 2015
Circulação sobre a casa Circulação pela casa
Circulação sob a casa
Circulação distributiva
Circulação nas partes internas
Os elementos de composição irregulares são posicionados ora para favorecer a integração dos ambientes internos, como
se observa na inserção periférica das áreas de serviço em relação ao corpo principal da casa, e ora para promover a
compartimentação e privacidade das áreas íntimas, sendo os banheiros assimilados no intermeio dos quartos . (Figura 9)
Espacialidade
O acesso principal da Casa Grelha se dá pelo “corredor principal - varanda longitudinal”. Nela, apesar da
multiplicidade de experiências visuais e sensórias promovidas, tem-se uma tensão unidirecional que predomina sobre
as outras e que leva o olhar ao fim do eixo, que tem como ponto focal uma escadaria. (Figura 10a). Ao acessar o hall,
(a)
(b) (a)
(a)
Circulação distributiva principal
Circulação secundária
Circulação espacializada
Circulação sugerida
Figura 8: Circulação - Casa das Pérgolas Deslizantes (2014). FGMF
Fonte: MOROISHI, Juliana, 2016
elementos irregulares
Figura 9: Elementos Irregulares de Composição – (a) Casa Grelha (2007); (b) Casa das Pérgolas Deslizantes (2014). FGMF
Fonte: MOROISHI, Juliana, 2016
ambiente integrado, aberto e iluminado, a sensação é de expansão, com experiência espacial multidirecional e
múltiplos pontos focais, onde o usufruidor deve se direcionar ao setor intimo ou social. (Figura 10b)
Na Casa das Pérgolas Deslizantes, o acesso se dá na própria circulação principal, mas que, ladeada pela ala de
serviços, sugere a configuração de um pequeno hall. Há ai uma pequena compressão espacial e, pela visualização da
longa circulação contínua, um aspecto de unidirecionalidade, compensada pela abertura visual das superfícies
envidraçadas para os pátios lateral e central. (Figura 11).
Portanto, o acessar e circular nas duas casas possui uma certa ambiguidade entre a sugestão de unidirecionalidade,
determinada pela configuração geométrica do corredor e pela definição de um ponto focal ao seu fim, e de
(a)
(b)
(a)
Figura 10: Espacialidade acesso e hall - Casa Grelha (2007). FGMF
Fonte: fotos Acervo FGMF / MOROISHI, Juliana, 2016
Figura 11: Espacialidade circulação. Casa das Pérgolas Deslizantes (2014). FGMF
Fonte: fotos Acervo FGMF / MOROISHI, Juliana, 2016
muldidirecionalidade, definida pela ausência de fechamentos verticais (Grelha) ou pelo aspecto translúcido dos
mesmos (Pérgolas Deslizantes).
Transposto o hall da Casa Grelha, chega-se à sala de estar que mantém a mesma linguagem espacial do percurso anterior.
Nela, as barreiras visuais são mínimas ou nulas, sendo ela toda vedada com elementos translúcidos que, quando abertos,
promovem a integração entre interior e exterior. Neste espaço aberto, saturado de iluminação natural e com grandes
aberturas que revelam a paisagem externa, consolida-se uma experiência multidirecional, com inúmeros pontos focais de
interesse (Figura 12). A experiência é similar nas salas das Pérgolas Deslizantes, onde portas de correr que estendem os
seus limites para os pátios bilaterais, bem como a disposição de ambientes integrados, promovem múltiplos pontos focais e
claras sensações de expansão física e visual (Figura 13).
Na passagem do setor social-serviços para o íntimo do corpo principal da casa, as dimensões estreitas do corredor
promovem uma contração espacial que é abrandada pelas grandes esquadrias que o delimitam e o integram com os
módulos vazios da grelha. Assim, com um novo nível de permeabilidade visual, o percurso prepara de forma dual o
usuário para ingressar na área mais privada da casa. (Figura 14a)
(a)
Figura 12: Espacialidade estar - Casa Grelha (2007). FGMF
Fonte: fotos Acervo FGMF / MOROISHI, Juliana, 2016
Figura 13: Espacialidade estar - Casa das Pérgolas Deslizantes (2014). FGMF
Fonte: fotos Acervo FGMF / MOROISHI, Juliana, 2016
Fora do corpo principal da casa, nas passarelas-varandas que ligam as unidades habitacionais, a experiência
exteriorizada e dinâmica ainda é constante. Apenas a redução da largura destas varandas (meio módulo), é sugerida
uma sutil contração física, preparando para o acesso à área íntima. Efeitos de luz e sombra promovidos pelas
pérgolas indicam certa intimidade, uma vez que já se está na casa, mesmo que em um ambiente externo. (Figura 1 4b).
Na Casa das Pérgolas Deslizantes, após a passagem pela sala, a lateralidade das duas alas íntimas e a mudança de
eixo da circulação, sugere alguma compressão espacial e uma unidirecionalidade, mesmo que tensionada pelo
fechamento translúcido de uma das suas superfícies. (Figura 15).
Assim, nas duas casas, a passagem por um corredor íntimo confere alguma indicação de mudança de caráter, mesmo que
este seja ainda dilatado ao exterior, como nos demais percursos da casa.
Figura 14: Espacialidade corredor íntimo - Casa Grelha (2007).FGMF
Fonte: Fotos: http://www.archidaily.com.br /MOROISHI, Juliana, 2016
(a)
(b)
(a)
Figura 15: Espacialidade corredor íntimo - Casa das Pérgolas Deslizantes (2014). FGMF
Fonte: fotos Acervo FGMF / MOROISHI, Juliana, 2016
Por fim, na terminação dos percursos das duas casas, chegam-se aos quartos que promovem uma compressão
espacial em volumes mais fechados. A experiência espacial é unidirecional, com uma única e grande abertura – no
plano (Grelha) e na aresta do volume (Pérgolas) - voltada para o exterior (Figura 16).
Assim, observa-se que nas duas casas a experiência espacial é sempre exteriorizada e com tensões multidirecionais,
variando apenas em menor grau nos quartos. Na Grelha, a experiência é mais uniformizada, enquanto a passagem pela sala
da Casa Pérgolas Deslizantes cria algum contraste no percurso doméstico.
Considerações Finais
Ainda que as duas casas analisadas situem-se em terrenos com dimensões e características bem diversas uma da
outra, pode-se afirmar que os seus partidos formais se assemelham. Ambas são organizados por uma grelha
estruturadora que define um claro zoneamento atomizado, com vazios ou pátios entre si. Por outro lado, ao serem os setores
conectados por circulações-varandas abertas ao exterior, as casas promovem sensíveis promenades espaciais. O tratamento das
“partes” das suas composições, especialmente no que se refere ao arranjo de estares e percursos íntimos marcados por tensões
multiderecionais e por uma tensão unidirecional dos ambientes íntimos, também aproximam os partidos adotados.
Tais casas podem ser entendidas como herdeiras da atomização horizontalizada observada em casas modernas cariocas, a
exemplo das casas Hermenegildo Sotto Maior (1942 - Aldary Henrique Toledo); Hidelbrando Accioly (1949 - Francisco
Bolonha) e Adolpho Bloch (1955 - Francisco Bolonha). Nelas, também se observa composições aditivas organizadas
em alas e estruturadas a partir de uma modulação estrutural e compositiva, bem como o uso de varandas e pátios,
(a)
(b)
(b)
Figura 16: Espacialidade quartos - (a) Casa Grelha (2007); (b) Casa das Pérgolas Deslizantes. FGMF
Fonte: MOROISHI, Juliana, 2016/ http://www.archdaily.com.br/br/01-18458/casa-grelha-fgmf
que, em seu conjunto, buscam estabelecer uma intensa relação entre interior e exterior. Contudo, nos casos em
estudos, há de se observar uma maior transgressão, no que se deve ao fato dos arranjos assumirem, com maior
radicalidade, feições rarefeitas e atomizadas, resultando numa maior ênfase às partes do que ao todo ou ainda,
ênfase ao suporte da grelha do que o seu conteúdo como um todo .