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Publicado originalmente em: www.funape.org.br/geomorfologia (neste endereço encontram-se outras contribuições do autor). CARTOGRAFIA GEOMORFOLÓGICA CASSETI, Valter Doutor em Geografia pela USP. Professor aposentado da UFG A Cartografia Geomorfológica se constitui em importante instrumento na espacialização dos fatos geomorfológicos, permitindo representar a gênese das formas do relevo e suas relações com a estrutura e processos, bem como com a própria dinâmica dos processos, considerando suas particularidades. Para Tricart (1965), o mapa geomorfológico refere-se à base da pesquisa e não à concretização gráfica da pesquisa realizada, o que demonstra seu significado para melhor compreensão das relações espaciais, sintetizadas através dos compartimentos, permitindo abordagens de interesse geográfico como a vulnerabilidade e a potencialidade dos recursos do relevo. Ao se elaborar uma carta geomorfológica devem-se fornecer elementos de descrição do relevo, identificar a natureza geomorfológica de todos os elementos do terreno e datar as formas (Ross, 1996). Muitas são as propostas existentes para a representação do relevo. A maior unanimidade entre elas refere-se à questão do conteúdo geral dos mapas, independentemente da maneira de representação gráfica, que geralmente provoca divergência entre as diversas tendências. Portanto, “o que parece mais problemático é a questão relativa à padronização ou uniformização da representação cartográfica, pois ao contrário de outros tipos de mapas temáticos, não se conseguiu chegar a um modelo de representação que satisfaça os diferentes interesses dos estudos geomorfológicos” (Ross, 1990). Abreu (1982) procura destacar o problema da classificação dos fatos geomorfológicos, “na medida que isto é um dado fundamental para o processo de análise”. Para tal, o autor considera procedente “deslocar o eixo de abordagem do problema da escala para o problema da essência dos fenômenos que interessa ao estudo do georrelevo”. Destaca a “forma” como síntese metodológica, “procurando obter dela as informações necessárias para a compreensão da essência de sua dinâmica e das propriedades adquiridas (...)”. Defende assim uma geomorfologia mais funcionalista, na medida em que oferece subsídios de interesse geográfico. Ressalta, contudo, que o problema da escala apresenta significância “principalmente na definição do encaminhamento metodológico, na escolha dos instrumentos de investigação e no nível de resolução gráfica do tratamento cartográfico (...)”. A forma passa a se caracterizar, então, como expressão da dinâmica ou do movimento dos materiais responsáveis pela morfogênese na crosta terrestre. Com base nessa premissa, Abreu (1982) recorre aos trabalhos soviéticos, desenvolvidos principalmente após a Segunda Guerra Mundial, voltados à análise de grandes e médios espaços, utilizando fundamentalmente o método cartográfico. Para o autor, a denominada “análise morfoestrutural”, que “deveria ser chamada simplesmente de geomorfológica, tem suas raízes firmemente plantadas na obra de Penck (1924) e teve como pioneiro

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  • Publicado originalmente em: www.funape.org.br/geomorfologia (neste endereo encontram-se

    outras contribuies do autor).

    CARTOGRAFIA GEOMORFOLGICA

    CASSETI, Valter Doutor em Geografia pela USP. Professor aposentado da UFG

    A Cartografia Geomorfolgica se constitui em importante instrumento na espacializao dos fatos geomorfolgicos, permitindo representar a gnese das formas do relevo e suas relaes com a estrutura e processos, bem como com a prpria dinmica dos processos, considerando suas particularidades. Para Tricart (1965), o mapa geomorfolgico refere-se base da pesquisa e no concretizao grfica da pesquisa realizada, o que demonstra seu significado para melhor compreenso das relaes espaciais, sintetizadas atravs dos compartimentos, permitindo abordagens de interesse geogrfico como a vulnerabilidade e a potencialidade dos recursos do relevo. Ao se elaborar uma carta geomorfolgica devem-se fornecer elementos de descrio do relevo, identificar a natureza geomorfolgica de todos os elementos do terreno e datar as formas (Ross, 1996).

    Muitas so as propostas existentes para a representao do relevo. A maior unanimidade entre elas refere-se questo do contedo geral dos mapas, independentemente da maneira de representao grfica, que geralmente provoca divergncia entre as diversas tendncias. Portanto, o que parece mais problemtico a questo relativa padronizao ou uniformizao da representao cartogrfica, pois ao contrrio de outros tipos de mapas temticos, no se conseguiu chegar a um modelo de representao que satisfaa os diferentes interesses dos estudos geomorfolgicos (Ross, 1990).

    Abreu (1982) procura destacar o problema da classificao dos fatos geomorfolgicos, na medida que isto um dado fundamental para o processo de anlise. Para tal, o autor considera procedente deslocar o eixo de abordagem do problema da escala para o problema da essncia dos fenmenos que interessa ao estudo do georrelevo. Destaca a forma como sntese metodolgica, procurando obter dela as informaes necessrias para a compreenso da essncia de sua dinmica e das propriedades adquiridas (...). Defende assim uma geomorfologia mais funcionalista, na medida em que oferece subsdios de interesse geogrfico. Ressalta, contudo, que o problema da escala apresenta significncia principalmente na definio do encaminhamento metodolgico, na escolha dos instrumentos de investigao e no nvel de resoluo grfica do tratamento cartogrfico (...). A forma passa a se caracterizar, ento, como expresso da dinmica ou do movimento dos materiais responsveis pela morfognese na crosta terrestre.

    Com base nessa premissa, Abreu (1982) recorre aos trabalhos soviticos, desenvolvidos principalmente aps a Segunda Guerra Mundial, voltados anlise de grandes e mdios espaos, utilizando fundamentalmente o mtodo cartogrfico. Para o autor, a denominada anlise morfoestrutural, que deveria ser chamada simplesmente de geomorfolgica, tem suas razes firmemente plantadas na obra de Penck (1924) e teve como pioneiro

  • Gerasimov, que props, em 1946, os conceitos de geotextura1, morfoestrutura e morfoescultura (Gerasimov & Mescherikov, 1968), os quais se equivalem aos conceitos de morfotectura, morfoestrutura e morfoescultura empregados por Mescerjakov (1968). O conceito de morfotectura, morfoestrutura e morfoescultura fundamentam-se na premissa penckiana do jogo de foras, internas e externas, que atravs de um conjunto de processos responde pela gnese do modelado do relevo terrestre.

    A identificao e a classificao das formas do relevo, necessariamente implicam considerar a gnese, a idade ou ainda os processos morfogenticos atuantes (Ross, 1990). A questo da escala de tratamento ou de representao se constitui na premissa bsica para o grau de detalhamento ou de generalizao da informao.

    Demek (1976, apud Avansi, 1982) prope o seguinte encadeamento de operaes para o mapeamento de morfoestruturas:

    a) anlise das cartas geolgicas e tectnicas de reas em estudo (em escalas pequenas e grandes), com a transferncia dos principais falhamentos para uma determinada base;

    b) anlise de cartas topogrficas, em iguais escalas, com o objetivo de se elaborar uma carta das rupturas tectnicas e das formas de relevo lineares, e uma carta dos elementos do relevo segundo seus atributos morfogrficos e morfomtricos;

    c) elaborao de perfis geolgico-geomorfolgicos, com a inteno de se definirem nveis regionais e elaborao de uma estratigrafia das formas;

    d) interpretao de fotografias areas procurando especificar a gnese dos elementos do relevo;

    e) levantamento de campo para teste e correo das interpretaes, valorizando-se itinerrios previamente definidos e utilizando-se, eventualmente, de sobrevos no caso de reas de difcil acesso. Nesta fase pode-se incluir coleta de materiais para posterior anlise laboratorial;

    f) integrao da informao obtida em campo. A carta das formas de relevo resultante, considerando seus aspectos morfogrficos e morfomtricos, revista, assumindo um carter gentico, dada a existncia de elementos importantes para explicar a origem das formas e esculturao do modelado.

    Tricart (1965), ao tratar da concepo e princpios de realizao da Carta Geomorfolgica ressalta as diferentes categorias de fenmenos representados segundo a escala adotada. Como exemplo, as cartas em pequena escala, como 1:1.000.000, 1:500.000, se orientam essencialmente para os fenmenos morfoestruturais, mostrando as anticlinais resultantes de dobramentos, seus monts ou combes , ou ainda os horsts e os grabens de um processo de falhamento, feies correspondentes quarta (10 2 km 2 ) ou quinta (10 km 2 ) ordem de grandeza na concepo de A.Cailleux e J. Tricart (1956). J as cartas em grande escala, como 1:5.000, 1:10.000, 1:25.000, so capazes de registrar fenmenos ou formas com algumas dezenas de metros de comprimento, correspondentes sexta (10 -2 km 2 ) grandeza na concepo taxonmica proposta pelos autores mencionados. Nesta ltima, com os smbolos convencionais, possvel representar lbulos de solifluxo, campos de

  • lapies , boorocas, dentre outras formas especficas. Portanto, a escala da representao que permitir definir o grau de complexidade do fenmeno observado.

    Com base nas recomendaes da Sub-Comisso de Cartas Geomorfolgicas da UGI (Unio Geogrfica Internacional), a carta geomorfolgica de detalhe, em escala grande, deve comportar quatro tipos de dados: morfomtricos, morfogrficos, morfogenticos e cronolgicos (Tricart, 1965).

    a) Morfomtricos : correspondem s informaes mtricas importantes, apoiadas em cartas topogrficas ou outras formas de levantamento. Geralmente as informaes mtricas so intrnsecas aos sinais ou smbolos para a representao das formas do relevo, a exemplo de extenso de terraos ou escarpas erosivas, declividade de vertentes, dentre outras. Para se evitar a sobrecarga de informaes na carta geomorfolgica, dificultando sua leitura, os dados morfomtricos, como a declividade das vertentes, a hierarquizao da rede hidrogrfica, dentre outros, podem ser apresentados parte, em uma representao cartogrfica especfica;

    b) Morfogrficos : correspondem a formas de relevo resultantes do processo evolutivo, sendo sintetizadas como formas de agradao e de degradao. Como formas de degradao destacam-se as formas de eroso diferencial, as escarpas de falha ou erosivas, ravinas e boorocas. Como formas de agradao destacam-se depsitos aluviais em plancies de inundao, concentrao de colvios pedogenizados ou pedimentos detrticos inumados. Os aspectos morfogrficos encontram-se estreitamente ligados aos morfogenticos, ou seja, as formas geralmente expressam as respectivas gneses. Quanto s formas de relevo, o Projeto Radambrasil utiliza formas estruturais, formas erosivas e formas de acumulao, tendo sido a segunda desmembrada em formas de dissecao e formas de dissoluo na Folha SD 23 Braslia. Klimaszewski (1963, apud Fairbridge, 1968) sugere maiores especificidades para representaes morfogrficas em escala grande, como formas tectnicas e estruturais, formas influenciadas pela litologia e estrutura, formas de agradao e degradao, dentre outras;

    c) Morfogenticos : referem-se aos processos responsveis pela elaborao das formas representadas. Assim, na representao cartogrfica do relevo, as diversas formas devem figurar de tal maneira que sua origem ou sua gnese sejam diretamente inteligveis. Como exemplo, as superfcies erosivas associadas a processo de aplainamento devem conter referncias ao processo de pediplanao, identificando a gnese ligada ao recuo paralelo de vertentes em condio climtica seca, podendo incorporar referenciais de natureza cronolgica, associados ao perodo de formao, adicionando termos como de cimeira (mais antigo) ou intermontanas (mais recente).;

    d) Cronolgicos : correspondem ao perodo de formao ou elaborao de formas ou feies. A representao cronolgica pode ser expressa atravs de cores, que mesmo que adotadas com outro sentido, podem oferecer subsdios dessa natureza. Exemplo so os mapas geomorfolgicos ao milionsimo do Projeto Radambrasil, onde a cor representa os relevos conservados e as tonalidades os relevos dissecados. Partindo desse princpio, as formas estruturais e as formas erosivas, associadas a relevos conservados, encontram-se relacionadas a processos morfogenticos ou morfoclimticos bem mais antigo em relao aos modelados ps-pliocnicos referentes aos relevos dissecados. As tonalidades adotadas para deposies de materiais, como os terraos e plancies, que podem ocorrer

  • tanto nos relevos conservados como nos dissecados, mantm relaes gentico-processuais pleisto-holocnicas. Muitas vezes as informaes morfocronolgicas so incorporadas na prpria legenda, a exemplo das superfcies de aplainamento tercirias, plancie de vrzeas holocnicas, pedimentos pleistocnicos coluvionados, dentre outros. Nas representaes geolgicas as cores convencionadas expressam relaes cronolgicas das estruturas litoestratigrficas, dispostas inclusive de forma cronolgica na legenda.

    Quanto aos princpios da representao da carta geomorfolgica, Tricart (1965) considera, como primeiro passo, a necessidade de uma base cartogrfica. A adio de curvas de nvel nos mapas geomorfolgicos, extradas das cartas topogrficas, pode se constituir em alternativa para suprir a ausncia de informaes morfomtricas, desde que no sobrecarreguem os limites da lisibilidade. A base topogrfica pode proporciona ainda a adio de outras informaes morfomtricas, como a adoo de duas ou trs classes de declividade na representao. Outro aspecto para o qual o autor chama ateno refere-se importncia dos dados estruturais na representao geomorfolgica, o que no representa uma opinio unnime entre os especialistas. Os ingleses, por exemplo, limitam a geomorfologia a uma cronologia da dissecao, sem se ocuparem da estrutura dos processos. Os poloneses negligenciam praticamente a geomorfologia estrutural em suas cartas, figurando, sobretudo a cronologia denudativa' e os processos associados s formas. So, portanto dois pontos de vistas incompatveis, que negligenciam as relaes dialticas entre a estrutura e o jogo das foras externas (Tricart, 1965).

    No mtodo C.G.A2 .-Tricart, so figurados sistematicamente os dados estruturais influenciando a geomorfologia: a litologia aparece em tons pastis, sob a forma de um fundo de carta. As rochas coerentes so representadas por pontos. As rochas mveis por trama. A disposio das camadas figura atravs de smbolos, como fron t de crista monoclinal, superfcie estrutural, dentre outras formas. Apresenta-se, a ttulo de exemplo, parte de legenda de cartas geomorfolgicas detalhadas referente ao sistema CGA-Tricart ( Fig. 5.1) , constante de anexo em sua obra (Tricart, 1965). Deve-se chamar a ateno para o fato de que a metodologia em questo adequa-se mais s representaes de grande escala (maiores que 1:50.000).

    Parte de legenda (dados estruturais) proposta por Tricart (1965)

    Demek (1967) prope a utilizao de trs unidades taxonmicas bsicas nas cartas geomorfolgicas, representadas pelas superfcies geneticamente homogneas, formas do relevo e tipos de relevo3 . Portanto, nas superfcies geneticamente homogneas, como no domnio dos chapades tropicais interiores com Cerrados e Floresta de Galeria (Ab'Sber, 1965), tem-se a presena de formas de relevo representadas por processo de pediplanao (plainos e cimeira e plainos intermontanos, pedimentos escalonados, onde se constatam tipos de relevo caracterizados por vertentes com discreta convexizao, cabeceira de drenagem em dales (veredas), vales simtricos, dentre outras formas. Para o autor, a menor unidade taxonmica a superfcie geneticamente homognea, que resulta de um determinado processo ou de um complexo de processos geomorfolgicos. Essa unidade taxonmica condicionada por processos de trs origens: os endgenos, os exgenos e os antrpicos (apud Ross, 1990).

  • A preocupao quanto s relaes taxonmicas das unidades, feies ou formas a serem representadas, levaram Ross (1992) a apresentar os pressupostos metodolgicos discutidos no captulo 1 ( Fig. 1.12 ), tendo como referncia Demek (1967) e Mescherikov (1968):

    1 txon: unidades morfoestruturais que correspondem s grandes macroestruturas, como os escudos antigos, as faixas de dobramentos proterozicos, as bacias paleomesozicas e os dobramentos modernos. Essa unidade pode conter uma ou mais unidades morfoesculturais, associadas a diversidades litolgico-estruturais, guardando evidncias das intervenes climticas na elaborao das grandes formas;

    2 txon: unidades morfoesculturais, que correspondem aos compartimentos gerados pela ao climtica ao longo do tempo geolgico, com interveno dos processos tectogenticos. As unidades morfoesculturais so caracterizadas pelos planaltos, plancies e depresses, que esto inseridas numa unidade morfoestrutural. Como exemplo, na unidade morfoestrutural representada pelos dobramentos antigos, como da regio central do Brasil, insere-se o Planalto Central Goiano, a Depresso do Tocantins e a Plancie do Araguaia. As unidades morfoesculturais, em geral, no tm relao gentica com as caractersticas climticas atuais ;

    3 txon: unidades morfolgicas, correspondentes ao agrupamento de formas relativas aos modelados, que so distinguidas pelas diferenas da rugosidade topogrfica ou do ndice de dissecao do relevo, bem como pelo formato dos topos, vertentes e vales de cada padro. Como exemplo, na Folha SE.22 Goinia (Mamede et al, 1983), o Planalto Central Goiano (unidade morfoescultural, denominado de unidade geomorfolgica na referida folha) se caracteriza pela presena de quatro unidades morfolgicas (denominadas de subunidades na referida folha): Planalto do Distrito Federal, Planalto do Alto Tocantins-Paranaba, Planalto Rebaixado de Goinia e Depresses Intermontanas. Uma unidade morfoescultural pode conter vrias unidades de padro de formas semelhantes;

    4 txon: corresponde unidade de padro de formas semelhantes. Estas formas podem ser: a) de agradao (acumulao), como as plancies fluviais ou marinhas, terraos; b) de degradao como colinas, morros e cristas. Na metodologia adotada pelo Projeto Radambrasil (IBGE, 1995) no segundo conjunto de smbolos, denominado de Formas de Relevo, estas encontram-se subdivididas em trs partes: Formas Estruturais, Formas Erosivas e Formas de Acumulao. As formas estruturais so representadas pela letra S, seguida por outras letras e respectivas tradues. O mesmo procedimento adotado para as formas erosivas e para as formas de acumulao. Nos Tipos de Dissecao encontram-se trs letras bsicas: a, c e t, ou seja, formas aguadas, formas convexas e formas tabulares. Os ndices de Dissecao encontram-se sintetizados adiante ( Tab. 5.1 ), onde so combinadas cinco classes medidas na imagem de radar, correspondentes dimenso interfluvial, e intensidade de aprofundamento dos talvegues, avaliada qualitativamente, tambm representada por cinco classes;

    5 txon: corresponde aos tipos de vertentes ou setores das vertentes de cada uma das formas do relevo. Cada tipologia de forma de uma vertente geneticamente distinta; cada um dos setores dessa vertente pode apresentar caractersticas geomtricas, genticas e dinmicas tambm distintas. Ross (1992) observa que as representaes desse txon so possveis em escalas maiores, como 1:25.000. Dentre as principais caractersticas

  • geomtricas das formas das vertentes destacam-se: vertente escarpada, convexa, cncava, retilnea, dentre outras;

    6 txon: refere-se s formas menores resultantes da ao dos processos erosivos atuais ou dos depsitos atuais. Exemplo, as formas associadas s intervenes antropognicas como as boorocas, ravinas, cortes de taludes, escavaes, depsitos tecnognicos como assoreamentos, aterros, bota-foras, ou as consideradas naturais, como cicatrizes de escorregamentos, bancos de deposio fluvial, dentre outros.

    Existem grandes problemas a serem superados para se chegar a uma carta geomorfolgica de padro internacional. Uma das questes bsicas refere-se s recomendaes da Sub-Comisso de Cartas Geomorfolgicas da UGI quanto incorporao dos quatro componentes de anlise (morfomtricos, morfogrficos, mofogenticos e cronolgicos) na representao geomorfolgica de detalhe ou semidetalhe. Ao mesmo tempo em que tais componentes geralmente deixam de ser observados nos mapeamentos em escala grande, so adicionalmente registrados nos mapeamentos em escala pequena, a exemplo da escola russa, adotada por Basenina et al (1976) ao enfocarem a questo morfoestrutural, o que pode prejudicar o limite de legibilidade da representao.

    Exemplos de mapeamentos geomorfolgicos em diferentes escalas

    Procurando evidenciar os nveis de informao usualmente contidos nas diferentes escalas de representao cartogrfica do relevo, foram selecionados trs exemplos para anlise. O primeiro refere-se a uma representao em pequena escala (1:1.000.000), aprimorada ao longo do tempo pelo Projeto Radambrasil; os outros dois ltimos referem-se a representaes em escalas mdia a grande (escalas 1:50.000, produzidas por Tricart, 1978 e 1:40.000, elaboradas por Nascimento et al, 1991), procurando evidenciar as diferenas de nveis de informaes geomorfolgicas, considerando as respectivas aplicaes.

    Representao geomorfolgica em escala pequena

    Como exemplo de representao geomorfolgica em escala pequena utiliza-se de parte da Folha SE-22, Goinia, produzida por Mamede et al (1983), ao milionsimo. A rea eleita corresponde seo sudoeste do Estado de Gois, regio de Mineiros, localizada entre os paralelos 16 00 a 18 00'S e 52 00' a 53 00'W ( Fig. 5.2 ).

  • Considerando a escala da representao, o mapeamento geomorfolgico considerou os quatro primeiros txons adotados pelo Projeto Radambrasil (IBGE, 1995), conforme esquema apresentado ( Esq. 5.1 ):

    Esquema 5.1. Estrutura da Geomorfologia adotada pelo Radambrasil (IBGE,1995)

  • Os Domnios Morfoestruturais, tambm denominados de Unidades Morfoestruturais na classificao de Ross (1992), correspondem aos trs grandes conjuntos estruturais do globo. Os Domnios Morfoestruturais apresentam caractersticas geolgicas prevalecentes, tais como direes estruturais que se refletem no direcionamento geral do relevo ou no controle da drenagem principal (IBGE, 1995). Na rea eleita, os dois domnios morfoestruturais apresentam certa relao com as unidades geomorfolgicas: os Planaltos e Chapadas da Bacia Sedimentar do Paran so associados aos sedimentos paleomesozicos da referida bacia, representados pela cor verde (relevos conservados) e respectivas tonalidades (relevo dissecado). J a Depresso do Araguaia, associada s estruturas cristalinas do Complexo Goiano, encontra-se representada na tonalidade rosa, correspondendo a relevo dissecado;

    As Regies geomorfolgicas referem-se ao segundo txon da metodologia adotada pelo Radambrasil (IBGE, 1995) na elaborao da Folha SD-23 Braslia, correspondentes s Unidades Morfoesculturais discutidas por Ross (1992). Trata-se de grupamentos de unidades geomorfolgicas que apresentam semelhanas resultantes da convergncia de fatores de sua evoluo (Barbosa et al, 1984). Estas se caracterizam por uma compartimentao reconhecida regionalmente e apresentam no mais um controle causal relacionado s condies geolgicas, mas esto ligadas, essencialmente, a fatores climticos atuais ou passados (IBGE, 1995). Portanto, no so as condies estruturais ou litolgicas que lhes do as caractersticas comuns e aspectos semelhantes. O clima um fator interveniente ou integrante desse conceito. Na rea eleita ( Fig 5.2 ) as referidas unidades, embora no tratadas numa relao taxonmica e nem mesmo mencionada a condio de regio geomorfolgica, podem ser entendidas como os denominados Planaltos e Chapadas da Bacia Sedimentar do Paran, Planalto Central Goiano e pela Depresso do Araguaia;

  • O terceiro txon refere-se s Unidades Geomorfolgicas (ou Sistemas de Relevo), denominadas simplesmente de Unidades Morfolgicas por Ross (1992). Correspondem a formas fisionomicamente semelhantes em seus tipos de modelado; a similitude resulta de uma determinada geomorfognese, inserida em um processo sincrnico mais amplo. (...). Cada Unidade Geomorfolgica mostra tipos de modelado, processos originrios e formaes superficiais diferenciadas de outras (Barbosa et al, 1984). O comportamento da drenagem, seus padres e anomalias so tomados como referencial na medida que revelam as relaes entre os ambientes climticos atuais ou passados e as condicionantes litolgicas ou tectnicas (IBGE, 1995). Na Folha SE.22, Goinia, Mamede et al (1983) tratam os Planaltos e Chapadas da Bacia Sedimentar do Paran e o Planalto Central Goiano como unidades geomorfolgicas, encontrando-se a primeira constituda das subunidades Planalto Setentrional da Bacia do Paran e Planalto Maracaju-Campo Grande. O Planalto dos Guimares (Alcantilados), que aparece ao norte, foi tratado separadamente, preservando suas caractersticas regionais. A rea correspondente ao Planalto Setentrional da Bacia do Paran e ao Planalto dos Guimares recebeu duas cores verdes, correspondentes aos relevos conservados. como as formas estruturais identificadas pelas superfcies estruturais tabulares (St) e os patamares estruturais (Spt), e as formas erosivas individualizadas por superfcies pediplanadas (Ep) e superfcies erosivas tabulares (Et). As tonalidades foram atribudas s reas dissecadas, sendo as mais fortes referentes s reas mais elevadas topograficamente (reverso dissecado da cuesta do Caiap) e as mais fracas aos nveis topogrficos rebaixados (depresses anaclinais das cuestas desdobradas, correspondentes s serras do Caiap e Negra). Enquanto as superfcies pediplanadas, localizadas no incio do reverso da cuesta do Caiap testemunham marcas do aplainamento de cimeira regional (nivelado aos 1.000 metros ). J, as formas erosivas, esto presentes nos topos residuais da depresso anaclinal da cuesta do Caiap, correspondentes aos alcantis. Observa-se que a serra do Caiap se constitui no divisor entre a bacia hidrogrfica do Paran, representada localmente pelos rios Claro e Verde (Planalto Setentrional da Bacia do Paran), e a bacia do Araguaia, caracterizada pelo rio do Peixe (Planalto dos Guimares Alcantilados). O limite entre o teto orogrfico regional (reverso da cuesta do Caiap ) e os patamares rebaixados (depresses anaclinais das cuestas do Caiap e Serra Negra) marcada por fronts de cuestas desdobradas . O patamar rebaixado (correspondente depresso anaclinal da cuesta do Caiap ( 500 a 700m) caracterizado por formas dissecadas convexas, com presena de superfcies erosivas tabulares associadas aos residuais de arenito do Grupo Arquidauana, correspondentes a formas bizarras, ou relevo de alcantis na definio de Almeida (1959). O patamar rebaixado da depresso anaclinal da Serra Negra ( 400 a 500m), posicionado topograficamente abaixo do anterior, encontra-se representado cartograficamente pela mesma tonalidade, estando individualizado pelo domnio de formas tabulares. O sucessivo escalonamento topogrfico determinado por efeitos tectnicos, responsveis pelo desdobramento de cuestas , culmina com a coalescncia entre o ltimo patamar e a Depresso do Araguaia.

    OsTipos de Modelados, correspondentes ao quarto txon na classificao utilizada pelo Projeto Radambrasil (IBGE, 1995), esto contidos os grupamentos de formas de relevo que apresentam similitudes de definio geomtrica em funo de uma gnese comum e da generalizao dos processos morfogenticos atuantes, resultando na recorrncia dos materiais correlativos superficiais. Os grupamentos referem-se aos modelados nas diferentes formas (estruturais, erosivas, de dissecao e de acumulao). Nas formas ligadas dissecao evidenciam-se os modelados tabulares, convexos e aguados, com respectivos ndices que identificam a dimenso interfluvial e o aprofundamento da drenagem. No

  • recorte utilizado ( Fig.5.2 ), a dissecao representada por formas tabulares (t) no reverso da cuesta do Caiap, formas convexas (c) no nvel rebaixado da depresso anaclinal (depresso da serra do Caiap), e formas tabulares (t) no nvel rebaixado desdobrado (depresso da Serra Negra). So observados remanescentes de aplainamento (superfcie pediplanada - Ep) e superfcie estrutural tabular (St) no divisor entre as bacias do Paran e Araguaia, bem como superfcies erosivas tabulares (Et) no Planalto dos Guimares ou depresso anaclinal da cuesta do Caiap. Quanto ao grau de dissecao do relevo, tem-se a presena de manchas de formas muito dissecadas ( Tab. 5.1 ), como nas nascentes do rio Matrinx (a24, formas aguadas, com dimenso interfluvial > 250m. e = 750m e aprofundamento forte da drenagem), bem como de baixo grau de dissecao, a exemplo do reverso da cuesta do Caiap (t51, formas tabulares, com dimenso interfluvial > 3.750 m e = 12.750m e aprofundamento da drenagem muito fraco).

    Tab.5.1. Ordem de grandeza das formas de dissecao

    Com relao aos componentes da representao geomorfolgica recomendados pela Unio Geogrfica Internacional entende-se que o exemplo escolhido possui uma boa correspondncia, apesar das naturais limitaes da escala (1:1.000.000). Alguns parmetros encontram-se contidos de forma direta ou indireta na representao, como:

    a) morfomtrico: que pode ser inferido pela tonalidade, como no caso do Planalto Setentrional da Bacia do Paran, onde a mais forte corresponde s superfcies mais elevadas (relevo conservado como o reverso da cuesta) e o mais claro s mais baixas (como o relevo dissecado correspondente ao nvel rebaixado e desdobrado), dando assim a sensao hipsomtrica representao. Tambm algumas simbologias lineares expressam unidades mtricas, como front de cuesta , que no exemplo ( Fig. 5.2 ) encontra-se como portadora de desnvel acima dos 150 metros ;

    b) morfogrfico: marcado por manchas de modelados de relevo especficos, como os tabulares, os convexos ou os aguados nas formas de dissecao;

    c) morfogentico: que embora implcito na morfologia representada, pode ser inferido atravs de formas especficas, como as plancies fluviais, superfcies pediplanadas, ou mesmo as diferentes formas de dissecao vinculadas aos processos lineares e areolares;

    d) cronolgico: que tambm pode ser inferido atravs de formas especficas, como a presena de terraos fluviais, sempre ligados a processos climticos ou paleoclimticos,

  • sobretudo pleistocnicos, ou plancies fluviais, associadas s superfcies alveolares holocnicas.

    Representaes geomofolgicas em escalas mdia a grande

    Os dois exemplos de mapeamentos geomorfolgicos selecionados, correspondentes s escalas de 1:50.000 e 1:40.000, tm por objetivo evidenciar a diferenciao de parmetros empregados, considerando as respectivas especificidades.

    a) Geomorfologia de Huaraz - Peru

    Como exemplo de mapeamento geomorfolgico de escala mdia a grande (1:50.000), utilizou-se da carta de Huaraz, no Peru ( Fig. 5.3 ), elaborada por Tricart (1978), com o objetivo de mostrar a vulnerabilidade do relevo em funo de manifestaes magmticas e frente ocupao urbana. Podem ser constatados os quatros componentes de anlise geomorfolgica da representao cartogrfica, o que natural por se tratar de uma escala de semidetalhe.

    Fig. 5.3. Geomorfologia de Huaraz (J. Tricart, 1978)

  • 1 As informaes morfomtricas foram representadas atravs de curvas de nvel, que variam entre 3.100 a 3.400 metros , demonstrando que a cidade de Huaraz encontra-se numa posio de vale, onde so individualizados fluxos torrenciais de lavas vulcnicas;

    2 Morfograficamente a rea encontra-se individualizada por formas fluviais, formas glaciais, formas associadas a aes hdricas e movimentos de massa. Por corresponder a uma rea andina, em posio altimtrica elevada, os efeitos dos glaciais se fazem presentes. O elevado gradiente, ligado tectnica moderna, alm de favorecer a eroso acelerada comandada pelos fatores hdricos, como escoamentos concentrados e as formas resultantes (ravinamentos, bad-lands ), contribuem para os movimentos de massa do tipo solifluxo e fluxos de lava;

  • 3 Os elementos morfogenticos encontram-se representados atravs das formas de escoamento (fluxo concentrado, difuso) ou manifestao dos diferentes processos, como os glaciais (morainas), ligados aos fatores climticos;

    4 O componente cronolgico pode ser inferido atravs das formas representadas, com alguma informao complementar, quanto ao perodo de ocorrncia, como rebordos de terraos antigos e atuais, que permitem correlaes temporais.

    A representao procura incorporar ainda informaes de interesse direto, assumindo a carta geomorfolgica importncia como subsdio aos eventuais riscos associados ao uso e ocupao do relevo. No presente caso, Tricart (1978), fundamentado no conceito de ecodinmica, incorpora informaes baseadas nas limitaes fsicas, imprescindveis ao ordenamento territorial. Com base na espacializao dos fenmenos, observa-se que o vale de Huaraz, no Peru, encontra-se caracterizado como zona de desequilbrio latente e grave, susceptvel aos riscos de remobilizao de lavas torrenciais. As faixas imediatas so apresentadas como portadoras de desequilbrios permanentes, correlacionadas aos processos responsveis pela gnese de ravinas e bad-lands . A zona estvel corresponde ao topo interfluvial; a oeste do vale, prevalecem morainas e arcos morinicos.

    b) Geomorfologia do municpio de Goinia-GO

    Tambm com a perspectiva de subsidiar os estudos de risco urbano, Nascimento & Casseti (1991) produziram carta geomorfolgica do municpio de Goinia-GO (Fig.5.4) , na escala 1:40.000, chegando ao nvel de detalhamento correspondente ao quinto txon na classificao de Ross (1992).

  • A representao geomorfolgica do municpio de Goinia, elaborada com base em levantamento aerofotogramtrico na escala de 1:40.000, partiu do terceiro txon de Ross (1992) correspondente s unidades geomorfolgicas, que foram definidas em funo da similitude de formas de relevo e suas relaes estruturais, incorporando a posio altimtrica. Numa relao azonal foram mapeados os terraos e as plancies da bacia do rio Meia Ponte, bem como os fundos de vale que os abrigam. O padro de formas semelhantes, correspondentes ao quarto txon de Ross (1992), foi apresentado com base no grau de dissecao do relevo, comandado pela drenagem (dimenso interfluvial e grau de aprofundamento dos talvegues). O quinto txon foi individualizado pelos segmentos de formas das vertentes, como a sua geometria, alm das formas associadas a agradao e degradao do modelado, com destaque para as influenciadas pela litologia e estrutura, que foram representadas atravs de simbologias pontuais e lineares.

    As unidades geomorfolgicas foram representadas por cores, na representao original, enquanto as informaes relacionadas aos padres de formas semelhantes foram classificadas segundo processos de agradao e de degradao. Foram incorporados dados morfomtricos referentes declividade das vertentes e adoo de simbologia correspondente. As unidades geomorfolgicas foram individualizadas por trs compartimentos. H apenas uma exceo, representada por terraos e plancies, bem como pelos fundos de vales, que ocorrem indistintamente nos diferentes compartimentos (azonais).

    Planalto Dissecado de Goinia ( 920 a 950 metros de altitude), constitudo pelo domnio formas aguadas com declives superiores a 30%, correspondentes a cristas monoclinais quartzticas, e formas convexas, com declives inferiores a 20%, representando o teto orogrfico do municpio, associadas aos granulitos flsicos;

    Chapades de Goinia ( 860 a 900 metros ), constitudo por superfcies aplainadas, sustentadas por quartzitos, e superfcies rampeadas (pedimentos detrticos que coalescem com os nveis de aplainamento);

    Planalto Embutido de Goinia ( 750 a 800 metros de altitude), constitudo pelo domnio de formas convexas, com declividade de at 20%, e de formas tabulares, correspondentes a remanescentes do pediplano embutido abrigando dales ;

    Terraos e Plancies da Bacia do rio Meia Ponte ( 700 a 720 metros de altitude), individualizados em terraos fluviais suspensos, associados s influncias paleoclimticas pleistocnicas, e plancies fluviais de inundao, correspondentes aos depsitos holocnicos atuais e subatuais;

    Fundos de Vales, correspondentes a uma faixa irregular, paralela ao sistema fluvial, com declividade que pode chegar a 40%. Sua individualizao deu-se em funo de mudanas nas relaes processuais, sobretudo entre os fluxos difusos e laminares em relao aos lineares.

    A definio das unidades e respectivas caractersticas morfolgicas permitiram a identificao de riscos, que foram agrupados em trs grandes compartimentos (Casseti & Nascimento, 1991):

  • a) reas de forte risco, definidas em funo da morfologia e da vulnerabilidade eroso/assoreamento, frente s intervenes antropognicas (plancie de inundao atual, terraos fluviais, fundos de vales, domnio de formas aguadas e convexas no Planalto Dissecado de Goinia, e dales ou veredas);

    b) reas de risco moderado, como no domnio das vertentes medianamente convexas do Planalto Embutido de Goinia; e

    c) reas de baixo risco, localizadas nas sees intermedirias s anteriormente mencionadas, como no domnio de formas tabulares e suavemente convexas do Planalto Embutido de Goinia, superfcies aplainadas ou rampeadas dos Chapades de Goinia.

    Na representao proposta registram-se preocupaes quanto aos fatores morfogrficos e morfogenticos, com algumas referncias de natureza cronolgica, considerando principalmente formas associadas a processos morfogenticos pleistocnicos, como os terraos suspensos ou nveis de pedimentao. O parmetro morfomtrico foi expresso pelas classes de declividades, incorporadas s formas de dissecao: 1) predomnio de declive de 0 a 5%; 2) de 5 a 10%; 3) de 10 a 20%; 4) de 20 a 40% e 5) superior a 40%.

    Muito ainda precisa ser feito para se chegar a uma linguagem comum quanto a forma e contedo da representao geomorfolgica. Existem certos avanos no que se refere seleo de indicadores temporais e espaciais na cartografao do relevo, sem contudo haver um maior equilbrio entre os fatores que integram uma representao funcional (parmetros morfomtricos, morfogrficos, morfogenticos e morfocronolgicos), o que necessariamente passa pela questo da escala. Se a representao dos fatos geomorfolgicos ainda gera polmica, maiores so os desencontros no que se refere aos componentes da representao cartogrfica e aos componentes do relevo de interesse geogrfico. Necessrio se faz rever a discusso fomentada por Hamelin (1964) quanto subordinao da Geomorfologia Funcional Geografia Global. Abreu (1982, p. 54) lembra a importncia das influncias diretas da esculturao e o desenvolvimento subseqente dos processos morfogenticos que se projetam claramente sobre as formas de uso do solo e se refletem na intensidade da produo e em seus custos sociais, o que foi registrado por Kgler (1976). Diga-se de passagem que no apenas no nvel da cartografao dos fatos geomorfolgicos que o homem se encontra ausente.

    Klimaszewski (1963) considera o avano na cartografia geomorfolgica maior no campo conceitual que no metodolgico. Basenina & Trescov (1972) insistem na necessidade de uma crtica permanente objetivando a melhoria do mtodo e refinamento dos conceitos mobilizados. Abreu (1982) chama a ateno para a ausncia de informaes ou fatos que interessam ao povoamento regional nas cartas apresentadas por Basenina & Trescov (1972), considerando a necessidade de incorporao da noo extremamente humanista de georrelevo proposta por Kgler (1976), estimando que a geomorfologia ganhar, no mbito da geografia, uma postura coerente com sua teoria e com os objetivos daquela. Evidentemente isto depender de um esforo pessoal dos gegrafos interessados em compreender a ordenao da Terra pelo Homem, atravs de mecanismos de anlise que incorporam tambm as relaes deste com seu ambiente, valorizando uma tica que tradicionalmente tem pertencido geografia e que hoje tem conquistado adeptos tambm em cientistas oriundos de outras disciplinas.

  • Notas de Rodap

    1 Geotextura corresponde s grandes feies da crosta, associadas s manifestaes de processos a elas associados.

    2 Centre de Gographie Applique.

    3Para Demek (1967) Superfcies geneticamente homogneas so reas de geometria relativamente planas, sem apresentar quebras de relevo. Resultam de curtos estgios na evoluo do relevo decorrentes de um ou mais processos agindo em uma certa direo (variam entre algumas dezenas de metros/alguns quilmetros quadrados); Formas de relevo so constitudas pela juno de superfcies geneticamente homogneas, resultantes de um mesmo processo, mas correspondendo a estgios mais longos no desenvolvimento do relevo (alcanam algumas centenas m 2 / km 2 ; Tipos de relevo correspondem a complexo de formas, em uma rea limitada de forma relativamente distinta, com a mesma altitude, mesma gnese dependendo da morfoestrutura, originada dos mesmos processos morfogenticos numa mesma histria evolutiva.

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