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& OUTRAS VOZES # INTERNET LAB NATÁLIA NERIS MARIANA VALENTE 2017 GÊNERO, RAÇA, CLASSE E SEXUALIDADE NAS ELEIÇÕES DE 2016

Centro de pesquisa em direito e tecnologia - OUTRASVOZES · mente, além de casos de machismo contra candidatas e xenofobia contra eleitores, casos de racismo contra ambos os grupos

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&OUTRASVOZES#

INTERNETLAB

NATÁLIA NERISMARIANA VALENTE2017

GÊNERO,RAÇA, CLASSEE SEXUALIDADENAS ELEIÇÕES DE 2016

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OUTRASVOZES#

INTERNETLAB

NATÁLIA NERISMARIANA VALENTE2017

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ÍNDICE

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APRESENTAÇÃO

#1RACISMO, SEXISMO E OUTRAS DISCRIMINAÇÕES

#2UTILIZANDO TECNOLOGIA PARA MOBILIZAR IDENTIDADES E PAUTAS

Listando e trazendo visibilidade

Você tem um “match” político

Dando “matchs” no sentido estrito

O desenvolvimento de apps pelo Estado

#3 ENGAJAMENTO, PARTICIPAÇÃO E TECNOLOGIA: TEMAS PARA DEBATES FUTUROS

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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APRESENTAÇÃO

Possibilitando a troca de informações de forma não mediada pela chamada grande mídia, as redes sociais e a Internet têm sido um espaço privilegiado de veiculação de discursos e de pluralização de vozes na esfera pública. Em momentos espe-cíficos, como os períodos eleitorais, o engajamento político é intensificado: as redes sociais tornam-se palco de campanhas, debates entre cidadãos, e entre eleitores e candidatos.

Já nas eleições de 2010, 2012 e 2014, no Brasil, a Internet vinha sendo um espaço de intensa articulação e conflito, em dinâmicas que em geral transcendem o “apenas virtual”.

Naqueles três períodos eleitorais, questões relativas a gêne-ro, raça, sexualidade, origem regional e classe social estive-ram no centro de disputas discursivas, seja por conta de casos de discriminação, seja em discussões sobre implementação de políticas direcionadas a grupos subalternizados, ou ain-da por no intenso ativismo de movimentos sociais com a finali-dade de inserir demandas identitárias na agenda política.

ELEIÇÕES: MACHISMO, XENOFOBIA E RACISMO NA REDEÉ bastante emblemático da articulação na Internet em torno de questões identitárias em períodos eleitorais a criação do portal Blogueiras Femi-nistas. De acordo com as idealizadoras, o site foi criado em 2010, como resposta à constatação que fizeram de que a campanha presidencial brasi-leira de 2010 teria sido fortemente marcada pela misoginia contra a então candidata à Presidência da República Dilma Rousseff. Naquele mesmo ano, manifestações xenofóbicas no Twitter foram objeto de discussão na Internet: após a vitória de Dilma Rousseff, o Twitter foi inundado por dis-cursos preconceituosos contra nordestinos, a quem os eleitores contrários à candidata atribuíam responsabilidade pelo resultado mediante consi-derações de origem. Contra essas manifestações, armaram-se campanhas contra a xenofobia, e foram também instaurados processos judiciais.

As eleições municipais de 2012 seguiram registrando, ainda que esparsa-mente, além de casos de machismo contra candidatas e xenofobia contra eleitores, casos de racismo contra ambos os grupos.

Em 2014, dados publicados pela Safernet indicaram um aumento de 34,15% nas páginas denunciadas à organização como racistas, e de 365% nas páginas com conteúdos relacionados à xenofobia, desta-cando-se manifestações contra nordestinos. De acordo com a Safer-net, a maior parte desses sites foi criada no período eleitoral, entre 6 de julho e a semana seguinte ao segundo turno daquele ano. Apenas no dia 27 de outubro (um dia após o segundo turno da eleição presi-dencial), por exemplo, foram recebidas pela Safernet 10.376 denún-cias anônimas contra 6.909 links diferentes nas redes sociais.

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Reconstruir as linhas gerais desses importantes aconteci-mentos posteriormente, no entanto, não é nada fácil. Eles vão sendo documentados, conforme acontecem, de forma esparsa em notícias na mídia, nas redes sociais, e em blogs. E ainda não desenvolvemos maneiras muito boas de guardar a me-mória digital: nossas discussões nas redes sociais perdem-se facilmente em feeds infinitos, no apagamento de páginas e perfis, ou na decisão por “fechar” sites e redes sociais.

Foi por esse motivo que nos propusemos, para o período eleitoral de 2016 (eleições municipais), a acompanhar estru-turadamente e reportar de forma sistematizada as discus-sões ocorridas na Internet sobre esses temas, como um pro-jeto da linha de pesquisa Internet & Gênero, Raça e Outros Marcadores Sociais do InternetLab.

BREVE NOTA SOBRE O NOSSO MÉTODOAntes do início da campanha eleitoral, mapeamos perfis de militantes de Direitos Humanos em todo o país, e, no período estabelecido para pro-paganda eleitoral na rádio e na TV (26 de agosto a 30 de outubro, segun-do turno), acompanhamos suas publicações no Facebook e/ou Twitter, identificando assim as questões que lhes chamavam atenção. Ao longo das semanas, selecionamos as pautas e escrevemos sobre ela, buscando, muitas vezes, seus protagonistas, para esclarecer pontos ou oferecerem suas posições.Ao final deste material está a lista de todos os perfis que seguimos no período.

Esta publicação é uma memória dos principais debates identitários travados na Internet ou em função da In-ternet nas eleições municipais de 2016, com o objetivo de não deixar que aquelas discussões fiquem perdidas pela rede, e permitir que elas colaborem com a elaboração de reflexões sobre o presente e para contextos eleitorais futuros.

O nosso trabalho de acompanhamento identificou dois grandes grupos de fenômenos relacionados a questões identi-tárias e tecnologia no período:

casos de discriminação, preconceito ou racismo e sexismo contra candidatos(as) e eleitores(as), edesenvolvimento ou uso de plataformas e aplicativos para a visibilização de candidaturas ou de pautas.

Nesta memória, trataremos então dessas duas questões, articulando os fatos ocorridos nos dois meses da campanha de 2016 a reflexões sobre desigualdades, tecnologias da informa-ção e da comunicação (as TICs) e processos democráticos1.

[1] Agradecemos às pesquisadoras Juliana Pacetta Ruiz e Clarice Tambelli, que participaram da produção dos boletins semanais durante o de-senvolvimento do projeto Internet, Vozes e Votos.

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#1RACISMO, SEXISMO E OUTRAS DISCRIMINAÇÕES A frequência e intensidade que caracteriza a relação de uma

grande parte de nós com as TICs vem eliminando progres-sivamente a possibilidade de traçarmos fronteiras definidas entre o que ocorre “dentro” e “fora” da Internet – ou mesmo que teorizemos sobre a existência de um “ciberespaço”, ter-mo que já foi bastante popular, que serve para se referir a um lugar virtual autônomo, com regras, atores e dinâmicas pró-prias. A noção de que essa separação não existe vem sendo cada vez mais afirmada em pesquisas sociológicas e antro-pológicas sobre a Internet: as relações dentro e fora da rede são co-constituídas, ou seja, a vida offline tem efeitos sobre a online, e vice-versa. A online reflete, principalmente com o uso cada vez maior de imagens (em vez de só de texto), as relações offline, mas também a dinâmica das relações na Internet, cada vez mais se tem percebido, expande-se para muito além dela. E, assim, as hierarquias presentes na sociedade encontram na Internet também seu espaço, ainda que de uma forma nova, que merece ser observada com cuidado.

SAIBA MAIS: DINÂMICA DAS RELAÇÕES SOCIAIS E INTERNETImportantes estudos no sentido de mostrar a implausibilidade dessa se-paração entre mundo virtual e mundo não-virtual podem ser encontrados no livro “No Emaranhado da Rede: gênero, sexualidade e mídia, desafios teóricos e metodológicos do presente” organizado por Larissa Pelúcio, Heloisa Pait e Thiago Sabatine, e publicado em 2015. No mesmo sentido, recomendamos também a leitura de artigos publicados em 2011 e 2014 pelo sociólogo Richard Miskolci: “Novas conexões: notas teórico-meto-dológicas para pesquisas sobre o uso de mídias digitais” e “Negociando visibilidades: desejo e segredo em relações homoeróticas criadas on-line”, respectivamente.

No período eleitoral de 2016, um caso de racismo e sexis-mo operando simultaneamente evidenciou essa dinâmica entre acontecimentos na rede e fora dela: o então prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB), acompanhado do candidato a prefeito Pedro Paulo (PMDB), apresentando e entregando chaves de um apartamento doado a uma mulher negra, diz a ela que “trepe muito no quartinho”; em segui-da, fez afirmações no mesmo sentido ao público que assistia à inauguração, sugerindo-lhes que entrassem na fila e pegassem senha. Tratou-se de evidente caso de subalternização de uma mulher negra, algo que vem sendo apontado por teóricas do feminismo negro no Brasil, como Sueli Carneiro (que trata da “identidade objeto” da mulher negra) e Lélia Gonzalez (sobre a forma essencialmente “dominadora” nessas relações).

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SAIBA MAIS: FEMINISMO NEGROCorrente teórica que ganhou força principalmente no final da década de 1970, o feminismo negro brasileiro busca evidenciar como dinâmicas de gênero, mas também raça e classe afetam as relações sociais. Entre suas principais teóricas estão Lélia Gonzalez, Beatriz Nascimento, Sueli Carneiro, Matilde Ribeiro, Jurema Werneck e Luiza Bairros. Essas intelectuais, seguindo os passos da produção sobre antirracismo tanto do Brasil quanto do exterior,elaboraram importantes análises sobre as dinâmicas de subalternização principalmente das mulheres negras no contexto brasileiro. Gonzalez, no clássico artigo “Racismo e Sexismo na Cultura brasileira”, de 1984, e Carneiro, em “Enegrecer o Feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma pers-pectiva de gênero”, de 2003, relatam como o processo de colonização e escravidão impactaram nossas relações raciais de modo a contribuir para que às mulheres negras a identidade de sujeito fosse negada, o que gerou, dentre muitas outras conseqüências, a hipersexualização de seus corpos.

Outros acontecimentos durante o processo eleitoral trouxe-ram também à tona dinâmicas de racismo e sexismo, atingindo também candidatos e candidatas. Um deles foi o caso de Márcio Black, candidato a vereador por São Paulo pela REDE, que teve seu site, onde estavam suas propostas de campanha, derrubado por conta de ataques que sobrecarregaram seu servidor. Márcio teve de migrar para outro servidor mais seguro e, mesmo as-sim, os ataques continuaram. Em entrevista ao nosso projeto, Márcio apontou que os ataques massivos que sua página na Internet sofreu teriam relação com o perfil de sua candidatura – negro, pautando a questão racial:

[Imagem 1] Reprodução própria;Print do vídeo.

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“ O que pode ter colocado os ataques neste lugar: primeiro a questão da candidatura, que vem crescendo e o que pode ame-açar outros candidatos; e outra é a questão racial. Incomoda muita gente ver uma candidatura negra ganhando destaque e crescendo tão rápido como a nossa, então é assim que a gente lê. Eu acho que a motivação maior com certeza é muito mais o fato de ser uma candidatura negra, do que ser uma candidatura que vem crescendo. Isso deve ser o ponto fundamental na tentativa de derrubar nosso site, porque é justamente nele que estão todas nossas propostas: escolhemos o site como plataforma primeira para deixar as propostas, porque fica muito mais organizado.”

ATAQUE DoSUm website tem uma capacidade máxima de acessos (slots), a depender do servidor no qual está hospedado. Uma técnica comum de “derrubar” um site, assim, é direcionar a ele mais acessos do que ele comporta, sobrecar-regando o servidor, e fazendo com que o site acabe “caindo”. Esse tipo de ataque é chamado de “ataque de negação de serviço” (no inglês, Denial of Service – DoS). Esses ataques são muito comuns, e muitas vezes têm mo-tivação ideológica ou política. Quando acontecem com empresas ou com pessoas que dispõem de recursos, a possibilidade recuperação e defesa de informações e dados é maior.

[Imagem 2]Imagem retirada do perfil do Facebook deMárcio Black

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ENTENDA O CASONa matéria “’Feministas merecem tortura’, ouve candidata a vereadora de São Paulo” publicada na coluna da Mônica Bergamo na Folha de São Paulo, candidatas relataram algumas das situações pelas quais passa-ram. Veja trechos da matéria:“Já me perguntaram o que meu marido acha de eu me candidatar, o que uma menina tão novinha vai fazer lá. Dizem que política não é lugar pra mim”. “Tem gente que xinga mesmo, que não gosta de feminista. Fala palavrão, chama de puta, mal-amada.”(...)Em uma panfletagem na praça Roosevelt, vários homens cumprimen-tam Maíra com liberdade excessiva: pegam na cintura, passam a mão no ombro. Olham para o busto dela. Um desce a mão por suas costas. Ela se esquiva. “É muito desagradável. Aí você fica brava com o desrespeito e dizem que ‘é só um elogio’.”(...)A funcionária pública Sâmia Bomfim (PSOL), 26, já ouviu que merecia ser es-tuprada e torturada. “Disseram que o coronel [Carlos Brilhante] Ustra [agente da ditadura militar] torturou quem mereceu, como as feministas”.

Também marcaram o período eleitoral de 2016 os diferentes relatos de assédio – também chamados de machismo eleito-ral – por parte candidatas a vereadora de diferentes cidades brasileiras. Elas relataram desde tratamentos discriminató-rios, como atitudes de homens demonstrando uma liberda-de e intimidade excessiva enquanto faziam campanha, até xingamentos e julgamentos que receberam em suas páginas nas redes sociais. Interessantemente, os casos, normalmente relatados pelas candidatas na Internet, ganharam também espaço na mídia tradicional em 2016.

No período de campanha de 2016, o racismo manifestou-se, ainda, em sua faceta religiosa. A folclorização, marginaliza-ção e tratamento de uma manifestação cultural como algo primitivo ou do “mal” se fez presente um post feito no Face-book pela coordenadora de campanha de um candidato de uma cidade do interior de Minas Gerais, quando da visita de seu rival político a uma Irmandade Católica de pessoas negras (Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis),re-velando preconceitos sobre a cultura afro-brasileira e discri-minação com base em estereótipos:

“Gente estou adoecendo, orem por mim, o Cantor [o candidato rival] tá na MACUMBA, misericórdia, a coordenadora [de cam-panha] sou eu, mas me ajuda aí.”

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O post gerou uma série de reações por outros usuários, que apontaram para seu teor discriminatório, e ainda uma nota de repúdio por parte da Irmandade:

Mediante tal comentário injurioso e difamatório de nossa ex--prefeita nos cabe esclarecer primeiramente que nossa religião é católica e que nós não “adoecemos” ninguém (….) A menção no post referente à “macumba”, vale esclarecer, foi intencionalmente usada para referir-se pejorativamente as nossas seculares prá-ticas culturais, impregnadas que são pela riquíssima história da ancestralidade afro-brasileira. Uma vez que é pública e notória a conotação negativa que esta palavra adquiriu coloquialmen-te no Brasil nas últimas décadas como resultado das inúmeras ações de racismo e intolerância religiosa praticadas por diver-sos segmentos da sociedade brasileira, especialmente contra os praticantes do Candomblé, da Umbanda e das demais religiões de matriz Africana, que, como é sabido, tampouco têm e jamais tiveram em seus fundamentos religiosos tradicionais o propósito de adoecer ou causar mal algum a qualquer indivíduo.

Como já havia ocorrido recentemente com outras Irmandades Católicas tradicionais do nosso estado, infelizmente desta vez a nossa querida Irmandade do Rosário de Justinópolis é que foi a vitima do racismo e da intolerância religiosa que tanto envene-nam a nossa sociedade na atualidade. [Imagem 3]

Reprodução própria - print da página da Irmandade“Nota de Repúdio Nós da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Justinópolis, situada à Rua Francisco Labanca 189, Papine, Ribeirão das Neves - MG, comunidade Quilombola e congadeira centenária que há 128 anos engrandece a cultura deste município, viemos por meio desta nota tornar público nosso completo repúdio aos crimes de ódio (racismo e intolerância religiosa - Lei 716/8911.635/07), injúria (art. 140 do Código Penal) e difamação(art. 139 do Código Penal) praticados...”

Houve também um caso em que um candidato a vereador da cidade de Natal (Jaufran Siqueira, PMN) utilizou-se de um meme, popular recurso nas redes sociais, para referir-se à sua oposição ao discurso ou prática feministas. Ele se utilizou de um meme famoso, a “disaster girl”, com uma frase que levan-tou uma forte reação sobre discriminação e mesmo referência a violência, dessa vez contra mulheres feministas:

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O meme não só gerou uma ampla campanha contra o can-didato, inclusive no perfil dele, como fez com que ele fosse denunciado quase duas mil vezes ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE/RN). As denúncias basearam-se na interpreta-ção de que a atitude de Jaufran poderia ser enquadrada como o crime do Art. 243 do Código Eleitoral (Lei 4737/65):

“não será tolerada propaganda:(...)III – de incitamento de atentado contra pessoa”.

Ao mesmo tempo, o post recebeu uma série de manifesta-ções de apoio; em posts posteriores, Jaufran queixou-se das reações e do processo que o PMN abriu para expulsá-lo da le-genda, o que chamou censura – o PMN repudiou abertamente a postagem do candidato.

Post #1, do dia 30 de agosto de 2016

Natal: uma cidade em que as piadas precisam ser explicadasSexta passada, 26, publiquei nas minhas redes sociais um postcard em formato de meme, onde eu, utilizando de humor, mostro minha oposição ao movimento feminista.

(...) Primeiramente quero deixar bem claro que sou totalmente contrário ao movimento feminista em virtude desse movimento não defender os valores da mulher, mas sim transformá-la em um mero objeto de ação social cujo a finalidade não é a ascensão da mulher na sociedade, mas só e somente só a destruição de uma cultura que foi construída ao longo dos últimos 2000 anos no mundo ocidental.”

[Imagem 4] Imagem retirada do perfil do Facebook de Jaufran Siqueira

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Post #2, do dia 31 de agosto de 2016

“(…) Minha oposição teórico-metodológica ao feminismo tem por missão denunciar os reais objetivos desse movimento, como, por exemplo, a perversão sexual e a destruição da família. Esses ob-jetivos ficam claro em livros, por exemplo, a Shulamith Firestone em seu livro a Dialética do Sexo, nas páginas 59 e 240.

O Partido da Mobilização Nacional (PMN) da Cidade do Natal na noite do dia de 30 de agosto de 2016 abriu o processo para me expulsar da legenda, o que levaria a impugnação da minha candidatura.

Repudio essa tentativa de censura-me e prejudica-me em vir-tude do império do politicamente correto e da falta de bom senso. Lutarei até as últimas circunstâncias legais para manter viva minha candidatura e poder levar a voz dos natalenses que care-cem de representantes que falem sua voz e que não tenham medo do politicamente correto e dos movimentos de esquerda (…)”

Jaufran foi multado em R$ 10.000,00 pela Justiça Eleitoral, e, apesar de a legenda ao final ter decidido pela não impugnação de sua candidatura, não foi eleito.

De um lado, a análise do conjunto desses casos indica para a interseccionalidade no que se refere às diferentes dinâmicas de opressão com base em gênero, classe e raça; de outro, e princi-palmente, faz-se perceber que a visibilização dos casos nas redes sociais contribuiu efetivamente para a elaboração de contra-nar-rativas, e de ressignificações que tensionaram instituições. Foi o caso do Judiciário, como nos casos de Paes, Jaufran e da Ir-mandade Religiosa (na forma de denúncias/processos). Do ponto de vista cultural e político, os casos promoveram, ainda que de modo esparso e temporário, a problematização do caráter dis-criminatório e hierarquizante de nossas relações sociais – como ocorreu principalmente nos casos de machismo eleitoral. Em algum grau, ainda que impossível mensurar com precisão, esses acontecimentos impactaram o curso das candidaturas.

O QUE É INTERSECCIONALIDADE?O conceito de interseccionalidade tem sido utilizado por ativistas e acadê-micas(os) para explicitar que diferentes formas de injustiça (sejam elas de gênero, raça/etnia, classe, religião) podem estar empiricamente entrelaçadas. Para aprofundamento, recomendamos fortemente a leitura do artigo “Tudo é interseccional? Sobre a relação entre racismo e sexismo”, da teórica Ina Kerner. A autora, buscando tratar do conceito em termos menos abstratos, desenvolve-o a partir de quatro modos de relação entre racismo e sexismo: diferenças, semelhanças, acoplamentos e cruzamentos / intersecções.

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#2UTILIZANDO TECNOLOGIA PARA MOBILIZARIDENTIDADES E PAUTAS

LISTANDO E TRAZENDO VISIBILIDADE

Se, no período eleitoral de 2016, a questão das identidades foi debatida nas redes por conta de ataques e ações de discrimi-nação – algo que já estava presente nas eleições anteriores -, marcante mesmo, em 2016, foi a utilização da tecnologia pela sociedade civil para trazer à tona o debate de identidades de uma forma propositiva, por meio de aplicativos e platafor-mas. Iniciativas desse tipo foram extremamente frequentes; abaixo, tratamos de algumas que se sobressaíram.

A mais simples e visível forma de mobilização nessa linha foi a criação de listas para visibilização de determinadas can-didaturas, como foi o caso da VoteTrans, que compilou can-didaturas de travestis e transexuais, e a lista de candidaturas indígenas publicada pela Rádio Yandê.

[Imagem 5 - cima]www.nlucon.com[Imagem 6 - baixo]www.radioyande.com

É central, para essas iniciativas, a idéia de representativi-dade/protagonismo; assim, em entrevista ao nosso projeto, um dos responsáveis pela elaboração lista da Rádio Yandê afirmou:

Como em outras eleições, teve candidaturas indígenas em diver-sas regiões; a diferença agora é que a rede digital está maior e mais acessível, o que possibilitou uma maior visibilidade

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destas candidaturas. De maneira geral a gente tem uma oportuni-dade de mostrar que estamos atuando em diversas frentes no País e que a política pode ser uma delas a partir de agora. (...) Ter candi-datos indígenas nos mostra que estamos querendo ser protagonistas e propor mudanças reais para a situação das populações indígenas, quer seja através de políticas públicas ou apoio direto.- Denilson Baniwa - Liderança Indígena, grifos nossos.

As listas de visibilização ganharam força principalmente a partir das eleições de 2014 - a iniciativa Vote LGBT é um caso emblemático. Naquele ano, buscando incentivar a inclusão de pautas pró-LGBT nos programas das candidaturas, o portal não somente divulgou indicações de candidatos comprometidos com o tema, como também elaborou materiais para informar os cida-dãos sobre a dinâmica do processo eleitoral2.

[2] Publicada em cartilha desen-volvida pelos membros do “Proje-to dos membros da Comunidade LGBT Brasil no Orkut e Facebook”, disponível em: http://www.lgbtbrasil.com.br/Cartilha/cartilha_lgbtbrasil.pdf

[Imagem 7 - esq.] www.votelgbt.com[Imagem 8 - dir.] www.merepresenta.org.br

“VOCÊ TEM UM MATCH” POLÍTICO

Como um desdobramento direto da iniciativa Vote LGBT, teve considerável destaque, nas eleições municipais de 2016, o projeto #MeRepresenta. A iniciativa consistiu basicamente em estimular candidatos(as) a vereador(a)a responder a um ques-tionário identificando suas opiniões acerca de quatorze pautas relacionadas a Direitos Humanos. Respondendo às mesmas perguntas em uma plataforma, o/a eleitor/a era apresentado/a uma lista de candidatos/as com posições semelhantes.

O projeto não somente permitiu que se encontrassem can-didatos(as) com posições afins – o “match político”, como brincou uma das responsáveis pelo projeto, referindo-se aos matches dos populares aplicativos de relacionamento –, como também provocou o debate sobre os temas de direitos huma-nos em questão, colaborando para que candidatos(as) fossem transparentes sobre essas pautas.

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SAIBA MAIS: #MEREPRESENTAQuestões feitas pelo #MeRepresenta a candidatos(as) e eleitores(as):

1. Você é a favor da adoção de crianças por famílias LGBTs?2. Você é a favor do uso de banheiros por pessoas travestis e transexuais de acordo com sua identidade de gênero?3. Você é a favor de cota de 50% para mulheres no Legislativo, garantin-do representatividade étnico-racial e respeito à identidade de gênero auto-declarada?4. Você é a favor de que as escolas promovam a igualdade de gênero e raça e o respeito as orientações sexuais e identidades de gênero?5. Você é a favor de cotas raciais e ações afirmativas para a população negra?6. Você acha que a realização de cultos e o uso de símbolos religiosos em repartições públicas deveriam ser proibidos?7. Você é a favor de que homens que tenham praticado atos de violência contra mulheres sejam impedidos de ocupar cargos públicos?8. Você é a favor da descriminalização e legalização do aborto?9. Você é a favor da criminalização da lesbofobia, homofobia, transfobia e bifobia?10. Você é a favor da desmilitarização da polícia?11. Você é a favor da desapropriação de imóveis abandonados para cria-ção de moradias de interesse social?12. Você é contra mudanças no licenciamento ambiental que fragilizem a proteção de populações vulneráveis de áreas atingidas por grandes empreendimentos?13. Você é favor da abertura de maiores espaços de participação direta da população na definição do orçamento municipal?14. Você é a favor da quebra dos contratos com empresas de mobilidade que não têm auditoria de custos e uma gestão transparente?

Os idealizadores: Além do VoteLGBT, foram parceiros na concepção da iniciativa: #AgoraéQueSãoElas, Rede Feminista de Juristas (#DeFEMde), a Rede Nos-sas Cidades (Meu Rio, Minha Sampa, Minha Porto Alegre e Meu Recife), a ONG CFEMEA e o grupo LGBT Brasil.

As questões podiam ser respondidas na plataforma por candidatos(as) e eleitores(as) de todo o país, mas, contando com voluntários e voluntárias e uma organização coordenada, o projeto realizou uma procura por respos-tas sistemática e ativa nas cidades de São Paulo, Campinas, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife. Os dados fornecidos pelos idealiza-dores do projeto, após as eleições, revelam o seu alcance:

CADASTRADOS NA PLATAFORMA

Número de Candidatos

Número de Usuários

Número de Visitas

Número de Partidos

Número de Municipio

Número de Estados

889 150 mil > 1 milhão 35 244 24

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Embora não seja possível estabelecer relações causais dire-tas, em alguns casos a participação na plataforma parece ter cumprido um papel. Essa é a posição de uma das idealizadoras do #MeRepresenta, em entrevista ao nosso projeto:

Eu acho que é bem difícil medir qual foi o impacto das mobili-zações nos resultados das eleições, mas eu acho que teve um impacto nas esferas públicas. (...) Se isso pode ser traduzido em termos de candidatos eleitos eu acho que é um pouco cedo para avaliar, talvez o impacto disso não venha agora, mas para as eleições futuras. Eu acho que também mesmo essas mobilizações que atuaram durantes essas eleições têm que ter calma de que os resultados não chegam nessas eleições mas em eleições futuras, ou seja, plantaram sementes para que nós consigamos seguir desenvolvendo esses projetos e fortalecendo-os.

Se nós pensarmos na trajetória do Vote LGBT, que nas eleições passadas fez uma pesquisa própria entre os próprios voluntá-rios, tentando identificar candidaturas LGBTs em todo o Brasil, houve um salto muito grande para que nessas eleições houvesse uma plataforma que não pautasse apenas a questão LGBT mas também a das mulheres, e também o direito à cidade, envolvendo vários outros coletivos e organizações e em várias cidades, com voluntários em várias cidades. Então houve um avanço. Eu acho que ao longo do tempo esses coletivos que se dedicaram a essas eleições só terão um acúmulo de knowhow em relação às próxi-mas eleições. - Evorah Cardoso, #MeRepresenta, #VoteLGBT; grifos nossos.

Segundo Evorah Cardoso, o #MeRepresenta tem o objetivo de, durante os anos de mandato dos eleitos em 2016, tornar disponível ao público o banco de respostas, na expectativa de que este seja um mecanismo para advocacy e atuação em prol da promoção da pauta de Direitos Humanos:

[A disponibilização poderá ser] um instrumento de transparên-cia que pode ser importante para mobilização social. Seja para cobrar coerência dos candidatos que foram eleitos, seja dos can-didatos que ainda podem tentar se eleger nas próximas eleições. Nós aumentamos o número de observadores e nós temos uma métrica facilmente comparável entre eles. A partir de agora, com essa base de dados, nós abrimos um flanco de observação mas também de articulação aqueles que sejam favoráveis as pautas de determinados movimentos que querem fazer propostas. (...)

A questão é deixar essa consulta de dados mais pública e inte-rativa do que uma tabela para que sirva de fonte para advocacy. Então se você quer saber quais são os políticos favoráveis ao aborto, você encontraria essas informações com mais facilidade

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para poder articular com eles (lobby no legislativo ou outras es-tratégias de incidência) ou seja, possibilitar articulações futuras em torno de determinadas pautas de direitos humanos. - Evorah Cardoso, #MeRepresenta, #VoteLGBT; grifos nossos.

Esse modelo de produção de “match” ¬implementado pelo #MeRepresenta– uso da tecnologia da informação para iden-tificar afinidades – foi utilizado por uma série de outras ini-ciativas. Foi o caso, por exemplo, dos projetos “Vote Cons-ciente” e “Quem Representa você?” – semelhantes, porém com menor alcance.

DANDO “MATCHS” NO SENTIDO ESTRITO

E, no contexto ainda da utilização de tecnologias de asse-melhadas a sites de relacionamentos, vale apontar para uma questão controversa que surgiu nesse período de campanha: o uso mesmo do Tinder, do Happn e de outros aplicativos de re-lacionamentos por candidatos para fins eleitorais. Tratavam--se de perfis de campanha eleitoral, fazendo uso do aplicativo, aparentemente, por suas vantagens em 1 atingir um público mais jovem, 2 sem investimento financeiro e 3 criando um contato mais direto entre o candidato/apoiador e o eleitor.

Uma questão a se levantar é se um candidato ou uma candidata fazendo campanha em um aplicativo de relacio-namento está querendo sinalizar sua abertura a questões relacionadas a gênero e sexualidade, especialmente se o candidato apresentar-se como LGBT (como foi o caso em uma das candidaturas a cujo perfil em site de relaciona-mento tivemos acesso – não revelamos a identidade por preocupações com intimidade). Mas, inclusive por isso, esse uso levanta preocupações.

[Imagem 9 - esq]Estado de S. Paulo[Imagem 10 - dir]Reprodução pópria -print do aplicativo Tinder

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De um lado, parece que não há nada na legislação eleito-ral a impedir a prática. Mas como esses usos são inovações, e a legislação não é granular a esse ponto, é de se questionar, por exemplo, se seria legal um(a) candidato(a) utilizar-se de uma conta Premium em um desses aplicativos. Afinal, a legislação eleitoral proíbe propaganda paga na Internet, como posts patrocinados no Facebook (Art. 57-C da Lei n. 9504/97). Usar uma conta Premium para fazer campanha em um Tinder, por exemplo, poderia ser enquadrado nisso? E o que configu-raria propaganda, nesse caso? A mera exposição da foto e do número do candidato?

Mas uma preocupação mais palpável, independente do caráter da conta do(a) candidato(a), é se o usuário comum de um aplicativo de relacionamento não tem uma expectativa razoável de que encontrará, ali, pessoas também buscando relacionar-se. A questão é, assim, mais ética que legal; será que usuários(as) desses aplicativos, especialmente se estive-rem vivendo fora dos padrões normativos da sexualidade, não esperam que encontrarão ali pessoas com os mesmos objeti-vos, e isso faz parte das razões pelas quais se sentem à vonta-de naquele espaço? O que significa dar match com um perfil de candidatura desses – o interesse da pessoa é amoroso ou sexual, ou se está apenas querendo fazer propaganda, ou am-bos? É possível que o perfil esteja apenas simulando interesse e disponibilidade para conquistar simpatia?

O DESENVOLVIMENTO DE APPS PELO ESTADO

Se, em 2016, a sociedade civil e candidatos fizeram intensivo uso das TICs em sentidos diversos, ficou claro que também o Estado se valeu desses recursos, com objetivos que variavam desde prevenir fraudes até informar eleitores sobre locais de votação. O Tribunal Superior Eleitoral desenvolveu 11 desses tipos de aplicativos no último pleito:

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Eleições 2016 “agregador” de todos os outros apps;

Onde votar ou justificar consulta nas bases de dados da Justiça Eleitoral;

Pardal – Denúnciaspara notificar irregularidades e não conformidades nas campanhas;

Resultadospara acompanhar, em tempo real, resultados de todo o Brasil

Boletim na Mãoconferir o resultado de qualquer seção eleitoral, por meio do código QR;

Mesários complementar treinamento dos mesários e auxiliar no esclarecimento de dúvidas;

Agenda JE datas do Calendário Eleitoral e do Calendário da Trans-parência.

JE Processostrâmite dos processos eleitorais;

Candidaturas acompanhamento dos candidatos;

QRUEL para preparação das urnas e informações sobre seu corre-to funcionamento;

Checkup da urna para uso dos técnicos da Justiça Eleitoral, para manuten-ção das urnas;

Caixa 1 (TRE-MT) controle social contra Caixa 2, via consulta e envio de informações para TRE;

Radar (TRE-BA) acesso a notícias

[Imagem 11]http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-2016/aplicativos-justica-eleitoral

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#3ENGAJAMENTO, PARTICIPAÇÃO E TECNOLOGIA: TEMAS PARA DEBATES FUTUROS O uso criativo das TICs para participação política tem inspira-

do análises otimistas em relação à potencialização de experi-ências democráticas, e em pelo menos três sentidos:

a pluralização de vozes na esfera pública, e em especial pela possibilidade de elaboração de contra-narrativas diante de casos de violência e discriminação;a possibilidade de incremento da participação da socie-dade civil em processos políticos e decisórios relevantes, eo incentivo à disponibilização de informações por parte dos órgãos públicos, que, com as TICs, têm mais possibili-dades de dar mais transparência aos seus atos.

DESAFIOS À FRENTE

O olhar para o uso da Internet no período de campanha para eleições municipais,com atenção para suas intersecções com os temas de gênero, raça, classe e outros marcadores sociais,aponta para que de fato tais perspectivas podemse constituir como possibilidades. No entanto, há que se apontar e trazer à tona também ospontos críticos a serem endereçados nessa relação.

Assim, é essencial considerar que, embora os novos meios de comunicação venham permitindo a ampliação das vozes de mulheres, negros, LGBTs, é também nesses grupos que se encontram a maior proporção de pessoas sem acesso ou com acesso limitado à Internet, tendo em vista o tipo de conexão e dispositivo utilizado.

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SAIBA MAIS: DESIGUALDADES NO ACESSO

Embora não tenhamos pesquisas que revelem de modo específico as desi-gualdades de acesso tendo em vista marcadores de sexualidade e raça no Brasil, o estudo anual desenvolvido pelo CETIC.br – o mais recente publi-cado é a pesquisa TIC domicílios 2015 - revela disparidades significativas em termos renda e região no que se refere ao acesso à Internet:

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Fonte: TIC Domicílios 2015

Fonte: TIC Domicílios 2015

Na literatura norte-americana, as desigualdades no acesso à Internet são chamadas “digital divides”; as divides podem ser de diversas ordens. Pes-quisa publicada em 2016 (“Digital Denied: The Impact of Systemic Racial Discrimination on Home-Internet Adoption”), por exemplo, aponta para a desigualdade de acesso entre grupos raciais nos Estados Unidos: 81% dos brancos têm acesso à Internet em casa, em comparação com 70% dos hispânicos e 68% dos negros.

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Há que se considerar ainda que, enquanto a organiza-ção de grupos comprometidos com pautas relacionadas à garantia e promoção de Direitos Humanos é expressiva, como as iniciativas expostas neste material mesmo pare-cem indicar, observa-se concomitantemente o crescimen-to considerável de grupos responsáveis pela elaboração e difusão de discurso de ódio e intolerância.

As diferenças no acesso persistem mesmo depois de explicadas as diferen-ças de renda e uma série de outros fatores demográficos: há uma divisão entre as pessoas que estão nas mesmas faixas de renda, mas em diferentes grupos raciais ou étnicos. A diferença é mais ampla para as pessoas que ganham menos de US$ 20.000/ano: 58% dos brancos neste grupo têm alguma forma de internet em casa, em comparação com apenas 51% dos hispânicos e 50 % dos negros. De acordo com o relatório, se a renda fosse o único fator determinante, esperaríamos ver níveis de adoção mais altos para negros. Com base nos rendimentos médios, deveríamos esperar que 69% dos lares hispânicos e 68% dos lares negros tivessem acesso à Inter-net em casa, mas os níveis reais de adoção destas populações são de 66% e 62%, respectivamente.

Fonte: Freepress.net

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Saiba mais: discurso de ódio e intolerância na redeAinda pouco explorado em pesquisas acadêmicas no Brasil, os ataques massivos a pessoas pertencentes a minorias (tais como mulheres, negros, LGBTTs) tem sido cada vez mais frequentes. Reportagens investigativas apontam para a existência de “gangues virtuais” que, rivalizando entre si, buscam “poder” medido pelo acúmulo de curtidas e compartilhamentos no Facebook. Na matéria “No submundo das gangues virtuais” publicada pela Revista Época é possível se aproximar do modo de organização e tá-ticas utilizadas por tais grupos – compostos majoritariamente por jovens – dentre eles menores de idade. O Judiciário tem sido confrontado com questões como essa, e também as plataformas vêm desenvolvendo políticas para lidar com o fenômeno – ver, por exemplo, matéria publicada pelo Estado de São Paulo: “Aumento do abuso e humilhação online preocupa empresas e assusta usuários”.

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Conforme apreendemos dos contatos feitos durante o pro-jeto, outra questão que os grupos que mobilizam em favor de direitos humanos enfrentam é a do custo das iniciativas. Assim, por exemplo, idealizadores do #MeRepresenta rela-taram que a continuidade do projeto no sentido de acompa-nhamento de legislaturas dependerá de financiamento co-letivo, dado que o projeto não conta com apoio ou recursos próprios – o que é realidade para outras tantas iniciativas da sociedade civil.

Quando tratamos das iniciativas estatais, sejam as de faci-litar a vida do cidadão, como os aplicativos que mencionamos acima, sejam aquelas que incrementam a transparência do Estado, há que se considerar as diferenças nas capacidades tecnológicas de cada ente. A título de exemplo, a última pes-quisa sobre o uso de TICs no setor público revela diferenças substanciais: no executivo público municipal, quase a tota-lidade (96%) das capitais dispõem de uma área específica de Tecnologias da Informação, enquanto que em municípios do interior essa taxa é de 41%.

A articulação entre os temas centrais deste projeto (Inter-net, violência e discriminação, inclusão e participação em processos democráticos) está em pleno desenvolvimento, e para onde apontarão as interseções depende também de que outras mobilizações, estatais, da sociedade civil e empre-sariais aconteceram nos anos que vêm. Que nesse caminho não fiquem perdidos na rede os acontecimentos de 2016.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAIRROS, Luiza. (1995) “Nossos feminismos revisitados” Revista Estudos Feministas. N. 02, p. 458-463. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/ viewFi-le/16462/15034.

CARNEIRO, Sueli (2003). “Enegrecer o feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma perspectiva de gênero”. Revista Estudos Avançados 17 (49). Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ea/v17n49/18400.pdf

GONZALEZ, Lélia (1984). “Racismo e Sexismo na Cultura brasileira”. In: Revista Ciências Sociais Hoje, Anpocs, 1984, p. 223-244.

KERNER, Ina. (2012). “Tudo é interseccional? Sobre a relação entre ra-cismo e sexismo”. Traduzido por Bianca Tavolari. Novos estud. - CEBRAP [online]. 2012, n.93, pp.45-58. ISSN 0101-3300. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-33002012000200005.

MISKOLCI, Richard. (2011) “Novas conexões: notas teórico-metodológicas para pesquisas sobre o uso de mídias digitais”. Cronos: Revista do Progra-ma de Pós-Graduação em Ciências Sociais, v. 12, n.2, p. 9-22.

_____________. (2014) “Negociando visibilidades: desejo e segredo em relações homoeróticas criadas on-line”. In Bagoas. Natal: UFRN, 2014, v.8, pp. 51-78.

_____________. (2015) “Do armário à discrição? Regimes de visibilidade sexual das mídias de massa às digitais”, in PELÚCIO, Larissa; PAIT, Heloísa; SABA-TINE, Thiago. No Emaranhado da Rede: gênero, sexualidade e mídia; desafos teóricos e metodológicos do presente. São Paulo: Annablume.

PELÚCIO, Larissa.; PAIT, Heloísa; SABATINE, Thiago. (2015) “Apresenta-ção”, in No Emaranhado da Rede: gênero, sexualidade e mídia; desa-fos teóricos e metodológicos do presente. São Paulo: Annablume.

PELÚCIO, Larissa. (2015) “O amor em tempo de aplicativos: notas afetivas e metodológicas sobre pesquisas com mídias digitais”, in PELÚCIO, Laris-sa; PAIT, Heloísa; SABATINE, Thiago. No Emaranhado da Rede: gênero, sexualidade e mídia; desafos teóricos e metodológicos do presente. São Paulo: Annablume.

Pesquisa sobre o uso das tecnologias de informação e comunicação no setor público brasileiro: TIC governo eletrônico 2015 [livro eletrônico].Survey on the use of information and communication technologies in the brazilian public sector: ICT electronic government 2015 / [coordenação exe-cutiva e editorial/ executiveand editorial coordenation Alexandre F. Barbosa; tradução para o inglês/translationintoEnglish Prioridade Consultoria]. - São Paulo: Comitê Gestor da Internet no Brasil, 2016. 3.7 Kb; PDF

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LISTA DOS BOLETINS PUBLICADOS SEMANALMENTE NO PROJETO INTERNET, VOZES E VOTOS 2016

Semana 1 Mobilização na Internet, Identidades e Instituições

Semana 2 Direitos Humanos em pauta

Semana 3 Campanhas, Likes e Matches

Semana 4 Relações Raciais em Pauta

Semana 5 Candidaturas Indígenas em Pauta

Semana 6 Plataformas, aplicativos e política

Semana 7 Relações de gênero e as eleições

Pesquisa sobre o uso das tecnologias de informação e comunicação nos domícilios brasileiros [livro eletrônico]: TIC domicílios 2015. Sur-vey on the use of information and communication technologies in brazilian households: ICT households 2015 / Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR [editor]. - São Paulo: Comitê Gestor da Internet no Brasil, 2016.

Turner, S. Derek. (2016) Digital Denied: The Impact of Systemic Racial Discri-minatio non Home-Internet Adoption. Freepress.net. Disponível em: http://www.freepress.net/sites/default/files/resources/digi-tal_denied_free_press_report_december_2016.pdf

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ATIVISTA / ORGANIZAÇãO

Carla AkotireneJéssica IpólitoSandra MuñozPareta CalderaschLarissa SantiagoPaula VianaPriscila EstevãoMarli SoaresViviana SantiagoAna Flor Fernandes RodriguesMaria do Socorro SilvaLola AronovichCleo SilvaSonia GuajajaraGlaucia TavaresAgá MelinoLuana TolentinoCélia XakriabáCarol DamiáBia BagagliDrika SouzaAna AmorimSâmia BonfimStephanie RibeiroDjamila RibeiroAmara MoiraThiane NevesLeticia YawanawaValdelice VeronDaiara TukanoJacqueline GomesEliane OliveiraSimone Cruz

CIDADE / ESTADO

Salvador | BASalvador | BASalvador | BASalvador | BASalvador | BAIlhéus | BAJoão Pessoa | PBJoão Pessoa | PBRecife | PERecife | PERecife | PERecife | PEMaceió | ALImperatriz | MARio de Janeiro | RJRio de Janeiro | RJBelo Horizonte | MGBelo Horizonte | MGOuro Preto | MGCampinas | SPSão Paulo | SPSão Paulo | SPSão Paulo | SPSão Paulo | SPSão Paulo | SPCampinas | SPBelém | PARio Branco | ACJaporã | MSBrasília | DFBrasília | DFSarandi | PR Vale do Rio Sinos | RS

TEMÁTICA

Gênero - Racial - NegrosGênero - Racial - NegrosGênero - Racial - SexualidadeRacial - NegroGênero - Racial - NegrosRacial - IndígenaGênero - Racial - NegrosGênero - SexualidadeGênero - Racial - NegrosRacial - Negro - SexualidadeGêneroGênero - SexualidadeGênero - Racial - NegrosGênero - Racial - IndígenasGênero - Racial - Negros - SexualidadeGênero - SexualidadeGênero - Racial - NegrosGênero - Racial - IndígenasGênero - Racial - NegrosGênero - SexualidadeGênero - SexualidadeGênero - Sexualidade - SaúdeGêneroGênero - RacialGênero - RacialGênero - SexualidadeGênero - Racial - NegrosRacial - IndígenaGênero - Racial - IndígenaGênero - Racial - IndígenaGênero - Racial - indígenaGênero - Racial - NegrosGênero - Racial - Negros

LISTA DE ATIVISTAS

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@Equipe do Projeto Diretora Mariana Giorgetti Valente Coordenadora de projeto Natália Neris Pesquisadoras Juliana Ruiz e Clarice Tambelli

Equipe Institucional Diretor Presidente Dennys Antonialli Diretor Francisco Brito Cruz Diretora Mariana Giorgetti Valente

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