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Centro Universitário de Belo Horizonte Bacharelado em Relações Internacionais A EMERGÊNCIA DE UM PODER NÃO-ESTATAL BASEADO NA SOCIEDADE CIVIL Bruno Kenji Yokoi Belo Horizonte 2007

Centro Universitário de Belo Horizonte · 2.2 Consequências da globalização ... causas e conseqüências. Serão apresentados diversos . 5 conceitos sobre a globalização, posteriormente

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Centro Universitário de Belo Horizonte Bacharelado em Relações Internacionais

A EMERGÊNCIA DE UM PODER NÃO-ESTATAL BASEADO NA SOCIEDADE CIVIL

Bruno Kenji Yokoi

Belo Horizonte 2007

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Bruno Kenji Yokoi

A EMERGÊNCIA DE UM PODER NÃO-ESTATAL BASEADO NA SOCIEDADE CIVIL

Monografia apresentada no programa de Bacharelado em Relações Internacionais do Centro Universitário de Belo Horizonte como requisito parcial para a obtenção do título. Orientadora: Sylvia Marques.

Belo Horizonte 2007

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________ Yokoi, Bruno Kenji 2007 A emergência de um poder não-estatal baseado na sociedade civil /

Bruno Kenji Yokoi. - 2007 63p. Orientadora: Sylvia Marques Monografia (graduação). Centro Universitário de Belo Horizonte – UNI-BH / Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Gerenciais (DCJPG)

CDD:________

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UNI-BH - Centro Universitário de Belo Horizonte Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Gerenciais (DCJPG)

Monografia intitulada “ A emergência de um poder não-estatal baseado na sociedade civil”, de autoria do aluno Bruno Kenji Yokoi, aprovada pela banca examinadora constituída pelos seguintes professores: ________________________________________________________

Profa. Sylvia Marques – DCJPG/ UNI-BH – Orientadora

________________________________________________ Prof. Rafael Ávila – DCJPG/ UNI-BH

________________________________________________ Prof. Leonardo César Souza Ramos – DCJPG/UNI-BH

Coordenador do Curso de Relações Internacionais do UNI-BH

Belo Horizonte, 14 de dezembro de 2007

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RESUMO

O objetivo deste trabalho é identificar a emergência de um poder não-estatal

baseado na sociedade civil. Desta maneira, serão analisadas questões como

globalização, interdependência complexa, governança global e a ordem mundial,

revolução tecnológica da informação e algumas conseqüências destas para o sistema

internacional baseado nos Estados e para a sociedade civil. Todas estas questões, de

uma maneira interdependente, contribuem para sustentar a possibilidade de

identificação do poder da sociedade civil global nas relações internacionais de maneira

favorável.

ABSTRACT

The objective of this work is to identify the emergency of a non-state power

based on the civil society. In this way, it will be analyzed matters like globalization,

complex interdependence, global governance and world order, information technology

revolution and some consequences for the international system based on States and for

the civil society. All this matters, in an interdependent way, support the possibility of

identification of the global civil society power in the international relations in a positive

way.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .............................................................................................01

2 GLOBALIZAÇÃO, SUAS CONSEQUÊNCIAS E A REVOLUCAÇÃO

TECNOLÓGICA DA INFORMAÇÃO........................................................06

2.1 Discutindo o conceito de globalização.............................................................09

2.2 Consequências da globalização........................................................................12

2.3 A revolução tecnológica da informação ..........................................................14

2.4 A influência da globalização no sistema westphaliano de Estados..................21

3 GOVERNANÇA GLOBAL E INTERDEPENDÊNCIA COMPLEXA.....26

3.1 Interdependência complexa..............................................................................27

3.2 A governança global e a ordem mundial...........................................................30

3.3 As conseqüências para o Estado........................................................................38

4 SOCIEDADE CIVIL GLOBAL E A EMERGÊNCIA DE UM PODER

NÃO-ESTATAL..............................................................................................44

4.1 A sociedade civil global...................................................................................45

4.2 A emergência de um poder não-estatal.............................................................49

5 CONCLUSÃO................................................................................................57

BIBLIOGRAFIA...........................................................................................................60

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01 - INTRODUÇÃO

Através de fenômenos contemporâneos, o sistema internacional sofreu diversas

mudanças em suas dinâmicas. A globalização revolucionou radicalmente os meios de

comunicação e as “distâncias” entre os países, sem contar com o sensível “enfraquecimento”

de suas fronteiras.

A globalização é o primeiro fenômeno a ser analisado neste trabalho, assim como suas

conseqüências para o sistema atual. A revolução tecnológica da informação, principalmente

nos meios de comunicação e transporte, alterou a dinâmica e intensidade do fluxo de pessoas

e informações. As viagens passaram a acontecer em tempo muito menor do que anteriormente

e, as informações agora podem ser passadas e compartilhadas praticamente de forma

instantânea. Além disso, a internet definitivamente revolucionou todo o planeta em todos os

setores ao conseguir conectar todo o mundo através de computadores, permitindo uma troca

de informações extremamente eficiente, que trouxe conseqüências para todas as áreas,

principalmente a econômica.

Concomitantemente, acompanhamos a idéia de supraterritorialidade, diminuindo as

barreiras dos contatos transnacionais. As pessoas se interagem de maneira muito mais “fácil”

do que anteriormente. Há idéias de um espaço comum, um local onde todos vivem, um espaço

único de relações sociais. Uma idéia de unidade, compartilhando informações e problemas em

comum.

Neste contexto, o advento da globalização, somado à interdependência complexa,

trouxe temas à agenda como o terrorismo e a poluição ambiental. Assim, esses temas

demonstram uma preocupação dos Estados que não mais podem controlá-los somente com

ações domésticas. Uma parte da autoridade estatal passou para coletividades sub-nacionais,

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fazendo com que algumas funções da governança estejam sendo executadas por atores não-

estatais (Scholte, 2004).

Desta maneira, a governança é caracterizada por ações em busca de objetivos em

comum, não dependendo de poder de polícia para ser executada. Dito isso, a governança

inclui atores não-estatais, que agem de maneira determinada, condizente à suas necessidades e

objetivos. Fica claro, porém, que a governança, sendo um sistema de ordenação, só funciona

sendo aceita pela maioria dos atores.

Juntamente a governança, a ordem exerce papel fundamental. Caracterizada por um

conjunto de entendimentos rotineiros entre os atores, a ordem mundial apresenta dois tipos de

entendimentos: a) os fundamentais, como a diplomacia, a cooperação e o conflito; b) os

rotinizados, como o comércio. Esses entendimentos intencionais ou não, sustentam a ordem

mundial. Assim, a governança global, faz com que os atores (governamentais ou não) aceitem

princípios, normas, regras e procedimentos em prol de objetivos comuns (Rosenau e Ernst-

Otto, 2000).

A abrangência da agenda global, a globalização, a interdependência complexa e a

governança global levaram o mundo a adquirir uma série de procedimentos e valores comuns.

Pautado nesses itens em comum, o poder da sociedade civil, principalmente ONGs, emerge

no sistema internacional de maneira que ensaiam papéis que antes só eram pensados em

termos de Estado.

Assim, a globalização nos remete à idéia de interdependência complexa (Keohane e

Nye, 2001). A interdependência, caracterizada pelo “estado de mútua dependência” (Sarfati,

1999:164), demonstra a complexidade das relações envolvendo os diversos atores do sistema

internacional, não se restringindo apenas ao nível das relações entre Estados, montando uma

rede onde os efeitos são recíprocos e os Estados estão vulneráveis e sensíveis à

acontecimentos no sistema internacional.

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A interdependência complexa apresenta então três características que são percebidas

atualmente, ainda mais com os efeitos da globalização. São elas: os canais múltiplos, a

ausência de hierarquia entre os assuntos e o menor papel a força militar (Keohane & Nye,

2001).

Os canais múltiplos são compostos pelas relações informais entre os atores (elites

governamentais, não-governamentais e organização internacionais (OIs)). Assim, acontece

uma maior troca de contatos de indivíduos, que podem afetar as relações interestatais. Fica

claro então, que essa característica afeta (proporcionalmente) a sensibilidade tangente à

interdependência entre os Estados.

A ausência de hierarquia entre os assuntos mostra que a agenda internacional não é

mais somente pautada por assuntos militares. Assim, não existiria uma hierarquia entre os

assuntos militares e não-militares, dando espaço e importância para assuntos como meio-

ambiente e cooperação econômica.

O menor papel do poder militar diz respeito à emergência desses novos assuntos na

agenda internacional. O poder não se restringe apenas ao nível militar, assim como suas

fontes. Então, questões como meio-ambiente e economia estariam assumindo um papel maior

e se igualando ou ultrapassando a importância militar.

A interdependência complexa envolve tamanho grau de sensibilidade entre os Estados,

onde cada ação gera uma conseqüência que pode atingir todo o sistema internacional. Tal grau

de dependência transmite uma idéia de governança global, a existência de uma ordem, mesmo

na ausência de uma autoridade central.

A análise se pauta na crescente participação política e popular da sociedade civil.

Participação tanto em Organizações Internacionais como em mobilizações de opinião pública

transnacional acerca de questões que antes eram debatidas somente pelos Estados. Assim,

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forma-se uma agenda, não nova, mas de acesso mais amplo e possivelmente mais vulnerável

às ações realizadas em âmbito civil.

Neste sentido, a sociedade desempenha um novo papel no cenário internacional. Um

papel de pressão aos governos, possibilitado pela emergência de um poder baseado na própria

sociedade civil. Uma sociedade dotada de poder para perseguir seus objetivos em um sistema

que antes era monopólio estatal no que tange à atores (westphaliano).

Diante de tal cenário, complexo, interdependente e visivelmente diferente do que

antes, surge a seguinte pergunta, a qual originou este trabalho: É possível identificar a

emergência de um poder não-estatal? Assim, partindo da hipótese de que sim, busca-se a

identificação de tal poder.

As mudanças no sistema, que aconteceram mais rapidamente nos últimos anos,

demonstram que essa nova dinâmica possibilita a emergência de um novo poder. Assim, este

trabalho se justifica ao tentar demonstrar em como estas mudanças sistêmicas possibilitaram

um poder novo e não-estatal ascender no sistema internacional contemporâneo, contrariando o

sistema westphaliano de Estados.

O presente trabalho então, expõe as conseqüências da globalização e como esse

fenômeno, somado à governança global e à interdependência complexa possibilitou a

emergência de um novo tipo de poder, um poder que não se baseia no Estado westphaliano,

mas na sociedade civil transnacional.

O trabalho parte da discussão acerca da globalização e suas conseqüências no capítulo

primeiro. A revolução tecnológica da informação também se faz presente nesta primeira fase

de maneira à tornar a explanação mais completa, uma vez que este fenômeno acontece ao

mesmo tempo em que a globalização, criando uma situação de interferência mútua.

Este capítulo abordará então, o fenômeno denominado de globalização, apresentando

suas possíveis origens, conceitos, causas e conseqüências. Serão apresentados diversos

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conceitos sobre a globalização, posteriormente se discutirá as causas, ou fenômenos, que

possibilitaram e/ou facilitaram a ocorrência do fenômeno. Não obstante, se discutirá as

conseqüências que a globalização trouxe para o sistema internacional.

Por fim, um breve relato sobre a Terceira Revolução Tecnológica. Através deste relato

se demonstrará a intensidade desta revolução, assim como as principais transformações,

principalmente nos meios de comunicação, criando um ambiente favorável à globalização.

Também serão analisadas mudanças que revolucionaram não somente a comunicação, mas

também os transportes, produção e a economia.

Em um segundo momento, no capítulo seguinte, é discutido a Interdependência

Complexa e a Governança Global, expondo seus conceitos e características de maneira à

buscar embasamento teórico para o trabalho. A crescente dependência mútua entre os países e

a possibilidade de uma governança global sem que de fato haja um governo são discutidas

neste capítulo que, assim, demonstra características sistêmicas essenciais para a análise.

Por fim, no terceiro e último capítulo, a sociedade civil é tema de exposição.

Sociedade esta, que desempenha um papel de suma importante para o trabalho, pois a partir

dela que, neste mesmo capítulo, será feita uma análise de todos os conceitos expostos. Tal

análise, ao interligar todos os assuntos abrangidos aqui, terá como fim a identificação da

emergência de um novo poder, não-estatal, baseado na sociedade civil transnacional.

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02 - A GLOBALIZAÇÃO, SUAS CONSEQÜÊNCIAS E A REVOLUÇÃO

TECNOLÓGICA DA INFORMAÇÃO

Para identificar a emergência de um poder não-estatal nas relações internacionais

contemporâneas, o primeiro passo é uma análise acerca globalização, uma vez que ela

possibilita uma integração entre as pessoas, criando um ambiente transnacional, onde as

pessoas possuem problemas e objetivos em comum, mesmo que diversificados e não tão

profundos.

O fenômeno contribui de maneira inestimável para que se identifiquem as demandas

comuns e que se articule as pessoas em diversas partes do planeta. Assim, facilitando as

interações entre eles para que possam vir a pressionar quem quer que seja e agir

coletivamente, somando forças de maneira a conseguir um poder para chegar aos objetivos

comuns.

O termo globalização começou a ser usado na década de 1960 e, desde então é

utilizado para os mais diversos fins. O fenômeno se torna importante por além de ser um

fenômeno que atinge as relações sociais contemporâneas, muda toda uma dinâmica de

interação entre as pessoas (Held e McGrew, 2001). Assim, deu-se o nome de globalização ao

fenômeno que se manifesta através da reorganização da produção, de indústrias transpassando

barreiras e fronteiras, da difusão dos mercados financeiros e de bens de consumo idênticos

para países distantes e do deslocamento massivo de população (Mittelman, 2000).

Contudo, antes de expor os conceitos para o termo, cabe avaliar as possíveis origens

para o fenômeno. Mittelman (2000) identifica três explicações sobre onde a globalização teria

se iniciado. A primeira, e também mais antiga, seria a hipótese de que a globalização se

iniciou no mesmo momento em que se originou a civilização. Assim, a globalização parte dos

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primeiros contatos feitos através de conquistas, comércio e migração, alterando a percepção

de espaço.

A segunda hipótese colocada pelo autor seria a de que a globalização teria se iniciado

durante o desenvolvimento do capitalismo na Europa no século dezesseis. Assim, alterações

na relação entre o capital e o trabalho, atuando em conjunto com as inovações tecnológicas,

possibilitaram o capitalismo se espalhar por todo o mundo.

Por último, a globalização teria se iniciado nas alterações fundamentais do próprio

capitalismo. Após a recessão da década de 1970, as pessoas esperavam por uma nova ordem

econômica mundial e, com a queda do sistema de Bretton Woods, as economias passaram a

focar a exportação ao invés do investimento no mercado interno. Assim, as empresas,

buscando maiores lucros, abandonaram o fordismo e passaram a adotar operações mais

flexíveis de capital e intensivas em tecnologia.

Tal fenômeno, porém, teve um ponto de partida. Quatro questões em conjunto

possibilitaram, segundo Scholte (2000), a emergência da globalização. São elas: a)

propagação do racionalismo como uma estrutura dominante do conhecimento; b) mudanças

no desenvolvimento do capitalismo; c) inovações tecnológicas nas comunicações e

processamento de dados e; d) a construção de estruturas regulatórias.

O racionalismo, segundo Scholte (2000), possui quatro características. Primeiro,

define o mundo como físico, não considerando forças como divinas. Segundo, é

antropocêntrica, analisa a realidade levando em conta os interesses e ações humanas. Terceiro,

o racionalismo possui um caráter científico, mostrando que a explicação para um fenômeno

pode ser obtida através de métodos de pesquisas objetivos e, indo além, demonstrando que

estas verdades possuem validade transplanetária. Por fim, o racionalismo é instrumental, pois

atribui grande valor à perspicácia, que permite que as pessoas resolvam problemas imediatos.

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Desta maneira, o racionalismo, por meio destas quatro características, possibilitou a

invenção tecnológica, a evolução capitalista e, através do antropocentrismo, a idéia de o

planeta como unidade, como um lugar em comum. Assim, o racionalismo possibilitou o

desenvolvimento das outras três questões que impulsionaram a emergência da globalização,

mudando o modo de se construir o pensamento.

O capitalismo1, por sua vez impulsionou a globalização quando empresas buscaram

mercados globais, cruzando fronteiras e buscando consumidores em outros Estados. Além

disso, a lógica capitalista de maximização dos lucros fez com que as empresas alterassem o

modo de produção de local para global, passando a atuar em diferentes Estados com o

objetivo de menores gastos.

A mobilidade do capital, característica da supraterritorialidade fez com que uns

Estados se tornem mais atrativos do que outros para receberem investimentos, dando poder

para as empresas os pressionarem por melhores condições. Além disso, o capitalismo criou

novas formas de obter ganhos no cenário internacional, e assim alcançar a acumulação

inerente à sua lógica.

Já a construção de estruturas regulatórias, facilitou as transações internacionais,

criando regras e procedimentos padrões e, após algum tempo, possibilitando a globalização da

moeda. Assim, a regulamentação beneficiou a globalização através da criação de padrões

técnicos e de processos, liberando as transações entre fronteiras, tanto de dinheiro como de

investimentos, de bens e serviços; garantia do direito de propriedade para o capital global, e

por fim, a legalização das atividades e organizações globais.

As inovações tecnológicas exercem um papel crucial para a globalização, fornecendo

infra-estrutura para a mesma. As inovações possibilitaram uma revolução nos meios de

comunicação, transportes e produção. Essas mudanças tecnológicas mudaram as dinâmicas

1 Segundo Scholte (2000), o capitalismo é entendido como estrutura de produção onde a atividade econômica é orientada à acumulação em excesso.

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dos mercados, dos relacionamentos sociais, da disseminação da informação e certamente

alteram a relação espaço-tempo. Fica visível a importância da revolução tecnológica para a

globalização. A discussão se torna importante também para este trabalho, uma vez que altera

a dinâmica das relações entre as pessoas. Essa alteração leva à uma dinamização dos

relacionamentos interpessoais, ao mesmo tempo em que a mudança na relação espaço-tempo

leva à uma maior “proximidade” entre elas, possibilitando a interação e a identificação de

pontos em comum.

2.1 - Discutindo o conceito de globalização

A discussão do conceito do termo globalização se apresenta como relevante, uma vez

que o termo e suas características dão bases para o trabalho. Talvez a mais discutida questão

acerca das incertezas concernente à globalização seja o seu conceito, a maneira como definir

tal fenômeno de forma que expresse a complexidade de todas as áreas que ela atinge, assim

como conseqüências. Cotidianamente, ouvimos que a globalização é tudo e, ao mesmo tempo,

afeta tudo, recebendo crédito por muitos fatos que atingem o sistema internacional. Porém, o

termo nunca é exposto de maneira clara e objetiva.

Diversos pensadores e intelectuais trabalham ou trabalharam em cima da criação de tal

conceito, mas nunca se chegou a um resultado que satisfizesse todas as áreas que a

globalização atinge. Apesar disso, grande parte da mídia e da população tende a relacionar o

fenômeno à economia. A economia pode ser, sim, um dos principais pilares, mas certamente

não é o único.

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Sarfati (2005) aponta a globalização de maneira que se caracterizaria pela queda das

barreiras tradicionais entre os Estados, conseqüente do avanço tecnológico. Portanto, tal

fenômeno deve abranger as relações humanas em todos os aspectos, incluindo a economia,

mas também a cultura, o meio-ambiente, a educação, a mídia etc.

Os conceitos são vários, como é evidenciado por Held e McGrew (2001). Para os

autores a globalização pode ser entendida como: a) um fenômeno que possibilita que uma

ação atinja um terceiro à distância; b) compressão espaço-temporal, entendida como resultado

da evolução tecnológica; c) aumento da interdependência; d) processo de diminuição do

mundo, devido ao rompimento de barreiras e fronteiras e outros, como integração global e

reordenação das relações de poder entre regiões (Held, 2001).

Scholte (2002), por sua vez, apresenta quatro maneiras em que a globalização é

entendida. São elas: internacionalização, liberalização, ocidentalização e universalização,

cada uma delas será exposta. Por fim o autor apresenta uma visão alternativa, de maior

abrangência, abrangendo todas os conceitos anteriores.

A globalização entendida como internacionalização seria a intensificação de

transações e interdependência entre os Estados, assim seria simplesmente o aumento de fluxos

e a conseqüente interdependência criada por eles. Por outro lado o entendimento do termo

como liberalização concerne à diminuição das barreiras entre os países, como barreiras

tarifárias e medidas regulatórias, fazendo com que se enfraquecessem as fronteiras do mundo

econômico.

A terceira forma apresentada pelo autor é a idéia de universalização. Assim, a

globalização assumiria um significado onde seria responsável pela dispersão de objetos e

experiências. Desta maneira, o fenômeno global2 estaria conduzindo todo o planeta à uma

homogeneização da cultura, economia, direito e da política.

2 Global entendido como mundial, todas as partes onde existem habitantes. (Held, 2001)

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O quarto conceito apresentado por Scholte (2002) é o de ocidentalização. Desta forma,

a globalização seria entendida como uma universalização de estruturas ocidentais, como o

capitalismo, o racionalismo, o industrialismo, entre outros. Consequentemente, a globalização

então, estaria ameaçando a cultura e a autodeterminação local. Uma vez que deixa culturas

locais expostas às culturas ocidentais, podendo ser entendida como um discurso hegemônico,

objetivando uma possível subordinação dos países que ainda se mantêm fora, claro que não de

maneira completa, da influência ocidental.

Por fim, Scholte (2002) apresenta um conceito alternativo, um conceito diferente dos

quatro anteriores por abranger não somente as relações, mas também o espaço em que estas

relações tomam lugar. A globalização nesta quinta interpretação é entendida como o aumento

de conexões transplanetárias entre as pessoas. Atualmente, percebe-se o aumento de conexões

supraterritoriais (conexões sociais que vão além do território geográfico). Essas conexões

evidenciam a redução nas barreiras de contato e facilitam o relacionamento, seja ele físico,

cultural e etc, uns com os outros.

Assim, a globalização refere-se a uma mudança na natureza do espaço social. As

pessoas viveriam juntas não somente de forma local, nacional e regional, mas em ambientes

transplanetários, onde o planeta seria um único local. Conseqüentemente, mudam-se os

“padrões de conhecimento, produção, governança, identidade e ecologia social”(Scholte,

2002: 15).

O conceito apresentado por último será o utilizado neste trabalho. Este conceito

abrange de alguma forma, os conceitos de globalização que se referem à universalização,

ocidentalização, liberalização e internacionalização, se tornando um conceito amplo e que

leva em consideração constrangimentos acerca da supraterritorialidade que é percebida no

sistema internacional.

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Porém para adotarmos este conceito, devemos retornar às origens da globalização. As

origens citadas anteriormente neste capítulo podem ser diferenciadas no que tange à

existência ou não de uma ruptura histórica que antecede o fenômeno da globalização. Desta

forma, as origens que apresentam uma ruptura histórica e, conseqüentemente, assumem que a

globalização é um fenômeno relativamente novo, podem ser adotados. Assim, a origem à ser

adotada será a terceira hipótese apresentada por Mittelman (2000), onde a globalização surge

após a recessão dos anos 1970, oriunda de uma alteração dentro do próprio capitalismo.

2.2 - Conseqüências da Globalização

No que tange às conseqüências da globalização destaca-se a produção, as finanças, o

meio-ambiente, a consciência global e a mídia. A produção vive momentos de mudanças. As

empresas passaram a produzir de maneira transnacional, executando uma parte do processo

em cada lugar, visando o corte de custos, sejam eles de mão-de-obra, como de transporte e

impostos. O dinheiro também sofreu evoluções. As invenções de cheques de viagem e cartões

de crédito criaram uma chamada moeda transnacional, além da emergência de diversas

moedas que passaram a ser conversíveis internacionalmente, como o Iene, Real e Euro

(Scholte, 2000).

Por sua vez, os mercados financeiros demonstram um aumento no volume de

transações enorme. Atualmente, em seis horas o mercado monetário internacional movimenta

mais do que o Banco Mundial movimentou em toda sua história.3 Os bancos passaram a atuar

de maneira global, possibilitando as pessoas fazerem depósitos para qualquer local do planeta.

3 Clark, 1999. In: Scholt, 2000.

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Concernente às transações, elas se intensificaram com a emergência dos meios de

comunicação e criação de instituições, sejam elas públicas ou privadas, que atuam de forma

global. O chamado dinheiro virtual nunca foi tão utilizado, onde bilhões ou até trilhões de

dólares são movimentados entre países sem que se mova um único papel moeda (Scholte,

2000).

Concernente ao meio ambiente, o agravamento de problemas como o efeito estufa e a

deterioração da camada de ozônio, demonstram explicitamente que existem problemas

globais, que devem ser combatidos por todos e não por países em separado, se trata de

responsabilidade de todos, evidente que mais de uns do que de outros, mas de todos (Scholte,

2000).

Evidente, também é a emergência de uma dita consciência global. As pessoas estão

mais familiarizadas com a idéia de um planeta único para todos, como lar da humanidade.

Assim, passam a compartilhar problemas. De fato, os problemas podem ser comuns já há

algum tempo, porém somente nos últimos anos as pessoas passaram a perceber que alguns

deles não atingem somente à elas, mas sim à grande parte do globo. Essa nova percepção faz

com que as pessoas passem à lutar em conjunto umas com as outras em favor de seus

objetivos (Scholte, 2000).

A mídia global agora atua de maneira transplanetária, transmitindo o mesmo conteúdo

para todo o planeta, desenvolvendo a idéia de um mundo com problemas e interesses em

comum. A revolução tecnológica e seus avanços tecnológicos como métodos de transmissão e

satélites tornaram as emissoras locais em verdadeiros portais de notícias internacionais. Na

internet é possível acessar os principais jornais de cada país, sem contar com os inúmeros

portais feitos por provedores que disponibilizam conteúdo informativo de diversos jornais

(Scholte, 2000).

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As comunicações foram impulsionadas de maneira impressionante e inédita. O

advento da internet, as evoluções na tecnologia de transmissão de dados e a tecnologia de

satélite conduziram à uma nova dinâmica de comunicação, mais econômica e extremamente

mais dinâmica. Da mesma maneira os mercados foram afetados. Atualmente, existe um

mercado global, permitindo a comercialização de produtos por todo o mundo através do

telefone, computador, internet e o transporte aéreo (Scholte, 2000).

Essas transformações nas comunicações, transportes, nos tratamentos de dados, dentre

outros foi extremamente importante para a globalização. Contudo ela só foi possível através

da revolução tecnológica da informação, que revolucionou todo o aparato tecnológico, dando

bases para o atual.

2.3 - A Revolução Tecnológica da Informação

A revolução tecnológica da informação é encarada como uma mudança que atinge

todas as áreas. Uma revolução que marca uma mudança substancial na tecnologia. Assim, tal

mudança se baseia na evolução da tecnologia da informação, proporcionada por uma série de

fatores e invenções (Castells, 1999).

Esta transformação tecnológica se expandiu de maneira rápida devido à mudanças nos

campos tecnológicos, através de uma linguagem digital comum que proporciona a geração,

armazenamento, recuperação, processamento e transmissão de informações. Assim, o mundo

adentrou em uma era onde o digital passou a fazer parte da cultura mundial (Negroponte

apud Castells, 1999).

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A revolução tecnológica pela qual passamos hoje é caracterizada pela maneira com

que penetra em todas as áreas, mudando as dinâmicas em todas elas. Porém, esta revolução

em específico, baseia-se principalmente nas mudanças nas tecnologias de informações,

processamento e comunicação (Kranzberg & Pursell apud, Castells 1999).

Por outro lado, percebe-se que a atual revolução tecnológica da informação não se

baseia somente em conhecimentos e informação. Ou seja, sua centralidade não está focada

nestes últimos, mas sim na aplicação destes de forma a gerar mais conhecimentos e de

dispositivos de processamento e comunicação da informação. Assim, a revolução atinge o

processo como um todo e não somente uma parte dele, criando um ciclo onde a invenção é

utilizada para inventar (Castells, 1999).

Assim, as novas tecnologias exercem o papel de processos à serem desenvolvidos.

Desta maneira, as novas tecnologias colocam o usuário e o criador em um mesmo patamar,

por vezes na mesma pessoa, criando um ambiente onde o criador e o usuário podem se fundir.

Tal possibilidade existe, por exemplo, na Internet, onde o usuário adquire tamanho grau de

domínio que pode passar alterar a tecnologia de maneira à conduzi-la à uma evolução

(Castells, 1999).

Mais do que isto, o fenômeno que estamos presenciando revoluciona toda uma

dinâmica das relações sociais. É evidente a formação e popularização de um sistema de

informações comum, de fácil acesso, capaz de interligar todo o planeta. Além disto, este

sistema evolui à cada curto período de tempo tornando-se cada vez mais rápido/dinâmico e

com custo cada vez menores, dando oportunidades de acesso não somente às elites, mas à

uma grande parte da população com menor renda (Castells, 1999).

Outro aspecto também merece destaque. A revolução tecnológica que estamos vivendo

não se restringe à uma região geográfica em específico. Ela atinge à quase todo o globo, de

maneira simultânea ou pelo menos com uma diferença temporal reduzida. Então, esta

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revolução possui uma característica de compreender por si só (e alterar) a relação espaço-

tempo.(Mokyr apud Castells, 1999)

Castells (1999) aponta quatro características para o paradigma tecnológico4. A

primeira é que a tecnologia é a matéria-prima, as tecnologias atuam sobre a informação e não

somente o contrário. A segunda é penetrabilidade dos efeitos das novas tecnologias,

moldando os processos individuais e coletivos.A terceira é a difusão da lógica das redes,

permitindo a interação complexa.

A quarta característica é a flexibilidade deste paradigma da informação torna os

processos reversíveis e as organizações e instituições podem ser moldadas ou alteradas,

através da reorganização de seus componentes. Por fim, a quinta característica traz a idéia de

integração, onde as tecnologias específicas convergem para um sistema com um alto grau de

integração.

Dito isto, abordar-se-á as invenções mais importantes e relevantes para este trabalho.

Um emaranhado de pequenas revoluções na arena da tecnologia que conduziram à uma

mudança significativa nos processos anteriores, fazendo com que se note uma mudança nos

processos, tempo e espaço. Invenções estas, que tornaram possível chamarmos o atual

fenômeno presenciado como Revolução Tecnológica da Informação.

As principais invenções da eletrônica se deram no período da Segunda Guerra

Mundial e logo após dela, porém somente na década de 1970 se percebe a difusão destas

invenções, dando origem às mudanças tecnológicas nas três principais áreas do meio, a

microeletrônica, fundamentais para o desenvolvimento e manutenção deste desenvolvimento,

os computadores, revolucionando a cultura e dinâmica social e do trabalho e as comunicações,

4 “Um paradigma econômico e tecnológico é um agrupamento de inovações técnicas, organizacionais e administrativas inter-relacionadas cujas vantagens devem ser descobertas não apenas em uma nova gama de produtos e sistemas, mas também e sobretudo na dinâmica da estrutura dos custos relativos de todos os possíveis insumos para a produção .” Freeman. In: Castells, 1999:77.

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alterando a relação espaço-tempo e se tornando extremamente mais abrangente e barata

(Castells, 1999).

A microeletrônica teve seu principal acontecimento em 1957 (após a invenção do

transistor), quando Jack Kilby e Bob Noyce inventaram o primeiro circuito integrado através

do processo plano. A conseqüência desta invenção foi o começo de um fenômeno tecnológico

explosivo, levando à queda do preço dos semicondutores. Assim, na década de 1960, os

circuitos intergrados foram evoluindo e diminuindo de preço, ficando 50 vezes mais barato

em 1971 do que em 1962 (Castells, 1999).

Esta invenção levou então, à invenção do primeiro microprocessador, em 1971, pela

Intel. A idéia de condensar um computador em um chip deu início à uma corrida tecnológica

em busca de cada vez mais agregar mais circuitos à um chip. Os chips, como é visto hoje, não

pararam de evoluir. Porém, o que chama mais atenção é o fato da velocidade com que a

evolução se desenvolve, em 1971 cabiam 2300 transistores em um chip do tamanho de uma

unha, em 1993 já eram 35 milhões (Castells, 1999).

Os computadores também foram frutos da Segunda Grande Guerra. Com apoio do

exército norte-americano, Mauchly e Eckert inventaram o primeiro computador para uso geral

da história, no Estado americano da Pensilvânia. O computador pesava cerca de 30 toneladas

e foi construído sobre plataformas de 2,75 metros de altura. A partir de então, a mesma

equipe, em 1951, desenvolveu a versão para o uso comercial, denominada UNIVAC-1. A

invenção foi imitada por várias empresas, dentre elas a IBM, que acabou por assumir a

liderança do mercado na década de 1950 (Castells, 1999).

Porém, foi em 1975, se beneficiando da invenção do microprocessador (1971), que Ed

Roberts inventou um computador de tamanho bem reduzido, denominado Altair. Logo, a

invenção deu base para as criações da Apple, o Apple I e o Apple II. Este último se tornou o

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primeiro sucesso comercial, inventado por Steve Wozniak e Steve Jobs. Logo em seguida a

IBM, em resposta à Apple, lançou o chamado PC (Personal Computer) (Castells, 1999).

A Apple, seguida pela IBM, iniciou a difusão dos computadores. E, em 1984, o

Machintosh foi criado pela primeira empresa, dando início à uma nova era, a era dos

computadores de fácil acesso e uma interface com o usuário contendo ícones (criada pela

Xerox) (Castells, 1999). Importante também, é o papel desempenhado pelos softwares no

processo de difusão dos computadores.

O software foi criado na década de 1970 por Bill Gates e Paul Allen. Incentivados pela

criação do Altair, eles adaptaram tecnologias já existentes para funcionarem no recém

inventado computador. O sucesso é evidente ao analisarmos a situação atual da empresa

criada por eles, a Microsoft (Castells, 1999).

Contudo, desde a década de 1980, as redes passam a fazer parte do mundo dos

computadores. As redes possibilitaram uma mobilidade e flexibilidade cada vez maior aos

computadores. Desta maneira, as redes possibilitaram a interação entre os computadores,

dinamizando a troca de informações. Sem dúvida, as redes só existem hoje graças às

inovações na microeletrônica e na telecomunicação, criando uma base para o

desenvolvimento de equipamentos e tecnologia que combinasse essas duas áreas (Castells,

1999).

As evoluções nos materiais que participam do processo de transmissão também foram

de suma importância. A invenção da fibra ótica revolucionou a transmissão antes feita por fios

de cobre. A velocidade e a quantidade de dados transmitidos aumentou consideravelmente. As

redes de banda larga integrada (IBN), utilizando fibras óticas, possuem uma capacidade de

transmissão centenas de vezes maior que a rede digital de serviços integrados (ISDN), que

utiliza fios de cobre (Castells, 1999).

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Vale a pena também, exaltar a importância da radiodifusão. As tecnologias de

transmissão via satélite e, posteriormente, a difusão do aparelho celular são consideráveis. Os

aparelhos celulares e as novas tecnologias de transmissão dão ao usuário grande versatilidade

e, operando em conjunto, as novas tecnologias permitem que todos os lugares do mundo, de

alguma forma, possam se conectar com qualquer outra parte dele (Castells, 1999).

Por último, mas nem um pouco menos importante, foi a criação da ARPA (Agência de

Projetos e Pesquisa Avançada do Departamento de Defesa Norte-Americano), em 1969. A

ARPA criou uma nova rede de comunicação eletrônica que, após se desenvolver na década de

1970, deu origem à o que conhecemos hoje como Internet. Mas, antes da Internet existir como

a Internet de hoje, outra invenção foi essencial, a do TCP/IP (Protocoloca de Controle de

Transmissão/Protocolo de Interconexão) (Castells, 1999).

O TCP/IP permitiu o desenvolvimento de uma comunicação inter-redes, fazendo com

que as redes, antes isoladas, passassem a interagir umas com as outras. Deste modo, a nova

tecnologia permitiu o desenvolvimento das redes e de seus graus de interação com outras

redes até chegarmos à Internet, tecnologia que certamente provocou uma pequena revolução

dentro da revolução tecnológica (Castells, 1999).

A internet, por sua vez, mudou o processo de comunicação e toda uma dinâmica

econômica, produtiva, social, entre outros. Os custos de transmissão de dados via Internet são

bem menores que os anteriores (carta, telefone, facsmile, entre outros). Além disso, a

velocidade e acessibilidade são características marcantes, permitindo interligar todas as

informações através do TCP/IP e disponibilizá-las aos usuários em qualquer lugar do mundo

com uma conexão à grande rede (Castells, 1999).

Diante de tal facilidade de acesso, presenciou-se uma adesão intensa à Internet. Como

demonstra a Figura 1, a Internet contava com dezesseis milhões de usuários em dezembro de

1995, 0,4% da população mundial. Já no ano 2000, o número de usuários atinge a

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impressionante marca de 451 milhões de usuários, correspondendo a 7,4% da população

mundial. Neste último mês de outubro, a marca atingiu a marca de mais de um bilhão de

usuário, correspondendo a mais de 16% da população mundial.

É impressionante notar, que o acesso à internet cresce à taxas altíssimas. Por vezes a

taxa de crescimento foi maior do que 100%, como por exemplo, de 1995 para 1996. Nota-se

também, uma diminuição dessa taxa de crescimento, que apesar de se manter alta, possui um

limite máximo imposto pelo número de pessoas existentes, ficando evidente o esgotamento

desse crescimento.

Figura 1: Crescimento do número de usuários da Internet.

Fonte: www.internetworldstats.com

O patamar alcançado pela Internet é invejável, na figura abaixo (Figura 2) podemos

notar que apenas alguns poucos locais do planeta não possuem qualquer conectividade via

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Internet. A África aparece como o continente que utiliza mais superficialmente os adventos

Internet, contrastando com a América, e Europa.

Figura 2: Geografia da Conectividade Internacional

Fonte: www.navigators.com

A revolução tecnológica atingiu todas as partes do planeta. Apesar de não se

apresentar na mesma intensidade e profundidade em todas as localidades, ela sem dúvida

mudou o cotidiano das pessoas, possibilitando a intensificação da relação entre elas.

2.4 - Influência da globalização no sistema westphaliano de Estados

Visto a globalização e a revolução tecnológica da informação, nota-se que o primeiro

fenômeno atinge a solidez do Sistema de Estados, que perdura durante séculos e está vivendo

uma época de dúvidas. O sistema de estados, caracterizado pela soberania e fronteiras, é

atingido devido ao aumento dos fluxos transfronteiriços de tal maneira, que por vezes foge ao

controle do próprio Estado. Conceitos como poder, territorialidade e soberania estão sendo

questionados diante de um mundo onde o local se mistura com o regional e global (Scholte,

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2000). Rosenau5 chama a atenção para a adaptação das chamadas Teorias de Relações

Internacionais para atualizarem noções de, por exemplo, territorialidade, porosidade das

fronteiras, papel das organizações transnacionais e a mudança de autoridades nacionais para

transnacionais. Nye (2002), por sua vez, coloca a questão sobre a interdependência envolvida

no processo. A globalização envolveria não somente um aumento de interdependência como

antes já ocorrido, mas sim um aumento na densidade e complexidade das redes, incluindo

mais regiões e classes econômicas.

Os Estados, desta forma, perderiam importância espacial, competindo com novos

níveis de interação e governança global. Apesar de continuarem com relevância política e

militar, eles não conseguem controlar, através de suas jurisdições nacionais, os novos atores

transnacionais.

Diante de tal quadro, os Estados estariam enfrentando a influência externa em suas

políticas internas, fazendo com que eles não executem mais suas funções como anteriormente.

Os problemas complexos não se resolvem mais apenas em âmbito interno. As variáveis

externas chegaram a tal ponto de interdependência que fica praticamente impossível traçar

políticas sem levar em conta as situações externas, às quais os Estados estão expostos.

Como colocado por Rosenau6, o sistema está se bifurcando em Estado-centrismo e

multi-centrismo e os Estados não são mais capazes de exercer soberania em alguns assuntos.

O meio ambiente e a administração do mercado de capitais ilustram bem essa perda de

soberania estatal, fugindo do controle dos Estados que se encontram impossibilitados de

agirem de forma unilateral diante problemas por vezes ocasionados.

Os Estados continuam sendo os atores principais (Nye, 2002), apesar de pressão

exercida pela interdependência. Porém nota-se a emergência de novos atores, como

organizações e instituições multilaterais, como a Organização Mundial do Comércio.

5 Rosenau apud Sarfati, 2005. 6 Rosenau apud Sarfati, 2005.

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Diante de tais circunstâncias e mudanças sistêmicas, Sarfati (1999) aponta três

mudanças na ordem dos Estados. Primeiro, rápidas mudanças nas fronteiras nacionais,

levando à constituição de das unidades básicas da ordem internacional. Segundo, a

caracterização do Estado pela integração e desintegração. Em outras palavras, ao mesmo

tempo em que se formam blocos como a União Européia e o NAFTA7, os Estados estão sob

um contínuo movimento de reafirmação das identidades nacionais. Por último, nota-se a

intensificação da interconexão entre os Estados e surgimento de instituições internacionais,

desafiando a ordem internacional tradicional composta por Estados monocêntricos e

hierárquicos. Assim, a soberania estatal vem sendo questionada em áreas como a segurança,

economia, saúde e ambiental.

Landau8 indica ainda que alguns, por vezes mais radicais quanto as possíveis

conseqüências da globalização, defendem que um dos aspectos mais visíveis da globalização

é a perda de soberania estatal. O Estado se caracterizaria de forma obsoleta e despossuída de

autoridade, resultando na ameaça da soberania estatal pela comunicação, empresas

transnacionais, mercados e globalização financeira, todos alavancados pelos avanços

tecnológicos.

A intensificação dos fluxos não somente monetários e comerciais, mas também

humanos, refletem à fragilidade à qual estão submetidas as fronteiras. Conseqüência da

globalização, esta fragilidade pode não levar à extinção das fronteiras, mas certamente está

contribuindo para isso.

A visível porosidade das fronteiras, causada pela globalização e pela revolução

tecnológica, demonstra não somente que os Estados perderam força como atores unitários,

7 “Constitue-se em um instrumento de integração das economias dos EUA, do Canadá e do México. O NAFTA (North America Free Trade Agreement) foi iniciado em 1988, entre norte-americanos e canadenses, e por meio do Acordo de Liberalização Econômica, assinado em 1991, formalizou-se o relacionamento comercial entre os Estados Unidos e o Canadá. Em 13 de agosto de 1992, o bloco recebeu a adesão dos mexicanos.” (Congresso Nacional – Comissão parlamentar conjunta do MERCOSUL). 8 Landau apud Sarfati, 2005.

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mas que uma nova dinâmica emerge no sistema internacional. Essa dinâmica não depende

fundamentalmente dos Estados, podendo agir com certa independência.

A globalização desempenha um papel sine qua non para a identificação de um poder

não-estatal. A supraterritorialidade, desterritorialização e reterritorialização, implícitas no

conceito de Scholte (2002) e adotada neste trabalho, somadas à revolução tecnológica, à

alteração na relação espaço-tempo; além da criação de espaços transnacionais e consciência

global, criam um cenário propício para que as relações sóciais se intensifiquem, fazendo com

que pessoas de todo o mundo se unam por objetivos em comuns. Por outro lado, a revolução

tecnológica da informação alterou toda uma estrutura, dinamizando e integrando os diversos

processos abrangidos. A globalização e a revolução tecnológica da informação somaram

forças e atuam fortemente na alteração da relação espaço-tempo, criando um cenário

dinâmico, com interações sociais cada vez maiores, com um custo reduzido. Todas as áreas de

conhecimento foram alteradas e a informação coloca estas novas tecnologias nas raízes dos

processos, sendo utilizadas desde a obtenção até a criação de novos dados.

Essa nova dinâmica, com mais importância dispensada à sociedade civil, permite que

o sistema westphaliano não seja extinto, mas alterado, passando a contemplar mais atores que

não os Estados.

Contudo, o fenômeno da globalização e a revolução tecnológica da informação,

isoladamente, não são capazes de sustentar a possibilidade da emergência de um novo poder

não-estatal. Assim, o próximo capítulo pauta a interdependência complexa e a governança

global.

A discussão acerca da interdependência complexa demonstra a rede de dependência

que atinge os atores internacionais. Desta forma, é possível identificar ações, que em um

primeiro momento pareçam isoladas, afetar e/ou influenciar terceiros. Esse estado de

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dependência entre os atores cria uma base mais concreta para a abordagem da Governança

Global.

A governança global será discutida demonstrando como o sistema internacional não

se encontra em total anarquia e é possível identificar uma determinada ordem nas relações

internacionais. Não obstante, demonstra também a possibilidade de uma governança sem que

exista um governo.

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03 – GOVERNANÇA GLOBAL E INTERDEPENDÊNCIA COMPLEXA

A globalização e a revolução tecnológica levaram à intensificação dos fluxos entre as

fronteiras criando uma situação nova para os Estados. A intensificação dos fluxos tornou

impraticável o controle estatal como era realizado anteriormente. Assim, os Estados estão

perdendo determinado controle dos fluxos e um determinado grau de soberania, criando

condições para a emergência de uma ordem, uma governança sem um poder autoritário

estatal. Tal emergência é possível pelas conseqüências dos diversos fatores apresentados,

todos eles contribuíram para a criação de condições onde o Estado se vê incapaz de controlar

todos os fluxos e o mundo percebe que a falta de um poder controlador não levou ao caos,

evidenciando a existência de uma governança.

Neste capítulo serão apresentados a Governança Global, Ordem Mundial,

Interdependência Complexa e o Estado Westphaliano. Estes quatro temas, somados aos

anteriores, são importantes para o trabalho, pois possibilitam a análise de um sistema que

viabiliza a emergência do poder da sociedade civil.

Os temas são interdependentes, não possuindo um critério determinado de ordem. Isto

se deve ao fato de que a criação ou transformação do sistema aconteceu por influência de

diversos fatores ao mesmo tempo. O primeiro tema a ser abordado será a Interdependência

Complexa, seguida pela Governança Global e a Ordem Mundial e finalmente o Estado

Westphaliano, pois este sim se transformou devido à ação dos temas anteriores.

Desta maneira, os temas serão expostos para uma posterior análise das conseqüências

oriundas deles. É de conhecimento que muitos dos temas aqui abordados não são

interpretados de maneira consensual pelos teóricos de Relações Internacionais, desta maneira,

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seria impraticável expor e discuti-los todos neste capítulo. Sendo assim, optou-se aqui por

utilizar autores-chaves para o tratamento dos temas. Desta forma, Rosenau embasa a

discussão sobre governança global e ordem mundial, Keohane e Nye a de interdependência

complexa e, por fim, Scholte a de globalização e das alterações nos Estados.

3.1 - Interdependência Complexa

O primeiro tema abordado neste capítulo, a interdependência complexa, possui um

papel relevante para as futuras exposições. O termo, criado por Keohane & Nye (2001) diante

das mudanças na política mundial, tenta desviar a visão clássica, onde, por exemplo, os

Estados são os únicos atores e o poder militar é o que importa. Desta maneira, uma nova gama

de interpretações é apresentada para explanar as novas dinâmicas internacionais.

O termo dependência refere-se à situação onde um Estado está sendo

significantemente afetado por forças externas. Por outro lado, a interdependência refere-se às

situações na política mundial caracterizadas por efeitos recíprocos entre os países ou atores de

diferentes países, podendo ser descrito como apenas um estado de dependência mútua

(Keohane & Nye, 2001).

Assim sendo, onde houver efeitos com custos recíprocos, mesmo que não sejam na

mesma proporção, existe interdependência. A interdependência sempre envolve custos, já que

restringe a autonomia de um Estado, porém não é garantia de ganhos para todos os atores

envolvidos (Keohane & Nye, 2001).

A interdependência complexa possui três características9:

9 Keohane & Nye, 2001.

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• Canais múltiplos: relações entre as elites governamentais, não-governamentais e

organizações transnacionais conectam a sociedade. Estes canais podem ser inter-

estatais, transgovernamentais e relações transnacionais.

• Mudança na agenda internacional: a agenda internacional inter-estatal não mais possui

uma hierarquia tão concreta. Desta maneira, assuntos concernentes à segurança, como

o militar, não mais dominam a agenda de maneira tão desproporcional.

• Diminuição do uso da força militar: a força militar não é mais tão usada por governos

contra outros governos quando estes se encontram em uma situação de

interdependência. A mudança na agenda internacional e a existência de alternativas

contribuem para que o uso das forças armadas seja evitado.

Assim, as conseqüências destas três características da interdependência complexa

refletem nos processos políticos. Em um ambiente com um menor papel das forçar militares,

falta de hierarquia na agenda internacional e canais múltiplos, três conseqüências podem ser

identificadas10:

• Ligação de estratégias: os objetivos e a atenção dada à determinados assuntos

variam entre os atores. Assim, um Estado poderoso em uma determinada área,

como a militar, pode não ter poderoso em arenas como a do meio ambiente. O

ambiente então envolve uma possibilidade de barganha nos mais diversos

assuntos, dentro de uma rede complexa de interesses e poderes.

• Formação da agenda: com a falta de uma hierarquia entre os assuntos da agenda

internacional, a formação e o controle da mesma se tornou mais importante.

10 Keohane & Nye, 1977.

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Assim, a agenda internacional de cooperação se torna importante e de interesse de

grupos, que podem organizar e mobilizar pressões para que os

assuntos/insatisfações internas se tornem inter-estatais.

• Relações transnacionais e transgovernamentais: os múltiplos canais de contato

entre sociedades faz com que o doméstico se aproxime do internacional. Desta

forma, as políticas de barganha são influenciadas por relações transnacionais.

Empresas multinacionais podem então, ser importantes como atores independentes

ou como instrumentos de manipulação dos governos. As políticas dos grupos

domésticos também são afetadas pela comunicação, pois esta permite que a troca

de informações entre grupos de diferentes países influencie suas ações.

• Papel das Organizações Internacionais (OIGs): neste ambiente, as OIGs ganham

papéis importantes. Auxiliam a construção de agendas internacionais, pois

conseguem agregar interesses e, assim, auxiliam a determinar as prioridades dos

governos. Fornecem bases para cooperação juntando representações dos países

menos desenvolvidos e funciona como fórum para eles, ofertando um espaço para

que possam ser ouvidos e, em alguns casos, com poder de voto.

Keohane e Nye (1998) atualizam seus trabalhos sobre a interdependência complexa

diante da revolução tecnológica, em específico dos meios de comunicação11. Desta maneira,

frente à intensificação da comunicação entre as fronteiras e da grande diminuição dos custos

da mesma, os múltiplos canais sofreram mudanças.

Os canais múltiplos aumentaram, permitindo que organizações não-governamentais e

redes conseguissem penetrar nos Estados sem se preocuparem com as fronteiras,

influenciando a construção da agenda utilizando legislações nacionais. A informação passou

11 Ver Cap. 01.

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então, a ser uma fonte de poder em um mundo de novos canais de comunicação entre

indivíduos. As informações, contudo, são controladas até certo ponto. Claro, existem

informações livres, porém informações estratégicas são protegidas por sistemas de

encriptação e informações comerciais por leis de propriedade intelectual. Desta maneira, a

política molda as informações e vice-e-versa. (Keohane & Nye, 1998)

3.2 - A Governança Global e a Ordem Mundial

O sistema internacional está presenciando fenômenos, como a globalização, que

afetam o cumprimento de constituições nacionais e tratados internacionais. Tal fato se deve,

por exemplo, ao maior grau de organização de subgrupos étnicos ou de outra natureza,

revolução tecnológica, interdependência econômica, visível principalmente em épocas de

crise, e alteração da agenda internacional, que agora conta com temas como a Aids, efeito

estufa, terrorismo, dentre outros. Assim, os Estados, apesar de ainda serem os principais

atores, perdem a força ao exercerem algumas funções. As coletividades e subgrupos agora

passam a executar algumas funções que antes eram estatais (Rosenau & Czempiel, 2000).

A governança, contudo, possui um papel importante ao lidar com uma autoridade cada

vez mais descentralizada. Porém, apesar da palavra remeter, constantemente, a governo, não

significa a mesma coisa. Ambos os termos possuem como características um objetivo, ações

em busca de metas e alguns sistemas de ordenação. Contudo, não são somente estas

características que compõem os mesmos (Rosenau & Czempiel, 2000).

O termo governo, como podemos notar, implica a existência de uma autoridade formal

para servir de apoio para atividades e um poder de polícia, para garantir ou ao menos, tentar

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garantir, a execução de políticas instituídas. Por outro lado, a governança se baseia em

atividades buscando objetivos em comum. A diferença seria que essas atividades não

necessitariam de derivar de responsabilidades legais, nem de poder de polícia para garantir

sua execução (Rosenau & Czempiel, 2000).

Portanto, a governança se apresenta como um termo mais abrangente, que engloba

instituições governamentais e não-governamentais e mecanismos informais, fazendo com que,

sem o poder de polícia, as pessoas e organizações busquem os objetivos comuns seguindo

uma determinada conduta. A governança, contudo, requer aceitação pela maioria, caso

contrário não será eficaz. Por outro lado, os governos não necessitam de apoio da maioria para

funcionarem (Rosenau & Czempiel, 2000).

Desta maneira, a governança é sempre eficiente, caso não seja será simplesmente

inexistente, enquanto os governos podem ser ineficazes e existirem, como não é muito raro de

se notar. Desta maneira, é possível falar em uma governança sem um governo (Rosenau &

Czempiel, 2000).

Assim, ao sugerir a existência de uma governança sem um governo é necessário expor

algumas funções que devem ser exercidas pela governança. Dentre as inúmeras funções, que

não dependem exclusivamente da ação de instituições e organizações criadas para este fim:

“a de interagir com os desafios externos que ocorrem em qualquer sistema;

evitar que conflitos entre os membros ou facções provoquem uma

destruição irreparável; buscar recursos para a preservação e o bem-estar

do sistema; definir objetivos e condutas destinadas para alcançá-los”

(Rosenau & Czempiel, 2000:14).

Dito isto, fica aparente que a idéia de governança pressupõe uma relação com a

ordem. A ordem global é o conjunto de entendimentos que norteia a política mundial. Apesar

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de esses entendimentos não serem sempre propositais, a soma deles constitui uma ordenação

para o sistema. Esses entendimentos são notados no comércio, cooperação, diplomacia,

documentos diplomáticos, dentre outros, e muitas das vezes de dão de maneira inconsciente,

não buscando uma ordem sistêmica em seu objetivo primário (Rosenau & Czempiel, 2000).

A relação entre ordem e governança é quesito sine qua non para a existência de

ambas. A governança não existe sem a ordem e a ordem não existe sem a governança, o que

as torna dependentes. Essa relação cria um cenário onde é possível a existência de uma

governança sem um governo, fato que merece atenção neste trabalho (Rosenau & Czempiel,

2000).

A possibilidade de uma ordem e governança sem um governo permite dizer que existe

uma governança global sem que exista uma autoridade central internacional. O sistema não

possui um ator que será autoridade central e que promova uma ordem mundial. Dessa

maneira, é perfeitamente coerente dizer que apesar da falta de tal autoridade o planeta possui

ordenamentos que tentam harmonizar as relações entre os atores.

A ordem mundial não necessita de abranger preocupações de nível global. Como

podemos notar, muitas das vezes as preocupações são regionais, bilaterais e/ou possuindo

temas bastante específicos. Desta maneira, empresas, Estados, ONG´s (Organizações não-

governamentais), regiões, movimentos sociais, dentre outros, podem colaborar para a ordem

mundial em suas atividades transfronteiriças (Rosenau & Czempiel, 2000).

A ordem mundial, portanto, é fruto de um esforço proposital ou não dos atores das

relações internacionais. Contudo, para a existência e a manutenção de tal ordem é necessária

uma estrutura que a sustente. Essa estrutura se desenvolve em três níveis fundamentais, que

existem em qualquer grau de ordem12:

12 Rosenau & Czempiel, 2000.

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a) Ideacional: É o nível onde estão presentes as crenças, contextos mentais,

maneiras de percepção, moldes de atitudes e valores compartilhados. É

pouco claro e são entendidos como “arranjos com os quais seus assuntos são

tratados”. Desta maneira, o nível ideacional cria um consenso entre os atores,

norteando-os dentro das mesmas premissas.

b) Objetivo: É o nível onde estão presente as ações, na maior parte não

proposital, que leva à uma repetição de ações que padronizam de maneira à

sustentar os arranjos existentes. São as ações dos atores e não o que eles

pensam ou como as enxergam. São ações quase que automatizadas.

c) Político: É onde as instituições e regimes tomam seu lugar. É o estágio

formal e organizado da ordem, onde os dois primeiros níveis são

“formalizados” na política global.

Os níveis fundamentais da ordem estão presentes em todos os graus de ordem.

Contudo, a ordem não é possível sem a existência dos três, conseqüentemente, nenhum deles

é suficiente para criar uma ordem. Eles são interdependentes e sozinhos não determinam uma

ordem (Rosenau & Czempiel, 2000).

Desta maneira, os regimes aparecem como uma grande fonte de governança. Criados

para lidarem com problemas em algumas áreas específicas, os regimes se tornaram

ferramentas para que os Estados criassem um grau de governança para determinados

problemas que foram surgindo ao longo do tempo, tais como segurança regional, economia,

meio ambiente, dentre outros.

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Os regimes podem ser definidos como princípios, normas, regras e procedimentos

adotados por atores governamentais e não-governamentais de maneira intersubjetiva em prol

de interesses compartilhados em uma área determinada das relações internacionais. Esta

determinada área também é chamada de issue-area (Rosenau & Czempiel, 2000).

Assim, os regimes apresentam muitas semelhanças com a governança, o que os torna

uma forma de governança. Esta última toma lugar entre os regimes (porém, não

exclusivamente), que não raramente geram atritos por processos, normas e/ou leis

conflitantes. Assim, os regimes atuam em áreas específicas ou sobre assuntos específicos com

um número de atores envolvidos definidos. Já a governança global, apoiando-se na ordem

mundial, trata de todos os atores do planeta e não se baseia em uma região específica, mas em

todas elas (Krasner, 1983).

O meio-ambiente, por exemplo, é um problema não muito recente, mas hoje podemos

notar que existem alguns regimes criados para tal problema. A preocupação em se tentar

“regulamentar” esta área se deve ao fato de que as ações de determinados Estados passaram

(ou pelo menos foram notadas) a prejudicar os ambientes de outros. Desta maneira, a

cooperação surgiu como a solução mais viável de regulamentação entre os Estados para

solucionar tais problemas (Lipschutz, 2004).

Assim, os regimes podem ser vistos como uma fonte de governança. Eles criam

padrões, normas de conduta tanto na sociedade civil como nos demais atores. Muitas das

vezes são os regimes responsáveis por lidarem com situações novas e criarem precedentes de

ação diante de determinadas questões.

As vantagens que os regimes ofereciam fizeram com que eles fossem adotados por

diversos países. Dentre as vantagens, pode-se citar a diminuição dos riscos, limitam as

alternativas de ações dos concorrentes, formalizam relações, maior transparência e diminuem

os custos de transação (Krasner, 1983).

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Este último, custos de transação, está intimamente associado ao capital. Isto, porque

ele tenta solucionar possíveis problemas envolvendo regulações e leis nacionais. Talvez seja

este o motivo da intensificação de regimes criados. Os problemas ambientais como o da

Camada de Ozônio também contribuíram significantemente, uma vez que se trata de um tema

recente, mas que preocupa e afeta todo o planeta (Lipschutz, 2004).

Ativistas sociais trabalham com a opinião pública para poderem exercem pressão em

prol de uma governança. A opinião pública é direcionada de maneira a pressionar instituições

políticas e governos à adotarem determinadas medidas, ou mesmo menos discutirem-nas. Por

outro lado, a sociedade e a opinião pública refletem os interesses dos consumidores. Desta

maneira, os ativistas tentam direcionar a lógica comercial, com o objetivo de que os

produtores passem a agir com “responsabilidade social” (Lipschutz, 2004).

Não obstante, a competição por lucros e novos mercados fez com que algumas

políticas nacionais perdessem prestígio. Além disso, os fatos diplomáticos se tornaram mais

abertos e expostos, criando um ambiente onde os Estados se viam não somente lidando com

externalidades internas, mas também internacionais. A preocupação em atender as demandas

internas e externas (que partem da sociedade civil, por exemplo) é clara, principalmente

próximo a eleições. Isto porque esses grupos podem pressionar diretamente ou simplesmente

pressionarem grandes corporações para que pressionem os governos. A pressão pode partir de

grupos internos até de outros Estados, regimes e atores não-estatais (Lipschutz, 2004).

Desta maneira, Lipschutz (2004) identifica quatro tipos de regimes existentes dentro

do sistema internacional atual. São eles:

• Regimes entre Estados: Tratados, acordos e/ou organizações que formalizam os

padrões internacionais. Como são entre Estados, são assinados e ratificados em acordo

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com as legislações nacionais. Incluem os modelos clássicos de organizações

internacionais, como a OMC.

• Regimes transnacionais: São regimes que contam com a participação de atores

públicos e privados. Geralmente se iniciam como um movimento ativista e depois

ganha repercussão suficiente para serem adotados por governos nacionais ou até

mesmo se transformarem em regimes públicos.

• Regimes ativistas: Podem contar com atores públicos, privados e organizações.

Normalmente são iniciados por movimentos ativistas e, posteriormente, adotados por

corporações e entidades públicas, como o “The International Tobacco Control

Network”.

• Regimes privados: Este tipo de regime conta com a participação de organizações

semi-governamentais ou quase não-governamentais. O nome é dado por, além de

serem compostas por membros públicos, semi-públicos e privados, a organização

possui autorização estatal para exercer algumas funções. Além disso, eles contam com

a participação de ONG´s, grupos sociais, representantes corporativos, dentre outros.

Funcionam como um conjunto de diretrizes voluntárias para as esferas públicas e

privadas, como o ISO.

Desta maneira, os regimes passam a figurar no sistema internacional, criando novos

padrões e colaborando ainda mais para uma ordem mundial. Seja qual for o motivo que os

levaram a serem criados, a verdade é que eles vão colaborando, individualmente para a

organização de uma governança global.

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Apesar dos conceitos serem bem parecidos, considerarem os mesmos atores e

representarem determinado ordenamento sem a existência de uma ordem global, os regimes

miram atuar em uma esfera de um determinado tema, as “issue-area”. A governança global é

um fenômeno amplo. Desta maneira, não se trata de um fenômeno isolado ou regionalizado,

como o próprio nome diz. Então, essa é a diferença primordial entre a governança global e os

regimes (Rosenau & Czempiel, 2000).

Os regimes são adotados aqui como apenas uma das fontes da governança, vale

lembrar que alguns autores como Young (1999) , os consideram de extrema importância. Os

regimes seriam quase que fundamentais para a existência de uma determinada governança

global, criando condições para que ela se desenvolva. Desta maneira os regimes são

abordados neste trabalho com extrema relevância, porém não fundamental. Os regimes são

vistos como fonte de governança, mas não a única fonte para tal. Certamente, colaboram

muito para uma governança quando tratam de temas como o meio ambiente, conflitos,

economia, dentre outros, a própria economia e o mercado criam determinadas condutas.

A governança financeira global é um bom exemplo. O mercado financeiro antes era

centralizado e contava com a existência de um país mais fortalecido do os demais, um líder.

Desta maneira, os EUA, através de Bretton Woods foram capazes de criar toda uma

governança acerca do mundo financeiro. Contudo, nos dias atuais percebe-se que o mercado

financeiro é caracterizado por três itens estruturais: pela descentralização, com diversos

centros espalhados pelo mundo; as instituições financeiras assumiram diversas formas,

interagindo com os mercados de crédito e elevando a importância da coleta, análise e

distribuição de informações e; o mundo financeiro não é mais dominado por um único poder

financeiro, como era na época de Bretton Woods, com os EUA. (Germain & Kenny, 2005)

Desta maneira a governança, pelo menos na parte financeira, foi criando condutas e

regras de ação, algumas herdadas do período de Bretton Woods. Atualmente, esta ausência de

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um poder acima dos outros e a descentralização de poder, tornou visível a existência de uma

governança sem um governo, sendo ela formalizada pela criação de agências de coordenação

como a Financial Stability Forum e o G-2013. (Germain & Kenny, 2005)

3.3 - As conseqüências para o Estado

As mudanças ocorridas nas últimas décadas alteraram significantemente as relações

internacionais. Os padrões como as atividades eram realizadas foram alterados, os atores

mudaram, enfim a dinâmica mudou. Diante desta série de mudanças ocorridas era de se

esperar que os Estados também se “atualizassem”, e de fato o fizeram, seja por vontade

própria ou simplesmente porque foi inevitável.

A governança estatal começou a mudar depois de um período que compreende a

metade do Séc. XIX até a metade do Séc. XX. Neste período os Estados controlavam

praticamente todas as transações internacionais, desde conselhos locais até ordens religiosas.

Todas as relações sociais também passavam pelas mãos dos Estados, padrões de saúde,

idioma, dinheiro, conservação ambiental, dentre outros. As esferas menores dos governos

também eram reguladas, como autoridades regionais e municipais. Em outras palavras, as

relações se davam praticamente somente entre Estados (Scholte, 2004).

Os Estados ditavam as regras dentro de seus territórios de maneira incontestável. Eles

eram a palavra máxima dentro de seu território, não respondendo a ninguém mais e regulavam

todas as relações que passassem suas fronteiras, inclusive as relações sociais. Desta maneira,

13 “O G-20 é um grupo de países em desenvolvimento criado em 20 de agosto de 2003, na fase final da preparação para a V Conferência Ministerial da OMC, realizada em Cancun, entre 10 e 14 de setembro de 2003.” E dedica-se a realizar “intensas consultas técnicas e políticas, visando a injetar dinamismo nas negociações” econômicas envolvendo os países membros. (Ministério das Relações Exteriores do Brasil).

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os Estados respeitavam também a soberania dos outros Estados, não intervindo na jurisdição

de outros países. Dito isto, fica claro também que as governanças nacionais não eram

compartilhadas com nenhum outro Estado. A territorialidade assumia grande importância na

dinâmica e compreensão dos atores (Estados) (Scholte, 2004).

Porém, a partir da metade do Séc. XX o sistema foi alterado pela acelerada

globalização e pelas relações supraterritoriais. Desta maneira, a prática de algumas políticas

pelos Estados ficou impossível. Não era mais possível para um Estado, por mais forte que

fosse, controlar todas as relações internacionais. A referência territorial havia diminuído,

fluxos ocorriam em diversas partes do planeta e atingiam quaisquer que fossem os países. Não

era possível “rastrear” as relações, pois não partiam mais de locais fixos, como antes. E, desta

forma, tornou-se impraticável exercer as regras de maneira extrema dentro de um determinado

país (Scholte, 2004).

A revolução tecnológica14 teve papel importante na obsolência do Estado. As

tecnologias de comunicação evoluíram (computadores, rádios, telefones, satélites, dentre

outros), não somente em aparatos, mas também em quantidade e velocidade, criando um

sistema onde era impossível para um Estado a monitoração. A mídia se aproveitou de tal

mudança e também passou a agir de maneira global, tirando do Estado o monopólio sobre o

idioma e a educação (Scholte, 2004).

Além disso, o sistema passou a contar com associações e empresas globais, que

impossibilitavam o Estado a exercer autoridade sobre elas. O capital se tornou global, as

transações aumentaram exponencialmente com as mudanças tecnológicas e mais uma vez não

era mais possível exercer controle total. Os cartões de crédito e as moedas globais, por sua

vez, fizeram o Estado perderem exclusiva autoridade nas taxas de conversão e fornecimento

de papel moeda (Scholte, 2004).

14 Ver Cap. 01.

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Porém, as mudanças também foram notadas em áreas sociais. A perda de autonomia

quanto aos bens materiais foi evidenciada com a crescente preocupação com a deteriorização

da Camada de Ozônio e preservação da biodiversidade. Grupos sociais, sob critérios como

sexo, profissão, raça, religião, dentre outros ganharam força, voz e se tornaram mais

organizados, saindo da sombra dos Estados. Os cidadãos e governos locais passaram a dar

importância à temas como direitos humanos, preservação ambiental e crescimento econômico.

A importância dada, por vezes, transcendeu a lealdade ao Estado, demonstrando uma

preocupação em âmbito global, não mais exclusivamente dependente do Estado (Scholte,

2004).

Dito isto, fica visível que as condições para a soberania estatal (como era antes) não

existem mais. O Estado perdeu autoridade (mesmo que não totalmente) para atores, não

novos, mas que agora atuam de maneira global e de forma mais livre, agindo e articulando

suas ações com outros atores em outros países. Apesar de esforços dos Estados para evitar ou

ao menos diminuir a autonomia com que estes fluxos estão ocorrendo, mas até o momento

não obtiveram sucesso em conseguir total controle. Ao mesmo tempo, nota-se que países

como os Estados Unidos da América, que aproveitaram as oportunidades oferecidas pelas

regras globais, instituições, finanças globais, moedas globais, dentre outros, para obter novas

formas de poder ou consolidar sua posição, mesmo que em troca perdesse soberania (Scholte,

2004).

Contudo, como se pode indagar, os Estados não estão com seus dias contados. De fato,

nada aponta para isso. Eles mudaram suas funções, perderam um pouco de sua soberania, mas

não indica que deixaram de exercer importante papel no sistema internacional.

“...assim como o território continuou importante com o fim do

territorialismo, os Estados continuaram importantes com o fim do

estatismo.”. (Scholte, 2004:10)

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Também não é um fato restrito à atualidade. Os Estados sempre estiveram envolvidos

em um processo de mudança, porém agora ele se tornou mais evidente. As mudanças atuais

são mais visíveis e ligadas diretamente ao processo de globalização (Scholte, 2004).

A primeira é a queda das fronteiras no que tange a interesses. Os Estados não mais

colocam os interesses internos contra os externos, não são vistos mais como assuntos opostos

e podem até caminhar juntos. Evidentemente, vários Estados aumentaram o protecionismo,

mas procuraram se inserir, ao mesmo tempo, no mercado financeiro global, processos

produtivos, redes de mídia, dentre outros. A segunda mudança se refere ao investimento

social (Scholte, 2004).

Durante as últimas décadas, os gastos sociais estatais foram alterados como contra-

medida às mudanças sistêmicas. Contudo, não existiu uma fórmula para esta mudança. Cada

Estado, dependendo de sua política interna, legislação, impostos, dentre outros, agiu de uma

maneira. Alguns Estados, a maioria, diminuíram o orçamento social, pois acreditavam que

diminuindo a taxação e o investimento em proteções sociais para se tornariam mais

competitivos. Por outro lado, alguns Estados, como a Coréia do Sul, aumentaram seus gastos

sociais acreditando que, desta maneira, estariam se preparando melhor para o mercado global.

Os investimentos, principalmente em educação, seriam uma preparação para inserção do país.

Assim, fato é que a globalização levou a mudanças nos orçamentos sociais. Não se sabe se

eles aumentam ou retraem cada país agiu de uma maneira, obviamente seguindo suas

particularidades (Scholte, 2004).

A terceira mudança se refere às guerras, ou pelos menos ao custo que eles representam

para os Estados. A conquista de territórios por motivos de segurança geoestratégica ou para

garantir recursos naturais ainda representa muito no contexto internacional. Contudo, os

métodos tradicionais perderam um pouco de sua força e os governos perderam um pouco de

interesse nelas. O motivo, nas palavras de Scholte (2004:16), seria:

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“Operações militares por terra, mar e ar não são terríveis modos de se

obter controle da internet, finança eletrônica, cadeias produtivas

transmundiais, mercados consumidores globais, tendências ecológicas

transplanetárias, ou regimes de governança”

Desta maneira, os Estados enfrentam mais resistência para guerrearem, uma vez que

possuem, atualmente, diversos fatores em comum. Hoje, empresas ocupam vários países ao

mesmo tempo, instituições e ONG´s também. Não se limitando a isso, os Estados

compartilham as mesmas moedas, regimes de governança, apóiam as mesmas elites globais,

possuem eventos de entretenimento iguais, dentre outros (Scholte, 2004).

Por outro lado, nota-se um aumento de conflitos internos. A maioria deles, conflitos

envolvendo uma minoria que foi alimentada por informações, dinheiro e armas, facilitada pela

globalização. As armas também sofreram alterações, criaram-se bombardeiros de longo

alcance e outras armas que cobrem um raio maior de ataque. Os satélites passaram a ser

utilizados com maior freqüência, o controle do fluxo na internet e contas bancárias também

estão entre as mudanças desta vez, provocadas pelo terrorismo. Desta maneira, o Estado não

está se desmilitarizando, muito menos deixou de investir em armas, como dito anteriormente.

A diferença é que agora as condições e objetivos estão mudados e as guerras estão cada vez

mais complexas e caras para o Estado (Scholte, 2004).

Uma quarta mudança pode ser identificada, se trata das conseqüências e modificações

dos Estados frente à intensificação dos fluxos transfronteiriços. É inegável que o fluxo

aumentou exponencialmente, o que já foi abordado anteriormente. Diante desta nova

conjuntura, os Estados começaram internacionalizar seu aparato. Existe uma troca de

informações, através de cooperações técnicas e instituições internacionais, principalmente no

que se refere à segurança, direitos humanos, meio ambiente, saúde, mercado financeiro,

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imigração e refugiados. A diferença principal desta nova cooperação é a falta de sustentação

do direito internacional, sendo elas realizadas através de memorandos de entendimentos entre

os envolvidos. Assim, os órgãos governamentais passam a agir com maior autonomia e se

relacionando com outros governos, instituições e ONG´s, levando o Estado a perder parte de

seu poder centralizado (Scholte, 2004).

Outra mudança que pode ser demonstrada é que a relação entre o Estado e a

governança nacional foi alterada. A governança global dissolveu a governança estatal interna

de três maneiras, relacionadas com as mudanças citadas anteriormente. Começando pelas

relações inter-estatais, que se intensificaram de maneira à tornar impraticável a

regulamentação pelo Estado. Desta maneira, instituições a nível municipal e regional

passaram a cobrir esse espaço na governança. Além disso, os problemas globais, antes

referidos, aumentam a importância de agências de controle menores, que funcionam de

maneira complementar, mas se comunicando com o exterior. Por último, mas não menos

importante, está o fato de que a internacionalização de diversos mecanismos financeiros,

comunicação, direito, consciência global, dentre outros, criaram uma infraestrutura para

instituições subestatais e supraestatais atuarem globalmente (Scholte, 2004).

Assim, instituições, que não o Estado, ganharam força e determinada autonomia para

agirem, não estando mais completamente subordinadas ao Estado. As ações não são nem de

perto, completamente autônomas, mas já indicam uma mudança no modo de gestão dos

Estados (Scholte, 2004).

Desta maneira, as mudanças ocorridas no sistema criaram condições para a

emergência de novos atores. Atores, dentre eles alguns baseados na sociedade civil, passaram

a contar com novas maneiras de atuação global. Atuação, por vezes, em funções antes

somente executadas pelos Estados, mas que agora são exercidas e, por vezes a mando dos

mesmos.

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04 – SOCIEDADE CIVIL GLOBAL E A EMERGÊNCIA DE UM PODER NÃO-

ESTATAL

As mudanças que ocorreram no sistema criaram um ambiente propício para a

emergência de um poder que não se baseia nos Estados. A globalização e a revolução

tecnológica alteraram uma série de fatores que levaram ao maior relacionamento entre as

pessoas de maneira exponencial. Uma consciência global e a identificação de problemas em

comum em diversas partes do planeta fizeram com que diversos grupos se organizassem e

passassem a exercer determinada pressão sobre os Estados.

Problemas como dinheiro, informação, poluição e cultura popular agora passam a

moldar as vidas das pessoas em qualquer continente. Surgem padrões internacionais que se

sobrepõem ao regional e nacional e a opinião pública já não é ignorada nem pelo mais

poderoso dos Estados (Mathews, 1997).

O declínio dos Estados e a emergência de atores não-estatais se devem,

principalmente, ao poder da revolução tecnológica, que quebrou o monopólio estatal de coleta

e administração de informação em larga escala. A informação passou a ser de acesso de

inúmeras pessoas e, em contra partida, houve a redução do número de quem a comanda,

fazendo com que se disseminasse de maneira muito mais fácil. Além disso, as inovações

tecnológicas reduziram a importância da distância geográfica entre as pessoas e

enfraqueceram os vínculos históricos com as nações. (Mathews, 1997).

Por sua vez, os Estados foram afetados significantemente. Além da globalização e

revolução tecnológica, a governança global e a interdependência complexa promoveram

conseqüências notáveis na forma de governar dos países (ver Cap. 02). Desta maneira,

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criaram-se condições e, em determinados momentos, necessidade de novos atores agirem em

prol das populações.

4.1 - A sociedade civil global

A globalização fez com que a competência regulatória atravessasse os níveis estatais,

supraestatais, subestatais e privados da governança. A mudança de um cenário estatista para

um policentrista incentivou mudanças na sociedade civil, uma vez que tirou parte do foco

antes exclusivo do Estado (Sholte, 2004).

A sociedade civil, de fato, possui diversos significados nas relações internacionais

atuais. Desta maneira, este trabalho se limitará em expor apenas uma das maneiras coerentes

para este trabalho. Todas as definições são aceitas por diversos teóricos, mas cada uma delas

remete a teorias nem sempre convergentes, podendo desvirtuar a discussão.

Assim, nas palavras de Scholte (2004:37), sociedade civil significa:

“ um espaço político, ou arena, onde associações voluntárias de cidadãos

buscam, de fora de partidos políticos, moldar as regras que governam a

vida social. Grupos da sociedade civil juntam cidadãos de maneira

intencional não coercitiva na tentativa de moldar as leis formais e as

normas informais que regulam a interação social”

Desta forma, os membros de associações da sociedade civil compartilham de visões

em comum em diversos âmbitos, desde política até meio ambiente. Não obstante, cabe

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ressaltar o caráter voluntário destas associações e por estarem, em tese, fora do âmbito

político em sua constituição, não em suas ações.

Esta definição possibilita que o termo englobe diversas atividades da sociedade civil,

como grupos pró-democracia, movimentos sociais, fóruns comerciais, movimentos de meio

ambiente, promotores dos direitos humanos, fundações filantrópicas, iniciativas de

cooperação para o desenvolvimento, de lobbies étnicos, associações baseadas na fé,

associações jovens, campanhas anti-pobreza, dentre outros. As organizações não

governamentais (ONGs) também fazem parte desta vasta gama de iniciativas da sociedade

civil e, como é de conhecimento, atuam nas mais diversas áreas (Scholte, 2004).

Desta forma, os grupos da sociedade civil se apresentam atuando nas mais diversas

questões, das mais diversas formas. Eles variam em suas constituições, níveis de capacidade,

escopos geográficos, persuasões ideológicas, visões estratégicas e táticas de campanha

(Scholte, 2004).

A dinâmica de ação destes grupos para moldar as regras da vida social mudou,

passando da necessidade da presença estatal para a possibilidade de ação mais independente.

Antes, eles agiam através dos Estados para alcançar seus objetivos, porém com o advento da

globalização e a mudança para um mundo que releva a participação de novos atores, estes

grupos passaram a agir em outros locais e redes de governança, como em arranjos regulatórios

(Scholte, 2004).

Por estes motivos, a mobilização da sociedade civil cresceu nos últimos anos,

movimentos sociais globais/transnacionais, ações civis globais/transnacionais, redes de

advocacia transnacionais e a sociedade civil global/transnacional emergiram e transcenderam

a barreira territorial do Estado. Contudo, não é uma novidade, já no Século XIX movimentos

religiosos, de paz e de mulheres já executavam suas ações de maneira global, mas hoje o

número de casos é muito maior (Scholte, 2004).

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A sociedade civil contemporânea se tornou global e seis características podem ser

identificadas. A primeira concerne ao foco, onde passaram a atuar em problemas de

governança transplanetária. Assuntos como controle de armas, mudança climática, proteção

cultural, inclusão digital, igualdade de gênero, HIV/AIDS, direitos humanos, padrões

laboratoriais, revivalismo religioso, acordos comerciais, dentre outros, passaram a contar com

o interesse da sociedade civil. Além, a própria globalização, que auxiliou a moldar esta

situação, é foco de ações de grupos anti-globalização, alter-globalização e justiça global

(Scholte, 2004).

A segunda diz respeito às qualidades globais adquiridas das relações com instituições

de governança transplanetária. As atividades da sociedade civil passaram a se dirigirem

diretamente a instituições como o Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional,

Organização Internacional do Comércio sem passar pelos Estados. Diante desta mudança, as

agências de governança global criaram mecanismos para lidar com associações da sociedade

civil, como melhora da comunicação pública, inclusão da sociedade civil em seus

informativos, elaboração de conferências e workshops, nomeando membros da sociedade civil

para comitês oficiais e adotando padrões de conduta em acordo com organizações da

sociedade civil (Scholte, 2004).

Uma terceira característica é o uso de transporte e meios de comunicação

transplanetários e supraterritoriais. O transporte aéreo possibilita que atores civis participem

em um número maior de fóruns globais e conferências oficiais e paralelas. Por outro lado, a

comunicação permite, hoje, que grupos da sociedade civil se mantenham em contato quase

que instantâneo com outros grupos ao redor do mundo. As redes de computadores, a mídia

eletrônica de massa e as telecomunicações funcionam com custos reduzidos em relação a

períodos anteriores e de maneira mais rápida e eficiente (Scholte, 2004).

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Outro aspecto identificado é a estrutura adotada pela sociedade civil, se aproximando

de formas organizacionais globais. Elas se apresentam de maneira centralizada e unitária, de

maneira federal ou em molde de redes transnacionais, não havendo uma secretaria de

coordenação. Nesta última, alguns grupos operam simplesmente através de um web site

(Scholte, 2004).

A quinta característica concerne à motivação da sociedade civil, o sentimento de

solidariedade transplanetária. Um grande número de grupos conseguiu construir um

sentimento de identidade, baseado em idade, gênero, profissão, raça, religião, orientação

sexual, dentre outros, que transcende as barreiras territoriais. Além disso, grupos começam a

agir em prol de assuntos cosmopolitanos, como segurança, justiça e humanidade (Scholte,

2004).

Por fim, a última característica é que algumas das associações da sociedade civil se

tornaram globais por criarem e manterem atividades regulatórias transnacionais. Elas se

envolveram diretamente com a formulação, implementação e monitoramento de medidas de

governança global (Scholte, 2004).

Desta, maneira a sociedade civil pode ser global quando direciona sua atenção para

questões transmundiais, utiliza comunicação transfronteiriças, possui organização global,

trabalha com a premissa de solidariedade supraterritorial, se relaciona e adquire conhecimento

de instituições multilaterais; e quando criam e mantêm atividades regulatórias transnacionais.

Estes quesitos não são excludentes, algumas associações civis podem ser globais apenas em

um destes quesitos ou em vários deles (Scholte, 2000).

A sociedade civil global se expandiu de maneira bastante rápida. O advento da

globalização proporcionou tal expansão, sendo identificado alguns fatores. O primeiro se

refere ao impulso do pensamento global, o que permite que as pessoas entendam o mundo

como um só local para construírem relações globais. O segundo fator é o desenvolvimento do

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capitalismo e a formação de espaços globais. O capitalismo impulsionou as relações devido

ao seu caráter maximizador de vendas e minimizador de custos, enquanto os espaços globais

criaram novas oportunidades de ganhos através de, por exemplo, Internet e finanças

eletrônicas.

A tecnologia, por sua vez, é o terceiro fator. A revolução tecnológica proporcionou

bases para conexões globais, apresentando novas tecnologias mais eficazes e econômicas de

comunicação. Por sua vez, a regulamentação funciona como um incentivador da globalização,

fator chave para a emergência da sociedade civil global, pois cria uma estrutura legal que a

favorece através de medidas como a padronização e liberalização (Scholte, 2000).

Por fim, a sociedade civil emergiu por algumas ações estatais. Na década de 1990,

muitos Estados reformaram suas constituições de maneira à facilitar e/ou estimular a

organização civil. Outra ação foram os cortes orçamentários em segurança social. Desta

maneira, Estados e instituições multilaterais contrataram associações civis tranfronteiriças

como solução (Scholte, 2000).

Desta maneira, foi possível que a sociedade civil global se inserisse no cenário

internacional. Ela passou a ter um papel de fato nas relações internacionais contemporâneas,

deixando de ser uma coadjuvante, na maioria das vezes ligada ao Estado.

4.2 - A emergência de um poder não-estatal

Os fenômenos apresentados moldaram o cenário internacional e possibilitaram que

novos atores emergissem na política mundial. A porosidade fronteiriça, a interdependência

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complexa, a governança global e a ordem mundial, foram disseminadas e desenvolvidas mais

rapidamente devido aos efeitos da globalização e da revolução tecnológica.

As tecnologias de informação romperam padrões hierárquicos de poder, diluindo-o

através de grupos e pessoas. A diminuição dos preços da comunicação e coordenação

favoreceu as redes descentralizadas frente outros padrões de organização. Através destas

redes, grupos conseguem somar suas vontades e ações sem terem na prática uma presença

institucional física ou formal. Estas redes possuem áreas de interseção de interesses, onde

grupos e indivíduos se interagem acerca de um determinado tema (Mathews, 1997).

Diante de um cenário interdependente com economias globalizadas e fluxos

eletrônicos instantâneos, a sociedade civil global percebeu a necessidade de se interconectar,

como por exemplo, as ONGs. Assim, ao se depararem com conflitos e problemas de

proporções imprevistas, elas estariam preparadas para reagir na mesma velocidade e dimensão

(De Moraes, 2001).

Alguns problemas enfrentados pela sociedade civil global, incluído os movimentos

sociais, se mostraram semelhantes em vários lugares no planeta e, se beneficiando da

globalização, a sociedade civil global se formou de maneira a organizar esses movimentos e

articular ações de maneira conjunta, agregando mais poder internacional. Poder este que,

devido à tamanha interdependência no sistema afeta governos para que os objetivos sejam

alcançados.

Durante os anos 90, a Internet ainda não era difundida como atualmente, nota-se uma

evolução no que tange ao relacionamento entre ONGs, constituindo redes que teciam um

“link” entre as ações locais e globais, tanto intra-organizacionais como inter-organizacionais.

Os motivos dessa evolução são vários, dentre os quais se destacam: o desenvolvimento

tecnológico, os conflitos sociais e ambientais se tornaram internacionais, a necessidade de

mais parcerias (Moraes, 2001).

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No mundo virtual criado pela Internet, a sociedade civil global consegue articular

manifestações em qualquer lugar do planeta, sem estar fisicamente presente. Assim, formam

uma rede de articulação internacional, dividindo funções, custos e recursos (Moraes, 2001).

Os efeitos também são notados no campo da política, uma vez que agindo em conjunto elas

têm acesso à um maior número de pessoas, somando poder político.

Os movimentos baseados na sociedade civil se adaptaram às novas tecnologias e

formas de ativismo, nas palavras de Marques (2003:13):

“Muitos de nós já recebemos em nossas caixas de e-mail, por

exemplo, mensagens cujo conteúdo tem relação com campanhas virtuais de

Organizações Não-Governamentais (ONGs). São abaixo-assinados

repudiando determinada empresa ou atitudes de Estados, textos destinados

à captação de recursos financeiros, disseminação de informações e

pesquisas e, sobretudo, presença institucional. Com a popularização da

Internet, a partir de 1996, essas organizações ganharam mais um espaço de

divulgação, interação e aglutinação de seus componentes. O acesso a um

computador conectado à Internet dá ao usuário a possibilidade de

participar de ações promovidas por movimentos sociais de um ponto nas

redes telemáticas.”

A drástica diminuição nos custos da comunicação internacional alterou os objetivos e

resultados das ações da sociedade civil global. Um exemplo é a rebelião de Chiapas, no sul do

México em janeiro de 1994. Após algumas horas da primeira troca de tiros, uma quantidade

significativa de mensagens de ativistas de direitos humanos foi jogada na internet. A iniciativa

atraiu o interesse da mídia internacional e ativistas se dirigiram para o local, limitando o poder

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de resposta armada do governo mexicano. O suposto conflito se tornou não-violento e, mais

tarde, Angel Gurria, Ministro das relações exteriores do México na época disse que o conflito

durou dez dias e, depois disso, a guerra havia trocado de cenário, havia se transferido para a

Internet, uma vez que os conflitos armados haviam cessado enquanto na internet diversos

grupos continuavam a manifestar insatisfação pelo ocorrido (Mathews, 1997).

A diversidade de ação destes grupos baseadas na sociedade civil é enorme, como

evidenciado por Mathews (1997:53):

“A extensão dos trabalhos destes grupos é quase tão ampla quanto seus

interesses. Eles criam novas idéias; advogam, protestam, e mobilizam apoio

público; fazem analises legais, científicas, técnicas e políticas; fornecem

serviços; moldam, implementam, monitoram e reforçam comprometimentos

nacionais e internacionais; alteram instituições e normas.”

Assim, a sociedade civil vai crescendo em espaços onde o poder estatal não mais

consegue exercer suas funções. Os fatores descritos anteriormente neste trabalho, demonstram

como funções antes monopolizadas pelo Estado passaram a contar com a presença de novos

atores, tirando parte do papel estatal.

Na última década, o número de organizações não-governamentais aumentou

significantemente e, algumas se apresentam com mais experiência e recursos do que governos

menores ou organizações internacionais. Em 1993, por exemplo, a Anistia Internacional tinha

mais recursos, dentre eles monetário, do que o Centro para os Direitos Humanos da Nações

Unidas. E, atualmente, as ONGs prestam mais assistência oficial para o desenvolvimento

(excluindo o Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional) do que todo o sistema das

Nações Unidas (Mathews, 1997).

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Não obstante, em alguns locais, as iniciativas civis prestam serviços básicos, antes

fornecidos pelos Estados. Serviços, tanto em âmbito rural como no urbano, de

desenvolvimento, educação e saúde são prestados à população em áreas onde os governos não

conseguem (Mathews, 1997).

A força destes movimentos, principalmente das ONGs, é notável e exerce pressão até

mesmo nos mais poderosos Estados. A exigência por inclusão nas negociações do NAFTA de

temas como saúde, segurança, poluição transfronteiriça, proteção do consumidor, imigração,

mão-de-obra infantil, mobilidade de mão-de-obra, sustentabilidade agrícola, foram feitas por

organizações não-governamentais do México, Canadá e Estados Unidos. Ao fim, a

administração Bush decidiu por estender o tratado para o meio-ambiente e questões

trabalhistas (Mathews, 1997).

As organizações internacionais também sofrem pressões por parte da sociedade civil

global, motivo ao qual as levou à trabalhar em conjunto em determinados momentos. Essa

questão conflita com os interesses dos Estados, que temem a emergência de novos atores ao

mesmo tempo em que luta pela manutenção da soberania. A situação é contrastante, pois de

um lado estão os Estados que dificultam a implementação de políticas por parte das

organizações internacionais devido ao interesse na manutenção da soberania e, de outro lado,

as entidades civis cheias de novas idéias, energia e demandando por um maior papel no

cenário mundial (Mathews, 1997).

Não obstante, empresas transnacionais também são afetadas pelas iniciativas da

sociedade civil. Em 1997, a PepsiCo iniciou suas participações em Burma (Mianmar). Em

seguida, a Free Burma Coalition, um grupo de cidadãos baseado nos Estados Unidos ligado

aos direitos humanos, exerceu pressão para que a Harvard University cancelasse um acordo

de um milhão de dólares com a PepsiCo, além de realizar boicotes contra seus produtos como

forma de protesto e coerção à participação da empresa em Burma (Perlas, 2000).

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Organizações como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional já realizam

alianças com a sociedade civil. Estas alianças foram vistas como necessárias diante das

mudanças sistêmicas para que as políticas implementadas atingissem os objetivos no Estados

alvos (Mathews, 1997).

Desta forma, grupos da sociedade civil respondem mais rapidamente às demandas e

oportunidade. Eles conseguem disponibilizar diversos tipos de serviços públicos, tanto em

países desenvolvidos como nos em desenvolvimento. Além disso, eles conseguem responder

melhor à problemas que aparecem de forma lenta, que com o passar do tempo acumula

conseqüências negativas, como problemas ambientais, crescimento populacional e pobreza

(Mathews, 1997).

A sociedade civil global executa lobbies onde quer que seja relevante para sua causa.

Alguns grupos transnacionais de cooperação para o desenvolvimento exercem pressão em

autoridades locais no Sul, grupos de mulheres atuam na Europa pressionando grupos à nível

regional na União Européia e, no nível global, o Fundo Monetário Internacional sofre pressão

de diversas uniões federais de comércio. Atualmente, a maioria das agencias de governança já

estabeleceram um canal de contato com a sociedade civil. Desta maneira, a sociedade civil

aumentou a legitimidade da governança supraestatal (Scholte, 2000).

Outra questão é o desenvolvimento de identidades étnicas. Com a maior participação

da sociedade civil, foi possível desenvolver identidades étnicas através do apoio a grupos

locais, como os povos indígenas na África. Desta forma, cria-se uma maior diversidade que

estimula e molda a ação política. Além disso, dissemina a cidadania, divulgando direitos e

deveres das pessoas (Scholte, 2000).

A democracia também sofreu alterações. Associações civis transfronteiriças criaram

novos canais de participação popular, fóruns, novos métodos de consulta popular, novos

locais de representação popular junto à conselhos eleitos e legislaturas e novas pressões

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populares para uma governança aberta e responsável. Assim, a sociedade civil global aliviou o

déficit democrático do sistema, permitindo uma maior participação das pessoas (Scholte,

2000).

A nova força no cenário internacional, a opinião pública internacional também se

apresenta como fator incisivo. Geralmente, mobilizada pelas ONGs, as opinião pública

internacional pode ser extremamente eficiente, alcançando seus objetivos de maneira rápida.

Por outro lado, a opinião pública doméstica permite que as ONGs atuem no interior de outros

Estados, exercendo pressão sobre os governos através de grupos domésticos. As ONGs

também auxiliam os cidadãos locais colocando-os em contato com grupos melhor articulados

e estruturados nos EUA e Europa (Mathews, 1997).

Contudo, apesar de exercer pressões e conseguir moldar agendas, a sociedade civil

teve sua importância mais visivelmente reconhecida em 1992, na Conferência sobre o Meio-

ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas no Rio de Janeiro. Na ocasião, foi registrado

o maior número de ONGs trabalhando para Estados e acabaram por serem permitidas de

participar do grupo decisório, adentrando de vez no palco da tomada de decisões.

Este poder de persuasão, pressão e uma maior participação na tomada de decisão dos

Estados, além de capacitar a sociedade civil em exercer funções antes estatais, foi chamado de

terceiro poder global por Perlas (2000). Outros autores como Lipchutz (2005) identifica

quatro tipos de poder, sendo que dois deles podem representar o poder da sociedade civil.

O poder produtivo é associado à linguagem e às práticas que constroem e organizam a

vida social, individual, coletividades identitárias e membros de uma comunidade política. Ele

pode ser exercido através de discursos e ações coletivas por grupos engajados em lutas sociais

objetivando afetar instituições e estruturas. O segundo poder é o institucional, que é a

capacidade e autoridade de estabelecer grupos coletivos para administrar e manipular

situações em seu interesse (Lipchutz, 2005).

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Contudo, não é objetivo deste identificar o tipo e a natureza do poder e sim identificar

a sua existência. Desta maneira, foi analisado o papel de processos e características do sistema

de maneira à fundamentar essa possibilidade.

A sociedade civil passou a fazer parte das relações internacionais contemporâneas. Ela

participa nos mais diversos assuntos (meio-ambiente, direitos humanitários, saúde, dentre

outros) e das mais diversas formas, atuando em meio à outros atores, seja de maneira conjunta

ou independente, passando a figurar na gama de atores internacionais.

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05 - CONCLUSÃO

O objetivo deste trabalho é a identificação de um poder não-estatal, baseado na

sociedade civil. Desta maneira foram expostos temas que colaboraram para a emergência da

sociedade civil global e, além disso, criaram um ambiente propício para tal fato. A

globalização, a revolução tecnológica, a interdependência complexa e a governança global

exercem papel crucial para tal fenômeno de maneira interdependente e não hierárquica.

A globalização trouxe aspectos como a supraterritorialidade que colaborou com a

diminuição das “barreiras” entre os Estados, incentivando os contatos transfronteiriços. A

facilitação destes contatos levou à emergência de uma consciência global e um espaço global

para as relações sociais.

A globalização intensificou todos os processos descritos neste trabalho. A

intensificação dos fluxos entre as fronteiras criou a necessidade de adaptação do sistema. As

agendas se tornaram mais flexíveis e atendem aos interesses de um número maior de atores.

Por sua vez, a revolução tecnológica propiciou a intensificação da globalização. As inovações

tecnológicas permitiram uma troca de informações rápida, quase que instantânea, entre

praticamente todas as pessoas do planeta. Os custos destas trocas diminuíram

significantemente. As mudanças tecnológicas tornaram possível a criação de espaços globais

e facilitaram a disseminação de valores, culturas, dentre outros.

A interdependência complexa, por outro lado, alavancou entendimentos internacionais

em áreas como economia e cooperação. A soberania foi afetada com um sistema onde o

estado de mútua dependência limita as ações estatais. O papel do poder militar diminuiu ao

mesmo tempo em que temas sociais ganharam espaço nas agendas internacionais. Novos

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atores surgem no cenário internacional baseados nesta interdependência, assim como uma

diversificação na agenda internacional. Os contatos entre os atores também se intensificaram

devido aos canais múltiplos, afetando as relações inter-estatais. Desta maneira, foi possível a

emergência de atores de fora do âmbito estatal, dentre eles a sociedade civil global.

Concomitantemente, a governança global e a ordem mundial incentivados pela

globalização, favorecidos pela interdependência complexa, que cria uma sensibilidade no

sistema às ações dos atores, criaram padrões e valores entre os atores de maneira voluntária.

Os padrões variam entre fundamentais como a cooperação e a diplomacia e rotineiros como o

comércio e a economia. A aceitação de tais padrões se baseia na identificação de objetivos

comuns entre os atores, fazendo-os demandarem estes entendimentos para diminuírem os

custos.

A congruência de todos estes aspectos leva à emergência da sociedade civil global em

um cenário interdependente e complexo. A capacidade de organização de grupos civis fez

com que diversas entidades em diversos âmbitos de ação emergissem e passassem a atuar em

conjunto com atores tradicionais, como o Estado.

As ações variam desde a simples consultas econômicas até ajuda humanitária. Desta

maneira, as entidades baseadas na sociedade civil vão tomando lugar dos Estados em assuntos

que se tornaram inviáveis para eles e em atividades onde ele considera mais vantajoso delegá-

los à sociedade civil.

Alheio às vontades e capacidades estatais, a sociedade civil passou a reinvidicar

políticas e direitos dos Estados. A intensificação do fluxo de informação agregou pessoas de

diversos pontos do planeta que compartilham uma insatisfação em comum e, depois de

organizadas, exercem lobby em governos nacionais.

As organizações internacionais das mais diversas naturezas também abriram suas

portas para a sociedade civil global através de canais diretos de comunicação, consulta e

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permitindo a participação em fóruns e seminários. Em alguns casos, a sociedade civil global

está presente até mesmo em reuniões decisórias, concretizando a sociedade civil na tomada de

decisões globais.

A sociedade civil passou, então a atuar em meio a Estados e OIs. Podendo ser esta

atuação à favor, em conjunto, em cooperação ou em forma de resistência e protestos por

decisões e políticas adotadas. Desta forma um poder não-estatal, baseado na sociedade civil -

capaz de influenciar governos, instituições, empresas, de configurar agendas e pressionarem a

tomada de decisão dos Estados – pode ser identificado no sistema internacional diante das

alterações propiciadas pela globalização, revolução tecnológica, governança global e a ordem

mundial e interdependência complexa.

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