Cesar Vidal Manzanares - Dicionario de Jesus e dos Evangelhos

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Dicionrio de Jesus e dos Evangelhos

Csar Vidal Manzanares

Dicionrio de Jesus e dos Evangelhos

EDITORA SANTURIO Aparecida-SP

Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Manzanares, Csar Vidal, 1958Dicionrio de Jesus e dos evangelhos / Csar Vidal Manzanares; | traduo de Ftima Barbosa de Mello Simon |. Aparecida, SP: Editora Santurio, 1997. Ttulo original: Diccionario de Jess y los evangelios. Bibliografia. ISBN 85-7200-479-3 1. Bblia - Dicionrios 2. Jesus Cristo I. Ttulo. 97-2199 ndices para catlogo sistemtico: 1. Bblia: Dicionrios 220.3 CDD-220.3

Ttulo original: Diccionario de Jess y los Evangelios Editorial Verbo Divino, 1995 ISBN: 84-8169-037-6

Traduo de Ftima Barbosa de Mello Simon Ilustrao da Capa: Pinxit G. A. Lomuscio Foto: Giorgio Vasari

Todos os direitos em lngua portuguesa reservados EDITORA SANTURIO - 1997 Composio, impresso e acabamento: EDITORA SANTURIO - Rua Padre Claro Monteiro, 342 Fone: (012) 565-2140 12570-000 Aparecida-SP.

Ano: 2003 2002 2001 Edio: 7 6 5 4 3 2

ApresentaoTalvez seja lugar-comum dizer que poucas obras, no decorrer da histria da humanidade, tm desfrutado de uma influncia to ampla como os Evangelhos. Talvez, mas no por isso a afirmao menos correta. Mesmo que se abstraia seu contedo espiritual questo que raia ao impossvel pouco se duvida que os Evangelhos e seu protagonista indiscutvel, Jesus de Nazar, continuam sendo, h praticamente dois mil anos, um poderosssimo referente social, artstico e tico. Boa prova disso que at mesmo aqueles que se definem como supostamente no afetados pelo fenmeno espiritual continuam, de maneira explcita, envolvidos em uma dialtica de negao ou confrontao direta com a pregao evanglica, atitude sem paralelos em relao a outras mensagens de contedo espiritual. Essa caracterstica, incontestvel ponto de referncia, tem dificultado sejamos sinceros em reconhec-lo a aproximao das diversas disciplinas aos Evangelhos no decorrer dos sculos. No corpo da presente obra, faz-se referncia concreta a aspectos como a exegese, as datas de redao ou o contedo de cada Evangelho, e seria intil reiterar aqui os pontos de vista expostos em diferentes vozes. Nas linhas seguintes, portanto, faremos referncia a questes no tratadas de maneira especfica, mas que so de especial importncia para abordar o estudo dos Evangelhos e a leitura das pginas que seguem. Refirome aos Evangelhos, considerando-os como gnero, como histria e, last but not least, como Boa Nova.

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Os Evangelhos como gnero literrio A problemtica relacionada com o gnero literrio a que pertencem os Evangelhos constitui, na realidade, um debate contemporneo ligado moderna investigao sobre o Novo Testamento. Em 1915, C. W. Votaw destacava que os Evangelhos podiam ser enquadrados na literatura biogrfica greco-romana, o que no iniciaria, mas impulsionaria, de maneira decisiva, a discusso sobre esse tema1. Em 1923, a posio de Votaw seria questionada radicalmente por K. L. Schmidt2. Este autor sustentava que os Evangelhos eram um tipo especfico de literatura crist primitiva no relacionado com outros gneros da Antigidade. As teses de Schmidt repercutiram e, de fato, converteram-se em uma espcie de dogma durante as dcadas posteriores, para o que colaborou a forma com que aquelas eram tributrias das contribuies do novecentista F. Overbeck3 e da crtica das formas. Praticamente, at a dcada de setenta, no presente sculo, existia um consenso quase generalizado que os Evangelhos constituam um gnero literrio per se, no mbito do mundo greco-romano, e que careciam de semelhana com outras obras do contexto cultural, a no ser que nos referssemos a relatos do tipo fabuloso e irreal. Essa postura comeou a ser questionada h mais de duas dcadas e atualmente est superada. O novo enfoque partia, na realidade, de uma nova aproximao aos Evangelhos (iniciada nos anos 50) que questionava a crtica das formas e a crtica da redao como teorias vlidas para explicarem a origem dos mesmos e analisarem seu contedo.

1 C. W. Votaw, The Gospels and Contemporary Biographies in the Greco-Roman World, em AJT, 19, 1915, pp. 45-73 e 217249. 2 K. L. Schmidt, Die Stellung der Evangelien in der allgemeinen Literaturgeschichte, em H. Schmidt (ed), Eucharisteion, Gotinga 1923, pp. 50-134. 3 F. Overbeck, ber die Aufnge der pratistichen Literatur, em HZ, 12, 1882, pp. 417-472.

Apresentao / 7

As alternativas propostas deixaram, no obstante, de resultar sempre acertadas. Pretendeuse mesmo identificar os Evangelhos com o gnero da aretologia, um suposto gnero para narrar a vida dos homens divinos da Antigidade. Mesmo que algum autor ainda sustente esse ponto de vista, hoje em dia o mesmo majoritariamente refutado pelos especialistas4 porque, na realidade, no dispomos de base slida para crer que o mencionado gnero existiria como tal nesse perodo histrico. Em termos gerais, os autores que ainda consideram que os Evangelhos podem ser enquadrados nos gneros greco-romanos fazem-no no mbito da biografia, da histria ou da novela. O certo, entretanto, que a questo est muito longe de ser facilmente resolvida. Vejamos o porqu. Em primeiro lugar, deve-se assinalar que os Evangelhos e nisso no se diferenciam, como veremos mais adiante, de outras fontes histricas da Antigidade no so escritos imparciais, mesmo que no caiam nos excessos lendrios dos Evangelhos apcrifos. Alm disso, como muito acertadamente D. E. Aune5 salientou, recordam consideravelmente o gnero de biografias populares tpico da literatura greco-romana, seguindo inclusive convenes literrias como a que encontramos em Lc 1,1-4. Contudo, os Evangelhos guardam distncias do mundo greco-romano em alguns aspectos de no pouca importncia. Assim, por exemplo, tm uma especial predileo pelas referncias ao Antigo Testamento e, evidentemente, pelas crenas crists primitivas a respeito de Jesus. Em outras palavras, os evangelistas seguiram alguns procedimentos literrios greco-romanos, porm no foram servis em relao a eles, podendo-se perceber tambm uma transcendental influncia judia facilmente explicvel. Sem d-

4 Ver a respeito: H. C. Kee, Aretalogies, Hellenistic Lives and the Sources of Mark, em Colloquy 12, Berkeley 1975. 5 D. E. Aune, The New Testament in Its Literary Environment, Filadlfia 1987, pp. 17-76.

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vida, neles dever influir a popularidade que ento o gnero biogrfico tinha no mundo grecoromano, como tambm o desejo de colocar em forma escrita os relatos orais e colees previamente relacionadas vida, ensinamento, morte e ressurreio de Jesus, a quem as comunidades crists viam como Senhor e Messias6. Os mesmos evangelistas no se viam, portanto, como autores de uma obra literria, mas como transmissores de um testemunho de conseqncias transcendentais para todo ser humano. O trabalho deles no era de criao, mas de servos (hyperetai) da Palavra (Lc 1,2). Por isso, diferentemente dos relatos hagiogrficos da poca, no buscaram retratar as qualidades de Jesus ou contar seus louvores de carter moral. Na realidade, os textos caracterizam-se por uma espantosa escassez de detalhes sobre Jesus como indivduo. O que interessava nele que era o cumprimento das profecias messinicas confiadas a Israel durante sculos; que sua morte expiatria oferecia o caminho de salvao para a humanidade e que seu chamado universal dirigia-se no s para assegurar a felicidade, mas tambm, e de maneira irrefutvel, para permitir que Deus operasse uma mudana radical da pessoa aqui e agora, para que esta se convertesse verdadeiramente a seu Rei. Esses aspectos so ainda mais bvios quando descemos ao terreno concreto de cada um dos Evangelhos. Marcos parece mostrar a influncia do gnero biogrfico7 (tambm se destaca seu paralelismo com outros8) seja este consciente ou

6 Nesse mesmo sentido, ver G. N. Stanton, Jesus of Nazareth in New Testament Preaching, Cambridge 1974. 7 Nesse mesmo sentido, ver P. Cox, Biography in Late Antiquity, Berkeley 1983, e A. Momigliano, The Development of Greek Biography, Cambridge 1971. 8 G. G. Bilezikian, The Liberated Gospel of Mark and Greek Tragedy, Grand Rapids 1977, e B. Standaert, L Evangile selon Marc: Composition et genre litteraire, Brujas 1978, compararam a estrutura de Marcos com a tragdia grega. Como acertadamente destacou D. E. Aune, o. c., pp. 48-49, as semelhanas mais parecem mera coincidncia.

Apresentao / 9

no. Mateus tambm permite traar paralelismos com biografias antigas, porm por sua vez e de forma predominante evidente nele o emprego preponderante de elementos procedentes do judasmo e do cristianismo primitivo. A isso se deve acrescentar que os destinatrios de sua obra eram no somente as pessoas de fora como as de dentro; no somente os no-convertidos como os discpulos. Lucas, sem dvida, o que apresenta maior paralelismo com os gneros literrios grecoromanos, e assim tem sido tratado pelos especialistas. Para Aune, por exemplo, Lucas e Atos so um claro exemplo de historiografia greco-romana9; e, para Talbert, tratar-se-ia antes de uma biografia10. So inegveis, contudo, os elementos judeus que participaram de maneira decisiva da obra de Lucas. Finalmente, Joo levando em conta as suas diferenas com os outros Evangelhos assemelha-se mais a isso do que a qualquer outra obra, e assim tem sido revelado por diversos estudiosos que o consideram uma fonte histrica (Talbert, J. A. T. Robinson). Concebidos os quatro, em grande parte, para o uso interno (Mateus, Marcos), resulta tambm bvia sua finalidade externa (Lc 1,1-4; Jo 21,30-31). Em termos gerais, portanto, podemos afirmar que os Evangelhos cannicos encaixam-se no gnero biogrfico-histrico existente na literatura greco-romana, gnero, por outro lado, muito diferente da novela, da hagiografia, da biografia lendria ou do relato mitolgico. No entanto, em relao aos Evangelhos, nesse gnero se produzem encadeamentos de elementos bem distanciados culturalmente do contexto do judasmo e do cristianismo primitivo. Em outras palavras, por razo das contribuies externas ao mundo grecoromano, os Evangelhos cannicos seriam biografias clssicas sui generis ou, se preferir, um subgnero dentro do referido gnero literrio.

9 D. E. Aune, Greco Roman Literature on the New Testament, Atlanta 1988. 10 C. H. Talbert, What is a Gospel, Filadlfia 1977.

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Uma vez chegados a esse ponto, a questo que logicamente se estabelece a do grau de confiabilidade histrica que podemos atribuir a eles. Os Evangelhos como fontes histricas Em termos simplesmente textuais, os Evangelhos oferecem, a partir de uma perspectiva histrica, um panorama incomparvel. Atualmente contamos com 2.328 manuscritos e fragmentos de manuscritos que abrangem a totalidade dos Evangelhos e que pertencem cronologicamente aos primeiros sculos de nossa era11. Noventa e sete a noventa e nove por cento do texto foi recuperado com absoluta certeza. Mais de cinqenta e quatro por cento dos versculos dos Evangelhos esto livres de variantes textuais e, em sua grande maioria, no apresentam problemas de historicidade. De fato, e evitando o tom apologtico, pode-se afirmar que nenhuma obra da Antigidade conta com um nmero sequer aproximado de textos, nem um grau similar de conservao. Como ressaltou, no momento oportuno, o falecido catedrtico da Universidade de Manchester, F. F. Bruce: Para a Guerra das Glias de Csar (composta entre 58 e 50 a.C.) h vrios manuscritos, mas s nove ou dez esto bons, e o mais antigo data de 900 anos mais tarde do que a poca de Csar. Dos 142 livros da Histria Romana de Lvio somente nos chegaram 35; destes nos so conhecidos no mais do que 20 manuscritos de pouco valor, dos quais um somente, e contendo fragmentos dos Livros III-VI, do sculo IV. Dos 14 livros das Histrias de Tcito apenas sobreviveram quatro e meio; dos 16 livros de seus Anais, 10 sobreviveram completos e dois em parte. O texto das partes restantes de suas

11 O mais antigo o manuscrito John Rylands (p. 32), que contm Jo 18,31-33.37-38, datado entre 90 e 110 d.C. O papiro OCallagham no pode ser considerado como restante dos Evangelhos.

Apresentao / 11

grandes obras histricas depende totalmente de dois manuscritos: um do sculo IX e outro do sculo XI12. O tipo de material histrico contido nos Evangelhos de difcil negao ou afirmao partindo de fontes arqueolgicas. Sem dvida, e por regra geral, as descobertas realizadas nesse campo vm confirmar os dados evanglicos, por exemplo: a existncia da piscina de Betesda de Jo 5,2; a importncia de Pilatos como prefeito da Judia, segundo uma inscrio da Cesaria martima, descoberta em 1961 etc. Algo semelhante podemos dizer das fontes externas (Ver *Jesus nas fontes no-crists). O testemunho sobre Jesus muito escasso e pequeno, mas no contradiz os dados evanglicos e at mesmo os confirma. Por outro lado, os materiais de que se nutriram os redatores dos Evangelhos que concluram sua obra durante o sculo I e, muito possivelmente, antes do ano 70 d.C. parecem ter sido abundantes e cuidadosamente conservados e transmitidos. O mesmo anonimato de seus autores (o que em si no confirma nem nega os testemunhos da tradio a respeito) vem creditar a tese, como j afirmamos, de que eles no se reconheciam como criadores, mas como transmissores fiis de testemunhos anteriores j escritos, como Q (c. 40-50 d.C.)13, ou orais. O mesmo ensinamento oral conforme oportunamente manifestaram Gerhardson e Riesenfeld no somente no desvirtuou o contedo original como tambm foi transmitido fidedigna e escrupulosamente. Recentemente, C. L. Blomberg indicou alguns dos fatores que contriburam decisivamente para isso: 1. Jesus era visto como a Palavra de Deus e, portanto, seu ensinamento devia ser cuidadosamente transmitido; 2. Mais de noventa por

12 F. F. Bruce, The New Testament Documents, Downers Groves 1964, pp. 179 -180. 13 A respeito de Q, ver C. Vidal Manzanares, El Primer Evangelio: el documento Q, Barcelona 1993.

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cento de seu ensinamento tem estrutura potica, o que facilita sua memorizao; 3. A memorizao era parte integrante dos sistemas de educao e aprendizagem na Antigidade; 4. A histria oral permitia certa margem de liberdade em relao apresentao, mas no quanto substncia do relato; 5. Era habitual anotar-se o ensinamento dos rabinos; 6. As escassas referncias a Jesus, em disputas eclesiais posteriores, obrigam a pensar que os primeiros discpulos no inventaram ensinamentos que depois colocaram nos lbios de Jesus para defender os prprios pontos de vistas; 7. Tem-se enfatizado excessivamente que a crena em um breve regresso de Jesus presumidamente levou os primeiros cristos a no registrarem por escrito os ensinamentos de seu Messias at a segunda gerao. Somente partindo da compreenso desses fatos, podemos explicar historicamente o grau de concordncia existente entre os evangelistas. Noventa e um por cento (601 versculos de 661) de Marcos aparecem em Mateus ou Lucas e, geralmente, nos dois. Outros 235 versculos aparecem em Mateus e Lucas, embora no em Marcos. Sessenta e oito por cento do material narrativo comum a Marcos e Lucas ou Mateus encontram-se tambm na mesma ordem, coincidncia extraordinria que faz pensar na existncia de um padro para contar a vida de Jesus, subjacente nas trs obras. As discrepncias entre os Evangelhos, por sua vez, so to pequenas que parecem desonestidade referir-se a elas como contradies (C. L. Blomberg)14. De fato, em lugar de contradies, o que encontramos so relatos mais breves de um mesmo acontecimento (Mc 5,21-43 e Mt 9,1826; Mc 11,12-14.20-21 e Mt 21,18-22 etc.); situao distinta no relato como conseqncia de uma estrutura narrativa diferente (Lc 4,16-30;

14 C. L. Blomberg, The Historical Reliability of the Gospels, Downers Grove 1987; S. C. Goetz C. L. Blomberg, The Burden of the Proof, em JSNT, 11, 1981, pp. 39-63.

Apresentao / 13

Mc 6,1-6); intenes de esclarecimento da fonte em relao aos destinatrios do Evangelho (Mc 10,18 e Mt 19,17; Lc 14,26 e Mt 10,37); ensinamentos de Jesus situados em diversos contextos (algo compreensvel, se levamos em conta que seus ensinamentos seriam repetidos em ocasies distintas) (Mt 5-7 e Mt 24-25); diferenas de matiz na traduo de uma fonte semtica prvia etc. Cavalo de batalha desde Strauss e Reimarus em relao confiabilidade histrica dos Evangelhos tem sido o tema dos milagres neles relatados. Sem dvida, trata-se de uma questo com conotaes meta-histricas; mas, sem entrar na mesma e j passada a poca de um cientificismo reducionista, nascido em grande parte do Iluminismo, podemos afirmar hoje, com certeza, trs coisas. Primeiro: as referncias a acontecimentos inexplicados ou sobrenaturais tambm so abundantes em autores clssicos cujo carter como fonte histrica indiscutvel (Tcito, Suetnio, Tito Lvio, Flvio Josefo etc.). Segundo: o mtodo cientfico no conta com instrumentos vlidos para conhecer alm daquilo que objeto de seu estudo e, portanto, mal pode pronunciar-se sobre fatos indiscutveis no sujeitos observao direta. Terceiro: o historiador no pode a priori negar os relatos relacionados a milagres, ainda mais tendo em vista o impacto histrico que tiveram esses acontecimentos (a ressurreio, por exemplo), embora no possa julgar, evidentemente, a natureza dos fatos sucedidos. Um autor pouco suspeito de ortodoxia como M. Smith15 afirmou que no se pode negar que Jesus realizou curas; e um estudioso da Antigidade clssica, catedrtico da Universidade de Yale, Ramsay McMullen, assinalou que os mencionados relatos de milagres no apenas no podem ser negados irrefletidamente como fraude, mas tambm

15 M. Smith, Jesus the Magician, So Francisco 1978. (Existe edio castelhana em Martnez Roca, Barcelona 1988, com o ttulo de Jess, el mago).

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so indispensveis para se entender a expanso do cristianismo e a compreenso do paganismo no Imprio Romano16. Certamente, sem a crena na ressurreio, inexplicvel a expanso do cristianismo aps a morte de Jesus e, por sua vez, evidente que no foi a f que produziu a crena na ressurreio, mas foi a convico nessa crena que dissipou a incredulidade e o desnimo dos discpulos e gerou a f (F. F. Bruce, C. Vidal Manzanares etc.)17. Certamente muitas das informaes contidas nos Evangelhos no podem ser confirmadas por testemunhos externos (algo comum em fontes histricas da Antigidade), mas tampouco so desmentidas nem temos razes para duvidar delas. De fato, tanto a evidncia externa como a interna apontam para o fato que os Evangelhos constituem fatores histricos confiveis que nos permitem conhecer, em grande parte, a vida e o ensinamento de Jesus18. Em sentido semelhante manifestou-se o professor David Flusser, da Universidade Hebraica de Jerusalm, com uma srie de afirmaes bastante interessantes, se considerarmos que elas no provm de um cristo, mas de um estudioso judeu especializado no perodo do Segundo Templo: Os discpulos de Jesus que relataram as palavras e as aes do mestre... no podiam deixar de aspirar mxima veracidade e exatido, j que para eles tratava-se da fidelidade a um imperativo religioso e no lhes era lcito afastarem-se do que realmente aconteceu; deveriam transmitir, com a maior exatido, as palavras do mestre... pois se no se ativessem fielmente aos fatos teriam colocado em perigo sua salvao eterna. No lhes era lcito mentir19.

16 R. MacMullen. Christianizing the Roman Empire, Yale 1984, e idem, Paganism in the Roman Empire, Yale 1981. 17 Uma anlise em profundidade do tema com bibliografia em C. Vidal Manzanares, El Judeo-cristianismo palestino en el s. I: de Pentecosts a Jamnia, Madri 1995. 18 A respeito, ver o apndice I de C. Vidal Manzanares, El Primer Evangelio: el Documento Q, Barcelona 1993. 19 D. Flusser, Jess, Madri 1975, p. 148.

Apresentao / 15

Longe de cair no relativismo de Bultmann ou de seus epgonos, o historiador acostumado a trabalhar com as fontes da Antigidade no considera que cada parte dos Evangelhos suspeita per se, exceto prova em contrrio. De fato, essa postura implicaria inverter o mtodo histrico normal e aplicar um critrio muito mais rigoroso s fontes bblicas do que o utilizado habitualmente com outros escritos antigos. Ele realiza uma anlise, valendo-se dos princpios normais de trabalho e, nos casos em que no possvel afirmar ou negar a partir de evidncia externa, concede ao menos o benefcio da dvida, tendo em conta a exatido habitual das fontes e o rigor com que se transmitiu e se fixou por escrito o material. precisamente esse ponto metodolgico de partida que permite ler os Evangelhos como so fontes histricas sem que essa viso seja nublada por pressupostos prvios no de carter cientfico, mas filosfico. A isso tambm se atribui o fato de, em regra geral, os historiadores e os arquelogos terem uma opinio muito mais positiva do Novo Testamento como fonte histrica do que a sustentada pelos telogos, pelos filsofos ou pelos fillogos20. Sem dvida, nenhuma anlise por mais cientfica que se pretenda pode subestimar outro fato de considervel importncia: a circunstncia de que os Evangelhos foram escritos no somente com o desejo de preservar a histria de Jesus e faz-lo com as maiores garantias de fidelidade como tambm, conforme seu prprio nome indica, com o de apresentar uma Boa Notcia. Os Evangelhos como Boa Nova Nas pginas anteriores tivemos oportunidade de ver como os Evangelhos se enquadram no

20 Ver a respeito meu apndice dedicado ao estudo histrico do Livro dos Atos em C. Vidal Manzanares, El judeo-cristianismo palestino en el s. I d.C.: de Pentecosts a Jamnia, Madri 1995.

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gnero histrico-biogrfico do mundo greco-romano, com transcendentais e importantssimas contribuies judaicas. Vimos tambm que, como fontes, apresentam importantes garantias de fidedignidade e, textualmente, carecem de paralelos na histria da Antigidade, exceto no que se refere a outros textos do Novo Testamento. Sem dvida, inclusive em termos histricos, os Evangelhos vo alm do mero relato. Sua finalidade levar o leitor ou ouvinte a examinar a evidncia fidedigna apresentada por testemunhas confiveis (Lc 1,1-4), a fim de que, ao faz-lo, cada pessoa conclua que Jesus o Messias e o Filho de Deus e que a vida eterna dada aos que nele crem (Jo 20,30-31). Expressas de diversas maneiras, em forma potica ou direta, em parbolas ou diatribes, as linhas mestras dos Evangelhos so facilmente identificveis. Em primeiro lugar, os quatro partem do princpio que o ser humano, a causa do pecado, encontra-se em um estado de perdio. Essa realidade universal, Jesus simbolizou-a com as imagens da ovelha desgarrada, da moeda perdida, do filho prdigo (Lc 15), do doente que necessita de mdico (Mc 2,17). Contudo, diante dessa triste e dolorosa realidade do ser humano, eleva-se o amor de Deus, um amor to extremado que enviou seu Filho Jesus, o Messias, para que todo aquele que nele crer passe da morte para a vida (Jo 5,24), no perea, mas tenha a vida eterna (Jo 3,16) e se converta em filho de Deus (Jo 1,12). O preo do resgate, da redeno a morte desse mesmo Jesus como o Servo Sofredor profetizado no captulo 53 do Livro de Isaas (Mc 10,45 e par.), o derramamento de seu sangue sobre o qual se fundamenta o estabelecimento de uma Nova Aliana entre Deus e a humanidade (Mt 26,28 e par.). Por isso, sua morte no foi fruto de um erro judicial ou de um plano erroneamente executado e fracassado. Constitua parte essencial da misso de Jesus e da qual ele estava consciente (Jo 10,15.17-18). Por isso tambm, a cruz no foi o final. Jesus levantou-se dentre os mor-

Apresentao / 17

tos e apareceu a numerosas testemunhas, convencendo at mesmo os incrdulos (Jo 20,27ss.) e os confusos (Lc 24,13ss. Comparar com 1Cor 15,1ss.). Por isso, a leitura dos Evangelhos fala diretamente ao corao do homem e da mulher de todos os tempos. Ainda mais: com decisiva insistncia. As afirmaes a respeito no deixam lugar a dvidas. Ningum pode encontrar o caminho, a verdade e a vida sem se agarrar a Jesus (Jo 14,6). Ningum pode alcanar a liberdade a no ser que a receba de Jesus (Jo 8,31-32). Ningum pode renegar o Deus Conosco (Mt 1), que chama a todos os que esto fatigados e sobrecarregados nesta vida para proporcionar-lhes descanso e alvio (Mt 11,28-30). Ningum jamais compreender plenamente o ser humano nem a histria em que este se desenvolve sem referncia a Jesus e, por isso, quem no recolhe com ele finalmente s dispersa (Lc 11,23 e par.). Para aqueles que ouvem o chamado converso, aqui e agora, inicia-se uma vida nova desenvolvida sob o impulso do Esprito Santo, de profunda confiana no Pai (Mt 6,25-32) e num amor que transcende as barreiras humanas (Mt 5,3848). Trata-se de uma vida em busca, primeiramente, do reino de Deus e sua justia (Mt 6,33); de uma vida fundamentada na rocha, que Jesus (Mt 6,24-27); de uma vida que aguarda prazerosamente seu regresso para julgar os vivos e os mortos, mas sobretudo para conduzir seus discpulos at a casa do Pai (Jo 14,1ss.). Em todos esses sentidos e no apenas em alguns o Evangelho tem pretenses de vigncia e permanncia milenares (Mc 13,31 e par.), pretenses abraadas e testemunhadas, no poucas vezes, com sangue, pela vivncia de milhares de pessoas ao largo de praticamente vinte sculos. A Presente Obra A partir desses trs eixos os Evangelhos como obras literrias, como fontes histricas e como Boa Nova deve-se ler o presente livro. Sua finalidade proporcionar um instrumento de

18 / Apresentao

trabalho, de consulta e de estudo a todos crentes e no-crentes que desejam conhecer mais Jesus e os Evangelhos. Da o grande nmero de opinies, de bibliografias que o acompanha; da a lista de ttulos, muitos deles de surgimento bem recente e que se encontram no final da obra. Trata-se, enfim, de um livro que deve ser lido com os Evangelhos mo porque, como um livro de botnica que no deve afastar-nos do aroma da rosa, deve levar-nos a apreci-los ainda mais. Este livro no pretende substituir a obra, mas contribuir, embora modestamente, para apreciar e degustar melhor os ensinamentos e a vida de Jesus. Se o conseguir pelo menos uma s vez ter atingido sua finalidade. Miami - Saragoa - Madri - Saragoa Primavera de 1994

Eis que estou porta e bato. Se algum ouvir minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearemos juntos (Ap 3,20).

Abiatar / 19

AAbbaPalavra aramaica que significa pai, ou melhor dizendo, papaizinho. o termo habitual com que Jesus se dirigia a Deus, o que demonstra sua autoconscincia de filiao divina (Mc 14,36). Atualmente, indiscutvel que nenhum dos judeus contemporneos de Jesus ousara aplicar semelhante tratamento a Deus e que os empregos posteriores da palavra no tinham a profundidade da adotada por Jesus.D. Flusser, Jess, Madri 1975; J. Jeremias, Abba, Salamanca 1983; idem, Teologa del N.T., Salamanca 1980; G. Vermes, Jess el judo, Barcelona 1977; Csar Vidal Manzanares, El Primer Evangelio: el Documento Q, Barcelona 1993; idem, El judeo-cristianismo palestino en el s. I: de Pentecosts a Jamnia, Madri 1995.

AbelEm hebraico Hebel, sopro. Conforme alguns, o nome estaria relacionado efemeridade de sua existncia. Para outros, derivaria do acdio ablu, filho. Era filho de Ado e Eva (Gn 4,2). Pastor e tendo melhor relao com o Criador, sofria a inveja de seu irmo Caim, que era agricultor. A inveja de Caim o levaria, finalmente, a assassinar seu irmo Abel (Gn 4). Para Jesus, um dos modelos do justo assassinado por um mpio e, nesse sentido, sua prpria prefigurao (Mt 23,35).Nahum M. Sarna, Understanding Genesis, Nova York 1970; G. von Rad, El libro del Gnesis, Salamanca 1982; P. Bonnard, o. c.

AbiatarSacerdote partidrio de Davi (1Sm 22,20-23). Jesus menciona-o como fundamento para sub-

20 / Abismo

meter o cumprimento da lei do *sbado a outros fins mais importantes (Mc 2,26). Supostamente, esse personagem ajudou Davi em um dia de sbado.

AbismoDo grego abyssos, profundidade sem fundo nem limites. Na traduo do Antigo Testamento para o grego, conhecida como Septuaginta ou Bblia dos LXX, o termo utilizado com referncia ao caos anterior obra criadora de Deus (Gn 1,2) e tambm em relao ao sheol ou Hades (J 41,24 LXX). No Livro de Henoc, o abismo claramente indicado como o lugar de castigo consciente dos *demnios ou anjos decados. Jesus identificou-o com a morada dos demnios (Lc 8,31) e o Hades com o lugar dos mortos conscientes (Lc 16,26ss.) (comp. Mt 25,41.46).J. Grau, Escatologa, Barcelona 1977; J. Guilln Torralba, Luces y sombras del ms all, Madri 1964; A. Edesrsheim, The Life and Times of Jesus the Messiah, Grand Rapids 1976; Csar Vidal Manzanares, Diccionario de las tres religiones monotestas: judasmo, cristianismo e islam, Madri 1993; idem, El judeo-cristianismo palestino en el s. I: de Pentecosts a Jamnia, Madri 1994; M. Gourgues, El ms all en el Nuevo Testamento, Estella 41993.

AbluoNo Antigo Testamento, as ablues eram limitadas a situaes bem explcitas de contato com a divindade ou classe sacerdotal em relao s suas funes (x 30,17-21). Jesus repudiou claramente as ablues tpicas das escolas farisaicas de sua poca (Mc 7,1ss. e par.).

Abominao da desolaoExpresso utilizada em Dn 11,31 que se refere profanao do Templo de Jerusalm por mos do monarca helenista Antoco Epfanes, no ano 168 a.C. Jesus empregou essa expresso ao profetizar a destruio de *Jerusalm e do *Tem-

Abutre / 21

plo (Mc 13,14 e Mt 24,15), possivelmente por causa do carter tambm pago das tropas romanas.F. F. Bruce, Israel y las naciones, Madri 1979; idem, New Testament History, Nova York 1980; P. D. Hanson, Old Testament Apocalyptic, Nashville 1987; idem, The dawn of Apocalyptic, Filadlfia 1989; F. J. Murphy, The Religious World of Jesus, Nashiville 1991; C. Rowland, The Open Heaven, Londres 1985; Csar Vidal Manzanares, El judeocristianismo...; idem, Diccionario de las tres...; V. Taylor, Evangelio segn san Marcos, Madri 1979; P. Bonnard, Evangelio segn san Mateo, Madri 1978.

Abrao1. Patriarca. Filho de Tar ou Tera, pai dos hebreus, pai dos que crem e amigo de Deus (Gn 15,1-18; 16,1-11; 18,1-19.28; 20,1-17; 22,1-14; 24). Segundo Jesus, no final dos tempos e junto ao patriarca, desfrutaro do banquete do *Reino de Deus no somente os israelitas como tambm os *gentios que creram no Cristo. 2. Seio de. Na literatura judaica, como por exemplo: Discurso a los griegos acerca del Hades, de Flvio Josefo, o lugar do sheol ou *hades, donde os justos esperavam conscientemente a descida do *Messias, que os arrebataria ao *cu. Esse o sentido que os *Evangelhos expressam, como o relato do homem *rico e *Lzaro de Lc 16,19-31.

AbutreGrego: Aetos. No Novo Testamento, difcil saber se o termo refere-se guia ou ao abutre, e, neste segundo caso, a qual espcie se refere (quebra-ossos, cinzento e abanto). A referncia em Mt 24,28 e Lc 17,37 de difcil interpretao. Enquanto para alguns autores se trataria de uma meno s guias das insgnias romanas, para outros seria um provrbio equivalente ao nosso Onde h fumaa, h fogo. Neste ltimo caso, Jesus estaria afirmando que o conjunto de sinais indicados por ele bastaria para saber que falava sobre o cumprimento da profecia.

22 / Acldama

AcldamaVer *Hacldama.

AdoraoDo latim adoratio, palavra derivada de ad oro (oro ou rogo-te). Define o culto reservado nica e exclusivamente a *Deus. No grego utilizavam-se os termos latreia, proskynesis e dula para expressar essa atitude. O judasmo reservava-a, de maneira indiscutivelmente exclusiva, a Deus, sem admitir o culto a nenhum outro ser nem tampouco a nenhuma imagem, mesmo que essa tendesse a representar a divindade (x 20,4ss.; Dt 5,1ss.; Is 44,9-20; Dn 5,23; 2Rs 23,4ss.). Tambm Jesus manteve esse ponto de vista (Mt 4,10; Lc 4,8); os evangelhos indicam que, aps sua *ressurreio, Jesus foi adorado por seus discpulos (Mt 28,17; Lc 24,52) que o proclamaram *Senhor e Deus (Jo 20,28); alguns textos parecem indicar uma conscincia incipiente dessa realidade antes mesmo da morte de Jesus (Mc 4,39-41; Lc 5,8-10).O. Cullmann, Christology of the New Testament, Londres 1975; M. Hengel, El Hijo de Dios, Salamanca 1978; E. Schweizer - A. Dez Macho, La iglesia primitiva: medio ambiente, organizacin y culto, Madri 1974; Csar Vidal Manzanares, El judeo-cristianismo...

AduanaLocal de arrecadao de impostos na entrada ou sada de um pas. *Cafarnaum era lugar de aduana entre a *Galilia e *Tracontide (Mt 9,9; Mc 2,14; Lc 5,27).

AdultrioO Antigo Testamento continha proibies categricas em relao ao adultrio (x 20,14; Lv 18,20; Dt 22,22-29), que era castigado com o *apedrejamento. Embora o judasmo rabnico tenha suprimido progressivamente a pena de morte

gape / 23

como castigo do adultrio, limitando a sano ao repdio esposa, o apedrejamento no era incomum nos tempos de Jesus (Jo 8,1ss.). A viso veterotestamentria do adultrio aprofundada por Jesus que o considerou um grave pecado (Mt 15,19; Mc 7,22) em trs aspectos concretos. Em primeiro lugar, ope-se execuo da adltera (Jo 8,1ss.), no que coincide, pelo menos em parte, com algumas das escolas rabnicas de sua poca. Em segundo lugar, interpreta como adultrio qualquer atividade inclusive mental em que a pessoa vista apenas como objeto de satisfao da lascvia (Mt 5,27ss.), no limitando o termo apenas s mulheres (Mt 5,28), mas incluindo tambm os homens. Finalmente, se Mateus 5,31-32 e 19,9 refere-se ao adultrio, este seria considerado por Jesus como a nica razo permitida para o divrcio, seguindo assim a linha da escola farisaica de Shamai.J. Driver, o. c.; P. Bonnard, o. c.; L. Poittevin - E. Charpentier, El Evangelio segn san Mateo, Estella 121993; J. Delorme, El Evangelio segn san Marcos, Estella 131995; J. Zumstein, Mateo el telogo, Estella 31993.

gapeUm dos quatro termos gregos os outros so phila, eros e storgu que podem ser traduzidos para o portugus como amor. No um termo clssico, embora sua forma verbal aparea ocasionalmente em Plutarco e em Xenofonte. Na Septuaginta, usado catorze vezes em relao ao amor sexual (Jr 2,2 etc.) e duas como contraposio a dio (Ecl 9,1). No Livro da Sabedoria, utilizado para descrever o amor de Deus (3,9) e o amor sabedoria (6,18). A carta de Aristias (229) considera-o alicerce de fora da piedade. Nos evangelhos, o termo mais importante para expressar o amor. Esse amor a base da relao entre o Pai e o Filho dentro da *Trindade (Jo 17,26) e tambm constitui a atitude fundamental de Deus para com os homens, manifestada de maneira primordial no fato de o Filho

24 / grafa

encarnar-se para morrer na cruz e assim expiar os pecados do gnero humano (Jo 3,16). Como sinal de gratido, o dever do ser humano manifestar esse amor-gape a Deus (Mt 22,37) e a seu *prximo, incluindo os *inimigos. Esse amor novo *mandamento deixado por Jesus constitui o maior distintivo da conduta crist (Jo 13,34; 15,12) e deve ser semelhante ao amor de Deus (Mt 5,43-48).W. Barclay, Palabras...; D. Flusser, o. c.; J. Klausner, Jess de Nazareth, Buenos Aires 1971; E. Schweizer - A. Daz Macho, o. c.

grafaFrases de Jesus no reunidas nos quatro evangelhos cannicos (Mateus, Marcos, Lucas e Joo). O Novo Testamento contm uma pelo menos em Atos 20,35ss. (1Ts 4,15ss. mais discutvel). Outras aparecem em textos cristos primitivos e at mesmo no Talmude, embora o carter hertico de algumas obras que as renem torne difcil estabelecer sua autenticidade, como por exemplo o evangelho de So Tom. Em termos gerais, no acrescentam nada de substancial ao nosso conhecimento do Jesus histrico.J. Jeremas, Palabras desconocidas de Jess, Salamanca 1984; Csar Vidal Manzanares, Los Evangelios gnsticos, Barcelona 1991; idem, El Primer Evangelio...; R. Dunkerley, Beyond the Gospels, Londres 1957.

AgripaVer *Herodes Agripa.

guaVer *Abluo, *Batismo, *Novo nascimento.

guiaAve de rapina mencionada em Mt 24,28 e Lc 17,37. Possivelmente identifica-se mais com o

Alimentos / 25

abutre do que com a guia propriamente dita. A sentena junto s referncias de Mateus e Lucas equivale ao provrbio portugus: Onde h fumaa, h fogo.

AisManifestao de dor ante uma desgraa presente (Mt 11,21; 23,13-29; Lc 6,24-26) ou futura (Mt 18,7; 24,19; 26,24). No deve ser confundida com *maldio.

lcoolO Antigo Testamento no probe seu consumo e at mesmo tem palavras de elogios para ele (Salmo 104,15; Pr 31,6). No entanto, muito rigoroso na condenao embriaguez, ainda que involuntria (Pr 20,1; 21,17; 23,30ss. etc.), e ao hbito de beber (Is 5,11ss.; 28,7). O Antigo Testamento probe o vinho aos *sacerdotes enquanto desempenham suas funes (Lv 10,9) e ao *nazireu durante seu voto (Nm 6,3). Jesus transformou a gua em vinho (Jo 2,1ss.), no teve problema em consumi-lo foi inclusive acusado de beberro (Mt 11,19) , conhecia seu uso medicinal (Lc 10,34) e o utilizou na ltima *Ceia (Mt 26,26ss.; Mc 14,23-25; Lc 22,20ss.).

Alfeu1. Pai de *Levi (Mc 2,14). 2. Pai de *Tiago, um dos *apstolos (Mt 10,3; Mc 3,18; Lc 6,15).

Aliana, NovaVer *Pacto, Novo.

AlimentosEm relao aos alimentos, o judasmo aplica as normas denominadas de cashrut, cuja ori-

26 / Alma

gem fundamental veterotestamentria, implicando uma clara separao entre alimentos puros e impuros. Em alguns grupos, como o dos *fariseus, o conjunto de proibies se ampliou e inclusive exigiu a adoo de uma srie de medidas concretas relacionadas ao acrscimo da prpria comida. Jesus se ops claramente a essas normas, principalmente quando eram acentuados apenas os aspectos externamente rituais da *Lei e no o essencial dela (Mt 15,1-20). E acabou por declarar puros todos os alimentos (Mc 7,18-19).H. H. Donin, o. c.; Y. Newman, o. c.; D. Stern, Messianic Jewish manifesto, Jerusalm 1991; Csar Vidal Manzanares, Diccionario de las tres...; Idem, El judeo-cristianismo...

AlmaParte espiritual do homem, distinta de seu corpo. Embora o conceito bblico esteja longe da rgida dicotomia entre corpo e alma que caracteriza, por exemplo, o hindusmo ou o platonismo, o certo que tambm existia a crena de uma categoria distinta do corpo que se identificava com o mais ntimo do ser. Assim aparece no Antigo Testamento como um eu espiritual que sobrevive consciente depois da *morte (Is 14,9ss.; Ez 32,21ss.). Ainda que se insista que o *pecado causa a morte da alma (Ez 18,4), isso no implica, em caso algum, a inconscincia ou aniquilao do sujeito. A morte fsica elimina seu corpo e destri os planos que fizera (Sl 146,4), porm seu *esprito volta-se para Deus (Ecl 12,7), persistindo. A idia da imortalidade da alma ainda era evidente durante o perodo intertestamentrio e refletida, entre outros, pelo historiador judeu Flvio Josefo em seu Discurso aos gregos acerca do Hades. Os rabinos contemporneos de Jesus assim como o Talmude judeu posterior insistiram tambm no conceito da imortalidade da alma e da sua sobrevivncia consciente (para ser atormentada conscientemente na *geena ou feliz no seio de *Abrao) aps a morte fsica. Em nossos

Altar / 27

dias, considera-se que a crena na imortalidade da alma uma das doutrinas bsicas do judasmo, especialmente no seu setor reformado. Em um de seus ensinamentos mais conhecidos (Lc 16,19ss.), Jesus ressaltou que, no momento da morte, a alma da pessoa recebe um castigo ou uma recompensa consciente, e descreveu o primeiro em termos sensveis como o fogo (Mc 9,47-48; Lc 16,21b-24), choro e ranger de dentes (Mt 8,12; 13,42; 24,51 etc.) etc. Apesar de tudo, no ensinamento de Jesus no se considera a consumao escatolgica concluda na *resssurreio (Jo 5,28-29; Mt 25,46). Ao recusar a idia do sono inconsciente das almas, da mortalidade da alma e da aniquilao, ao mesmo tempo que ressaltava a esperana da ressurreio, Jesus conservava a viso j manifestada no Antigo Testamento e, muito especialmente, no judasmo do Segundo Templo, com excees como a dos *saduceus.A. Cohen, o. c.; J. Grau, Escatologa...; J. L. Ruiz de la Pea, La otra dimensin, Santander 1986; C. Vidal Manzanares, El judeo-cristianismo...; Idem, Diccionario de las tres..; M. Gourges, El ms all en el Nuevo Testamento, Estella 41993.

AlosPerfume extrado de uma madeira preciosa do Oriente. Costumava-se mistur-lo a outros, como a *mirra (Jo 19,39).

AlqueireTambm: modius. Medida romana de capacidade de uns 8,75 litros. Em determinadas ocasies, era utilizada por gente humilde como prato ou tigela para comer (Mt 5,15; Mc 4,21; Lc 11,33).

AltarO lugar diante do qual se apresentavam as *oferendas a Deus. Jesus considerava-o digno de respeito (Mt 5,23ss.; 23,18-20) e exigia, por isso,

28 / Am Ha-Arets

a prvia reconciliao daqueles que se acercavam dele.

Altar de pontas de antigos santurios israelitas (Am 3,14; Sl 118,27)

Am Ha-AretsLiteralmente, a gente da terra. Grupo que inclua, conforme o critrio dos *fariseus, a maioria do povo de *Israel, pouco inclinado a guardar as normas da *Tor, de acordo com a sua interpretao. Sob esse ponto de vista, considerava-se ritualmente bastante contaminada para poder comparecer limpa diante de Deus. O fato de Jesus considerar questes como as relacionadas ao *sbado ou aos *alimentos com maior flexibilidade, sua fama de fazedor de *milagres e o fato de ver os homens como pecadores necessitados da ajuda divina (Mc 2,16-17) de quem teria de sair procura (Lc 15,1ss.) so algumas das causas que explicam a atrao que exerceu sobre muitos dos am ha-arets. Sem dvida, essas realidades no deveriam fazer-nos esquecer, em uma romntica idealizao, que tambm boa parte das pessoas pertencentes a essa classe social sentiu-se desiludida com as aes de Jesus. A radicalidade de seu ensinamento e especialmente seu conceito no-poltico do *messias provocaram a desiluso em muitos que acabaram por abandon-lo (Jo 6,15-60ss.).

Ancios / 29 E. Schrer, o. c.; Encyclopaedia of Religion and Ethics, 13 vols., 1908-1926 (doravante ERE), I, pp. 385ss.; E. P. Sanders, Judaism...; C. Vidal Manzanares, El Primer Evangelio...; C. Saulnier e B. Rolland, Palestina en tiempos de Jess, Estella 101994.

AmmPalavra hebraica que significa em verdade e que tambm pode ser traduzida por assim seja ou assim . No caso de Jesus, ocasionalmente, pode anteceder declaraes que realcem seu carter de *profeta.

AmorVer *gape, *Sexo.

AnaNome de uma viva profetisa, que reconheceu em Jesus menino o *messias (Lc 2,36).

AnsSumo *sacerdote a partir de 6 d.C. (Lc 3,2), sogro de *Caifs e, muito possivelmente, chefe do grupo dos *saduceus. Embora deposto por Valrio Grato em 15 d.C., continuou mantendo um poder sombra, como demonstra o fato de Jesus ter sido conduzido diante dele no transcurso de seu processo (Jo 18,13-24).

AnciosNo Antigo Testamento, recebia esse nome aquele que sucedia ao pai geralmente em virtude do direito de primogenitura no governo da casa, cl ou tribo (1Rs 8,1-3; Jz 8,14-16). Desfrutavam de autoridade sobre o povo (Dt 27,1; Esd 10,8) e eram tambm representantes da nao em atos polticos (Jz 11,5-11; 1Sm 8,4; 2Sm 5,3) e religiosos (Lv 4,13-15; Js 7,6). Numa pr-

30 / Andr

tica generalizada, os povoados contavam com uma administrao civil e religiosa desempenhada por ancios (Dt 19,12; 21,2; Rt 4,2-11; 1Sm 11,3; Esd 10,14). Essa instituio vigorou at o tempo de *Jesus (Mt 15,2; 21,23; 26,3-47).R. de Vaus, Instituciones del Antiguo Testamento, Barcelona, 1985; C. Vidal Manzanares, Diccionario de las tres...; Idem, El judeo-cristianismo...

AndrUm dos *doze *apstolos de *Jesus (Jo 1,3542; Mt 4,18-20; Mc 13,3ss.). Seguramente, nada sabemos a respeito dele alm do que o Novo Testamento apresenta. Segundo uma tradio tardia, foi martirizado em Patras na Acaia, por volta do ano 60. A tradio de ter morrido em uma *cruz em forma de aspa com certeza carece de base histrica e no surgiu antes do sc. XIV.

AnjoPalavra derivada do grego ggelos (mensageiro), que na Septuaginta traduz o hebreu malaj. Com essa misso de mensageiros divinos que aparecem principalmente nos evangelhos (Mt 11,10; Mc 1,2; Lc 7,24-27; 9,52). Somente em situaes excepcionais so mencionados por um nome (Lc 1,19.26). Esto relacionados misso de Jesus (Mt 4,11; Mc 1,13; Lc 22,43; Jo 1,51) e sua *parusia (Mt 13,39.41.49; 16,27; 24,31; 25,31). Presentes na corte celestial (Lc 12,8ss.; 16,22), alegram-se com a *converso dos *pecadores (Lc 15,10) e cuidam das crianas (Mt 18,10). Seu estado de vida permite compreender qual ser a condio futura dos que se salvam (Mt 22,30; Mc 12,25; Lc 20,36). Os evangelhos indicam tambm a existncia do Diabo, um anjo decado ao qual seguiram outros anjos, como um ser pessoal e real que governa os reinos deste mundo (Lc 4,5-7) e o mundo em geral. Jesus deu a seus *discpulos a autoridade para derrot-lo (Lc 10,19-20) e, no fim dos tempos,

Anti-semitismo / 31

tanto ele como seus sequazes sero vencidos (Mt 25,41) e confinados no fogo eterno.A. Cohen, o. c.; F. J. Murphy, The Religious...; ERE IV, pp. 578, 584, 594-601; C. Vidal Manzanares, Diccionario de las tres...; Idem, El judeo-cristianismo...

AnoSua durao dependia de seu carter solar ou lunar. Dividia-se em *inverno (de 15 de outubro a 15 de maio) e *vero (de 15 de maio a 15 de outubro). Nos clculos de durao, uma frao de ano equivalia a um ano inteiro. Contavam-se os anos de um imperador a partir de sua ascenso ao trono. Assim, o ano quinze de *Tibrio (Lc 3,1) iria de 19 de agosto de 28 a 19 de agosto de 29, mas *Lucas utilizou o cmputo srio que iniciava o ano em 1o de outubro e, nesse caso, o ano quinze teria iniciado em 1o de outubro de 27.

Anti-semitismoAtitude de hostilidade, que pode concretizarse em agresses especficas aos judeus. Nem todo ataque ou crtica a eles deve ser visto como demonstrao de anti-semitismo. De fato, o Antigo Testamento contm fortes ataques contra o povo de Israel (x 32,9; 33,3; Dt 31,27; Jr 2,27 etc.) que no podem ser entendidos em termos raciais, mas espirituais: acusa-se o povo como o grupo que desobedece voz de Deus e dos profetas. Nesse mesmo sentido devem ser interpretadas as referncias negativas dos evangelhos relacionadas a Israel. Jesus lamentou a incredulidade de alguns judeus (Mc 6,1-5), assim como a dureza da conduta de alguns dos dirigentes religiosos (Mt 23). Sem dvida, salientou taxativamente que a salvao vinha dos judeus (Jo 4,22), manifestou sua compaixo pelo povo necessitado (Mt 10,6; 15,24; Mc 6,34) e expressou seu desejo de restaur-lo (Lc 13,34). Longe de se evidenciar no ensinamento de Jesus o menor vislumbre de anti-

32 / Antigo Testamento

semitismo, percebe-se nele um profundo amor a Israel, de cujo povo fazia parte espiritual e racialmente.L. Poliakov, Historia del antisemitismo, v. I, Buenos Aires 1968; H. Ben-Sasson, A History of the Jewish People, Harvard 1976 (H uma edio espanhola da Aliana Editorial, com o ttulo de Historia del pueblo judo, 3 tomos, Madri 1988); C. Vidal Manzanares, El primer Evangelio...; Idem, El judeo-cristianismo...; E. Mary, La aportacin de un judo a la Iglesia, Barcelona 1986.

Antigo Testamento1. Primeira parte da Bblia crist, que contm os livros revelados ao povo de Israel no passado. Existem dois *cnones mais extensos, aos quais se devem acrescentar outros especficos de algumas Igrejas orientais. O primeiro, estabelecido pelos judeus no Conclio de Jmnia (90-100 d.C.), contm as seguintes divises e livros: a Tor ou Lei (Gnesis, xodo, Levtico, Nmeros e Deuteronmio), os Neviim ou Profetas (Josu, Juzes, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis, Isaas, Jeremias, Ezequiel e os Doze profetas menores (Osias, Joel, Ams, Abdias, Jonas, Miquias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias) e os Ketubim ou Escritos (Salmos, Provrbios, J, Cntico dos Cnticos, Rute, Lamentaes, Eclesiastes, Ester, Daniel, Esdras, Neemias, 1 e 2 Crnicas). Esse cnon o adotado atualmente pelos judeus e tambm pelas Igrejas protestantes, embora para estes a ordem dos livros seja outra. A Igreja Catlica incluiu no cnon judaico do Antigo Testamento os seguintes livros que, por essa razo, so chamados deuterocannicos (pertencentes a um segundo grau de canonicidade) e aos quais os adeptos do primeiro cnon denominaram apcrifos (excludos do cnon): Judite, Tobit ou Tobias, 1 e 2 Macabeus, Eclesistico, Sabedoria, Baruc, trechos adicionais a Ester e Daniel. Esse cnon mais amplo mais tardio.F. F. Bruce, The Canon of Scripture, Downers Grove 1988; R. K. Harrison, o. c.; C. Vidal Manzanares, Diccionario de las tres...; A. Paul, La inspiracin y el canon de las Es-

Apocalptico / 33 crituras, Estella 41993; R. Beckwith, The Old Testament Canon of the New Testament Church, Grand Rapids 1986.

AntipasVer *Herodes Antipas.

AnunciaoVisita do anjo a Maria para anunciar-lhe que dela nascer virginalmente o Messias (Lc 1,2638), o qual descrito com caractersticas humanas (Lc 1,32) e divinas (Lc 1,34ss.).R. E. Brown, El nacimiento del Mesas, Madri 1982; J. Zumstein, Mateo, el telogo, Estella 31993. J. P. Michaud, Mara de los Evangelios, Estella 21993; L. Poittevin e E. Charpentier, El Evangelio...; A. George, El Evangelio segn san Lucas, Estella 131994; C. Perrot, Los relatos de la infancia de Jess, Estella 71993.

ApedrejamentoConforme a *Lei de Moiss, morte prescrita para alguns delitos mais graves como o *adultrio ou a *blasfmia (Lv 24,14). Essa pena ainda era vigente na poca de Jesus e era costume que as testemunhas do delito lanassem a primeira pedra (Jo 8,7). evidente que Jesus ops-se ao cumprimento literal desse preceito mosaico (Jo 8,1ss.), assim como aplicao da lei de *talio em qualquer de suas formas. Em muitos casos, a execuo por esse meio convertia-se quase num linchamento legalizado, procedente da clera popular (Lc 20,6; Jo 8,5859; 10,31-33; 11,8). Essa foi a experincia de Jesus, que acusou *Jerusalm de apedrejar os profetas a ela enviados (Mt 23,37; Lc 13,34).

ApocalpticoDenominao aplicada a um gnero literrio que descreve acontecimentos relativos ao final dos tempos e, mais concretamente, crise final anterior chegada do *Reino messinico. Embora se

34 / Apstolos

costume comparar o apocaliticismo a atitudes escapistas, essa interpretao geralmente no corresponde s fontes escritas de que dispomos. O gnero apocalptico manifesta uma perspectiva evidentemente espiritual, mas no especulativa e, habitualmente, dotada de uma viso prtica da existncia. Temos exemplos desse gnero na segunda parte do Livro de *Daniel ( discutvel que a totalidade do livro possa ser qualificada como apocalptica), numa segunda parte de *Zacarias e no denominado Apocalipse de *Isaas (Is 2427). No perodo intertestamentrio, o *judasmo produziu obras apocalpticas em alguns casos, posteriormente interpoladas por autores cristos como o Livro de Henoc, o quarto livro de Esdras, a Assuno de Moiss, o Livro dos Jubileus e o Testamento dos Doze Patriarcas. No Novo Testamento, somente o ltimo livro Apocalipse pertence a esse gnero. Sem dvida, existem caractersticas apocalpticas no discurso de Jesus no *Monte das Oliveiras (Mt 24 e 25; Mc 13; Lc 21), no qual se mesclam as predies sobre a futura destruio de *Jerusalm com referncia *parusia.P. D. Hanson, The Dawn...; Idem, Old Testament apocalyptic...; F. J. Murphy, o. c.; C. Rowland, The Open Heaven, Londres 1985; D. S. Russell, The Method and Message of Jewish Apocalyptic, Filadlfia 1964; C. Vidal Manzanares, El judeo-cristianismo...; Idem, Diccionario de las tres...; Equipo Cahiers Evangile, El Apocalipsis, Estella 10 1994; M. Delcor, Mito y tradicin en la literatura apocalptica, Madri 1977.

ApstolosSo os discpulos mais prximos de Jesus, escolhidos para expulsar *demnios, curar enfermidades, anunciar o evangelho (Mt 10,2-4; Mc 3,16-9; Lc 6,14-16; At 1,13) e julgar as doze tribos de *Israel (Mt 19,28). Conhecemos seus nomes atravs das listas que aparecem nos Sinticos e nos Atos (Mt 10,2-4; Mc 3,16-19; Lc 6,14-16; At 1,13), omitindo-se, nesse ltimo caso, o nome de *Judas Iscariotes. Joo no apresenta nenhu-

Apstolos / 35

Os apstolos Pedro e Paulo (Epitfio de Ansellus)(DACL) ma lista, porm menciona os Doze como grupo (Jo 6,67; 20,24) e no mesmo sentido escreve *Paulo (1Cor 15,5). A lista costuma ser dividida, de maneira convencional, em trs grupos de quatro. No primeiro, o apstolo mencionado em primeiro lugar sempre Simo, cujo nome foi substitudo pelo cognome *Pedro (Petrs [pedra], seguramente uma traduo do aramaico Kefas). Sempre associado a Pedro, vem seu irmo *Andr (Jo 1,40-41; Mc 1,16) e, logo em seguida, so mencionados Tiago e Joo, que eram, como os dois irmos citados anteriormente, pescadores na Galilia (Mc 1,19). Se sua me (Mt 27,56) era *Salom, irm de *Maria, a Me de Jesus (Mc 15,40; Jo 19,25), seriam ento primos deste. Entretanto, a hiptese no de todo segura. No segundo grupo de quatro, encontram-se *Filipe de *Betsaida (Jo 1,44; 6,5-8; 12,22), *Bartolomeu, geralmente identificado com *Natanael (Jo 1,4546; 21,2), *Tom, chamado Ddimo (o gmeo) (Jo 11,16; 20.24), e *Mateus, que deve ser identificado com o Levi de outras listas. Finalmente, no terceiro grupo de quatro esto Judas Iscariotes (supostamente morto logo aps a execuo de Jesus), *Simo, o Zelote, *Tiago, filho de *Alfeu e situado em dcimo lugar em Mateus e Marcos e em dcimo primeiro em Lucas e Atos *Lebeu, *Tadeu e *Judas. Essa ltima discrepncia tem sido explicada por diversas maneiras. Alguns apontam a falta de escritos sobre esse per-

36 / Apstolos

sonagem (R. E. Brown, The Twelve and the Apostolate em NJBC, Englewood Cliffs 1990, p. 1.379); outros identificam Tadeu com *Judas, o irmo de *Tiago, considerando Lebeu apenas uma variante textual (A.T. Robertson, Una armona de los cuatro Evangelios, El Paso 1975, pp. 224-226. No mesmo sentido, M. J. Wilkins, Disciples em DJG, p. 181, alegando, principalmente, a existncia de uma coincidncia total no restante dos nomes), uma tese conciliadora que, possivelmente, corresponda realidade histrica.

F. Schleiermacher e F. C. Baur negaram que o grupo dos Doze foi estabelecido por Jesus. De incio, impossvel negar que ele era bem primitivo, j que Paulo o menciona em 1Cor 15,5. Alm disso, em vista da anlise das fontes, o mais adequado fixar seu estabelecimento durante a vida de Jesus (E. P. Sanders, M. Hengel, F. F. Bruce, C. Vidal Manzanares etc.). Isso explicaria tambm circunstncias como a premncia em completar seu nmero aps a morte de Judas (At 1, 15-26). Tem-se discutido bastante desde os finais do sculo passado o significado exato do apostolado. O ponto inicial dessa anlise foi, sem dvida, a obra de Lightfoot sobre a Epstola aos Glatas (J. B. Lightfoot, Saint Pauls Epistle to the Galatians, Londres 1865). evidente que o termo deriva do infinitivo grego apostellein (enviar), cujo uso

Apstolos / 37

no era muito comum nessa lngua. Na Septuaginta, s aparece uma vez (1Rs 14,6) como traduo do particpio passado shaluaj de shlj (enviar). Tomando como ponto de partida essa circunstncia, H. Vogelstein e K. Rengstorf relacionaram a instituio dos apstolos aos sheluhim ou comisses rabnicas enviadas pelas autoridades palestinas para represent-las com plenos poderes. Os sheluhim recebiam um mandato simbolizado pela imposio das mos, e seus deveres que, muitas vezes, eram simplesmente civis incluam ocasionalmente a autoridade religiosa e a proclamao de verdades religiosas. Por no possuirmos referncias aos sheluhim cronologicamente paralelas aos primeiros tempos do cristianismo, a interpretao citada j recebeu fortes ataques a partir da metade deste sculo. Atualmente, existe uma tendncia de relacionar novamente a figura do apstolo com a raiz verbal shlj, que foi traduzida na Septuaginta umas setecentas vezes por apostollein ou exapostollein. O termo era bastante amplo como j destacou Lightfoot indo, posteriormente, alm do grupo dos Doze. So consideradas importantes as contribuies de H. Riesenfeld (The Gospel Traditions and Its Beginnings, Londres 1957) e de B. Gerhardsson (Memory and Manuscript: Oral Tradition and Written Transmission in the Rabbinic Judaism and Early Christianity, Uppsala 1961), que estudavam a possibilidade de os Doze serem o receptculo de um ensinamento de Jesus, conforme uma metodologia de ensinamento semelhante ao rabnico e que, a partir deles, foi-se formando um depsito de tradies relacionadas com a pregao de Jesus. Essa tese, embora no seja indiscutvel, possui certo grau de probabilidade.C. K. Barrett, The Signs of an Apostle, Filadlfia 1972; F. Hahn, Der Apostolat in Urchristentum em KD, 20, 1974, pp. 56-77; R. D. Culver, Apostles and Apostolate in the New Testament em BSac, 134, 1977, pp. 131-143; R. W. Herron, The Origin of the New Testament Apostolate em WJT, 45, 1983, pp. 101-131; K. Giles, Apostles before and after Paul em Churchman, 99, 1985, pp. 241-256; F. H. Agnew, On the origin of the term Apostolos em CBQ, 38,

38 / Aramaico 1976, pp. 49-53; Idem, The origin of the NT ApostleConcept em JBL, 105, 1986, pp. 75-96; B. Villegas, Peter Philip and James of Alphaeus em NTS, 33, 1987, pp. 294; Csar Vidal Manzanares, Diccionario de las Tres Religiones, Madri 1993; Idem, El judeo-cristianismo...

AramaicoIdioma semtico que j nos finais do perodo veterotestamentrio sobrepusera-se populao judia, de tal maneira que necessitava de interpretao aramaica para entender as Escrituras em hebraico (Ne 8,1ss.). Jesus se expressou em aramaico, ainda que certamente conhecesse o hebraico (Lc 4,16ss.) e tambm o grego, j que era galileu.M. Black, An Aramaic Approach to the Gospels and Acts, Oxford 1967; G. Lamsa, Holy Bible from the Ancient Eastern Text (Peshitta), Nova York 1989.

ArimatiaCidade a noroeste de Jerusalm, possivelmente a Ramataim do Antigo Testamento (1Sm 1,1). Dela procedia o *Jos que sepultou Jesus (Mt 27,57; Mc 15,43; Lc 23,51; Jo 19,38).

AromaSubstncia aromtica de origem vegetal utilizada para a fabricao de *perfumes (Mc 16,1; Lc 23,56; 24,1; Jo 10,40).

ArquelauFilho de *Herodes, o Grande, e de Maltace (23 a.C. 15 d.C.), irmo de *Herodes Antipas, *etnarca da *Judia, *Samaria e Idumia em 4 a.C. Acusado de tirania, viu-se obrigado a exilarse em Viena, na Glia, em 6 d.C., transformandose seu territrio em provncia romana. O medo de suas aes levou *Jos, o pai legal de Jesus, a fixar sua residncia na *Galilia (Mt 2,22).

rvore / 39

ArqueologiaVer *Cafarnaum, *Jerusalm, *Nazar, *Qumrn.

ArrependimentoEm hebraico, o termo utilizado teshuvh, que procede de uma raiz verbal que significa voltar ou retornar. No Antigo Testamento, um chamado constante dos profetas para afastar-se do mau caminho e viver de acordo com a Aliana. Em nenhum caso, indica a obteno do perdo mediante o esforo humano, mas receber o perdo misericordioso de Deus para seguir uma vida nova de obedincia a seus mandamentos. Nos evangelhos, o conceito de arrependimento (metanoia ou mudana de mentalidade) um conceito essencial, equivalente *converso, que se liga ao profetismo do Antigo Testamento, mostrando-se distanciado do desenvolvimento do judasmo posterior. Jesus insiste na necessidade de arrepender-se porque chegou o *Reino de Deus (Mc 1,14-15) e afirma que se perecer se no houver arrependimento (Lc 13,1-5). O arrependimento jamais uma obra meritria, mas uma resposta ao chamado amoroso e imerecido de Deus (Lc 15,1-32). O arrependimento , portanto, voltarse graa de Deus, receb-la humilde e agradecidamente e, ento, levar uma vida conforme os princpios do Reino. E at mesmo quele que se arrepende e j no tem possibilidade de mudar de vida, porque est prestes a morrer, Deus mostra seu amor, acolhendo-o no *paraso (Lc 23,39-43).

rvoreSmbolo do ser humano, que deve dar bons frutos a *converso para no ser lanado ao fogo (Mt 3,10; 7,17ss.; 12,33; Lc 3,9; 6,43ss.).

40 / Ascenso

AscensoEpisdio relatado por Lucas (Lc 24,51) e possivelmente por Mc 16,19. Tambm est implcito no final de Mateus (28,16ss.) e numa passagem de Joo (7,39). Nessas passagens se expressa a separao visvel de Jesus e seus discpulos (Lc 24,51; At 1,9) como deve acontecer na *parusia ou segunda vinda de Cristo (At 1,1011) e a ascenso daquele direita do Pai, segundo os textos messinicos do Salmo 2 e 110. Alm disso, esse fato constitui o passo prvio para o envio do *Esprito Santo (Jo 7,39; At 1,6-8). Por no estar ligada descrio conscienciosa sobre a vida eterna ou sobre o final dos tempos, torna os relatos sobre ela substancialmente distintos dos do apocalipse judaico j mencionado.

AssassinatoNo Antigo Testamento o ato intencional de matar algum (x 20,13). Nesse caso, a pena imposta pela *Tor era a morte (x 21,12ss.). Se o homicdio fosse acidental, existiam medidas de proteo em favor do causador (Nm 35,14-34). Para Jesus, a ira ou o insulto so equivalentes ao assassinato (Mt 5,21ss.) e no lcita nenhuma forma de violncia (Mt 5,38ss.) nem mesmo para castigar o causador do mal. A nova tica do *Reino implica uma atitude da parte de seus seguidores rigorosamente distinta da dos *gentios (Mt 5,46-47) e at mesmo a apresentada pela *Tor (Mt 5,21ss.; 5,27ss.; 5,38ss.).J. Driver, Militantes para un mundo nuevo, Barcelona 1977; J. J. Petuchowski, La voz del Sina, Bilbao 1989; C. Vidal Manzanares, El Primer Evangelio...; Idem, El judeocristianismo...

AsseMoeda romana de bronze. Dezesseis asses era o salrio habitual por um dia de trabalho (Mt 10,29; Lc 12,6).

Autoridade / 41

Atar e desatarNo contexto da *sinagoga, decises relacionadas com a sua disciplina interna e com aspectos jurdicos. Em passagens onde aparecem expresses desse tipo, os evangelhos parecem referir-se a questes disciplinares (Mt 18,18) e, principalmente (Mt 16,9; Jo 20,23), capacidade de decidir o destino final dos homens como conseqncia da mensagem anunciada pelos *apstolos. Aceit-lo ou rejeit-lo implicar, finalmente, a *salvao ou condenao da pessoa (Mc 16,1416). Nesse sentido, a autoridade dos discpulos difere da autoridade rabnica, j que inseparvel da mensagem anunciada. Em harmonia com isso, mais tarde na Igreja a autoridade apostlica aparece relacionada especificamente com o ensinamento (At 2,42; 2Tm 2,24-26).

AugustoTtulo imperial conferido, em 16 de janeiro de 27 a.C., a Caio Jlio Csar Otaviano (63 a.C. 14 d.C.), sobrinho-neto de Jlio Csar (Lc 2,1).

O imperador Augusto

AutoridadePoder assentado sobre a legitimidade (Mt 12,2.10; 22,17). A que Jesus possui permite-lhe

42 / Azeite

fazer *milagres de cura, expulsar *demnios e reinterpretar a *Lei de Deus (Mt 7,29; 9,6; 9,8; Mc 1,27); purificar o *Templo (Mt 21,23-27 e par.); julgar os seres humanos (Jo 5,27); entregar sua vida e ressuscitar (Jo 10,18. Comp. Jo 2,1922) e dar a vida eterna (Jo 17,2). Jesus possua essa autoridade onipotente (Mt 28,19-20) antes mesmo de nascer (Jo 17,1ss.) e a delega agora a seus *discpulos (Mt 10,1ss.), que devem exercla da mesma forma que ele o fez como *Servo de Jav (Mt 20,25-28; Mc 10,42-45; Lc 22,24-27). Ao lado dessa autoridade nica, legtima, encontram-se outras constitudas, cuja origem no humana, mesmo que tenha essa aparncia (Jo 19,10-11). Assim a possui o *Diabo sobre os reinos deste mundo (Lc 4,6).

AzeiteAlimento obtido da azeitona prensada. Alm de alimento, na poca de Jesus era utilizado para a iluminao (Mt 25,3ss.), como remdio (Lc 10,34; Mc 6,13) e como cosmtico (Mt 6,17; Lc 7,46). O azeite da *parbola das virgens (Mt 25,3ss.) simboliza a fidelidade espiritual dos *discpulos que devem, nessa atitude, esperar a *parusia.

zimoPo sem levedura que se consumia durante a *festa da *Pscoa.

Barrabs / 43

BBanqueteVer *Mesa.

Relevo romano do sculo I, representando um banquete de doze comensais em torno de uma mesa redonda de trs ps (Pizzoli)

BaraquiasO pai de Zacarias (Mt 23,35).

BarjonasLiteralmente, filho de Jonas ou de Joo. Cognome de *Pedro (Jo 21,17).

BarrabsLiteralmente, filho de Abbas ou filho do pai. Delinqente judeu cuja liberdade alguns do seu povo preferiram de Jesus (Mt 26,16; Mc 15,6ss; Lc 23,18ss.; Jo 18,40; At 3,14). A circunstncia

44 / Bartimeu

da libertao de um preso pela *Pscoa tem base histrica e aparece comentada no *Talmude. Bem difcil de sustentar a interpretao moderna que v em Barrabs um revolucionrio nacionalista em vez de um delinqente comum. Tampouco existe a possibilidade de ter sido um *zelote, porque esse grupo no existia na poca de Jesus.H. Guevara, Ambiente poltico del pueblo judo en tiempos de Jess, Madri 1985: E. Schrer, o. c.; J. Blinzler, o. c.; D. R. Catchpole, The Trial of Jesus, Leiden 1971; C. Vidal Manzanares, El Primer Evangelio...

BartimeuLiteralmente, filho de Timeu. Nome pelo qual ficou conhecido um mendigo cego curado por Jesus nas proximidades de Jeric e durante sua viagem at *Jerusalm (Mc 10,46-52; Mt 20,2934).

BartolomeuLiteralmente, filho de Tolmay. Patronmico de um dos *Doze (Mt 10,3). Geralmente identificado como Natanael, procedente de Can da Galilia, como se encontra em Jo 1,45ss.; 21,2.C. Vidal Manzanares, El judeo-cristianismo...

BatMedida judia de capacidade similar metreta grega e equivalente a 36,44 litros (Lc 16,6).

BatismoRito de imerso em gua, que simbolizava a consagrao espiritual. Essa prtica, igual da abluo que s vezes definida com esse mesmo termo, era comum entre os judeus (x 29,4; 30,20; 40,12; Lv 16,26.28; 17,15; 22,4.6). No tempo de Jesus, batizava-se em gua corrente o proslito procedente do paganismo, significando sua puri-

Batismo / 45

ficao da impureza idoltrica. Da mesma forma, os sectrios do *Mar Morto praticavam ritos relacionados com a imerso, ligados tambm a um simbolismo de purificao. Como no caso dos proslitos, os *essnios de Qumrn consideravam que a pessoa abandonava uma situao de perdio para entrar numa de salvao, embora a pertena a uma ou outra no estivesse definida em termos raciais ou nacionais, mas exclusivamente espirituais. Algo semelhante encontramos em *Joo Batista. Este pregou um batismo como sinal de arrependimento para perdo dos pecados (Mc 1,4), isto , o batismo no perdoava os pecados, todavia era sinal de que se realizara a *converso que precedia o perdo. Nesse sentido, Joo ops-se aos que, sem a converso anterior necessria, pretendiam receber o batismo (Mt 3,7ss.). Uma vez mais, a condio para a salvao no era pertencer a um grupo os filhos de Abrao mas a mudana no relacionamento com Deus. Jesus recebeu o batismo de Joo, passando no curso do mesmo por uma experincia do Esprito Santo, que reafirmou sua autoconscincia de filiao divina e de sua messianidade (Mc 1,10 e par.). Conforme o quarto evangelho, esse episdio foi compartilhado com o prprio Batista (Jo 1,29-34). Quanto a Jesus assumir o batismo de Joo, parece haver uma identificao simblica do *messias sofredor com os pecadores chamados converso. Parece que os discpulos de Joo que comearam a seguir Jesus tambm batizaram (Jo 4,1-2), embora Jesus no o tivesse praticado. Os relatos sobre a ressurreio de Jesus mostram-no ordenando a seus discpulos a pregao do evangelho, cuja aceitao deve simbolizar-se mediante o batismo administrado com uma frmula trinitria, que atribui um s nome comum ao *Pai, ao *Filho e ao *Esprito Santo (Mt 28,19), posterior pregao do evangelho de salvao (Mc 16,1516). , portanto, indiscutvel que as primeiras *Igrejas crists recorreram ao batismo como rito de entrada nelas, que simbolizava a converso e a

46 / Beijo

adeso a Jesus como messias e *Senhor (At 2,38; 8,12.38; 9,18; 10,48; 10,48; 1Cor 1,14.16 etc.).G. Barth, El bautismo en el tiempo del cristianismo primitivo, Salamanca 1986; L. F. Badia, The Qumran Baptism and John the Baptists Baptism, Lanham 1980; G. R. BeasleyMurray, Baptism in the New Testament, Grand Rapids 1962; J. W. Dale, Baptizo, Bauconda 1991; J. Jeremias, Infant Baptism in the First Four Centuries, Filadlfia 1962; C. Vidal Manzanares, El judeo-cristianismo...; Diccionario de las tres religiones monotestas...

BeijoSinal de afeio (Lc 15,20; Mc 9,36; 10,16) e de respeito (Mt 26,48ss.; Lc 7,38.45).

BelmLiteralmente, casa do po. Segundo alguns autores, significaria casa da deusa Lahama. A Bblia refere-se a duas cidades com esse nome: uma, situada a uns 15 km a oeste de Nazar, a que se costuma denominar Belm de Zabulon (Js 19,15); a outra, a mais conhecida, situada em Jud. Esta se encontra a uns 7 km ao sul de Jerusalm e recebe tambm o nome de frata. Era o povoado onde nasceu o rei Davi (1Sm 16-17,12) e se esperava que dela nasceria o *messias (Mq 5,11ss.). Os evangelhos situam o nascimento de *Jesus nessa cidade, relacionando tal circunstncia com sua messianidade (Mt 2,1; Lc 2,4). Desde o sculo XIX, tem-se questionado a veracidade dessa notcia histrica; o certo que no existem motivos de peso para neg-la e tampouco existem dados nas fontes de que dispomos que defendam, de maneira segura, um outro local para o nascimento de Jesus.F. Dez, Gua de Tierra Santa, Estella 21993; E. Hoade, Guide to the Holy Land, Jerusalm 1984.

BelzebuTermo que deriva de Baal-Zebub, o deus filisteu de Acaron (2Rs 1,2ss.). Os judeus deformaramlhe o nome, convertendo-o em Belzebu (lit. senhor

Benedictus / 47

das moscas, embora os textos rabnicos o interpretassem como senhor do esterco). No perodo do segundo *Templo, j era identificado com o prncipe dos *demnios e assim aparece no Novo Testamento (Mt 10,25; 12,24; Mc 3,22; Lc 11,15ss.).ERE II; C. Vidal Manzanares, El judeo-cristianismo...

Bem-aventuranasPalavras de Jesus com as quais inicia o sermo da montanha (Mt 5,3-12) e o sermo da plancie (Lc 6,20-23). Mateus rene 7 (ou 8, conforme a maneira de cont-las), enquanto Lucas somente indica 4, unidas a quatro maldies.J. Driver, o. c.; P. Bonnard, o. c.; C. Vidal Manzanares, El Primer Evangelio...; Idem, Diccionario de las tres religiones...; L. Poittevin e E. Charpentier, o. c.; A. George, o. c.; J. Dupont, El mensaje de las Bienaventuranzas, Estella, 1992; P. Beauchamp e D. Vasse, La violencia en la Biblia, Estella 81993.

BnoNa Bblia, so os favores desejados pelo homem e concedidos por Deus, tanto espirituais como materiais, como sade, riqueza etc. (Gn 39,5; Dt 28,8; Pr 10,22 etc.). O termo tambm empregado para referir-se s frmulas com que se suplicam essas benevolncias e, posteriormente, s splicas que se recitam em determinadas ocasies. O ideal rabnico chegou a ser o de pronunciar centenas de vezes diariamente (Men 43b). A *Eucaristia crist deriva tanto etimolgica como ideologicamente do conceito judaico de bno.Y. Newman, o. c.; W. O. E. Oesterley, o. c.; L. Deiss, La Cena del Seor, Bilbao 1989; C. Vidal Manzanares, El judeocristianismo...; Idem, Diccionario de las tres religiones...

BenedictusLiteralmente, bendito. Designao do cntico de Zacarias em Lc 1,68-79, a partir da sua primeira palavra na Vulgata.

48 / Betnia

BetniaLiteralmente, casa dos pobres. 1. Aldeia situada a pouco mais de 2,5 km de *Jerusalm, a leste do Monte das *Oliveiras. Segundo Jo 11,111, nela habitava *Lzaro com suas irms *Marta e *Maria. 2. Lugar no-identificado margem leste do *Jordo, onde *Joo Batista batizava (Jo 1,28; 10,40).E. Hoade, o. c.; F. Dez, o. c.

BetesdaDo aramaico Belseza. Literalmente, campo das oliveiras. Denominao do bairro norte de Jerusalm onde se situava a piscina ou tanque de Betesda (literalmente, casa da misericrdia) a cujas guas se atribuam propriedades milagrosas. As escavaes realizadas nas proximidades da atual igreja de Santana descobriram um tanque escavado na pedra, de uns 90 m de comprimento por 60 m de largura e uma profundidade de 7 a 8 m. O evangelho de Joo (5,2ss.) relaciona a esse cenrio uma das *curas realizadas por Jesus na pessoa de um paraltico.E. Hoade, o. c.; F. Dez, o. c.

BetfagLiteralmente, casa dos figos. Local a leste de Jerusalm, situado margem da estrada que conduzia a *Jeric. Os evangelhos o mencionam em relao com a entrada de Jesus na Cidade Santa (Mc 11,1; Mt 21,1; Lc 19,29-37; ver tambm Zc 9,9). Existe a possibilidade de que se encontrava prximo atual Kefr-et-Tur, no lado sudeste do Monte das Oliveiras.E. Hoade, o. c.; F. Dez, o. c.

BetsaidaLiteralmente, casa dos pescadores. Local nas imediaes do lago de Tiberades, possivelmente

Boanerges / 49

a leste da foz do *Jordo, e de onde eram naturais *Pedro, *Andr e *Filipe.E. Hoade, o. c.; F. Dez, o. c.

BetzatVer *Betesda.

BbliaVer *Escritura.

BlasfmiaDerivado das palavras gregas blabe (defeito) e femi (falar). Violao do terceiro mandamento que Deus entregou a Moiss no Sinai. Segundo o judasmo, a blasfmia ou jilul Hashem inclui o insulto, o emprego em vo e a profanao do nome de Deus. No Antigo Testamento, era castigada com a morte (Lv 24,10-16). Nos evangelhos, considera-se que classificar de demonacos os *milagres de Jesus equivale a blasfemar contra o *Esprito Santo uma afirmao indireta da divindade do Esprito Santo e implica numa situao de afastamento espiritual que impede a salvao da pessoa (Mt 12,22-32; Mc 3,22-30). O fato de Jesus arrogar-se poderes que cabem somente a Deus, como perdoar pecados, era considerado blasfmia por seus contemporneos (Mt 9,3; 26,64-66); igualmente quando afirmava que Deus era seu Pai, fazendo-se assim igual a Deus (Jo 5,18). A acusao de blasfmia teve, sem dvida, uma importncia determinante na investigao do *Sindrio, que culminou com a entrega de Jesus a *Pilatos e sua crucifixo (Mt 26,57-75; Mc 14,53-72; Lc 22,54-71).

BoanergesLiteralmente, filhos do trovo. Cognome dado a *Tiago e *Joo, os filhos de Zebedeu (Mc 3,17), por seu temperamento.

50 / Bodas

BodasNos evangelhos e, em geral, no Novo Testamento smbolo do banquete de Deus com os homens. Todos so convidados para elas (Mt 22,9), o que exige uma *converso prvia, simbolizada pela veste prpria para bodas (Mt 22,11ss.). Jesus participou da celebrao de bodas, como a de *Can (Jo 2,1-3).

BolsaOs evangelhos mencionam vrios tipos de bolsa, como a destinada s provises (Mt 10,10; Mc 6,8; Lc 9,3) e ao dinheiro (Lc 10,4; 12,3; 22,35ss.). O termo tambm se refere ao cinto que servia de bolsa (Mt 10,9) e a uma caixa porttil (glossokomon) (Jo 12,6; 13,29), semelhante a um cofre.

Bom PastorNo Antigo Testamento, um dos ttulos aplicados a Deus (Sl 23; Ez 34,11ss.). No Novo, o ttulo aplica-se a *Jesus (Jo 10,14ss.). Deste se afirma que se compadecia de uma multido que caminhava como ovelhas sem pastor (Mc 6,34) e que viu seu ministrio em termos de pastormessinico (Jo 10), cujas ovelhas se dispersariam ao ser morto o pastor (Zc 11,4ss.; 13,7-9), para reunirem-se aps sua ressurreio (Mc 14,27). A imagem do messias-pastor est ligada tambm referncia de Jesus sobre o juzo final quando as ovelhas sero separadas dos cabritos encontrada em Mt 25,32ss.P. Bonnard, o. c.; J. Zumstein, o. c.; C. Vidal Manzanares, El Judeo-cristianismo...

Bom SamaritanoParbola encontrada em Lc 10,29ss., na qual Jesus em discrepncia com o judasmo de sua poca estendeu o sentido de prximo a todas as pessoas e no apenas s que pertenciam mesma f. Historicamente, alguns Padres da Igreja

Cabrito / 51

(como Agostinho de Hipona) interpretaram a narrao em termos simblicos (o ferido o ser humano, o samaritano Cristo, a hospedaria a Igreja, as moedas, os sacramentos do Batismo e da Eucaristia etc.); contudo, inadmissvel essa exegese.D. Marguerat, Parbola, Estella 21994; J. Jeremias, Las parbolas de Jess, Estella 121992; Idem, Interpretacin de las parbolas, Estella 51994; A. George, o. c.

Brao do SenhorImagem de origem veterotestamentria (Dt 4,34; Is 52,10; 53,1), que se refere interveno salvfica de Deus na histria humana (Lc 1,52; Jo 12,38).

BrancoCor da luz (Mt 17,2), ligada s festas. O branco tambm est relacionado com seres gloriosos e anglicos (Mt 28,3; Mc 16,5; Jo 20,12; Mt 17,2; Jo 4,35).

CCabritoGrego: Erifos. Na poca de Jesus, era costume que nos pastos estivessem juntos as cabras ou cabritos negros e as ovelhas brancas. Quando recolhidos no estbulo, eram ento separados. Desse costume da vida diria vem o exemplo sobre o juzo final encontrado em Mt 25,33ss. A carne desse animal era reservada para os dias de festa (Lc 15,29).

52 / Cafarnaum

CafarnaumLiteralmente, povo de Nahum. Cidade galilia situada margem oeste do lago de *Tiberades, prximo desembocadura do *Jordo. Por sua situao de fronteira, contava com aduana (Mt 9,9) e com um destacamento de soldados romanos (Mt 8,5-13), embora no parea tratar-se de um local helenizado. Durante certo tempo foi local de residncia de Jesus (Mt 4,13; 9,1), que a amaldioou por sua incredulidade (Mt 11,23). Escavaes realizadas neste sculo apresentaram os restos do que pode ter sido a casa de Pedro segundo outros autores, a do prprio Jesus e os restos de uma sinagoga construda sobre as bases da que este conheceu.E. Hoade, o. c.; F. Dez, o. c.

CaifsNome pelo qual o Sumo Sacerdote judeu Jos, que desempenhou suas funes de 18 a 36 d.C., era conhecido. Genro de Ans, deveu a este no s a designao como a inspirao com que dirigiu seu cargo. Membro do grupo dos *saduceus, presidiu o *Sindrio que decidiu entregar Jesus s autoridades romanas para sua execuo (Jo 18,33ss.). Tambm perseguiu os seguidores de Jesus (At 4,6).C. Vidal Manzanares, El Primer Evangelio...; C. Saulnier e B. Rolland, Palestina en tiempos de Jess, Estella 101994; J. Comby e J. P. Lmonon, Roma frente a Jerusaln, Estella 1983; H. Cousin, Los textos evanglicos de la Pasin, Estella 2 1987.

CaladoEmbora as pessoas abastadas tivessem calado fechado (Lc 15,22), o comum fora de casa era usar sandlias, que consistiam em uma sola amarrada com correias (Mt 3,11; Mc 1,7). As caractersticas desse tipo de calado explicam por que a lavagem dos ps fosse uma demonstrao habi-

Calvrio / 53

tual de cortesia para os hspedes (Lc 7,38.44). Era normal levar um par a mais quando se viajava (Mt 10,10; Lc 22,35).

CalendrioNo tempo de Jesus, o calendrio era semi-solar e, para se completarem trezentos e sessenta e quatro dias, a cada trs anos acrescentava-se um ms adicional aos doze meses lunares. De acordo com o calendrio solar, as festas caam sempre no mesmo dia da semana como, por exemplo, Pentecostes no domingo. O ano civil iniciava-se no primeiro ms da primavera (nis), embora, inicialmente, fosse no outono.

CliceCopo de barro ou metal, de forma cncava e de pouca profundidade (Mt 23,25ss.; Mc 7,4). Nos evangelhos, simboliza o destino ou misso da pessoa (Mt 20,22ss.; Mc 10,38ss.), o que, s vezes, implica uma prova difcil (Mt 26,39.42; Mc 14,36; Lc 22,42; Jo 18,11).

CalvrioNome utilizado para designar o lugar onde *Jesus foi executado. Deriva do latim de locus calvariae ou lugar da Caveira (Lc 23,33). Os outros evangelhos o denominam com a palavra aramaica Gulgulta, de onde procede nosso Glgota. Tradicionalmente (e existem boas razes histricas e arqueolgicas para aceitar a tradio como fidedigna), localizado sob a atual igreja do Santo Sepulcro, em Jerusalm. No se aceitou a localizao do Calvrio proposta pelo britnico Gordon.C. Vidal Manzanares, De Pentecosts...; B. Bagatti - E. Testa, Il Golgota e la Croce, Jerusalm 1984; E. Hoare, o. c.; F. Dez, o. c.; I. Martin, Siete recorridos con el Nuevo Testamento en Jerusaln, Jerusalm 1987.

54 / Cambistas

CambistasTermo com que se designavam as pessoas encarregadas, no *Templo, de trocar as moedas com efgies contrrias lei mosaica por moeda judia. A taxa habitual de cmbio era de um *bolo de prata por meio siclo (Mt 21,21; Jo 2,14). A purificao do Templo realizada por Jesus em parte foi dirigida contra os abusos que, sob a proteo da religio, eram nele cometidos, incluindo-se entre eles a atividade cambial.

Siclo de Israel, ano II. Clice, smbolo da salvao

CameloAnimal de montaria e tiro caracterstico do Oriente Mdio. Aproveitava-se sua pele para confeccionar vestimentas (Mt 3,4). Seu tamanho era expresso comum que Jesus empregou para indicar que os *fariseus se ocupavam de mincias, mas se esqueciam do mais importante (Mt 23,24), assim como para indicar que o amor s riquezas impede totalmente a entrada no *Reino de Deus (Mt 19,24; Mc 10,25; Lc 18,25).

CaminhoA estrada que conduz vida eterna. Jesus ensinou que no existia uma pluralidade de caminhos; apenas que ele era o nico que levava ao Pai (Jo 14,4-6). Em termos humanos, esse caminho to estreito que segui-lo impossvel sem

Cananeu / 55

uma prvia converso (Mt 7,13ss.; Mt 5,20; 18,8ss.; 25,21.23).

Campo de sangueTambm: Hacldama (aramaico). Local situado ao sul de *Jerusalm, do outro lado do vale de Enom. Pertencente a um oleiro, o terreno fora comprado com as trinta moedas de prata da traio de *Judas, com a finalidade de sepultar indigentes (Mt 27; At 1,18-20). Conforme afirmao atual de J. Jeremias, o relato, longe de ser uma lenda, constitui um fato histrico.J. Jeremias, Jerusaln...

CanaJunco palestino que cresce nas margens do Jordo. Era usado como vara (Mt 27,29ss.48; Mc 15,19.36). Jesus utilizou-a como imagem de compaixo do *messias para aqueles que estavam perdidos (Mt 12,20; 11,7; Lc 7,24).

Can1. Torrente de gua situada nos limites de Efraim e Manasss, atualmente conhecida com o nome de Wadi Qana. 2. Cidade a sudeste de Tiro. 3. Povoao da *Galilia, onde *Jesus realizou seus primeiros *milagres (Jo 2,1-11; 4,46-54). Tem-se identificado esse local com Jirbet - Can, a uns 13 km de *Nazar, e com Kefr Kenna, mais prxima de Nazar, no caminho de *Tiberades. Desde o sculo IV, tende-se a preferir esta ltima identificao.E. Hoare, o. c.; F. Dez, o. c.

Cananeu1. Habitante de Cana, designao geral para os fencios (Mt 15,22; Mc 7,26). 2. Cognome de Simo (Mt 10,4; Mc 3,18). A julgar pelo paralelo

56 / Candelabro

em Lc 6,15, provavelmente trata-se de uma transcrio do termo aramaico qananaya. Este no tinha o sentido posterior de zelote como guerreiro nacionalista, mas simplesmente o de pessoa espiritualmente fervorosa.

CandelabroUtenslio domstico destinado a segurar as lmpadas (Mt 5,15; Mc 4,21; Lc 8,16; 11,33).

CnonLista de livros oficialmente reconhecidos como parte das Escrituras e inspirados por Deus. O cnon judaico do Antigo Testamento continha os seguintes livros: Gnesis, xodo, Levtico, Nmeros, Deuteronmio, Josu, Juzes, Rute, 1 e 2Samuel, 1 e 2Reis, 1 e 2Crnicas, Esdras, Neemias, J, Salmos, Provrbios, Eclesiastes, Cntico dos Cnticos, Isaas, Jeremias, Ezequiel, Daniel, Joel, Osias, Ams, Abdias, Jonas, Miquias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias. O cnon protestante contm os mesmos livros e o catlico, alm desses, inclui os denominados *apcrifos por judeus e protestantes e, pelos catlicos, como deuterocannicos ou pertencentes a um segundo cnon. So eles: 1 e 2Macabeus, Tobias, Judite, Eclesistico, Sabedoria, Baruc, adies a Ester e a Daniel. Nos evangelhos, Jesus no cita os apcrifos ou deuterocannicos. Quanto ao Novo Testamento, no existe discusso entre as confisses crists em relao aos livros que o compem: Mateus, Marcos, Lucas, Joo, Atos dos Apstolos, Romanos, 1 e 2Corntios, Glatas, Efsios, Filipenses, Colossenses, 1 e 2Timteo, Tito, Filmon, Hebreus, Tiago, 1 e 2Pedro, 1, 2 e 3Joo, Judas e Apocalipse.A. Paul, La inspiracin y el canon de las Escrituras; F. F. Bruce, Canon...; R. Beckwith, The Old Testament Canon of the New Testament Church, Grand Rapids 1985.

Carne / 57

Canto do galoTermo com que se designava o final da terceira viglia, por volta das 3 horas da manh. O episdio se reveste de especial interesse nos evangelhos porque Jesus profetizou que *Pedro o negaria antes que cantasse o galo na noite de sua priso como, de fato, aconteceu. Dada a importncia de Pedro no incio do cristianismo e do lugar em que estava o apstolo nesse acontecimento, no h nenhuma razo para se duvidar de que a passagem reflete um fato histrico (Mc 13,35; Mt 26,34; Mc 14,30; Lc 22,34; Jo 13,38; Mt 26,74s.; Mc 14,68.72; Jo 18,27).E. Hoare, o. c.; F. Dez, o. c.

CoQuadrpede que na poca de Jesus podia ser domstico (Mt 15,26ss.) ou selvagem (Lc 16,21). A palavra encerra tambm um sentido pejorativo (Mt 7,6).

CapernaumVer *Cafarnaum.

CaridadeVer *gape.

CarneO termo carne no tem uma significao unvoca nos evangelhos. A expresso toda carne refere-se ao conjunto de todos os seres humanos (Mt 24,22); carne e sangue designa o ser humano em suas limitaes (Mt 16,17; 26,41) e carne tambm se refere em contraposio a esprito ao homem em seu estado de pecado (Jo 3,6). Finalmente comer a carne e beber o sangue de Jesus, longe de ser uma referncia

58 / Carpinteiro

eucarstica, significa identificar-se totalmente com Jesus, custe o que custar, pelo Esprito que d a vida. A exigncia dessa condio explica por que muitos que seguiam Jesus at esse momento abandonaram-no a partir de sua afirmao (Jo 6,53-58.63).

CarpinteiroTraduo inexata da palavra grega tekton, que designava um arteso ou obreiro que trabalhava com diferentes materiais como madeira, pedra ou metal. Segundo os evangelhos, essa foi a ocupao de *Jos e do prprio Jesus, antes de seu ministrio pblico (Mt 13,55; Mc 6,3).

CastidadeAbsteno das relaes sexuais por motivos espirituais. Implica a limitao do sexo no matrimnio ou a sua total renncia por tempo determinado ou indefinido. O judasmo do tempo de Jesus considerava que o nico canal apropriado para as relaes sexuais era o *matrimnio, e afirmava que a proibio de uma conduta sexualmente imoral fazia parte no somente do ensinamento da *Tor, mas tambm dos mandamentos de No que a impunham a todos os povos. Tambm mantinha normas de castidade relacionadas com *jejuns concretos, *festas e *guerras. A absteno perptua das relaes sexuais no era habitual, embora historicamente houvesse algum caso excepcional, como o dos sectrios de Qumrn. O cristianismo herdeiro desse conceito, e Jesus (que, evidentemente, no contraiu matrimnio), em harmonia com o pensamento judeu de sua poca, reprovou tambm o olhar ou o pensamento luxurioso (Mt 5,27-30). Da mesma forma, elogiou os que renunciavam totalmente s relaes sexuais por causa do *Reino de Deus (Mt 19,12), considerando-os possuidores de um dom especfico no alcanado por todos.

Cegueira / 59

CastigoVer *Inferno.

Ctedra de MoissTermo com que se designava um assento honorfico na *sinagoga, reservado aos mestres da *Lei. Jesus se manifestou contra a apropriao que essas pessoas faziam da vida espiritual de Israel (Mt 23,2).

CedronLiteralmente, o turvo, o escuro. Atualmente recebe o nome de Wadi-en-Nar. Curso dgua que nasce a noroeste de Jerusalm e corre por um vale profundo, situado entre o muro leste da cidade e o Monte das Oliveiras.E. Hoare, o. c.; F. Dez, o. c.

CefasLiteralmente, pedra. Cognome dado a *Pedro (Jo 1,42-43) e mantido no cristianismo posteriormente (1Cor 1,12; 3,22; 9,5; 15,5; Gl 1,18; 2,9.11.14).

CegueiraEnfermidade bastante comum nos tempos de Jesus, em conseqncia das condies climticas e higinicas. Os cegos viviam desamparados em seu triste destino e recorriam mendicncia como forma de ganhar a vida (Mc 10,46; Jo 9,1). Os evangelhos citam vrias *curas de Jesus que tiveram cegos como protagonistas (Jo 9,1ss.; Mt 20,29-34). Nos evangelhos, a cegueira simboliza a rejeio das pessoas em receber a salvao oferecida por Jesus (Mt 15,14; 23,16-26; Jo 9,41; 12,40). Por isso, as curas de cegos efetuadas por Jesus

60 / Ceia, ltima

no somente pretendem alivi-los em sua desgraa, como tambm demonstram que Jesus o *Messias e a nica luz (Mt 11,5; Lc 7,22; Jo 9,39; Mt 13,16ss. etc.).

Ceia, ltimaTermo com que se designa a ltima ceia celebrada por Jesus com seus *discpulos. Teve como cenrio o andar superior de uma casa (Mc 14,15; Lc 22,12) que se identificaria com a mencionada em At 1,13, situada, com certeza, a sudoeste de *Jerusalm. Esse episdio se identifica, sem dvida alguma, com a celebrao da Pscoa judaica. De fato, assim o afirmou Jesus (Lc 22,15; Mt 26,17; Mc 14,12) e assim se depreende do rito da Ceia, na qual Jesus se identifica com o Cordeiro cujo sangue salva o povo (Lc 22,20), um eco do relato pascal de x 12, e inicia a Nova Aliana, em paralelo Aliana sinatica, tambm acompanhada de efuso de sangue (x 24). Strauss questionou a localizao cronolgica da ltima Ceia, insistindo que Joo a situava no dia anterior Pascoa, o que denotaria uma clara contradio entre os evangelistas. Para apoiar esse ponto de vista, diferentes autores tm-se referido s passagens contidas em Jo 18,28; 19,14 e 19,31. O exame dos textos joanitas, no entanto, no evidenciam essa contradio. Assim, em 18,28, os sacerdotes judeus realmente no se referem Ceia da Pscoa, mas totalidade da festa que durava sete dias (2Cr 30,22). A expresso vspera da Pscoa (19,14) tampouco deve ser interpretada como significando o dia anterior Ceia da Pscoa, mas, pelo contrrio, com o sentido real que tinha o dia denominado preparao, isto , o dia anterior ao *sbado, nossa sexta-feira. De fato, nesse mesmo sentido aparece em Mt 27,62; Mc 15,42; Lc 23,54 e, no mesmo Joo, em duas ocasies (19,31.42). Finalmente, a passagem de Jo 19,31 no pode ser interpretada no sentido de que o primeiro dia da festa nessa referida Pscoa foi o sbado. O dia principal podia ser o primeiro, o ltimo ou o sbado da festa (ver Jo 7,37). Se isso

Centurio / 61

for pouco, tenha-se em conta que Joo insiste como os Sinticos que a crucifixo aconteceu na sexta-feira (Jo 18,39-40; 19,31.42; 20,1.19 etc.). Portanto, longe de diferenciar-se dos *Sinticos, Joo concorda com eles ao situar a ltima Ceia na quinta-feira e a crucifixo na sexta-feira.A. T. Robertson, Una armona de los cuatro Evangelios, El Paso 1975; C. Vidal Manzanares, El Primer Evangelio...; Idem, El judeo-cristianismo...; E. F. Teolgica Toulose, La Eucarista en la Biblia, Estella 61994; H. Cousin, Los textos evanglicos de la Pasin, Estella 21987.

CelibatoVer *Castidade.

CenculoPalavra portuguesa oriunda de coenaculum (refeitrio), o termo empregado pela Vulgata para designar a sala superior onde ac