Civil Obrigacoes Vol 4 (CESSÃO)

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    MATERIAL DE APOIO

    DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

    Apostila 04

    Prof. Pablo Stolze Gagliano

    Temas: Transmissão das Obrigações e Cláusula Penal

    1.  Transmissão das Obrigações

    A relação obrigacional não é estática, é dinâmica.1 

    Dentro, pois, desta dinâmica obrigacional, o tema sob análise

    compreende o estudo de três figuras jurídicas muito importantes, sendo que

    apenas as duas primeiras foram reguladas pelo novo Código Civil:

    a)  cessão de crédito;

    b)  cessão de débito;

    c)  cessão de contrato.

    2. Cessão de Crédito

    A cessão de crédito traduz uma modalidade de transmissão

    obrigacional em que o credor (cedente) transfere total ou parcialmente oseu crédito a um terceiro (cessionário), mantendo-se a mesma relação

    obrigacional – primitiva – com o devedor (cedido).

    Note-se que a relação obrigacional é a mesma, razão pela qual

    não pode ser confundida com a novação subjetiva ativa, caso em que, como

    1

     Neste ponto, recomendamos, mais uma vez, a leitura da obra “A Obrigação comoum Processo” de Clóvis do Couto e Silva, FGV.

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    vimos, com o ingresso do novo credor, é considerado criada uma obrigação

    nova.

    Vale frisar ainda que a cessão poderá ser onerosa ou gratuita –

    esta última possibilidade, de per si, aliás, já serviria para não identificá-latotalmente com o pagamento com sub-rogação (que é sempre oneroso, por

    envolver pagamento...).

    A disciplina da cessão do crédito é feita a partir do art. 286:

    Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a

    natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula

    proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se nãoconstar do instrumento da obrigação.

    A cláusula proibitiva da cessão, denominada “pacto de non

    cedendo”, à luz do princípio da eticidade, deve constar expressamente no

    instrumento da obrigação.

    Um importante ponto, ainda, deve ser ressaltado: à luz do princípio da

    boa-fé, e como decorrência do “dever de informação”, o devedor deve sercomunicado da cessão feita, sob pena de não ser a mesma eficaz em

    face dele:

    Art. 290. A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor,

    senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que,

    em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.

    Outros artigos interessantes:

    Art. 292. Fica desobrigado o devedor que, antes de ter conhecimento

    da cessão, paga ao credor primitivo, ou que, no caso de mais de uma

    cessão notificada, paga ao cessionário que lhe apresenta, com o título de

    cessão, o da obrigação cedida; quando o crédito constar de escritura

    pública, prevalecerá a prioridade da notificação.

    Art. 293. Independentemente do conhecimento da cessão pelo devedor,pode o cessionário exercer os atos conservatórios do direito cedido.

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    Art. 294. O devedor pode opor ao cessionário as exceções que lhe

    competirem, bem como as que, no momento em que veio a ter

    conhecimento da cessão, tinha contra o cedente.

    Importante ponto, finalmente, diz respeito à responsabilidade pelacessão do crédito.

    Regra geral, o cedente responderá apenas pela existência do crédito

    cedido, não se responsabilizando pela solvência do devedor (cessão pro

    soluto); nada impede, no entanto, como decorrência da autonomia

    privada, que seja convencionada também a responsabilidade pela solvência

    do devedor (cessão pro solvendo).

    Neste sentido, leiam-se os seguintes artigos:

    Art. 295. Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que não se

    responsabilize, fica responsável ao cessionário pela existência do crédito ao

    tempo em que lhe cedeu; a mesma responsabilidade lhe cabe nas cessões

    por título gratuito, se tiver procedido de má-fé.

    Art. 296. Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pelasolvência do devedor.

    Art. 297. O cedente, responsável ao cessionário pela solvência do

    devedor, não responde por mais do que daquele recebeu, com os

    respectivos juros; mas tem de ressarcir-lhe as despesas da cessão e as que

    o cessionário houver feito com a cobrança.

    3.  Cessão de Débito

    A cessão de débito ou assunção de dívida opera-se por meio de

    um negócio jurídico pelo qual o devedor, com expresso consentimento do

    credor, transfere o seu débito a terceiro.

    Fique atento: a relação obrigacional é a mesma, razão pela

    qual não se identifica com a novação subjetiva passiva.

    No Código Civil, a sua disciplina é feita nos arts. 299 a 303:

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    Art. 299. É facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, com o

    consentimento expresso do credor, ficando exonerado o devedor primitivo,

    salvo se aquele, ao tempo da assunção, era insolvente e o credor o

    ignorava.

    Parágrafo único. Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para

    que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como

    recusa.

    Art. 300. Salvo assentimento expresso do devedor primitivo,

    consideram-se extintas, a partir da assunção da dívida, as garantias

    especiais por ele originariamente dadas ao credor.

    Art. 301. Se a substituição do devedor vier a ser anulada, restaura-se o

    débito, com todas as suas garantias, salvo as garantias prestadas por

    terceiros, exceto se este conhecia o vício que inquinava a obrigação.

    Art. 302. O novo devedor não pode opor ao credor as exceções

    pessoais que competiam ao devedor primitivo.

    Art. 303. O adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo opagamento do crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar em

    trinta dias a transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento.

    Vale observar que a anuência do credor é indispensável para que

    se dê esta modalidade de cessão.

    4. Cessão de Posição Contratual

    É comumente denominada de “cessão de contrato”, não tendo

    sido regulada pelo novo Código Civil.

    O seu reconhecimento fica a cargo da doutrina e da

     jurisprudência, valendo mencionar que o Código Português fora explícito em

    sua disciplina (ver arts. 424 a 427).

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    Diferentemente das modalidades anteriores, na cessão de

    contrato, o cedente transfere ao cessionário, de forma global, a sua própria

    posição contratual, compreendendo créditos e débitos.

    Trata-se, em outras palavras, da cessão da sua própria posição ousituação no contrato.

    É, pois, modalidade de cessão muito mais abrangente do que as

    anteriores.

    São requisitos gerais desta cessão, em nosso pensar:

    a)  a celebração de um negócio jurídico entre cedente e

    cessionário;

    b)  a integralidade da cessão (cessão global);

    c)  a anuência expressa da outra parte (cedido) .

    Confira, logo abaixo, importante jurisprudência selecionada

    referente a este tema, que será desenvolvido em sala de aula.

    5. Cláusula Penal

    Segundo CLÓVIS BEVILÁQUA, “não se confunde esta pena

    convencional com as repressões impostas pelo direito criminal, as quais

    cabe somente ao poder público aplicar em nossos dias. A pena convencional

    é puramente econômica, devendo consistir no pagamento de uma soma, ouexecução de outra prestação que pode ser objeto de obrigações”.2 

    Trata-se, pois, de um pacto acessório pelo qual as partes fixam,

    previamente, a indenização devida em caso de descumprimento culposo da

    obrigação principal, de uma determinada cláusula do contrato, ou,

    simplesmente, em caso de mora.

    2 BEVILÁQUA, C lóvis. The oria Ge ra l do Dire ito C ivil. Campinas: RED, 2000, pág. 104.

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    Veja a sua disciplina jurídica, no Código Civil:

    Art. 408. Incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde

    que, culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.

    Art. 409. A cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação,

    ou em ato posterior, pode referir-se à inexecução completa da obrigação, à

    de alguma cláusula especial ou simplesmente à mora.

    Art. 410. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de total

    inadimplemento da obrigação, esta converter-se-á em alternativa a

    benefício do credor.

    Art. 411. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de mora, ou

    em segurança especial de outra cláusula determinada, terá o credor o

    arbítrio de exigir a satisfação da pena cominada, juntamente com o

    desempenho da obrigação principal.

    Art. 412. O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode

    exceder o da obrigação principal.

    Art. 413. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a

    obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da

    penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a

    finalidade do negócio.

    Art. 414. Sendo indivisível a obrigação, todos os devedores, caindo em

    falta um deles, incorrerão na pena; mas esta só se poderá demandar

    integralmente do culpado, respondendo cada um dos outros somente pelasua quota.

    Parágrafo único. Aos não culpados fica reservada a ação regressiva

    contra aquele que deu causa à aplicação da pena.

    Art. 415. Quando a obrigação for divisível, só incorre na pena o devedor

    ou o herdeiro do devedor que a infringir, e proporcionalmente à sua parte

    na obrigação.

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    Art. 416. Para exigir a pena convencional, não é necessário que o

    credor alegue prejuízo.

    Parágrafo único. Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula

    penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foiconvencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização,

    competindo ao credor provar o prejuízo excedente.

    Selecionamos, nessa linha, alguns importantes enunciados (da 4ª

    Jornada de Direito Civil) que serão, juntamente com a matéria,

    desenvolvidos em sala de aula:

    355 – Art. 413. Não podem as partes renunciar à possibilidade de reduçãoda cláusula penal se ocorrer qualquer das hipóteses previstas no art. 413 do

    Código Civil, por se tratar de preceito de ordem pública.

    356 – Art. 413. Nas hipóteses previstas no art. 413 do Código Civil, o juiz

    deverá reduzir a cláusula penal de ofício.

    357 – Art. 413. O art. 413 do Código Civil é o que complementa o art. 4º da

    Lei n. 8.245/91. Revogado o Enunciado 179 da III Jornada.

    358 – Art. 413. O caráter manifestamente excessivo do valor da cláusula

    penal não se confunde com a alteração de circunstâncias, a excessiva

    onerosidade e a frustração do fim do negócio jurídico, que podem incidir

    autonomamente e possibilitar sua revisão para mais ou para menos.

    359 – Art. 413. A redação do art. 413 do Código Civil não impõe que a

    redução da penalidade seja proporcionalmente idêntica ao percentual

    adimplido.

    Ao final do material de apoio, leia, também, jurisprudência

    selecionada pertinente à matéria, que será desdobrada nas aulas.

    6. Jurisprudência Selecionada

    6.1. Transmissão das Obrigações

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    Processual civil. Agravo no recurso especial. Contrato de mútuo do

    Sistema Financeiro de Habitação - SFH. Ação revisional. Cessão do contrato.

    Ausência de interveniência da instituição financeira.

    Ilegitimidade ativa do cessionário.

    - A interveniência da instituição financeira é obrigatória na

    transferência de imóvel financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação

    pois, sem esta, não tem o cessionário legitimidade ativa para ajuizar ação

    visando discutir o contrato realizado entre o mutuário cedente e o

    mutuante.

    Agravo no recurso especial não provido.

    (AgRg no REsp 934989/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,

    TERCEIRA TURMA, julgado em 23/08/2007, DJ 17/09/2007 p. 277)

    PROCESSUAL CIVIL. SFH. IMÓVEL FINANCIADO. CESSÃO.

    LEGITIMIDADE ATIVA DO CESSIONÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RAZÕES

    QUE NÃO INFIRMAM FUNDAMENTO CAPAZ, POR SI SÓ, DE MANTER O

    ACÓRDÃO RECORRIDO. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DA SÚMULA N.

    283/STF. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. SÚMULA 83/STJ.

    1. In casu, o recorrente não combateu efetivamente fundamento

    do Tribunal a quo suficiente para manter o entendimento consignado, qual

    seja, de anuência tácita do credor hipotecário com o negócio jurídico

    entabulado entre o mutuário originário do SFH e o cessionário do chamado

    "contrato de gaveta", sendo aplicável, por analogia, a súmula nº 283/STF,

    verbis: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida

    assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange

    todos eles".

    2. No tocante à divergência jurisprudencial, o aresto combatido

    não merece reparo, uma vez que se encontra em consonância com

    cristalizada jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de que, com o

    advento da Lei 10.150/20003, o cessionário possui legitimidade para discutir

    3  Art. 20. As transferências no âmbito do SFH, à exceção daquelas queenvolvam contratos enquadrados nos planos de reajustamento definidos pela Lei no

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    e demandar em juízo questões pertinentes às obrigações assumidas no

    contrato de mútuo, firmado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação -

    SFH, pelo mutuário originário. Incidência da súmula nº 83 do STJ.

    3. Recurso especial não conhecido.

    (REsp 653.415/SC, Rel. MIN. CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ

    CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), SEGUNDA TURMA, julgado em

    08/04/2008, DJe 02/05/2008)

    ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. FCVS.

    CESSÃO DE OBRIGAÇÕES E DIREITOS. "CONTRATO DE GAVETA".

    TRANSFERÊNCIA DE FINANCIAMENTO. NECESSIDADE DE CONCORDÂNCIA

    DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA MUTUANTE. LEI Nº 10.150, DE 2000 (ART.

    20).

    1. A cessão de mútuo hipotecário carece da anuência da

    instituição financeira mutuante, mediante comprovação de que o

    cessionário atende aos requisitos estabelecidos pelo Sistema Financeiro de

    Habitação-SFH. Precedente da Corte Especial: REsp 783389/RO, Rel.

    Ministro ARI PARGENDLER, CORTE ESPECIAL, julgado em21/05/2008, DJ de 30/10/2008.

    2. Consectariamente, o cessionário de mútuo habitacional, cuja

    transferência se deu sem a intervenção do agente financeiro, não possui

    legitimidade ad causam para demandar em juízo questões pertinentes às

    obrigações assumidas no contrato ab origine.

    3. Ressalva do ponto de vista do Relator no sentido de que, adespeito de a jurisprudência da Corte Especial entender pela necessidade de

    8.692, de 28 de julho de 1993, que tenham sido celebradas entre o mutuário e oadquirente até 25 de outubro de 1996, sem a interveniência da instituiçãofinanciadora, poderão ser regularizadas nos termos desta Lei. 

    Parágrafo único. A condição de cessionário poderá ser comprovada junto àinstituição financiadora, por intermédio de documentos formalizados junto aCartórios de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, ou de Notas, onde secaracterize que a transferência do imóvel foi realizada até 25 de outubro de 1996. 

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    anuência da instituição financeira mutuante, como condição para a

    substituição do mutuário, a hipótese sub judice envolve aspectos sociais

    que devem ser considerados.

    4. A Lei n.º 8.004/90 estabelece como requisito para a alienação ainterveniência do credor hipotecário e a assunção, pelo novo adquirente, do

    saldo devedor existente na data da venda.

    5. A Lei n.º 10.150/2000, por seu turno, prevê a possibilidade de

    regularização das transferências efetuadas sem a anuência da instituição

    financeira até 25/10/96, à exceção daquelas que envolvam contratos

    enquadrados nos planos de reajustamento definidos pela Lei n.º 8.692/93,

    o que revela a intenção do legislador de possibilitar a regularização doscognominados “contratos de gaveta”, originários da celeridade do comércio

    imobiliário e da negativa do agente financeiro em aceitar transferências de

    titularidade do mútuo sem renegociar o saldo devedor.

    6. Deveras, consoante cediço, o princípio pacta sunt servanda, a

    força obrigatória dos contratos, porquanto sustentáculo do postulado da

    segurança jurídica, é princípio mitigado, posto sua aplicação prática estar

    condicionada a outros fatores, como, por v.g., a função social, as regrasque beneficiam o aderente nos contratos de adesão e a onerosidade

    excessiva.

    7. O Código Civil de 1916, de feição individualista, privilegiava a

    autonomia da vontade e o princípio da força obrigatória dos vínculos. Por

    seu turno, o Código Civil de 2002 inverteu os valores e sobrepõe o social

    em face do individual. Dessa sorte, por força do Código de 1916, prevalecia

    o elemento subjetivo, o que obrigava o juiz a identificar a intenção das

    partes para interpretar o contrato. Hodiernamente, prevalece na

    interpretação o elemento objetivo, vale dizer, o contrato deve ser

    interpretado segundo os padrões socialmente reconhecíveis para aquela

    modalidade de negócio.

    8. Sob esse enfoque, o art. 1.475 do diploma civil vigente

    considera nula a cláusula que veda a alienação do imóvel hipotecado,

    admitindo, entretanto, que a referida transmissão importe no vencimento

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    antecipado da dívida. Dispensa-se, assim, a anuência do credor para

    alienação do imóvel hipotecado em enunciação explícita de um princípio

    fundamental dos direitos reais.

    9. Deveras, jamais houve vedação de alienação do imóvelhipotecado, ou gravado com qualquer outra garantia real, porquanto função

    da seqüela. O titular do direito real tem o direito de seguir o imóvel em

    poder de quem quer que o detenha, podendo excuti-lo mesmo que tenha

    sido transferido para o patrimônio de outrem distinto da pessoa do devedor.

    10. Dessarte, referida regra não alcança as hipotecas vinculadas

    ao Sistema Financeiro da Habitação – SFH, posto que para esse fim há lei

    especial – Lei n° 8.004/90 –, a qual não veda a alienação, mas apenasestabelece como requisito a interveniência do credor hipotecário e a

    assunção, pelo novo adquirente, do saldo devedor existente na data da

    venda, em sintonia com a regra do art. 303, do Código Civil de 2002.

    11. Com efeito, associada à questão da dispensa de anuência do

    credor hipotecário está a notificação dirigida ao credor, relativamente à

    alienação do imóvel hipotecado e à assunção da respectiva dívida pelo novo

    titular do imóvel. A matéria está regulada nos arts. 299 a 303 do NovelCódigo Civil – da assunção de dívida –, dispondo o art. 303 que "o

    adquirente do imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do

    crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar em 30 (trinta) dias

    a transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento." 12. Ad

    argumentandum tantum, a Lei n.º 10.150/2000 permite a regularização da

    transferência do imóvel, além de a aceitação dos pagamentos por parte da

    Caixa Econômica Federal revelar verdadeira aceitação tácita. Precedentesdo STJ: EDcl no Resp 573.059 /RS e REsp 189.350 - SP, DJ de 14.10.2002.

    13. Agravo Regimental desprovido.

    (AgRg no REsp 838.127/DF, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA

    TURMA, julgado em 17/02/2009, DJe 30/03/2009)

    PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL.

    SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. "CONTRATO DE GAVETA".CESSIONÁRIO.

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    ILEGITIMIDADE ATIVA.

    1. A Corte Especial do STJ, por ocasião do julgamento do REsp n.

    783.389/RO, Rel. Min. Ari Pargendler (DJe 30.10.2008), firmou

    entendimento no sentido de que "a cessão do mútuo hipotecário não pode

    se dar contra a vontade do agente financeiro; a concordância deste

    depende de requerimento instruído pela prova de que o cessionário atende

    as exigências do Sistema Financeiro da Habitação".

    2. Portanto, a cessão do mútuo realizada anteriormente a

    25.10.1996 não é vedada, mas condicionada à demonstração de que o novo

    cessionário preenche os requisitos estabelecidos para a formalização do

    contrato, na forma do art. 20 da Lei n. 10.150/200, o que não ocorreu no

    caso, conforme consignado pelo Tribunal de origem.

    3. Agravo regimental não provido.

    (AgRg no REsp 951.283/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL

    MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2009, DJe 21/09/2009)

    Competência. Conflito. Cessão de contrato. Cessionária: Caixa

    Econômica Federal. Intervenção. Fase Recursal. Assistência. Justiça

    Estadual X Justiça Federal.

    - A cessão de direitos e ações pelo Banco Meridional do Brasil à

    Caixa Econômica Federal, com a conseqüente intervenção desta, na

    qualidade de assistente, em embargos à execução, após a prolação da

    sentença, mas antes do julgamento da apelação, desloca a competência

    para a Justiça Federal.

    - A Justiça Federal é competente para apreciar o pedido de

    assistência formulado pela entidade federal e, caso admita a intervenção,

    poderá julgar o mérito do recurso.

    - Do contrário, inadmitida a Caixa Econômica como assistente,

    será competente, para o julgamento daquele recurso, a Justiça Estadual.

    (CC 35.929/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDASEÇÃO, julgado em 23.10.2002, DJ 06.10.2003 p. 200)

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    Cessão de contrato de arrendamento mercantil. Direitos e

    obrigações que lhe são anteriores. Cessionário que pleiteia a revisão do

    contrato. Abrangência das prestações anteriores adimplidas pelo cedente.Legitimidade do cessionário reconhecida. Recurso provido.

    - A celebração entre as partes de cessão de posição contratual,

    que englobou créditos e débitos, com participação da arrendadora, da

    anterior arrendatária e de sua sucessora no contrato, é lícita, pois o

    ordenamento jurídico não coíbe a cessão de contrato que pode englobar ou

    não todos os direitos e obrigações pretéritos, presentes ou futuros, inclusive

    eventual saldo credor remanescente da totalidade de operações entre aspartes envolvidas.

    - A cessão de direitos e obrigações oriundos de contrato, bem

    como os referentes a fundo de resgate de valor residual, e seus respectivos

    aditamentos, implica a transferência de um complexo de direitos, de

    deveres, débitos e créditos, motivo pelo qual se confere legitimidade ao

    cessionário de contrato (cessão de posição contratual) para discutir a

    validade de cláusulas contratuais com reflexo, inclusive, em prestaçõespretéritas já extintas.

    - A extinção do dever de pagamento da prestação mensal não se

    confunde com a possibilidade de revisão das cláusulas contratuais, pois esta

    decorre do direito de acesso ao Poder Judiciário e habilita a parte

    interessada a requerer o pagamento de diferenças pecuniárias incluídas

    indevidamente nas prestações anteriores à cessão contratual, pois foram

    cedidos não só os débitos pendentes como todos os créditos que viessem a

    ser apurados posteriormente.

    (REsp 356.383/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA

    TURMA, julgado em 05.02.2002, DJ 06.05.2002 p. 289)

    6.2. Cláusula Penal

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    RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. OBRIGAÇÃO.

    DESCUMPRIMENTO.

    CLÁUSULA PENAL MORATÓRIA. CUMULAÇÃO COM LUCROS

    CESSANTES.

    POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI.

    INEXISTÊNCIA.

    DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA.

    1. A instituição de cláusula penal moratória não compensa o

    inadimplemento, pois se traduz em punição ao devedor que, a despeito de

    sua incidência, se vê obrigado ao pagamento de indenização relativa aosprejuízos dele decorrentes. Precedente.

    2. O reconhecimento de violação a literal disposição de lei

    somente se dá quando dela se extrai interpretação desarrazoada, o que não

    é o caso dos autos.

    3. Dissídio jurisprudencial não configurado em face da ausência de

    similitude fática entre os arestos confrontados.

    4. Recurso especial não conhecido.

    (REsp 968.091/DF, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES,

    QUARTA TURMA, julgado em 19/03/2009, DJe 30/03/2009)

    AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

    CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. RESCISÃO CONTRATUAL.

    INADIMPLÊNCIA. CLÁUSULA PENAL.

    ART. 53, DO CDC. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.

    I - A estipulação de multa contratual de 10% sobre o valor total

    do contrato, em caso de desfazimento do acordo, não ofende o disposto no

    art. 53 do CDC, porquanto apenas parte do valor total já pago será retido

    pelo fornecedor.

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    II - Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando

    a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida

    (Súmula 83 do STJ) Agravo Regimental improvido.

    (AgRg no Ag 748.559/MG, Rel. Ministro SIDNEI BENETI,TERCEIRA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 08/10/2008)

    CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA

    E CESSÃO.

    INADIMPLÊNCIA RECONHECIDA DOS RÉUS. RESCISÃO

    DECRETADA. PERDA DAS IMPORTÂNCIAS PAGAS CONSOANTE CLÁUSULA

    PENAL. CONTRATO CELEBRADO ANTES DA VIGÊNCIA DO CDC. VALIDADE

    DA COMINAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO INSUFICIENTE. SUCUMBÊNCIA.

    CPC, ART. 20, § 4º.

    I. Reconhecida a inadimplência dos réus, em contrato de

    promessa de compra e venda e cessão imobiliária, válida é a cláusula que

    prevê a perda das parcelas pagas quando celebrado o contrato antes da

    vigência do Código de Defesa do Consumidor. Precedentes do STJ.

    II. Insuficiência de prequestionamento que impede, ao teor dasSúmulas n. 282 e 356 do C. STF, o debate acerca do acerto ou não da

    extinção da ação reintegratória de posse.

    III. Ausente a condenação, a sucumbência deve ser fixada com

    base no art. 20, § 4º, do CPC.

    IV. Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido.

    (REsp 399.123/SC, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR,

    QUARTA TURMA, julgado em 07.12.2006, DJ 05.03.2007 p. 288)

    CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE

    COMPRA E VENDA.

    INADIMPLÊNCIA DO DEVEDOR. CONTRATO ANTERIOR AO CDC.

    INAPLICABILIDADE. PERDA DAS PRESTAÇÕES PAGAS PREVISTA

    EM CLÁUSULA PENAL.

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    I. Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor a contrato

    celebrado antes da sua vigência, pelo que a cláusula penal que prevê a

    perda da totalidade das parcelas pagas, contratada antes da entrada em

    vigor da Lei n. 8.078/80, não pode ser afastada com base em tal diploma.

    Precedentes do STJ.

    II. Recurso especial conhecido e provido.

    (REsp 435.608/PR, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR,

    QUARTA TURMA, julgado em 27/03/2007, DJ 14/05/2007 p. 310)

    Direito civil. Obrigações. Ação anulatória de contrato de cessão de

    obras literárias por encomenda (elaboração de duas telenovelas).

    Reconvenção. Indenização por perdas e danos. Descumprimento

    integral do contrato. Redução da multa contratual. Cláusula penal. Função

    compensatória.

    - Inviável a revisão do julgado, por força das Súmulas 5 e 7 do

    STJ, se o Tribunal de origem, ao analisar o processo, atento ao teor do

    contrato objeto da controvérsia e ao acervo probatório juntado pelas partes,

    concluiu pela inexistência de qualquer ato omissivo ou comissivo passível demacular o negócio jurídico.

    - A redução da multa compensatória, de acordo com o Código

    Civil, somente pode ser concedida nas hipóteses de cumprimento parcial da

    prestação ou, ainda, quando o valor da multa exceder o valor da obrigação

    principal.

    - Considerando-se que estipulada a cláusula penal em valor nãoexcedente ao da obrigação e que foi total o inadimplemento contratual, não

    cabe a redução do seu montante, que deve servir como compensação pela

    impossibilidade de obtenção da execução específica da prestação

    contratada, na hipótese, a elaboração de duas telenovelas.

    Recurso especial não conhecido.

    (REsp 687.285/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA

    TURMA, julgado em 25.09.2006, DJ 09.10.2006 p. 287)

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    CIVIL E PROCESSUAL. COTAS DE CONSÓRCIO ADQUIRIDAS DE

    EMPRESA VENDEDORA DE VEÍCULOS. CARACTERIZAÇÃO COMO

    COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. DESISTÊNCIA PELO ADQUIRENTE.

    CLÁUSULA PENAL. CDC, ART. 53.

    MITIGAÇÃO. RETENÇÃO PARCIAL PARA RESSARCIMENTO DE

    DESPESAS.

    I. Reconhecido pelo Tribunal estadual que se cuidou, na espécie,

    de compromisso de compra e venda de quotas de consórcio, a desistência,

    pelo adquirente, sob alegação de dificuldades econômicas, implica na

    aplicação parcial da cláusula penal, cabendo a retenção de parte dos valores

    a serem restituídos, para ressarcimento de despesas administrativas davendedora.

    II. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.

    (REsp 165.304/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR,

    QUARTA TURMA, julgado em 07.02.2006, DJ 20.03.2006 p. 273)

    7. Texto Complementar

    É sempre vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade de

    cláusulas em contrato bancário?

    Reflexões sobre a Súmula 381 do STJ

    Pablo Stolze Gagliano4 e Salomão Viana5 

    Um dos pontos fundamentais do pensamento do filósofo da

    linguagem ROBERT ALEXY6 é a defesa da imperiosa necessidade de o jurista

    4Juiz de Direito (BA), mestre em Direito Civil pela PUC-SP, especialista em Direito Civil pela FundaçãoFaculdade de Direito da Bahia, professor da Universidade Federal da Bahia e da Rede LFG. 5  J uiz Federal (BA), especialista em Direito Processual Civil pela UFBA, professor da Universidade

    Federal da Bahia e da da Rede LFG. 6 Teoria da Argumentação Jurídica. SP: Edidora Landy, 2005. 

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    desenvolver o fundamento discursivo do seu pensamento em bases lógicas,

    visando a atingir convincentemente o resultado hermenêutico de sua

    atividade cognitiva.

    E está certo ALEXY.

    Afinal, não cabe ao magistrado julgar de acordo com o seu

     “achismo”, mas, sim, segundo valores socialmente objetivados, e na linha

    de uma hermenêutica filosoficamente justificada.

    Por isso, em nossa atividade acadêmica, exortamos, continuamente,

    os nossos alunos a não imaginarem existir uma fronteira entre a dogmática jurídica e os outros ramos do conhecimento humano, especialmente o

    filosófico.

    Aliás, em um sistema cada vez mais marcado pela abertura

    conceitual dos preceitos normativos – império dos conceitos vagos e das

    cláusulas gerais – a comunicação entre as diversas fontes do conhecimento

    humano, além de traduzir uma quebra do encastalamento autopoiético do

    Direito, passou a ser uma obrigatória exigência para a adequada aplicação

    da norma ao caso concreto.

    Nesse contexto, resta óbvio que não pode o juiz tornar-se um mero

    reprodutor de uma ideia preconcebida, esteja ela insculpida em uma lei ou

    aparentemente incrustada no entendimento sumulado de um tribunal.

    Uma postura acomodatícia de um membro do Poder Judiciário em tais

    casos, além de gerar o risco político imanente ao amesquinhamento dos

    limites da atividade jurisdicional, menoscaba a certeza de que, em toda

    atividade interpretativa, uma ideia que se concebeu a priori   precisa,

    invariavelmente, ser reconstruída por ocasião da sua aplicação no caso

    concreto.

    É este o grande medo que nos assoma, ante a publicação doenunciado n. 381 da súmula da jurisprudência dominante do STJ.

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    Tememos que tal enunciado produza interpretações açodadas,

    superficiais, cômodas, com desprezo ao “ônus da argumentação jurídica”,

    anunciado por ALEXY.

    A prevalência de interpretações desta natureza, além de produzir os

    resultados indesejáveis já apontados, poderia culminar em um desastroso

    retrocesso nas concepções que passaram a nortear a teoria do contrato,

    mormente após a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988.

    Lembremo-nos do teor do enunciado: “Nos contratos bancários, é

    vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas”.

    Ora, se, por um lado, a edição de mais um enunciado de um tribunal

    superior traduz fortalecimento da segurança jurídica, por conta do

    estabelecimento de um parâmetro claro para que se alcance a desejada

    uniformização da jurisprudência, por outro, não podemos olvidar que a

    aplicação do preceito nele contida, segundo as características de cada caso

    posto sob apreciação judicial, demanda um esforço hermenêutico mínimo

    por parte do julgador, para que se não despejem, no mesmo cadinho

     jurisprudencial, situações marcadas pela dessemelhança.

    GERIVALDO NEIVA, em recente texto, faz as seguintes ponderações:

     “Ora, da forma em que foi editada a Súmula, quando o STJ diz que o Juiz

    não pode conhecer de ofício de tais cláusulas, por outras vias, está

    querendo dizer que os bancos podem inserir cláusulas abusivas nos

    contratos, mas o Juiz simplesmente não pode conhecê-las de ofício. Banco

    manda, Juiz obedece! Como diz o jargão de uma comediante da televisão:

    cláusula abusiva? Pooooooode!! Nesta lógica absurda, considerando que as

    cláusulas abusivas são sempre favoráveis aos bancos e desfavoráveis ao

    cliente, o STJ quer que os Juízes sejam benevolentes com os bancos e

    indiferentes com seus clientes. Devem se omitir, mesmo sabendo que esta

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    omissão será favorável ao banco, e não podem agir, mesmo sabendo que

    sua ação poderá corrigir uma ilegalidade” 7.

    E é exatamente para se evitar situações como a prevista pelo aludido

    autor que precisamos nos aprofundar nas bases da justificação do

    entendimento sumulado e, especialmente, estabelecer os limites da sua

    aplicação.

    Neste passo, uma primeira conclusão deve ser, de logo, anunciada:

    desde que sejam respeitados os limites estabelecidos pelo sistema jurídico,

    em especial os previstos no núcleo principiológico da congruência, não

    pode ser vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade de umacláusula, em um contrato bancário.

    Esta é a vontade do sistema jurídico. E não há súmula que tenha o

    poder de contrariá-la.

    Assim, a proibição contida no enunciado somente pode se dirigir a

    hipóteses em que o reconhecimento ex officio  afronte o princípio da

    congruência.

    E é exatamente neste ponto que nos encontramos, de novo, com

    ROBERT ALEXY.

    Se é reconhecidamente indispensável que o jurista desenvolva o

    fundamento discursivo do seu pensamento em bases lógicas, de modo a

    atingir convincentemente o resultado hermenêutico de sua atividade

    cognitiva, sem estabelecer fronteiras entre a dogmática jurídica e os outros

    ramos do conhecimento humano, é igualmente imprescindível que o jurista,

    ao aplicar uma norma que integra um microssistema jurídico, não ignore a

    existência de núcleos principiológicos de outros ramos da ciência do Direito.

    7 http://gerivaldoneiva.blogspot.com/2009/05/sumula-381-do-stj-um-ato-falho.html.

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      Assim, é no Direito Constitucional e no Direito Processual Civil, mais

    precisamente no exame do núcleo principiológico da congruência, que

    devemos buscar as bases necessárias para que seja dada ao enunciado n.

    381 a sua exata interpretação.

    Para tanto, vale lembrar que “existe um poder-dever da autoridade

     jurisdicional de responder ao pedido feito pela parte” 8, sendo-lhe “vedado

    se pronunciar sobre o que não tenha sido objeto do pedido” 9. Igualmente,

    não é permitido ao Poder Judiciário ir “além do pedido formulado,

    concedendo ou deixando de conceder expressamente mais do que tenha

    sido pedido” 10.

    Pronunciamento judicial decisório em que o magistrado deixa de

    responder, na íntegra, ao pedido feito pela parte, em que se manifesta

    sobre o que não tenha sido objeto do pedido ou em que se pronuncia sobre

    matéria além do pedido formulado, é pronunciamento tisnado de vício. A

    depender da situação em que se enquadre, dentre as três acima

    mencionadas, tratar-se-á de uma decisão infra, extra ou ultra petita. E a

    ocorrência de qualquer destas situações “consiste em infração ao princípio

    da congruência do decisum com o pedido” 11.

    Nenhuma dúvida, pois, pode restar de que para que um julgador

    possa conhecer, de ofício, da abusividade de uma cláusula, em um contrato

    bancário, ele somente poderá fazê-lo se o julgamento que resultar do

    fundamento discursivo do seu pensamento não violar o princípio da

    congruência12.

    8ALVIM, Arruda.  Manual de Direito Processual Civil, vol. 2. São Paulo: RT, 2005, p. 552.9 ALVIM, Arruda. Ob. cit., p. 554. 10 ALVIM, Arruda. Ob. cit., p. 557. 11 ALVIM, Arruda. Ob. cit., p. 557. 12 Cuidamos, aqui, da chamada congruência externa objetiva. “A congruência externa  da decisão dizrespeito à necessidade de que ela seja correlacionada, em regra, com os sujeitos envolvidos no processo(congruência subjetiva) e com os elementos objetivos da demanda que lhe deu ensejo e da resposta dodemandado (congruência objetiva). A congruência interna diz respeito aos requisitos para a suainteligência como ato processual. Nesse sentido, a decisão precisa revestir-se dos atributos da clareza,certeza e liquidez” (DIDIER Jr., Fredie. BRAGA, Paula Sarno. OLIVEIRA, Rafael. Curso de DireitoProcessual Civil, vol 2, 4ª edição. Salvador: Editora JusPodivm, 2009, p. 309).

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      Por outras palavras, o julgador deve, sim, conhecer, de ofício, da

    abusividade de cláusulas em contratos bancários, desde que, com isto, não

    profira um julgamento extra ou ultra petita13.

    E aí é de todo indispensável que se realce que a necessidade de que

    o magistrado atue com obediência ao núcleo principiológico da congruência

    está a anos-luz de distância da odiosa aplicação do direito mediante

    perspectiva puramente processual.

    Diferentemente disto, a atenção à congruência entre a demanda

    proposta e o seu julgamento pelo Poder Judiciário é consectário

    irrenunciável do respeito a aspectos basilares de um Estado Democrático deDireito.

    Efetivamente, admitir que o Poder Judiciário possa proferir um

     julgamento a respeito do que não lhe foi pedido ou de modo a conceder

    mais do que foi pedido é permitir que o patrimônio jurídico de uma das

    partes seja invadido sem que a ela tenha sido dada oportunidade de se

    manifestar e de interferir no conteúdo da decisão. É permitir, portanto, que

    a garantia constitucional do contraditório e, por conseguinte, o princípio do

    devido processo legal sejam reduzidos ao nada.

    Proclama-se, atualmente, a necessidade de que os agentes políticos

    do Poder Judiciário tenham uma atuação proativa. Anuncia-se um novo

    tempo, um tempo de ativismo judicial, em que novas posturas do jurista

    frente à Constituição conduziriam ao que se rotula de

    neoconstitucionalismo, com os seus consectários lógicos, dentre eles o

    neocivilismo e o neoprocessualismo (ou formalismo-valorativo).

    Não somos resistentes a que os preceitos decorrentes destes novos

    tempos se instalem.

    13 Observe-se que não há possibilidade lógica de que do conhecimento, de ofício, da abusividade de uma

    cláusula contratual resulte uma decisão infra petita. Por este motivo, apesar de a aplicação do princípioda congruência implicar também a proibição de julgamentos infra petita, nos adstringiremos, nestasreflexões, a tratar das hipóteses de julgamentos extra e ultra petita.

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      Muito pelo contrário!

    O que não é possível, entretanto, é admitir que a desejada

    proatividade do Poder Judiciário resulte por colocar em risco a segurança

     jurídica de quem quer quer seja. Se os preceitos de ordem pública, tais

    como os estabelecidos no Código Civil e no Código de Defesa do

    Consumidor para assegurar a função social da propriedade e dos contratos,

    devem ser vistos com pre-eminência sobre outras normas, eles nunca

    tiveram, não tem e nunca terão força para inumar a garantia constitucional

    do contraditório, a menos que, nesse roldão, seja demolido um dos pilares

    do Estado Democrático de Direito.

    Com a palavra, nesse ponto, HUMBERTO ÁVILA14:

     “O Poder Judiciário não deve assumir, em qualquer matéria, e em

    qualquer intensidade, a prevalência na determinação da solução entre

    conflitos morais porque, num Estado de Direito, vigente numa sociedade

    complexa e plural, deve haver regras gerais destinadas a estabilizar

    conflitos morais e reduzir a incerteza e a arbitrariedade decorrente da sua

    inexistência ou desconsideração, cabendo a sua edição ao Poder Legislativo

    e a sua aplicação, ao Judiciário”.

    Ao lado da violação à garantia constitucional do contraditório, aliás,

    outras agressões ao sistema jurídico são facilmente identificáveis no

    permissivo de que o Poder Judiciário julgue fora ou além do que lhe foi

    pedido. Assim é que, apenas a título de exemplo, restariam também

    feridos o princípio dispositivo e o princípio da inércia da jurisdição.

    Não é, definitivamente, esta a ordem jurídica que se deseja.

    Porém, não se pode confundir este tipo indesejável de atuação do

    Poder Judiciário, com outro, este também marcado pela proatividade.

    14

      Neoconstitucionalismo”: entre a “Ciência do Direito” e o “Direito da Ciência”. Revista Eletrônica deDireito do Estado (REDE), n. 17, jan./fev./março de 2009. Salvador: Instituto Brasileiro de DireitoPúblico. Disponível em www.direitodoestado.com.br/rede.asp ,

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    Todavia, a proatividade que marca este tipo outro de atuação a que

    nos referimos é saudável, hígida, reverente ao Estado Democrático de

    Direito e, por isto mesmo, perfeitamente ajustada ao sistema jurídico.

    E, nessa perspectiva, o julgador deve, sim, aplicar, de ofício,

    preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos no Código

    Civil e no Código de Defesa do Consumidor para assegurar a função

    social da propriedade e dos contratos, ou em observância a outro

    princípio de matriz constitucional, desde que o faça no estritos

    limites do julgamento da lide posta sob sua apreciação.

    Com efeito, segundo norma expressa, contida no Código Civil,nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública,

    tais como os estabelecidos naquele código para assegurar a função social da

    propriedade e dos contratos (art. 2035, parágrafo único15).

    A dicção imperativa “nenhuma convenção prevalecerá” conduz à clara

    conclusão de que o juiz não depende de manifestação alguma para que

    possa reconhecer  a abusividade lesiva ao sistema de princípios

    constitucionais. Todavia, ele somente poderá fazê-lo se, ao conhecer, de

    ofício, da abusividade, a conclusão a que chegar não o conduza a desbordar

    os limites daquilo que lhe foi pedido e que constitui o chamado thema

    decidendum.

    É que se é certo que o magistrado, em regra, não pode conhecer de

    fatos que não tenham sido alegados pelas partes16, não está ele, porém,

    atrelado ao enquadramento normativo que as partes fizerem dos fatos por

    elas alegados.

    Um exemplo tornará mais claro o nosso pensamento.

    15 Art. 2.035. (...)Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os

    estabelecidos por este Código para assegurar a função da propriedade e dos contratos.16 As exceções a esta regra somente podem estar contidas na lei, a exemplo do que se dá com as normasinsculpidas nos arts. 131 e 462 do CPC.

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    Imagine-se, que seja proposta, por um banco, uma demanda, cujo

    pedido esteja voltado para a cobrança do valor resultante da aplicação de

    uma cláusula penal17.

    Ao narrar os fatos, o banco-autor, invocando a qualidade de credor,

    informa que celebrou determinado contrato com o réu, seu cliente, a quem

    imputa a situação de devedor, e que, no mencionado contrato, foi inserido

    um pacto acessório, pelo qual os contratantes fixaram um valor a título de

    indenização para a hipótese de descumprimento culposo da obrigação

    principal. Por considerar que a obrigação principal assumida por seu cliente

    teria sido descumprida, o banco formula o pedido de que seja imposta ao

    devedor a obrigação acessória de pagar o valor constante na referidacláusula.

    O devedor, por sua vez, em defesa, argumenta que o valor cobrado é

    inexigível, em razão de a cláusula penal conter determinado vício

    invalidante.

    Muito bem.

    Ao apreciar o caso, o juiz conclui que o vício apontado pelo réu inexiste.

    O valor cobrado pelo banco, pois, se examinada a situação apenas à luz

    dos argumentos esgrimidos pelo réu, seria exigível.

    Ao lado disto, porém, o magistrado constata que o valor estabelecido a

    título de indenização é abusivo, porque excede o valor da própria obrigação

    principal, o que constitui afronta ao que dispõe o art. 412 do Código Civil18.

    17 Sobre a cláusula penal, um dos autores deste artigo, em obra da qual é coautor, fez o registro de que setrata ela de “... um pacto acessório, pelo qual as partes de um determinado negócio jurídico fixam, previamente, a indenização devida em caso de descumprimento culposo da obrigação principal, dedeterminada cláusula do contrato ou em caso mora. Em outras palavras, a cláusula penal, tambémdenominada pena convencional, tem a precípua função de pré-liquidar danos, em caráter antecipado, parao caso de inadimplemento culposo, absoluto ou relativo, da obrigação” (GAGLIANO, Pablo Stolze.

    PAMPLONA FILHO, Rodolfo.  Novo Curso de Direito Civil, Direito das Obrigações, Saraiva, 6ª ed,2006, pág. 355). 18 Art. 412. O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.

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    Nessa linha, apesar de o art. 41319  do mesmo código nada dizer a

    respeito de a redução judicial do valor previsto na cláusula poder se operar

    de ofício, deverá o juiz fazê-lo, reconhecendo a abusividade do valor

    excedente, independentemente de manifestação do demandado.

    Ao assim atuar, o magistrado permanecerá atrelado aos estritos lindes

    da demanda, sem qualquer afronta ao princípio da congruência.

    Observe-se, neste passo, que a decisão a respeito da questão principal

    (a imposição, ao réu, da obrigação de pagar o valor constante na cláusula

    penal) terá como fundamento o juízo de valor formado pelo magistrado a

    respeito da abusividade da cobrança.

    Ele, o juiz, não decidirá fundamentado na invalidade integral da

    cláusula (que é a tese defendida pelo réu), mas na sua invalidade parcial,

    naquilo em que o valor nela previsto for abusivo, independentemente de

    manifestação do interessado.

    Assim, a resolução da questão da abusividade – que é uma questão a

    ser resolvida incidenter tantum – não exsurgirá do processo como fruto da

    atuação jurisdicional fora dos limites do que foi pedido ao Poder Judiciário,

    mas rigorosamente dentro das fronteiras do que é dado ao julgador

    conhecer ao proferir uma decisão numa determinada causa: o Poder

    Judiciário foi provocado para decidir a respeito da imposição de uma

    obrigação a alguém e sobre ela decidiu20.

    Imagine-se, agora, uma situação inversa, na qual a demanda é

    proposta pelo cliente do banco, que, em situação semelhante à

    anteriormente descrita, comparece em juízo para obter a declaração da

    19 Art. 413. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sidocumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista anatureza e a finalidade do negócio. 20 FREDIE DIDIER JÚNIOR, em editorial publicado em 13 de maio de 2009 no seu site, intitulado Sobreo n. 381 da súmula do STJ (Editorial 63, www.frediedidier.com.br), faz precisas considerações arespeito de aspectos processuais que envolvem o tema, estabelecendo conexão com a norma contida no

     parágrafo único do art. 112 do CPC, que versa sobre a possibilidade de o juiz conhecer de ofício sobre anulidade de cláusula de eleição de foro em contrato de adesão. O aludido editorial é de leituraindispensável para quem pretende formar uma ideia clara a respeito do real alcance do novo enunciado.

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    invalidade de uma cláusula penal. Neste caso, o consumidor dos serviços

    bancários não aguardou que o banco lhe cobrasse. Ele próprio resolveu

    tomar a iniciativa.

    Ao apresentar os seus argumentos, o autor perfilha a linha de

    entendimento segundo a qual o pacto acessório contido no contrato contém

    determinado vício invalidante, pugnando pela sua declaração, para, assim,

    firmar a sua inexigibilidade.

    Se, ao apreciar o caso, o juiz concluir que o vício apontado pelo autor

    inexiste, mas, simultaneamente, constatar que o valor estabelecido a título

    de indenização é abusivo, porque excede o valor da própria obrigaçãoprincipal, deverá promover, ex officio, a redução judicial do valor previsto

    na cláusula, independentemente de manifestação do demandante.

    Ao fazê-lo, o magistrado permanecerá atrelado aos limites que foram

    traçados no pedido formulado pelo autor. Mas não estará sujeito – melhor

    dito, escravizado – a uma manifestação do interessado para que possa

    atuar em respeito a um princípio matricial, como o é, na hipótese dada, o

    da boa-fé objetiva.

    E aí é de todo adequado analisar, agora, ambas as situações sob a ótica

    da garantia constitucional do contraditório.

    No primeiro caso, o banco, na qualidade de autor, viu o Poder

    Judiciário se pronunciar, ex officio, sobre uma questão incidental e, com

    base no seu entendimento, decidir o que lhe foi pedido. E isto – nenhuma

    dúvida pode restar a respeito – o julgador pode, sim, fazer.

    Inaplicável é, pois, num caso como este, o enunciado n. 381 da súmula

    do STJ.

    Na segunda hipótese, o banco réu, por ocasião da citação, tomou

    conhecimento de que o pedido do autor estava voltado para a declaração dainvalidade de determinada cláusula. Ao lado disto, a ele, réu, não é dado

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    ignorar que o sistema jurídico, máxime no que toca à existência de

    preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos no Código Civil e no

    Código de Defesa do Consumidor para assegurar a função social da

    propriedade e dos contratos, bem como a boa-fé objetiva, permite que o

    magistrado conheça de ofício de abusividades. Assim, cabia ao réu, em

    obediência à norma contida no art. 300 do CPC21, defender, sob todos os

    aspectos jurídicos – e não apenas quanto aos aspectos que foram objeto de

    abordagem pelo autor – a validade da cláusula.

    Destarte, quanto à incolumidade, em ambos os casos concretos

    imaginados, da garantia constitucional do contraditório, restará ela mantida,

    na íntegra, uma vez que o magistrado, em nenhum dos casos, ao decidir,teria desbordado os limites da lide posta para a sua apreciação.

    Não é por outro motivo que continua a merecer loa o enunciado n. 356

    da IV Jornada de Direito Civil, segundo o qual nas hipóteses previstas no

    art. 413 do Código Civil, o juiz deverá, de ofício, reduzir a cláusula penal.

    Observe, porém, caro leitor: à vista dos pedidos concretamente

    formulados nos casos propostos, não poderia o magistrado, por exemplo,

    conhecer de ofício da abusividade do índice de correção monetária escolhido

    pelas partes para incidir sobre o valor da obrigação principal, pois tal tema

    desborda os limites do objeto litigioso do processo.

    Por tudo isto, o que se conclui é que, em nosso sentir, o STJ não

    pretendeu, com a súmula n. 381, impedir, em termos absolutos, a atuação

     judicial espontânea diante de cláusulas consideradas abusivas, pois, se

    assim fosse, estaria aquele tribunal mandando às favas, não apenas a

    própria principiologia constitucional, mas também o Código Civil (arts. 421 e

    422) e o Código de Defesa do Consumidor (art. 51).

    Não é isso.

    21 Art. 300. Compete ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato ede direito, com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir.

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    A pretensão, com toda a certeza, é a de ajustar a atuação jurisdicional

    aos limites processuais do thema decidendum, para evitar aquele “ativismo

     judicial” indesejável a que nos referimos.

    Aliás, uma leitura atenta do julgamento do REsp n. 1.061.530/RS – que

    foi o recurso admitido, nos termos do art. 543-C do CPC, como

    representativo da controvérsia – traz um valoroso contributo para o

    entendimento das razões que conduziram o STJ a publicar o enunciado n.

    381.

    No julgamento, restou claro que a preocupação daquela corte superioresteve voltada para impedir que a atuação ex officio  do Poder Judiciário

    resulte em violação ao núcleo principiológico da congruência.

    Na sua redação, entretanto, o enunciado disse mais do que poderia ser

    dito. Por isto, a sua construção redacional merece revisão, a fim de que

    não sirva de base – ou de desculpa – para justificar decisões injustas,

    calcadas em interpretação superficial ou açodada.

    Nessa ordem de idéias, conclamamos você, amigo leitor, a adotar,

    diante desse novo e importante enunciado, uma postura crítica e

    inteligente, a fim de que não se reverbere a falsa idéia de que, a partir de

    sua edição, os juízes se converteram em meros repetidores de normas,

    dependentes sempre de provocação das partes, mesmo em temas de índole

    constitucional, num inegável revival da interpretação exegética dos

    primórdios do Código Francês.

    (17 de março de 2009. Artigo. Professores Pablo Stolze e Salomão Viana.)

    8. Fique por Dentro

    Acompanhe as importantes informações abaixo, provenientes do

    Superior Tribunal de Justiça.

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    Mãe ganha direito de pedir em nome próprio alimentos em favor defilhos

    22/10/2009

    É possível à mãe pedir, em nome próprio, alimentos em favor de filhos

    menores. A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça(STJ) e foi tomada em um recurso apresentado pelo pai das crianças. Adefesa dele sustentava, entre outras questões, ilegitimidade da mãe paraagir em nome dos filhos. A discussão judicial começou em uma ação dedissolução de união estável, cumulada com partilha de bens e fixação dealimentos. O pedido foi julgado parcialmente procedente pela justiça deorigem.

    Segundo a decisão da Terceira Turma do STJ, é realmente dos filhos alegitimidade ativa para propor ação de alimentos, devendo os paisrepresentá-los ou assisti-los conforme a idade. Contudo, a formulação do

    pedido em nome da mãe não anula o processo, apesar da má-técnicaprocessual, pois está claro que o valor se destina à manutenção da família. “O pedido está claramente formulado em favor dos filhos”, assinalou arelatora do processo, ministra Nancy Andrighi. “E esse entendimento trazcomo suporte o interesse público familiar que está na obrigação de prestaralimentos”.

    O dever de sustento, guarda e educação dos filhos, de acordo com a Turmaé, em princípio, de ambos os cônjuges, e vem sendo cumprido de maneiradireta pela mãe dos menores a quem coube a guarda após a dissolução daunião estável.“Naturalmente o direito aos alimentos, reconhecido pelo

    acórdão não é titularizado pela mãe, mas por cada um dos filhos a quem elarepresentou e, assim, eventual execução decorrente do seu inadimplementodeverá ser movida pelo titular, ou seja, por cada um dos seus filhospessoalmente”, prosseguiu a ministra.

    A Terceira Turma reiterou que a maioridade do filho menor atingida nocurso do processo não altera a legitimidade ativa para propor a ação, aindamais quando a jurisprudência do STJ impossibilita a exoneração automáticado alimentante por ocasião da maioridade do filho. “Para que a exoneraçãose configure é necessária a propositura de ação específica com esse fim, ouao menos abertura do contraditório para a discussão específica da matériana ação de alimentos”, esclareceu a relatora. A circunstância isolada damaioridade, para a Turma, não justifica anulação do julgado.

    Fonte:

    http://www.stj.jus.br/portal_stj/objeto/texto/impressao.wsp?tmp.estilo=&t

    mp.area=398&tmp.texto=94325 acessado em 25 de outubro de 2009.

    Estágio probatório dos servidores públicos é de três anos

    Depois de algumas idas e vindas legislativas, a Terceira Seção do Superior

    Tribunal de Justiça (STJ) definiu: com a Emenda Constitucional (EC) n.19/1998, o prazo do estágio probatório dos servidores públicos é de três

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    anos. A mudança no texto do artigo 41 da Constituição Federal instituiu o

    prazo de três anos para o alcance da estabilidade, o que, no entender dos

    ministros, não pode ser dissociado do período de estágio probatório.

    O novo posicionamento, unânime, baseou-se em voto do ministro Felix

    Fischer, relator do mandado de segurança que rediscutiu a questão no STJ.

    O ministro Fischer verificou que a alteração do prazo para a aquisição da

    estabilidade repercutiu sim no prazo do estágio probatório. Isso porque esse

    período seria a sede apropriada para avaliar a viabilidade ou não da

    estabilização do servidor público mediante critérios de aptidão, eficiência e

    capacidade, verificáveis no efetivo exercício do cargo. Além disso, a própria

    EC n. 19/98 confirma tal entendimento, na medida em que, no seu artigo28, assegurou o prazo de dois anos para aquisição de estabilidade aos

    servidores que, à época da promulgação, estavam em estágio probatório.

    De acordo com o ministro, a ressalva seria desnecessária caso não

    houvesse conexão entre os institutos da estabilidade e do estágio

    probatório.

    Não só magistrados como doutrinadores debateram intensamente os efeitos

    do alargamento do período de aquisição da estabilidade em face do prazo

    de duração do estágio probatório fixado no artigo 20 da Lei n. 8.112/90.

    Conforme destacou o ministro Fischer, o correto é que, por

    incompatibilidade, esse dispositivo legal (bem como o de outros estatutos

    infraconstitucionais de servidores públicos que fixem prazo inferior para o

    intervalo do estágio probatório) não foi recepcionado pela nova redação do

    texto constitucional. Desse modo, a duração do estágio probatório deve

    observar o período de 36 meses de efetivo exercício.

    Promoção

    O caso analisado pela Terceira Seção é um mandado de segurança

    apresentado por uma procuradora federal. Na carreira desde 2000, ela

    pretendia ser incluída em listas de promoção e progressão retroativas aos

    exercícios de 2001 e 2002, antes, pois, de transcorridos os três anos deefetivo exercício no cargo público.

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    Inicialmente, apresentou pedido administrativo, mas não obteve sucesso.

    Para a administração, ela não teria cumprido os três anos de efetivo

    exercício e, “durante o estágio probatório, seria vedada a progressão e

    promoção” nos termos da Portaria n. 468/05 da Procuradoria-Geral Federal,

    que regulamentou o processo de elaboração e edição das listas de

    procuradores habilitados à evolução funcional.

    A procuradora ingressou com mandado de segurança contra o ato do

    advogado-geral da União, cujo processo e julgamento é, originariamente,

    de competência do STJ (artigo 105, III, b, CF). Argumentou que estágio

    probatório e estabilidade seriam institutos jurídicos distintos cujos períodosnão se vinculariam, razão pela qual teria direito à promoção.

    Nesse ponto, o ministro Fischer destacou que, havendo autorização legal, o

    servidor público pode avançar no seu quadro de carreira,

    independentemente de se encontrar em estágio probatório.

    Ocorre que essa não é a situação da hipótese analisada, já que a Portaria

    PGF n. 468/05 restringiu a elaboração e edição de listas de promoção e

    progressão aos procuradores federais que houvessem findado o estágio

    probatório entre 1º de julho de 2000 e 30 de junho de 2002. Em conclusão,

    o mandado de segurança foi negado pela Terceira Seção.

    Processos: MS 12523

    Fonte:

    http://www.stj.gov.br/portal_stj/objeto/texto/impressao.wsp?tmp.estilo=&tmp.area=398&tmp.texto=91739 (acessado em 26 de abril de 2009)

    DECISÃO

    Indenização por tortura durante regime militar pode ser pedida a

    qualquer tempo 

    As ações de indenização por danos derivados de atos de tortura ocorridos

    durante o Regime Militar são imprescritíveis. A Segunda Turma do Superior

    Tribunal de Justiça (STJ) reiterou o entendimento já consolidado de que, emcasos em que se busca a defesa de direitos fundamentais, indenização por

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    danos morais decorrentes de atos de tortura por motivo político ou de

    qualquer outra espécie, não há que prevalecer a prescrição de cinco anos

    (qüinqüenal).

    Dois recursos da União tentavam reverter decisão individual do relator,

    ministro Mauro Campbell Marques, que reconhecia a imprescritibilidade dos

    danos morais advindos de tortura no regime militar. A União tentava fazer

    valer o prazo prescricional de cinco anos previsto no Decreto n. 20.910/32.

    Também se alegava que a decisão não levava em consideração o que

    afirma a súmula vinculante n. 10 do Supremo Tribunal Federal (STF),

    segundo a qual: "Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) adecisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare

    expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder

    Público, afasta a sua incidência no todo ou em parte."

    O relator, ao apreciar os recursos especiais da União, já havia considerado

    que o STJ tem reiteradas decisões reconhecendo o direito à indenização por

    danos morais sofridos pelas prisões e torturas advindas das perseguições

    políticas perpetradas durante o regime militar. Ele reconheceu não somente

    o dever de indenizar, mas o fato de que tais ações poderiam ser ajuizadas a

    qualquer tempo, ou seja, são imprescritíveis.

    Ao levar os novos recursos da União à apreciação dos demais ministros que

    integram a Segunda Turma, confirmou-se o entendimento do ministro

    Mauro Campbell de que a ofensa a direitos fundamentais não se subsume

    aos prazos prescricionais do Decreto n. 20.910/32 e do Código Civil.

    Quanto à alegada violação à cláusula constitucional de reserva de plenário,

    a Turma entendeu que, nas palavras do Ministro Relator, a “suposta

    malversação do artigo 97 da Constituição Federal de 1988 deve ser

    apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, sendo o recurso especial via

    inadequada para suscitá-la” e que “para fins de interposição de recurso

    especial, o conceito de "lei federal" não abrange as súmulas, sejam

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    vinculantes ou não, especialmente quando a decisão do Tribunal de origem

    é anterior à edição do verbete considerado violado”.

    Fonte:

    http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tm

    p.texto=89643 (acessado em 20 de outubro de 2008)

    Veja, ainda, recentes súmulas aprovadas:

    SÚMULAS

    Súmula expande a proteção dada ao bem de família a pessoas

    solteiras, separadas e viúvas 

    Nova súmula, a de número 364, aprovada pela Corte Especial amplia oscasos em que se pode usar a proteção do Bem de Família. Criado pela Lei

    Nº 8.009 de 1990, o Bem de Família é definido como o imóvel residencial

    do casal ou unidade familiar que se torna impenhorável para pagamento de

    dívida.

    O projeto 740, que deu origem à nova súmula, foi relatado pela ministra

    Eliana Calmon e estendeu a proteção contra a penhora para imóveis

    pertencentes a solteiros, viúvos ou descasados. Entre os precedentes da

    súmula 364 estão os Recursos Especiais (Resp) 139.012, 450.989, 57.606 e

    159.851.

    O Resp 139.012, o relator, ministro Ari Pargendler considerou que o imóvel

    de uma pessoa ainda solteira no momento em que a ação de cobrança foi

    proposta e que veio a casar-se depois era protegido contra a penhora. O

    ministro considerou que no momento da penhora já haveria uma unidadefamiliar no imóvel, justamente o alvo da proteção do Bem de Família.

    Já em outro recurso, o 450989, o ministro aposentado Humberto Gomes de

    Barros destaca que a Lei Nº 8.009 não visa apenas à proteção da entidade

    familiar, mas de um direito inerente à pessoa humana: o direito a moradia.

    Nesse processo, uma pessoa residia sozinha no imóvel, não tendo sido

    considerada protegida pela 8.009. No entendimento do ministro relator,

    entretanto, a proteção deve ser estendida para esses casos.

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    Segundo a súmula 364, “O conceito de impenhorabilidade de bem de família

    abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e

    viúvas” .

    Fonte:

    http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tm

    p.texto=89622 (acessado em 20 de outubro de 2008)

    SÚMULAS

    Enunciado define competência para julgar cobrança de honorários

    de profissionais liberais 

    A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou o Projeto

    695, que criou a súmula 363. A nova súmula, relatada pelo ministro Ari

    Pargendler, vai resolver diversos conflitos de competência entre tribunais

    em julgamentos de cobrança de honorários de profissionais liberais. O novo

    enunciado define que a competência para processar e julgar ação de

    cobrança de profissionais liberais contra clientes é da Justiça Estadual.

    Entre os vários precedentes legais utilizados estão os CC 52.719-SP,

    65.575-MG, 93.055-MG e 15.566-RJ. No conflito originário do Rio de

    Janeiro, o relator, o ministro aposentado Sálvio de Figueiredo, decidiu que o

    pagamento pela prestação de serviços por pessoas físicas não se confunde

    com verbas trabalhistas definidas na Consolidação das Leis do Trabalho

    (CLT). Portanto não poderiam ser julgadas pela Justiça trabalhista e sim

    pela Justiça comum.

    Já no Conflito 52719, tratou-se de ação trabalhista originada de serviços

     jurídicos prestados à Caixa Econômica Federal por terceiros. A ministra

    Denise Arruda, relatora da ação, aponta que, apesar da Emenda

    Constitucional (EC) 45 de 2004 tenha passado para a justiça laboral a

    competência para julgar as ações relações trabalhistas de entes públicos de

    direito e da administração pública, isso não incluiria ações com natureza

    exclusivamente civil.

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    É o seguinte o enunciado da súmula 363: Compete à Justiça estadual

    processar e julgar a ação de cobrança ajuizada por profissional liberal

    contra cliente.

    Fonte:http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tm

    p.texto=89621 (acessado em 20 de outubro de 2008)

    SÚMULAS

    Nova Súmula do STJ define: dano moral deve ser corrigido a partir

    do arbitramento 

    A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou uma novasúmula. A súmula 362, originada pelo projeto 775, relatado pelo ministro

    Fernando Gonçalves, tem o seguinte texto: “A correção monetária do valor

    da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento”.

    Entre os precedentes do novo resumo de entendimentos do Tribunal estão

    os recursos especiais (Resp) 657.026, 743.075 e o 974.965. No julgamento

    do REsp 675.026, o relator, ministro Teori Albino Zavascki, aponta que o

    reajuste em indenizações por dano moral deve ser da data em que o valor

    foi definido na sentença e não na data em que a ação foi proposta. Para o

    ministro a última hipótese seria corrigir o que já havia sido corrigido

    anteriormente.

    A nova súmula faz uma exceção à regra da súmula 43, que define que nas

    indenizações de modo geral a correção da indenização deve contar da data

    do efeito danoso. Apenas no caso indenização por dano moral, a correção sedá a partir da data do arbitramento.

    Fonte:

    http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tm

    p.texto=89620 (acessado em 20 de outubro de 2008)

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    9. Bibliografia Básica

    Novo Curso de Direito Civil – Obrigações – vol. II, PABLO STOLZE GAGLIANO e

    RODOLFO PAMPLONA FILHO, (Saraiva) www.saraivajur.com.br   ou

    www.editorajuspodivm.com.br

    10. Mensagem 

    Deus fique na sua companhia!

    E lembre-se: Fé acima de tudo!

    Paz e luz!

    Um abraço!

    O amigo, Pablo.

    Revisado.Ok.2009.2 C.D.S.