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X-V^P % BOLETIM INFORMATIVO DO GTME N 0 41 DEZEMBRO 92 /// XW/y XV. o CO - DIALOGO - INDIFERENÇA - ARIDEZ CRIATIVIDADE - NEGAÇÃO - AFIRMAÇÃO. s

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X-V^P %

BOLETIM INFORMATIVO DO GTME N041 DEZEMBRO 92 /// XW/y XV.

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CO - DIALOGO - INDIFERENÇA - ARIDEZ

CRIATIVIDADE - NEGAÇÃO - AFIRMAÇÃO. s

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TUPARI DEZEMBRO/92 Foto Otávio Velho

Ecologia e a reciclagem do cristianismo Na arte religiosa asiática, o círculo é tão predo-

minante como o crucifixo na Europa ocidental. Os monges budistas tibetanos fazem mandala de areia para realçar sua visualização do sagrado. O sereno Buda ou os bodhisattvas são retratados em imagens de círculos e círculos concêntricos para simbolizar paz interior, graça e perfeição. A mitologia e a arte religiosa hindus vivamente representam o símbolo poderoso da reencarnação para intitular o sofrimento e a fínitude humana. As pessoas que vivem ligadas ao campo sempre descrevem o movimento da lua e das estrelas num caminho cíclico.

A imagem do círculo é também importante para as mulheres em ambos os aspectos, simbólicos e bio- lógico. Os corpos das mulheres seguem ciclos perió- dicos com significativas mudanças hormonais e psi- cológicas. Mais sintonizadas aos ciclos das estações, as mulheres desde tempos imemoriais dispõem o cír- culo em grupos de espiritualidade, aprendem a dan- çar o círculo de Sara ou de Hagar para expressar sua solidariedade e criar círculos de irmandade para o companheirismo.

Desde o Iluminismo, o cristianismo ocidental tem entendido o tempo e a história numa maneira linear e progressiva. O mito de Prometeu foi reforçado pelo desenvolvimento na ciência e tecnologia. Mas os cristãos com uma consciência ecológica começam a questionar as pressuposições do Iluminismo e as pro- messas da tecnologia. Eles têm redescoberto a reci- clagem como um significativo tema ecológico e espi- ritual.

As pessoas asiáticas, as mulheres do mundo intei- ro e os cristões conscientes subitamente acham uma linguagem comum quando conversam sobre o sagra- do e o processo natural: círculos, ciclos e recicla- gem.

O controle tecnológico, um modelo de desenvol- vimento orientado em direção ao mundo ocidental e o patriarcado formam uma "Trindade profana", domi- nando as vidas das mulheres marginalizadas. Num encontro em Nairobi em 1992, participantes da Asso- ciação Ecumênica dos Teólogos do Terceiro Mundo condenaram as estruturas patriarcais que desumani- zam as mulheres, a negação dos direitos e da liberda- de política e econômica das mulheres e todas as for- mas de violência feitas ao sexo feminino. Tais opres- sões são freqüentemente desculpadas e reforçadas pelas religiões patriarcais, pela expressão e lingua- gem androcêntricas e pela interpretação masculina dos clássicos e das escrituras. A filósofa feminista Mary Daly argumenta que as mulheres devem falar de "gin-ecologia", um ambiente que é sadio para o crescimento e o bem-estar das mulheres. A reciclagem do cristianismo

A crise ecológica e a degradação das mulheres nos desafiam a refletir se o cristianismo tem promo- vido interligação, mutualidade e eco-justiça. Muitos cristãos conscientes ecologicamente estão a par de que um sistema religioso antropocêntrico, hierárqui- co e patriarcal é parte do problema e não parte da so- lução. Algumas de nossas tradicionais crenças cristãs necessitam passar por um processo de reciclagem pa- ra que possam ser reapropriadas pelo mundo contem- porâneo. A idéia de reciclagem não é nova na nossa tradição, porque seu significado é antecipado pelos temas religiosos de conversão, metanoia e até mes- mo ressurreição.

De um modelo hierárquico a um modelo ecoló- gico. Teólogas feministas há muito têm salientado que o entendimento dualista e hierárquico de Deus e do mundo é a raiz do problema do cristianismo oci- dental. A hierarquia do ser coloca Deus infinitamente acima dos seres humanos e os seres humanos acima da natureza; uma visão-de-mundo dualista separa a mente do corpo, o masculino do feminino e os huma- nos do mundo não humano. O valor de um indivíduo ou objeto natural depende da posição ocupada na hie- rarquia ao invés de sua ou seu valor intrínseco e dig- nidade. Um modelo ecológico não projeta Deus lon- ge do mundo e acima dos seres humanos. Deus-seres humanos-natureza são interdependentes e interrela- cionados, assim como os três indicadores interligados

do sinal de reciclagem. A percepção dualista do mun- do deve abrir caminho a um entendimento correlativo e integral, assim como cada ponto no círculo é rela- cionado com o centro e um ao outro. Um modelo ecológico valoriza a diversidade na biosfera e respei- ta a multiplicidade em termos de raça, gênero e orientação sexual.

Do antropocentrismo ao bio-centrismo: O cristia- nismo coloca os seres humanos no centro do univer- so. Toda a criação foi realizada para o benefício dos seres humanos, que são para dominar sobre os pei- xes, os pássaros e todas as coisas viventes sobre a terra.

A criação foi condenada e amaldiçoada como re- sultado da pecaminosidade humana. Mas pela graça de Deus, aos seres humanos é oferecida a possibili- dade de salvação. Eles, em troca, podem salvar o planeta assumindo o responsabilidade como filhos e filhas de Deus.

Uma maneira contrária de entender o mundo é contando a história da terra e da biosfera. Como Thomas Berry salienta, o planeta terra veio a existir aproximadamente há dez bilhões de anos atrás e a vi- da apareceu sete bilhões de anos mais tarde. As plan- tas apareceram aproximadamente há seiscentos mi- lhões de anos e os animais chegaram um pouco de- pois. A consciência humana somente surgiu aproximadamente há dois milhões de anos. A biosfe- ra existia bem antes de nós e sua complexidade so- mente começou a ser entendida pelos biólogos no sé- culo 20. É arrogante de nossa parte pensar que a ter- ra existe somente para nosso controle e que a salvação da galáxia vasta e em expansão dependeria somente de cinco bilhões de seres humanos.

O antropocentrismo ocidental criou um Deus de acordo com a imagem dos seres humanos: Deus é rei, pai, juiz supremo e guerreiro. Deus é o Senhor da história, intervindo nos eventos humanos. Ao con- trário, o povo oriental e os povos indígenas, que são ligados ao solo, imaginam o divino, o Tao, como si- lencioso e não-intrusivo. eles falam da terra com res- peito e reverência como a mãe que está sustentando e confirmando a vida. A substituição de antropocen- trismo por bio-centrismo necessita de uma mudança de nossa maneira de pensar e falar sobre Deus, De uma espiritualidade passiva a uma espirituali- dade apaixonada:

A busca por uma espiritualidade adequada se tor- na urgente de modo crescente em nossa crise ecológi- cai No passado, a espiritualidade era vista como si- nônimo de asceticismo, disciplina espiritual, medita- ção, oração e as buscas de outro mundo. De acordo com uma visão-de-mundo dualista, o espírito é contra o corpo, a emoção e o apetite. Hoje, nós devemos começar a falar de uma espiritualidade integral biofí- lica e incorporada. Ao invés de ser passiva e sem emoção, esta nova espiritualidade deve ser apaixona- da, erótica, falseando como fogo. Ela deve nos levar a amar com toda a nossa capacidade, procurar obter justiça em nossos relacionamentos e caminhar humil- demente com Deus e com a mãe terra. Ela deve des- pertar admiração e respeito em nós quando vemos a estrela cadente, as folhas do outono e o orvalho da manhã.

Esta espiritualidade apaixonada tem que nos ca- pacitar a trabalhar pela paz. Paz não é uma situação

sem guerras ou conflitos, mas é harmonia, bem-estar e felicidade por causa de um relacionamento íntegro. Paz não é uma espera passiva por políticos e estrate- gistas para executar uma solução para nós, mas uma ação apaixonada em nossas comunidades locais para capacitar os sem poder, para fortalecer o fraco e res- taurar o que foi feito de errado. Uma nova solidariedade nos anos noventa

O desafio para as igrejas dos anos noventa é alar- gar nossa visão e intensificar nosso compromisso de trabalhar pela integridade da criação, justiça e paz. Quando o movimento ecumênico primeiramente co- meçou, a visão era promover unidade da igreja para executar o testemunho e a missão. Nos anos 70, as pessoas de outras crenças foram incluídas no diálogo religioso como um passo favorável à construção de uma comunidade humana mais ampla. Em nossa épo- ca presente, o movimento ecumênico tem que mudar de uma solidariedade eclesial para uma solidariedade ecológica.

A palavra "solidariedade" originou-se na tradi- ção legal francesa, referindo-se ao vínculo natural de pessoas da mesma origem. Mais tarde, este termo foi usado pelo Movimento dos Trabalhadores Cristãos, como foi entendido por Marx: a auto-organização dos oprimidos. Tem havido uma forte tradição de justiça em seu uso na Europa. No entanto, as pessoas na Ásia entendem "solidariedade" um pouco dife- rentemente. Solidariedade em chinês significa juntar- se a um e ligar um ao outro. Na língua da Indonésia, o termo significa juntar-se um ao outro em um círcu- lo. O uso nas linguagens orientais estimula a cons- ciência ecológica de interligação de todas as coisas.

Solidariedade ecológica é assumir responsabilida- de mútua ao invés de achar bodes expiatórios e criar novas vítimas. Os povos indígenas têm dito por sécu- los, que a tomada de sua terra rouba-lhes não somen- te os meios de existência, mas o significado da vida. Nosso mundo não seria mais seguro se o teste de ex- plosivos nucleares, a descarga de lixos radioativos e o (ísioque de armas nucleares fossem feitos longe da Europa e dos Estados Unidos, no Pacífico. Nossas cidades não seriam menos perigosas se somente o li- xo tóxico fosse descarregado na nação Osage em Oklahoma ou M Reserva Rosebud dos Sioux em Soüth Dakota. Nossas vidas não seriam enriquecidas se nós somente pedíssemos à próxima geração para pagar nossas dívidas é serem responsáveis pela con- fusão que nós criamos. Nós somos parte um do outro e â falha de um sistema ecológico afeta todos os ou- tros.. ■

A solidariedade ecológica é nosso pacto com a ter- ra, o oceano, a floresta, os rios e as montanhas. Sem os montes, para onde mais poderemos elevar os nos- sos olhos para pedir socorro (Salmo 121:1)? Sem as árvores do campo, quem baterá palmas quando nós sairmos com alegria e formos conduzidos em paz (Isaías 55:12)? Se/nós colocarmos veneno no Mar Vermelho, até mesmo Deus não seria capaz de reali- zar milagres poderosos. Nosso pacto com a natureza não é baseado no temor e ansiedade porque a nature- za está seriamente poluída e seus recursos são limita- dos. Nós precisamos renovar nosso pacto com o pla- neta terra, a ser feito de alegria, celebração e grati- dão porque nós somos parte da natureza e do processo natural.

Trechos da palestra de KWOK PUI-LAN, teólo- ga anglicana de Hong Kong, na Conferência do CMI, durante a Eco-92. • Traduzido por Raquel Batista da Silva.

EXPEDIENTE O Tupari é o informativo trimestral do Grupo de Trabalho Missionário Evangélico GTME. Está destinado a velcula- ção Interna de informações sobre os povos indígenas e os trabalhos missionários de solidariedade. Avenida dos Trabalhadores, 3.419 - Bairro Carumbé Caixa Postal 642 78.005-970 - Cuiabá-MT ■ Brasil Fax/Telefone: (065) 322-7476 Equipe de Redação: Arlindo Leite, Jaider Batista da Silva Rubens Seibel e Villi Fritz Seilert. Oiagramação/paginação: Cláudio Castro Composição, Fotolito e Impressão: Central Gráfica e Editora Centro Oeste Ltda Rua Cursino do Amarante, 881 - Fone 321-3215 - Cuiabá-MT

...Este boletim é elaborado a par- tir das contribuições de amigos e amigas dos povos indígenas, que enviam, de todas as partes do País, textos, notícias, poemas, in- formações, críticas e sugestões.

A todos/ as somos muito agra- decidos.

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DEZEMBRO/92 TUPARI Marcos Imbrizl

Sao Miguel das Missões, RS

Era uma vez um czar naturalista que caçava homens. Quando lhe disseram que também se caçavam borboletas e andorinhas, ele ficou muito espantado e achou uma barbaridade.

Carlos Drumond de Andrade

"Uma sociedade que agrava de tal modo suas contradições erh nome da defesa dos privilégios de suas elites, prisioneira da lógica do capital, condena à destrui- ção e à morte os povos indígenas. Em nome dessa lógica, os povos indígenas da América Latina têm seus territórios invadidos, as riquezas naturais saqueadas por poderosos grupos nacionais e transnacionais. Em nome da lógica do desenvolvi- mento capitalista, os territórios indígenas são inundados por hidrelétricas, invadi- dos por empresas madeireiras, farmacêuticas e mineradoras. Esses projetos des- truidores transformam as populações locais em "refugiados do desenvolvimen- to", forçados a migrar para os centros urbanos. Somam-se a isso a invasão cultural, a destruição de seus valores pelas seitas fundamentalistas. Depois de rou- bar a sua terra, submeter seu corpo à exploração assalariada, tentam matar sua al- ma."

Denúncia da situação dos povos indígenas na Conferência Internacional: Terra, Ecologia e Direitos Humanos realizada de 24 a 28 de maio de 1992 em Vitória (ES). Consta no documento final Em Defesa da Vida e dos Povos.

O Planeta é uma grande canoa Enquanto as manchetes de nossos jornais e revistas chamavam a aten- ção de todos para o "Caso Paia- kan", passou despercebido (ou foi deliberadamente ignorado?) o pro- nunciamento de Marcos Terena, no dia 10 de junho, na Conferência da ONU sobre Meio Ambiente er De- senvolvimento — a ECO-92. Único brasileiro a falar na Conferência, afora o governo, teve suas palavras em destaque nos grandes jornais do hemisfério norte, que atestavam te- rem sido essas palavras ouvidas com "profunda reverência" pelos líderes mundiais. Publicamos a se- guir trechos do pronunciamento.

Durante esses 500 anos que se comemoram neste ano de 92, os Povos Indígenas sempre procura-

ram falar, gritar, dizer os seus problemas, mas infe- lizmente os ouvidos do mundo nunca estavam escu- tando o que queríamos dizer.

Mas a história da humanidade, a história do mun- do, do mundo moderno, dos povos do século XXI, está mostrando através da máquina que alguma coisa está errada com o chamado "desenvolvimento".

Por isso, vocês vieram ao Rio de Janeiro, dos mais diversos lugares, para falar, para discutir o que fazer com o Planeta Terra.

E nós, os índios do mundo, nós não tínhamos on- de falar, onde conversar, onde sermos escutados. En- tão, tratamos de criar um espaço próprio, segundo a nossa tecnologia, a nossa sabedoria, a nossa ciência e arquitetura. E criamos uma aldeia indígena aqui no Rio de Janeiro. Mas, quando nós pensamos em fazer isso, muitas pessoas que se consideram "especialis- tas em índios", começaram a dizer: Vocês estão fa- zendo folclore para agradar a ONU.

Negativo! Esse templo da sabedoria milenar, esse código de vida que nenhum cientista conseguiu des- cobrir e que está com os Povos Indígenas, é aquilo que vocês estão procurando aqui dentro.

Será que o mundo moderno está preparado prá escutar o que nós queremos dizer, depois de 500 anos de um silêncio imposto pela Colonização e pela catequese?

Por isso, nós também viemos aqui para o Rio de Janeiro, nessa Aldeia KARI-OCA...

A gente procurou escrever no papel a nossa filo- sofia, o nosso pensamento...

Porque nós somos conhecedores da natureza. Nós praticamos o desenvolvimento sustentado e isso para nós sempre foi uma coisa do dia a dia e não uma vida alternativa, como o chamam...

Então, a gente pergunta: O que significa viver? Quando a Primeira-Ministra da Noruega diz, va-

mos assegurar o nosso futuro comum! O que vocês querem dizer como isso?

Não se pode gastar milhões e milhões de dólares

para se fazer uma grande Conferência dessa e não es- cutar o que a Terra tem prá dizer.

A natureza está sendo destruída a cada momento. Cada jato que cruza o Atlântico, está destruindo a na- tureza. Cada pesquisa atômica ou nuclear no Pacífi- co, nos oceanos, está destruindo a natureza. Cada vez que se desembolsa dinheiro para pesquisar, em nome da paz, novas armas de guerra, está se destru- indo a natureza. Está destruindo a sua própria vida e não só a vida do índio.

Por isso que nós ficamos pensando: Temos 5, 7 minutos para falar depois de 500 anos de silêncio. Mas, será que a gente vai ser escutado pelas pessoas? Como gente, como pessoas?

O planeta é uma grande canoa, é um grande bar- co onde tem negro, tem índio, tem branco. Porque quando o pulmão de vocês não agüentar mais respi- rar esse ar... O pulmão, o corpo de vocês vai ficar doente e o nosso também.

E, quando não tiver mais água para beber... E, quando vocês não puderem mais matar a sede com as águas dos rios, das florestas, o que vocês vão fazer? Talvez vocês inventem uma pílula para matar a sede, mas, ela nunca vai ser saborosa como as águas que bebemos das florestas.

Nós temos a Biodiversidade, por isso lutamos pe- la demarcação de nossas terras. Por que, atrás da luta territorial, está o patrimônio da sobrevivência, estão os remédios que a natureza nos dá. Está a comida que a natureza nos dá.

Quantas vezes eu fiquei encabulado quando via países pequenos, os chamados de Terceiro Mundo, correndo atrás dos representantes do Primeiro Mun- do, para pedir dinheiro. Isso não é Dignidade. Que- remos tratamento sério como Povos Indígenas. Um dia quem sabe, nós vamos ter assento aqui dentro, quando a cabeça do homem branco se abrir e com- preender que nós não somos ameaça à Civilização de vocês, pelo contrário, sempre fomos ameçados até extinguirem muitas de nossas nações indígenas.

Aqui no Rio de Janeiro, nós procuramos mostrar também que não estamos fazendo discursos, retóri- cas. Nós temos valores que gostaríamos de influen- ciar na vida de quem mora na cidade. Vocês falam em transferência de tecnologia. O que pode ser isso para vocês? O que significa "desenvolvimento" para vocês?

Quando eu saí de minha aldeia e cheguei na cida- de, fui considerado um menino pobre e eu não sabia o que era pobreza. Eu não sabia o que era ser rico. Porque na minha aldeia não tínhamos moeda, dinhei- ro. Tínhamos comida, tínhamos liberdade como os pássaros e os animais.

Nós queremos dizer para vocês: durante 500 anos seguramos a Biodiversidade, as riquezas, os recursos da nossa gente. Agora, não queremos mais fazer isso sozinhos. Queremos fazer isso em conjunto com vo- cês. Por que vocês têm a tecnologia, vocês têm a má- quina e nós temos a sabedoria da natureza. Será que é possível sonhar com isso?

Quando nós fizemos a Declaração da KARI- OCA, como chamamos, nós pensamos em dizer para

vocês: Todo o nosso futuro é projetado com base nos rastros dos nossos antepassados. Isso é nossa cultura. Isso é nossa força. A força espiritual que a humani- dade está perdendo. A força espiritual que se trans- forma em política. Não brinquem com o espírito, o seu espírito é sagrado.

Gostaria de ler para vocês a Declaração que fize- mos na KARI-OCA. Ela não diz exatamente, talvez, o que vocês esperam, mas ela fala do nosso coração. A parte técnica está aqui, várias folhas da nossa tec- nologia, e aqui a parte da Declaração que fizemos para a humanidade: "NÓS, OS POVOS INDÍGE- NAS, CAMINHAMOS EM DIREÇÃO AO FUTU- RO NAS TRILHAS DE NOSSOS ANTEPASSA- DOS. DO MAIOR AO MENOR SER VIVENTE, DAS QUATRO DIREÇÕES, DO AR, DA ÁGUA, DA TERRA E DAS MONTANHAS, O CRIADOR COLOCOU A NÓS, POVOS INDÍGENAS EM NOSSA TERRA, NÃO COMO LATIFÚNDIO, MAS COMO NOSSA MÃE. AS PEGADAS DE NOSSOS ANTEPASSADOS ESTÃO PERMANEN- TEMENTE GRAVADAS NAS TERRAS DE NOS- SOS POVOS.

Nós, povos indígenas, mantemos nossos direitos inerentes a autodeterminação, que tanta gente tem medo de que os índios atinjam, como vocês um dia também atingiram na relação entre os povos. Sempre temos tido o direito de decidir as nossas próprias for-. mas de governo, de usar nossas próprias leis, de criar e educar nossos filhos, direito a nossa própria identidade cultural, sem interferência. Continuamos mantendo nossos direitos inalienáveis a nossas terras e territórios. A todos os nossos recursos do solo e do subsolo e as nossas águas. Afirmamos nossa contínua responsabilidade de passar todos esses direitos às ge- rações futuras — não para outras pessoas, mas para nossos filhos!

Não podemos ser desalojados de nossas terras. Nós, povos indígenas, estamos unidos pelo círculo de vida em nossas terras — Código de vida que o ho- mem branco não compreende. Aquilo que vocês cha- mam nessa reunião, de meio ambiente.

Nós, povos indígenas, caminhamos em direção ao futuro.

Nas trilhas dos nossos antepassados". Vocês acreditam nisso? Vocês podem pensar nis-

so? Quando vocês assinarem aqui os acordos, é pos-

sível que nós não estejamos aqui dentro, mas vocês vão estar.

E vocês têm que ser nossos aliados. Vocês têm que ser aliados do futuro. Por isso que a gente sempre diz: é assim a Carta

da Terra. Simples. Tão óbvia como a vida de vocês. Como a nossa

vida! Ela é simples como as crianças. Como as cores do arco-íris. Acreditem nisso. Vocês todos dos Governos... Não tenham medo de nós, Porque o futuro do Índio, É o futuro de vocês também, É o futuro do Planeta!

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TUPARI DEZEMBRO/92

Ailton Krenak

4 4"^) ara se continuar uma herança cultural, _§7 é necessário ter suporte físico, ou seja,

os nossos lugares na terra, nosso habitat. Não pedimos um latifúndio, uma fazenda. Queremos um sítio sagrado no sentido cultural, onde exis- tam referências simbólicas de nosso passado".

"Da mesma maneira que a cultura ocidental se utiliza de escolas e de instrumentos auxiliares para o aprendizado, a minha cultura tem uma instituição de conhecimento: o sonho. Quando você abre seu coração e seu pensamento, você busca o sonho. Dentro do sonho você tem ensi- namentos".

"Em vez de se quebrar a cabeça, deve-se fi- car quieto, esvaziar toda a ansiedade e esperar o

índio Crucificado, escultura de Mérida, Qozqo, Peru

' 'NãQuele diü levantarei < arruinada do tuxaua. Tapare frestas, levantarei a.v ruínas c reconstruirei como nos dias. que vêm os dias — profeta d — em que os vinhos de açaí.

bis

Terra e sonho sonho. As soluções aparecem durante os so- nhos".

"A instituição do sonho é um traço cultural, da mesma maneira que algumas tradições reli- giosas possuem rituais como romarias ou ora- ções. Não é um truque para ficar esperto ou sair de enrascadas".

"Todas as culturas antigas possuíam seus xa- mãs. Só que esses xamãs foram gradativamente desmoralizados pela sucessão de fatos rápidos. Hoje ninguém mais tem tempo para escutar xa- mãs. As sociedades modernas criaram os psicó- logos, os antropólogos, os botânicos, os astró- logos".

"A melhor caricatura dos 500 anos do Desco- brimento da América é: 500 anos antes havia

uma pessoa pelada em um terreiro, sentado em uma esteira de buriti e pintada de urucum. Qui- nhentos anos depois, essa mesma pessoa está vestindo uma calça qualquer-coisa, sentada em uma cadeira velha de fiberglass, sem pintura, sem cheiro, tentando ficar parecida com essa coisa que é ser civilizado".

"Estes choques empobrecem os dois lados: os índios, pela imitação patética dos brancos. Os brancos, pela perda de dignidade cultural. Ao tentar "aculturar" o indígena, o branco apenas cria raias de periferia cultural, com gente que não consegue ser a sua repetição, que não tem sua fé, que não acredita em seus valores. Tudo vira um arremedo''.

- Declarações à Revista da Folha, que circulou em S. Paulo no dia 11 de out.

Buscando Novo Céu e Nova Terra A CNUMAD está se reunindo vinte anos

após a Conferência de Estocolmo sobre o Meio Ambiente, e nenhuma tendência impor- tante de degradação ambiental foi revertida.

Hoje toda a vida está ameaçada num grau bem mais elevado do que há vinte anos. Te- memos fatos mais brutais ainda daqui a vinte anos, pois continuamos assaltando o planeta. O consumo de energia continua como se fos- se ilimitado em termos de conteúdo e benigno em seus efeitos.

Muitas espécies de animais e plantas fo- ram extintas. A poluição da água, do solo e do ar é maior do que nunca. A desertificação e o desmatamento se aceleram. Enormes quantias de dinheiro gasto em armas e na mi- litarização continuam a exaurir recursos de- sesperadamente necessários, e a prática dos poderosos de usar conflitos locais para fins políticos e econômicos, após o final da con- frontação entre Leste e Oeste, aumentou.

Vocês hão de entender porque nos pesa o coração e porque é extremamente urgente que nós, como igrejas, assumamos compromissos espirituais, morais e materiais vigorosos e permanentes, com o surgimento de novos modelos de sociedade, baseados numa pro- funda gratidão a Deus pela dádiva da vida e no respeito pela totalidade da criação de Deus.

Não ousamos negar nosso próprio papel como igrejas na crise que agora nos assola. Nós mesmos não proferimos a palavra profé- tica. Na verdade, nem mesmo a ouvimos quando dita por outros recentemente, incluin-

do uma série de cientistas. E muito menos de- mos ouvidos aos clamores dos povos indíge- nas, que nos disseram durante séculos que a modernidade iria sujar seu próprio ninho e devorar seus próprios filhos. Assim precisa- mos sentir pesar e nos arrependermos.

Para o cristão, isto é mais do que um ato político: é uma prática espiritual. Mais ainda, viver de acordo com o Espírito é captar sua presença em toda a criação. Pois, como dis- semos acima, o Espírito habita todo o cosmo, dá respiração a toda a vida e afina nossos co- rações para ouvir o pulso da terra e o cami- nho da verdade e da beleza.

Em segundo lugar, nossas próprias igrejas devem ser lugares em que aprendemos de maneira nova o que significa o fato de que a aliança de Deus se estende a todas as criatu- ras, redescobrindo a dimensão ecocêntrica da Bíblia. Isto significa um estilo de vida mate- rialmente modesto que ama e trata a terra com gentileza, como o faz Deus.

Ao fazermos isto, deveríamos cultivar uma atitude penitencial pelos pecados cometi- dos contra a natureza e fomentar a compaixão pelos seres a quem causamos dano (Fp 2.1- 5). Deveríamos estabelecer relações de inclu- são e reconciliação entre os sexos, entre ra- ças, culturas e povos, mantendo uma postura de unção abençoada perante todo ser e todo o conjunto de seres.

Trechos da Carta às Igrejas - Conferência do Conselho Mundial de Igrejas - Rio-Baixada Flu- minense, Pentecostes 92.

"O Brasil está sendo construído em cima de

um cemitério" "Vou apresentar a

vocês as palavras dos meus irmãos, dos que somos chamados de ín- dios. Essas palavras vão contar para vocês a

última parte do drama que nós estamos viven- do, desde que os ho- mens de outra raça, de outra cultura, de outro mundo, puseram os pés em nossas terras. O homem branco, aquele que se diz civilizado.

pisou duro não só na terra, mas na alma do meu povo, e os rios cresceram e o mar se tornou mais salgado, porque as lágrimas da minha gente foram mu- itas" — Txibae Ewo- roro, do povo Bororó (MT).

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DEZEMBRO/92 TUPARI

Krenak: Avaliando a Missão e a Solidariedade A situação dos Krenak, no Vale do Rio

Doce, continua preocupante e são mui- tas as dificuldades que vêm sendo en-

frentadas, dentre elas, a desintrusão dos possei- ros que depende do processo já há 5 anos no Supremo Tribunal; a educação escolar dos jo- vens e outros problemas decorrentes da falta de terra.

Na busca de auxiliar os Krenak na sua orga- nização frente às realidades impostas pelo con- tato com os "civilizados", e na luta pela sua autodeterminação, o grupo de Solidariedade aos Krenak, realizou dois encontros em outubro, na Igreja Metodista de Resplendor.

No dia 4 foi realizada uma tarde de debates sobre a Política Indigenista da Igreja Metodista. Cerca de 20 pessoas estavam presentes, for- mando um grupo de igual número de índios Krenak e pessoas solidárias. O GTME contribu- iu na discussão através do seu coordenador.

Foi destacado um item do Credo Social da Igreja, que dispõe:

"A Igreja Metodista orienta aos seus mem- bros a amar efetivamente as pessoas, caminhan- do com elas até as últimas conseqüências para a

sua libertação dos problemas e sua autopromo- ção integral".

No dia 25 o grupo de Solidariedade aos Krenak viabilizou o encontro entre representan- tes da aldeia e o bispo primaz da Igreja Meto- dista, Adriel de Souza Maia. No momento da Escola Dominical, em Resplendor, o bispo exortou a igreja para o compromisso missioná- rio que deve ocorrer para além de suas paredes. O pastor Keller Apolinário Rosa da Silva, re- presentando o Grupo de Solidariedade, lembrou o compromisso profético que a Igreja deve ter frente aos sofrimentos dos povos indígenas. Os Krenak, em conversa com o bispo Adriel, rela- taram sua história, lutas e problemas.

O bispo Adriel, após ter lembrado que as ações desenvolvidas em prol da reintegração da terra estão paralisadas, informou que terá uma audiência com o presidente em exercício — Itar mar Franco e colocou-se à disposição para a en- trega de uma reivindicação do povo Krenak, so- licitando providências imediatas para a desintru- são dos posseiros.

Keller Apolinário Rosa da Silva

Marly de Castro Costa

Situação dos Povos Indígenas preocupa juventude metodista

Trezentos re- presentantes da juventude meto- dista de todas as partes do Brasil, reuniram-se na fazendinha do Instituto Metodis- ta Isabela Hen- drix, em Sabará, MG, entre os dias 18 a 21 de junho, para debate do te- ma "Por uma Juventude estuda no Rio, situação igreja viva e consciente".

O ministério de ação popular da 5 a Região Eclesiástica foi convidado para dirigir um labo- ratório, que oferecia temas como assalariados rurais, questão agrária e causa indígena. Foram aprovados dois projetos de trabalho a nível na- cional. O primeiro, em Rondônia, que aconte- cerá em julho de 1993, e o segundo do Lar Me- todista, em Santa Maria, RS. Além dos proje- tos, a mesa da confederação programa um plano missionário para a causa indígena, quando se completa 5 séculos da chegada dos brancos à América.

No laboratório de ação popular, dividimos o tempo entre a questão agrária e os assalariados rurais, para esclarecer sobre os problemas dos chamados "bóias frias".

A questão indígena foi apresentada a partir das atividades do GTME, de seu trabalho na ar- ticulação com as igrejas e sua linha de trabalho, como a proposta de evangelização, a partir da solidariedade e convivência. Tivemos várias perguntas a respeito de evangelização dos ín- dios, e como são suas sociedades e suas diferen- ciações lingüísticas. Os participantes estavam interessados em saber como apoiar os índios.

Federação Metodista de Jovens

Foram discutidas as possibilidades de apoio a partir do lugar

, em que o jovem se en- 1 contra, organizando ! grupos de apoio, bus- | cando discutir a situa-

ção dos povos indíge- nas nas escolas e igre- jas e apoiando toda iniciativa que visa proteger os direitos dos índios.

dos Povos Indígenas No término dos es- tudos, foi elaborada pelos participantes a carta seguinte:

"O ladrão vem somente para roubar, matar e destruir. Eu vim para que tenham vida, e a te- nham em abundância". João 10:10

Nós, jovens metodistas, reunidos no XI con- gresso nacional, em Sabará, MG, nos dias 18 a 21 de junho de 1992.

A opressão em que se encontram: os sem terra, os índios e negros, as crianças e adoles- centes, os assalariados.

A situação em que se encontram: a saúde pública, a ecologia, a campanha pela pena de morte.

Sabemos que, como Igreja, não devemos fi- car à margem dessa situação por que passa o nosso país.

Nós, como cristãos e cristãs, sentimos a res- ponsabilidade de denunciar, por palavras e pela prática, todas as forças e instrumentos que opri- mem e destroem a vida humana.

Enquanto comunidade missionária a serviço do povo, devemos assumir todos os compromis- sos firmados pela Igreja Metodista em seus do- cumentos oficiais.

João Luis Ferreira

índios Krenak debatem proposta missionária metodista

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6 TUPARI DEZEMBRO/92

Assembléia do povo de Deus Quito-Equador, 13 a 18 de setembro de 1992

Vivendo o Evento Q 542p(

primeiro encontro Continental da Assembléia ' do Povo de Deus, contou com a presença de pessoas, de 20 países latino-americanos e de na-

cionalidades indígenas, pegras, mestiças, brancas, com irmãos e irmãs da África, América do Norte e Europa. Crentes de várias confissões cristãs (evangé- licas, morávia, católica) membros religosos indíge- nas, negros, mestiços, brancos, pastores, pastoras, sacerdotes, religiosos e religiosas, bispos e le'gos.

Todos abertos ao diálogo e ao Espírito Santo que ao longo desses anos vem sustentando os povos da América Latina em suas lutas e dores, conscientes de seu compromisso com os sentimentos populares e da sensibilidade da entidade que cada qual apresenta pa- ra com a causa do Reino de Deus.

Em cada irmão víamos um guerreiro despido de preconceitos, empunhando a espada da justiça para combater os males que vêm destruindo o nosso povo há mais de 500 anos.

Logo na abertura do encontro, podia se ver algo que só acontece com o povo de Deus, através dos símbolos da riqueza e criatividade do movimento po- pular, com vários países desfilando com seus trajes típicos, símbolos, cantos, heróis e mártires.

Foram impressionantes as palavras chaves que eram repetidas com fervor: Povo, resistência, espe- rança, vida, luta, irmandade, solidariedade, unidade, convergência na denúncia dos 500 anos de agressão

européia é norte-americana. "O Povo de Deus Vida e Espe-

rança", foi o grande tema de refle- xão e animação nas celebrações li- túrgicas que deu unidade e profundi- dade ao encontro, marcando o caminho que comprometemos a se- guir como povo pobre e crente na América Latina e no Caribe.

Dentre alguns objetivos, como: "Contribuir para o resgate de nossa história e a recu- peração de nossa própria identidade, valorizar e vi- venciar o ecumenismo evitando a repetição dos er- ros, nos próximos 500 anos, fortalecer e reanimar a esperança, fortalecer a luta libertadora pela solidarie- dade, justiça, paz e respeito à natureza", vimos que a unidade que pretendemos conseguir como indígena, negra, mestiça, popular, se funda no respeito da identidade e das lutas próprias de cada um, seja mu- lher, homem, jovens, operários, universitários, ín- dio, negro, mestiço, para realizarmos o nosso tão al- mejado sonho que é uma sociedade justa, livre e fra- terna.

Nosso encontro não foi só um momento de refle- xão sobre o ecumenismo, teve o caráter expressado principalmente na experiência profunda de unidade; com a convivência amistosa, na pobreza alegremente compartilhada na oração, celebração, liturgias, can-

América de todas as raças ■ ao centro, Rev. Ademário ■ tos, poesias, danças, abraços, simpatias, aplausos, solidariedade, sinceridade aberta...

Todos participaram e contribuíram porque o mo- mento era de entrar na roda e sentir o calor humano da solidariedade sem acepção de pessoas e sobretudo onde as várias crenças buscavam solução para os problemas e lutavam por um reconhecimento dos di- reitos históricos.

Chegamos à conclusão de que estamos compro- metidos a seguir lutando por um novo amanhecer, sem impérios, conquistadores, corsários coloniais, ditadores, coronelismo eclesiástico, mas sim, por uma fraternidade mundial comunitária e solidária, como a que nós desejamos.

Agora é sentar com as bases para consolidar a unidade e realizar debates por regiões para a evolu- ção e o intercâmbio de experiências, por estados para uma maior realização da APD.

Despertando no Rio interesse pela causa das sociedades nativas Nos finais de semana de julho e agosto, du-

rante suas férias, João Luis, metodista de Ri- beirão Preto, jornalista e membro do GTME, falou sobre a situação dos povos indígenas no Brasil, a "evangelização" e o papel dos cristã- os hoje depois de 500 anos de dominicais das Igrejas metodistas de Santa Cruz, Inhoaíba, Rocinha e ainda por um grupo de 12 estaduni- denses da Carolina do Sul, em intercâmbio com a Igreja do estado do Rio. Nestes encon- tros foram relatadas a proposta e as atividades do GTME e as lutas pela demarcação das ter- ras e recuperação cultural. As maiores preocu- pações foram levantadas pela informação da ação criminosa do garimpo, e das madeireiras e devastação da floresta pelas frentes de coloni- zação. Foi destacada sempre a importância que tem a mobilização da sociedade civil para bar- rar esses crimes. Jovens metodistas do Rio querem apoiar as lutas dos índios

Feitos os contatos com a federação meto- dista de jovens da Ia Região, fui convidado para falar acerca dos povos indígenas no Bra- sil, num encontro entre os dias 31 de outubro a 02 de novembro de 1992, na cidade de Barra Mansa.

A participação no laboratório foi de apro- ximadamente 30 jovens que para início de con- versa, tinham muitas perguntas sobre os ín- dios. Notei a preocupação sobre a evangeliza- ção e o chamado para a missão entre os índios. Me senti no direito de não responder pois acho complicado para iniciantes e expliquei que isto era assunto para um curso mais aprofundado. Relatei sobre missionários/as em área e ativi- dades do GTME. Aproveitando as informa- ções do curso por correspondência do GTME, elaborei um roteiro com as seguintes informa- ções: critério de etnias, conceito de comunida- de indígena, uso da terra, produção de alimen-

tos, noções de parentesco, demarcação de áre- as, identificação e formas de auxiliar os índios na sua própria localidade.

O questionamento se deu no âmbito das agressões sofridas pelos diversos povos e in- formei sobre os projetos econômicos, a hidre- létrica e dei pistas de como famílias se integra- ram nas florestas usando os recursos naturais com técnicas extrativistas não destrutivas.

A juventude foi incentivada a formar e par- ticipar de organizações de apoio aos povos in- dígenas.

Discutiu-se que a ação missionária entre os índios atualmente se diferencia pela nova pro- posta de evangelização diferente das tradicio- nais missões. Exemplos são o diálogo intercul- tural no qual os índios são parceiros e o apoio para que eles iniciem a formar suas próprias li- deranças e lutem por seus direitos, como já ocorre via UNI - União das Nações Indígenas.

Após a exposição, os participantes obser- varam o mapa do CEDI, cartazes e fotos. Fo- ram distribuídos os jornais do GTME e foi passada uma lista de endereços de entidades, de pastores/as metodistas envolvidos com a questão indígena e grupos populares preocupa- dos com os índios. A idéia de se ter um curso de aprofundamento foi colocado ao grupo que deixou Eduardo Gomes como responsável para contactar os interessados no curso.

Definir-se-á local e data. Após os trabalhos, tiramos uma Comissão

para elaboração de uma carta aberta às igrejas na qual conste a preocupação em colocaborar com as comunidades indígenas e se cobre as igrejas postura que não seja de conivência com o desrespeito dos direitos já adquiridos destas comunidades diferenciadas etnicamente.

João Luis Ferreira

Ademário Guimarães Dantas igreja Presbiteriana Unida de Formosa, Go.

0 CLAI comemora 10 anos de vida Em 16 de novembro de 1982, em Huampani, Lima Peru, foi

criado o Conselho Latino-Americano de Igrejas (CLAI), culmi- nando uma etapa de quatro anos de consultas, reflexões e articu- lações iniciadas em Oaxtepec, México.

Constituído como uma fraternidade de Igrejas e organismos ecumênicos, o CLAI busca promover a unidade do povo de Deus na América Latina e no Caribe.

Assim, nascido do anseio por servir a Jesus Cristo e procla- má-lo em nosso continente, o CLAI é um lugar de encontro e diálogo; um espaço para adorar conjuntamente a nosso Senhor e buscar os elementos básicos de um testemunho comum que ex- presse o amor que temos por nossas irmãs e irmãos.

Dez anos se passaram. Durante esse período muita coisa foi realizada na proclamação do Reino de Deus e no serviço aos empobrecidos de nosso continente. Em ações pastorais dinâmi- cas e comprometidas com o tempo e espaço em que está inseri- do, o CLAI se faz vivo junto a diferentes segmentos de socieda- de. Sua atuação se dá nas áreas da evangelização, da promoção e comunicação, da família, mulheres e crianças, da consolação e solidariedade e da cultura indígena.

8 Igrejas e 11 Organismos Ecumênicos compõem o CLAI no Brasil: Igreja Cristã Reformada, Igreja Episcopal do Brasil, Igreja Evangélica Árabe, Igreja Evangélica de Confissão Lutera- na do Brasil, Igreja Evangélica Congregacional do Brasil, Igreja Metodista, Igreja Presbiteriana Independente, Igreja Presbiteria- na Unida do Brasil, ASTE, CEBEP, CEDI, CELADEC, CE- NEC, CESE, CESEP, CONIC, GTME, Instituto Ecumênico de Pós Graduação em Ciências da Religião e UBRAJE.

A sede da região Brasil está localizada na cidade de São Pau- lo: Vieira de Morais, 618 Conj. 24 -Campo Belo São Paulo - SP 04617-0001 Tel: 531-8220/ 530-9828 do cartão comemorativo.

Animando uns aos outros "Nós nos comprometemos, em solidariedade com os Indígenas,

a lutar pela demarcação de suas terras e pela sua autonomia, e a res- peitar suas expressões religiosas como primeiro passo de um proces- so de inculturação do Evangelho. Que o resgate das culturas massa- cradas seja feito pelos próprios indígenas com o acompanhamento solidário dos agentes comprometidos com a causa indígena." Na semana de 8 a 12 de setembro mais de 2.000 pessoas reuniram-se na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, representando as Comunidades Eclesiais de Base de todo o Brasil e de muitos países da América Latina e do Caribe. Além dos peregrinos de todos os la- dos, 1.500 cristãos da própria cidade envolveram-se nos serviços que garantiram o bom funcionamento deste 8o Intereclesial. "O povo de Deus renascendo das culturas oprimidas" foi o tema que despertou a participação de toda essa gente: mulheres e homens, bis- pos, leigos, padres, irmãs, índios, pais-de-santo, e 106 membros de igrejas evangélicas. O GTME contribuiu no bloco São Sepé Tiarajú, que debateu as culturas indígenas e a evangelização. Além desse blo- co, havia o das mulheres, dos negros, dos trabalhadores e dos mi- grantes. A carta final, contestada em parte pelo próprio bispo de S. Maria foi assumida com muita alegria pelo plenário.

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DEZEMBRO/92 TUPARI

A causa indígena perde um defensor Num único acidente, o Brasil

perdeu dois dos poucos de- mocratas com trajetória na parca história da democracia no país. De formas diferentes, Ulysses Guima- rães e Severo Gomes conquistaram seus lugares mediante atuações dis- tintas, mas que os distanciaram da grande maioria de políticos do Bra- sil.

Severo Gomes, teve uma traje- tória mais radical, na sua origem e no seu ponto de chegada. Vindo da UDN, ele participou ativamente do golpe de 1964 e foi ministro de Castelo Branco e de Geisel. Sua ruptura com o regime ocorreu no

transcurso dos anos 70, em torno da defesa das empresas nacionais e só encontra similar em seu grande irmão político - Teotônio Vilela.

Nas palavras de Paulo Sérgio Pinheiro, um companheiro insepa- rável de Severo, ele era "um de- fensor de causas perdidas, como os índios, presidiários e loucos". Co- mo recorda ainda, ele foi o maior responsável pelo capítulo sobre os índios na Constituição, considera- do um exemplo mundial.

Ainda na ditadura. Severo, com a consciência do valor da cul- tura e do mundo intelectual já ad- quirida em sua formação juvenil.

Paraíba elege a primeira prefeita indígena Teve pouca repercussão na im-

prensa nacional a vitória de Nancy (Iracy Cassiano Soares) índia Poti- guara, parteira e enfermeira, que de forma digna, ganhou a eleição para a Prefeitura da Baía da Traição. Nancy é mãe, avó, tem 48 anos, sendo a maioria dedicados ao Povo Potiguara. Como mulher, sofreu muitas humi- lhações, discriminações, perseguições para chegar onde chegou. Depois do salvar-se de um câncer uterino, Tupã lhe concedeu a honra de se unir à Or- ganização Indígena. A Baía da Trai- ção é um Município da Paraíba, bal- neário tradicional indígena que foi e é explorado pelos especuladores da la- gosta, camarão e cana-de-açúcar e por isso uma zona surda de conflitos. Essa situação, há décadas, vem dei- xando o Povo Potiguara no mais pro- fundo nível de miséria humana, além de ter causado a migração de cente- nas de índios para os grandes centros urbanos, destribalizando-os. Essa si- tuação já foi denunciada pelo Grumin nas Nações Unidas assim como tam-

bém outras pessoas o fizeram. Os principais objetivos da prefeita índia são: democratizar a área tradicional indígena (Baía da Traição) hoje ocu- pada por índios e não índios; envol- ver os índios na participação dos lu- cros gerados pelos recursos naturais da área, criar cooperativas de pesca, criar um mini-hospital, promover uma Educação voltada para as tradi- ções indígenas, promover um turismo que gere recursos e desenvolvimento, sem prejudicar a identidade indígena; acabar definitivamente com os arren- damentos de terras. Nancy que é tam- bém uma das Conselheiras do GRU- MIN, participou da Assembléia de criação do Conselho de Profissionali- zação da Mulher Indígena e Forma- ção de Lideranças (GRUMIN) no úl- timo mês de setembro. Nancy admi- nistrará a prefeitura com 60% de apoio entre os vereadores, sendo um, índio Potiguara, o sr. Rosil.

Eliane Potiguara

Kaíngang conquistam área em Irai Com ajuda dos parentes indígenas

que vieram de todo o Rio Grande do Sul e de santa Catarina, os Kaingang ocuparam e fizeram a autodemarcação de suas terras junto ao Rio do Mel, no município de Irai, no dia 12 de agosto.

Condenando a ação dos Kaingang juntaram-se o prefeito, sr. Pedrinho, do PDT, políticos conservadores da re- gião, 'ecologistas' de última hora e até a FUNAI. O acampamento de trabalho foi feito perto do aeroporto, construído dentro da área indígena e agora, inter- ditado. A portaria de reconhecimento

dá área foi assinada ainda em maio pe- lo então ministro Célio Borja, sob o número 00247, com basfe em laudo an- tropológico concluído desde 1985. O prefeito tentou anular a decisão da Jus- tiça e hipocritamente, a mesma prefei- tura que mantém um lixão dentro da área acusava os índios de serem depre- dadores da mata e das fontes de água termais. O casal de missionários. Lú- cio Schwingel e Ingret Kaminski, da IECLB, acompanhou toda a luta deste povo.

Igreja Missouri ordena pastor indígena A Igreja do Sínodo de Missouri,

Igreja Evangélica Luterana no Brasil ordenou ao pastorado o terena Edson V. Nimbu, 29 anos, que cursou teolo- gia no Instituto Concórdia, em São Le- opoldo/RS e no Seminário de São Pau- lo.

Nascido em Aquidauana, MS, Ed- son não viveu na aldeia, mesmo tendo a maioria de seus parentes lá. No ano de 75 conheceu a Igreja Luterana em Aquidauana. Nessa cidade, a igreja

reúne descendentes de alemães e um grande número de índios terena. Pasto- reando hoje uma comunidade em Ara- caju, Sergipe, Edson Nimbu fala com saudade do seu povo: 'freqüentemente visito os parentes nas aldeias. Noto a harmonia em que eles vivem. Sinto saudades do convívio amigável que existe entre eles".

(adaptado do Mensageiro Lutera- no, ano 75, n0 7)

valeu-se de sua posição para defen- der muitas vítimas da repressão. Eleito senador por São Paulo, ele fez de seu gabinete e de seu man- dato um espaço de articulação das lutas pelo direitos de cidadania dos marginalizados, injustiçados, ofen- didos. Foi o primeiro parlamentar a entrar em contato com os Yano- mami em suas reservas, tendo se engajado na luta pela demarcação de terras de todas as tribos rema- nescentes.

Humanista radical. Severo foi figura ímpar, pelo caminho trilha- do, pela força de suas convicções e sua ética pessoal e pública. Sua

morte deixa um vazio que, a histó- ria brasileira infelizmente nos tem ensinado, dificilmente será preen- chido. Resta a confiança que sua ação generosa encontre, nos inú- meros companheiros que forjou - entre os quais estão os da Comis- são Teotônio Vilela -, a energia pa- ra que a defesa das causas justas deixe de ser causa perdida, numa sociedade digna e soberana como a que Severo sonhou e à qual dedi- cou o melhor de sua vida. do jornal BRASIL AGORA - out.

92

De olho no Governo de Itamar

Quem é o ministro José Eduardo de Andrade Vieira? Segundo a Folha de S. Paulo de 18 de maio de 1992, o dono do

Bameríndus deixou a equipe econômica do governo perplexa ao decla- rar que havia vendido bois sem nota fiscal, durante o Plano Cruzado, em 1986. Andrade Vieira disse que na época os frigoríficos só com- pravam sem nota. Ele afirmou ainda que não estava recolhendo o Fin- social.

Andrade Vieira sempre publica artigos de política e economia na imprensa. Seu ghostwriter é um ex-editorialista do Estadão, José Neu- mane, que acaba de publicar um livro sobre o processo do impeach- ment de Collor, e que editou, em 1988, o material forjado pela Para- napanema e publicado pelo Estadão durante uma semana, acusando o Conselho Indigenista Missionário e as organizações indígenas de esta- rem mancomunados com interesses estrangeiros.

do Brasil AGORA, 26 out.

Povo Guajajara faz reféns em protesto contra assassinato

Notícia em todo o país, desde maio, quando apreenderam armas de agentes da Polícia Federal, os índios da aldeia Coquinho, no Maranhão, voltaram a ser destaque no início de novembro. Em protesto contra o as- sassinato do índio Augusto Pereira, os guajajara interditaram a BR 226, entre Barra do Corda e Grajaú, no Maranhão, retendo 7 ônibus e 8 car- ros, com cerca de 200 pessoas. Logo no segundo dia foram libertadas as mulheres e as crianças e os índios condicionaram a liberação da rodovia a retirada do povoado de S. Pedro dos Cacetes, que fica dentro da área demarcada para os guajajara. Pediam ainda a intervenção do Ministro da Justiça, Maurício Corrêa, que vê essa situação como um problema a ser resolvido pelo estado do Maranhão. Mesmo assim, o ministro dispunha- se a ir até o local para ajudar na resolução do impasse.

Folha de S. Paulo 5 nov/92

Fundação Mata Virgem conclui demarcação A Fundação Mata Virgem, criada

pelo líder indígena Raoni e o cantor Sting, concluiu dia 4 de nov, a demar- cação da reserva Menkragnoti, no sul do Pará, com 4,9 milhões de hectares. Se implantada, a reserva unificará o maior território indígena contínuo no país — 11,3 milhões de hectares, ligan- do a reserva Kaiapó (PA) à reserva Ja- rina (MT) e ao Parque Nacional do Xingu (MT).

O diretor executivo da Mata Virgem, Luís Carlos Pinagé, 35, disse que os mapas da região demarcada serão apre-

ciados pela Funai para homologação da reserva pelo presidente da República.

"Será outra luta", disse. Na Men- kragnoti, vivem cerca de 500 índios em três aldeias. Folha de S. Paulo 5 nov/92

E nos Estados Unidos Com a vitória dos democratas para a

presidência, foi eleito o Io senador indí- gena (ou nativo americano) do país. Cha- ma-se Ben Nighthorse (Cavalo da Noite) Campbell, tem 59 anos e vai representar no Senado o estado de Colorado.

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8 TUPARI DEZEMBRO/92

Um duro golpe no racismo revista Véspera, da AGEN

Terra minha, mãe de meus avós, quisera acariciar tua beleza, contemplar tua serenidade e acompanhar teu silêncio, quisera acalmar tua dor, chorar tua lágrima ao ver teus filhos dispersos pelo mundo, pedindo pousada em terras distantes, sem alegria, sem paz, sem mãe, sem nada. 4 A celebração de Colombo, para nós, é um in-

Asulto!' A frase e o poema acima são de uma mulher

guatemalteca, de 33 anos, que contra a vontade do governo do seu país, ganhou o prêmio Nobel da Paz por lembrar ao mundo o sofrimento e a perse- guição sofridas pelos povos indígenas. Rigoberta Menchú Tum receberá a homenagem no dia 10 de dezembro, dia dos Direitos Humanos, em Oslo, na Noruega.

Marcando os 500 anos da chegada de Colombo ao Novo Mundo o nome de uma representante das vítimas dessa história de ocupação junta-se a ou- tros bem conhecidos na lista dos vencedores do Nobel da Paz: Luther King Jr, Willy Brandt, Lech Walesa, Bispo Tutu e Perez Esquivei. Rigoberta é índia Maia, do grupo Quiché e mora no México, exilada, desde 1981, após o assassinato de seu pai, sua mãe e um irmão, pelas forças de segurança do governo. Ao receber a notícia do prêmio suas pri- meiras palavras foram "eu só queria que meus pais estivessem presentes".

Destacada na mensagem do Comitê do Nobel como "advogada dos direitos indígenas e ativista

de justiça social e da reconciliação etno-cultural", Rigoberta disse que o prêmio de 1.2 milhões de dólares vai servir para fortalecer as lutas para que ao final do século XX haja liberdade para todos os índios e que o continente americano se tome de fa- to pluralista.

Nascida na pobreza, sem escolarização, Men- chú tomou-se uma trabalhadora nas plantações de milho e feijão, de café, algodão e açúcar, quando ainda criança. Ela aprendeu a falar espanhol so- mente aos 20 anos e mesmo assim a sua auto-bio- grafia EU, RIGOBERTA MENCHÚ, tomou-se conhecida e divulgada em 11 línguas. Seu pai, Vi- cente, foi organizador do sindicato de agriculto- res. Mais tarde foi esfolado e publicamente quei- mado pelas tropas de segurança. Isto aconteceu quando ele e seus camaradas ocuparam a Embai- xada espanhola na cidade da Guatemala, chaman- do a atenção para sofrimentos e os assaltos poli- ciais que pesavam sobre os lavradores. A embai- xada foi incendiada e todos os manifestantes morreram. Poucas semanas depois os soldados ar- rastaram a mãe de Menchú, a seqüestraram e a violentaram repetidas vezes. Depois da tortura, ela foi abandonada sob uma árvore onde morreu.

Nos últimos 30 anos de rebelião contra os su- cessivos govemos repressivos da Guatemala, mais de 120 mil pessoas foram assassinadas. Menchú tem apoiado todas as organizações que lutam con- tra essa situação. Ao ser premiada, o govemo rea- giu: "foi uma vitória política das guerrilhas". Por outro lado, foi saudada pelo colunista Alfonso Portillo do diário Siglo 21; "Ela faz com que aqueles que são guiados pelo ódio, pelo racismo, pelo egoísmo e pela estupidez, tremam".

Igreja Católica lamenta ação violenta dos militares

Nota ao público Nestes dias, os meios de comunicação locais

e até nacionais relatam os acontecimentos na Maloca de Maturuca. Por acharmos que as in- formações foram em parte distorcidas e para atender as muitas solicitações recebidas, a Dio- cese de Roraima sente a necessidade de publicar a seguinte nota:

1. No dia 30 de agosto, uma patrulha de mi- litares, chefiada por vários Capitães, um Major e um Tenente, às ordens de um Coronel, perto do meio dia, chegou, de helicópteros e carros, na maloca de Pedra Branca com um índio, que estranhamente vestia também farda militar. Soubemos depois que o índio tinha sido forçado a vestir a farda e acompanhar os militares.

Depois que saíram dos carros e dos helicóp- teros, se dirigiram à residência da Missão, ar- rombaram as portas de acesso, a porta de um armário, vasculharam gavetas e arquivos, le- vando algum material. Em seguida se dirigiram ao pequeno depósito, à garagem, ao galinheiro e ao lugar onde está armazenada merenda esco- lar e ali também arrombaram portas, vasculha- ram estantes, caixotes, tudo com violência. Não satisfeitos, foram para a Igreja da Comunidade, vasculharam um pequeno armário onde estavam utensílios da Igreja, livros, panos e uma bandei- ra brasileira. Em seguida, foram ao Posto Mé- dico, mandaram sair o doente que lá estava, inspecionaram armários e estantes e carregaram uma pasta onde estavam contidas as mensagens da fonia da comunidade, mensagens recebidas e enviadas à FUNAI. Na mesma ocasião foi inva-

dida a residência do segundo Tuxaua. Ali, além de mexerem com a mobília, foram levados 500 mil cruzeiros e 118 gramas de ouro. O dinheiro pertence ao segundo Tuxaua e o ouro à Cantina da Comunidade. É com mágoa que relatamos estes fatos. Os índios da Maloca ouviram dizer que o arrombamento foi feito porque os milita- res julgaram que na residência, os Padres ti- nham armas escondidas. Todavia, nenhuma ar- ma foi encontrada, como um oficial do Exército afirmou, de forma oficial, na nota publicada pe- la imprensa.

2. Desde a chegada da brigada a Roraima, as relações entre a Diocese e a gal. Francisco Pinto dos Santos Filho, foram sempre amisto- sas, como, de forma geral, em épocas anterio- res. O Sr. General informou pessoalmente ao Bispo, lamentando o acontecido. Realmente es- te episódio grave e lamentável nos surpreende e também magoa o pessoal missionário, pois achamos que eventuais dúvidas que podem sur- gir, devem ser superadas de maneira correta. Não entendemos culpar a instituição do Exérci- to, cientes da função que lhe é atribuída pela Constituição. Lamentamos que certos oficiais tenham se comportado desta forma.

3. Não é a primeira vez que são propaladas calúnias contra a Igreja e sua ação evangeliza- dora. O Exército mais uma vez constatou que tudo não passava de fofoca. Solicitamos que de uma vez por todas se ponha fim ao boato de que os padres dão armas aos índios, assim também que acabem as calúnias contra a Igreja.

D. Aldo Mongiano, Bispo de Roraima

Justa homenagem a Rigoberta Menchú

População indígena Atual no continente Americano (em milhões de habitantes

Países ' População População % A. Latina/Caribe Nacional Indígena

Bolívia 6,9 4,9 71

Mais Guatemala 8,0 5,3 66

de Peru 20,0 9,3 47

40% Equador 9,5 4,1 43 Subtotal 44,4 23,6 53 Belize 0,15 0,029 19 Honduras 4,8 0,7 15 México 85,0 12,0 14

De Chile 12,0 1,0 8

5% a El Salvador 5,5 04, 7

20% Guiana 0,8 0,045 6

Panamá 2,2 0,140 6 Suriname 0,5 0,030 6 Nicarágua 3,5 0,160. 5

Subtotal 114,45 14,504 13

Guiana Francesa 0,1 0,004 4

Paraguai 3,5 0,100 3

Colômbia 30,0 0,6 2 Venezuela 18,0 0,4 2 Jamaica 2,4 0,048 2

Porto Rico 3,6 0,072 2

De Trindad y Tobago 0,010 0,0002 2

1%a Dominica 0,082 0,002 2

4% Costa Rica 2,7 0,035 Guadalupe 0,36 0,004 Barbados 0,28 0,003 Bahamas 0,25 0,003 Martinica 0,10 0,001 Antigua y Barbados 0,75 0,001 Argentina 30,0 0,350

Subtotal 91,457 1,6232 2

De 0,01 % Brasil 150,0 0,3 0,20

a 0,9% Uruguai 2,5 0,0004 0,016

Subtotal 152,5 0,3004 0,20

Total 392.807 40.027 10,19

Est. Unidos 257,0 2,0 0,8

Canadá 24,0 1,5 6

Total do continente 674,0 43,5 6,5

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DEZEMBRO/92 TUPARI 9

Quincentenário de Colombo provoca protestos

Nos Estados Unidos a controvérsia tor- nou-se tão furiosa e intensa antes do 5 o

centenário da descoberta, da viagem de Co- lombo ao Novo Mundo que o dia mesmo pas- sou quase sem notícia. Não foi assim na América Latina, onde os americanos nativos constituem a maioria da população em algu- mas nações e uma grande minoria em outras, e onde tensões culturais entre índios, mesti- ços, e descendentes dos conquistadores têm, por longo tempo sido severas. Dois grupos de povos nativos de pontos quase opostos do he- misfério - Alasca e Peru - encontraram-se nas pirâmides de Teótihuacan, fora da cidade do México, ao fim de uma marcha de um mês

para celebrar '500 anos de sobrevivência'. Na cidade, outros manifestantes penduraram um símbolo onde se lia 'cinco séculos de massacres', no pescoço da estátua de Colom- bo na elegante avenida principal. Manifesta- ções massivas também ocorreram na Bolívia e no Chile. Em Buenos Aires alguns nativos realizaram uma greve de fome de três dias, que terminou no Dia de Colombo em frente da Casa Rosada, o palácio presidencial da Argentina. E em Manágua, Nicarágua, um pôster apresentava Colombo como um GRANDE LADRÃO, ASSASSINO, RACIS- TA, TORTURADOR, OPRESSOR DO PO- VO INDÍGENA E INSTIGADOR DA

GRANDE MENTIRA. Time, Out. 92

Em Boa Vista, Roraima, a dança do tucuí e uma cerimônia de batismo de folhas de acordo com a tradição macuxi, marcaram o 12 de outubro. Organizado para ser o maior ato público de protesto na Amazônia brasilei- ra, chegou a reunir representantes de 22 po- vos e de 15 organizações indígenas. Davi Ko- penawa denunciou a presença de quase 3 mil garimpeiros no território yanomami. Muitas lideranças reivindicaram maior presteza na demarcação das terras e mais recursos para o combate à malária que continua causando ví- timas entre as populações indígenas.

Esperanças Obscurecidas Construído para honrar Colombo, o farol de

Joaquim Balaguer só ilumina a extrava- gância do presidente.

Em Santo Domingo, blackouts acontecem caprichosamente a toda hora do dia ou da noite. As luzes escurecem de repente e as telas dos te- levisores ficam em branco. Elevadores se saco- dem e param em qualquer lugar. No entanto, os problemas energéticos da capital não mudam a idéia do presidente Joaquim Balaguer de acio- nar o interruptor que liga "El Faro a Colón", um farol com 10 andares de altura que foi cons- truído para comemorar os 500 anos da chegada de Colombo nas Américas. No topo do monu- mento que tem formato de um crucifixo, 147 holofotes projetarão no céu a imagem de uma grande cruz que será visível em noites claras até Porto Rico, que fica 247 km ao leste. "El Fa- ro" consome 10.000 kilowatts de energia por hora, o que é igual ao consumo de um pequeno bairro de classe média.

Que "El Faro" não é popular entre o povo dominicano seria dizer pouco. Ninguém odeia mais o monumento que aqueles que vivem na favela Maquiteria, no coração de Santo Domin- go. O farol é encostado na favela. "Não é incrí- vel ter construído essa coisa quando tem gente morrendo de fome?" pergunta o morador Jorge Merán. Os barracos onde moram os vizinhos de Merán e que não têm água encanada provavel- mente nunca serão vistos pelos turistas que vêm para admirar "El Faro". A aproximação de vi- sitas ao local será feita por uma avenida borda- da com palmeiras de coco, prédios de aparta- mentos pintados em cores agradáveis, e um mu- ro todo desenhado que a população chama "o muro da vergonha".

Até recentemente, Balaguer parecia ignorar o absurdo de gastar 70 milhões de dólares num projeto tão faraônico num país sobrecarregado com uma dívida externa de 4 bilhões de dóla- res, uma taxa de desemprego de 30% e um de- clínio da qualidade de vida para os seus 7.5 mi- lhões de habitantes, a maioria dos quais quase sempre foram pobres. Mas, os moradores das favelas começaram a protestar quando as suas

casas, ao redor de "El Faro", foram destruídas pelas máquinas para poder construir estradas e moradias de baixa e média renda para profissio- nais e militares.

Em resposta aos protestos, o governo adian- tou uma semana a data da cerimônia de inaugu- ração, ignorando assim o quincentenário de Co- lombo no 12 de outabro depois de três anos de planejar precisamente para essa data. Muitos dignitários do mundo inteiro que foram convi- dados para o evento informaram que não vi- riam, mesmo antes da mudança de data. O Papa João Paulo 11, na cidade para uma conferência de bispos latino-americanos, também manteve distância das cerimônias.

Balaguer, 85 anos, cego de glaucoma e com a saúde geral em estado ruim, já sonha em construir o farol de Colombo por quatro déca- das, desde que o antigo ditador Rafael Trujillo abriu terreno para o projeto em 1949. O plano de Trujillo não se realizou por ser caro demais, mas Balaguer ressuscitou a idéia em 1986 com base no argumento de que iria gerar mais di- nheiro vivo do turismo do que todos os cassinos de Santo Domingo juntos. A atração principal dentro do enorme farol seria um mausoléu con- tendo o que dizem ser os restos mortais do pró- prio Colombo — uma afirmação altamente dis- putada pela Espanha.

Enquanto o presidente sonhava, crescia a miséria dos dominicanos. Mesmo assim, mante- ve sua intenção de deixar a sua marca na histó- ria. Assumindo controle pessoal de quase 30% do orçamento nacional de 1 bilhão de dólares, começou a lançar dinheiro em projetos grandio- sos, tais como um novo aeroporto e um aquedu- to, sem o planejamento adequado. Um resultado foi o complexo de 415 milhões de dólares da re- serva de Jiguey e Aguacate: apesar da sua insta- lação estar completada, os canos antigos de Santo Domingo não dão conta de transportar o maior volume de água que vem da fonte nova.

Balaguer alega que ele não vai se candidatar a um sétimo mandato em 1994. Mas o dano já foi feito: alguns analistas políticos têm receio de que as instituições democráticas do país já este- jam seriamente enfraquecidas. Para esta gera-

ção de dominicanos, "El Faro" serve como um monumento, não tanto a Colombo mas a um ho- mem cegado pelos seus próprios sonhos.

TIME, 19 out, 1992.

Alfabeto do amor Letra e Música: Evandro Jair Meurer

A lembra America. B o Bra 7 C este chão Deenca

Em mãos unidas, Força e vigor. Genvn-se vidas, "Hermenos ', Sf. hon Igreja do presente é herdeira de sua história, Jamais deve pensar cm ufanismo e glória. Kulinu ou Giiaraiti, ameríndios sem vitória, Latino-Americanos. imnchas rubras na memória.

Martírio c extermínio de um povo massacrado. Na frente vinha a cruz, mas a espada ao lado. O povo que é de Cristo, vendo o índio explorado. Precisa ter consciência de um agir nuiis irmanado.

Quinhentos longos aiws de uma forte resistência, Retemínam dores, lutas pela sobrevivência.

Trocar os preconceitos pela nova consciência.

.te, Su Zclaiulo pel

ilfabeto veiadas

une povos — raça e cor. pela linguagem do amor. vida professor, onu) manda o Criador.

Esta canç gélico da Sul, ocorr eonseguli composit CP 17. Lu

o, da IEC

titura pode-se

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10 TUPARÊ DEZEMBRO/92 Arllndo G. Leite

Unipop e GMTE ■ formação em favor da causa indígena

Formação Seminário em Belém - PA Entre os dias 31.08 e 04.09.92 realizou-se

em Belém-PA, um Seminário sobre a questão indígena e o trabalho missionário, promovido conjuntamente pelo GTME e UNIPOP - Institu- to Universidade Popular. O evento contou com a participação de 18 pessoas e realizou-se em cinco noites, abordando os seguintes temas com seus respectivos assessores: 31.08 - Panorama geral sobre a questão indígena (Arlindo Leite - GTME); 01.09 - índios do Pará (Expedito Ar- naud - antropólogo do Museu Goeldi); 02.09 - O índio conta sua história (Franscisco Assurini - índio da nação Assurini); 03.09 - Reflexão teo- lógica sobre a questão indígena (Dóris Kieslich (GTME): 04.09 - Trabalho missionário com os índios (Rebeca Spires e Nello Rufaldi - CIMI norte I, e Arlindo Leite - GTME.

Curso de Antropologia em Cascavel-PR

O Curso de Antropologia "Sul" realizou-se em Cascavel,, de 13 a 22 de outubro de 1992. Participaram do mesmo 10 companheiros do GTME, 7 do CIMI Sul e 1 da UNUUÍ.

O Curso contemplou aspectos antropológi- cos dos povos Jê, especialmente Kaingang e Xo- kleng, numa primeira etapa de estudos, que transcorreu nos dias 13 a 16.09, e contou com a assessoria de Juracilda Veiga, da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP. Estrutura social, sistema de parentesco e nominação, mi- tologia, religiosidade, doenças/curas/Morte, fo- ram alguns dos temas debatidos nesta ocasião.

Numa segunda etapa, entre os dias 19 e 22.09, foram abordados assuntos relativos aos Tupi-Guarani, sob a orientação de Bartomeu Melià, do Centro de Estúdios Paraguayos "An- tônio Guasch" - CEP AG. Os temas básicos aqui estudados foram: Organização, Economia e Re- ligiosidade Guarani. Um exercício de síntese fi- nal sobre os mesmos, realizado pelos próprios participantes, foi considerado muito importante.

Arlindo G. Leite

Opan forma novos indigenistas Um grupo de dez pessoas conclui em dezembro

o curso de indigenismo oferecido pela OPAN após um estágio prático em seis áreas indígenas da Amazônia. Ali, durante dois meses, elas tiveram a oportunidade de conhecer as comunidades indíge- nas e sentir as situações vividas pelas equipes locais que atuam naquelas comunidades. Os estagiários foram recebidos pelos Enawenê-nawe (Mato Gros- so), Parintintin (Humanita-AM), Paumari (Tapaua- AM), Kulina e Canamari (Eirunepê-AM) e Katuki- na (Foz do Jutai-AM) e foram acompanhados pelas equipes locais ou outros membros para isso desta- cados.

A OPAN neste momento está priorizando a "Calha do Sul" do rio Amazonas onde se localiza a maior parte de seus projetos. Ali as áreas ainda não estão demarcadas e as comunidades encontram dificuldades para sua melhor organização. A atua- ção da OPAN pretende adiantar-se ao processo de ocupação definitiva dos territórios indígenas pelas frentes de expansão da sociedade nacional. O traba- lho com aquelas comunidades visa apoiá-las em sua organização e capacitá-las para enfrentar seus pro- blemas, com ênfase na defesa dos seus territórios. Ainda há condições de se assegurar áreas suficien- tes onde aquelas comunidades possam manter suas condições de sobrevivência como povos.

Estudantes de Teologia da IECLB estudam situação dos povos indígenas e formas de apoio

No fim de semana, de 18 a 20 de setembro, foi reali- zado um Encontro de Iniciação à Questão Indígena, no Morro do Espelho, em São Leopoldo, com a participa- ção de 25 estudantes de teologia da Igreja Luterana. Par- te dos/as estudantes envolvidos/as já mantém em funcio- namento na Faculdade de Teologia um grupo de solida- riedade aos povos indígenas chamada Marcai Tupã-Y. Este grupo organizou toda a infra-estrutura para que o Encontro acontecesse. A assessoria foi dada pelo GTME e o COMIN contribuiu com uma detalhada exposição da história e situação atual dos povos do Sul do país.

Em meio a muitas leituras, debates e vídeos, o en- contro foi marcado pelo ânimo e pela prontidão dos/as participantes para o envolvimento em tarefas que favore- çam um futuro de dignidade para as sociedades indíge- nas.

A OPAN é uma entidade indigenista, fundada em 1969, que seleciona e prepara pessoas para de- senvolver projetos de trabalho de forma direta com povos indígenas, atuando nos campos da saúde, educação, economia, defesa da terra e organização indígena. A metodologia de trabalho das equipes privilegia a convivência e a participação no dia a dia das comuinidades, procurando valorizar seu modo próprio de vida e incentivando sua organiza- ção em vista da superação dos problemas concre- tos. Os membros da OPAN são voluntários que as- sumem um compromisso de trabalho por um perío- do mínimo de três anos. Atulamente a necessidade maior é de técnicos no campo da saúde e da econo- mia.

Para o curso do próximo ano já estão sendo fei- tos os contatos com os interessados, em vista da ne- cessária seleção para formação de um grupo de 10 pessoas, os interessados podem escrever para: OPAN - Cx. Postal 615 - 78005-970 - Cuiabá-MT.

Para a seleção estamos dando preferência a quem já tem experiência de trabalho em movimen- tos de base e organização popular. Outros critérios são: formação mínima de 2o grau e uma profissão, idade entre 20 e 33 anos, saúde física e condições psicológicas para adaptar-se ao cotidiano das comu- nidades indígenas.

2 a 4 dez Curso sobre Movimentos Indígenas, na OPAN, Cuiabá no programa Teologia para o Desenvolvimento, em Vitória, ES, o GTME e a GENACORA con- tribuirão no estudo do tema "índios e Negros; Dois Pólos, Dois Destinos"

Dia dos Direitos Humanos em Cuiabá, reunião para definição de ações de parceria entre a IECLB (COMIN), GTME e OPAN Encontro de Obreiros/as do COMIN/IECLB, na Chapada dos Guimarães

17 e 18 dez - Encontro do Grupo de Trabalho Indigenista, que reúne os/ as metodistas comprometidos/as com as populações indígenas. Será em Cuiabá, na se- de da OPAN.

18 dez - Reunião da Diretoria do GTME, em Cuiabá 19 e 20 dez - Assembléia Anual do GTME, na Chapada dos

Guimarães com assessoria do antropólogo Car- los Alberto Ricardo, do CEDI.

5 a 6 dez ■

10- 14 dez

14 - 18 dez ■

LEITURAS RECOMENDADAS

. x. mmmmA i i i ■ Estudo de antropologia a partir da prática diária

ZWESTCH, Roberto (organizador)

500 anos de invasão, 500 anos de resistência São Paulo, Paulinas/CEDI, 1992, 321 páginas

Este livro reúne 16 artigos e 12 documentos relativos aos "500 anos", um texto para celebração de Ação de Graças, um mapa da América Latina e Caribe e um qua- dro com a população indígena dessa região. Trata-se de um material que aborda sob diversos e significativos en- foques a questão dos 500 anos de invasão, dominação, re- sistência e evangelização do continente Latino-America- no. Obra marcadamente ecumênica, contando com a par- ticipação de sacerdotes, pastores e colaboradores leigos das Igrejas católicas, luterana, metodista e presbiteriana unida, manifesta um amplo esforço de reflexão e compro- misso solidário com os povos indígenas, negros e margi- nalizados".

O GTME teve a oportunidade de contribuir com a ini- ciativa desta publicação, enviando para o companheiro Roberto Zwetsch, organizador da semana, os textos de Jorge Luiz Rodrigues Gutierrez, Elsa Tamez, Ana Cláu- dia Figueroa e João Dias de Araújo, originalmente rece- bidos para publicação em nosso informativo Tupari. VÁRIOS A máscara índia de Deus Cadernos do COMIN n" 1 São Leopoldo, IECLB, 1992, 41 páginas

Em setembro deste ano de 1992 comemorou-se o 10° aniversário de criação do Conselho de Missão entre ín- dios - COMIN, pelo Conselho Diretor da Igreja Evangéli- ca de Confissão Luterana no Brasil - IECLB. "Para não perder as reflexões, para não esquecer os posicionamen- tos, para não emitir conceitos equivocados sobre o passa- do de nossa própria atuação, é que decidimos lançar o exemplar n" 1 de CADERNOS DO COMIN com uma coleção de documentos, atas, folhetos, que refletem mo- mentos importantes e peculiares de nossa caminhada, de nossas experiências, de nossos posicionamentos", (da

apresentação - "Para nossa Memória..." - feita pelo P. João Artur M. da Silva, presidente do COMIN).

VÁRIOS Com as próprias mãos - professores indígenas constru-

indo a autonomia de suas escolas Brasflia, CIMI, 1992, 40 página

Desde aproximadamente cinco anos, desencadeou-se um amplo processo de mobilização e capacitação de pro- fessores indígenas, que assumiu proporções nacionais e se tomou determinante desde a reorientação das escolas em áreas indígenas até a definição das leis que regem a edu- cação indígena neste país.

O presente texto procurou reunir, de maneira sintética e didática, os principais aspectos envolvidos no processo acima referido, sob os seguintes títulos: 1 - Recordando a história dos encontros; 2 - Nascem as organizações dos professores indígenas; 3 - Temas e debates (escola, alfa- betização, etno-conhecimentos, currículo, capacitação de professores); 4 - A legislação brasileira e a educação. Há também 8 anexos, a maioria dos quais são documentos fi- nais de Encontros de Professores Indígenas. KRENAK, Ailtin Centro de Pesquisa Indígena - The Indian Research Center São Paulo, Núcleo de Cultura Indígena, 1992, 22 páginas

É um texto bilíngüe - português/inglês - em que Ailton Krenak faz um relato sobre as atividades e perspectivas do Centro de Pesquisa Indígena, do qual é Diretor Execu- tivo. O referido Centro é base do Programa Especial de Formação e Apoio à Pesquisa das Comunidades Indíge- nas.

No período de 1988 a 1992, o Centro formou 8 técni- cos de cinco povos indígenas, nas seguintes áreas: vivei- ros de mudas, processamento de frutos e essências, pei- xes e camarões, animais silvestres e agricultura regenera- tiva.

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DEZEMBRO/92 TUPARI 11

A coisa mais bonita que temos dentro de nós mesmos é a DIG-

NIDADE. Mesmo se essa está mal- tratada. Mas não há dor ou tristeza que o vento e o mar não apaguem. E o mais puro ensinamento dos velhos, dos anciãos partem da SABEDO- RIA, da VERDADE e do AMOR. Bonito é florir no meio dos senti- mentos impostos pelo poder. Bonito é florir no meio do ódio, da inveja, da divisão, da mentira ou do lixo da sociedade. Bonito é sorrir e amar quando uma cachoeira de lágrimas nos cobre a alma! Bonito é poder di- zer SIM e avançar. Bonito é constru- ir e abrir as portas a partir do nada. Um futuro digno espera os Povos In- dígenas de todo o mundo. Foram muitas vidas violadas, culturas, tra- dições, religiões, espiritualidades e línguas. A VERDADE está chegan- do à tona, mesmo se nos arrancam os dentes! O importante é prosse- guir. É comer caranguejo com fari-

«nisso nha, peixe seco com beju e mandio- ca. É olhar o mar e o céu. E reve- renciar os mortos: os ancestrais. É sonhar os sonhos deles e vê-los. É conviver com as "manias do cabo- clo", que na realidade são as rela- ções mais sagradas de nosso povo, porque são relações com a terra e com o criador, nosso Deus Tupã. Bonito é vestir os trajes do TORE e honrar-se como se vestira os trajes dos reis e senti-lo como a expressão máxima das relações entre o homem, a terra e Deus. E sentir o sagrado e o universo. O importante é crer e con- fiar mesmo que na noite anterior vio- laram nossa casa ou nosso corpo. É preciso ouvir os velhos, p som do mar, dos ventos e do sol. É preciso a unidade Potiguara, por isso pedimos a Tupã que nos proteja e dê um basta ao sofrimento secular de nosso Povo

.comedor de camarão: Povo Potigua- ra. Pedimos à força superior, que nossos pensamentos se elevem aos

mais profundos planos sagrados da espiritualidade indígena Potiguara, junto aos velhos pajés apagados pelo Poder, mas renascido como FOR- ÇA, pela consciência do Povo. Pedi- mos que nossos espíritos se elevem ao sagrado da sabedoria humana e receba a irradiação do amor, da PAZ e do conhecimento à todas as nossas cabeças Potiguara, transformando to- do pensamento discordante ou confli- tuado em pensamento de PAZ que construirá a unidade indígena.

Que possamos construir a partir de agora, uma grande frente de ener- gias, apoiada por todos os que lêem esse compromisso, para garantir a DIGNIDADE de um Povo abando- nado, condenado à extinção.

NÃO! Não podemos admitir a derrota. Há jovens, há crianças sor- rindo, há mar, há sol, há esperança. Há espiritualidade! Basta que solte- mos as amarras do racismo, do egoísmo, esse inimigo que divide o

nosso povo. Abramos a porta. Entre- mos. Nossos velhos nos esperam pa- ra a cerimônia da paz profunda e da luz inquebrantável. Oremos também ao guerreiro, amigo e protetor dos Potiguaras do dia 29 de setembro. Um grande memorial se construirá em homenagem aos pajés, aos anciã- os, aos guerreiros, defensores eter- nos da terra e da natureza.

Vamos, meu povo, elevemos nossos pensamentos à Tupã e abra- mos nosso coração na "Oração pela Libertação dos Povos Indígenas" não só pelo Potiguara, mas pelos 300 milhões de índios que habitam o pla- neta TERRA — E pensemos na frase sábia do cacique Xavante Aniceto: "A Palavra da Mulher é Sagrada co- mo a Terra".

Eliane Potiguara

A planta abençoada Uma História Esquecida Me preocupo muito com os meios

de subsistência para meu povo. É mui- to difícil, porque nós somos donos, quer dizer, foi demarcado, há muito tempo, um território de 4 mil hectares para nós e hoje nós só possuímos 28 hectares. Tudo o mais está ocupado por fazendeiros.

Temos poucos velhos, porém, o pouco que temos é o suficiente para passar para gente nossa história e tam- bém a nossa linguagem, macrojê. Nós temos um livro que contém a lingua- gem todinha. Só que a gente pega um livro... se eu emprestar um livro da- queles para vocês, vocês não vão en- tender nada, porque eles são diferen- tes. Então através da orientação deles, a gente pede, eles vão falando e a gen- te vai aprendendo e tenta passar para os menores, nós mesmos, os jovens, vamos tentando passar.

Se a gente planta e cresce uma planta sadia e tal é porque alguém está abençoando aquilo ali. E quem é? Um ser superior a nós. Se existem as estre-

las... sei lá... é alguma coisa assim, e alguma pessoa superior, e essa pessoa superior à gente... é Deus!

Ninguém tem religião, assim, espe- cífica... eu sou de tal igreja... não existe. E não tem adoração a um Deus, assim, como por exemplo um Tupã. Não tem, não existe essa coisa. Todo mundo acredita em um Deus, no mes- mo Deus que vocês acreditam, porém não tem nenhuma religião.

Se eu tenho religião? Bem, eu tam- bém não tenho. Eu freqüento a igreja metodista, porque eu moro nos fundos de uma igreja, mas quando eu mudei pra lá, eu morava em Conselheiro Pe- na e não freqüentava igreja nenhuma.

Eu gosto de ter liberdade, eu gosto de ser livre, escolher, portanto lá nin- guém fica em cima de mim... "hoje você vai à igreja". Me chamam, às ve- zes as pessoas fazem o convite.

Dirlene Krenak

z^" Judeus questionam "Evangelização A chegada dos europeus à

América, em 1492, coincidiu com a expulsão dos mouros da Espa- nha. E se as atuais comemorações do Quinto Centenário vêm levan- tando uma onda de críticas, o mes- mo se refere aos eventos do ciclo Sefarad, que lembram a emigração forçada dos judeus espanhóis. Cor- rentes políticas, grupos de intelec- tuais e representantes de etnias in- dígenas americanas, consideram que comemorar o Quinto Centená- rio representa um aval ao que constitui o primeiro passo para o genocídio americano. E, da mesma forma, um grupo de intelectuais ju- deus da Itália lançou o movimento Gerush, que defende a transforma- ção do ano que marca o meio milê- nio de exclusão dos não-cristãos da Espanha, em um ano de luta pela

tolerância. Uma das coordenadoras do Ge-

rush, Ana Borioni, lembra que, "o massacre dos não-cristãos america- nos foi precedido pela exclusão dos não-cristãos na Espanha, quer di- zer, a colonização aconteceu base- ada na intolerância, e isso deve ser revisto". Ela inclusive aproveitou a ECO-92, no Rio de Janeiro, para fazer contatos com lideranças indí- genas, negras e muçulmanas. "Em nossos tempos, onde a intolerância é moeda corrente, atividades mo- destas talvez sejam importantes no sentido de resgatar a luta pela con- vivência pacífica das diferenças", concluiu.

extraído do jornal Vermelho & Branco, do ISER.

Quando falamos e refletimos sobre os 500 anos de evangelização, ou me- lhor, 500 anos de CONQUISTA, te- mos a tendência de pensar apenas na Igreja Católica-Romana e nos interes- ses de Espanha e Portugal. Por esta causa os Anglicanos, e seguramente outras igrejas não romanas, se sentem isentos de culpa ou participação. E uma dupla sensação que envolve a tranqüilidade de ter se omitido e satis- fação de não ser católicos-romanos.^

Porém a verdade é que a história da conquista dos povos indo-america- nos está na base da história do anglica- nismo na América Latina.

Poucas informações vazaram na história dos conquistadores. O que sa- bemos é que já por volta do ano 1769 eram batizadas cem pessoas do povo Miskito na costa atlântica da Nicará- gua. Um lugar conquistado pelos ingle- ses. Quase um século depois, em 1872, eram batizados os primeiros anglicanos nativos da América do Sul, dos povos da Tierra dei Fuego no Sul da Argenti- na. Isto antes de chegarem os primei- ros missionários norte-americanos ao Brasil que dedicaram-se a evangelizar os euro-americanos latinos.

Isto aconteceu por várias causas. Do ponto de vista missionário a Igreja da Inglaterra recusava fazer missão nos países considerados católicos-romanos (isto é entre os latinos). Sim podia ser feito um trabalho missionário entre po- vos considerados pagãos e sem cultura. Um escritor anglicano inglês, Neill, expressa isto com esta frase:

"... solitários patagônios dessa fria e desolada região considerados por muitos como a mais inferior e degrada- da das espécies humanas..."

Mesmo carregada por interesses comerciais e colonialistas a missão dos anglicanos teve características diferen- tes a dos Católicos romanos. Na Nica- rágua chegaram a dar armas para os indígenas, usando-os como soldados na defesa dos interesses britânicos. Na América do Sul a prática mais comum foi a compra de terra para os povos na- tivos.

Comprar terras foi a alternativa as- sistencialista para enfrentar o despojo que sofreram estes povos. Sem dúvida muitos converteram-se ao cristianismo

e ao anglicanismo mais pela terra que pela eloqüência de pregadores euro- peus. Um exemplo prático aconteceu em Equador recentemente. A Diocese comprou terras para um povo com a condição de instalar ali uma igreja. O acordo era que depois de alguns anos a propriedade passasse à mão do povo o que não aconteceu. Assim os indígenas passam a depender das terras que são proriedade da igreja. Terras compra- das para os indígenas são realidades que permanecem até hoje nas missões sustentadas pela SAMS (Sociedade Missionária para América do Sul) no Chile, norte da Argentina e Paraguai.

Prova da superioridade com a que sempre se revestiram os missionários ingleses é que, mesmo sendo os pri- meiros batizados na América do Sul, os irmãos indígenas só foram ordena- dos ao ministério sacerdotal depois de muitos latinos com menos tradição dentro do anglicanismo.

Até hoje quando contamos com de- zenas de sacerdotes destes povos na América do Sul, e um Bispo do povo Mataco, pouco se ouve falar da sua te- ologia, eclesiologia e participação nas decisões da igreja a nível regional e mundial. Quanto poderíamos aprender de nossos irmãos e irmãs anglicanos por tradição ou por imposição? Há uma grande contribuição para a igreja latino-americana ofuscada pelo domí- nio cultural e eclesiástico. Na última conferência de Lambeth o lugar de Dom Mário Marinho, Bispo Mataco do Paraguai, foi ocupado por um inglês. O argumento foi que Dom Mário não se sentiria bem participando daquela reunião na Inglaterra e então desistiu.

Como anglicanos podemos reverter esta história de dominação e esqueci- mento? Quem sabe, ao descobrir nossa história nativa possamos assumir um novo papel na luta pela dignidade dos povos e pela integridade da fé cristã que, mal ou bem, ficou enraizada neste continente. Dom Almir dos Santos, presidente do GTME e Bispo de Brasí- lia, está sem dúvida na frente de um novo desafio para os anglicanos.

Rev. Humberto E. Maiztegui Gon- çalves pastor anglicano em S. Fco.de Paula, RS.

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12 TUPARI DEZEMBRO/92

Evangelho e indiferença não caminham juntos ^■^ ^ *~ Romulo Faldini

Em 1980, eu, meu irmão e alguns terenas, viemos à Brasília para es-

tudar, arrumar um bom emprego, e criar uma situação de vida melhor, ser rico, ter dinheiro. Nós tínhamos desco- berto que ter dinheiro era importante para o branco. Tendo dinheiro e estudo nós seríamos aceitos. Mas ao chegar- mos em Brasília conhecemos outros in- dígenas que lutavam por suas terras. Até então não sabíamos da existência de outras tribos. O contato com eles nos fez entender que havia diferença entre índios e não índios. E nós éramos índios terenas. Descobrimos então que tínhamos que recuperar nossa identida- de, e para isso precisávamos primeiro ter nossa terra. Certos disso, nos uni- mos a outras nações e fundamos a União das Nações Indígenas - UNI.

Eu nasci num lar cristão, mas mui- tas coisas do cristianismo eu não enten- dia. Os missionários ingleses foram os primeiros a chegar em nossa aldeia. Is- so nos marcou muito. Na época, esses missionários não tinham uma metodo- logia transcultural para falar aos nos-

em-MiíHft

Rubens Matuck, 91, aquarela s/ papel de algodão ■ Prospecto exposição Araweté

sos patrícios. Isso nos fez sofrer muito, não por leva- rem a Palavra de Deus, mas pelo modo como a leva- ram. A mensagem nunca foi contextualizada ao dentro do universo de minha tribo. Para nós, os Te- rena (MS), Deus é Ituko-Óviti, que quer dizer "o criador", mas muitas tribos foram ensinadas a adotar outro Deus e a associar toda nossa cultura às coisas do mal. Outro exemplo que posso citar é a questão de pobreza e riqueza.

A riqueza no padrão capitalista não existe na al- deia. Não sabíamos o que era ser rico ou pobre. Só fui entender isso quando, por questão de doença na família, fomos parar em Campo Grande (MS), numa época difícil para nós, pois meu pai não tinha uma profissão que nos garantisse sustento adequado. Nes-

ta situação tivemos o primeiro contato com as crian- ças brancas da nossa idade. Crianças que passavam fome, órfãs e abandonadas. Foi assim que entende- mos a questão da riqueza e da pobreza.

Na aldeia não tínhamos classe média, alta e bai- xa. Hoje já há esta divisão, embora não seja como entre os brancos, mas em outras tribos não existe es- te problema. A Bíblia ensina que não devemos juntar tesouros na terra. Nós já sabíamos disso, sem nunca termos lido a Bíblia.

Temos problemas, mas usamos a natureza e o que ela nos oferece. Minha avó sempre dizia: "A criança aqui não passa fome. Agora estamos na épo- ca da guavira, acabou a guavira vem a araticu, aca- bou o araticu vem a manga, acabou a manga começa

Romulo Faldini

o caju." Você nunca vai ver em nossa al- deia uma criança desnutrida ou abandona- da. Pra nós, a criança é o princípio da vi- da. Você nunca verá um menino roubando porque o órfão também tem educação. Não a educação capitalista, mas uma cultura que passa dos velhos para os jovens. Lá você não vai encontrar pessoas sem mora- dia, porque vivemos em comunidade. Quando temos uma caça, todos comem, as crianças e os mais velhos pegam a melhor parte.

Me preocupa o fato de muitas igrejas não reforçarem as lutas indígenas.

Por muito anos e especialmente duran- te a Constituinte, reunimos em Brasília aproximadamente 400 índios para fazer o nosso "Lobby". Vocês acompanharam pe- la televisão nossas idas aos Ministérios e aos gabinetes de políticos. Muitos índios não crentes nos cobraram: vocês que são crentes têm missionários nas aldeias. Por que eles não estão aqui para nos ajudar? Fiquei com vergonha. Os missionários fa- lam que vão estar conosco, mas na hora em que precisamos eles não aparecem. Quem aparece são os padres do CIMI,

CNBB, com advogados, financiando nossas passa- gens e nossas despesas, enquanto encaramos as pes- soas que estão contra nós. E onde estão, os pastores?

Quando eu e outros terenas crentes procuramos alguns dos deputado evangélicos para nos ajudar, eles nos viraram as costas. Com exceção da irmã Be- nedita. O povo evangélico nunca se uniu a nós nas questões sociais.

Carlos Justino Marcos, o Carlos Terena, é membro da Igreja Batista Central de Taguatin- ga, DF, tem 35 anos e preside o CONPLEI ■ Conselho Nacional de Pastores e Lideranças Evangélicas Indígenas.

O texto foi elaborado a partir de uma entrevista feita por jovens batistas de Campinas e publi- cada na revista Juventude, de maio de 92.

A compreensão que nasce da convivência Um grande antropólogo francês. Mareei Mauss,

fez um belo estudo sobre o assunto — o Ensaio sobre a dádiva — baseado em dados sobre comunidades aborígenes melanésias. Importante é perceber que tal estrutura está presente na grande maioria das socie- dades tribais não estratificadas, quer dizer, socieda- des não divididas em castas ou classes sociais. Foi uma descoberta verificar que ainda hoje podemos en- contrar comunidades humanas nas quais o poder está, de fato, na comunidade, de modo que as lideranças que existem têm a obrigação de prestar serviço. Um chefe, por exemplo, geralmente é o mais pobre por- que é aquele que mais tem que dar, distribuir bens, única forma de manter alto o seu prestígio e o de sua comunidade. Foi gratificante observar como neste povo o direito à vida precede todos os demais direi- tos e ver como ele se concretiza por meio de regras sociais de convivência bastante estritas. Roubar entre os Kulina não é crime, quando muito, apenas um mo- tivo banal de fofoca. Grave mesmo é sovinar, deixar de dar aquilo que se tem. E quando isto acontece, o roubo nada mais é do que repor o equilíbrio comuni- tário quebrado por aquele que deseja guardar, escon- der, acumular bens, alimentos ou qualquer outra coi- sa. Que diferença em relação aos nossos padrões cul- turais! Pode-se imaginar o grau de liberdade que uma cultura como a dos Kulina proporciona. Diante de um Kulina livre em seu mundo, um arrogante oci- dental cora de vergonha, se for honesto.

Entretanto, a história é tragédia também. Acossa- dos por todos os lados, objeto de preconceito e escár- nio por parte de pessoas e grupos que cobiçam suas

terras e riquezas, os Kulina e outros de seus parentes cqjno os Yanomami, Xavante, Kaxinauá, Tucano, Tapirapé, Kayapó, lutam e defendem como podem — com as mais diferentes "armas" — os seus direitos.

Na Constituição brasileira de 1988, artigos 231 e 232, os povos indígenas conseguriam uma grande vi- tória. Neste artigos estão assegurados que os seus di- reitos à terra, às tradições e costumes, à língua, en- fim, à cultura autóctone são direitos originários e inalienáveis. Essa conquista lhes dá respaldo legal para fazer frente a poderosos interesses de pessoas e grupos — nacionais e multinacionais — que avançam sobre os territórios indígenas em busca de lucros des- medidos.

Em meio a todas estas realidades francamente conflitivas, nós cristãos nos encontramos como uma pequena barca enfrentando fortes ondas e tempesta- des, a ponto de quase soçabrar. Não só nos sentimos pequenos e frágeis, porém sentimo-nos igualmente desafiados e comprometidos com a busca de novas relações, mais simétricas e criadoras de fraternidade e libertação, de modo que, nossa solidariedade cristã — que brota do centro da nossa fé, da própria pessoa do Crucificado — seja concreta e redunde em favor da vida e do futuro que os próprios indígenas estão penosamente construindo (ou reconstruindo?).,

Seria colaborar nesta reconstrução uma tarefa que compete a missionários evangélicos? A pergunta é possível, sem dúvida. Mas da mesma forma como se faz esta pergunta, deveria-se ter a capacidade de ou- vir o outro lado da moeda. Ouvir em primeiro lugar o clamor que vem das comunidades indígenas. Em

segundo lugar, ouvir a voz daqueles que têm se com- prometido numa caminhada com os povos indígenas buscando alternativas de uma vida nova, recobrada e livre outra vez. Em terceiro lugar, ouvir a voz do Es- pírito que se eleva desde o sofrimento dos oprimidos e dos povos discriminados, através dos quais pode- mos identificar — quem sabe — o próprio grito de Jesus (Mt 25, 31ss, I Co 1,25, ss; Lc 4,16ss).

Assim, talvez possamos no futuro recuperar em parte a credibilidade da igreja cristã, tanto tempo aliada do colonialismo e dos poderosos de plantão. Recuperar a confiabilidade no próprio Evangelho — mensagem de vida e salvação — que recebemos gra- tuitamente, mas que uma história de desserviço, con- formismo, intolerância e opressão quase desautorizou irremediavelmente. Hoje, há um desafio para aqueles que levam a sério a missão que vem de Deus: assu- mir a dor e o projeto dos excluídos, dos povos indí- genas, dos negros, das mulheres, das crianças aban- donadas, das viúvas e aposentados, de todos aqueles "pobres" que não têm valor perante o moderno mundo inteiro. A partir daí, rever toda a nossa cami- nhada para — no espírito de Cristo Crucificado e Ressurreto — renovar a nossa frágil fé, a fé que só existe quando atua pelo amor, como bem disse Pau- lo, na sua epístola da liberdade (Gl 5,lss).

Lori Altmann e Roberto E. Zwetsch — casal que atuou por muitos anos entre o povo Kulina. Ambos são ministros da IECLB e mestrandos em teologia. — A primeira parte desse texto mais o que aqui consta, foi publicada no JOREV, de dez/ 91.

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DEZEMBRO/92 TUPARI 13

Mantos negros e corações partidos ^ll .y ^3 JÊL Loren Mc. In

Há 500 anos, quando os colonizadores brancos chegaram à nossa terra, o mais estranho deles vinha na frente, vestido todo de preto, parecia

ser um urso, mas não caminhava como um. Estava vestido com um chapéu e um manto negro, também tinha pêlos negros em sua face. Ele fez uma coisa estranha. Caiu de joelhos e olhou para o céu com seus braços levan- tados. Começou a falar estranhas palavras que o povo não podia entender. Tomou um pequeno objeto preto que estava em sua mão, o qual ele abriu e leu alto, enquanto os outros estavam ajoelhados.

Este acontecimento mudou o curso da história para os povos nativos na América do Norte. Estas novas pessoas trouxeram com elas seus costu- mes e suas maneiras, diferentes das nossas. Aqui onde nós somos o "povo original", nossa língua e estilo de vida quase se foram. Nossa cultura tem sido substituída pelos costumes do povo branco e pelo cristianismo.

Òs insultos são ainda um dos maiores passatempos da sociedade bran- ca, mesmo entre algumas pessoas de igreja que se sentam juntas, que lide- ram as congregações. Alguns ainda intimidam os nativos com tiros, em muitos lugares do país.

Quando chegaram aqui os colonizadores brancos não podiam sobrevi- ver, não podiam competir com a aspereza desta terra. Por razões desco- nhecidas para estes, os assim chamados selvagens, vestidos apenas com pe- les de animais, vieram e os ajudaram. Eles os ensinaram como caçar, pes- car, plantar milho, tirar a pele dos animais, como preservar a carne e especialmente, como fazer roupas que os capacitaria a sobreviver durante os meses de inverno.

Mas o povo nativo entrou em declínio assim que o povo branco inter- feriu nos assuntos dos nativos: os Iroquóis trocaram peles de animais por armas dos ingleses ou dos holandeses, por exemplo, enquanto os Hurons, aliados à França, tinham de parar com suas crenças tradicionais e se tornar cristãos antes que pudessem pegar em armas. O povo nativo começou — através do contato com a cultura européia — a lutar por lucro pessoal.

Lucro pessoal, avareza e vingança não era parte do estilo de vida de- les. Isto foi trazido pelos europeus, que agora começaram a arruinar o "círculo de vida" que era o funda- mento da cultura nativa.

A intervenção religiosa manipt • lou a maior parte do declínio dest-' nação antes poderosa. Declararam se "salvadores" destes "selva gens", "os mantos negros" qui viajaram da Europa para a terra d( povo Huron, suas cabeças cheias dt sonhos de que sua fé cristã podk conquistar a cultura "selvagem" dos povos nativos.

Com o objetivo de negociar com os franceses, o povo Huron tinha que concordar em levar os jesuítas para dentro de suas vilas. Então o outono veio, o tempo em que as pes- soas se mudavam para casas grandes e repletas para o inverno. As doen- ças vieram trazidas pelos europeus que se mudaram rapidamente para os quartos esfumaçados e fechados.

E como as crianças tossiam, os "Mantos Negros" anunciavam: "Seu líder espiritual é falso. O cu- randeiro está trabalhando para o de- mônio". Varíola, catapora, saram- po, e o maior assassino — gripe — matou o jovem, o velho, e alguns dos mais saudáveis. Divisões cresce- ram entre o povo da vila, causadas pelo cristianismo. O povo Huron que acreditava no Deus cristão, não ajudava a defender a vila, mesmo quando havia um ataque dos Iro- quóis.

Cristãos. Quem eram os real- mente espirituais? O povo nativo que acredita que os objetos inanima- dos têm espírito? Ou aqueles que

Beto Ricardo, CEDI

O Pajé Mirã-no, exposição Araweté

Intyre

acreditavam que os nativos eram pagãos e sub-humanos e podiam ser aprisionados ou enviados para outra terra?

Existem muitos nativos cristãos, pessoas que acredi- tam em Deus, que fazem perguntas sobre o céu, que estão sendo batizadas, que estão fazendo tudo o que é pedido a elas. E existem tra- dicionais, que acreditam em sua cultura. Eles são aqueles que nunca mudariam por ne- nhuma razão. Eles são aque- les que acreditam que todo homem, mulher e criança devia aprender sua cultura, aprender quem eles realmen- te são, antes que seja muito tarde.

Poucos nativos no Cana- dá, hoje, são tradicionalis- tas. Mas, é devido a estas Xavante, Revista Tempo e Presença, CEDI, 167 poucas pessoas que nossa cultura está ainda viva, é através delas que espe- ro descobrir minha própria verdade. Este é o passo que eu gostaria de to- mar, mas, vagarosamente para tentar me adaptar a uma sociedade que era única, um "círculo de vida", livre para percorrer a trilha da minha vida do princípio ao fim.

Eu quero conhecer as curas nativas, como sarar nossas doenças com ervas e raízes, sem a interferência do governo e das igrejas. Nossa medici- na funcionou muito bem quando a terra era livre de poluição.

Até dez anos atrás, quando nós en- trávamos na cidade, ainda ouvíamos "índios bêbados". Nós ouvimos isto muito bem. Nós somos pagãos e selva- gens aos olhos de algumas das igrejas, aos olhos de algumas pessoas brancas. Outros olham para nós como iguais a eles e caminhamos juntos.

Estamos tentando viver em uma so- ciedade que foi construída em volta de nós. As igrejas brancas, o governo, so- mente queriam fazer o que era bom, mas eles fizeram? O bem que eles fize- ram, foi somente para eles mesmos, nos destruindo vagarosamente, nos empur- rando para trás, a deixar os nossos cos- tumes com o propósito de que a cultura deles florescesse.

Agora, depois de 500 anos, o que resta do povo nativo? Onde estão os verdadeiros nativos do Canadá?

Nós estamos começando a reacender o fogo de nossa cultura, com a esperan- ça de que ele criará a chama, que pode- rá ser vista e sentida por todas as nações de um lado a outro da América. O ardor da cultura outrora altiva, que foi quase perdida, uma cultura que está voltando com o propósito de que nós possamos ser alguém novamente. Isto está verda- deiramente começando a acontecer.

Neil Monague ■ conselheiro de droga- dos e alcoólatras em Christian Island,

, Ontario - da Revista Observar da I. Unida do Canadá. Traduzido por Tel- ma P. Santos Coelho.

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14 TUPARI DEZEMBRO/92

A propósito do dia da reforma protestante -31 de outubro A pobre gente, explorada e massacrada

posicionamento de um reformador sobre o colonialismo , uando Cristóvão Colombo man- dou rezar o primeiro Te Deum no

12 de outubro de 1492 na ilha de Guanahani, no arquipélago das Baha- mas, Martinho Lutero tinha 9 anos.

dia i:

Flor Garduno, revista du, heft nr. 1, januar 92, Deutschiand

Quando o monge dominicano Antônio de Montesinos dirigiu sua primeira predica contra as crueldades praticadas e a tirania da conquista no advento de 1511, Lutero há pouco havia sido con- vocado para Wittenberg. Um mês an- tes das disputas de Lutero em Worms, Fernão de Magalhães "descobrira" as Filipinas. A conquista das Novas Ter- ras aconteceu numa época, em que a Reforma criava espaços para a nova li- berdade evangélica na Europa. É de se admirar que os primórdios do colonia- lismo e os violentos debates sobre a sua legitimação praticamente não en- contrem menção na tão extensa litera- tura reformada.

Um dos poucos reformadores que, pelo que me consta, se posicionou cri- ticamente frente aos acontecimentos nas Novas Terras, foi Martin Bucer. Martin Bucer (1491/1551) era de ori- gem humilde e, antes de se ligar ao movimento da Reforma, era monge dominicano. Como tal ele certamente tinha conhecimento da considerável re- sistência que principalmente os domi- nicanos ofereciam contra a situação nas Novas Terras. Bucer escreve já em 1538: "Infelizmente, no entanto, ve- mos que eles se procuram adonar das terras e dos bens de judeus, turcos e outros hereges, mas pouca seriedade se sente quanto a um esforço para salva- rem as suas almas para Cristo, nosso Senhor. E isto não somente na parte dos príncipes, que são denominados de senhores deste mundo, mas também da parte dos assim chamados guias espiri- tuais...

Em conseqüência disto sente-se também uma pesada ira de Deus contra a descoberta e conquista das novas ter- ras e ilhas, empreendimento do qual tanto se vangloriam, assim como se a cristandade crescesse consideravelmen- te, desta forma. Com este empreendi- mento eles não fizeram outra coisa que se apropriar do corpo e dos bens desta pobre gente, acima de tudo, para em seguida também se adonarem de sua alma através de uma falsa fé que é en- sinada pelos monges peregrinos.

Eu ouvi que João Glappion, con- fessor de Sua Majestade o Imperador, lamentou diante de pessoas idôneas que os espanhóis estão forçando esta pobre gente das terras recém descobertas a procurar ouro e outras coisas e que a estão torturando de tal forma que, quando o trabalho e o sofrimento se tornam insuportáveis, muitos se suici- dam.

Por outro lado, quais são as conse- qüências para o nosso povo? Quanta gente boa se perde nas travessias, e, quando se pensa ter ganho muito, en- tão se trata somente de bens materiais, estímulos para guerras terríveis, pom- pa e orgulho (para uns poucos) e opressão para o povo pobre e simples. Em conseqüência uns poucos concen- tram em suas mãos os bens e proprie- dades de todo o mundo através deste comércio e do lucro e depois se apro- veitam dos outros, assim que muitos, apesar de trabalharem duramente, mal e mal têm pão seco para comer. A isto então eles chamam fazer a fé cristã crescer. Que o Senhor dê aos nossos

La Pacifica, Equador, 500 anos príncipes e superiores juízo e vontade para que aumentem e melhorem a cris- tandade' '.

Estas colocações evangélicas de Bucer são interessantes, em muitos sentidos. Quatro aspectos me cairam de uma maneira especial em vista: 1. Martin Bucer vê e reconhece que nas terras e ilhas recentemente con- quistadas vivem pessoas. O seu sofri- mento não o deixa indiferente. Ele as chama de "esta pobre gente". Isto é incomum. Francisco de Vittoria, um dos mais conhecidos humanistas espa- nhóis do século XVI, define "esta po- bre gente" como sendo bárbaros, im- becis, idiotas, ingênuos, seres que não são muito melhores que gado e animais selvagens e extremamente burros. Sua conclusão: É justo e correto que se in- tervenha em suas terras e que se exerça uma espécie de tutela. Bucer denomina os povos submetidos carinhosamente "esta pobre gente" e lastima que lhes seja tirado bens e posses, saúde e vida, e que sejam submetidos ao trabalho forçado e a tortura ao ponto de muitos cometerem suicídio. O texto do grande humanista espanhol aponta para a tra- dição colonialista que tem sua continui- dade em afirmações de menosprezo e paternalismo contra os povos do Ter- ceiro Mundo que ainda se pode ouvir hoje. A perspectiva de Bucer relembra a solidariedade e somente ela corres- ponde ao Evangelho.

2. De acordo com o Evangelho está a crítica de Bucer quanto às conse- qüências decorrentes da conquista para os conquistadores. Emerge uma nova compreensão de mundo e vida. A con-

quista de acordo com Bucer leva "ao acúmulo de bens materiais, a estímulos para guerras terríveis, à. pompa e ao orgulho (para uns poucos) e à opressão do povo simples e pobre"; em outras palavras: a conquista tem por objetivo único o acúmulo de riqueza material e, em conseqüência, concentração de po- der, pompa e luxo para uns poucos e opressão para os pequenos. Esta atitu- de e tipo de comportamento eram ina- ceitáveis até lá para a moral da época. Paulatinamente elas se tomam comuns.

Na crescente contradição entre ex- pansão colonialista e moral havia duas possibilidades: ou se superava o colo- nialismo ou se descartava a moral. Se é certo que com o passar dos tempos a moral colaborou para enfraquecer as bases do colonialismo, mais certo é que o colonialismo minou a moral. "A homogenização dos valores através do dinheiro" é atualmente mais do que nunca a base espiritual para o sofri- mento e morte de pessoas sem conta em todas as partes do mundo. Reco- nhecer e denunciar este mecanismo e se converter deste caminho perverso é o grande desafio que nos é imposto pe- lo Evangelho. A referência de Martin Bucer à perda de pessoas valiosas e à ambigüidade do que se entende por lu- cro e ganho não perdeu nada em atuali- dade.

■ 3. Também no "reconhecer dos si- nais dos tempos" (Lucas 12.56) com olhos abertos e consciência desperta Martin Bucer se deixou guiar pelo Evangelho. Ele já observou um fato do qual paulatinamente também nós esta- mos tomando consciência: a Europa

como um todo necessariamente não lu- crou com o colonialismo. Bucer diz que são uns poucos que concentram em suas mãos as riquezas e os bens de to- do o mundo e com eles fazem o que bem entendem e que para os restantes mal e mal deixam o necessário para so- brevivei apesar do duro trabalho. Há um estudo em que é feito o cálculo so- bre os gastos e ganhos do colonialismo alemão entre 1871 e 1914, que chega à seguinte conclusão: O Império Alemão gastou mais com o colonialismo que lucrou. O colonialismo como empreen- dimento subvencionado? Certamente que não. Mas os que verdadeiramente lucraram foram as grandes firmas e bancos, ainda hoje conhecidos, que na- quele período ficaram grandes, rece- bendo subvenções do governo para os seus negócios. "Uns poucos..." diz Martin Bucer.

Este estado de coisas continua inal- terado no atual neocolonialismo. Os grandes conglomerados fazem os gran- des negócios. Eles estão em condições de submeter aos seus interesses a polí- tica, o direito, a moral e a religião. Aqui se manifesta o verdadeiro ateis- mo de nossa época, a negociação de Deus na lógica da multiplicação do ca- pital e na exploração ideologicamente camuflada. A longo prazo isto não tra- rá bons frutos para as vítimas de qual- quer jeito não, mas também não para os agentes da exploração, seus aliados e beneficiados. Deixar-se guiar pelo Evangelho implica em ter coragem pa- ra denunciar este problema.

4. Bucer também pensa na dimensão missionária do Evangelho. Ela consiste na esperança e na tarefa de colaborar para que o Reino de Deus ganhe espa- ço neste mundo. Será que Bucer está se dirigindo às pessoas certas, quando ele espera justamente das autoridades que elas venham "aumentar e melho- rar a Cristandade"? Certo é que ele aparentemente não tinha em mente a fé cristã como justificativa para a con- quista. Com o argumento da cristiani- zação, porém, os conquistadores mini- mizavam e justificavam a sua práxis destruidora. Apesar de sua sede por ouro e da sua iniciativa de escravizar os índios, Colombo foi um homem profundamente religioso, que nada mais queria do que glorificar Deus neste mundo. Mas isto não é possível a ferro e fogo, à força e à base da inqui- sição, também não na aliança entre o missionário de Cristo, o mercador to- mado pela cobiça e o soldado saquea- dor. Isto somente é possível no segui- mento a Cristo e isto significa na soli- dariedade com a "pobre gente" sofredora e marginalizada, indepen- dente de sua cultura e raça. Isto so- mente é possível na corajosa resistên- cia evangélica contra os poderosos, que pisam a dignidade humana dos ou- tros e a sua própria. Isto também é possível somente no serviço desapega- do às criaturas de Deus, quando não se pergunta a que religião pertencem, quando não se converte e batiza a qual- quer preço, mas antes de mais nada e unicamente se procura preservar e fo- mentar vida.

Guenter Reese, é pastor Luterano (Tradução de Arteno Speilmeier)

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DEZEMBROI92 TUPARI 15

44 Por todos os meus parentes ^5

Justiça, Paz e Pesadamente vestidos, preparados para o

meio metro de neve cobrindo a encosta do monte, um pequeno grupo de pessoas, paradas quietamente em volta do que parecia uma per- feita, se preferir, grande, árvore de Natal. A maioria, índios americanos de uma variedade de tribos e todos membros de uma congregação in- dígena de pessoas estavam fazendo orações em favor da árvore.

Podia ter sido mais uma excursão congrega- cional para colher uma árvore de natal para sua igreja, exceto que estas orações eram uma total mistura de orações cristãs e orações de tribos indígenas tradicionais. Algumas das pessoas es- tavam realmente falando com. a árvore, falando palavras de consolação, justificação, intenção e promessa. Os dois pastores mantinham tabaco em suas mãos, prontos para oferec|ê-lo de volta para o Criador, oferecê-lo pela vida desta árvo- re, oferecê-lo para as quatro direções, acima e abaixo, oferecê-lo com o objetivo de manter a harmonia e o equilíbrio da criação mesmo na perpetração de um ato de violência.

Há um senso real de valor cultural sendo exposto nesta reunião. Há aqui uma atitude vol- tada para criação e para todas as criaturas, que diferencia os americanos índios dos outros lip- ricanos e da maior parte dos europeus. Ainda é a característica preferida de um grande númerõl de povos indígenas do mund^), representadas de um sólido valor cultural que persevera mçs- tno naquelas comunidades indígenas que têm si- do convertidas ao Cristianismo.

Talvez um forasteiro descreveria a atitude destes índios como de temor reverente ou es- panto. Nós índios americanos não pensamos co- mo nenhum deles, mas preferíamos chamá-lo de "respeito" - a atitude apropriada de respeito necessária para cumprir nossa responsabilidade como parte do conjunto criado, necessário para ajudar a manter a harmonia e o equilíbrio, a in- terdependência e interreleação de todas as coi- sas em nosso mundo.

Mais importante é a noção fundamental de reciprocidade. As orações e oferecimento do ta- baco (fumo) são atos recíprocos de dar algo de volta à Terra e para toda a criação com o objeti- vo de manter o equilíbrio mesmo quando nós rompemos o equilíbrio cortando esta árvore.

A questão da posição das culturas indígenas para os povos cristãos, especialmente aqueles da Europa e América do Norte, é esta: Como pode o respeito por uma árvore ou rocha, ani- mais ou eventualmente por outros seres huma- nos encontrar algum lugar no mundo industrial- comercial surgido da modernidade e que agora ameaça toda a criação com a extinção "pós-mo- derna"? E com que tipo de reciprocidade nós nos comprometemos? Nós nos comprometere- mos? O que nós restituimos para a Terra quan- do devastamos uma floresta ou despojamos uma mina, deixando milhas e milhares de terra total- mente improdutivas?

Talvez mais aflitivamente, esta mesma per- gunta possa ser colocada em termos de justiça humana: Onde está a reciprocidade, a manuten- ção do equilíbrio cósmico, com respeito àqueles que estão sofrendo diversas opressões em nosso mundo moderno - negros na África do Sul, não - judeus na Palestina, Tamils no Sri Lanka ou povos tribais na América Latina?

Com muitos outros povos do Terceiro e

a Integridade das Árvores de Natal Quarto Mundos, eu também tenho me preocu- pado que a inquietude do crescimento da cons- ciência da crise ecológica enfrentada por toda a criação pode e freqüentemente tem desviado as pessoas da consciência genuína de sua conscien- tização e envolvimento em assuntos de justiça e libertação. A preocupação pela sobrevivência dos peixes nos lagos da montanha, poluídos pe- la chuva ácida, por exemplo, é certamente no- bre. Entretanto, quando a preocupação desvia nossa af-nção do sofrimento diário dos negros na África do Sul, ele se torna uma real partici- pante na opressão imposta sobre estes irmãos e irmãs pelo terror do apartheid.

De minha parte, eu devo constantemente lembrar ao bom povo cristão na América do Norte da contínua opressão dos índios america- nos : \ nossa taxa de 60 % de desempregados, a déstrtijçao dejiossas culturas; ojrôubó de nossas terras; e o nosso maior carrasco*.as doenças e a

ndo traw^èstatística de ij^^S$ anos. A ne- iáÊms que anuncia-

p pobíe e oprimido" meio à-,

cUsiÉ^onHolde lo| ces rãl isto é verdfífèiramente fêil, mes riqueza da América do Norte.

Entretanto, eu quero argumentar que o res- peito pela criação deve ser nosso ponto inicial para a reflexão teológica em nosso mundo peri- goso. Mais explicitamente, a perspec^^p dio ípiericanoé que justiça é paz fluirá um resultado natural da preocupaiç sqaropriada IpiiipBaçífeÉl

A nível teológico, á seqüência de pa no programa de Justiça, Paz e Integruí Criação do Conselho Mundial de Igrejas é pro- blemática para os Nativos Americanos, e creio que para outros povos indígenas do Quarto Mundo. Ea "Integridade da Criação" deve ser entendida como muito mais do que uma preocu- pação pela desintegração ecológica. Deve ser o que a espiritualidade inata dos índios na Améri- ca, das ilhas do Pacífico, das tribos africanas, e de outros povos indígenas nos ajuda a apontar na direção certa.

Os índios americanos e outros povos indíge- nas têm um antigo segredo, e têm muito para ensinar aos europeus e norte-americanos sobre o mundo e as relações humanas no mundo. Eles são confiantes nos fundamentos espirituais de seu discernimento, confiança que estes funda- mentos podem se tornar um recurso de cura e reconciliação para toda a criação. Um par de exemplos simples vem da perspectiva indígena.

Meus ancestrais indígenas tinham uma rela- ção com Deus como Criador, que era saudável e responsável, bem antes deles conhecerem ou confessarem o evangelho de Jesus Cristo., Este relacionamento começou com o reconhecimento do Outro, Criador, a força criativa por trás de todas as coisas que existem, em data bem ante- rior à vinda dos missionários.

Em tudo o que eles faziam, nossos ances- trais indígenas reconheciam a bondade do Cria- dor e de toda a criação incluindo eles mesmos. Este era o assunto das estórias, o foco de suas orações e o propósito das cerimônias. Eles re- conheciam o equilíbrio e a harmonia que carac- terizavam todo o universo criado: Inverno e Ve- rão eram mantidos em equilíbrio um com o ou- tro. Assim também era a caça e o plantio, céu e terra, quente e frio, sol e lua, fêmea e macho, mulher e homem. Nossos ancestrais reconhe-

ciam tudo isto como bom, assim como Deus faz no fim do sexto dia (Gênesis 1-31).

Todo discernimento espiritual do índio ame- ricano, logo, teologia indígena, começa, com a criação, e isto é refletido na postura litúrgica básica dos índios em muitas tribos norte-ameri- canas. Nossas orações são mais freqüentemente ditas com a comunidade congregada dentro de alguma forma de círculo. De fato, o Círculo é a chave símbolo para a auto-percepção nestas tri- bos, representando o todo do universo e nossa parte nele.

Nós vemos a nós mesmos como co-partici- pantes em igualdade no círculo, não ficando nem acima nem abaixo de nada mais na criação de Deus. Não há hierarquia em nosso contexto cultural, mesmo de espécies, porque o círculo não tem início nem fim. Todas as criaturas par- ticipam juntas, cada uma com sua própria ma- neira, para preservar a integridade do círculo. Ip Quando um grupo de índios forma um cír- culo para orar, todos sabem que as orações têm já inièiado com a representação de um círculo. Nem palavras têm ainda sido ditas, e em algu- mas ceranônias nem palavras precisam ser ditas mas a iÃenção física de nossa forma tem já ex- pressados nossa oração e preocupação profunda pela inte|ridade de todos na criação de Deus.

Os povos Lakota e Dakota têm uma frase i usada em todas suas orações que apropriada- mente ilustram o senso dos nativos americanos de eentralidade da criação. A frase "Mitakuye Oyasin", por todos os meus parentes, funciona quase como a palavra "Amém" no Cristianis- mo americano e europeu. Assim como é usada para terminar toda oração, e freqüentemente es- tá nela mesma toda a oração, sendo a única fra- se dita.

Como muitos símbolos nativos, Mitakuye Oyasin é polivalente no seu significado. Certa- mente, é oração pelos parentes mais chegados de alguém -tias, primos, filhos, avós. E "pa- rentes" pode ser entendido como membros tri- bais ou mesmo todo o povo indígena.

Ao mesmo tempo, a frase inclui todos os se- res humanos, todos os bípedes são parentes uns dos outros e a eterna expansão do círculo não para lá. Todo Lakota que ora esta oração, sabe que em nossos parentes "necessariamente in- cluem-se os quadrúpedes, os alados e todos os seres vivos sobre a Mãe Terra''. Um professor Lakota tem sugerido que uma melhor tradução de "Mitakuye Oyasin" seria: "Por todas as coisas acima de mim e abaixo de mim e em vol- ta de mim: Isto é, por todos os meus parentes".

Estes exemplos ilustram a ampla imagem de interrelacionamento e interdependência simboli- zada pelo círculo e a importância de reciproci- dade e respeito um pelo outro para manter a in- tegridade do círculo. A preocupação do índio americano por iniciar a teologia com a criação é uma necessidade de reconhecer a bondade e o valor natural de todas as criaturas de Deus. Nós experimentamos o mal ou pecado como rompi- mento neste delicado equilíbrio, rompimento que nega o valor intrínseco de qualquer de nos- sos parentes.

George Tinker: é indígena, teólogo luterano, pastor numa paróquia unida de anglicanos e luteranos, e professor assistente na Escola de Teologia lliff em Denver, Colorado.

Traduzido da revista Sojoumers por Telma P. Santos Coelho.

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16 TUPARÊ DEZEMBRO/92

Os espíritos celestes e a origem da humanidade 4 4 A ntigamente, a terra não era po-

-tm.voada e no céu não havia ne- nhum Kiad-pod. Havia somente um gran- de bloco de pedra, lindo, liso e brilhante. Esse bloco era, porém, uma mulher. Um dia abriu-se ao meio e, entre torrentes de sangue, deu à luz um homem. Era Wa- ledjád. Mais uma vez, fendeu-se o bloco

e nasceu um outro homem. Chamou-se Wab. Ambos eram pajés. Não tinham mulher, por isso cada qual fabricou para si um machado de pedra e derrubaram duas árvores. Depois mataram um aguti, arrancaram-lhe os dentes da frente e, com isso, esculpiram uma companheira para cada um deles.

Charge ■ Revista Tempo e Presença 167, CEDI

Assim, nasceram também os outros pajés primitivos, os Wamoa-pod, uns da terra, outros das águas.

Há muito tempo, não existiam na ter- ra nem Tuparis nem qualquer outra pes- soa. Nossos antepassados viviam debaixo da terra, onde o sol nunca aparece. Sen- tiam muita fome, pois não tinham de co- mer senão frutos da palmeira. Uma noite, descobriram um buraco na terra e saíram para fora. A saída não ficava longe da choça dos antigos pajés Eroté e Towa- pod. Acharam ali as plantações de amen- doim e milho dos pajés. Comeram bas- tante e, pela manhã, sumiram, outra vez, pelo buraco, escondido entre pedras. As- sim fizeram noite após noite. Eroté e To- wapod pensaram serem agutis que rouba- vam suas plantações, mas uma manhã descobriram sinais dos homens e acharam o buraco por onde eles saíam para fora. Levantaram a pedra que cobria a saída e com uma vara comprida remexeram den- tro do buraco. Os homens começaram a sair para fora, aos borbotões, até que os pajés tamparam o buraco outra vez.

Os homens eram, então, horrendos. Tinham presas compridas como o porco do mato e membranas entre os dedos e aríelhos como os patos. Eroté e Towapod quebraram-lhes as presas e formaram- lhes as mãos e os pés. Desde então, os homens não têm mais presas pontudas, nem membranas natatórias, mas dentes bonitos, dedos e artelhos.

Muita gente ficou dentro da terra. Chama-se Kinno e vive lá até hoje. Quan- do toda gente da terra morrer, então os Kinno sairão do solo e virão morar aqui em cima.

As pessoas tiradas da terra por Eroté não ficaram vivendo todas no mesmo lu- gar. Nós, Tupari, ficamos aqui, os outros emigraram para longe, por todos os la- dos. São os nossos vizinhos, os Arikapu, Jabuti, Makuráp, Aruá e as tribos restan- tes.

Extraído do livro "Tupari" - de Franz Caspar

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