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ISBN - 978-85-61091-07-1 FORMAÇÃO SOCIOCULTURAL E ÉTICA Volume II

Coletanea 2010 CD

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ISBN - 978-85-61091-07-1

FORMAO SOCIOCULTURAL E TICAVolume II

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Diretor Presidente da Mantenedora Claudio Ferdinandi Reitor Wilson de Matos Silva Vice-reitor e Pr-reitor Administrativo Wilson de Matos Silva Filho Pr-reitor de Ensino Wilson de Matos Silva Pr-reitor de Pesquisa, Ps-graduao e Extenso Flvio Bortolozzi Diretora de Planejamento de Ensino Regina Movio de Lara Diretor de Cincias Humanas e Sociais Aplicadas Adriano Rogrio Goedert Diretor de Cincias Exatas e Tecnolgicas Flvio Bortolozzi Diretora de Cincias Biolgicas e da Sade Solange Munhoz Arroyo Lopes Diretora de Pesquisa Ludhiana Ethel Silva Bertoncello Diretor de Ps-graduao Valdecir Bertoncello Diretor de Extenso e Apoio Comunitrio Cludio Alexandre Ferdinandi Diretor de Desenvolvimento Institucional Amir Limana Diretor de Educao a Distncia Willian Victor Kendrick de Matos Silva Diretor de Servios Acadmicos Ricardo Carvalho Rodrigues

OrganizadoresFbio Inacio Pereira Dbora Azevedo Malentachi Gislene Miotto Catolino RaymundoAv. Guedner, 1610 Jd. Aclimao (44) 3027-6360 CEP 87050-390 Maring Paran www.cesumar.br

Ficha catalogrfica elaborada pela Biblioteca Central - CESUMAR

CENTRO UNIVERSITRIO DE MARING. Diretoria de Planejamento de Ensino e Ncleo de Apoio Pedaggico: C397 Formao sociocultural e tica: volume II / organizadores: Fbio Inacio Pereira, Dbora Azevedo Malentachi, Gislene Miotto Catolino Raymundo Maring, PR, 2010. 150 p. ISBN: 978-85-61091-07-1 1. Ensino superior. 2. tica. 3. Avaliao. I. Ttulo. CDD - 22. ed. 378 CIP - NBR 12899 - AACR/2

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APRESENTAO

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sta coletnea de Formao Sociocultural e tica rene textos dos mais diversos gneros e temas, criteriosamente selecionados para estimular sua reflexo e anlise sobre fatos relacionados economia, poltica, cultura, arte e meio ambiente, acontecimentos que ocorrem na sociedade atual e que devem fazer parte do universo de todos os que buscam compreender criticamente seu entorno social, e tambm para aprimorar suas competncias e habilidades de leitura e interpretao de textos, a partir do raciocnio dedutivo e lgico. Diariamente, avalanches de informaes so transmitidas por diversos suportes miditicos, porm o ato de ouvir ou ler irrefletidamente tais informaes forma sujeitos passivos, alienados e habituados a no analisar os porqus e as razes por trs dos fatos noticiados. preciso ler, mas ler profundamente, a fim de que possamos desempenhar a nossa cidadania de modo consciente e, assim, agir em benefcio da sociedade. Sabemos que rduo o caminho para a formao do indivduo em sua totalidade, crtico e consciente dos acontecimentos do seu contexto social. Por isso, em consonncia com sua misso que promover a educao de qualidade nas diferentes reas do conhecimento, o Centro Universitrio de Maring disponibiliza este livro, que certamente enriquecer sua formao pessoal e acadmica, levando-o a contribuir de modo cada vez mais significativo no desenvolvimento de uma sociedade justa e solidria.

Wilson de Matos Silva Reitor do Centro Universitrio de Maring

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SUMRIO

Prefcio........................................................................................................................... Introduo...................................................................................................................... Parte I Economia......................................................................................................................... Sociedade........................................................................................................................ Parte II Poltica............................................................................................................................ Cultura e Arte.................................................................................................................. Meio Ambiente................................................................................................................ Anexo I.......................................................................................................................... Fontes consultadas.....................................................................................................

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PREFCIO

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presente coletnea Formao Sociocultural e tica, volume II, compreende uma das aes do Ncleo de Apoio Pedaggico do Centro Universitrio de Maring que busca promover a formao integral do indivduo. Seu principal objetivo o de facilitar o acesso a um conjunto de textos dos mais diversos gneros e assuntos dentro de cinco eixos economia, sociedade, poltica, cultura e arte, meio ambiente fundamentais para a compreenso da sociedade. Assim, este material traz a oportunidade no apenas de ampliar conhecimentos, mas, tambm, aperfeioar tcnicas e habilidades fundamentais para o seu desempenho enquanto leitor e, consequentemente, enquanto profissional e cidado. Para acompanhar a evoluo do mundo, manter-se em dia, atualizado e bem informado, bem como para exercer sua cidadania com criticidade e construir seu espao merecido no mercado de trabalho, preciso cuidar da QUALIDADE de suas leituras. Certamente, se compararmos os graduados que saem das universidades com o diploma nas mos, porm desinteressados pela leitura, com os alunos que, no percurso de sua vida acadmica, tornaram-se leitores proficientes e habilidosos, estes esto a quilmetros de vantagem no atual mercado de trabalho cada vez mais exigente. Francis Bacon j dizia que A leitura faz do homem um ser completo e Victor Hugo que Ler beber e comer. O esprito que no l emagrece como um corpo que no come. Ao contrrio do que muitos pensam, a leitura no se limita apenas a decodificar palavras, frases, pargrafos ou textos. Ler de forma adequada tambm no uma questo de dom ou talento reservado para poucos. Leitura um processo a ser aprendido, uma atividade capaz de, ao mesmo tempo, formar, informar e transformar! Nesse sentido, este livro foi especialmente preparado para somar conhecimentos e aperfeioar habilidades leitoras. Aqui voc poder verificar, primeiramente, contedo especfico a respeito do ato de ler e textos que sugerem reflexes sobre a importncia da leitura. Voc tambm encontrar explicaes sobre estratgias de leitura que serviro de subsdio para faz-lo compreender melhor quais os caminhos para aperfeioar habilidades leitoras e, por fim, uma seleo de textos apresentados para estimular a reflexo, acompanhados por sugestes de leitura, links para visitar e outros contedos complementares.

Sucesso nas leituras! Organizadores

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INTRODUO

NVEIS DE LEITURA

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leitura a porta de entrada para a interAO com o outro, com o mundo e consigo mesmo em sua totalidade. Ler no unicamente interpretar os smbolos grficos, mas interpretar o mundo em que vivemos. Na verdade, passamos todo o nosso tempo lendo: lemos as imagens, as pessoas, suas palavras, seus gestos, seus olhares e at mesmo seu silncio; lemos outdoors, placas e sinais de trnsito; lemos textos informativos e tantos outros gneros que circulam na sociedade; lemos textos impressos, textos virtuais, textos verbais e no-verbais. Lemos tudo, mesmo que inconscientemente. Entretanto, nem tudo o que lido compreendido por leitores habituados leitura superficial, porque a leitura processo que requer do leitor um trabalho ativo de compreenso e interpretao do texto, a partir de seus objetivos, de seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a linguagem (Parmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos de ensino fundamental: lngua portuguesa/Secretaria de Educao Fundamental. Braslia: MEC/SEF, 1998, pp. 69-70). Em outras palavras, o leitor no pode se colocar na posio de sujeito passivo nas leituras que realiza. Seu nvel de leitura e o modo como l, isto , as estratgias que aplica nas suas leituras, principalmente as que so exigidas na vida acadmica, o segredo para a capacidade de compreenso leitora, para a formao do leitor proficiente, maduro, experiente e habilidoso. O segredo para o sucesso! So, pelo menos, trs os nveis de leitura: 1. leitura superficial: neste nvel, o leitor l apenas o que est escrito nas linhas do texto, percebe somente o que est explcito na superficialidade das linhas; decodifica as informaes, mas no as compreende em sua totalidade. 2. leitura adequada: neste nvel, o leitor no fica preso na superficialidade das linhas ou no contedo literal do texto; o leitor realiza a leitura nas entrelinhas, consegue identificar, no texto, pistas que permitem a construo de novos sentidos. 3. leitura complexa: neste nvel, o leitor vai alm das linhas e das entrelinhas do texto; ele faz uma leitura por trs das linhas, relaciona textos e contextos, constri mais sentidos ainda. E lembre-se: a leitura um processo a ser aprendido. Todo leitor pode, com estudo, muita leitura e dedicao, aperfeioar suas habilidades leitoras e, assim, ultrapassar nveis.

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ESTRATGIAS DE LEITURA leitura uma atividade que implica estratgias de seleo, antecipao, inferncia e verificao, sem as quais no possvel proficincia. o uso desses procedimentos que possibilita controlar o que vai sendo lido, permitindo tomar decises diante de dificuldades de compreenso, avanar na busca de esclarecimentos, validar no texto suposies feitas. (Parmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos de ensino fundamental: lngua portuguesa/Secretaria de Educao Fundamental. Braslia: MEC/SEF, 1998, pp. 69-70). Talvez, mesmo que inconscientemente, voc j faa uso dessas estratgias. Porm, para se tornar um leitor crtico e proficiente, de fundamental importncia conhec-las, compreend-las, aplic-las e aperfeio-las conscientemente. Vamos, portanto, atentar para o significado de cada uma delas.

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a) Estratgia de Seleo: so aes que possibilitam ao leitor focar somente o que lhe til para a compreenso do texto, desprezando-se itens considerados irrelevantes. Na leitura de um texto qualquer, a mente do leitor seleciona o que lhe interessa ou o que pertinente para determinada situao. Nas provas discursivas ou objetivas, por exemplo, imprescindvel que o leitor atente para as informaes mais relevantes, a partir das quais far a interpretao adequada para responder satisfatoriamente as questes. Outro exemplo so os trabalhos cientficos, em que o acadmico-leitor precisa selecionar, entre dezenas de livros, peridicos e outros materiais de leitura que compem a lista bibliogrfica sugerida pelo professor, o que, de fato, interessa aos objetivos de sua pesquisa. Neste universo de informaes, no d para ler tudo. preciso ser seletivo e aplicar essa estratgia conscientemente, a partir de critrios bem definidos. b) Estratgia de predio ou antecipao: so antecipaes que o leitor constri sobre o texto que est lendo, possibilitando-lhe a antecipao do contedo, mantendo a ateno no objetivo determinado inicialmente. A partir dessa estratgia, o leitor levanta hipteses, antecipando informaes com base nas pistas que percebe durante a leitura. Ela ocorre, por exemplo, quando, na leitura de uma obra literria, o leitor consegue deduzir o que acontecer no final dela com base nas pistas que o enredo da histria traz. A partir das manchetes dos jornais, o leitor pode antecipar algumas informaes apresentadas na reportagem. O leitor pode antecipar, tambm, mediante o conhecimento sobre determinado autor, qual ser o ponto de vista e os argumentos apresentados por esse autor sobre determinado assunto, antes mesmo de ler o texto completo. c) Estratgia de inferncia: so aes que unem o conhecimento que no est explcito no texto, porm possvel de ser captado, com o conhecimento que o leitor tem sobre o assunto; uma ponte de sentido que o leitor cria com o texto lido, construindo uma nova informao, que no existia antes no texto, nem no leitor. O ato de inferir informaes no explcitas no texto a capacidade do leitor em identificar, compreender e interpretar, a partir do seu raciocnio lgico, o que o autor no disse, mas deixou implcito nas entrelinhas. O leitor pode inferir, tambm, o significado de palavras desconhecidas a partir das pistas que o prprio texto apresenta.

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d)

Estratgia de autocontrole: a ponte que o leitor faz entre o que supe (seleo, antecipao, inferncia) e as respostas que vai obtendo no percurso da leitura. Trata-se de verificar as antecipaes e as inferncias, confirmando-as ou refutandoas, com a finalidade de garantir a compreenso e interpretao adequada do texto. A confirmao ou no das antecipaes e das inferncias realizadas se constri no processamento da leitura do texto. Pode-se fazer verificaes de todos os tipos: verificar se o que foi lido j foi compreendido; verificar a relao do contedo do texto com o contexto da poca em que foi escrito, com o contexto atual; verificar a fragilidade ou a consistncia dos argumentos; verificar o estilo do autor, a clareza ou falta de clareza nas suas palavras; verificar fatores polticos ou ideolgicos nas entrelinhas do texto, e assim por diante.

e) Estratgia de autocorreo: ocorre quando as expectativas levantadas pelas estratgias de antecipao no so confirmadas, havendo um momento de dvida. O leitor, ento, repensa a hiptese anteriormente levantada, constri outras e retoma as partes anteriores do texto para fazer as devidas correes. o caso do leitor, por exemplo, que volta para corrigir a palavra que leu erradamente, ou que volta para reconsiderar determinada assertiva de certa questo, com base na releitura do texto e do enunciado, identificando-a como correta. importante que voc, prezado(a) aluno(a), coloque em prtica essas estratgias nas suas leituras, no apenas as que so exigidas no universo acadmico, mas as que fazem parte da sua vida fora dos muros da faculdade e que tambm so fundamentais para sua formao.

Textos

L

eia mais, leia muito, leia bastante, leia o mximo que puder, leia jornais, leia revistas, leia livros.... bem provvel que, nos vrios anos de sua vida escolar, ensinos fundamental e mdio, voc deve ter ouvido de seus saudosos professores, vrias vezes, algo semelhante a isso, no mesmo? No se trata apenas de um simples conselho de educadores para educandos. Est mais para um apelo que grita aos ouvidos e, ainda assim, s escuta quem realmente quer, quem realmente compreende a importncia da leitura. Os trs textos que seguem so fantsticos, porque renem uma srie de informaes sobre esse assunto, ampliam a nossa viso e aguam a nossa criticidade sobre a infinita dimenso de possibilidades que ns, leitores, podemos encontrar no universo da leitura. Leia, grife o que mais chamar sua ateno e reflita! LER DEVIA SER PROIBIDO Por Guiomar de Grammon A pensar fundo na questo, eu diria que ler devia ser proibido. Afinal de contas, ler faz muito mal s pessoas: acorda os homens para realidades impossveis, tornando-os incapazes de suportar o mundo insosso e ordinrio em que vivem.

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A leitura induz loucura, desloca o homem do humilde lugar que lhe fora destinado no corpo social. No me deixam mentir os exemplos de Don Quixote e Madame Bovary. O primeiro, coitado, de tanto ler aventuras de cavalheiros que jamais existiram meteu-se pelo mundo afora, a crer-se capaz de reformar o mundo, quilha de ossos que mal sustinha a si e ao pobre Rocinante. Quanto pobre Emma Bovary, tomou-se esposa intil para fofocas e bordados, perdendo-se em delrios sobre bailes e amores cortesos. Ler realmente no faz bem. A criana que l pode se tornar um adulto perigoso, inconformado com os problemas do mundo, induzido a crer que tudo pode ser de outra forma. Afinal de contas, a leitura desenvolve um poder incontrolvel. Liberta o homem excessivamente. Sem a leitura, ele morreria feliz, ignorante dos grilhes que o encerram. Sem a leitura, ainda, estaria mais afeito realidade quotidiana, se dedicaria ao trabalho com afinco, sem procurar enriquec-la com cabriolas da imaginao. Sem ler, o homem jamais saberia a extenso do prazer. No experimentaria nunca o sumo Bem de Aristteles: o conhecer. Mas para que conhecer se, na maior parte dos casos, o que necessita apenas executar ordens? Se o que deve, enfim, fazer o que dele esperam e nada mais? Ler pode provocar o inesperado. Pode fazer com que o homem crie atalhos para caminhos que devem, necessariamente, ser longos. Ler pode gerar a inveno. Pode estimular a imaginao de forma a levar o ser humano alm do que lhe devido. Alm disso, os livros estimulam o sonho, a imaginao, a fantasia. Nos transportam a parasos misteriosos, nos fazem enxergar unicrnios azuis e palcios de cristal. Nos fazem acreditar que a vida mais do que um punhado de p em movimento. Que h algo a descobrir. H horizontes para alm das montanhas, h estrelas por trs das nuvens. Estrelas jamais percebidas. preciso desconfiar desse pendor para o absurdo que nos impede de aceitar nossas realidades cruas. No, no dem mais livros s escolas. Pais, no leiam para os seus filhos, pode lev-los a desenvolver esse gosto pela aventura e pela descoberta que fez do homem um animal diferente. Antes estivesse ainda a passear de quatro patas, sem noo de progresso e civilizao, mas tampouco sem conhecer guerras, destruio, violncia. Professores, no contem histrias, pode estimular um curiosidade indesejvel em seres que a vida destinou para a repetio e para o trabalho duro. Ler pode ser um problema, pode gerar seres humanos conscientes demais dos seus direitos polticos em um mundo administrado, onde ser livre no passa de uma fico sem nenhuma verossimilhana. Seria impossvel controlar e organizar a sociedade se todos os seres humanos soubessem o que desejam. Se todos se pusessem a articular bem suas demandas, a fincar sua posio no mundo, a fazer dos discursos os instrumentos de conquista de sua liberdade. O mundo j vai por um bom caminho. Cada vez mais as pessoas lem por razes utilitrias: para compreender formulrios, contratos, bulas de remdio, projetos, manuais etc. Observem as filas, um dos pequenos cancros da civilizao contempornea. Bastaria um

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livro para que todos se vissem magicamente transportados para outras dimenses, menos incmodas. E esse o tapete mgico, o p de pirlimpimpim, a mquina do tempo. Para o homem que l, no h fronteiras, no h cortes, prises tampouco. O que mais subversivo do que a leitura? preciso compreender que ler para se enriquecer culturalmente ou para se divertir deve ser um privilgio concedido apenas a alguns, jamais queles que desenvolvem trabalhos prticos ou manuais. Seja em filas, em metrs, ou no silncio da alcova... Ler deve ser coisa rara, no para qualquer um. Afinal de contas, a leitura um poder, e o poder para poucos. Para obedecer no preciso enxergar, o silncio a linguagem da submisso. Para executar ordens, a palavra intil. Alm disso, a leitura promove a comunicao de dores, alegrias, tantos outros sentimentos... A leitura obscena. Expe o ntimo, torna coletivo o individual e pblico, o secreto, o prprio. A leitura ameaa os indivduos, porque os faz identificar sua histria a outras histrias. Torna-os capazes de compreender e aceitar o mundo do Outro. Sim, a leitura devia ser proibida. Ler pode tornar o homem perigosamente humano. Fonte: PRADO, J.; CONDINI, P. (Orgs.). A formao do leitor: pontos de vista. Rio de Janeiro: Argus, 1999. p. 71-73.

LER: UMA LEITURA MULTIDIMENSIONAL Francisco Gomes de Matos Ler processo Ler procura Ler projeto Ler pintura Ler processar Ler procurar Ler projetar Ler pintar Ler produzir Ler parafrasear Ler provocar Ler problematizar Ler propor

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Ler prever Ler provar Ler prover Ler percorrer Ler perguntar Ler perscrutar Ler perspectivar Ler formar Ler INformar Ler reformar Ler TRANSformar Ler SABER Ler PODER SABER LER? PODER DA INCLUSO! No ler? No saber LER? Desumana verdade: PODER DA EXCLUSO! O direito de saber ler para melhor REpensar a todo humano ser devemos assegurar LER pensamento,valor,emoo LER sentimento, poder, antecipao LER prosa, poesia, cognitivAO LER a alma da CRIAO Fonte: MATOS, F. G. Ler: uma leitura multidimensional. Linguagem & Ensino, Pelotas, v. 9, n. 1, p. 247-249, jan./jun. 2006.

LER CHATO. SER? Por Jaime Pinsky A idia de que livro chato s pode partir de quem no sabe o prazer que a leitura proporciona O tempo histrico no tem um compromisso muito grande com o tempo cronolgico, ou mesmo o tempo psicolgico: dcadas no Egito dos faras podem corresponder a anos no

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perodo da expanso ibrica ou meses do sculo XXI. A percepo da velocidade do tempo histrico decorre do ritmo dos acontecimentos, assim como da rapidez dos meios de transportes e comunicaes. Talvez por isso, sempre que estamos em algum local tranqilo, geralmente no interior, somos tentados a dizer que ali as coisas no acontecem e que como se estivssemos em pleno sculo XIX. possvel que, para evitar a idia de que possamos ser vistos como retrgrados, ou fora do nosso tempo, busquemos acelerar tudo: msicas no podem ser lentas, filmes buscam ritmos alucinantes e, se no tiverem dois mortos por minuto de projeo, em mdia, so considerados acadmicos. Propaga-se a idia idiota que tudo que no muito veloz chato. O pensamento analtico substitudo por achados, alunos trocaram a investigao bibliogrfica por informaes superficiais dos sites de pesquisa pasteurizados, textos bem cuidados cedem espao aos recados sem maisculas e acentos dos bilhetes nos correios eletrnicos. O importante no degustar, mas devorar; no usufruir, mas possuir apressadamente. O tempo, o tempo correndo atrs. No que eu queira fazer a apologia da lentido e da ineficincia, mas um bom concerto feito tanto de bons allegros quanto de dolentes adgios. Alm disso (e Charles Chaplin j percebia isso no incio do sculo XX, em Tempos Modernos), ser humano dominar a mquina e no ser por ela dominado. E a, a meu ver, se estabelece uma das principais distines entre ler e ver televiso. Voc pega o livro, olha a capa, a contracapa, folheia sensualmente suas pginas e escolhe, livremente, aquela que quer ler. Pode pular pedaos, comear pelo fim, reler vrias vezes trechos que amou, para decorar, ou que odiou, para criticar. Desde que seja seu, voc pode escrever no livro (para isso ele tem espao em branco): livro rabiscado sinal de leitura atenta. Nada como retomar um livro lido anos atrs e ler nossas prprias notas: se forem ingnuas, rimos com a condescendncia de quem cresceu; se forem brilhantes, nos preocupamos com nossa estagnao. Voc estabelece o prprio ritmo de apreenso do escrito, seja ele cincia, seja fico. Tantas vezes me furtei lendo lentamente o final de um livro pelo qual me apaixonara e do qual no queria me separar J a telinha autoritria. Ela comea o assunto quando bem entende, faz as pausas que quer, inserindo as propagandas que deseja, determina o ritmo, diz quando e para onde devo olhar. Se no estou no poder, ento, pior ainda. Tenho que ver jogo de time de que no gosto, pedao de novela babaca, entrevistas sem sentido, assassinatos sem conta, tudo num volume superior ao que eu suporto, mas que no tenho como regular, pois estou sem o controle remoto nas mos. Mesmo quando vejo um vdeo ou um DVD, em que posso controlar algumas dessas variveis, lido com o personagem e a paisagem imaginados por outro, emboto a minha imaginao e me curvo diante de heris e mocinhas prontos e iguais para todos, enquanto, no livro, cada um sonha como quiser e puder. No por outra razo que dificilmente gostamos dum filme baseado em livro que j lemos, mesmo quando a pelcula de boa qualidade como O Nome da Rosa ou Vidas Secas. Antes que algum pense que sou contra o cinema, ou at a televiso, devo dizer que isso no acontece, mas que ando mesmo um pouco preocupado. J no h mais quase nenhum consultrio, laboratrio e at sala de espera em prontos-socorros de hospitais que no tenham a sua televiso. E, o que pior, ligada. O infeliz chega quebrado, estropiado, ou apenas dolorido, e se lhe impinge humor chulo, falsas pegadinhas, loiras igualmente

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falsas, com sndrome de eternas adolescentes, de botinha e coxas de fora, animando crianas de olhares perdidos, conversas de pessoas confinadas que no tm o que dizer, entrevistas com pessoas que estiveram confinadas e que continuam sem ter o que dizer, e por a afora. A sala tem pouca iluminao, j nem sequer tem aquelas revistas semanais atrasadas. A luz que falta e o rudo que sobra impedem que aqueles que trouxeram seus livros possam ler. As pessoas olham para a telinha, olham-se umas s outras e sua prpria condio. Com um livro na mo poderiam estar viajando, sonhando, aprendendo, conhecendo gente e lugares interessantes, idias fascinantes, desbravando, questionando, maravilhando-se. Contudo, continuam sentadas olhando umas para as outras e para a telinha que cobra o tributo da dependncia, da elaborao de frases feitas e idias gastas. A idia de que livro chato s pode partir de quem no sabe o prazer que a leitura proporciona. Assim, quero lanar aqui um pedido ou vrios: aos mdicos, para que iluminem melhor suas salas de espera, o que, alm de deix-las menos lgubres, permitiria que as pessoas pudessem ler enquanto esperam. Aos hotis, para que no se esqueam de colocar luz de leitura nos quartos. Uns e outros poderiam manter uma pequena biblioteca ao alcance dos clientes. A concepo bastante corrente em nosso pas de que diverso est sempre e necessariamente ligada ao rudo e ao lcool s pode partir de algum que no gosta de fato do Brasil. E ele ainda merece uma oportunidade. Ou no? * Historiador, escritor e editor, doutor e livre docente da USP e professor titular da Unicamp, universidades em que lecionou. Autor de vrios livros, entre os quais Cidadania e Educao e As primeiras civilizaes, , atualmente, diretor editorial da Editora Contexto. Publicado no Correio Braziliense de 28-07-02 e na Revista Espao Acadmico com autorizao do autor (REA, n 15, agosto de 2002, disponvel em http://www.espacoacademico.com.br/015/15cpinsky.htm Fonte: PINSKY, Jaime. Ler chato. Ser? Revista Espao Acadmico. Maring, ago. 2002. Disponvel em: . Acesso em 8 fev. 2010.

A

partir dos textos acima, quais ideias estimularam a sua reflexo? Vamos pontuar alguns aspectos. Por que, por exemplo, a leitura faz muito mal pessoa, pode ser um problema e, tambm, pode tornar o homem perigosamente humano? Em que consiste o poder da leitura? Qual a diferena entre leitores e meros telespectadores? Influenciados pela ideia ou sensao de que tudo que no muito veloz chato, qual o perfil dos leitores na sociedade contempornea? Depois de pensar sobre essas e outras questes que voc mesmo pode elaborar silenciosamente nas suas reflexes e antes de passarmos para a Parte I, em que sero apresentados textos sobre assuntos relacionados Economia e Sociedade, vamos parar um momento para pensar sobre o tema-mestre desta coletnea. O QUE TICA?

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A origem da palavra tica vem do grego ethos, que quer dizer o modo de ser, o carter. Os romanos traduziram o ethos grego, para o latim mos (ou no plural mores), que quer dizer costume, de onde vem a palavra moral. Tanto ethos (carter) como mos (costume) indicam um tipo de comportamento propriamente humano que no natural, o homem no nasce com ele como se fosse um instinto, mas que adquirido ou conquistado por hbito (VZQUEZ). Portanto, tica e moral, pela prpria etimologia, diz respeito a uma realidade humana que construda histrica e socialmente a partir das relaes coletivas dos seres humanos nas sociedades onde nascem e vivem. No nosso dia-a-dia no fazemos distino entre tica e moral, usamos as duas palavras como sinnimos. Mas os estudiosos da questo fazem uma distino entre as duas palavras. Assim, a moral definida como o conjunto de normas, princpios, preceitos, costumes, valores que norteiam o comportamento do indivduo no seu grupo social. A moral normativa. Enquanto a tica definida como a teoria, o conhecimento ou a cincia do comportamento moral, que busca explicar, compreender, justificar e criticar a moral ou as morais de uma sociedade. A tica filosfica e cientfica. Nenhum homem uma ilha. Essa famosa frase do filsofo ingls Thomas Morus ajuda-nos a compreender que a vida humana convvio. Para o ser humano, viver conviver. justamente na convivncia, na vida social e comunitria, que o ser humano se descobre e se realiza enquanto um ser moral e tico. na relao com o outro que surgem os problemas e as indagaes morais: o que devo fazer? Como agir em determinada situao? Como comportar-me perante o outro? Diante da corrupo e das injustias, o que fazer? Portanto, constantemente, no nosso cotidiano, encontramos situaes que nos colocam problemas morais. So problemas prticos e concretos da nossa vida em sociedade, ou seja, problemas que dizem respeito s nossas decises, escolhas, aes e comportamentos - os quais exigem uma avaliao, um julgamento, um juzo de valor entre o que socialmente considerado bom ou mau, justo ou injusto, certo ou errado, pela moral vigente. O problema que no costumamos refletir e buscar os porqus de nossas escolhas, dos comportamentos, dos valores. Agimos por fora do hbito, dos costumes e da tradio, tendendo a naturalizar a realidade social, poltica, econmica e cultural. Com isto, perdemos nossa capacidade critica diante da realidade. Em outras palavras, no costumamos fazer tica, pois no fazemos a crtica, nem buscamos compreender e explicitar a nossa realidade moral. No Brasil, encontramos vrios exemplos para o que afirmamos acima. Historicamente marcada pelas injustias scio-econmicas, pelo preconceito racial e sexual, pela explorao da mo-de-obra infantil, pelo jeitinho e a lei de Gerson etc, etc. A realidade brasileira nos coloca diante de problemas ticos bastante srios. Contudo, j estamos por demais acostumados com nossas misrias de toda ordem. Naturalizamos a injustia e consideramos normal conviver lado a lado as manses e os barracos, as crianas e os mendigos nas ruas; achamos inteligente e esperto levar vantagem em tudo e tendemos a considerar como sendo otrio quem procura ser honesto. Na vida pblica, exemplos o que no faltam na nossa histria recente: anes do

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oramento, impeachment de presidente por corrupo, compras de parlamentares para a reeleio, os medicamentos "b o", mfia do crime organizado, desvio do Fundef etc., etc. No sem motivos fala-se numa crise tica, j que tal realidade no pode ser reduzida to somente ao campo poltico-econmico. Envolve questes de valor, de convivncia, de conscincia, de justia. Envolve vidas humanas. Onde h vida humana em jogo, impem-se necessariamente um problema tico. O homem, enquanto ser tico, enxerga o seu semelhante, no lhe indiferente. O apelo que o outro me lana de ser tratado como gente e no como coisa ou bicho. Neste sentido, a tica vem denunciar toda realidade onde o ser humano coisificado e animalizado, ou seja, onde o ser humano concreto desrespeitado na sua condio humana. Fonte: O QUE TICA? Dhnet. Disponvel em: . Acesso em 10 fev. 2010.

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PARTE I

ECONOMIA

E

SOCIEDADE

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ECONOMIA

Introduo

O

presente captulo aborda um conjunto de temas relacionados ao campo dos problemas econmicos contemporneos, tais como: mercado de trabalho, mercado financeiro, subsdios agrcolas, blocos econmicos, avanos tecnolgicos, empreendedorismo, entre outros. Vale lembrar que o campo da economia est voltado para o processo geral de desenvolvimento e manuteno da vida em sociedade. A palavra economia um termo grego formado por duas palavras, oikos (casa) e nomos (costume ou lei), e permite-nos inferir sua preocupao enquanto cincia: o cuidado das regras da casa. A partir dessa etimologia, pode-se defini-la como cincia social responsvel pelas formas de relacionamento humano, ligadas produo da vida, aos estudos da produo, distribuio e consumo de bens e servios. A partir da anlise dos textos aqui apresentados, de diversas origens e estilos, prope-se oferecer aos leitores a possibilidade de refletir sobre temas importantes do cenrio econmico nacional e internacional. Os textos so introduzidos por comentrios que ajudam na compreenso e problematizao da sociedade, tendo em vista o aprimoramento da reflexo crtica e autnoma. Nesse sentido, permitem uma viso geral do processo de desenvolvimento social capaz de nos dar pistas na direo de uma compreenso da dinmica econmica atual. Sugere-se uma leitura atenta, tendo em vista a apreenso de aspectos relevantes da realidade socioeconmica atual.

Textos

O

texto abaixo foi publicado originalmente pela Revista Exame e tem o objetivo de apontar e refletir sobre as principais tendncias econmicas para 2010. No Brasil, o ano marcado pelo otimismo em economia e por expectativas em relao s eleies presidenciais. s vsperas das eleies a pergunta que se faz no mbito econmico diz respeito continuidade ou ruptura do modelo de desenvolvimento adotado pelo pas. As foras polticas em disputa sinalizam grandes mudanas, ou a perspectiva de continuidade da poltica econmica atual? No mundo, a China seguir crescendo como potncia econmica e poltica? TENDNCIAS 2010: IDEIAS ECONOMIA SOCIAL Os economistas podem melhorar a condio humana?

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Por Paul Ormerod A matemtica est se tornando cada vez mais difundida na economia. Para que fique registrado: na hora certa, entre adultos e de comum acordo, eu tambm uso matemtica. H boas e ms razes para empreg-la a servio da economia. S que at agora as ms prevaleceram. Isso no teria muita importncia se os formuladores de polticas no levassem a economia to a srio. Quase nenhum deles liga para loucuras da teoria literria, por exemplo. Mas a economia tem importncia e, nas fronteiras da disciplina, uma mudana sutil mas profunda est ocorrendo. A economia est comeando a se tornar mais realista, enraizada em instituies, em histria, no mundo real, e, por conseguinte, mais til. Foi assim, alis, que a economia comeou. Na poca ela no era chamada de "economia", mas de "economia poltica", simbolizando o fato de que economias no existem independentemente de sistemas e instituies polticos. Adam Smith fundou, sozinho, a disciplina de economia h cerca de 200 anos, e sua influncia grande at os dias de hoje. Mas seu livro seminal, A Riqueza das Naes, no contm nenhuma equao. Em vez disso, Smith emprega argumentos cuidadosamente construdos, apoiados numa profuso de evidncias histricas. O corretor de aes ingls David Ricardo, autor de Princpios da Economia Poltica e Tributao (1817), menos conhecido, mas a teoria econmica- padro de comrcio ainda se baseia em sua obra. Mais de um sculo depois, duas figuras de extremos opostos do espectro poltico fizeram contribuies de largo alcance economia. John Maynard Keynes estudou matemtica em Cambridge e depois passou para a economia. Friedrick Hayek, a inspirao intelectual para o thatcherismo, tinha insights profundos em psicologia e tambm em economia. Ricardo, Keynes, Hayek e uma srie de outras figuras-chave evitaram deliberadamente a matemtica. Eles preferiram usar argumentos ponderados respaldados em evidncias. Como foi, ento, que a matemtica se tornou to presente na economia, quando tanta coisa foi alcanada sem ela? A pior razo que o emprego da matemtica faz com que os economistas se sintam como verdadeiros cientistas. Eles tm "inveja da fsica". Os fsicos usam a matemtica (tente fazer fsica quntica s com palavras), e so cientistas de verdade, que realmente explicaram como uma poro de coisas funciona. Portanto, se usarmos a matemtica, isso nos far verdadeiros cientistas, no ? Bem, o erro lgico desta ltima frase bastante bvio. Mas ele no impede a satisfao ntima que a maioria dos economistas sente quando cobre a pgina de smbolos matemticos. H uma razo mais sria e mais danosa para a matemtica, ao menos um tipo particular de matemtica, ser usada em economia. Ela est inextricavelmente ligada ao conceito de "homem econmico". A economia basicamente uma teoria sobre o comportamento dos indivduos. E a histria- padro no s supe que os indivduos so movidos pelo interesse prprio, mas que eles se comportam como algum tipo de supercomputador -- sempre recolhendo cada pedao de informao relevante para uma deciso. Esses indivduos tomam ento a melhor deciso possvel com base nas opes disponveis. No apenas uma boa deciso, mas a melhor. Ou, como economistas gostam de dizer, tima. Essa ainda a base para o ensino de economia na universidade. Mas, paradoxalmente, foi precisamente o emprego da matemtica na economia que solapou essa viso do mundo.

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tambm uma razo por que a disciplina est avanando dramaticamente. A matemtica pode ser muito til em economia desde que a pensemos como uma simples ferramenta entre muitas. Ela uma ferramenta que pode nos ajudar no pensamento lgico. como outra linguagem -- ela pode nos ajudar a encontrar nosso rumo. Mas pioneiros como os vencedores do Nobel de 2001 George Akerlof e Joseph Stiglitz avanaram o tema nos anos 70. Eles perceberam que algo mais era necessrio, por isso abandonaram a ideia de que as pessoas tm uma informao perfeita quando tomam decises. Eles desenvolveram o conceito de "racionalidade limitada": embora possamos tentar tomar a melhor deciso, podemos no conseguir em razo da falta de informaes vitais. Assim, num mundo de racionalidade limitada, as pessoas que se comprazem em comida vagabunda ou fumam pesadamente no so vistas necessariamente como tomando a melhor deciso possvel para elas. O trabalho de Akerlof e Stiglitz representou um passo adiante enorme para tornar a economia mais realista. Daniel Kahneman e Vernon Smith, vencedores do Nobel de 2002, deram passos ainda mais largos. Eles entraram efetivamente no mundo e conduziram experimentos para ver como as pessoas de fato se comportam. Observando e deduzindo, como cientistas de verdade! Descobriram que, na maior parte do tempo, as pessoas no se comportam como o homem econmico. Em sua palestra na cerimnia do Nobel, Kahneman afirmou: "A caracterstica central de agentes (pessoas) no que eles raciocinam mal, mas agem intuitivamente com frequncia. E o comportamento desses agentes no guiado pelo que eles so capazes de computar, mas pelo que enxergam em dado momento". Em outras palavras, o conceito de um homem econmico racional, calculador, est sendo abandonado. A teoria do homem econmico postula que as pessoas tm todas as informaes relevantes para tomar a melhor deciso. Nessa nova abordagem, as pessoas tm -- na melhor hiptese -- uma informao imperfeita. Elas seguem aos trambolhes, tentando tomar decises racionais, s vezes conseguindo -- mas, com frequncia, falhando. As novas abordagens que se desenvolveram para substituir o homem econmico, talvez surpreendentemente, tornaram a economia muito mais dura. Em vez de apenas manipular algumas equaes, ns precisamos pensar nas regras de comportamento relevantes. E precisamos recuperar a importncia de instituies e da histria. Em suma, temos de recuperar a ideia de economia poltica numa roupagem completamente moderna. Friederick Hayek sofre a desconfiana de muitos, mas h uma verdade profunda em sua observao: "Um economista que apenas um economista no pode ser um bom economista". Tudo isso deixa a economia mais humilde. Em vez de pretender passar por uma teoria de comportamento completamente geral -- aplicvel a todas as pessoas em todos os tempos e lugares --, a economia agora muito menos pomposa. Mas, em ltima instncia, essas mudanas serviro para tornar a disciplina mais realista. E potencialmente mais poderosa como uma fora para ajudar a compreender e melhorar a condio humana.

MUNDO A China sob os holofotes Por Ana Luiza Herzog, de Copenhague

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0s estudiosos das relaes internacionais j soltaram um veredito: 2009 foi mesmo o ano do G20 -- grupo que rene os pases ricos do mundo e os emergentes, como Brasil, China e ndia. Isso no significa, porm, que essa a configurao de poder global que dever se manter em 2010 e nos anos vindouros. Tudo indica que, no futuro prximo, as aspiraes do planeta estaro sob o jugo no de um grupo de naes, mas do G2: Estados Unidos e China. A prova mais recente disso foi dada no apagar das luzes de 2009, durante as duas semanas da conferncia da ONU sobre o clima, realizada em Copenhague. O evento na capital dinamarquesa reuniu cerca de 40 000 pessoas e mais de 120 chefes de Estado e governo. A despeito dessa diversidade de lideranas, durante todo o tempo, as atenes estiveram voltadas sobretudo para os movimentos desses dois pases. Afinal, qualquer plano de combate ao aquecimento global torna-se vazio se as duas maiores economias do planeta -- e tambm as maiores emissoras de gases causadores do efeito estufa -- no quiserem participar. Durante as duas semanas de durao da COP15, Estados Unidos e China estiveram no centro das discusses o tempo todo, como era esperado. Mas foi a firmeza dos negociadores chineses o que deixou surpresos muitos dos participantes e observadores da reunio. A China, que em 2010 deve tornar-se a segunda maior economia do mundo (e que j a maior emissora de CO2 do planeta, em termos absolutos), decidiu assumir de vez seu papel de protagonista no cenrio da poltica internacional. Isso comeou a ficar claro logo no incio da conferncia. Desde os primeiros dias, a delegao chinesa se apresentou como a voz do G77, como conhecido o grupo de cerca de 150 pases pobres e emergentes. Os negociadores do pas adotaram com convico o discurso de defesa dos fracos e oprimidos. Os chineses deixaram claro que o preo do combate ao aquecimento global no pode significar a criao de entraves ao desenvolvimento econmico desses pases. Tambm no foi possvel demover o pas da oposio a um sistema mundial de verificao do cumprimento das metas, uma das exigncias-chave feitas pelo presidente americano, Barack Obama, em sua passagem no dia final da conferncia. O discurso americano se apoiava na ideia da prestao de contas. Mas a leitura dos especialistas era diferente. Os Estados Unidos no esto preocupados com o que faro brasileiros, indonsios ou indianos. "A grande questo a China", diz Nathan E. Hultman, professor da escola de polticas pblicas da Universidade de Maryland e membro da Brookings Institution, um renomado instituto de pesquisa americano. "Obama precisa poder dizer aos cidados do pas, com convico, que a economia chinesa tambm est fazendo sacrifcios. Caso contrrio, nada feito." Essa queda de brao observada pelo mundo todo, e que muitos acreditam ser um dos principais motivos para a falta do acordo que se esperava de Copenhague, no deixa dvidas sobre o novo equilbrio de foras neste comeo de milnio. No de hoje que h boas justificativas para o medo americano. Nenhum outro pas nutre uma gana de crescer to grande quanto a China. O pas j tem 650 milhes de aparelhos celulares, mais que o dobro que toda a populao americana. Passou frente dos Estados Unidos no mercado que, durante um sculo, foi sinnimo do seu dinamismo: o automobilstico. A mquina exportadora chinesa permitiu o acmulo de mais de 2 trilhes de dlares em reservas internacionais. A ditadura asitica hoje o principal credor dos Estados Unidos. Agora, diante do imperativo de que o mundo se converta economia de baixo

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carbono, h prenncios de que pode ter chegado a hora de a China assumir de vez a dianteira. O pas decidiu que no s vai esverdear sua matriz energtica -- ainda movida a carvo mineral e, por isso, predominantemente suja --, como vai se tornar o maior exportador de tecnologias limpas do mundo. Na maioria dos pases costuma haver um espao de tempo razovel entre a tomada de uma deciso e sua execuo. Na China comunista, esse intervalo bem mais curto. H cinco anos, 80% das turbinas elicas instaladas no pas eram produzidas no exterior. Hoje, os fabricantes nacionais j respondem por 75% dessa demanda. Ao menos publicamente, os Estados Unidos e, sobretudo, a China, rejeitam a ideia de um mundo regido pelo G2. Os chineses afirmam no ter a pretenso de reformar o mundo ou se meter nos problemas alheios. O que os chineses, porm, no negam, que todas as suas aes so guiadas por um princpio: o de fazer crescer o PIB. E a natureza desse pragmatismo basta para que, cada vez mais daqui para a frente, a exemplo do que ocorreu em Copenhague, a soluo para qualquer dilema global passe pelo delicado bal entre esses dois pases.

BRASIL Um ano decisivo para o pas Por Andr Lahz um ciclo que se encerra. O oitavo e derradeiro ano sob a batuta do presidente Luiz Incio Lula da Silva d incio frentica corrida pela sucesso -- e, para usar a cruel imagem sobre os costumes de Braslia em fins de mandato, nem mesmo a incrvel popularidade de Lula dever impedir que o caf que lhe ser servido em 2010 v gradualmente esfriando com o passar do tempo. Enquanto isso, a cada ms deve aumentar a bajulao aos postulantes mais competitivos na disputa pelo primeiro cargo da nao. Nada a estranhar. da prpria natureza da poltica antecipar o deslocamento do poder. O que h de notvel no ano que se inicia a percepo generalizada de que, sejam quais forem as escolhas do eleitorado, a vida no futuro ser muito parecida com a de hoje. Contratos sero respeitados. A moeda ser preservada. As empresas seguiro produzindo -- eis o cenrio com que trabalham dez entre dez especialistas em finanas internacionais. Mais do que uma aposta puramente econmica, eles confiam num salto qualitativo da sociedade brasileira. Ao conseguir descolar os ambientes da poltica e da economia, o Brasil tornou-se bem mais parecido com pases em estgio de desenvolvimento muito superior. Num mundo que ainda lambe as feridas da crise financeira, oferecemos uma combinao irresistvel de estabilidade com crescimento num ambiente de democracia plena. Como deve evoluir a economia brasileira daqui para a frente? Todos os prognsticos indicam um ano prspero -- as estimativas so de crescimento forte, um dos mais robustos dos ltimos tempos. Ao longo de 2009, empresas dos mais diferentes setores ajustaram para baixo a produo na tentativa de desovar estoques acumulados aps a ecloso da crise financeira. O corte de produo cobrou seu preo -- o PIB chegou a cair em dois trimestres e deve fechar o ano com crescimento nulo. O lado bom dessa histria que o consumo interno se recuperou antes do que muitos imaginavam -- ao fim e ao cabo, 2009 acabou melhor do que se acreditava. O ano de 2010, portanto, comea com uma

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combinao promissora: poucos estoques e muita demanda. sinnimo de produo em alta. As empresas devem operar em ritmo bem acima do normal para essa poca do ano. E isso estimula o emprego e o investimento. Tambm deve aumentar a efervescncia no meio empresarial. Nesse sentido, a criao de um gigante no varejo englobando as lojas de Po de Acar e Casas Bahia pode ser vista como um indcio do momento atual do mercado. As operaes de fuses e aquisies, que saltaram de 10 bilhes de dlares em 2002 para 95 bilhes em 2008, despencaram em 2009 -- de janeiro a novembro o volume foi de 54 bilhes. Agora, a expectativa de um novo crescimento, ainda que no se volte ao patamar recorde de 2008. Tambm devem ser retomados os negcios no mercado de capitais. Os IPOs e as ofertas de aes em bolsa, que somaram pouco mais de 3 bilhes de dlares em 2004, chegaram a 35 bilhes em 2007. O volume caiu para cerca de 20 bilhes de dlares em 2009 -- e executivos de mercado esperam um crescimento de at 40% em 2010. Alguns setores devem ser particularmente beneficiados com o reaquecimento da economia -- com destaque para o de petrleo e gs. O Brasil j comea a ser includo nas listas dos pases petroleiros mais promissores, a ponto de frequentar, ao lado de Rssia, Iraque, Nigria e Cazaquisto, o recm-criado acrnimo Brink, que rene as naes onde se espera produo crescente nos prximos anos. Todas essas projees indicam que, ressalvado o aspecto inerentemente imprevisvel das atividades humanas, 2010 um ano considerado ganho de antemo pelos principais analistas da cena econmica. O risco, alis, so os problemas advindos do prprio sucesso. Por todos os ngulos, o que se v so foras estimulando a economia. O governo aumentou os gastos logo aps a crise -- e essa despesa continua crescendo. O consumo das famlias e das empresas est em forte expanso. O investimento, que despencou em 2009, deve pelo menos voltar ao patamar pr-crise. O mundo continua querendo os produtos brasileiros. Se nada for feito, o pas corre o risco de transitar diretamente para um cenrio de superaquecimento econmico -- o que leva muitos analistas a prever altas de juro, ainda que moderadas, nos meses frente. De certa forma, o bom momento do Brasil deve explicitar problemas histricos que no foram sanados -- a baixa poupana, o estado deplorvel da infraestrutura, a falta de mo de obra qualificada para sustentar o crescimento. Um novo ciclo poltico est prestes a ser inaugurado, com a sada de cena -talvez momentnea -- do presidente Lula. Ser preciso muito trabalho de seu sucessor para manter o pas no patamar recm-conquistado e, esperamos, al-lo ainda mais.

ECONOMIA Um problema pode virar soluo? Por Jos Roberto Caetano Empate por zero a zero no resultado que a torcida brasileira goste de comemorar. Mas, no campo da economia, o fato de o Brasil ter atravessado um ano de turbulncia financeira global sem crescimento virou motivo de celebrao. Afinal, o desempenho notavelmente melhor que o conseguido em confuses passadas e tambm superior ao de muitos outros pases, em particular os desenvolvidos. Melhor ainda, os indicadores mostram que estamos a caminho de marcar uma goleada em 2010. Na busca das razes de nosso relativo

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sucesso em 2009, curioso notar que itens normalmente associados lista de problemas nacionais -- gigantismo do governo, voluntarismo dos bancos oficiais, taxas de juro nas alturas, baixo volume de crdito, baixa participao do setor externo na economia -- de repente mudaram de coluna e passaram a ser includos nas solues. Nada explicita melhor a reviravolta no terreno das ideias econmicas do que o debate sobre o Estado. Hoje consenso que o bom resultado do Brasil em 2009 deve-se em parte s aes do Estado, seja diretamente, seja por meio de seus bancos. Tambm foi decisiva a constatao de que os brasileiros estavam com suas contas pessoais relativamente em ordem -- a anos-luz de distncia do imbrglio do subprime americano. O equilbrio no se deve frugalidade dos hbitos, e sim ao fato de que o crdito no Brasil h muito tempo tem um custo exorbitante e escasso. Isso mantm consumidores e empresas relativamente mais cautelosos quanto ao uso de dinheiro alheio. Aqui, ao contrrio dos pases mais avanados, a preferncia por investir menos, mas com dinheiro prprio. uma estratgia que restringe o crescimento -mas que, na hora do aperto, tornou-se um trunfo. Tambm reduzida a exposio do pas aos riscos do comrcio exterior. Como o mercado brasileiro ainda relativamente protegido, a soma das exportaes e importaes representa menos de um quinto do PIB -- em pases como a Coreia da ordem de 90%. Ser que os problemas de antes realmente viraram soluo? Em meio euforia das boas notcias econmicas, bom tomar cuidado com algumas concluses tortuosas -- ou no mnimo apressadas. Uma coisa enfrentar uma crise. Outra, bem diferente, construir as bases de uma economia moderna. Violar essa linha de raciocnio leva concluso de que traos que foram qualidades na crise merecem ser reforados agora. A que mora o perigo. " bvio que o setor pblico ajudou, mas essa viso glorifica problemas nossos", diz Alexandre Schwartsman, economista-chefe do banco Santander. "Se colocarmos um gordo e um magro em situao de inanio, no h dvida de que o sujeito mais robusto ter mais chance de sobreviver. Nem por isso algum mdico recomendaria ficar gordo para se prevenir de uma morte por falta de comida." Se a ao do governo funcionou nas circunstncias atuais, tambm fato que, antes, atrapalhou muito -- e continuar a faz-lo no futuro. O pas no estaria melhor se tivesse crescido com mais vigor no passado, o que seria possvel se empresas e trabalhadores no fossem to sobrecarregados pelo peso estatal? Mais uma concluso errada a ser evitada a de que a abertura da economia ao exterior um mal. "Um mercado fechado uma faca de dois gumes", afirma o economista ingls John Williamson, criador do termo Consenso de Washington para batizar o conjunto de medidas de estabilizao recomendadas a pases da Amrica Latina. "O pas fica menos propenso a sofrer impactos de uma crise externa, mas tem dificuldade de se aproveitar dos momentos bons." Isso j ficou patente com a capacidade de crescer que as economias mais abertas da sia demonstraram. O fato de agora, por um ou dois anos, sofrerem mais que o Brasil, no justificaria jogar suas polticas vencedoras por dcadas na lata de lixo. Ter um mercado interno forte -- este sim um atributo do Brasil que fez diferena e vale ser estimulado -- uma coisa. Dar as costas para o mundo outra, bem diferente. Nesse aspecto, como em outros, bom ter cuidado para no tirar concluses erradas.

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TECNOLOGIA A internet das coisas Por Srgio Teixeira Jr. A web comemorou seu 20 aniversrio em 2009, e nesses primeiros anos de vida o que se viu na rede foi produto do ser humano. Pginas pessoais, lojas de comrcio eletrnico, sites de empresas e de governos, redes sociais. Nos prximos 20, o homem vai ser deixado para trs na internet. Mas no se est falando de um futuro sombrio, de submisso do homem mquina. Pelo contrrio. uma constatao: os sensores esto se acumulando nossa volta. Eles esto nas novas infraestruturas de energia eltrica (as redes inteligentes), nos sensores instalados em equipamentos industriais, nas redes de telecomunicaes. E no so apenas chips: cmeras filmam ruas e estradas 24 horas por dia, sistemas de segurana monitoram residncias e empresas. Alguns deles j esto conectados e muitos outros vo plugar-se rede criando uma nova e valiosssima coleo de informaes que vai se fundir com a internet que conhecemos -- e transform-la para sempre. "A oportunidade da web no est mais crescendo de forma aritmtica. Est crescendo exponencialmente", escreveram recentemente num artigo John Batelle e Tim OReilly, gurus do Vale do Silcio que cunharam o termo web 2.0. "O fsforo foi riscado entre 1999 e 2004. Entre 2005 e 2009 ps-se fogo no pavio. Em 2010, acontecer a exploso." Essa "internet das coisas" no est no futuro distante, e a prova disso provavelmente est dentro de seu bolso agora. Os smartphones, celulares que tm a sofisticao tecnolgica de computadores de mesa de cinco anos atrs, so a face mais visvel dessa nova revoluo que se aproxima. Muitos dos novos aparelhos tm chips de GPS embutidos. Podem transmitir para amigos e familiares a localizao do dono em tempo real, o tempo todo. Podem tambm agregar s fotos tiradas com o celular informaes precisas de localizao. As coordenadas de georreferenciamento tambm funcionam na mo inversa. Quem usa o aplicativo do Google no iPhone, por exemplo, pode optar por receber os resultados de busca mais adequados sua localizao. Quer saber onde est o restaurante italiano mais prximo? A resposta ser dada pela base de dados do gigante da internet -- com a ajuda do GPS de seu smartphone. Quer saber mais sobre uma garrafa de vinho na prateleira do supermercado? Basta tirar uma foto do rtulo e submet-la a um servio na web. A resposta ter opinies de outros enfilos, alm de uma comparao de preos: uma loja a duas quadras tem a mesma garrafa por um preo 20% mais baixo. As mquinas tambm vo conversar entre si -- e, com a ajuda de grandes sistemas computacionais, as informaes desse dilogo sero processadas e traduzidas em benefcios para o ser humano. O primeiro grande passo ser dado com as redes eltricas inteligentes, uma das principais reas de investimento em 2010. Os antigos medidores analgicos sero gradualmente substitudos por sistemas digitais, conectados pela internet com a fornecedora de eletricidade. Isso vai permitir, por um lado, mais controle s empresas eltricas. Hoje, elas dependem das reclamaes dos clientes para saber quando o fornecimento foi interrompido em uma rua. Com as redes inteligentes, o aviso ser disparado automaticamente. Do lado do consumidor, o benefcio inicial vir nas contas. Com informaes mais precisas sobre os horrios de pico de consumo, as empresas eltricas podero oferecer preos diferenciados de acordo com a hora do dia. Os eletrodomsticos com chips embutidos representam uma segunda fase. Processadores e rdios de

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comunicao sem fio caem de preo vertiginosamente. Uma estimativa d conta de que antes do fim da prxima dcada haver, para cada pessoa do planeta, mil objetos equipados com chip e sistemas de comunicao sem fio. A conta de luz provavelmente deixar de existir. Em seu lugar haver um painel de controle, disponvel em tempo real na web, mostrando quais so os aparelhos que mais consomem eletricidade e qual o horrio mais conveniente -- ou seja, mais barato -- para ligar a lava-loua, por exemplo. A internet das coisas tambm poder melhorar o trnsito. J h sistemas de navegao de carros que transmitem em tempo real informaes sobre o andamento dos veculos. Mostrados num mapa, eles so uma indicao fiel das condies de trnsito. A sade se prepara para uma revoluo. Sistemas de monitoramento remoto de pacientes vo transmitir dados em tempo real. Estamos apenas comeando a vislumbrar os benefcios de ter o mundo dos homens -- e das coisas -- conectado pela web. [...] Fonte: TENDNCIAS 2010: IDIAS. Portal Exame, So Paulo, dez. 2010. Disponvel em: . Acesso em 17 fev. 2010.

Leituras complementares Comisso Econmica para a Amrica Latina e Caribe (CEPAL) UOL Economia

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o artigo a seguir, os autores descrevem a atual crise na zona do euro e, no mercado de cmbio, a perda de valor da moeda. Destaca-se a situao de dficit da balana comercial de pases como Espanha, Portugal e Grcia que deixa evidente o quanto a crise econmico-financeira atingiu os pases da Unio Europia. Por que a crise do dlar no significa a ascenso do euro? O artigo nos estimula a pensar sobre a integrao econmica global e o quanto a crise do dlar comprometeu as economias do mundo todo. A UNIO MONETRIA EM RISCO, O EURO ATACADO Por Claire Gatinois e Marie de Vergs Dez anos aps sua criao, estaria a zona do euro ameaada de dissoluo? Os mercados financeiros temem isso, preocupando-se com o dficit pblico que eles consideram injustificvel de determinados pases europeus. Aps a Grcia ter sido foco de seus temores, a Espanha, Portugal e a Itlia tambm se tornaram motivo de preocupaes. Na quinta-feira (4), as praas financeiras tiveram uma forte queda: -5,94% para a Bolsa de Madri, -5% para a de Portugal, enquanto as praas grega e italiana cediam 3,3% e 3,5%. Na

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sexta-feira, a queda continuava. Madri recuou 1,65%, e Lisboa mais 2%. As turbulncias financeiras tambm se manifestaram sobre o mercado de cmbio. O euro afunda cada dia mais. Na sexta-feira, a moeda nica valia US$ 1,36, um nvel indito em oito meses. Desemprego chega a 10% na zona do euro Os especialistas da empresa de investimentos Pimco agora aconselham a se manter longe do euro. E o dlar, que parecia ameaado de queda, reencontra seu status de porto seguro. Alguns analistas de fato acreditam que o nvel de endividamento atual na zona do euro no pode ser eliminado pelo crescimento esperado, frgil demais. A retomada poder ser comprometida. O nervosismo dos investidores tambm aparece no mercado de bnus soberanos desses pases. Agora, a Grcia deve fazer emprstimos por 10 anos taxa de 6,7%. Em outras palavras, o pas causa tamanha desconfiana que ele deve pagar um prmio de risco de 3,6% em relao Alemanha, a referncia do mercado. Na quarta-feira, Portugal, por sua vez, sofreu para atrair investidores o suficiente para sua ltima emisso de ttulos. Tom alarmista Os dois pases esto sob presso das agncias de classificao de risco. Segundo os rumores que agitam os mercados, a Fitch e a Moodys podero imitar a Standard&Poors que, desde dezembro de 2009, abaixou a perspectiva da dvida da Espanha de estvel para negativa. O presidente do Eurogrupo, Jean-Claude Juncker, tentou tranquilizar, afirmando, na quintafeira, que as situaes desses dois pases no so um risco. J Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu (BCE), garantiu que no haveria nenhuma exceo s regras oramentrias europias. Ele mostrou assim sua confiana na capacidade da Grcia e de outros pases europeus em voltar rapidamente para dentro dos limites requeridos pelo pacto de estabilidade europeu. Os critrios de Maastricht estabelecem em 3% o nvel mximo de dficit pblico e em 60% o do endividamento do Estado. Mas essas declaraes tranquilizadoras se opem s do Prmio Nobel de Economia Paul Krugman, para quem a maior dificuldade para a zona do euro mais a Espanha do que a Grcia. O mesmo tom alarmista se encontra na anlise do economista americano Nouriel Roubini: Se a Grcia um problema, a Espanha poder ser um desastre, porque ela a quarta economia da zona, indicou. Certamente h um pouco de especulao, acredita o economista Philippe Brossard, presidente da agncia Macrorama, mas esses temores so, no fundo, bastante legtimos. Desde o incio da crise, no desinflaram a bolha do crdito, mas voltaram a infl-la ao levar o fardo da dvida no mais aos agentes privados, e sim aos Estados, diz. Para sair da crise e evitar a catstrofe, os Estados de fato financiaram o salvamento de suas economias usando centenas de bilhes de dlares, euros ou ienes. Para Brossard, o problema no est circunscrito Europa, mas se estende assim a todos os pases da OCDE [Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico]. Ele

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observa que no mais raro ver nveis de endividamento pblico atingirem 80% a 90% do Produto Interno Bruto (PIB), com dficits pblicos da ordem de 6% a 7%. Alm disso, o Fundo Monetrio Internacional (FMI) explica que o dficit global da zona do euro continua sendo inferior ao de outros pases como os Estados Unidos ou o Japo. A realidade que apesar de a catstrofe ter sido evitada, a economia ainda vai muito mal, acredita o economista Jacques Attali. Segundo ele, passada a euforia, os mercados financeiros esto percebendo que o crescimento no estvel. A crise no acabou, conclui. Fonte: GATINOIS, Claire; VERGS, Marie de. A Unio Monetria em risco, o euro atacado. Le Monde. 6 fev. 2010. Disponvel em: . Acesso em 19 fev. 2010.

Leituras complementares Crise do dlar e crise do euro Confiana econmica cai na zona do euro em fevereiro EUROPA O portal da Unio Europeia

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artigo abaixo trata da questo da poltica norte-americana para o aumento dos subsdios agrcolas. Os subsdios so uma ajuda financeira ou mesmo a iseno de impostos de produtos que o governo oferece a determinados setores da economia. Os subsdios contrariam o princpio de igualdade comercial, pois acabam desequilibrando o comrcio internacional impedindo o desenvolvimento de pases mdios e pequenos. Quais so as consequncias diretas dos subsdios para os pases no mercado internacional? Podem promover a fome? EUA VO AMPLIAR SUBSDIOS PARA DOBRAR EXPORTAES EM 5 ANOS Ofensiva serve para recuperar a economia norte-americana, mas Brasil pode ter mais dificuldade no acesso a mercados importantes, como o chins e o russo Por Giovani Ferreira e Luana Gomes Os Estados Unidos anunciaram ontem o que promete ser a maior ofensiva do pas no comrcio internacional do agronegcio. Em cinco anos, o governo norte-americano quer dobrar as exportaes do setor, que devem alcanar US$ 100 bilhes neste ano. A meta foi apresentada na abertura do Agricultural Outlook Forum 2010, em Arlington, cidade nos

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arredores de Washington que tradicionalmente sede do evento organizado pela Secretaria de Agricultura dos EUA (USDA, na sigla em ingls). Caso se concretize, ela ameaa o desempenho das exportaes agrcolas do Brasil, que no ano passado atingiram US$ 64 bilhes. O Paran, maior produtor nacional de gros, tambm sentir com fora os efeitos do avano da agricultura dos EUA. Essa a hora de fortalecer o comrcio global de commodities agrcolas, afirmou o analista do USDA Jim Miller, durante a cerimnia de abertura da conferncia. As estatsticas da agricultura norte-americana preocupam. A Amrica Rural representa apenas um sexto da populao do pas, mas o setor que mantm a nao unida. Precisamos fortalecer o agronegcio atravs da abertura de novos mercados dentro e fora do pas, disse Tom Vilsack, secretrio de Agricultura dos EUA. Sem maiores detalhes, o secretrio deixou claro que para atingir a meta o pas no deve medir esforos, inclusive com o aumento dos subsdios ao segmento. Outra estratgia norte-americana para ampliar a participao no mercado mundial ser intensificar os acordos bilaterais com os pases onde cresce o consumo, como a China. Responsvel por 54% do comrcio global do complexo soja, o pas asitico a principal aposta norte-americana para alavancar as exportaes do setor. Os chineses, vale lembrar, compram atualmente metade das exportaes brasileiras do gro. Os EUA tambm querem participar do mercado de valor agregado. Um exemplo a exportao de carne suna para Rssia, onde fatalmente fica estabelecida outra disputa com o Brasil. Discurso diferente A mudana no discurso em relao aos subsdios se justifica no esforo do governo pela recuperao econmica, abalada com a crise financeira deflagrada no segundo semestre de 2008. No ano passado o presidente Barack Obama tentou, sem sucesso, cortar progressivamente parte da ajuda do governo agricultura. A proposta gerou polmica e foi barrada no Congresso, onde o agronegcio sustenta um dos maiores lobbies. Agora, o novo posicionamento vai mexer com o mercado e com as relaes internacionais, avaliam os analistas brasileiros que participam do Outlook 2010. A ousadia preocupa o Brasil, que busca mais espao para sua crescente produo. No vai ser fcil para os Estados Unidos dobrarem suas exportaes. No podemos subestimar a capacidade dos norte-americanos, mas preciso considerar algumas variveis para que isso possa ocorrer, como estrutura porturia, negociaes internacionais e reciprocidade do mercado, alm da reao dos outros pases exportadores, diz Thom Guth, tcnico da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) que acompanha as discusses do frum. Marco Olvio Morato de Oliveira, analista de mercados da Organizao das Cooperativas Brasileiras (OCB) que est no frum, refora que a estratgia dos Estados Unidos na busca de novos mercados vai explorar o trip da sustentabilidade. Eles esto se preparando e organizando a base desse processo, que passa pela recuperao do mercado, do produtor exportao. O projeto econmico, mas o apelo ser o da produo sustentvel, alerta Morato de Oliveira.

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O Agriculture Outlook Forum prossegue hoje com as discusses sobre a modernizao da economia agrcola da China, o maior comprador mundial de soja. Fonte: FERREIRA, Giovani; GOMES, Luana. EUA vo ampliar subsdios para dobrar exportaes em 5 anos. Jornal de Maring Online. Maring, 19 fev. 2010. Disponvel em: . Acesso em 19 fev. 2010.

Leituras complementares Portal do Agronegcio Livre Comrcio

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texto a seguir divulga a criao de um novo bloco regional que rene quase todos os pases da Amrica Latina. Os blocos regionais nasceram em diversas partes do planeta desde o final do sculo passado como forma de proteo dos pases membros. No continente americano, existem diversos organismos criados para integrar os pases da regio, como OEA, Nafta, Mercosul, entre outros. Quais os princpios efetivamente norteadores dessa nova organizao? Seriam basicamente econmicos como tradicional nesses blocos? AMRICA LATINA APROVA CRIAO DE NOVO BLOCO REGIONAL SEM OS EUA BBC Brasil Os presidentes dos pases da Amrica Latina e do Caribe aprovaram, nesta tera-feira em Cancn, no Mxico, a criao de um novo bloco que represente todas as naes da regio sem a participao do Canad e dos Estados Unidos. O organismo se chamaria, temporariamente, Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos e iniciaria suas atividades a partir de julho de 2011 data da prxima Cpula da Amrica Latina e do Caribe em Caracas, na Venezuela. Finalmente h um consenso sobre isso, tambm houve discusses intensas, disse o presidente do Mxico, Felipe Caldern. Segundo ele, o novo bloco deve impulsionar a integrao regional e promover a agenda regional em encontros globais. At agora, os lderes ainda no incluram Honduras no novo grupo regional. O bloco seria uma alternativa Organizao dos Estados Americanos (OEA) o principal frum das relaes regionais nos ltimos 50 anos. A OEA tem sofrido crticas de seus

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prprios membros aps uma srie de embates polticos e comerciais entre pases da regio e os Estados Unidos. Princpios O novo organismo foi aprovado pelos 25 chefes de Estado e de governo que participaram da Cpula no Mxico. Segundo o comunicado divulgado pelos lderes, o bloco ter entre seus princpios promover o respeito ao direito internacional, a igualdade dos Estados, evitar o uso de ameaa de fora e trabalhar a favor do meio ambiente na regio. Alm disso, o organismo deve promover a integrao poltica da regio assim como o dilogo com outros blocos. As regras de operao definitivas devero ser adotadas no evento de Caracas, no prximo ano, ou na Cpula que ocorrer no Chile, em 2012. 'Substituio' O presidente de Cuba, Ral Castro, elogiou o anncio sobre a aprovao do novo bloco, que incluiria o pas, diferentemente da OEA. Cuba foi suspensa da Organizao dos Estados Americanos em 1962 por causa do sistema poltico socialista da ilha. Em 2009, a OEA decidiu aceitar novamente os cubanos no bloco, mas Cuba rejeitou. O presidente da Venezuela, Hugo Chvez, j havia expressado seu apoio proposta, afirmando que seria uma ao para distanciar a regio da colonizao americana. Um representante do Departamento de Estado dos Estados Unidos afirmou que no acredita que o novo bloco substituir a OEA. Os termos do novo organismo e a eventual substituio do Grupo do Rio e da Cpula da Amrica Latina e do Caribe pelo novo bloco ainda no foram esclarecidos. Segundo o presidente eleito do Chile, Sebastin Piera, muito importante que no tentemos substituir a OEA. A OEA uma organizao permanente e tem suas prprias funes, disse. Fonte: AMRICA LATINA aprova criao de novo bloco regional sem os EUA. BBC Brasil. 23 fev. 2010. Disponvel em: . Acesso em 24 fev. 2010.

Leitura complementar Blocos Econmicos e Organizaes Internacionais

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artigo a seguir convida reflexo sobre a tendncia mundial de aquisio de empresas e a formao de grandes corporaes. No mercado nacional, a Hypermarcas, objeto de anlise do artigo abaixo, desponta com um dos mais significativos exemplos dessa tendncia. O que esse processo representa para a economia brasileira? Quais as consequncias para as pequenas e mdias empresas? Quais os riscos para os trabalhadores? O IMPRIO DAS MARCAS Com investimentos de 5 bilhes de reais e uma gesto tipicamente brasileira, o empresrio Joo Alves de Queiroz Filho, ex-dono da Arisco, comprou 20 concorrentes e transformou sua Hypermarcas numa das maiores empresas de consumo do pas Por Marcelo Onaga Nos ltimos anos, a economia brasileira passou por profundas transformaes - quase todas para melhor. A estabilidade hoje algo que nem mesmo os esquerdistas mais raivosos colocam em questo, o pas atingiu o grau de investimento, o mercado de capitais tornou-se um dos mais pujantes do mundo, o acesso ao crdito ficou mais fcil e barato. A combinao desses fatores fez surgir o que alguns economistas j chamam de "novo capitalismo brasileiro", um perodo de formao de grandes companhias nacionais aptas ou dispostas a competir com algumas das maiores corporaes globais. " um momento indito, que permitiu a ascenso de empresas brasileiras com potencial de ganhar o mundo", afirma Oscar Malvessi, professor de finanas corporativas da Fundao Getulio Vargas de So Paulo. Poucas empresas representam to bem essa fase como a Hypermarcas -seja pela rapidez com que foi criada, seja pela forma peculiar como administrada. Criada h nove anos, a partir de um produto sem quase nenhuma tecnologia ou inovao - a l de ao Assolan -, a Hypermarcas passou de mdia empresa com faturamento de 30 milhes de reais no primeiro ano de operao a uma respeitvel companhia de 3,5 bilhes de reais de receita em 2009. Trata-se de um espetacular crescimento de 11 500% em menos de uma dcada. Nesse perodo, investiu cerca de 5 bilhes de reais em 20 aquisies de empresas nacionais, todas de bens de consumo, algumas com marcas bastante conhecidas, sobretudo no crescente - e hoje sexy - mercado da classe C. Em 2009, segundo um levantamento da consultoria Bain&Company, a Hypermarcas foi a empresa brasileira que mais foi s compras (excluindo firmas de private equity e bancos), com cinco aquisies que somaram quase 2 bilhes de reais. Embora seja uma empresa aberta, com valor de cerca de 11 bilhes de reais em bolsa e milhares de acionistas, a Hypermarcas um reflexo da forma de pensar do goiano Joo Alves de Queiroz Filho, mais conhecido como Jnior, um dos raros empresrios brasileiros que reinventaram o sucesso em tempos, circunstncias e negcios diferentes. Aos 57 anos de idade, fundador e dono de 31% do capital da Hypermarcas, Jnior est construindo um gigante do mercado de consumo pela segunda vez. Durante quase duas dcadas, ele comandou a Arisco, empresa fundada por seu pai em 1969. Depois da venda da companhia por 760 milhes de dlares para a americana Bestfoods (que viria a ser incorporada logo em seguida pela anglo-holandesa Unilever) no ano 2000, Jnior decidiu recomear. Seu plano era construir uma espcie de "Procter& Gamble brasileira", uma companhia que oferecesse produtos de consumo em reas to diferentes quanto alimentos e medicamentos, sobretudo para os consumidores emergentes. Assim como fizera na Arisco, ele no criaria nada novo.

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Seus produtos - de ls de ao a medicamentos genricos - no demandam patentes ou grandes departamentos de pesquisa e desenvolvimento. So uma alternativa, muitas vezes mais barata, ao que o consumidor j se acostumou a comprar. Seu grande capital, ao fazer isso, seria a combinao de experincia na produo, domnio do marketing de massa e conhecimento profundo dos canais de distribuio - trs pilares construdos durante sua trajetria na Arisco. Os resultados recentes da Hypermarcas mostram que, pelo menos nesse sentido, Jnior j chegou perto de seu objetivo. Hoje, sua empresa conta com um portflio com mais de 170 marcas e 4 000 produtos - de molho de tomate a analgsicos - e tem praticamente o dobro do tamanho da operao brasileira da P&G, que faturou cerca de 1,8 bilho de reais no pas em 2009. Vi que havia muitas empresas como a Arisco, de origem familiar, que uma hora seriam alvo de um movimento de consolidao, disse Jnior a EXAME, em uma de suas rarssimas entrevistas (suas fotos nesta reportagem so as primeiras publicadas por um veculo de imprensa). E acreditei que eu poderia ser o consolidador. A face de comprador serial comeou a se manifestar em 2001, quando Jnior recomprou a Assolan, marca que fazia parte do portflio da Arisco, da Unilever. No ano seguinte, lanou o sabo em p Assim. A partir de 2003, com um apetite cada vez mais voraz, arrematou de empresas praticamente annimas marcas consagradas como Doril e Bozzano. Seu radar acionado sempre que ele se depara com uma companhia dona de produtos conhecidos do grande pblico mas que por alguma razo foram esquecidos ou com empresas familiares que enfrentam dificuldades de su-cesso. Identificado o alvo, hora de Jnior mostrar sua habilidade de negociao. preciso fazer o dono da companhia perceber que, se ele vender, receber um valor justo e que a obra de sua vida no ser enterrada. Do contrrio, a empresa pode desaparecer, diz. Esse poder de persuaso, alis, apontado por quem o conhece bem como um de seus maiores trunfos. Apesar da infncia modesta, Jnior um empresrio sofisticado. Cerca-se de alguns dos mais respeitados banqueiros e advogados do pas. Elabora estratgias complexas ao mesmo tempo que cultiva, no ambiente de negcios, a imagem do caipira bem-sucedido. Em boa medida, Jnior a personificao de um estilo de gesto tipicamente brasileiro - um jeito de conduzir os negcios que combina tcnicas sofisticadas com uma dose considervel de intuio, agressividade com o conservadorismo nos custos tpico dos negcios criados do zero, decises rpidas com personalismo. Com seu jeito simples, ele sabe dizer o que o interlocutor quer ouvir e no tem problema em fazer concesses - algo normalmente complicado para as multinacionais. Foi assim, por exemplo, que a Hypermarcas atravessou a negociao da americana Pfizer com o laboratrio de genricos Neoqumica. Apesar de colocar na mesa uma tima proposta financeira, a Pfizer no garantia uma posio executiva de destaque para o ento presidente e principal acionista da Neoqumica, Marcelo Limrio Gonalves Filho. A negociao entre as duas empresas j estava em estgio avanado quando Jnior entrou na disputa. Segundo um executivo que acompanhou de perto o processo, ele ofereceu praticamente o mesmo valor da multinacional americana - 1,3 bilho de reais -, mas garantiu que Gonalves Filho assumiria o comando da rea de medicamentos da Hypermarcas. Sempre aproveitamos as pessoas e as culturas das empresas que compramos. Elas j sabem como funciona o negcio e, principalmente, os erros que tm de ser evitados, diz Jnior. Em outro negcio

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fechado pela Hypermarcas no ano passado, ele adotou uma ttica diferente. Percebeu que o dono da empresa com quem negociava se sentia frustrado por no ter herdeiros interessados no negcio e temia que as marcas que havia criado desaparecessem. Sou o filho que voc no teve e vou fazer nossa empresa crescer, disse Jnior na ocasio. A frase foi decisiva para que o negcio fosse fechado - e est longe de ser mero bla-bla-bl de negociante. Depois de vender a Arisco, Jnior viu a marca praticamente desaparecer do mercado nos anos seguintes. Antes lder de mercado em alguns segmentos - como temperos, por exemplo -, ela hoje tem participao tmida dentro da linha de produtos da Unilever e h tempos no recebe nenhum investimento de marketing. No ano passado, a Unilever, vendeu para a empresa de caf Santa Clara uma das marcas que vieram com a aquisio da Arisco - a Frisco, de sucos em p, que chegou a ser vice-lder desse segmento no passado. A unidade da Arisco, em Gois, foi modernizada e ampliada e hoje a maior fbrica de alimentos da Unilever no mundo. (No mercado, comenta-se que a marca Arisco seria o novo alvo de aquisies da Hypermarcas. Os envolvidos no confirmam.) Para construir seu conglomerado de produtos de consumo, Jnior contou com mais do que uma boa estratgia e uma lbia convincente. Ele precisou provar ao mercado que, de fato, tinha ambio e caixa suficientes para erguer uma companhia maior do que fora a Arisco. Nesse sentido, sua grande tacada veio em 2007, com a aquisio da empresa de medicamentos e produtos de cuidado pessoal Dorsay Monange, a paulista DM, dona de marcas como Doril, Gelol e Risqu. Com a compra da empresa por 1,2 bilho de reais - a Hypermarcas triplicou seu faturamento. Jnior um timo negociador e soube aproveitar o bom momento do mercado brasileiro para criar uma grande companhia, afirmou a EXAME Nelson Morizono, ex-dono da DM. Morizono e Jnior tm muitas caractersticas em comum. Alm da averso exposio pblica (a entrevista a EXAME foi a primeira j concedida por Morizono), ambos adotaram a estratgia de comprar marcas fortes e sustent-las com pesados investimentos em marketing. A compra da DM marcou tambm a estreia da Hypermarcas nos dois mercados que mais crescem no setor de consumo, sobretudo depois que o fenmeno da ascenso da classe C se fortaleceu: o de medicamentos que dispensam receita mdica, tambm conhecidos como OTC, e o de cuidados pessoais. [...]

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Pode-se dizer que o maior desafio de Jnior e seus executivos comea a partir de agora. Para manter sua velocidade de crescimento e o interesse dos investidores por seus papis, sua empresa precisar fazer aquisies num ritmo ainda mais intenso do que o atual. A meta de Jnior comprar uma mdia de um novo negcio a cada dois meses em 2010 - e pelo menos uma dessas operaes deve envolver uma grande empresa. Vamos comprar at triplicar de tamanho, diz Jnior. Pelas contas de Bergamo, para alcanar um faturamento anual de aproximadamente 10 bilhes de reais, a Hypermarcas dever levar cinco anos. Depois disso, o volume das aquisies deve diminuir gradativamente. J no haver tantas empresas venda no mercado, diz Bergamo. A partir da, preveem os executivos da Hypermarcas, o crescimento no Brasil passar a ser basicamente orgnico, concentrado nas reas de atuao j exploradas pela companhia - alimentos, higiene e limpeza, cuidados pessoais e medicamentos. Segundo pessoas prximas a Jnior, porm, ele j estaria analisando a possibilidade de dar os primeiros passos rumo internacionalizao de seu negcio. Com a crise, de fato, h empresas baratas nos Estados Unidos e na Europa, diz Jnior. O problema que no h muita sinergia com os negcios no Brasil, e isso acaba encarecendo a operao. Entre as companhias baratas, Jnior estaria olhando de perto um pequeno laboratrio farmacutico americano e uma fabricante de cosmticos na Europa. [...]

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Fonte: ONAGA, Marcelo. O imprio das marcas. Portal Exame, Seo Notcias. So Paulo, jan. 2010. Disponvel em: . Acesso em 3 fev. 2010.

Leitura complementar Custos e riscos envolvidos em operaes de aquisio de empresas

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artigo a seguir trata da questo do crescimento do desemprego global em consequncia da crise econmico-financeira de 2009. Um dos problemas socioeconmicos de maior relevncia para os pases do mundo, o desemprego atinge de forma contundente tanto os pases desenvolvidos quanto os subdesenvolvidos. Vale considerar que os dados medem a incidncia da crise sobre os empregos formais, mas quais seriam os impactos sobre o mundo do trabalho informal? Ou mesmo sobre os diversos seguimentos sociais em que no possvel mensurar o impacto? DESEMPREGO GLOBAL ATINGE RECORDE DE 212 MI DE PESSOAS, DIZ OIT da Folha Online O desemprego mundial disparou em 2009 devido crise e atingiu 6,6% da populao economicamente ativa. Com isso, 212 milhes de pessoas no estavam empregadas no ano passado, o que uma cifra recorde, afirmou nesta quarta-feira a OIT (Organizao Internacional do Trabalho), que ainda previu um agravamento da situao para este ano. "O nmero de desempregados no mundo alcanou 212 milhes em 2009 devido a uma alta sem precedentes de 34 milhes em relao a 2007, quando teve incio a crise", informou a OIT atravs da Agncia Internacional do Trabalho, que divulgou hoje seu informe anual "Tendncias Mundiais do Emprego". Apenas em 2009 foram 27 milhes de pessoas a mais sem emprego. Entre 2007 e 2009, o ndice de desemprego progrediu 0,9 ponto percentual. Cerca de 12 milhes dos novos desempregados em 2009 --40% do total-- esto na Amrica do Norte, Japo e Europa Ocidental, e outros 8 milhes so encontrados no Leste Europeu e na Amrica Latina, informou a OIT. J as taxas de desemprego na sia, na frica e no Oriente Mdio ficaram estveis. Para 2010, a OIT prev que mais 16 milhes de pessoas ficaro desempregadas, fazendo com que a taxa de desemprego global chegue aos 7%. Frente a uma situao econmica ainda frgil, a OIT pediu aos pases que tomem medidas que favoream a criao de empregos.

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"Est claro que a prioridade poltica atual evitar uma reativao econmica sem empregos", advertiu o diretor-geral da Agncia Internacional do Trabalho, Juan Somavia, citado em um comunicado. "A mesma vontade poltica que salvou os bancos deve ser aplicada para salvar e criar empregos. Podemos obter isso graas a uma forte convergncia das polticas pblicas e do investimento privado." Fonte: DESEMPREGO global atinge recorde de 212 mi de pessoas, diz OIT. Folha Online. 26 jan. 2010. Disponvel em: . Acesso em 3 fev. 2010.

Leitura complementar Organizao Internacional do Trabalho

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artigo a seguir aborda o que parece ser uma tendncia no mundo do trabalho no sculo XXI: as mulheres trabalham menos tempo em casa. O texto evidncia o crescimento da insero das mulheres no mercado de trabalho, mas tambm revela outras razes para esse fenmeno econmico e social. Que implicaes esse processo de mudana socioeconmica tem acarretado? Essas implicaes interferem no modelo tradicional de unidade familiar? Como os homens tm se adaptado a esta realidade? MULHERES TRABALHAM MENOS TEMPO EM CASA Com mercado de trabalho feminino aquecido e renda em alta, tempo semanal gasto em tarefas domsticas cai 5 horas desde 2001 Vagas em setores como comrcio e servios ganham participao no mercado, e acesso a bens de consumo agiliza trabalho no domiclio Por Verena Fornetti O nmero de horas que as mulheres dedicam aos afazeres domsticos est diminuindo. A carga horria mdia empregada em tarefas como a limpeza da casa e o cuidado das crianas e dos idosos passou de 28,9 horas por semana em 2001 para 23,9 horas em 2008, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica). A mudana se relaciona com o crescimento da participao das mulheres no mercado de trabalho, com o avano da renda, que permite a compra de bens que agilizam o cuidado com a casa -como o micro-ondas, o liquidificador e a mquina de lavar- e com a melhora, ainda que modesta, da diviso de tarefas domsticas entre os homens e as mulheres. Ana Lcia Sabia, gerente do IBGE, destaca que, com a melhora na renda nos ltimos anos, mais famlias tm acesso a eletrodomsticos. "A cada ano, cresce o acesso a bens de

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consumo. A mquina de lavar, por exemplo, um dos itens mais libertadores da mulher e ainda no um bem universal no pas, como a geladeira j ." O acesso a servios pblicos tambm contribui para a queda no tempo gasto nas tarefas relacionadas casa, uma vez que a matrcula dos filhos em creches e escolas permite que a mulher exera outras atividades. E o aumento da renda possibilita a contratao de empregadas ou diaristas para exercer essas atividades dentro da casa. "As mulheres foram para a rua", afirma Hildete de Arajo, especialista da Universidade Federal Fluminense, que destaca o aumento da participao das mulheres na Populao Economicamente Ativa. Segundo o IBGE, em 2008, 47,2% das mulheres com dez anos ou mais no pas estavam ocupadas. Em 1992, eram 43,4%. Ela diz que o IBGE fez antes da piora da crise as entrevistas para a Pnad 2008, que apontou a diminuio do tempo gasto na realizao das tarefas domsticas. Na ocasio, cresciam os setores que empregam boa parte da mo de obra feminina, como comrcio e servios. Em 2009, apesar do impacto da recesso econmica, esses segmentos tambm estiveram aquecidos, o que indica que continua crescendo a participao das mulheres no mercado de trabalho. A Pnad 2009 ser divulgada no fim deste ano. Nmero subestimado A pesquisadora afirma que o nmero de horas dedicadas casa apontado pela pesquisa est subestimado. Segundo Arajo, os dados referentes ao trabalho realizado pelo homem dentro do domiclio tambm podem estar distorcidos. "Existe o preconceito de que trabalho domstico coisa de mulher e, portanto, no valorizado." O professor da Unicamp Claudio Dedecca refora essa percepo: "Os homens podem responder ao pesquisador do IBGE que o tempo para lavar o carro conta como afazer domstico. E, por outro lado, a mulher pode no considerar atividades como a de levar os filhos escola porque acha que so coisas normais do dia a dia". O IBGE incluiu a pergunta sobre dedicao a essas tarefas em 2001. Mas, mesmo com a ressalva de que o nmero do IBGE pode estar aqum do real e de que a pesquisa recente -e, portanto, a base de dados para a anlise ainda limitada-, Dedecca diz que a diminuio das horas dedicadas ao lar revela avano na sociedade. "Uma parte do trabalho domstico no se pode exteriorizar -por exemplo, a ateno dedicada formao dos filhos. Mas outra parte espero que o poder pblico assuma, com escola integral, creches etc." Classes sociais Os nmeros do IBGE tambm revelam que, quanto menor a escolaridade -e, por conseguinte, a renda-, maior o tempo dedicado casa. Mulheres que estudaram 15 ou mais anos empregam quase a metade do tempo nessas tarefas do que o gasto pelas que frequentaram a escola por at um ano.

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Fonte: FORNETTI, Verena. Mulheres trabalham menos tempo em casa. Folha de S. Paulo. Seo Dinheiro. So Paulo, 18 fev. 2010. Disponvel em: . Acesso em 18 fev. 2010.

Leitura complementar Mulheres no Mercado de Trabalho: grandes nmeros

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artigo abaixo divulga um dado que impressiona: a abertura diria de 200 empresas, em mdia, no Paran. O texto trata do impacto dessas novas empresas para a criao de novos empregos, mas tambm nos faz pensar sobre a questo do empreendedorismo como condio necessria para o desenvolvimento econmico e social da sociedade. PARAN REGISTRA ABERTURA DE 200 EMPRESAS POR DIA Da Redao Com a criao de 56.023 novas empresas no ano passado, o Paran mantm o ritmo de abertura de 200 estabelecimentos produtivos por dia til, dos quais 89,3% foram enquadrados como micro e pequenas empresas e 3,65% como empresas de pequeno porte. Esses nmeros foram decisivos para a criao de 69.084 novos empregos, segundo Jlio Maito Filho, presidente da Junta Comercial do Paran. Das novas empresas abertas, 32% esto em Curitiba e regio metropolitana. Os principais polos na criao de novas empresas foram: Londrina (4.080), Maring (3.753), Ponta Grossa (3.133), Cascavel (2.280), Umuarama (1.510), Santo Antnio da Platina (1.311) e Foz do Iguau (1.103). Todas as cidades do interior tiveram aumento em relao abertura de empresas registradas em 2008. Fonte: PARAN registra abertura de 200 empresas por dia. O Dirio do Norte do Paran. Maring, 18 fev. 2010. Disponvel em: . Acesso em: 18 fev. 2010. Leitura complementar Portal Sebrae-PR

Charge

A

partir de um recurso bastante simples, a charge a seguir demarca diferenas na mensagem que se quer comunicar: a desproporo do lucro dos bancos